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pensamento
     nacional
     AcadÊMICO




                            A metamorfose
                             organizacional
                                             (e a fÁBULA da barata na lata)




                                                                  Segundo Carmen
                                                                  Migueles, professora da
                                                                  Fundação getulio vargas
                                                                  e consultora da
                                                                  symballein, AFASTAR-SE
                                                                  DA HIERARQUIA NÃO
                                                                  SIGNIFICA ABRAÇAR A
                                                                  ORGANIZAÇÃO EM REDE. A
                                                                  transformação ideal é
                                                                  em direção a um modelo
                                                                  híbrido, tema de seu novo
                                                                  livro, que ela antecipa
            Fotos: iStock




                                                                  aqui com exclusividade




26    HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br
Imagine que um operário de uma              outro, o cumprimento de tarefas frag-      por critérios ligados à produtividade fí-
fábrica de alimentos cujo nome seja         mentadas. Ambas precisam se misturar       sica do ser humano no trabalho, e uma
sinônimo de confiabilidade enxerga          para que haja ganhos de flexibilidade e    aproximação das habilidades ligadas
uma barata no meio de sua linha de          inteligência de que a nova organização     aos ativos intangíveis. Focar essas ha-
produção. Ele precisa tomar uma             necessita. Isso em si nem é novidade —os   bilidades muda muita coisa:
decisão: interrompe o trabalho e            adeptos dos modelos gerenciais japone-
ma­a a barata ou mantém o ritmo
    t                                       ses da década de 1980 e da reen­ enharia
                                                                            g          •	 A qualidade dos vínculos de cada in-
e ignora o inseto?                          dos anos 1990 já haviam chegado à con-        divíduo com a empresa, com o supe-
   Guarde esse suspense na memória;         clusão de que o aumento da autonomia          rior e com a equipe é o que passa a
vou desenvolvê-lo em breve. Antes,          do executante é fundamental.                  fazer a grande diferença.
preciso falar da imensa pressão que as         O desafio agora é como fazer isso.      •	 A reputação da organização e o va-
empresas vêm sofrendo para eliminar         Estou convencida de que a solução está        lor percebido pelo cliente tornam-
suas estruturas hierárquicas e substi-      na capacidade de agir sobre passivos          -se os responsáveis pela maior par-
tuí-las por um modelo organizacional        intangíveis que todas as culturas na-         te das margens.
em rede, em nome da maior capacida-         cionais ou étnicas colocam e, a partir     •	 A sustentabilidade passa a depender
de de inovação, de adaptação e de mais      daí, criar maneiras de ver e pensar o         da gestão de um conjunto de relacio-
um sem-número de motivos. Nesse             trabalho por meio das culturas organi-        namentos que boa parte dos gestores
cenário, a pergunta que vale 1 milhão       zacionais, buscando construir sistemas        aprendeu a ignorar.
é: que configuração é realmente a ideal     de coordenação informais e flexíveis
para uma empresa?                           capazes de organizar a cooperação.           Nesse novo modelo, valor percebi-
   Sem que essa questão seja formula-          Essa virada representa uma impor-       do, reputação, valor da marca, cultura
da e receba uma resposta adequada,          tante mudança do foco de uma empre-        organizacional, gestão do capital inte-
a metamorfose corporativa pode ser          sa: sai a concentração na técnica e na     lectual e inovação são fatores estreita-
mais dolorosa, e mais fatal, do que a de    engenharia e entra a priorização do        mente inter-relacionados. E é com a
Gregor Samsa, o protagonista da obra        fator humano no trabalho. Na prática,      gestão dessas relações que aumenta
A Metamorfose, de Franz Kafka.              isso representa um afastamento das         a capacidade da organização de atu-
   Sem dúvida, estamos todos fasci-         habilidades mais duras, mensuráveis        ar em rede e se beneficiar dela. Entra
nados com o potencial das redes —a
velocidade da integração, o acesso às
informações e as novas possibilidades             SINOPSE
de cooperação que elas geraram trou-
xeram possibilidades inimagináveis há
pouco mais de 20 anos. Porém existem              •	 Está em discussão a transformação das organizações
virtudes na hierarquia que não podem                hierárquicas em modelos em rede, assentados sobre o
ser ignoradas, principalmente a capaci-             conhecimento. O objetivo seria aumentar a cooperação para a
dade de coordenar sistemas complexos,               gestão do conhecimento e, consequentemente, para a inovação.
e qualquer outro modelo, para substituí-
-la, precisa realizar melhor essa difícil
                                                  •	 O melhor, no entanto, é buscar um modelo híbrido, que
tarefa [veja quadro na próxima página].             busque o reequilíbrio entre hierarquia e rede em uma nova
   Em outras palavras, para as organi-              governança. Esta deve ser capaz de regular a organização por
zações, a hierarquia ainda é, em larga              indicadores de qualidade da gestão, redistribuindo poder e
medida, insubstituível. Como, diante                autoridade, dando mais voz aos detentores de conhecimento e
disso, construir um novo modelo or-                 com novas formas de disciplina organizacional. Tal combinação
ganizacional eficiente? Uma resposta                só é possível com o desenvolvimento da cultura corporativa.
é certa: não é possível caminhar nes-
sa direção sem repensar a empresa de              •	Isso pede que se construa a hierarquia do conhecimento, em
maneira muito mais profunda.                        detrimento da hierarquia industrial, selecionando alguns
                                                    aspectos tradicionais da hierarquia e excluindo outros, e que se
CONSENSO SOBRE O QUE FAZER                          estimule a cooperação das redes nesse cenário. A hierarquia
O que essa nova organização almejada                do conhecimento neutralizará as características indesejáveis
vem transformar no modelo hierárqui-                da organização em rede, como caos, falta de coordenação e de
co é, sobretudo, a clássica separação               foco, excesso de informação e de participação.
que ele faz entre concepção e execução:
de um lado, comando e controle e, do


                                                                         HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br   27
pensamento
     nacional

     em cena, definitivamente, a gestão dos         culdade fica evidente: será difícil sus-    questão de escolha de indivíduos livres
     ativos intangíveis.                            tentar uma ou mais boas relações onde       e sua gestão pressupõe:
       Porém sem abolir 100% a hierarquia.          não houver um jogo ganha-ganha para
     São grandes os desafios para a forma-          todos os stakeholders, onde for grande      •	 processos bem definidos;
     ção de redes colaborativas que sejam           a distância entre o discurso e a prática,   •	 métricas de excelência das entregas
     verdadeiramente produtivas —a redu-            onde faltar transparência no processo          do core business;
     ção das quase infinitas probabilidades         decisório sobre recursos, onde predo-       •	 investimentos em áreas críticas para
     de interação, a manutenção da memó-            minar a desconfiança. Organizações             as entregas de valor da organização;
     ria do que é gerado, a aplicabilidade          autoritárias terão problemas.               •	 sistemas de consequências éticos e
     das soluções— e nenhum se resolve                Ressalte-se que as culturas latinas,         justos; e
     sem alguma hierarquização.                     a brasileira entre elas, sofrem espe-       •	 esforços de alinhamento da comuni-
                                                    cialmente desse mal. Nesses países,            cação interna e dos sistemas de in-
     DIFICULDADES DE FAZER                          redistribuir poder e autoridade é um           formação, bem como de transparên-
     Na hora de as empresas gerenciarem             desafio maior do que nos mais iguali-          cia nas formas de alocar recursos.
     intangíveis, têm de vencer, logo de            tários. Mas eis uma boa notícia: várias
     cara, uma primeira grande dificulda-           organizações superaram os obstáculos           Sim! E, ao propor um novo modelo
     de: a maneira de pensá-los. Em re-             descritos e já conseguem fazer a gestão     organizacional, estou falando automa-
     cente revisão que realizei, com outros         de ativos intangíveis que constrói esse     ticamente de uma nova cultura, capaz
     pesquisadores, nas principais revistas         novo modelo organizacional, entre a         de conciliar as virtudes da hierarquia
     e jornais acadêmicos mais bem ava-             hierarquia e a rede.                        (organização, planejamento e foco)
     liados do mundo, encontramos uma                                                           com as virtudes da rede (liberdade,
     tendência marcada: a de olhar para             ENTÃO, COMO FAZER?                          flexibilidade e participação) e de com-
     os intangíveis pela mesma lógica de            Nessa moda de parafrasear certo po-         bater as principais fraquezas da hierar-
     raciocínio empregada para pensar os            lítico norte-americano, eu diria: “É a      quia (fragmentação, burocratização e
     tangíveis. Há uma tendência clara a            cultura, estúpido!”. A cultura de uma       desempoderamento das pessoas) e as
     “coisificar” os intangíveis. Coisas têm        organização constitui “o” fator de coor­    principais fraquezas da rede (caos, fal-
     preço e valor em si; um ativo intan-           denação flexível que permite a gestão       ta de coordenação e de foco, excesso de
     gível, não. Seu valor depende de um            integrada dos ativos intangíveis e, as-     informação e de participação).
     conjunto de relações e não é demais            sim, dá unidade e coerência ao todo            E, para isso acontecer, há que repen-
     afirmar que gestão integrada de ativos         e estrutura o processo decisório. Mas       sar a coordenação, o poder e os víncu-
     intangíveis é gestão das relações que          esqueça a definição messiânica de cul-      los dos indivíduos com a organização.
     lhes dão sustentação. Traduzindo: ati-         tura como valores e crenças compar-
     vo intangível não é coisa; é relação. E,       tilhados, que líderes convertidos incu-     Coordenação, poder e vínculos
     sendo relação, a segunda grande difi-          tem nas pessoas. A cultura não é uma        Lembra-se da história inicial deste arti-
                                                                                                go? Do operário em uma fábrica de ali-
                                                                                                mentos que vê uma barata e não sabe o
                                                                                                que faz? Voltemos a ela: se esse funcio-

         exemplos híbridos
                                                                                                nário conhece a estratégia e o posicio-
                                                                                                namento da marca, e se compreende a
                                                                                                importância e os desafios de criar con-
         Hospitais e universidades eram considerados organizações anárquicas, cujo
                                                                                                fiabilidade nos processos produtivos,
         resultado dependia mais da excelência de seus indivíduos (médicos, profes-
                                                                                                ele não hesita: para a máquina, mata a
         sores e pesquisadores) do que da divisão de tarefas e da hierarquia. Hoje,
                                                                                                barata e reporta a contaminação.
         contudo, aumentam sua efetividade pela seleção de linhas de pesquisa que
                                                                                                   Rapidamente, esse funcionário de
         congregam esforços e pela construção de processos, procedimentos e pro-
                                                                                                chão de fábrica consegue calcular o
         tocolos que permitam, pelo aprimoramento contínuo, alcançar resultados
                                                                                                risco para a marca e para a imagem
         cada vez melhores. São exemplos de modelo híbrido.
                                                                                                perante o consumidor de ter uma bara-
           É importante ter consciência de que a administração científica e sua hie-
                                                                                                ta morta em uma lata do produto. Sabe
         rarquia foram capazes, como nenhum outro modelo, de transformar com-
                                                                                                que a confiabilidade dos equipamentos
         plexidade e especialização em desempenho. Tratou-se da inovação que
                                                                                                nunca é perfeita e que é necessário um
         causou a maior diferença na vida do maior número de pessoas em toda a
                                                                                                esforço constante de aprimoramen-
         história, pois o gigantesco aumento da produtividade do trabalho que gerou
                                                                                                to. Entende a relevância de seu papel
         permitiu à humanidade passar da era da escassez para a era da abundância.
                                                                                                nesse cenário e parte para a ação. Após
                                                                                                o relato aos encarregados, ainda faz o


28     HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br
pensamento
     nacional

     acompanhamento do caso e coloca o

                                                         Saiba mais sobre
     problema para toda sua equipe: “Como
     podemos evitar que isso aconteça no
     futuro?”. E, com uma pergunta simples
     e focada como essa, a equipe, por sua               CARMEN MIGUELES
     vez, pode cooperar para a busca de so-
                                                         Carmen Migueles é professora da Fundação Getulio
     lução, criando uma inovação no pro-
                                                         Vargas (FGV) no Rio de Janeiro. Doutora em sociolo-
     cesso produtivo que reduza as chances
                                                         gia das organizações, mestre em antropologia pela
     de esse episódio acontecer no futuro.
                                                         Universidade de Sophia (Tóquio, Japão) e historia-
        Percebe-se aí um tipo de coordena-
                                                         dora pela Pontifícia Universidade Católica gaúcha,
     ção, uma distribuição de poder e vín-
                                                         escreveu três livros, entre os quais Criando o Há-
     culos típicos de uma cultura organiza-
                                                         bito da Excelência (ed. Qualitymark) e Antropologia
     cional fortemente alinhada a esse valor
                                                         do Consumo (ed. FGV), e está finalizando Cultura e
     de entrega para o cliente, que não deixa
                                                         Gestão Integrada de Ativos Intangíveis (título provi-
     o funcionário em dúvida sobre parar a
                                                         sório), com o tema desenvolvido neste artigo, para
     produção —mesmo que isso reduza o
                                                         lançar em 2013. Migueles também é consultora
     volume desta— e resolver o problema.
                                                         de empresas e, por meio da firma de consultoria
     Nessa cultura, seu superior imediato
                                                         Symballein, que fundou e dirige, trabalha com o
     vai avaliá-lo mais positivamente se ele




                                                                                                                  Foto: Divulgação
                                                         diagnóstico de intangíveis. Ela e o sócio Marco Túlio
     interromper tudo, pois terá forte ade-
                                                         Zanini deram uma detalhada entrevista a HSM Ma-
     são à cultura da empresa.
                                                         nagement a esse respeito [edição nº 85, página 30].
        Agora imagine que esse indivíduo
     está em uma organização em que tal
     foco não está claro. Seu supervisor
     imediato é pressionado por metas de
     produção e o gerente de qualidade,             grandes projetos, garantindo maior                contratual de natureza exclusiva-
     por metas de confiabilidade. Ele deve          racionalidade no emprego dos re-                  mente jurídica e econômica (em que
     tomar uma decisão. “Quem está olhan-           cursos e na divisão de tarefas e pa-              as atividades não têm sentido);
     do? O gerente de qualidade ou o super-         péis. Ela reduz tremendamente os             •	   relação trabalhista pensada como re-
     visor? Se for o supervisor, paro e mato        riscos de médio e longo prazos para               lação entre patrão e empregado;
     a barata ou não paro?” O operário pre-         os investidores e para os profissio-         •	   foco no comando e controle (com
     cisa acertar com um conjunto maior de          nais do conhecimento.                             regras, padrões e procedimentos en-
     variáveis em mente: é como se tivesse            É o planejamento dos investimentos,             quadrando o trabalho, quando isso
     de jogar um dado e tirar 5 de qualquer         por sua vez, que permite financiar o              deveria só servir à boa execução);
     maneira; há uma possibilidade em               trabalho dos profissionais do conhe-         •	   foco nas tarefas e não nos atributos
     seis de isso acontecer. Ou suponha que         cimento, cobrir os gastos da curva de             das entregas; e
     a empresa passou por uma fusão e o             aprendizado dentro das equipes de alto       •	   busca por planos de cargos e salá-
     comprador quer aumentar o volume               desempenho e o tempo de maturação                 rios que reduzem desproporcional e
     de vendas e reduzir os preços, e para          das pesquisas e dos esforços de inova-            excessivamente os seres humanos a
     isso quer trabalhar com 100% da capa-          ção. Não poderia ser mais falsa a ideia           métricas genéricas.
     cidade do equipamento. Há tamanha              de que a hierarquia é barreira à gestão
     falta de clareza nas informações e tan-        do conhecimento. Trata-se do contrá-         Estimular a cooperação
     to risco que o funcionário parece ter de       rio. Deve-se, isto sim, eliminar suas        A predisposição dos funcionários para
     tirar 9 jogando dois dados. Sua chance         características inadequadas:                 a cooperação depende da confiança e
     de acertar é reduzida para 1/36.                                                            da qualidade de seu vínculo com a em-
                                                    •	 separação concepção-execução;             presa (que cabe aos gestores estabele-
     O DESAFIO DE FAZER NA PRÁTICA                  •	 prevalência da ética dos acionistas       cer). As tarefas-chave para isso são:
     Como chegar a esse modelo híbrido,                em detrimento da ética dos stakehol-
     que combina rede e hierarquia, repen-             ders (com destaque especial para a        •	 Envolver todos na organização e na
     sando coordenação, poder e vínculos?              assimetria de poder entre os execu-          melhoria dos resultados alinhados às
                                                       tivos que representam os acionistas e        promessas da marca.
     Filtrar a hierarquia                              os profissionais do conhecimento);        •	 Definir tão bem os processos de apri-
     Deve-se usar a hierarquia para                 •	 redução dos vínculos entre indiví­           moramento que todos enxerguem
     planejar os investimentos e criar                 duos e organização a uma relação             claramente como contribuir.


30     HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br
pensamento
     nacional
                                                                                 Alta aceitação

                                                                                                                     Desenho de normas
                                                                                                                     e regras para orientar o
                                                                                                                     comportamento humano
                                                                                                                     promovendo jogos
                                                                                                                     cooperativos (ganha-ganha)

                                                                   A) Conflito             B) Compatibilidade
                                                                   econômico                     positiva


                                           Baixa                                                                              Alta
                                       lucratividade                                                                      lucratividade



                                                               C) Compatibilidade                 D) Conflito
                                                                    negativa                         moral




        Seguindo o quadrante B, trabalhe, por exemplo:                           BAIXa aceitação

        •	 A compreensão do que é valor para o cliente.
        •	 O entendimento de como a organização pode produzir, entregar, aprimorar e renovar sua oferta de valor.
        •	 A decisão de como investir e em que investir para ser capaz de obter o máximo retorno por essas entregas.
        •	 Um desenho organizacional adequado para que a empresa sempre se renove.
        •	 A formulação de políticas de gestão de pessoas que estimulem a cooperação para esse fim.
        •	 O desenho de métricas e acompanhamentos de resultados que alinhem os esforços com os objetivos.




     •	 Direcionar métricas e acompanha-            •	 Encarar as dificuldades (se necessá-         •	 Comunicar-se com as pessoas e
        mentos para favorecer os esforços de           rio, reduzindo as distâncias de poder           apoiá-las a não ceder às justificativas
        quem está voltado para o aprimora-             e partilhando informações).                     e ao fatalismo do “é assim mesmo”.
        mento das entregas.                         •	 Aumentar a capacidade de estabe-             •	 Construir esforços de governança
     •	 Estabelecer real transparência nas             lecer conversas difíceis (por exem-             alinhados com a promoção de ações
        decisões (deve estar claro por que a           plo, cobrar responsabilidade por                ganha-ganha. Antes de cada esforço,
        organização está patrocinando esfor-           resultados e negociar com o supe-               vale consultar a matriz acima.
        ços em uma direção e não em outra).            rior melhores condições de traba-            •	 Apoiar o desenvolvimento de resi­
     •	 Garantir a maior descentralização              lho para um subordinado).                       liência nos indivíduos. Assim, eles
        da decisão sobre as funções que pre-                                                           persistirão na busca de soluções ne-
        cisam ser exercidas, para que haja             O líder não pode evitar questões como:          cessárias e viáveis e convencerão os
        maior foco na utilização dos recursos                                                          outros a se esforçar para isso.
        e no valor a ser gerado —em primeiro        •	 Alguém não sabe o que deve fazer?
        lugar, para o cliente final e, depois,      •	 Faltaram investimento, processo e               Os desafios, muitos, são exequíveis se
        para o conjunto dos stakeholders.              procedimento?                                a questão cultural for privilegiada, com
                                                    •	 Por que não se faz o que deve efetiva-       um equilíbrio entre a hierarquia e as
       Especificamente, o líder deve tomar             mente ser feito?                             redes. O importante é não adiar seu en-
     estas iniciativas de gestão de equipes:        •	 Quais são os espaços de liberdade?           frentamento para que não se encontre
                                                    •	 Por que omissão é “pecado”?                  uma barata enlatada por aí e para que
     •	 Tratar das verdadeiras causas dos           •	 O que é liderança baseada em valo-           a organização não se torne uma barata,
        problemas (especialmente os de cul-            res nesse sentido?                           como Gregor Samsa. A metamorfose
        tura nacional e organizacional, por         •	 Qual é o papel de cada um de nós?            pode e deve acontecer —para melhor.
        onde a racionalidade e a capacidade
        de coordenação se perdem de ma-                Por fim, a organização tem de criar
        neira mais perversa).                       sistemas de apoio e incentivo para:               HSM Management



32     HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br

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Metamorfose organizacional

  • 1. pensamento nacional AcadÊMICO A metamorfose organizacional (e a fÁBULA da barata na lata) Segundo Carmen Migueles, professora da Fundação getulio vargas e consultora da symballein, AFASTAR-SE DA HIERARQUIA NÃO SIGNIFICA ABRAÇAR A ORGANIZAÇÃO EM REDE. A transformação ideal é em direção a um modelo híbrido, tema de seu novo livro, que ela antecipa Fotos: iStock aqui com exclusividade 26 HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br
  • 2. Imagine que um operário de uma outro, o cumprimento de tarefas frag- por critérios ligados à produtividade fí- fábrica de alimentos cujo nome seja mentadas. Ambas precisam se misturar sica do ser humano no trabalho, e uma sinônimo de confiabilidade enxerga para que haja ganhos de flexibilidade e aproximação das habilidades ligadas uma barata no meio de sua linha de inteligência de que a nova organização aos ativos intangíveis. Focar essas ha- produção. Ele precisa tomar uma necessita. Isso em si nem é novidade —os bilidades muda muita coisa: decisão: interrompe o trabalho e adeptos dos modelos gerenciais japone- ma­a a barata ou mantém o ritmo t ses da década de 1980 e da reen­ enharia g • A qualidade dos vínculos de cada in- e ignora o inseto? dos anos 1990 já haviam chegado à con- divíduo com a empresa, com o supe- Guarde esse suspense na memória; clusão de que o aumento da autonomia rior e com a equipe é o que passa a vou desenvolvê-lo em breve. Antes, do executante é fundamental. fazer a grande diferença. preciso falar da imensa pressão que as O desafio agora é como fazer isso. • A reputação da organização e o va- empresas vêm sofrendo para eliminar Estou convencida de que a solução está lor percebido pelo cliente tornam- suas estruturas hierárquicas e substi- na capacidade de agir sobre passivos -se os responsáveis pela maior par- tuí-las por um modelo organizacional intangíveis que todas as culturas na- te das margens. em rede, em nome da maior capacida- cionais ou étnicas colocam e, a partir • A sustentabilidade passa a depender de de inovação, de adaptação e de mais daí, criar maneiras de ver e pensar o da gestão de um conjunto de relacio- um sem-número de motivos. Nesse trabalho por meio das culturas organi- namentos que boa parte dos gestores cenário, a pergunta que vale 1 milhão zacionais, buscando construir sistemas aprendeu a ignorar. é: que configuração é realmente a ideal de coordenação informais e flexíveis para uma empresa? capazes de organizar a cooperação. Nesse novo modelo, valor percebi- Sem que essa questão seja formula- Essa virada representa uma impor- do, reputação, valor da marca, cultura da e receba uma resposta adequada, tante mudança do foco de uma empre- organizacional, gestão do capital inte- a metamorfose corporativa pode ser sa: sai a concentração na técnica e na lectual e inovação são fatores estreita- mais dolorosa, e mais fatal, do que a de engenharia e entra a priorização do mente inter-relacionados. E é com a Gregor Samsa, o protagonista da obra fator humano no trabalho. Na prática, gestão dessas relações que aumenta A Metamorfose, de Franz Kafka. isso representa um afastamento das a capacidade da organização de atu- Sem dúvida, estamos todos fasci- habilidades mais duras, mensuráveis ar em rede e se beneficiar dela. Entra nados com o potencial das redes —a velocidade da integração, o acesso às informações e as novas possibilidades SINOPSE de cooperação que elas geraram trou- xeram possibilidades inimagináveis há pouco mais de 20 anos. Porém existem • Está em discussão a transformação das organizações virtudes na hierarquia que não podem hierárquicas em modelos em rede, assentados sobre o ser ignoradas, principalmente a capaci- conhecimento. O objetivo seria aumentar a cooperação para a dade de coordenar sistemas complexos, gestão do conhecimento e, consequentemente, para a inovação. e qualquer outro modelo, para substituí- -la, precisa realizar melhor essa difícil • O melhor, no entanto, é buscar um modelo híbrido, que tarefa [veja quadro na próxima página]. busque o reequilíbrio entre hierarquia e rede em uma nova Em outras palavras, para as organi- governança. Esta deve ser capaz de regular a organização por zações, a hierarquia ainda é, em larga indicadores de qualidade da gestão, redistribuindo poder e medida, insubstituível. Como, diante autoridade, dando mais voz aos detentores de conhecimento e disso, construir um novo modelo or- com novas formas de disciplina organizacional. Tal combinação ganizacional eficiente? Uma resposta só é possível com o desenvolvimento da cultura corporativa. é certa: não é possível caminhar nes- sa direção sem repensar a empresa de • Isso pede que se construa a hierarquia do conhecimento, em maneira muito mais profunda. detrimento da hierarquia industrial, selecionando alguns aspectos tradicionais da hierarquia e excluindo outros, e que se CONSENSO SOBRE O QUE FAZER estimule a cooperação das redes nesse cenário. A hierarquia O que essa nova organização almejada do conhecimento neutralizará as características indesejáveis vem transformar no modelo hierárqui- da organização em rede, como caos, falta de coordenação e de co é, sobretudo, a clássica separação foco, excesso de informação e de participação. que ele faz entre concepção e execução: de um lado, comando e controle e, do HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br 27
  • 3. pensamento nacional em cena, definitivamente, a gestão dos culdade fica evidente: será difícil sus- questão de escolha de indivíduos livres ativos intangíveis. tentar uma ou mais boas relações onde e sua gestão pressupõe: Porém sem abolir 100% a hierarquia. não houver um jogo ganha-ganha para São grandes os desafios para a forma- todos os stakeholders, onde for grande • processos bem definidos; ção de redes colaborativas que sejam a distância entre o discurso e a prática, • métricas de excelência das entregas verdadeiramente produtivas —a redu- onde faltar transparência no processo do core business; ção das quase infinitas probabilidades decisório sobre recursos, onde predo- • investimentos em áreas críticas para de interação, a manutenção da memó- minar a desconfiança. Organizações as entregas de valor da organização; ria do que é gerado, a aplicabilidade autoritárias terão problemas. • sistemas de consequências éticos e das soluções— e nenhum se resolve Ressalte-se que as culturas latinas, justos; e sem alguma hierarquização. a brasileira entre elas, sofrem espe- • esforços de alinhamento da comuni- cialmente desse mal. Nesses países, cação interna e dos sistemas de in- DIFICULDADES DE FAZER redistribuir poder e autoridade é um formação, bem como de transparên- Na hora de as empresas gerenciarem desafio maior do que nos mais iguali- cia nas formas de alocar recursos. intangíveis, têm de vencer, logo de tários. Mas eis uma boa notícia: várias cara, uma primeira grande dificulda- organizações superaram os obstáculos Sim! E, ao propor um novo modelo de: a maneira de pensá-los. Em re- descritos e já conseguem fazer a gestão organizacional, estou falando automa- cente revisão que realizei, com outros de ativos intangíveis que constrói esse ticamente de uma nova cultura, capaz pesquisadores, nas principais revistas novo modelo organizacional, entre a de conciliar as virtudes da hierarquia e jornais acadêmicos mais bem ava- hierarquia e a rede. (organização, planejamento e foco) liados do mundo, encontramos uma com as virtudes da rede (liberdade, tendência marcada: a de olhar para ENTÃO, COMO FAZER? flexibilidade e participação) e de com- os intangíveis pela mesma lógica de Nessa moda de parafrasear certo po- bater as principais fraquezas da hierar- raciocínio empregada para pensar os lítico norte-americano, eu diria: “É a quia (fragmentação, burocratização e tangíveis. Há uma tendência clara a cultura, estúpido!”. A cultura de uma desempoderamento das pessoas) e as “coisificar” os intangíveis. Coisas têm organização constitui “o” fator de coor­ principais fraquezas da rede (caos, fal- preço e valor em si; um ativo intan- denação flexível que permite a gestão ta de coordenação e de foco, excesso de gível, não. Seu valor depende de um integrada dos ativos intangíveis e, as- informação e de participação). conjunto de relações e não é demais sim, dá unidade e coerência ao todo E, para isso acontecer, há que repen- afirmar que gestão integrada de ativos e estrutura o processo decisório. Mas sar a coordenação, o poder e os víncu- intangíveis é gestão das relações que esqueça a definição messiânica de cul- los dos indivíduos com a organização. lhes dão sustentação. Traduzindo: ati- tura como valores e crenças compar- vo intangível não é coisa; é relação. E, tilhados, que líderes convertidos incu- Coordenação, poder e vínculos sendo relação, a segunda grande difi- tem nas pessoas. A cultura não é uma Lembra-se da história inicial deste arti- go? Do operário em uma fábrica de ali- mentos que vê uma barata e não sabe o que faz? Voltemos a ela: se esse funcio- exemplos híbridos nário conhece a estratégia e o posicio- namento da marca, e se compreende a importância e os desafios de criar con- Hospitais e universidades eram considerados organizações anárquicas, cujo fiabilidade nos processos produtivos, resultado dependia mais da excelência de seus indivíduos (médicos, profes- ele não hesita: para a máquina, mata a sores e pesquisadores) do que da divisão de tarefas e da hierarquia. Hoje, barata e reporta a contaminação. contudo, aumentam sua efetividade pela seleção de linhas de pesquisa que Rapidamente, esse funcionário de congregam esforços e pela construção de processos, procedimentos e pro- chão de fábrica consegue calcular o tocolos que permitam, pelo aprimoramento contínuo, alcançar resultados risco para a marca e para a imagem cada vez melhores. São exemplos de modelo híbrido. perante o consumidor de ter uma bara- É importante ter consciência de que a administração científica e sua hie- ta morta em uma lata do produto. Sabe rarquia foram capazes, como nenhum outro modelo, de transformar com- que a confiabilidade dos equipamentos plexidade e especialização em desempenho. Tratou-se da inovação que nunca é perfeita e que é necessário um causou a maior diferença na vida do maior número de pessoas em toda a esforço constante de aprimoramen- história, pois o gigantesco aumento da produtividade do trabalho que gerou to. Entende a relevância de seu papel permitiu à humanidade passar da era da escassez para a era da abundância. nesse cenário e parte para a ação. Após o relato aos encarregados, ainda faz o 28 HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br
  • 4. pensamento nacional acompanhamento do caso e coloca o Saiba mais sobre problema para toda sua equipe: “Como podemos evitar que isso aconteça no futuro?”. E, com uma pergunta simples e focada como essa, a equipe, por sua CARMEN MIGUELES vez, pode cooperar para a busca de so- Carmen Migueles é professora da Fundação Getulio lução, criando uma inovação no pro- Vargas (FGV) no Rio de Janeiro. Doutora em sociolo- cesso produtivo que reduza as chances gia das organizações, mestre em antropologia pela de esse episódio acontecer no futuro. Universidade de Sophia (Tóquio, Japão) e historia- Percebe-se aí um tipo de coordena- dora pela Pontifícia Universidade Católica gaúcha, ção, uma distribuição de poder e vín- escreveu três livros, entre os quais Criando o Há- culos típicos de uma cultura organiza- bito da Excelência (ed. Qualitymark) e Antropologia cional fortemente alinhada a esse valor do Consumo (ed. FGV), e está finalizando Cultura e de entrega para o cliente, que não deixa Gestão Integrada de Ativos Intangíveis (título provi- o funcionário em dúvida sobre parar a sório), com o tema desenvolvido neste artigo, para produção —mesmo que isso reduza o lançar em 2013. Migueles também é consultora volume desta— e resolver o problema. de empresas e, por meio da firma de consultoria Nessa cultura, seu superior imediato Symballein, que fundou e dirige, trabalha com o vai avaliá-lo mais positivamente se ele Foto: Divulgação diagnóstico de intangíveis. Ela e o sócio Marco Túlio interromper tudo, pois terá forte ade- Zanini deram uma detalhada entrevista a HSM Ma- são à cultura da empresa. nagement a esse respeito [edição nº 85, página 30]. Agora imagine que esse indivíduo está em uma organização em que tal foco não está claro. Seu supervisor imediato é pressionado por metas de produção e o gerente de qualidade, grandes projetos, garantindo maior contratual de natureza exclusiva- por metas de confiabilidade. Ele deve racionalidade no emprego dos re- mente jurídica e econômica (em que tomar uma decisão. “Quem está olhan- cursos e na divisão de tarefas e pa- as atividades não têm sentido); do? O gerente de qualidade ou o super- péis. Ela reduz tremendamente os • relação trabalhista pensada como re- visor? Se for o supervisor, paro e mato riscos de médio e longo prazos para lação entre patrão e empregado; a barata ou não paro?” O operário pre- os investidores e para os profissio- • foco no comando e controle (com cisa acertar com um conjunto maior de nais do conhecimento. regras, padrões e procedimentos en- variáveis em mente: é como se tivesse É o planejamento dos investimentos, quadrando o trabalho, quando isso de jogar um dado e tirar 5 de qualquer por sua vez, que permite financiar o deveria só servir à boa execução); maneira; há uma possibilidade em trabalho dos profissionais do conhe- • foco nas tarefas e não nos atributos seis de isso acontecer. Ou suponha que cimento, cobrir os gastos da curva de das entregas; e a empresa passou por uma fusão e o aprendizado dentro das equipes de alto • busca por planos de cargos e salá- comprador quer aumentar o volume desempenho e o tempo de maturação rios que reduzem desproporcional e de vendas e reduzir os preços, e para das pesquisas e dos esforços de inova- excessivamente os seres humanos a isso quer trabalhar com 100% da capa- ção. Não poderia ser mais falsa a ideia métricas genéricas. cidade do equipamento. Há tamanha de que a hierarquia é barreira à gestão falta de clareza nas informações e tan- do conhecimento. Trata-se do contrá- Estimular a cooperação to risco que o funcionário parece ter de rio. Deve-se, isto sim, eliminar suas A predisposição dos funcionários para tirar 9 jogando dois dados. Sua chance características inadequadas: a cooperação depende da confiança e de acertar é reduzida para 1/36. da qualidade de seu vínculo com a em- • separação concepção-execução; presa (que cabe aos gestores estabele- O DESAFIO DE FAZER NA PRÁTICA • prevalência da ética dos acionistas cer). As tarefas-chave para isso são: Como chegar a esse modelo híbrido, em detrimento da ética dos stakehol- que combina rede e hierarquia, repen- ders (com destaque especial para a • Envolver todos na organização e na sando coordenação, poder e vínculos? assimetria de poder entre os execu- melhoria dos resultados alinhados às tivos que representam os acionistas e promessas da marca. Filtrar a hierarquia os profissionais do conhecimento); • Definir tão bem os processos de apri- Deve-se usar a hierarquia para • redução dos vínculos entre indiví­ moramento que todos enxerguem planejar os investimentos e criar duos e organização a uma relação claramente como contribuir. 30 HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br
  • 5. pensamento nacional Alta aceitação Desenho de normas e regras para orientar o comportamento humano promovendo jogos cooperativos (ganha-ganha) A) Conflito B) Compatibilidade econômico positiva Baixa Alta lucratividade lucratividade C) Compatibilidade D) Conflito negativa moral Seguindo o quadrante B, trabalhe, por exemplo: BAIXa aceitação • A compreensão do que é valor para o cliente. • O entendimento de como a organização pode produzir, entregar, aprimorar e renovar sua oferta de valor. • A decisão de como investir e em que investir para ser capaz de obter o máximo retorno por essas entregas. • Um desenho organizacional adequado para que a empresa sempre se renove. • A formulação de políticas de gestão de pessoas que estimulem a cooperação para esse fim. • O desenho de métricas e acompanhamentos de resultados que alinhem os esforços com os objetivos. • Direcionar métricas e acompanha- • Encarar as dificuldades (se necessá- • Comunicar-se com as pessoas e mentos para favorecer os esforços de rio, reduzindo as distâncias de poder apoiá-las a não ceder às justificativas quem está voltado para o aprimora- e partilhando informações). e ao fatalismo do “é assim mesmo”. mento das entregas. • Aumentar a capacidade de estabe- • Construir esforços de governança • Estabelecer real transparência nas lecer conversas difíceis (por exem- alinhados com a promoção de ações decisões (deve estar claro por que a plo, cobrar responsabilidade por ganha-ganha. Antes de cada esforço, organização está patrocinando esfor- resultados e negociar com o supe- vale consultar a matriz acima. ços em uma direção e não em outra). rior melhores condições de traba- • Apoiar o desenvolvimento de resi­ • Garantir a maior descentralização lho para um subordinado). liência nos indivíduos. Assim, eles da decisão sobre as funções que pre- persistirão na busca de soluções ne- cisam ser exercidas, para que haja O líder não pode evitar questões como: cessárias e viáveis e convencerão os maior foco na utilização dos recursos outros a se esforçar para isso. e no valor a ser gerado —em primeiro • Alguém não sabe o que deve fazer? lugar, para o cliente final e, depois, • Faltaram investimento, processo e Os desafios, muitos, são exequíveis se para o conjunto dos stakeholders. procedimento? a questão cultural for privilegiada, com • Por que não se faz o que deve efetiva- um equilíbrio entre a hierarquia e as Especificamente, o líder deve tomar mente ser feito? redes. O importante é não adiar seu en- estas iniciativas de gestão de equipes: • Quais são os espaços de liberdade? frentamento para que não se encontre • Por que omissão é “pecado”? uma barata enlatada por aí e para que • Tratar das verdadeiras causas dos • O que é liderança baseada em valo- a organização não se torne uma barata, problemas (especialmente os de cul- res nesse sentido? como Gregor Samsa. A metamorfose tura nacional e organizacional, por • Qual é o papel de cada um de nós? pode e deve acontecer —para melhor. onde a racionalidade e a capacidade de coordenação se perdem de ma- Por fim, a organização tem de criar neira mais perversa). sistemas de apoio e incentivo para: HSM Management 32 HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br