Engenheiro Agrário, antigo director-geral da ADRA e coordenador do Observatório Político e Social de Angola (OPSA).
Trouxe ao espaço do debate uma reflexão a volta dos resultados do estudo sobre o crédito agrícola em Angola, realizado través da Acção para o Desenvolvimento Rural e Ambiente (ADRA, no âmbito da Estratégia Nacional de Segurança Alimentar, homologado e promulgado em 2009 pelo governo de Angola.
Nas recomendações finais enfatizou que não estamos muito mal, nem muito bem em termos de concepção de crédito, mas no entanto a política agrícola deve ser melhorada, desde a formação de quadros e a criação de mecanismos eficazes e eficientes para a aplicação da mesma e para o fortalecimento do sector
1. Projecto de Apoio à
Implementação da ENSAN
Estudo sobre o Crédito Agrícola de Campanha
Luanda, 18/2/15
2. Índice
1. Enquadramento do Estudo
2. Constatações
3. Reflexões sobre as Constatações
4. Conclusões
5. Recomendações
3. Enquadramento do estudo
Projecto visa promover a Implementação
da ENSAN
Focaliza na Linha Especial de Crédito
Agrícola de Campanha cujo valor foi de
US$ 150 milhões
Mecanismo simplificado e relativamente
acessível com uma taxa de juro de 5%
Abordagem participativa e daí o
estabelecimento de Comités Locais de
Pilotagem
4. Enquadramento do estudo
Projecto é apoiado pela APN e AECID com
implementação da ADRA
Estudo desenvolvido em Benguela,
Huambo Huíla e Malanje
Foi previsto apresentar as conclusões e
recomendações do estudo num Workshop
Estudo deve ser uma contribuição para o
debate nacional sobre crédito agrícola
Únicas acções levadas a cabo desde 2013
foram regularizações e confirmação de
garantias de risco dadas aos bancos
5. Enquadramento do estudo
O objectivo do Estudo foi analisar o
impacto, a eficiência e a eficácia da Linha
de Crédito e retirar lições e recomendações
Mais especificamente o Estudo deveria
verificar se a Linha de Crédito:
− Tem uma estratégia que responde às
necessidades e contexto;
− É de fácil acesso para os agricultores
familiares e teve requisitos apropriados;
− Dispõe de recursos adequados
− Alcançou os seus objectivos iniciais;
− Provocou mudanças nas populações.
6. Enquadramento do estudo
Foi usada a seguinte metodologia:
− Leitura de documentação;
− Entrevistas semi estruturadas a informantes
chave;
− Constituição e treinamento de 4 equipas de 2
técnicos (uma por província) para recolha de
dados;
− Elaboração e aplicação de um questionário a 313
agricultores
− Realização de grupos focais com os respondentes
ao questionário
Limitações: Longa duração do estudo;
primeira recolha de informação sem qualidade;
informação disponibilizada foi escassa; grupo
receou que entrevistadores fossem cobradores;
Bancos sem autorização para fornecer dados
7. Constatações
Questionário
− Aplicado nos municípios de Baía Farta,
Ganda, Bailundo, Caala, Cacula,
Caluquembe, Kalandula e Cangandala;
− Entrevistados 313 agricultores:164 homens
e 149 mulheres.
8. Constatações
2% tinha menos de 20 anos, 17,3% entre
21 e 30 anos, 41,7% entre 31 e 40 anos e
39% mais de 40 anos
A maioria dos entrevistados (46,3%)
situava-se a mais de 15Km da sede do
município, 16% entre 10 e 15, 20,9%
entre 5 e 10 e 16,7% a menos de 5
9. Constatações
A maioria (29,2%) tomou conhecimento
do CAC através da
Associação/Cooperativa, 15,9% da EDA,
8,4% do soba,7,1% de amigos, 5,8%
Unaca e 4,9% da ADRA
10. Constatações
Dos respondentes 191 (62,4%) tinha
solicitado crédito e 115 (37,6%) não tinha
Dos 191 que solicitaram 140 tiveram o
crédito aprovado, 12 foram rejeitados e
30 não responderam
11. Constatações
Dos 140 agricultores que receberam crédito,
119 (85%) responderam sobre o montante
recebido e destes 53 (45%) não sabiam quanto
receberam.
Dos outros, 14,3% menos de 50.000 Kz,
11,8% entre 50.000 e 100.000 Kz, 8,4% entre
100.000 e 230.000 Kz e 21,8% entre 230.000
e 500.000 Kz.
Sobre o uso do crédito, 104 compraram
fertilizantes, 91 sementes, 63 ferramentas, 34
tracção animal, 18 motorizadas, 5 sistemas de
irrigação e 4 usaram na mecanização.
Quanto ao reembolso dos 93 que responderam
72% disse que não tinha reembolsado e 28%
que o tinha feito.
12. Constatações
Dos 99 agricultores que não solicitaram crédito,
42 informaram que não tinham ouvido falar do
CAC, 30 não tinham BI e 18 tinham medo do
crédito 9 várias outras razões
13. Constatações
Benguela
Responderam 42 homens (53%) e 38 mulheres
(47%)
Área de cultivo: 36% têm menos de 2 ha, 48%
entre 2 e 5, 13% entre 5 e 10 e 3% mais de 10
Energia utilizada na terra: 57 responderam
nenhuma, 14 tracção animal e 4 tractor
14. Constatações
Huambo
− Responderam 39 homens (56%) e 31 mulheres
(44%)
− Perguntados se tinham a terra legalizada, 45
responderam que não e 22 que sim
− Quanto à área de cultivo, 69% têm entre 2 e 5
ha e 31% mais de 10 ha.
15. Constatações
Huíla
− Responderam 40 homens (49%) e 42 mulheres
(51%)
− A esmagadora maioria (92%) dos agricultores
não têm a terra legalizada.
− Na área de cultivo, 39% tem menos de 2 ha,
48% tem entre 2 e 5 ha.
16. Constatações
Malanje
− Responderam 43 homens (53%) e 38 mulheres
(47%)
− 43 agricultores tem de 2ha, 21 tem entre 2 e 5,
8 entre 5 e 10 e 1 mais de 10ha.
− A quase totalidade dos agricultores (96%)
apenas utiliza energia humana na terra
17. Outras Constatações
Huíla
− Foram beneficiados 2.028 camponeses de
382.000 existentes (0,5%) – IDA
− Órgãos de implementação do crédito são
de nível local, não havendo estrutura
provincial, o que prejudicou a coordenação
− Membros dos comités sem preparação
técnica em financiamentos e isso prejudica
o diálogo com os Bancos - IDA
− Os Bancos e os fornecedores não estavam
preparados para esta actividade – IDA
− Preços praticados eram muito elevados e
não deveria haver comerciantes
credenciados, mas sim escolhidos pelos
camponeses - Unaca
18. Outras Constatações
Huambo
− Foi elogiada a qualidade dos fornecedores –
BPC
− Bancos deveriam ter tido um papel mais
activo na definição dos créditos - BPC
− A taxa de reembolso foi somente de 20% -
BPC
− Satisfação com o programa, excepto na
questão da margem de lucro dos adubos
(10%) – Fornecedores
− Insatisfação com as demoras no
desalfandegamento das mercadorias -
Fornecedores
19. Outras Constatações
Malanje
− A campanha 2010-2011 beneficiou 6.727
agricultores e a de 2011-2012 5.564
− O crédito atribuído permitiu acesso a
imputes agrícolas diversos e teve um forte
impacto na motivação dos camponeses
− Campanha teve organização deficiente na
concertação entre as partes envolvidas e o
processo foi lento – D.P. Agricultura e IDA
− Reclama-se o curto período de tempo para
pagamento do crédito (10 meses)
− Lamenta-se que a aprovação do crédito
seja feita a nível central e que o prazo de
reembolso começa na aprovação do mesmo
20. Outras Constatações
Benguela
− Alguns funcionários bancários provocaram
um clima de medo nos beneficiários –
Autoridades Tradicionais
− Criticas aos fornecedores em geral e ao
facto de haver muitos processos pendentes
nos Bancos – Unaca
− Os Comités de Pilotagem devem explicar
aos interessados o que se passou com a
linha de crédito - Unaca
21. Outras Constatações
Volume de crédito desembolsado em 2012–
IDA
Linha de crédito inactiva desde o último
trimestre de 2012 devido ao fraco
cumprimento das cláusulas contratuais –
Ministério da Economia
Banco Operador
Capital desembolsado
(AKZ)
Banco Sol 1.532.642.858,32
BCI 1.498.749.441,05
BMF 138.926.217,00
BPC 5.816.435.849,00
TOTAL 8.986.754.365,37
22. Outras Constatações
Resumo dos desembolsos e reembolsos em
2013 – Ministério da Economia
Nível de reembolso insignificante (2,2%)
Final da campanha agrícola 2011/2012 o nº
de beneficiários do crédito era aproxim.
100.000 – IDA e Ministério Economia
Banco
Operador
Ano Agrícola
Capital Desembolsado
(AKZ)
Capital Reembolsado
(AKZ)
Banco Sol 2010/2011/2012 1.227.098.250,03 37.604.308,00
BPC 2010/2011/2012 11.742.544.828,37 210.696.201,22
BCI 2010/2011/2012 1.181.008.568,50 55.270.986,00
BAI/MF 2010/2011/2012 105.656.106,00 15.732.063,00
TOTAL 2010/2011/2012 14.256.307.752,80 319.303.558,22
23. Reflexões sobre as Constatações
A guerra e as politicas seguidas nessa altura não
permitiram o desenvolvimento agrícola
O crédito agricola era uma prática usual em Angola
As politicas dão pouca atenção à agricultura familiar
Apesar das intenções de diversificar a economia e
reduzir dependência do petróleo, a fraqueza do
sector privado e debilidade institucional, não o
permite
Crédito agrícola deve ser analisado neste contexto
difícil
A grande inexperiência dos actores não podia
permitir um bom desenho programático
24. Reflexões sobre as Constatações
Conhecimento de outras experiências era quase
nulo
O regulamento previa aquisição de
equipamentos que não podem ser amortizados
só numa campanha
O período de reembolso de 10 meses era
extremamente curto
A taxa de juro era considerada demasiado
elevada
O valor máximo de $5.000 é considerado
demasiado baixo
O desenho de crédito de campanha não previu
os riscos e contingências de uma actividade
como a agricultura
25. Reflexões sobre as Constatações
Desembolsos
− Beneficiários só recebiam bens dos fornecedores
− Não foi previsto apoio aos agricultores para
elaboração de propostas
− Impossibilidade de acesso a fundo de maneio
− Beneficiários não escolheram os fornecedores
− Bens fornecidos nem sempre correspondiam ao
previsto, nem às necessidades
− Os fornecedores não estavam preparados para
assumir o papel que lhes estava atribuído
− Os preços praticados foram injustos e superiores
aos praticados nos mercados locais
− A oportunidade dos desembolsos foi inadequada
ao ano agrícola e ao ciclo das culturas, que revela
desconhecimento do carácter sazonal ou ciclo da
actividade agrícola
26. Reflexões sobre as Constatações
Eficácia
− “O crédito não está 100% mal, mas também não
está 100% bem”
− Agricultores beneficiados reconhecem que muitas
necessidades foram ou podem ser resolvidas
− Dadas as deficiências do desenho do programa e
desvio às regras, o sistema não podia ser eficaz
− Falta de informação e divulgação; falta de
participação dos beneficiários, falta de uma
entidade reconhecida e respeitada pelos
agricultores foram alguns dos condicionalismo do
sistema
− Grande maioria dos agricultores não possui B.I.
− Exagerado desequilíbrio de género
− Bancos não têm pessoal qualificado e com
sensibilidade para entender agricultura familiar
27. Reflexões sobre as Constatações
Eficiência
− Crédito concedido foi de 170 milhões dólares
− O valor médio por beneficiário foi 1.700 dólares
− Calcula-se que só foram beneficiados com crédito
5 % dos agricultores familiares
− Huambo – concedidos AKZ 1.339 milhões a 8.437
famílias e foram reembolsados 109 mil (8%)
− Malanje – concedidos 152 milhões a 5.564
agricultores
− Huíla – crédito concedido a 2.028 camponeses,
num universo de 382.000 (0,5%)
− Os beneficiários não terem utilizado o volume
máximo de crédito permitido, demonstra a
prudência dos bancos
− O BPC é o maior credor com mais de 82% de
valores de crédito mutuado % dos agricultores
28. Reflexões sobre as Constatações
Coordenação
− O Conselho Nacional de Segurança Alimentar
nunca funcionou como mecanismo de
coordenação, articulação e monitoria da ENSAN
− Os Comités de Pilotagem foram uma boa ideia
mas os seus membros não estavam preparados
− Administradores com dificuldades de entender a
importância da agricultura na economia local
− O paternalismo de algumas acções
governamentais prejudica compreensão do crédito
− Outros actores sociais como as igrejas não
entendem a importância da sua participação por
não terem benefícios directos dela
− Os Comités devem ser revistos e dotados de
condições para o seu funcionamento
− Coordenação só a nível municipal e central
29. Reflexões sobre as Constatações
Cobertura
− O Crédito foi concedido em 95 municípios de
todas as províncias
− Localização das agências bancárias e inexistência
de fornecedores em muitos municípios é limitação
para crédito chegar aos agricultores isolados
Sustentabilidade
− A longa paralisação da linha de crédito é a prova
da sua falta de sustentabilidade
− O não ajustamento do desenho do programa e
dos desvios detectados não ajudou a criar
sustentabilidade
− A falta de financiamento da agricultura por parte
do OGE é outro factor contra a sustentabilidade
− A sustentabilidade passa pela modernização e
esta deve ter prespectiva de longo prazo
30. Conclusões
O CAC é pertinente e valorizado por todos os
entrevistados porque responde a uma necessidade
sentida e é solução para a alavancagem da
agricultura familiar
Os impactos positivos poderiam ser maiores se os
processos tivessem sido melhor organizados e
coordenados
Também a estiagem e a não previsão de imprevistos
impediu um maior impacto
As falhas foram muitas vezes ditadas pela
inexperiência geral de todos os actores (o
condicionalismo do novo). Isto não retira
responsabilidade a alguns actores
31. Conclusões
O desejo de os beneficiários terem acesso a
dinheiro é justificados por uma situação que o
PRAPEN pode colmatar
A deficiente rede empresarial de prestação de
serviços condicionou a execução do programa e o
crédito não foi aproveitado para reforçar essa rede
A deficiente rede de assistência técnica estatal e
privada foi outra condicionante à execução do
programa
Mentalidade ainda existente de que “o que é do
Estado não é para pagar” pode outra
condicionante ao sucesso
A suspensão em 2012 da linha de crédito tem sido
muito perniciosa para o programa
32. Recomendações
CAC deve continuar mas serem corrigidos aspectos do
desenho, melhorada a sua organização e reforçados
os aspectos financeiros a todos os níveis
Devem ser revistos os prazos de pagamento (diferido
pelo período de 1 ano) e o período de reembolso
(serviço da divida que permita ao agricultor crescer)
Estabelecer as taxas de juro de cerca de 1%
(baseadas na Taxa Libor)
O novo desenho deve prever riscos e contingências
derivadas do clima, pragas ou doenças
A acção do CAC deve incidir onde o IDA e outras
instituições de assistência técnica tenham condições
de ajudar na elaboração das propostas e fazer o
acompanhamento
33. Recomendações
Deve ser negociado com os Bancos medidas para que
melhorem a sua capacidade e eliminem os pontos
fracos identificados
Torna-se necessário melhorar a qualidade e aumentar
o número de fornecedores, o que pode derivar da
ampliação da actividade creditícia e aumento das
áreas cultivadas
CAC deve ser alavanca para a reanimação do comércio
rural e da economia local
Os Administradores devem ser mais responsabilizados
pelo CAC e fomento agrícola em geral. Os Comités de
Pilotagem devem ser reforçados e capacitados
Devem existir mecanismos de coordenação a nível
provincial
34. Recomendações
Deve ser melhorada a forma de divulgar a informação
sobre o acesso e condições para o CAC. EDAs deve ser
principal canal de informação
Devem ser tomadas medidas que melhorem os níveis
de participação dos beneficiários nas várias fases,
incluindo propostas e negociação com os bancos
O CAC deve ser articulado e complementado com o
PROAPEN e o PREI, para outras necessidades e tirar
partido do processo de legalização e formações
As autoridades, a todos os níveis, devem insistir no
discurso de que quem beneficia de crédito tem de
pagar para não prejudicar os outros e o País
Se o crédito é de campanha, deve ser
operacionalizado antes da mesma e integrado com
outros projectos de desenvolvimento local