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CADERNO DE PAUTA
N A T A L / R N , 0 9 d e M a i o d e 2 0 1 6 . A N O 1 - E D I Ç Ã O 0 0 5
Caderno de Pauta cadernodepauta www. cadernodepauta.blogspot.com.br
Grupo Permantente de Estudo da Entrevista / Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Por Clércio Rodrigues e Thayane Guimarães
Imagem http://lanyy.jusbrasil.com.br/artigos/212899233/
LINCHAMENTOS
A JUSTIÇA DOS INCONFORMADOS
	 Há mais ou menos um
mês na capital potiguar, um ocor-
rido chamou a atenção da popu-
lação. Para alguns, um ato super-
democrático de justiça que mostra
a revolta de um povo cansado da
violência anabolizada. Para outros,
uma amostra desumana da cruel-
dade que atropela os direitos hu-
manos e tenta “conseguir a paz de
forma violenta”, como diria Mano
Brown. O linchamento de dois jov-
ens suspeitos de praticar crimes
nas imediações do maior Shopping
Center de Natal aconteceu na noite
do dia 11 de abril e desde então, ba-
seou ilustres debates que dividem
opiniões a respeito do papel e con-
ceito de cidadania.
	 Os adolescentes que foram
linchados, tiveram as roupas reti-
radas, foram obrigados a correr
seis quilômetros e a pular da ponte
de Igapó, na Zona Norte de Natal,
agora fazem parte de uma estatísti-
ca que assusta. O Núcleo de Estu-
dos da Violência da Universidade
de São Paulo (USP), estudou casos
de linchamento ocorridos entre
1980 e 2006, e comprovou que o
Brasil é o país que mais lincha no
mundo. Normalmente, a justifica-
tiva para esses atos é baseada na
descrença da população nas insti-
tuições do governo que creditam os
poderes da justiça e do direito pe-
nal. “Esse tipo de atitude é errada,
porém compreensível. As pessoas
se sentem desamparadas, e já que
a polícia não nos protege, a popu-
lação se sente no direito de fazer
justiça com as próprias mãos” afir-
mou Jacques Noronha, estudante
de jornalismo na UFRN.
	 Os direitos humanos gan-
haram muita notoriedade nas úl-
timas décadas, e com isso, uma
importância legislativa crescente.
Porém em muitos casos, o recon-
hecimento normativo não é passi-
vo de enfrentar a “legalidade de-
mocrática” que sustenta o poder de
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de justiceiro ao cidadão revoltado.
Um dos pontos mais explorados a
partir do ponto de vista dos direitos
humanos é o poder da mídia, que
de acordo com a psicóloga Daniela
Bezerra, membro do Conselho de
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Regional de Psicologia, também
ajuda a incutir uma espécie de
medo social, gerando sensações
como a insegurança, impotência e
impunidade.
	 Para voltarmos ao caso de
linchamentocitadonoiníciodotex-
to, usaremos ele como exemplo: em
todas as matérias que ilustravam o
ocorrido nos dois maiores jornais
em circulação da cidade, não houve
menção à infração dos Direitos
Humanos. A marginalização dess-
es Direitos contribui na construção
de uma naturalização da violência
na sociedade. Todavia, a psicóloga
alerta que para compreender
Grupo Permantente de Estudo da Entrevista / Universidade Federal do Rio Grande do Norte
N A T A L / R N , 0 9 d e M a i o d e 2 0 1 6 . A N O 1 - E D I Ç Ã O 0 0 5
EXPEDIENTE Participaram desta edição: Sebastião Albano - coordenador; Thayane Guimarães - programação visual;
Clércio Rodrigues, Isabela Maia e Thayane Guimarães - Reportagem
EXPEDIENTE
Caderno de Pauta cadernodepauta www. cadernodepauta.blogspot.com.br
Veja mais conteúdo exclu-
sivo sobre linchamentos e
reportagens especiais no
nosso blog!
essa situação é necessário analisar
o contexto no qual nossa sociedade
está inserida: uma sociedade de
consumo, extremamente individ-
ualista – onde para um sujeito, os
outros são irrelevantes.
	 Outro detalhe no caso dos
suspeitos que foram obrigados
a pular da ponte de Igapó, é que
ambos os envolvidos eram meno-
res de idade. Não é surpresa para
ninguém que a realidade do crime
recruta novos atuantes desde as
primeiras fases da juventude, e
naturalmente, cada vez mais pres-
enciamos casos envolvendo crim-
inosos menores de idade. Consid-
erando não apenas a influência da
mídia, mas também a gigantesca
discussão a respeito da maioridade
penal – que também é alimentada
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gramas policias, por exemplo – é
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	 No geral quando casos en-
volvem “menores infratores” a
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cia contra o outro na necessidade
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itos Humanos no país. A psicólo-
ga Daniela afirma que a grande
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flito com a lei, são somente os elei-
tos ao cumprimento desta e aque-
les que devem ser sujeitados a ela”
	 O principal argumento dos
justiceiros, escancarado em fóruns
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de que o poder público não detém
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da segurança das comunidades, e
em vez de ficarem trancafiados em
suas próprias casas com medo do
convívio social, sustentam que a
população deve sim tomar atitudes
mais diretas para ajudar a polícia a
sanar o problema. De acordo com
o sociólogo José de Souza Martins,
professor titular aposentado da
USP, em seu livro “Linchamentos:
A Justiça Popular no Brasil”, casos
como este são antigos no país: o
mais antigo data de 1585, registra-
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	 Com base em dados le-
vantados pelo professor, os esta-
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linchamento são São Paulo, Rio de
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mas, 10,2% são menores de idade,
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cada dia, quatro linchamentos ou
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	 Em entrevista ao Uol, o
sociólogo diz “Aparentemente, o
justiçamento no lugar da justiça
tem como fator principal a insegu-
rança, o medo e a falta de confiança
nas instituições responsáveis pela
garantia de que crimes serão apu-
rados e os criminosos punidos. No
linchamento não há nada de justo
nem de legítimo. Não há qualquer
argumento válido para defender
linchamentos. Todo linchamen-
to é um ato irracional de violên-
cia coletiva, retrógrado.” finaliza o
acadêmico.
	 De maneira geral, a dis-
cussão sobre linchamentos e jus-
ticeiros permeia as mais diversas
esferas, porém, como afirma o
professor José “A sociedade mal
tem consciência de que é grande
o número de linchamentos que
pratica. Nem os condena, nem os
legitima”. Grande parte do prob-
lema está na efemeridade dos ca-
sos: como uma bomba, estouram
e movimentam a discussão sobre
crimes assim. Porém quando a poe-
ira baixa, são esquecidos até que
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aconteça. Cabe a todos a consciên-
cia de caso, para que uma solução
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não ocorram. Pois afinal, não é cul-
pa somente da população inconfor-
mada, do poder público ineficiente,
ou das vítimas-bandidos injustiça-
das. É um contexto complexo que
precisa de espaço na esfera públi-
ca, e começamos com isso abrindo
a discussão em jornais acadêmicos
como este Caderno de Pauta.
Entre em contato conosco:
Mande perguntas e sug-
estões no email
grupertufrn@gmail.com
Perdeu alguma edição do
CP? Acesse nossa Hemero-
teca Digital e encontre todas
as versões impressas do jor-
nal do nosso Grupert
Fechamos o mês de
Abri/2016 com 1.013 visu-
alizações no Blog. Total de
3.230 até o mês de Maio

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  • 1. CADERNO DE PAUTA N A T A L / R N , 0 9 d e M a i o d e 2 0 1 6 . A N O 1 - E D I Ç Ã O 0 0 5 Caderno de Pauta cadernodepauta www. cadernodepauta.blogspot.com.br Grupo Permantente de Estudo da Entrevista / Universidade Federal do Rio Grande do Norte Por Clércio Rodrigues e Thayane Guimarães Imagem http://lanyy.jusbrasil.com.br/artigos/212899233/ LINCHAMENTOS A JUSTIÇA DOS INCONFORMADOS Há mais ou menos um mês na capital potiguar, um ocor- rido chamou a atenção da popu- lação. Para alguns, um ato super- democrático de justiça que mostra a revolta de um povo cansado da violência anabolizada. Para outros, uma amostra desumana da cruel- dade que atropela os direitos hu- manos e tenta “conseguir a paz de forma violenta”, como diria Mano Brown. O linchamento de dois jov- ens suspeitos de praticar crimes nas imediações do maior Shopping Center de Natal aconteceu na noite do dia 11 de abril e desde então, ba- seou ilustres debates que dividem opiniões a respeito do papel e con- ceito de cidadania. Os adolescentes que foram linchados, tiveram as roupas reti- radas, foram obrigados a correr seis quilômetros e a pular da ponte de Igapó, na Zona Norte de Natal, agora fazem parte de uma estatísti- ca que assusta. O Núcleo de Estu- dos da Violência da Universidade de São Paulo (USP), estudou casos de linchamento ocorridos entre 1980 e 2006, e comprovou que o Brasil é o país que mais lincha no mundo. Normalmente, a justifica- tiva para esses atos é baseada na descrença da população nas insti- tuições do governo que creditam os poderes da justiça e do direito pe- nal. “Esse tipo de atitude é errada, porém compreensível. As pessoas se sentem desamparadas, e já que a polícia não nos protege, a popu- lação se sente no direito de fazer justiça com as próprias mãos” afir- mou Jacques Noronha, estudante de jornalismo na UFRN. Os direitos humanos gan- haram muita notoriedade nas úl- timas décadas, e com isso, uma importância legislativa crescente. Porém em muitos casos, o recon- hecimento normativo não é passi- vo de enfrentar a “legalidade de- mocrática” que sustenta o poder de torturar um bandido, e dá o título de justiceiro ao cidadão revoltado. Um dos pontos mais explorados a partir do ponto de vista dos direitos humanos é o poder da mídia, que de acordo com a psicóloga Daniela Bezerra, membro do Conselho de Direitos Humanos e do Conselho Regional de Psicologia, também ajuda a incutir uma espécie de medo social, gerando sensações como a insegurança, impotência e impunidade. Para voltarmos ao caso de linchamentocitadonoiníciodotex- to, usaremos ele como exemplo: em todas as matérias que ilustravam o ocorrido nos dois maiores jornais em circulação da cidade, não houve menção à infração dos Direitos Humanos. A marginalização dess- es Direitos contribui na construção de uma naturalização da violência na sociedade. Todavia, a psicóloga alerta que para compreender
  • 2. Grupo Permantente de Estudo da Entrevista / Universidade Federal do Rio Grande do Norte N A T A L / R N , 0 9 d e M a i o d e 2 0 1 6 . A N O 1 - E D I Ç Ã O 0 0 5 EXPEDIENTE Participaram desta edição: Sebastião Albano - coordenador; Thayane Guimarães - programação visual; Clércio Rodrigues, Isabela Maia e Thayane Guimarães - Reportagem EXPEDIENTE Caderno de Pauta cadernodepauta www. cadernodepauta.blogspot.com.br Veja mais conteúdo exclu- sivo sobre linchamentos e reportagens especiais no nosso blog! essa situação é necessário analisar o contexto no qual nossa sociedade está inserida: uma sociedade de consumo, extremamente individ- ualista – onde para um sujeito, os outros são irrelevantes. Outro detalhe no caso dos suspeitos que foram obrigados a pular da ponte de Igapó, é que ambos os envolvidos eram meno- res de idade. Não é surpresa para ninguém que a realidade do crime recruta novos atuantes desde as primeiras fases da juventude, e naturalmente, cada vez mais pres- enciamos casos envolvendo crim- inosos menores de idade. Consid- erando não apenas a influência da mídia, mas também a gigantesca discussão a respeito da maioridade penal – que também é alimentada por movimentos iniciados em pro- gramas policias, por exemplo – é necessário entender o que muda quando este fator entra em jogo. No geral quando casos en- volvem “menores infratores” a população tende apenas a ignorar ou aclamar a justiça. Esse tipo de caso, porém, foi muito importante para revelar que o perigo não está apenas no estereotipado suspeito de crime, mas também no “cidadão de bem”, que justifica sua violên- cia contra o outro na necessidade de assegurar a “paz social”. Mais ainda, revela uma população total- mente alheia à existência e suposta validade da Declaração dos Dire- itos Humanos no país. A psicólo- ga Daniela afirma que a grande questão presente nesse ponto, é que “nós vivemos em uma sociedade de classes, e desta forma, as classes afetam tudo. Assim, a justiça não consegue ser igualitária e seleciona quem é o alvo das leis e para quais classes sociais elas funcionam. Os adolescentes considerados em con- flito com a lei, são somente os elei- tos ao cumprimento desta e aque- les que devem ser sujeitados a ela” O principal argumento dos justiceiros, escancarado em fóruns e em grupos sobre a crescente criminalidade nas redes sociais, é de que o poder público não detém mais o domínio sobre a situação da segurança das comunidades, e em vez de ficarem trancafiados em suas próprias casas com medo do convívio social, sustentam que a população deve sim tomar atitudes mais diretas para ajudar a polícia a sanar o problema. 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No linchamento não há nada de justo nem de legítimo. Não há qualquer argumento válido para defender linchamentos. Todo linchamen- to é um ato irracional de violên- cia coletiva, retrógrado.” finaliza o acadêmico. De maneira geral, a dis- cussão sobre linchamentos e jus- ticeiros permeia as mais diversas esferas, porém, como afirma o professor José “A sociedade mal tem consciência de que é grande o número de linchamentos que pratica. Nem os condena, nem os legitima”. Grande parte do prob- lema está na efemeridade dos ca- sos: como uma bomba, estouram e movimentam a discussão sobre crimes assim. Porém quando a poe- ira baixa, são esquecidos até que uma nova onda de linchamentos aconteça. Cabe a todos a consciên- cia de caso, para que uma solução seja alcançada e mais linchamentos não ocorram. Pois afinal, não é cul- pa somente da população inconfor- mada, do poder público ineficiente, ou das vítimas-bandidos injustiça- das. 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