2. Sumário
1. Sugestões Austenianas 03
2. Quando Conheci Jane Austen 04
3. Jane Austen e Eu 06
4. Porquê “Northanger Abbey” como Título? 08
5. Lendo a Abadia de Northanger 09
6. As Minhas Impressões sobre Northanger Abbey 11
7. Em Defesa de Northanger Abbey 13
8. A Sátira de Northanger Abbey 15
9. Blaize Castle em Northanger Abbey 16
10. Northanger Abbey 1986 18 2
11. Northanger Abbey 2007 19
12. Adaptação de 2007 21
13. Expiação, Jane Austen e Northanger Abbey 23
14. Catherine Morland o Patinho Feio de Jane Austen 25
15. Henry Tilney 27
16. Eleanor Tilney: A Amiga Sincera 29
17. As Torpezas de Thorpe 31
18. James Morland e Isabella Thorpe 33
19. O General Sem Coração 36
20. A Grande Família Morland 38
21. Frederick Tilney 40
22. Mr. e Mrs. Allen 41
23. Pais e Filhos 43
24. Sabias Que… 44
3. [SUGESTÕES AUSTENIANAS]
MARINA NUNES
Livro
Adoro livros… Vou sugerir o livro que estou a ler actualmente: Tieta do Agreste de
Jorge Amado… Apaixonante… está a ser o meu primeiro contacto com Jorge
Amado e estou apaixonada pela sua escrita. Entramos naquele mundo que ele
descreve… Reconhecemos a linguagem própria que ele não “dissimula” em cada
situação. Estou a adorar e já estou a chegar ao final.
E não posso de sugerir a maior parte das obras de Julio Dinis: A Morgadinha
dos Canaviais, As Pupilas do Sr. Reitor, Uma família Inglesa, Os fidalgos da Casa
Mourisca, entre outros… Gosto da escrita que nos faz sentir cheiros, que nos
faz bater o coração! E “As Horas”… Um livro apaixonante que nos faz sorrir no 3
final: afinal estava tudo ligado…
Música
Qualquer álbum do Rodrigo Leão… A musica de Rodrigo Leão é intensa,
forte, tem emoção… A minha musica favorita “La Fête” do álbum Cinema,
álbum através do qual descobri esta musica maravilhosa, é simplesmente
divina…
Filme
“O Véu Pintado”…
Um filme maravilhoso que descobri por acaso mas que se tornou um dos meus favoritos
de sempre… Têm de ver!
Blogue
FutLol… porque gosto de futebol, porque é engraçado e
porque o meu primo participa…
4. Por Luísa (Luh do Blogue
Currently-Reading)
Desde bastante nova que tenho um arrepender-me de ter visto as
enorme gosto pela leitura, com uma adaptações, pois acho que perdi muito 4
preferência especial por clássicos e da experiência da leitura, embora
romances históricos. Tenho “Orgulho e Preconceito” seja um dos
igualmente por hábito basear as meus livros preferidos.
minhas escolhas em pesquisas de
opiniões de outros leitores e listas de Mas antes de ler “Orgulho e
recomendações. Quando, por acaso Preconceito” e pouco depois de ter
me deparei com uma lista do género descoberto Jane Austen, numa visita à
“Cem livros que deve ler antes de Biblioteca da minha escola secundária,
morrer” onde, entre muitos, se deparei-me com um volume de bolso,
encontrava “Orgulho e Preconceito” de bastante fino e com uma capa de cores
Jane Austen. Reconheci o nome da desmaiadas onde se lia “Sensibilidade e
autora e fiz uma pesquisa acerca da Bom Senso” de Jane Austen. Escusado
obra e fiquei fascinada! Quando será dizer que o requisitei e nessa
descobri que existiam séries e filmes noite, comecei logo a lê-lo, no entanto,
baseados no livro, não consegui não me senti muito entusiasmada
descansar sem os ver todinhos. Mais durante a leitura e não me identifiquei
tarde quando li o livro, cheguei a muito com as personagens. Talvez
5. fosse ainda demasiado jovem para A obra de Jane Austen prima pela
perceber e apreciar a sensibilidade da exímia crítica social que transparece
obra pois, recentemente, decidi dar- em personagens ridículos e
lhe outra oportunidade e achei-o um frequentemente patéticos,
livro maravilhoso. Depois desta estereotípicos das classes sociais
primeira leitura de uma obra de Jane contemporâneas da autora e essa é
Austen, a minha vontade de ler mais uma das coisas que mais me apraz na
livros da autora esmoreceu. sua escrita.
No Verão, há cerca de dois anos, Um romance de Jane é como uma
comprei “Orgulho e Preconceito”, mais pequena máquina do tempo que me
até pela memória que guardava da transporta sempre para um mundo à
adaptação da BBC de 1995, do que parte, para uma época de costumes e
pelo que já tinha lido da autora. convivência social tão diferentes do
Comecei a ler e não consegui parar e que temos hoje em dia e que, na
foi a partir daí que começou a minha minha opinião, tinha uma magia e
obsessão saudável com Jane Austen e a sentimento próprios que se perderam 5
sua obra. Quase de seguida comprei com o tempo.
uma edição em inglês com todos os
romances acabados da autora e li Jane Austen depressa se tornou uma
“Emma” e reli “Sensibilidade e Bom das minhas autoras predilectas e tenho
Senso”. Mais recentemente li sempre um prazer especial em ler e
“Persuasão” e “Northanger Abbey”. reler tudo o que escreveu. Nos dias
mais preguiçosos, gosto sempre de ver
“Persuasão”, a par de “Orgulho e uma ou outra adaptação dos seus
Preconceito” são os meus livros romances.
preferidos de Austen, li-os quase de
uma assentada e fiquei sempre Agradeço aqui o convite que me foi
fascinada pelas heroínas maravilhosas, feito pela Clara, do Jane Austen
estórias envolventes e pelos heróis Portugal, para escrever este pequeno
galantes. texto, que me deixou muito contente!
Muito obrigada!
6. Minha cara Jane, que me rodeia e o efeito que tem em
novamente me deparei com uma mim; observei os lugares que costumo
dificuldade nesta carta. O tema da nossa frequentar e... De repente... Tinha uma
adorável revista é a Abadia de ideia para esta carta.
Northanger e, mais uma vez, em
semelhança à edição anterior, não li Porque, tal como a Jane sabe, nada é mais
(ainda!) a obra. importante para um autor do que
observar. E a Jane fez isso muito bem.
Mais uma vez, colocava-se a questão: "o 6
que escrever à minha cara Jane?". Bom, Os seus livros contêm uma grande
certamente poderia contar-lhe o quão observação das relações que se
horrível é estudar para exames tão perto estabelecem entre as pessoas; de tal
uns dos outros que mais parecem forma, que, por vezes, me surpreendo
moscas; ou poderia ainda falar-lhe da com a maneira como é capaz de
imensidão de projectos que planeava descrever algumas personagens menos...
fazer durante as férias e agora não me recomendáveis, de forma tão fiel que me
apetece realizar; ou poderia, até, contar- fazem lembrar alguém.
lhe a minha questão existencial "ir ou
não ir ao exame de recurso de A Jane tem uma extraordinária
Economia?", mas parece-me... capacidade de nos "obrigar" a apaixonar
despropositado. ou a odiar certas personagens com
poucas palavras. Efectivamente, não
Em vez disso, comecei a pensar no que necessita de grandes discursos ou de uma
poderia contar-lhe; observei as ruas e as lista de defeitos tão grande como o
pessoas por quem passo praticamente Kilimanjaro para percebermos o carácter
todos os dias; observei a (pouca) natureza daquela pessoa em particular e,
7. consequentemente, vamos lentamente Ora, a esses senhores e senhoras tenho a
entranhando aquilo que sentimos em dizer (com todo o respeito pela
relação a esta última, de uma forma tão subjectividade de cada opinião cuja
subtil que nem damos conta de o fazer. inexistência é impossível) que, pura e
Mas a sua observação é ainda mais simplesmente, a Jane fez aquilo que se
interessante noutro aspecto: os locais espera de um escritor: conseguir contar-
onde as obras decorrem. nos uma história com palavras
A Jane não foi daqueles autores que suficientemente sucintas para que
falam do Parque X ou da Terra Y, que descrições exacerbadas sejam
fica algures entre A e B e que, quando desnecessárias e, simultaneamente,
vamos a ver, não existem. Ou estão mostrar-nos o seu mundo como você o
incorrectas. Ou nem sequer sabemos o vê, ou seja, explicando o que sabe, não o
que se quer dizer. que pensa saber. Se isto é ser alguém
incapaz de escrever, ou cuja escrita é
A minha cara teve uma grande atenção rudimentar ou, ainda, com uma completa
nesses pormenores e é sabido de muitos falta de tacto para todos os
que tentava obter informações de vários acontecimentos que a rodeiam, então 7
locais através dos seus conhecidos. Por penso que, hoje em dia, alcançámos o
essa mesma razão, quando nos fala de hecatombe da literatura, desde vampiros
um local em particular, sabemos que que brilham a sereias que andam em
podemos confiar no seu julgamento do terra e a deuses que, originalmente, são
mesmo para o retratar mentalmente e pai e filho, se tornarem irmãos.
isso é uma grande vantagem.
Além disso, tal fidelidade permite aos Mas eu não cedo (completamente) ao
leitores conhecerem mais sobre si e sobre desespero, Jane, pois sei que, em tempos
o ambiente em que vivia. Essa é a mais- de grande desespero posso pegar num
valia de todas as suas obras. livro seu, deliciar-me com uma bonita e
interessante história de amor e sonhar
E devo, aqui, aproveitar, para fazer uma com o mundo que você viu. Quem sabe,
pequena anotação. Deparei-me, por quando criarem uma máquina que
vezes, com opiniões de outros autores e permita viajar no tempo eu lhe faça uma
críticos da literatura em como a Jane se visita?
agarrava apenas àquilo que conhecia e
que a sua escrita era muito... seca, por Até à próxima carta,
falta de melhor expressão.
8. [PORQUÊ NORTHANGER ABBEY COMO TÍTULO?]
SANDRA FREITAS
NÃO FOI JANE AUSTEN QUE O ESCOLHEU
castelos e abadias são retratados como lugares
Northanger Abbey refere-se ao nome do castelo assustadores e arrepiantes e os seus títulos
pertencente a uma das famílias envolvidas nesta
obra de Jane Austen, os Tilneys. Contudo, com
apontavam quase sempre para os lugares onde 8
decorria a acção. Da mesma forma, Northanger
este título parece que toda a acção do livro teria Abbey ajuda os leitores a adivinhar a intenção
lugar na abadia quando, na verdade, a acção só satirizante da obra.
aí começa a desenrolar-se a partir do vigésimo
capítulo. Então, porquê este título?
Outra explicação possível para o título reflecte uma
das principais preocupações temáticas do romance.
Primeiro, é importante ressaltar que não foi Jane Catherine Morland, a protagonista do livro é
Austen que o escolheu. O livro só foi publicado após obcecada com romances góticos e,
a sua morte e foi o seu irmão quem escolheu este consequentemente com Northanger Abbey a partir
título. A autora havia-o intitulado de ‘Catherine’, do momento em que ouve falar dela. Todavia, ao
nome da protagonista. Isto levanta a questão de longo da história aprende que a vida não é um
saber porque é que o irmão de Jane Austen achou romance gótico e que a Abadia de Northanger é
que ‘Northanger Abbey’ seria um título mais apenas a residência da família Tilney e não um
adequado. lugar que possa satisfazer os seus desejos de
aventuras góticas.
Uma possível explicação reside no conteúdo da
obra. A Abadia de Northanger satiriza os populares
romances góticos do século XIX e neles, os antigos
9. [LENDO A ABADIA DE NORTHANGER]
CLARA FERREIRA
"NORTHANGER ABBEY IS JANE AUSTEN’S AMUSING AND BITINGLY
SATIRICAL PASTICHE OF THE GOTHIC ROMANCES POPULAR IN HER
DAY”
Julga-se que foi a primeira obra completada Elinor, de quem se torna muito amiga durante a
para publicação 1803), embora se saiba que já sua estadia em Bath. Durante a sua estada em
tinha começado a escrever "Sensibilidade e Bom Northanger Abbey uma série de mistérios e
Senso" (Sense and Sensibility) e "Orgulho e enganos acontecem, resultando numa partida
Preconceito" (Pride and Prejudice). inesperada.
9
De acordo com a irmã, o seu título inicial era
"Susan" e terá sido escrito entre 1798-1799.
Contudo, só foi publicado em 1817,
postumamente, juntamente com "Persuasão"
(Persuasion).
Catherine Morland, a heroína desta obra de Jane
Austen, com apenas 17 anos, parte para Bath
com um casal amigo da família, Mr. e Mrs.
Allen.
Em Bath, toma o primeiro contacto com a
sociedade, em tudo diferente de Fullerton, a sua
terra natal (no campo). Aí conhece uma grande
amiga Isabella Thorpe de quem terá uma
enorme decepção.
Mais tarde é convidada para ir para
Northanger Abbey com Mr. Tilney e a sua irmã,
10. Catherine, é descrita, como uma fervorosa Henry Tilney não é tão sentida pelo leitor como
leitora de romances góticos, de imaginação em Persuasão, por exemplo.
muito fértil, um charme muito próprio, uma
ingenuidade característica da idade e uma Henry Tilney, é um personagem muito especial,
bondade gigantesca. Penso que a empatia com a bastante sensato e razoável, quase perfeito, diria
personagem não é imediata, eu pelo menos, eu!
cansei-me, por vezes, da sua insensatez e
É também uma crítica à sociedade fútil, e a
imaturidade.
alguns "personagens-tipo", tal como Isabella e
John Thorpe.
O amor nesta obra não é tão forte como noutras No fim da história vemos uma clara evolução no
obras de Jane Austen. A relação entre ela e pensamento de Catherine, ela cresce,
decididamente, durante toda a obra.
10
11. [AS MINHAS IMPRESSÕES SOBRE NORTHANGER ABBEY]
PAULA FREIRE
EU ADOREI ESTE ENSAIO!
Quando comecei a leitura deste livro vinha-me independência, o amor fraternal que nutria pela
sempre à cabeça a frase do personagem irmã e o respeito que, apesar das suas
masculino do filme "O clube de leitura de Jane brincadeiras, tinha por Catherine. Era um
Austen". Segundo aquele, esta obra era um mero homem vertical.
ensaio de Jane Austen. Através dele a autora fez
uma viagem de descoberta sobre o seu estilo. Ao longo da leitura, não fui capaz de me 11
Aqui ainda não está definido. Existiam dúvidas. desligar de algumas frases proferidas por Henry
Ou pelo menos parece havê-las. Creio que não que são dignas de registo e também algumas
se trata de uma verdadeira obra acabada. Foi posições por ele tomadas. Atrevo-me a pensar
com essa impressão que terminei a leitura deste que se tratavam de posições assumidas pela
livro. própria Jane Austen. Merece destaque uma nota
interessante sobre romances versus história.
Todavia, gostei do enredo. Gostei das Henry e Catherine falavam acerca de livros e do
personagens, principalmente de Henry pouco reconhecimento dos romances que ela
Tilney. Adorei a inocência de Catherine e a defendia em detrimento da leitura livros de
sua incrível imaginação que ao longo do livro história que causavam grande "tormento" às
nos oferecem momentos de boa disposição e crianças. A discussão leva-os para o patamar da
leveza. Catherine era uma peça em bruto que educação e Henry termina muito bem dizendo
apenas precisava das mãos certas para se tornar (...) Mas os historiadores não são os responsáveis
numa obra de arte inteligente e delicada. E a pelas dificuldades na aprendizagem da leitura, e
sua transformação pela mão de Henry? até mesmo a menina, que não me parece, no
Adorável. A forma como ele brincava com a sua fundo, ser partidária de uma aplicação severa e
inocência e simultaneamente a protegia não intensa, pode vir a reconhecer que vale bem a
passam despercebidas. Convenceram-me logo. pena ser atormentado por dois ou três anos da
Ele conseguia aliar estes dois traços com perfeita vida em prol de ser capaz de ler tudo o que
elegância. Encantou-me a sua inteligência, a sua falta. Imagine, se a leitura não fosse ensinada, a
12. senhora Radcliffe teria escrito em vão ou até fortuna. E considera que casar por dinheiro é a
talvez nem o tivesse feito. Esta discussão é coisa mais ignóbil da existência.
relevante no sentido de mostrar a preocupação
que Jane Austen com a educação das mulheres. Neste livro encontramos também, ainda que de
Ela conseguia alcançar as vantagens de esta forma sucinta e rápida, uma abordagem à
existir no círculo feminino. É também Henry política do país, o que me surpreendeu pelo
que afirma que ser-se sempre firme pode ser facto de este ter sido escrito cedo.
uma obstinação. E saber relaxar é o verdadeiro
Mas a grande marca que este livro me deixa é a
desafio. Ou, ainda, ser-se levado por conjecturas
crítica aberta que Jane Austen deixa à literatura
de segunda mão é uma pena. Mas a que mais
fantástica. A certa altura a autora mostra
me marcou foi sem dúvida esta: já ouvi falar em
claramente a sua aversão por este tipo de escrita
fiéis acções. Mas uma promessa fiel, a fidelidade
e aponta-lhe consequências pouco felizes. Diz
de prometer! É uma palavrinha bem poderosa,
que todo o sofrimento de Catherine resulta
pois pode muito bem decepcioná-la (ar) e
sobretudo da influência dos livros que até aí
magoá-la (ar).
lera, afirmando que por muito encantadores
Existe outra passagem que, no meu que fossem os livros da senhora Radcliffe, e
entender, consubstancia uma crítica feita tanto mesmo os livros dos que a imitavam, não era
aos homens como às mulheres, o que não deixa com certeza neles que a natureza humana devia
ser procurada, pelo menos ali, nos condados
de ser interessante. Diz a determinada altura a 12
centrais de Inglaterra. (...) Mas na parte central
autora que as vantagens da tolice natural numa
bela jovem já se encontram realçadas pela de Inglaterra havia, com certeza, alguma
importante pena de uma companheira de segurança, mesmo para a vida de uma mulher
escrita e, quanto à forma como trata do assunto, que não fosse amada, conferida pelas leis da
limito-me a acrescentar, fazendo justiça aos terra e os hábitos da época. O assassínio não era
homens, que, embora para a maior e mais tolerado, os criados não eram escravos, nem se
frívola parte deste sexo a imbecilidade nas arranjavam poções para dormir, como o
mulheres seja considerada uma enorme ruibarbo, em todos os farmacêuticos. A
vantagem para realçar os seus encantos referência à natureza humana e à essência do
naturais, existe um outro grupo bastante ser humano são, para mim, o alicerce de todas
grande, suficiente e razoavelmente bem as estórias de Jane Austen. Por isso acredito que
informado, que deseja algo mais numa mulher este tenha sido um ensaio, muito bom, que Jane
do que ignorância. terá feito para definir a sua escrita e para
sedimentar a estrutura que a iria sustentar. O
resultado está à vista. Jane é uma escritora que
fala sobre pessoas reais; sobre a sociedade e
A crítica clara ao casamento por dinheiro está sobre sentimentos. E fá-lo bem. Com
também presente nesta obra. Através de inteligência.
Catherine, Jane afirma que detesta a ideia de
uma grande fortuna procurar outra grande Eu adorei este ensaio!
13. [EM DEFESA DE NORTHANGER ABBEY]
CLARA FERREIRA
HÁ MEDIDA QUE O TEMPO PASSA VOU GOSTANDO CADA VEZ
MAIS DA PUREZA DE CATHERINE MORLAND
13
medida que o tempo
passa, vou gostando
cada vez mais da pureza
de Catherine Morland.
"She was born to be an
heroine"...
Lê-se muito a respeito de Northanger Abbey, Deixo aqui um comentário que encontrei no site
essa sombra na obra de Jane Austen. Jane Austen Society UK e que achei interessante
pois dá uma perspectiva engraçada sobre o
Pergunto-me, será por a heroína não possuir
Romance. Na altura em que li Northanger
um carácter sólido, forte e maduro? Será por ser
Abbey nunca tinha pensado nele como um
ingénua, pura e infantil?
Romance que idolatrava outro Romance, o que é
Devo confessar que não fiquei extasiada da bastante curioso!
primeira vez que li Northanger Abbey. Mas há
Defesa do Romance:
14. Northanger Abbey (Abadia de Northanger) Camila ou Belinda", ou, dentro de pouco tempo,
contém a mais famosa defesa da arte do apenas algum trabalho no qual os maiores
Romance por Jane Austen. poderes da mente estão dispostos, no qual o
mais completo conhecimento da natureza
A leitura preferida de Catherine Morland são humana, a mais feliz delineação das suas
Romances. "Sim, Romances", escreve Jane variedades, as mais vivas efusões de inteligência
Austen, "qual o mal de uma heroína de um e humor, estão expressas para o mundo na
Romance ser idolatrada por a de outro melhor lingua possível.
Romance, de quem pode ela esperar protecção e
consideração?". Ela dá um exemplo: É uma ironia engraçada embora perigosa
quando confundida com a vida real, os
"E o que está a ler, Menina ? " "Oh, é apenas um Romances podem verdadeiramente dar-nos
Romance!" responde a senhorita, enquanto conhecimento dos nossos parceiros humanos
pousa o seu livro com indiferença forçada ou podendo ultrapassar o conhecimento
vergonha momentânea. "É somente Cecilia ou conseguido pela vida real de facto.
14
15. [A SÁTIRA DE “ABADIA DE NORTHANGER”]
CLARA FERREIRA
PARA PERCEBER ABADIA DE NORTHANGER NA TOTALIDADE É
NECESSÁRIO LER “THE MYSTERIES OF UDOLPHO”
Já li escrito que para "The Mysteries of Udolpho" foi publicado em
perceber a "Abadia de 1794 (Northanger Abbey foi escrito entre 1798
Northanger" na e 1799 e publicado em 1803).
totalidade, é necessário 15
conhecer a obra de Ann
Radcliffe "The Mysteries
A acção decorre em 1584 e conta-nos a história
of Udolpho", uma vez
de Emily St. Aubert, uma jovem francesa que
que toda a obra de Jane
fica orfã depois da morte do pai. É um romance
Austen se baseia nela,
gótico, repleto de incidentes de terror, castelos
satirizando e
sombrios, eventos sobrenaturais, vilões e uma
parodiando com os romances góticos, tão em
heroína perseguida.
voga naquela altura.
Emily é feita prisioneira num castelo após a
"The Mysteries of Udolpho" é o romance que a
morte do pai pelo Sr. Montoni, um criminoso
nossa heroína Catherine Morland devora
italiano que casou com sua tia, Madame
avidamente ao longo da história. No fundo, é
Cheron. Emily apaixona-se por Valancourt, um
um romance dentro do romance. Como nunca li
jovem conheceu numa viagem que fez com o
nem conhceço minimamente o enredo (e talvez
pai à Suiça, todavia, o seu encarceramento
não seja a única), procurarei dar a informação
afasta-a dele. No sombrio castelo de Udolpho
possível para uma leiga em romances góticos.
onde está prisioneira, estão escondidos variados
mistérios e um deles envolve o seu pai e uma
Marquesa de Villeroi.
16. [BLAIZE CASTLE EM NORTHANGER ABBEY]
CLARA FERREIRA
BLAIZE CASTLE, O CENÁRIO QUE SERVE PARA AFASTAR
CATHERINE DO COMBINADO COM MISS TILNEY
Vamos ser capazes de fazer pelo menos mais - É o lugar mais bonito de Inglaterra, que em
umas dez coisas. Kingsweston! Claro! E o qualquer ocasião merece que se façam
Castelo de Blaize também, e tudo aquilo que nos cinquenta milhas para ser visitado.
lembramos. Mas aqui a sua irmã diz que não
vem! - Mas é mesmo um castelo? Um castelo antigo?
16
- Castelo de Blaize! - exclamou Catherine - Mas - O mais antigo de todo o reino.
o que é isso?
- Mas é como aqueles que lemos nos livros?
17. - Exactamente. Catherine do combinado com Miss Tilney,
fortemente influenciada pela artimanha de 17
- Fale a sério... e tem mesmo torres e longas Thorpe que a convence de que estes não irão
galerias? cumprir o prometido de ir passear com ela.
- Às dúzias." Na realidade este castelo existiu e existe nos dias
de hoje. É uma construção moderna em formato
Capítulo 11, tradução de Luiza Mascarenhas
triangular, que foi mandada construir por
Thomas Farr em 1766; situada em Henbury,
muito para lá de Bristol, nos terrenos de uma
É assim que Jane Austen nos apresenta Blaize mansão neoclássica, foi acabada de construir em
Castle, o cenário que serve para afastar 1790 por William Pet
Como vêem, Blaise Caslte não passa de um
castelo "a fingir", Thorpe estava, mais uma vez, a
ludibriar a nossa ingénua heroína e a fazer-lhe
passar uma imagem totalmente falsa daquilo
que Blaise Castle era na realidade.
18. [NORTHANGER ABBEY 1986]
CLARA FERREIRA
COMECEI A GOSTAR MAIS DO FILME, PRINCIPALMENTE A PARTIR DA
CHEGADA A NORTHANGER ABBEY
Confesso que achei esta versão embora Felicity Jones lhe
a coisa mais horrenda que se fique cem vezes à frente.
podia fazer com a obra de 18
Jane Austen. Isto no início.
Fazem-se adulterações No desenrolar da história
imensas à história e a meu ver, comecei a gostar mais do
sem qualquer nexo. Os irmãos filme, principalmente a partir
Thorpe são odiosos e numa da chegada a Northanger
interpretação terrível pois vê- Abbey, onde, apesar de tudo
se a milhas de distância que se consegue vislumbrar
são uns tremendos interesseiros e nem partes da história original.
Catherine Morland se deixaria enganar. Os
A cena em que Tilney encontra Catherine no
banhos romanos... meu deus... Pergunto-me
quarto da mãe está tal e qual o texto original, o
qual a lógica de colocarem aquilo no filme?!
único ponto a favor que consigo encontrar no
meio de tanta criatividade pouco inteligente.
A banda sonora é outra coisa terrível, péssima e
irritante! Mr. Tilney às vezes parece-se mais
No início achei deplorável a adulteração, no
com o irmão, nalgumas atitudes. Gostei da actriz
entanto, o fim mostrou-se bem mais agradável..
19. [NORTHANGER ABBEY 2007]
VERA SANTOS
A QUÍMICA ENTRE CATHERINE E O SEU MR. TILNEY ERA BOA
19
Jones, eram muito bons além disso a química
entre Catherine e o seu Mr. Tilney era boa.
Ainda não li este livro, tal como ainda não li o
Parque de Mansfiled e se ver a adaptação de
Catherine pareceu-me bem diferente das outras
2007, foi um verdadeiro turn off para ler em
heroínas de Jane, na medida em que era bem
seguida o livro, o mesmo não posso dizer desta
mais ingénua e parecia ter a cabeça menos no
adaptação. Não sei até que ponto é fiel ao livro,
lugar, mas não era necessariamente uma tola ou
mas é decididamente fiel ao espÍrito de Jane
leviana. Mas de certa forma pensei que ela
Austen e aquilo a que ela nos habituou. O leque
talvez pudesse ser o género de pessoa que se
de actores reunidos, todos desconhecidos para
deixa levar e cair em desgraça como acontece
mim, com excepção de Carey Mulligan e Felicity
20. como Isabella, mas mais pela sua ingenuidade constante, no qual ela nunca percebe se há
de que pela sua vontade de ser como ela. veracidade ou apenas uma brincadeira.
Já em Mr. Tilney encontramos um homem com De resto e como sempre, os cenários, guarda-
uma postura menos séria e muito mais roupa e música não desiludem. Penso que é
20
descontraída do que outros homens criados por impossível não gostar de Catherine Morland, eu
Jane, e talvez por isso, penso que ambos se pelo menos gostei muito dela até porque tal
tornam o par perfeito, ela com a sua como ela facilmente entro nos livros que estou a
ingenuidade e ele com aquele troçar dela ler!
21. [A ADAPTAÇÃO DE 2007]
CLARA FERREIRA
QUANTO MAIS VEJO (ESTA ADAPTAÇÃO) MAIS GOSTO DELA
21
Confesso que a primeira vez que vi esta série Esta adaptação consegue transportar para o ecrã
não gostei particularmente, achei que não fazia os verdadeiros irmãos Thorpe no seu melhor.
jus à obra. Mas a verdade é que, quanto mais Isabella foi terrivelmente bem interpretada.
vezes a vejo mais gosto dela e ultimamente Eleanor Tilney mostrou-se no ecrã com a
tenho criado uma grande paixão tanto por esta postura e doçura com que é descrita na obra.
adaptação como pelo romance. Henry Tilney está no seu melhor com J.J. Field,
todo o "gozo" que faz com Catherine é genuíno e
Escusado será dizer que, entre esta adaptação e a consegue ter aquele toque irónico e humorístico
de 1986, esta está cem vezes melhor e mais com o qual o romance nos apresenta.
rigorosa em relação à obra, para alem de gostar
muito mais deste Henry Tilney do que do outro Gostei muito de rever Sylvestra aqui no papel de
e o mesmo se passar com Catherine. Mrs. Allen, muito bem feito, a cena da corrida
22. para
os
lugares no salão de Bath está hilariante. Catherine no quarto da mãe, nesta versão o
Também gostei muito da cena na ópera e das texto é alterado e Henry não é tão duro com
desculpas de Catherine por não ter cumprido Catherine.
com o acordado e ter faltado ao passeio. Os
passeios com Eleanor e Henry também são O fim desta versão é adorável, o pedido de
muito enternecedores. casamento é "romantiquíssimo" e a atrapalhação
do beijo final amorosa, digna da nossa heroína
Ao contrário da versão de 86 que segue à risca o Catherine Morland! 22
texto original da cena em que Henry apanha
23. [EXPIAÇÃO, AUSTEN E NORTHANGER ABBEY]
CLARA FERREIRA
ATONEMENT TEM MAIS LIGAÇÃO A JANE AUSTEN DO QUE EU
JULGAVA
Quais as semelhanças de Expiação (Atonement)
com a obra de Jane Austen, isto claro, para além 23
de Keira Knightley ter sido a protagonista em
ambas adaptações, do Director de Realização ser
o mesmo de Orgulho e Preconceito (2005) e do
actor principal (James McAvoy) também ter
participado no filme Becoming Jane?
Pois bem, confrontei-me com esta questão
enquanto explorava pela net. Expiação está no
número um dos meus melhores filmes de
sempre e desde que li o livro ainda me tornei
numa fã mais fervorosa.
Embora quase que venere o filme, e já o tenha
visto repetidas vezes, nunca me tinha passado
pela cabeça qualquer relação com Jane Austen.
Mas a verdade é que há.
Neste artigo, "Shades of Austen in McEwan's
Atonement", esse tema é muito desenvolvido. A epígrafe do livro Atonement, traz o seguinte
excerto de Abadia de Northanger de Jane
Austen:
24. "Dear Miss Morland, consider the dreadful
nature of the suspicions you have entertained.
What have you been judging from? Remember
the country and the age in which we live.
Remember that we are English: that we are
Christians. Consult your own understanding,
your own sense of the probable, your own
observation of what is passing around you. Does
our education prepare us for such atrocities?
Do our laws connive at them? Could they be
perpetrated without being known in a country encontrar paralelos entre a obra de Jane
like this, where social and literary intercourse is Austen e a sua obra.
on such a footing, where every man is Segundo, existe também uma suspeita
surrounded by a neighbourhood of voluntary mal interpretada e errada feita por
spies, and where roads and newspapers lay Briony Tallis, que resulta numa
everything open? Dearest Miss Morland, what consequência muito mais grave que a de
ideas have you been admitting?" Catherine Morland.
Terceiro, o próprio Ian 24
McEwan
descreveu a sua obra como "o seu
Esta passagem de A Abadia de Northanger tem romance Jane Austen".
vários efeitos na obra de Ian McEwan:
Primeiro, encoraja os leitores a tentar
O artigo é extenso, mas penso que já transmiti a
ideia que desejava. Na verdade, Atonement, tem
mais ligação a Jane Austen do que eu julgava.
De facto, a suspeita criada por Briony é idêntica
à de Catherine, ambas acusam, sem provas,
alguém de um crime horrendo. Mas em
Catherine não há consequências de maior, pois a
história não desenvolve por aí, mas em Briony, as
consequências são terríveis e a personagem é
perseguida toda a sua vida por essa suspeita que
levantou. Confesso que o fim de Atonement me
colocou a chorar feita criança, e agora que sei
que tem ligações em Jane Austen, vou idolatrar
este filme e livro ainda mais!
25. [CATHERINE MORLAND, O “PATINHO FEIO” EM JANE AUSTEN ]
FÁTIMA VELEZ DE CASTRO
UM AUTÊNTICO PATINHO FEIO QUE VAI DESABROCHANDO AO
LONGO DA HISTÓRIA
25
De
A“Abadia de Northanger” é um romance de Jane
qualquer modo aprecio Catherine Morland
Austen que não me cativa. Embora pareça que
como protagonista, um autêntico patinho feio
os leitores (em geral) simpatizem menos com o
que vai desabrochando ao longo da história. A
“Parque de Mansfield”, sobretudo pelas
autora prepara-nos logo no início, afirmando
características aparentemente amorfas da sua
que “ninguém que alguma vez tivesse conhecido
heroína – Fanny Price – no meu caso isso não
Catherine Morland na infância poderia supor
acontece.
que ela nascera para se tornar uma heroína”. E
nem sei se no final lhe podemos chamar heroína
de facto, porém destaca-se nesta personagem o
seu crescimento e formação de carácter.
26. familiar. Esta é uma ideia
permanente na obra de
Austen, a de que a razão
deve dar atenção ao
coração e não às questões
materiais.
Mas não foram apenas as
experiências desagradáveis
que fizeram Catherine
crescer enquanto pessoa. A
paixão por Tilney, o
“choque” de personalidades
(o sarcasmo, a intrepidez e a intensidade), e toda
A menina travessa, a jovem que sonha com os a aprendizagem que faz com ele, é vital para
romances de mistério, move-se inicialmente que entre na idade adulta “com os pés na terra”,
num meio muito limitado que não lhe abre os percebendo até onde pode ir a fantasia e a
realidade.
horizontes sociais e intelectuais, mas que ao 26
mesmo tempo a protege. A ida para Bath foi
uma excelente oportunidade para contactar
com outros grupos da sociedade e aprender com Catherine Morland parece ser a menina mais
as “armadilhas” dos supostos amigos. Também a rebelde, a mais “maria-rapaz”, a mais criativa
estadia em Northanger e a forma como evoluiu sonhadora de todas as personagens de Jane
a relação com o general Tilney a fez Austen… será que alguma de nós foi um dia
amadurecer, aprendendo como as questões de assim também?
fortuna podem perigar a felicidade conjugal e
27. [HENRY TILNEY]
LILIANA ISABEL
UMA DAS COISAS QUE MAIS ADORO EM TILNEY É O SEU SENTIDO
DE HUMOR
Gosto muito desta personagem e é
das personagens masculinas que
mais gosto nas obras de Jane 27
Austen. É uma personagem
simpática e acessível. Eu penso que
Tinley é até muitas vezes uma
versão em upgrade de Darcy, pois
Darcy tinha o charme e o bom
coração, mas não tinha a aptidão
comunicativa que Henry Tilney
tem. Podemos afirmar que é o
homem perfeito. Se é que isso existe
e se é que as mulheres estão
verdadeiramente interessadas no
homem "perfeito".
Uma das coisas que mais adoro em
Henry é o seu sentido de humor. Se
há coisas que nós mulheres
apreciamos num homem é o seu
sentido de humor, e nisso Henry
ganha muitos pontos. Catherine
que o diga, pois não lhe resistiu.
28. Uma das grandes
diferenças entre
Henry e os restantes
heróis de Austen é
que ele não é
descrito como um
homem
particularmente
belo, mas não é
por isso menos
interessante,
muito pelo contrário. Em relação aos seus
Trata-se de um homem decidido e que sabe sentimentos por Catherine sabemos que foi
aquilo que diz e aquilo que sente. Uma das Catherine quem primeiro se apaixonou e que
personagens que mais expõe as suas opiniões Henry só mais tarde se aproximou dela
em relação aos seus pontos de vista (na sua romanticamente. No entanto, foi das primeiras
grande maioria inteligentemente expostos) pessoas a entender e aprender a gostar de
torna-o uma personagem forte não só de Catherine apesar da sua personalidade que
Northanger Abbey como de toda a obra de Jane tanto ou quando "especial" e até ingénua. Foi
Austen. fantástico poder falar de Henry Tilney de quem 28
eu tanto gosto e que tanto tem " a ver comigo".
29. [ELEANOR TILNEY: A AMIGA SINCERA]
EVA SOUSA
PENSO QUE ELEANOR É TRISTE
o casamento entra, claramente, nesta linha". W.
H. Auden concorda, dizendo que Smith gostava
Contudo, se aceitarmos a possibilidade de Jane de criar imagens que poderiam ser chamadas de
Austen ter conhecido e ter sido inspirada por estilo barroco ridículo".
Sydney Smith, uma comparação entre os dois
pode explicar muito sobre Henry. Por exemplo,
Sydney Smith "gostava de falar a brincar sobre 29
matéria sérias, produzindo linhas de imagens É certo que Jane Austen sempre disse que não
ridículas para provar o seu ponto de vista; a baseava os seus personagens em pessoas reais.
comparação de (...)
Henry Tilney
entre a dança e
Eu vejo em
Eleanor Tilney a
encarnação das
qualidades que
uma boa amiga
deve ter. Ela é
uma
personagem que
passou por
dificuldades na
vida, apesar de
provir duma
família abastada
é órfã de Mãe
(da qual nem
30. teve oportunidade de se despedir) vive com uma encarna as qualidades que uma amiga fiel deve
Pai cujo respeito lhe inspira medo e mesmo ter.
nestas ásperas circunstâncias, às quais se alia a
escassez de amigas da sua idade tem esta É a verdadeira amiga de Catherine, não faz
capacidade inata para a amizade, de certo grande alarido, limita-se a estar lá e a ser, sem
grande brilho aparente,
um apoio para a
heroína desta história.
Eleanor faz-me
lembrar as pessoas
realmente boas que
encontramos na vida e
das quais não nos
apercebemos muito,
pois, por o serem
naturalmente e sem
vaidade não sentem
necessidade de o
publicitar.
criada de forma autodidacta, por inspiração de 30
um coração e puro!
Eleanor é um exemplo de graça feminino, Apesar de todas estas qualidades penso que
candura fragilidade e força em simultâneo e Eleanor é triste! Não revoltada, mas uma pessoa
triste com a vida…
31. [AS TORPEZAS DE THORPE]
CÁTIA PEREIRA
“ESTE AINDA VAI DAR MAIS TRABALHO DO QUE MERECE”
Dentre os "canalhas" que Jane Austen desenhou enquanto deu um toque ligeiro e indiferente na
na sua escrita, John Thorpe é o mais medíocre mão de Isabella, na direcção de Catherine
de todos. Os outros, apesar de canalhas, atirou o pé atrás e fez uma meia vénia. Era um
possuem algum encanto - mesmo que ilusório e jovem robusto, de estatura média, com um rosto
superficial. Com Thorpe isto não acontece. normal e sem qualquer graciosidade, que 31
Desde a primeira linha escrita sobre ele parecia recear parecer demasiado interessante a
constatamos que ele é medíocre e execrável. não ser que vestisse o fato de lacaio e
Estarei a ser demasiado
cruel? Talvez. cavalheiro se
Mas, em não fosse
nenhum descontraído
momento, ao quando devia
longo de ser educado, e
Northanger descarado
Abbey, quando lhe
consegui era permitido
sentir outro ser
sentimento descontraído"
que não fosse
aversão por
John Thorpe.
Encontro uma
grande ironia
na voz de Jane
"John Austen nesta
Thorpe,(…) descrição de
32. John Thorpe. Neste parágrafo, ela deixa bem espírito que não tenha tido oportunidade de se
cultivar. Apesar de não ter muitas
posses não seria propriamente
destituído. Poderia ser uma pessoa
melhor se o quisesse.
Eu não acredito que John Thorpe
tivesse algum tipo de sentimento de
enamoramento ou paixão por
Catherine Morland que justificasse um
assédio tão acentuado. Este assédio é
tão intenso e despropositado que
chega a ser irritante.
Então, o que terá despertado esta
atitude? Apesar da inocência, da
beleza e da candura que tornam
Catherine encantadora, penso que a
resposta reside em 32
argumentos
frívolos. A conveniência dela ser irmã
do pretendente da irmã de Thorpe e
uma suposta herança que os Allen lhe
atribuiriam serão as duas respostas para esta
claro quem ele é. Deixa-nos de sobreaviso, questão. O assédio seria resultado desta busca
como quem diz "cuidado, este ainda vai dar pela conveniência e pelo dinheiro.
mais trabalho do que merece!".
Não posso dizer que ele reconhecesse o risco
que representava Mr. Tilney. Não o via como
"concorrência" ao coração de Catherine. Acho
Busquei a palavra ideal para defini-lo. Não
que ele apenas o via como uma distracção a ser
encontrei. Lembrei de fazer esta brincadeira
extinta, mas não com força suficiente para
com a sonoridade do nome dele: torpe. Contudo,
ofuscar o seu próprio brilho. Isto porque John
ele é bem mais do que isso. Esgoto toda a
Thorpe sempre agiu como se Catherine
adjectivação que encontro e a lista seria
Morland fosse uma presa fácil e uma conquista
infindável, porque John Thorpe possui todas as
garantida.
características que são abomináveis aos meus
olhos: mal-educado, pretensioso, arrogante, Se eu pudesse oferecer um presente a John
interesseiro, grosseiro, indiscreto, inconveniente, Thorpe este presente seria um espelho. Um
mentiroso, intriguista, vaidoso, enfadonho e espelho bem grande. E um par de óculos. Talvez,
pouco inteligente. Tudo isto não resulta de um assim, ele se enxergasse.
33. [JAMES MORLAND E ISABELLA THORPE]
MARINA NUNES
ISABELLA THORPE (…) NÃO É UMA PESSOA BOA
Não me consigo decidir pelo "grau" em que "... sendo de disposição muito amigável e
gosto desta obra de Jane Austen... Que gosto é sinceramente dedicado à irmã,...", mas o seu 33
certo, porque gosto de todas as suas obras que já papel "principal" nesta obra é como apaixonado
li, e gosto num grau muití ssimo elevado, mas por Isabella, que o leva até a ser menos
este livro tem qualquer coisa
que me faz colocá-lo logo
abaixo de Orgulho e
Preconceito e Persuasão mas
acima do Parque do Mansfield...
Mas em relação a Emma, por
exemplo, não sei "como o
colocar". As personagens que
me "coube" apresentar neste
blogue são James Morland e
Isabella Thorpe. Opto por uma
apresentação em conjunto
porque no fundo a personagem
de J.Morland tem interesse não
tanto como irmão de Catherine,
mas sim como "apaixonado e
cego" por Isabella.
J. Morland é apresentado como
34. "dedicado" a sua irmã.
James estudou com o
irmão de Isabella e
tornou-se "próximo" da
família. Esta
proximidade permitiu-
lhe encontrar a irmã em
Bath, mas acima de tudo
fez com que ele abrisse o
seu coração à linda
Isabella. Este sentimento
que ele nutre por
Isabella tornou-o "cego"
aos defeitos desta. Não é
que outros menos
apaixonados ou sem
paixão, não o tivessem
sido também (como é o
caso de Catherine) mas
J.Morland entrega 34
completamente o seu
coração e a sua vida a
esta. Isabella tendo
perfeita noção deste
facto utiliza mesmo esta ascendência sobre ele carta amargurada à sua irmã em que lhe diz "...
para os seus "caprichos". "... era a primeira vez espero que perdoes tudo ao teu irmão menos a
que o seu próprio irmão se colocava contra loucura de pensar que os seus afectos eram
ela..." e esta sua atitude era completamente retribuidos."
condicionada por Isabella que "... entretanto,
levara um lenço aos olhos e Morland, infeliz Isabella Thorpe, como se pode verificar pelo que
perante tal visão, não se controla...". refiro anteriormente não é uma "pessoa boa". É
vaidosa, "sequiosa" de atenção e, considero até,
Considero que Morland era um rapaz sério e "falsa"... Estarei a ser demasiado dura com ela? A
por isso levou a sério a sua relação com Isabella, própria mãe de Isabella ao apresentá-la diz: " A
chegando a falar com o seu pai. O seu mais alta chama-se Isabella, é a minha mais
sentimento por Isabella era tão forte que não lhe velha, e é ou não uma bela rapariga?".
permitiu agir na altura certa quando viu o que
Isabella "andava a fazer"... Aliás quando Isabella sabe que é bonita e manipula todos a
finalmente "se rende às evidências" e desfaz o seu belo prazer: sabe ser dócil e simpática para
seu compromisso com Isabella escreve uma cativar todos... Quando conhece Catherine
35. partilha a sua
amizade e
atenção com um
terceiro
interveniente e
começa a
comprometer
alguns planos
de Isabella, ela
mostra o seu
verdadeiro "eu".
E Catherine
começa a
desde logo a cativa com os seus modos. "A perceber esta "falsidade" de Isabella em algumas
evolução da amizade entre Catherine e Isabella situações, nomeadamente na "busca" de atenção
fora tão rápida como caloroso o seu inicio, e como com F.Thorpe.
passaram tão depressa pelas várias fases de
desenvolvimento da ternura que em breve nem Aliás, após alguns "deslizes" de Isabella e depois
ela nem os amigos do inicio se lembravam. do que ela faz ao seu irmão Catherine diz:
Chamavam-se pelo nome, quando passeavam "Tanto pior para Isabella e para a nossa 35
iam sempre de braço dado, apanhavam a cauda intimidade (...) Ela não passa de uma vaidosa (...)
do vestido uma à outra para dançar, e não se Não acredito que tenha qualquer consideração
afastavam um segundo sequer." por James ou por mim, e como desejava nunca a
ter conhecido." Não concordo com Catherine...
A sua amizade com Catherine parece forte mas ainda bem que Isabella existe nesta obra...
parece-me que é apenas conveniente e serve os torna-a muito mais viva!
propósitos de Isabella. Assim que Catherine
36. [O GENERAL SEM CORAÇÃO]
CÁTIA PEREIRA
ELE SERIA UM LIBERTINO REPRIMIDO
General Tilney é o patriarca da família Tilney. É
um senhor de posses e de posição social. É uma A impressão geral que eu tive sobre o General
pessoa obscura, antipática e perfeccionista. Tilney, ao longo do livro, era de que ele seria um
Exigente na pontualidade. Exigente também na libertino reprimido. Mais concretamente, eu
aplicação de regras e leis por ele impostas no passei quase toda a leitura do livro a pensar que
seio do seu lar. É evidente, aos olhos dos leitores, o General Tilney estaria interessado em
que os seus filhos dedicam-lhe mais receio do conquistar Catherine. Eu não conseguia 36
que respeito. E ele, cultiva a solidão e os dias perceber o porquê da sua imprevista simpatia
sombrios em cada passo que dá. para com ela, já que ele era absolutamente
amargo no pouco que dizia às outras pessoas.
Não
pude
deixar
de rir
de mim
própria
quando
37. pai dela exigia
que ela partisse
de imediato a
meio da noite.
Que tipo de
pessoa é que põe
um convidado
para fora de casa
a meio da
madrugada?
Ainda por cima,
uma pessoa tão
adorável e tão
descobri que afinal o seu interesse centrava-se frágil quanto Catherine? Atitude vil e cobarde, a
numa pretensa herança de que Catherine viria a meu ver. E, é de destacar, ela não tinha qualquer
herdar dos Allen. Nunca passou pela minha culpa do engano criado.
mente que pudesse ser esta a razão do interesse
dele simplesmente porque Catherine nunca deu Se eu ainda tinha alguma solidariedade pelo
esta impressão a ninguém. Este enredo de facto dele ter perdido a mulher perdia-a
enganos criado por John Thorpe, que terá dito totalmente com esta atitude cruel. Preferia que 37
isto ao General Tilney, criou uma dinâmica à ele fosse realmente um libertino reprimido,
história muito interessante. E, gerou também a sempre seria mais interessante do que um
cena fulcral na Abadia de Northanger, que homem desprovido de sentimentos.
acontece quando Eleanor diz à Catherine que o
38. [A GRANDE FAMÍLIA MORLAND]
CLARA FERREIRA
FULLERTON PARCE SER UM AUTÊNTICO PARAÍSO NA TERRA
Jane Austen apresenta-nos uma enorme família O pai era padre; mas como nunca se mostrara
em Northanger Abbey. Mr. e Mrs. Morland desmazelado ou pobre, todos o respeitavam,
parecem respirar de uma imensa felicidade, que embora se chamasse Richard e nunca tivesse
também passam aos filhos. Fullerton parece ser sido bonito. Possuía considerável independência
um autêntico paraíso na terra, e enquanto que lhe vinha de duas boas freguesias. Nunca
leitores somos imbuídos dessa alegria, harmonia tivera por costume cercear a liberdade das 38
e paz - em Fullerton não há problemas, não há filhas. A mãe era uma mulher de senso prático,
manhas nem artimanhas, tudo é genuíno e puro. de bom génio, e, o mais importante, de boa
constituição física. Quando Catherine nasceu já
ela tinha três filhos; em vez de morrer ao dar à
luz o último, como qualquer pessoa esperaria,
Mr. e Mrs. Morland são apresentados ao leitor
continuou a viver. Viveu para ter mais seis
da seguinte maneira:
filhos, para os ver crescer à sua volta e gozar de
excelente saúde.
A senhora Morland era
uma excelente senhora e
queria que os seus filhos
obtivessem os maiores
êxitos, mas tinha o
tempo tão ocupado com
os partos e com o ensino
dos mais pequenos, que
as filhas mais velhas
ficaram inevitavelmente
39. abandonadas a si próprias. (1º Capítulo) do perigo que daí pudesse advir para a sua filha.
As suas advertências limitaram-se a isto: -
Catarina, vê lá se agasalhas bem a garganta
Não é um início muito auspicioso, mas também quando fores à noite aos salões. Gostava que
não é um início inteiramente censurável - Mrs. apontasses todas as tuas despesas. Para isso toma
Morland sofria daquilo que muitos pais sofrem lá este livrito.
hoje em dia - falta de tempo. O que seria de
esperar com dez crianças a cargo. Mas os Morland não eram tão obtusos como
posso estar a fazer passar. Podiam não estar
Também não estavam totalmente informados, conscientes dos perigos da sociedade citadina,
viviam circunscritos a Fullerton e por isso, mas souberam refrear a chegada solitária da
afastados do "mal" do mundo. A partida de filha depois de ser expulsa de Northanger:
Catherine com os Allen era, por um lado, triste,
por implicar a ausência da filha; mas por outro, Não eram pessoas que se irritassem de ânimo
um alívio, por ficarem com menos um filho leve ou que julgassem com azedume as afrontas
para se preocuparem, Catherine estava, aos seus com que os melindravam. Mas, neste caso,
olhos, inteiramente segura na companhia dos quando tudo foi conhecido, consideraram-no
vizinhos e amigos Allen. como um insulto que se não devia pôr de parte,
nem ser facilmente perdoado. Sem sofrerem
Era de supor que, à medida que se aproximava a nenhum susto romântico por pensarem na 39
hora da partida, aumentassem as preocupações longa e solitária viagem da filha, os pais sabiam
da senhora Morland, e que mil pressentimentos que devia ter sido muito desagradável para ela,
alarmantes, motivados pela separação da sua e isso é que eles nunca quereriam que lhe
querida Catherine, lhe enchessem o coração de tivesse acontecido.
tristeza, e a fizessem chorar nos últimos dois
dias que estiveram juntas; e que na hora da
separação, quando estivessem no seu quarto, ela Nós somos o espelho da educação que
prudentemente lhe desse os melhores conselhos, recebemos e a nossa base constrói-se a partir do
para a precaver dos fidalgos e barões que se berço, Catherine é o claro exemplo disso.
divertem a forçar as raparigas
a ir para alguma quinta
afastada. Era assim que, nesse
momento, deveria aliviar o
coração. Quem é que não
pensaria deste modo? Mas a
senhora Morland sabia tão
pouco de lordes e barões que
não tinha a mínima ideia da
sua maldade, nem suspeitava
40. [FREDERICK TILNEY]
PAULA FREIRE
FREDERICK É UM HOMEM ELEGANTE E BONITO QUE GOSTA
DE NAMORSICAR RAPARIGAS BONITAS
O capitão Frederick Tilney (Frederick) é o filho mais flirt casual mais que notório. É a marca de
velho do General Tilney e o possível herdeiro da Frederick. Terminada a sua estadia, termina também
Abadia de Northanger. Trata-se de um personagem a brincadeira e as consequências não são
secundário que surge apenas na segunda parte do preocupação sua. Segundo Eleanor, este jurou que
livro e que prima pela total ausência de discurso. mulher nenhuma merecia o seu amor. Guardava
Tudo o que sabemos de Frederick é-nos dado a
conhecer pelas demais personagens ,
apenas orgulho no seu coração. E, segundo Henry,
era vaidoso e teimoso. O respeito que este nutria
40
nomeadamente Henry, Catherine, Eleanor e Isabella. pelo General não era nenhum. Parecia gostar de o
contrariar em tudo e jamais lhe prestava qualquer
Frederick é um homem elegante e moderno que satisfação.
gosta de namoriscar raparigas bonitas. Os seus
modos e atitudes não causaram impressão à nossa Mas, seria Frederick assim por natureza ou teria
jovem Catherine que os encontrou inferiores aos do acontecido algo que tivesse determinado o seu
seu irmão Henry. É um misto de Mr. Darcy com carácter? Eu penso que terá sofrido bastante com a
Whickam. Confuso? Não. Frederick tem a morte precoce da mãe por quem teria nutrido
arrogância inicial de Mr. Darcy. Quando é verdadeiro afecto. O facto de o pai ser um homem
apresentado em Bath, num baile, protesta com o frio e distante terão contribuído para o seu
irmão por este o querer ver dançar e fá-lo de modo sofrimento. Estes dois factores que poderão ter
bastante audível. Mas também é, como referido, um influenciado a tomada de posição em não se querer
homem que adora "coleccionar" damas e adora apaixonar por nenhuma mulher já que o sofrimento
quebrar as regras da boa educação, características da perda estaria assim latente na sua vida.
que tanto marcaram a personagem de Whicham e
Willoughby. Para mim, Frederick é o molde de outros
personagens de Jane Austen.
O alvo da sua conquista será Isabella. Tola e
convencida, troca a o amor sincero de James por um
41. [MR. E MRS. ALLEN]
CLARA FERREIRA
MRS. ALLEN DÁ UMA ENORME E PERIGOSA LIBERDADE A
CATHERINE
propriedades de Fullerton, a aldeia de Wiltshire
Mr. e Mrs. Allen partilham a mesma alegria do onde viviam os Morlands, foi aconselhado a ir
casal Croft em Persuasão, embora não se para Bath para tratar a gota. A esposa, uma
completem tão harmoniosamente. Os Allen são senhora alegre e amiga de Catherine Morland,
um casal sem filhos e com uma considerável sabendo que quando não acontecem aventuras
41
fortuna. São vizinhos dos Morland e amigos da a uma rapariga na sua terra, ela tem de as
família, daí que levem Miss Morland consigo na procurar fora, convidou-a a ir com eles. O casal
viagem para Bath. Morland concordou de boa vontade. (1º
Capítulo)
Mr.Allen, que possuía a maior parte das
42. Mrs. Allen era daquelas muitas mulheres cuja
convivência consegue surpreender, se
pensarmos que houve um homem que pudesse
gostar dela, a ponto de a desposar. Não era uma
beleza nem uma inteligência; não tinha talento
nem maneiras finas. Foi o seu porte senhoril,
uma bondade pacífica e inactiva e certa
propensão para a frivolidade que fizeram dela a
escolhida de um homem inteligente e sensato,
como o senhor Allen. De certa maneira, estava
realmente talhada para introduzir uma rapariga
na sociedade, porque gostava de ir a toda a
parte e de ver tudo como se ainda fosse jovem.
Os vestidos eram a sua paixão. Tinha grande
prazer em andar sempre bem posta; por isso a
apresentação da nossa heroína na sociedade não
se pôde fazer antes de ter comprado um vestido
Mr. Allen faz-me lembrar um pouco Mr. da última moda para a sua protegida, depois de
Bennet, contudo, ao contrário do último, Mr. ambas passarem três ou quatro dias a saber o
Allen nutre uma verdadeira afeição pela que mais se usava. (2º Capítulo) 42
mulher; e à semelhança de Mr. Bennet, também
a trata com a devida condescendência.
Mrs. Allen é um pouco fútil, a "moda" parece ser
a única coisa que lhe interessa e que a preenche.
Mrs. Allen deveria assumir na história o lugar
de "conselheira" de Catherine, guiando-a na sua
"introdução" à sociedade. Isso não acontece,
aliás, Mrs. Allen dá uma enorme e perigosa
liberdade a Catherine e deixa-a fazer tudo o que
ela quer. Como li algures, ela tem o papel de
"não fazer nada de nada".
43. [PAIS E FILHOS]
CÁTIA PEREIRA
EM NENHUMA DAS SUAS OBRAS ENCONTRAMOS UM PAI TÃO SEM
CORAÇÃO
“(…)deixo que seja decidido por quem o Mr. Tilney, de ter ido ao encontro de Catherine
pretender fazer se a tendência deste livro é a de após ela ter sido banida da Abadia. Nem a
fazer a apologia da tirania parental ou premiar tirania do pai nem a desobediência do filho
a desobediência filial” parecem-me ser o motor deste livro.
43
A alma deste livro se divide em duas partes. Por
um lado, é o coração puro e a imaginação
Jane Austen termina a Abadia de Northanger infindável de Catherine. Por outro lado, somos
com esta frase. Dá a entender que o motor desta todos nós, leitores do romance que vivemos e
história prende-se à esta dinâmica entre “tirania criamos as nossas próprias expectativas e
parental” e “desobediência filial”. Ao longo de conclusões. Vejo a Abadia de Northanger como
todas as obras de Jane Austen podemos ver que uma grande interrogação sobre o papel do leitor
esta dinâmica relacional é uma marca presente e a sua interacção com a obra.
e constante. Mas, em nenhuma de suas obras,
encontramos um pai tão sem coração. Terá a
vida tornado o General Tilney frio e insensível?
Terá sido a perda da sua mulher? A única
desobediência filial que podemos apontar é a de
44. Sabias Que…
A primeira adaptação da obra Abadia de Northanger44
data de 1968. Uma adaptação espanhola, sendo que a
inglesa apenas viria a surgir em 1986. Esta versão
espanhola teve dez episódios e não segue à risca a obra.
Parece que nesta versão Catalina (Catherine) e Isabel
(Isabella) apaixonam-se ambas por Henry, cuja mãe foi
assassinada na Abadia. Catalina e Isabel vão ambas para
Northnager investigar cada membro da família Tilney,
tal e qual como uma história de detectives.