O documento fornece um resumo da literatura produzida em Santa Catarina, abordando sua cronologia desde o século XIX, principais autores e movimentos literários como a Geração da Academia, Grupo Sul e Catequese Poética. Exemplos de trechos literários ilustram a representação do enxaimel social e das relações humanas em obras de autores catarinenses.
1. Recortes da literatura produzida a
partir de Santa Catarina
Viegas Fernandes da Costa
(Sarau Eletrônico / Biblioteca Universitária / FURB)
2. Primeiras questões
Seria possível falarmos de uma literatura
catarinense?
Qual a importância de se ler os
catarinenses?
O desconhecimento a respeito dos autores
catarinenses estaria relacionado a um certo
colonialismo cultural?
3. Breve cronologia
Em 1847 Marcelino Dutra (1809-1869) publica o livro
de poemas “Assembleia das Aves”.
Horácio Nunes Pires (1855-1919), dramaturgo, autor
de peças como “Um cacho de mortes” e do romance
de costumes “D. João de Jaqueta”.
Década de 1880, grupo “Ideia Nova”. Liderado por
Virgílio Várzea (1863-1941). Opunha-se ao
romantismo e reuniu Realistas, Simbolistas e
Parnasianos.
Nomes: Virgílio Várzea, Cruz e Sousa, Luiz Delfino
entre outros. Estes autores viveram a transição
política da Monarquia para a República no Brasil.
4. Cruz e Sousa (1861-1898)
Filho de escravos alforriados.
No Rio de Janeiro incorporou
a estética do simbolismo
(Misticismo, espiritualismo,
subjetivismo, sonoridade da
poesia, realidade expressa de
maneira vaga, ênfase no
imaginário, na sugestão e na
fantasia.
A literatura de Cruz e Sousa
dá ênfase no senso trágico e
anseia a libertação através da
transcendência.
5. Geração da Academia
1921: criação da Sociedade
Catarinense de Letras (mais tarde
chamada de Academia Catarinense
de Letras).
“Geração sem livros”: a maior parte
publicava em jornais e revistas.
Principais nomes: Altino Flores, José
Boiteux, Othon d’Eça (“Homens e
Algas”), Tito Cavalho (“Bulha d’Arroio”
– contos regionalistas)
Fundam a revista “Terra”
6. Grupo Sul
1946: surgimento do Círculo de
Arte Moderna (Grupo Sul).
Duramente criticados por Altino
Flores
Principais nomes: Anibal Nunes
Pires, Ody Fraga, Eglê
Malheiros, Salim Miguel, Antonio
Paladino, Adolfo Boos Jr.,
Silveira de Souza
1947-1957: publicação da
Revista Sul.
1957: Longa-metragem “O preço
da ilusão”.
7. Salim Miguel: Velhice e outros contos; Rede;
A morte do Tenente e outras mortes; A vida
breve de Sezefredo das Neves, poeta;
Primeiro de abril; As confissões Prematuras;
Mare Nostrum; Jornada com Rupert entre
outros.
8. Adolfo Boos Jr.: Teodora & Cia; Companheira
noturna; Quadrilátero; Um largo, sete
memórias; Presenças de Pedro Cirilo;
Burabas entre outros.
9. Catequese Poética
O movimento inicia em 1964.
Valorização do poema como forma de comunicação viva
e atuante.
Principal representante: Lindolf Bell (1938-1998): As
Annamárias; Incorporação; As vivências elementares; O
código das águas entre outros.
Experiências de comunicação poética: objetos poéticos,
corpoema etc.
10. Outros autores catarinenses
Marcos Konder Reis (1922-2001): poeta
de Itajaí. Livros: Menino de Luto; Praia
Brava; Antologia poética; Caminho das
pandorgas entre outros.
Alcides Buss: poeta. Livros: Ahsim;
Transação; Contemplação entre outros.
Idealizador do Varal Literário.
Almiro Caldeira (1921-2007): contista e
romancista. Livros: Rocamaranha; A
arca açoriana entre outros. Açorianismo.
11. Lausimar Laus (1916-1979): jornalista,
professora e escritora. Seu principal livro
é o romance “O guarda-roupa alemão”
Guido Wilmar Sassi (1922-2003): contista
e romantista de temática regionalista.
Livros: Amigo velho; São Miguel;
Geração do deserto entre outros.
Urda Alice Klueger: romancista, cronista
e historiadora. Livros: Verde Vale; No
tempo das tangerinas; No tempo da
bolacha Maria; Cruzeiros do Sul entre
outros
12. Deonísio da Silva: jornalista e escritor.
Livros: Avante soldados: para trás (com o
qual ganhou o Prêmio Casa de Las
Américas); A cidade dos padres; Ovelhas
de aluguel entre outros.
Flávio José Cardozo: contista e cronista.
Livros: Singradura; Longínquas baleias;
Trololó para flauta e cavaquinho entre
outros.
Maicon Tenfen: contista, cronista e
romancista. Livros: Entre a brisa e a
madrugada; Mistérios, mentiras e trovões;
Casa Velha Night Club entre outros.
13. Demais autores: Maura de Senna Pereira; Silveira de Souza;
C. Ronald; Holdemar de Oliveira Menezes; Harry Laus;
Enéas Athanázio; Martinho Brunning (Hai Kais); Amilcar
Neves; Edla Van Steen; José Endoença Martins; Péricles
Prade; Dennis Radünz; Fábio Brüggemann; Douglas Zunino;
Godofredo de Oliveira Neto, Rubens da Cunha; Gregory
Haertel; Viegas Fernandes da Costa, Marcelo Labes entre
muitos outros.
15. José Endoença Martins. Enquanto Isso Em Dom
Casmurro. 1993.
“Esta cidade também já foi alemã, italiana. Com
alemães e italianos as enchentes anuais perderam
leveza e novidade. Ganharam angústia. O enxaimel
foi despejado da riqueza de detalhes estéticos que
abrigava e virou simulacro empobrecido da nostalgia.
A Oktoberfest adquiriu o teor escuro da revolta
desesperada, da dor. Uma dor de cerveja e mijo
azedos. Alegrias e festas exauriram-se. A
abundância econômica despencou.” (p. 10)
16. Godofredo de Oliveira Neto. Faina de Jurema. 1981.
“A civilização dos seus antepassados, porém, junto
com as suas qualidades, legou-lhes seus imensos
defeitos. O espírito de comunidade funcionava
unicamente nas relações entre o grupo e outro grupo
de raça distinta. No interior do círculo o
individualismo preponderava. Para se elevar, pisar
sobre os ombros era a lei. A vitória assim obtida era
agraciada com prêmios materiais. Isto era o mais
importante. A noção de moeda e de seu poder
colateral estava aqui tão às soltas como no velho
mundo quando de lá partiram” (p. 47)
17. Gregory Haertel. Aguardo. 2008.
“Aguardo não é uma cidade extensa. Encravada no
meio de um vale, Aguardo é cortada em toda a sua
extensão por um rio que raramente acorda. Até esta
enchente de 1980 o rio despertara duas outras
vezes. Daqueles despertares lê-se nos livros. Moram
em Aguardo os que ali nasceram e os que para cá
fugiram. Existiam índios e negros. Os primeiros
foram exterminados juntamente com as capivaras, à
bala. Os negros desapareceram. Não existem
bancos em Aguardo. O dinheiro é guardado sob os
colchões em sacolas de supermercado. As casas de
Aguardo são limpas. As panelas de Aguardo são
ariadas dia sim dia não e usadas uma vez por mês.
18. As crianças de Aguardo são gordas (qualquer sinal de
magreza é interpretado como desutrição) e as suas
notas são altas (o boletim vai de oito a dez. Notas
abaixo destas são motivo para reprimendas públicas
e conselhos aos envergonhados pais). Em Aguardo
evita-se comentários sobre suicídios e deficientes
mentais. Os retardados, em Aguardo, são como o
tamanho dos genitais: só sabem sobre eles quem os
tem.” (p. 31).
19. Adolfo Boos Júnior. Quadrilátero (Livro Um: Matheus).
1986.
“era cada um para o seu lado, sonhando a sua maneira
e alimentando o sonho com a inveja, juntos apenas
quando a necessidade obrigava alguém a pedir
emprestado; em comum, somente o desencanto e a
decadência, mas vistos apenas nos outros e
raramente admitidos em si próprio; mas era um
grupo, reunido sei lá por que maldição que – não
obstante a inveja e a rivalidade quase sem sentido –
chegara a ter anseios iguais (...)”
20. “não, não era uma família, pelo menos dentro da noção
de família, união e coisas assim: porém, sob outro
aspecto, era quase uma família, desunida, irmanada
apenas na miséria e na revolta e – muito pior – na
maldição de não se entregar, de não desistir; quem
ajudava já estava pensando em pedir, cada um
perseguindo o sonho a sua moda, vendo no vizinho
tudo aquilo que não queria ser e – contudo –
apresentando a mesma imagem.” (p. 389-390)