SlideShare ist ein Scribd-Unternehmen logo
1 von 4
Problemática da arte por computador

A Arte é, antes de tudo, artifício. É o computador, ferramenta do artifício, a chave
da única arte autêntica: aquela que se emancipa do calor humano? As imagens
apresentadas nesta sala fazem-nos pensar assim.
Seria o artista esboço imperfeito de uma máquina de criar à qual recorremos à
falta de melhor? E que papel representará ele num Universo do artifício total?
Por que este frenesi ``humanista'' que deseja assimilar o homem àquilo que ele
tem de mais animal em si, o calor do coração? Se podemos recriar a aparência do
mundo pelo poder da mente - e do computador - por que nos limitarmos às
vagabundagens do instinto?
A arte por computador é resultado dos tempos: por que uma ética repressiva da
arte limitando-a somente às mãos do ``artista''?
E se a arte por computador, por ser nova, presta-se ao tráfego e à alienação,
como diz Frieder Nake, isso não é senão acidente de percurso, canal obrigatório
de uma dada sociedade. A serigrafia é a primeira etapa do múltiplo, o múltiplo a
primeira etapa da dissolução da obra na consciência cultural, que por sua vez é a
primeira etapa de uma nova criação.
A arte não é uma cousa como a Vênus de Milo ou o Empire State Building; é uma
relação que o homem mantém com as cousas: relação ativa para o criador que as
altera e as organiza à sua vontade, relação passiva do consumidor fruidor de
formas e de arranjos. Enriquecimento de vida, programação da sensualidade ou
experiência de sensualização das formas, é sempre o jogo de dominar seu
ambiente ou ser dominado por ele.
E que brilhantes excitações da vivacidade de nossos sentidos nos propõem os
fósforos coloridos da tela luminosa, nova superfície a ser pendurada, animada
deste ``conjunto de manchas de cores segundo uma certa ordem'' de que falava
Maurice Denis, jogos e caleidoscópios da arte permutacional como primeiras
etapas de uma construção de artifícios pela memorização ilimitada.
Sabemos que doravante a máquina é suscetível de absorver, sem perdas, a
totalidade dos estímulos estéticos, de moê-los em grãos codificados de
sensorialidade, e de distribuirlos sem migalhas nos compartimentos de sua
memória. Eis-nos em confronto com a verdadeira questão: pode-se destes fazer
surgir uma nova obra?
A arte é uma sensualização programada do ambiente: ambiente próximo, imediato
e quase passivo do campo visual explorado pelo olho no movimento que custa tão
pouco a ponto de poder ser prodigalizado. Ambiente do desenvolvimento sonoro
ou teatral, ambiente espacial que o homem explora ou descobre em sua
totalidade. Artes para ver, ouvir ou praticar, o artista é o seu programador: é ele
que semi-determina micromovimentos dos olhos ou trajetos para perambulação
urbana, jogos dos labirintos e dos jardins; ele os condiciona, fixando para si
próprio como regra do jogo a aquisição de prazer por parte daqueles que o
praticam. O computador, com suas memórias, suas sub-rotinas e seus algoritmos,
oferece ao artista o meio para elaborar esta programação do jogo sensorial em
uma escala que os artistas do passado não poderiam jamais ter suposto - à
exceção talvez dos maneiristas cujo rigor obstinado captou a vertigem do infinito
do campo das permutações.
A arte da sociedade dos Sistemas repousará sobre as máquinas de complexidade
a ser manipulada. Vemos criar-se um Neomaneirismo da Máquina, isto é, um
estilo operatório no qual a maneira é mais importante que a forma, pois uma forma
não é senão uma ``solução'' dentre um grande número de outras possíveis da
mesma maneira, de certo modo uma demonstração de existência. A maneira da
realização é a verdadeira fonte de riqueza, de invenção e de força.
Outrora programador intuitivo, daqui prá frente saído ``es qualités'' das escolas de
programação, substituindo uma intuição vaga e segura pela inserção de uma taxa
de aleatório mensurado e previamente experimentado, o artista ou aquele que
toma seu lugar, o criador de formas novas, pode prender-se a seu próprio jogo,
encontrando em sua atividade uma razão de ser suficiente para não preocupar-se
com o público. O produto do computador resolve este jogo dialético que se
estabelece entre o artista como criador puro e o artista como fornecedor de
patterns consumidos sensualmente por um espectador externo à ação de
inovação. Como se inserirá este jogo dialético em uma ``sociedade bem
programada''? Esta é a questão.
A fascinação é esta qualidade do relacionamento entre o ser a forma que impõe
de modo duradouro essa mesma forma ao trajeto do olhar. Inúmeros são seus
recursos: a simples ``força da forma'' não é senão um dentre eles, o
emaranhamento, o duplo sentido, a simetria, a vertigem perspética, a integração
perceptiva, o choque da cor, a finura imposta pelo detalhe, o domínio da
complexidade estão entre os utensílios da fascinação, aqueles que o artista
explora à sua vontade e dos quais os inovadores da arte óptica fizeram uma
exploração sistemática. A arte por computador dispõe de novos recursos de
fascinação: a perseguição de um longo desígnio resultante de variações precisas
e inumeráveis que o olhar integrará de um só golpe, encontrando a tendência por
sob o desvio, a regra sob a exceção, a ordem distante sob a desordem próxima;
ela é uma destas novas possibilidades que resultam diretamente da precisão do
detalhe dentro do gigantismo do propósito, levadas pela máquina a inventariar os
algoritmos oriundos deste novo possível, e a calcular as forças de fascinação que
esses algoritmos dela extraem.
A obra de Waldemar Cordeiro prefigura a evolução das imagens artificiais ou
naturais,   criando   todas   as   etapas   intermediárias,   esquemas   fabricados
automaticamente com base numa fotografia ou reciprocamente. É assim que por
um processo de manipulação dos pontos de uma imagem, Cordeiro os quantifica
por meias-tintas, depois os submete à derivação de sua granulação em função de
sua posição que faz emergir os seus contornos, e ainda duas outras derivações. A
imagem torna-se então apta a todas as manipulações permitidas pelo sinal
eletrônico. Ele situa-se destarte no campo dos possíveis, mostrando que se pode
ir longe na arte de fascinar. Pois se tais imagens me seduzem, sei que, por trás de
cada uma delas, existem variações que basta pesquisar.
As imagens aqui expostas não são fechadas em si mesmas; elas exemplificam
uma arte toda de artifício que segue rumos bem diferentes do imaginário artístico
tradicional. O caminho do arbitrário nela passa através da ordem e não há ponto,
mancha, cor, que não tenha sido levado em conta, conscientizado pelo ordenador
das formas: não é mais o resultado de uma continuidade espontânea do
movimento de sua mão, porém de uma vontade de forma; faz-se necessária uma
aptidão de ir além. O artista deve ir além e definir sua atividade pela idéia do
exemplo antes que pela da obra.

   •   Textos de Abraham A. Moles - L'Arte et l'ordinateur, Casterman, 1971 e
       conferência proferida na Universidade de Montreal, Canadá - selecionados pelo
       autor, numa homenagem pessoal à obra de Waldemar Cordeiro. Setembro / 1973.

Weitere ähnliche Inhalte

Was ist angesagt?

Aula 2 Linha
Aula 2  LinhaAula 2  Linha
Aula 2 Linha
phcarte
 
Msa modelos anatomia humana eletrônicos
Msa modelos anatomia humana eletrônicosMsa modelos anatomia humana eletrônicos
Msa modelos anatomia humana eletrônicos
Valter Maniga
 
Artes ficções urbanas estratégias para a ocupação das cidades
Artes ficções urbanas estratégias para a ocupação das cidadesArtes ficções urbanas estratégias para a ocupação das cidades
Artes ficções urbanas estratégias para a ocupação das cidades
Luara Schamó
 
Impressionismo - cor luz tinta
Impressionismo - cor luz tintaImpressionismo - cor luz tinta
Impressionismo - cor luz tinta
Vitor Pedro
 

Was ist angesagt? (20)

Aula 2 Linha
Aula 2  LinhaAula 2  Linha
Aula 2 Linha
 
Msa modelos anatomia humana eletrônicos
Msa modelos anatomia humana eletrônicosMsa modelos anatomia humana eletrônicos
Msa modelos anatomia humana eletrônicos
 
Surrealismo
Surrealismo Surrealismo
Surrealismo
 
Surrealismo
SurrealismoSurrealismo
Surrealismo
 
Surrealismo
SurrealismoSurrealismo
Surrealismo
 
AULA 4 - ARTE - 3º E.M
AULA 4 - ARTE - 3º E.MAULA 4 - ARTE - 3º E.M
AULA 4 - ARTE - 3º E.M
 
Surrealismo
SurrealismoSurrealismo
Surrealismo
 
Análise de Obras de Arte. Entre o linear e o pictórico.
Análise de Obras de Arte. Entre o linear e o pictórico.Análise de Obras de Arte. Entre o linear e o pictórico.
Análise de Obras de Arte. Entre o linear e o pictórico.
 
Elementos Formais Da Pintura
Elementos Formais Da PinturaElementos Formais Da Pintura
Elementos Formais Da Pintura
 
Caixa de sonhos universos im_possíveis_ surrealismo_soniarittmann
Caixa de sonhos universos im_possíveis_ surrealismo_soniarittmannCaixa de sonhos universos im_possíveis_ surrealismo_soniarittmann
Caixa de sonhos universos im_possíveis_ surrealismo_soniarittmann
 
Surrealismo
SurrealismoSurrealismo
Surrealismo
 
Artes ficções urbanas estratégias para a ocupação das cidades
Artes ficções urbanas estratégias para a ocupação das cidadesArtes ficções urbanas estratégias para a ocupação das cidades
Artes ficções urbanas estratégias para a ocupação das cidades
 
Linguagem pictorica
Linguagem pictoricaLinguagem pictorica
Linguagem pictorica
 
Banco de Arte Moderna
Banco de Arte ModernaBanco de Arte Moderna
Banco de Arte Moderna
 
Arte rupestre
Arte rupestreArte rupestre
Arte rupestre
 
Impressionismo - cor luz tinta
Impressionismo - cor luz tintaImpressionismo - cor luz tinta
Impressionismo - cor luz tinta
 
Retórica da acção urbana
Retórica da acção urbanaRetórica da acção urbana
Retórica da acção urbana
 
linguagem pictórica: elementos visuais
linguagem pictórica: elementos visuaislinguagem pictórica: elementos visuais
linguagem pictórica: elementos visuais
 
O desenho como intensidade art
O desenho como intensidade artO desenho como intensidade art
O desenho como intensidade art
 
Práticas artísticas contemporâneas algumas questões
Práticas artísticas contemporâneas algumas questõesPráticas artísticas contemporâneas algumas questões
Práticas artísticas contemporâneas algumas questões
 

Andere mochten auch

Pesqueiros 2010
Pesqueiros 2010Pesqueiros 2010
Pesqueiros 2010
nilson1605
 
Texto o que é método paulo freire 7 6p - dia 07 de novembro
Texto o que é método paulo freire 7   6p - dia 07 de novembroTexto o que é método paulo freire 7   6p - dia 07 de novembro
Texto o que é método paulo freire 7 6p - dia 07 de novembro
Profesonline
 
03 procedimento administrativo - questões polêmicas
03   procedimento administrativo - questões polêmicas03   procedimento administrativo - questões polêmicas
03 procedimento administrativo - questões polêmicas
Heitor Carvalho
 
Axpe Consulting: news septiembre 2013
Axpe Consulting: news septiembre 2013Axpe Consulting: news septiembre 2013
Axpe Consulting: news septiembre 2013
AXPE Consulting
 
Formação para cidadania
Formação para cidadaniaFormação para cidadania
Formação para cidadania
myri2000
 
Alinelisboa plano de aula aula5_modulo2
Alinelisboa plano de aula aula5_modulo2Alinelisboa plano de aula aula5_modulo2
Alinelisboa plano de aula aula5_modulo2
Aline Lisboa
 
Atividade formativa 4
Atividade formativa 4Atividade formativa 4
Atividade formativa 4
pcarvalho54
 
Power point copa
Power point copaPower point copa
Power point copa
ariellebota
 
Valle del cauca (2)
Valle del cauca (2)Valle del cauca (2)
Valle del cauca (2)
da11iela
 

Andere mochten auch (20)

Mulher cópia
Mulher   cópiaMulher   cópia
Mulher cópia
 
Pesqueiros 2010
Pesqueiros 2010Pesqueiros 2010
Pesqueiros 2010
 
la tecnologia en america
la tecnologia en americala tecnologia en america
la tecnologia en america
 
Texto o que é método paulo freire 7 6p - dia 07 de novembro
Texto o que é método paulo freire 7   6p - dia 07 de novembroTexto o que é método paulo freire 7   6p - dia 07 de novembro
Texto o que é método paulo freire 7 6p - dia 07 de novembro
 
Grupo 5
Grupo 5Grupo 5
Grupo 5
 
Conhecer
ConhecerConhecer
Conhecer
 
Estado novo vargas
Estado novo vargasEstado novo vargas
Estado novo vargas
 
03 procedimento administrativo - questões polêmicas
03   procedimento administrativo - questões polêmicas03   procedimento administrativo - questões polêmicas
03 procedimento administrativo - questões polêmicas
 
Axpe Consulting: news septiembre 2013
Axpe Consulting: news septiembre 2013Axpe Consulting: news septiembre 2013
Axpe Consulting: news septiembre 2013
 
Conferencia 2ºepo clasificación animales
Conferencia 2ºepo clasificación animalesConferencia 2ºepo clasificación animales
Conferencia 2ºepo clasificación animales
 
Formação para cidadania
Formação para cidadaniaFormação para cidadania
Formação para cidadania
 
Alinelisboa plano de aula aula5_modulo2
Alinelisboa plano de aula aula5_modulo2Alinelisboa plano de aula aula5_modulo2
Alinelisboa plano de aula aula5_modulo2
 
Atividade formativa 4
Atividade formativa 4Atividade formativa 4
Atividade formativa 4
 
Transporte BA 2020 Transitar BA 2007
Transporte BA 2020 Transitar BA 2007Transporte BA 2020 Transitar BA 2007
Transporte BA 2020 Transitar BA 2007
 
Power point copa
Power point copaPower point copa
Power point copa
 
Valle del cauca (2)
Valle del cauca (2)Valle del cauca (2)
Valle del cauca (2)
 
Plano decenal de expansão de energia – PDE 2020
Plano decenal de expansão de energia – PDE 2020Plano decenal de expansão de energia – PDE 2020
Plano decenal de expansão de energia – PDE 2020
 
Aventura matemática
Aventura matemáticaAventura matemática
Aventura matemática
 
Barcelona 2012
Barcelona 2012Barcelona 2012
Barcelona 2012
 
Plataforma moodle
Plataforma moodlePlataforma moodle
Plataforma moodle
 

Ähnlich wie Problemática da arte por computador

Artedigitalfinal
ArtedigitalfinalArtedigitalfinal
Artedigitalfinal
Luís Rocha
 
A carta de monteiro lobato
A carta de monteiro lobatoA carta de monteiro lobato
A carta de monteiro lobato
Monique Tomazi
 
Impressionismo , Neo Impressionismo E Pós Impressionismo
Impressionismo , Neo Impressionismo E Pós ImpressionismoImpressionismo , Neo Impressionismo E Pós Impressionismo
Impressionismo , Neo Impressionismo E Pós Impressionismo
Marquês de Pombal
 

Ähnlich wie Problemática da arte por computador (17)

Aventura em busca de imagens jamais vistas
Aventura em busca de imagens jamais vistasAventura em busca de imagens jamais vistas
Aventura em busca de imagens jamais vistas
 
Flusser
FlusserFlusser
Flusser
 
A LíNgua Do Mundo
A LíNgua Do MundoA LíNgua Do Mundo
A LíNgua Do Mundo
 
Projeto EU||EU
Projeto EU||EUProjeto EU||EU
Projeto EU||EU
 
Funções da arte
Funções da arteFunções da arte
Funções da arte
 
Trabalho sobre a arte
Trabalho sobre a arteTrabalho sobre a arte
Trabalho sobre a arte
 
Elementos fundamentais da linguagem visual
Elementos fundamentais da linguagem visualElementos fundamentais da linguagem visual
Elementos fundamentais da linguagem visual
 
0 arte pra que
0 arte pra que0 arte pra que
0 arte pra que
 
Documento do Eixo Arte Digital
Documento do Eixo Arte DigitalDocumento do Eixo Arte Digital
Documento do Eixo Arte Digital
 
Documento do Eixo Arte Digital
Documento do Eixo Arte DigitalDocumento do Eixo Arte Digital
Documento do Eixo Arte Digital
 
040 educação artística
040   educação artística040   educação artística
040 educação artística
 
Artedigitalfinal
ArtedigitalfinalArtedigitalfinal
Artedigitalfinal
 
Artedigitalfinal
ArtedigitalfinalArtedigitalfinal
Artedigitalfinal
 
A carta de monteiro lobato
A carta de monteiro lobatoA carta de monteiro lobato
A carta de monteiro lobato
 
Impressionismo , Neo Impressionismo E Pós Impressionismo
Impressionismo , Neo Impressionismo E Pós ImpressionismoImpressionismo , Neo Impressionismo E Pós Impressionismo
Impressionismo , Neo Impressionismo E Pós Impressionismo
 
O Imaginário Brasileiro
O Imaginário BrasileiroO Imaginário Brasileiro
O Imaginário Brasileiro
 
Jogos Surrealistas e Inteligência Artificial
Jogos Surrealistas e Inteligência ArtificialJogos Surrealistas e Inteligência Artificial
Jogos Surrealistas e Inteligência Artificial
 

Mehr von Venise Melo

Manual atividades complementares 2012
Manual atividades complementares 2012Manual atividades complementares 2012
Manual atividades complementares 2012
Venise Melo
 
Tabela pontuação atividades complementares
Tabela pontuação atividades complementaresTabela pontuação atividades complementares
Tabela pontuação atividades complementares
Venise Melo
 
Apresentação leexa
Apresentação leexaApresentação leexa
Apresentação leexa
Venise Melo
 
Regulamento FAT Mostra Acadêmica 2012
Regulamento FAT Mostra Acadêmica 2012Regulamento FAT Mostra Acadêmica 2012
Regulamento FAT Mostra Acadêmica 2012
Venise Melo
 
05 códigos experimentais novo
05 códigos experimentais  novo05 códigos experimentais  novo
05 códigos experimentais novo
Venise Melo
 
Cartemas - Eliane Weizmann
Cartemas - Eliane WeizmannCartemas - Eliane Weizmann
Cartemas - Eliane Weizmann
Venise Melo
 
Livro o que_é_design
Livro o que_é_designLivro o que_é_design
Livro o que_é_design
Venise Melo
 
Experimentação 04 - Desconstrução Hibridismo
Experimentação 04  - Desconstrução HibridismoExperimentação 04  - Desconstrução Hibridismo
Experimentação 04 - Desconstrução Hibridismo
Venise Melo
 
Experimentação 03 - Bauhaus
Experimentação 03  - BauhausExperimentação 03  - Bauhaus
Experimentação 03 - Bauhaus
Venise Melo
 
Experimentação 02 - Tipografia Descontrução
Experimentação 02  - Tipografia DescontruçãoExperimentação 02  - Tipografia Descontrução
Experimentação 02 - Tipografia Descontrução
Venise Melo
 
Experimentação 01 - Tipografia - parte1
Experimentação 01 -  Tipografia - parte1Experimentação 01 -  Tipografia - parte1
Experimentação 01 - Tipografia - parte1
Venise Melo
 
Experimentação 01 - Tipografia - parte2
Experimentação 01 - Tipografia - parte2Experimentação 01 - Tipografia - parte2
Experimentação 01 - Tipografia - parte2
Venise Melo
 
Aula teorica - Design Gráfico Pós-Moderno
Aula teorica - Design Gráfico Pós-ModernoAula teorica - Design Gráfico Pós-Moderno
Aula teorica - Design Gráfico Pós-Moderno
Venise Melo
 
Aula teorica - Bauhaus
Aula teorica  - BauhausAula teorica  - Bauhaus
Aula teorica - Bauhaus
Venise Melo
 
Aula teorica - Da Arte Nouveau ao Futurismo
Aula teorica - Da Arte Nouveau ao FuturismoAula teorica - Da Arte Nouveau ao Futurismo
Aula teorica - Da Arte Nouveau ao Futurismo
Venise Melo
 
Experimentação 05 06 07 PHOTOSHOP
Experimentação 05 06 07   PHOTOSHOPExperimentação 05 06 07   PHOTOSHOP
Experimentação 05 06 07 PHOTOSHOP
Venise Melo
 
Aula panorama arte e tecnologia
Aula panorama arte e tecnologiaAula panorama arte e tecnologia
Aula panorama arte e tecnologia
Venise Melo
 
Arte tecnologia brasil_itaucultural
Arte tecnologia brasil_itauculturalArte tecnologia brasil_itaucultural
Arte tecnologia brasil_itaucultural
Venise Melo
 
As implicações do digital
As implicações do digitalAs implicações do digital
As implicações do digital
Venise Melo
 
Levy cibercultura
Levy ciberculturaLevy cibercultura
Levy cibercultura
Venise Melo
 

Mehr von Venise Melo (20)

Manual atividades complementares 2012
Manual atividades complementares 2012Manual atividades complementares 2012
Manual atividades complementares 2012
 
Tabela pontuação atividades complementares
Tabela pontuação atividades complementaresTabela pontuação atividades complementares
Tabela pontuação atividades complementares
 
Apresentação leexa
Apresentação leexaApresentação leexa
Apresentação leexa
 
Regulamento FAT Mostra Acadêmica 2012
Regulamento FAT Mostra Acadêmica 2012Regulamento FAT Mostra Acadêmica 2012
Regulamento FAT Mostra Acadêmica 2012
 
05 códigos experimentais novo
05 códigos experimentais  novo05 códigos experimentais  novo
05 códigos experimentais novo
 
Cartemas - Eliane Weizmann
Cartemas - Eliane WeizmannCartemas - Eliane Weizmann
Cartemas - Eliane Weizmann
 
Livro o que_é_design
Livro o que_é_designLivro o que_é_design
Livro o que_é_design
 
Experimentação 04 - Desconstrução Hibridismo
Experimentação 04  - Desconstrução HibridismoExperimentação 04  - Desconstrução Hibridismo
Experimentação 04 - Desconstrução Hibridismo
 
Experimentação 03 - Bauhaus
Experimentação 03  - BauhausExperimentação 03  - Bauhaus
Experimentação 03 - Bauhaus
 
Experimentação 02 - Tipografia Descontrução
Experimentação 02  - Tipografia DescontruçãoExperimentação 02  - Tipografia Descontrução
Experimentação 02 - Tipografia Descontrução
 
Experimentação 01 - Tipografia - parte1
Experimentação 01 -  Tipografia - parte1Experimentação 01 -  Tipografia - parte1
Experimentação 01 - Tipografia - parte1
 
Experimentação 01 - Tipografia - parte2
Experimentação 01 - Tipografia - parte2Experimentação 01 - Tipografia - parte2
Experimentação 01 - Tipografia - parte2
 
Aula teorica - Design Gráfico Pós-Moderno
Aula teorica - Design Gráfico Pós-ModernoAula teorica - Design Gráfico Pós-Moderno
Aula teorica - Design Gráfico Pós-Moderno
 
Aula teorica - Bauhaus
Aula teorica  - BauhausAula teorica  - Bauhaus
Aula teorica - Bauhaus
 
Aula teorica - Da Arte Nouveau ao Futurismo
Aula teorica - Da Arte Nouveau ao FuturismoAula teorica - Da Arte Nouveau ao Futurismo
Aula teorica - Da Arte Nouveau ao Futurismo
 
Experimentação 05 06 07 PHOTOSHOP
Experimentação 05 06 07   PHOTOSHOPExperimentação 05 06 07   PHOTOSHOP
Experimentação 05 06 07 PHOTOSHOP
 
Aula panorama arte e tecnologia
Aula panorama arte e tecnologiaAula panorama arte e tecnologia
Aula panorama arte e tecnologia
 
Arte tecnologia brasil_itaucultural
Arte tecnologia brasil_itauculturalArte tecnologia brasil_itaucultural
Arte tecnologia brasil_itaucultural
 
As implicações do digital
As implicações do digitalAs implicações do digital
As implicações do digital
 
Levy cibercultura
Levy ciberculturaLevy cibercultura
Levy cibercultura
 

Problemática da arte por computador

  • 1. Problemática da arte por computador A Arte é, antes de tudo, artifício. É o computador, ferramenta do artifício, a chave da única arte autêntica: aquela que se emancipa do calor humano? As imagens apresentadas nesta sala fazem-nos pensar assim. Seria o artista esboço imperfeito de uma máquina de criar à qual recorremos à falta de melhor? E que papel representará ele num Universo do artifício total? Por que este frenesi ``humanista'' que deseja assimilar o homem àquilo que ele tem de mais animal em si, o calor do coração? Se podemos recriar a aparência do mundo pelo poder da mente - e do computador - por que nos limitarmos às vagabundagens do instinto? A arte por computador é resultado dos tempos: por que uma ética repressiva da arte limitando-a somente às mãos do ``artista''? E se a arte por computador, por ser nova, presta-se ao tráfego e à alienação, como diz Frieder Nake, isso não é senão acidente de percurso, canal obrigatório de uma dada sociedade. A serigrafia é a primeira etapa do múltiplo, o múltiplo a primeira etapa da dissolução da obra na consciência cultural, que por sua vez é a primeira etapa de uma nova criação. A arte não é uma cousa como a Vênus de Milo ou o Empire State Building; é uma relação que o homem mantém com as cousas: relação ativa para o criador que as altera e as organiza à sua vontade, relação passiva do consumidor fruidor de formas e de arranjos. Enriquecimento de vida, programação da sensualidade ou experiência de sensualização das formas, é sempre o jogo de dominar seu ambiente ou ser dominado por ele. E que brilhantes excitações da vivacidade de nossos sentidos nos propõem os fósforos coloridos da tela luminosa, nova superfície a ser pendurada, animada deste ``conjunto de manchas de cores segundo uma certa ordem'' de que falava Maurice Denis, jogos e caleidoscópios da arte permutacional como primeiras etapas de uma construção de artifícios pela memorização ilimitada. Sabemos que doravante a máquina é suscetível de absorver, sem perdas, a totalidade dos estímulos estéticos, de moê-los em grãos codificados de
  • 2. sensorialidade, e de distribuirlos sem migalhas nos compartimentos de sua memória. Eis-nos em confronto com a verdadeira questão: pode-se destes fazer surgir uma nova obra? A arte é uma sensualização programada do ambiente: ambiente próximo, imediato e quase passivo do campo visual explorado pelo olho no movimento que custa tão pouco a ponto de poder ser prodigalizado. Ambiente do desenvolvimento sonoro ou teatral, ambiente espacial que o homem explora ou descobre em sua totalidade. Artes para ver, ouvir ou praticar, o artista é o seu programador: é ele que semi-determina micromovimentos dos olhos ou trajetos para perambulação urbana, jogos dos labirintos e dos jardins; ele os condiciona, fixando para si próprio como regra do jogo a aquisição de prazer por parte daqueles que o praticam. O computador, com suas memórias, suas sub-rotinas e seus algoritmos, oferece ao artista o meio para elaborar esta programação do jogo sensorial em uma escala que os artistas do passado não poderiam jamais ter suposto - à exceção talvez dos maneiristas cujo rigor obstinado captou a vertigem do infinito do campo das permutações. A arte da sociedade dos Sistemas repousará sobre as máquinas de complexidade a ser manipulada. Vemos criar-se um Neomaneirismo da Máquina, isto é, um estilo operatório no qual a maneira é mais importante que a forma, pois uma forma não é senão uma ``solução'' dentre um grande número de outras possíveis da mesma maneira, de certo modo uma demonstração de existência. A maneira da realização é a verdadeira fonte de riqueza, de invenção e de força. Outrora programador intuitivo, daqui prá frente saído ``es qualités'' das escolas de programação, substituindo uma intuição vaga e segura pela inserção de uma taxa de aleatório mensurado e previamente experimentado, o artista ou aquele que toma seu lugar, o criador de formas novas, pode prender-se a seu próprio jogo, encontrando em sua atividade uma razão de ser suficiente para não preocupar-se com o público. O produto do computador resolve este jogo dialético que se estabelece entre o artista como criador puro e o artista como fornecedor de patterns consumidos sensualmente por um espectador externo à ação de
  • 3. inovação. Como se inserirá este jogo dialético em uma ``sociedade bem programada''? Esta é a questão. A fascinação é esta qualidade do relacionamento entre o ser a forma que impõe de modo duradouro essa mesma forma ao trajeto do olhar. Inúmeros são seus recursos: a simples ``força da forma'' não é senão um dentre eles, o emaranhamento, o duplo sentido, a simetria, a vertigem perspética, a integração perceptiva, o choque da cor, a finura imposta pelo detalhe, o domínio da complexidade estão entre os utensílios da fascinação, aqueles que o artista explora à sua vontade e dos quais os inovadores da arte óptica fizeram uma exploração sistemática. A arte por computador dispõe de novos recursos de fascinação: a perseguição de um longo desígnio resultante de variações precisas e inumeráveis que o olhar integrará de um só golpe, encontrando a tendência por sob o desvio, a regra sob a exceção, a ordem distante sob a desordem próxima; ela é uma destas novas possibilidades que resultam diretamente da precisão do detalhe dentro do gigantismo do propósito, levadas pela máquina a inventariar os algoritmos oriundos deste novo possível, e a calcular as forças de fascinação que esses algoritmos dela extraem. A obra de Waldemar Cordeiro prefigura a evolução das imagens artificiais ou naturais, criando todas as etapas intermediárias, esquemas fabricados automaticamente com base numa fotografia ou reciprocamente. É assim que por um processo de manipulação dos pontos de uma imagem, Cordeiro os quantifica por meias-tintas, depois os submete à derivação de sua granulação em função de sua posição que faz emergir os seus contornos, e ainda duas outras derivações. A imagem torna-se então apta a todas as manipulações permitidas pelo sinal eletrônico. Ele situa-se destarte no campo dos possíveis, mostrando que se pode ir longe na arte de fascinar. Pois se tais imagens me seduzem, sei que, por trás de cada uma delas, existem variações que basta pesquisar. As imagens aqui expostas não são fechadas em si mesmas; elas exemplificam uma arte toda de artifício que segue rumos bem diferentes do imaginário artístico tradicional. O caminho do arbitrário nela passa através da ordem e não há ponto, mancha, cor, que não tenha sido levado em conta, conscientizado pelo ordenador
  • 4. das formas: não é mais o resultado de uma continuidade espontânea do movimento de sua mão, porém de uma vontade de forma; faz-se necessária uma aptidão de ir além. O artista deve ir além e definir sua atividade pela idéia do exemplo antes que pela da obra. • Textos de Abraham A. Moles - L'Arte et l'ordinateur, Casterman, 1971 e conferência proferida na Universidade de Montreal, Canadá - selecionados pelo autor, numa homenagem pessoal à obra de Waldemar Cordeiro. Setembro / 1973.