O documento discute a civilização egípcia antiga, incluindo a importância do Rio Nilo para o desenvolvimento da agricultura e da formação do Estado egípcio, a estrutura social hierárquica e a economia baseada na agricultura, e o avanço das artes, ciências e religião no Egito Antigo.
1. Professor Tyrone Andrade de Mello
A civilização egípcia
O que é uma civilização? Qual a importância do Rio Nilo para o desenvolvimento da agricultura
no Egito? Que fatores contribuíram para a desagregação das comunidades primitivas e para a
formação da monarquia egípcia? Como era a estrutura egípcia? Quais as características da religião
e sua importância na manutenção do Estado? Quais são os principais deuses egípcios? Quem eram
os escribas? Por que saber ler e escrever era uma atividade valorizada? E hoje? Qual é a
importância de saber ler e escrever? Qual é a explicação divina para a origem dos faraós? Qual é a
explicação histórica para o aparecimento dos faraós no Egito? O que são ideogramas ou
fonogramas? Sabe fazer seu próprio ideograma? Escrever uma mensagem cifrada?
O que é uma civilização?
No final da Pré-história foi marcado pelo surgimento das primeiras cidades. Isso foi possível, entre
outros fatores, pelo domínio de técnicas agrícolas, como o arado de tração animal e a irrigação.
Essas inovações geraram um aumento da produção de alimentos. Mas nem tudo o que se produzia
era consumido. O que “sobrava” era armazenado como estoque para o futuro ou era trocado por
outros produtos. Essa sobra é o que hoje chamamos de excedentes e foi muito importante para o
desenvolvimento do comércio.
2. Além disso, com o aperfeiçoamento das atividades agrícolas, uma parte da população passou a se
dedicar também ao comércio, outros ao artesanato, e outros (geralmente proprietários de terras e
grupos ligados a cultos religiosos) a chefiar as sociedades.
O aumento da produção agrícola provocou o crescimento da população e o aumento das cidades,
tornando necessária a construção de muralhas, pontes e sistemas de irrigação. Essas obras exigiam
organização e muito trabalho. Às vezes levavam o tempo de várias gerações para serem
construídas. Para executá-las era necessário um grupo de pessoas que coordenasse as atividades.
Liderado por um governante (geralmente um rei), esse grupo deu origem ao Estado.
Nas cidades, algumas pessoas que não tinham a necessidade de trabalhar para sua própria
subsistência começaram a se dedicar à investigação da natureza. As atividades intelectuais se
desenvolveram, dando origem aos primeiros filósofos, astrônomos, matemáticos etc.
Essas cidades deram origem às normas de organização social de enorme riqueza e complexidade.
A esse tipo de organização social chamamos civilização. Aliás, a palavra civilização vem do latim
civis, que quer dizer cidade.
Além de designar determinada forma de organização social e cultural, o termo civilização também
deriva do verbo “civilizar”, que significa educar alguém de maneira a torná-lo apto a conviver com
as outras pessoas dentro dos modelos de conduta de uma sociedade.
As culturas criadas pelas primeiras civilizações causam admiração nas pessoas até os dias atuais.
Mas o processo de dominação de uma cultura sobre a outra muitas vezes usou o ato de “civilizar”
o outro como justificativa para a imposição violenta da cultura dominante, o que resultou em
intolerância,desrespeito às diferenças culturais e em guerras.
A origem da civilização egípcia
3. “O Egito é uma dádiva do Nilo.” A frase é de Heródoto, historiador da Grécia Antiga, e mostra a
importância que esse rio teve na formação do povo egípcia. Suas águas cortam o nordeste da África
(uma região desértica), tornando o solo por onde passa bastante fértil.
No entanto, o rio, sozinho, não criou civilização alguma. Foram os homens e as mulheres
estabelecidos às suas margens que criaram uma cultura e uma maneira de se organizar
totalmente novas. Isso ocorreu tanto no norte, onde se destaca o delta, uma espécie de triângulo
próximo ao mar na desembocadura do rio, como no vale que acompanha o Nilo por mais de 1000
km.
Estudos arqueológicos revelam que antes de 5000 a.C. Grupos humanos já habitavam a região do
vale do Rio Nilo, numa faixa de 6 km de extensão de cada lado do rio. Acredita-se que o clima e a
vegetação da região eram bem diferentes do que se conhece atualmente. Áreas que hoje fazem
parte de desertos eram verdes e abrigavam diversos animais (elefantes, girafas, avestruzes,
antílopes etc). Isso atraiu grupos humanos desde a época paleolítica.
Aos poucos, com o crescimento da população, já na fase neolítica, as pessoas passaram a cultivar
trigo, cevada e a criar gado. Organizaram-se, assim, as primeiras comunidades agrícolas em torno
do Nilo, chamadas NOMOS. Essas aldeias eram autônomas, ou seja, eram independentes umas das
outras.
A grande concentração de NOMOS às margens do Nilo e o crescimento da população fez com
que houvesse um aumento na produção agrícola. Mas como plantar sem ser naquelas áreas que o
Nilo inundava e fertilizava naturalmente?
Esse desafio levou cada comunidade a buscar soluções. A principal delas foi a IRRIGAÇÃO, que,
aliada ao aperfeiçoamento de técnicas agrícolas, ajudou a resolver o problema da alimentação.
Uma hipótese sobre o surgimento do Estado no Egito
Por volta de 3500 a.C., os vários NOMOS, antes independentes, foram reunidos e passaram a ter
uma liderança única. Essa foi uma das primeiras formas de organização do Estado que se
conhece. Essa reunião de NOMOS deu origem a dois reinos: o Baixo Egito, no norte, formado
pelos NOMOS da região do delta, e o Alto Egito, localizado ao sul.
A união de diversos NOMOS possivelmente ocorreu em decorrência do crescimento democráfico
e de disputas pelo domínio de terras. Com o aumento da população e da produção de excedentes ,
começaram a surgir alguns problemas: quem iria supervisionar a construção de diques e
fortificações e administrar serviços públicos? Diante disso alguns grupos começaram a disputar
essas novas funções que antes não existiam.
Para solucionar os sucessivos conflitos, que duraram muitos séculos, instituiu-se o
4. reconhecimento de uma “autoridade superior”. Assim, um grupo prevaleceu sobre os demais e
passou a determinar as regras a serem seguidas por todos.
A união entre os 2 reinos só foi alcançada por volta de 3200 a.C. A primeira sede do poder
centralizado foi a cidade de Tínis, que mais tarde foi transferida para Mênfis. A autoridade máxima
reconhecida era o rei ou faraó. Ele tinha a função de manter a unidade, a ordem e a continuidade
do Estado egípcio.
Ao que parece,coube a um chefe do Alto Egito chamado Narmer ou Menés, não se sabe ao certo,
realizar a façanha de reunir os dois reinos. Assim, foi criado um Estado forte, que impunha a ordem
sobre os 42 NOMOS, cujos chefes (os nomarcas) tornaram-se representantes locais do faraó.
O controle dos diques e da irrigação das terras pelo Rio Nilo continuou sendo feito pelos NOMOS,
transformados em províncias subordinadas ao governo central. O surgimento do Estado egípcio
fez parte de um longo processo que levou mais de 2000 anos para se completar.
Nesse tempo, as antigas comunidades agrícolas autônomas se tornaram províncias do faraó, com
uma organização complexa e dividida em grupos, tendo cada grupo uma posição definida na
sociedade.
A divisão social e a economia no Egito Antigo
Na sociedade egípcia, as posições mais privilegiadas na pirâmide social eram ocupadas pelo faraó e
por sua família. A seguir vinham os sacerdotes, os funcionários do Estado (burocratas e militares) e
os nobres, muitos deles descendentes das famílias dirigentes dos NOMOS.
5. Os sacerdotes
Os sacerdotes chegaram a formar o grupo mais rico e influente do Egito. Além de interpretarem
os desejos dos deuses e cuidarem dos cultos, eles recebiam tributos e tinham isenção de impostos.
Isso fazia as riquezas dos templos crescerem continuamente.
Os escribas
Entre os burocratas vale destacar a função dos escribas. Além de supervisionar a administração,
eram responsáveis pelos registros por escritos do reino, que serviam principalmente para o controle
dos impostos e dos estoques de alimentos.
Os camponeses
Na base da sociedade egípcia estavam os camponeses. Também conhecidos como FELÁS, eles
eram obrigados ao pagamentos de tributos, a trabalhos forçados e estavam sujeitos a castigos
impostos por funcionários do Estado.
Os escravos
Havia também os escravos que trabalhavam nas minas e pedreiras estatais, nas terras reais e nos
templos. Em geral, eram prisioneiros de guerra e não constituíam um grupo numeroso, exceto
durante alguns períodos.
No Egito Antigo, a agricultura (cultivo do trigo, da cevada, do algodão, do papiro e do linho) foi a
prática mais importante. Os egípcios dedicavam-se também à criação de animais, como cabras,
carneiros e gansos. Praticavam a pesca e ocupavam-se da atividade artesanal. Desenvolveram,
ainda, a produção de tecidos, vidros e navios. Vale registrar também a atividade comercial, tanto
dentro do Egito como com o exterior, muito controlado pelo Estado.
6. Religião, ciência e arte
A religião foi muito importante no Egito Antigo, a começar por sua interferência direta no poder (o
faraó era um rei-deus). A religião egípcia caracterizava-se pelo POLITEÍSMO, ou seja, pela crença
em vários deuses (poly=vários), representados em formas humanas e animal. Quando os NOMOS
eram independentes, cada um deles tinham seus próprios cultos e divindades. Com a unificação
política. Alguns desses cultos foram impostos pelos faraós a toda a população. Foi o que aconteceu
com o culto dos deuses Amon-Rá (o Sol), Osíris (a fertilidade), Ísis, Hórus, e também Anúbis e
Ápis. Ainda assim, ao longo da história egípcia as divindades locais dos antigos NOMOS foram
preservadas.
Os egípcios acreditavam que, após a morte, a alma era enviada ao reino dos mortos. Depois seria
julgada no tribunal de Osíris e, tempos depois, voltaria ao mesmo corpo para uma nova vida.
Para o corpo se conservar e poder voltar a abrigar a alma a técnica de mumificação dos cadáveres,
conhecimento controlado pelos sacerdotes, foi aperfeiçoada.
A mumificação, prática que, em razão de seu alto custo, era destinada apenas para os mortos das
famílias mais ricas, permitiu aos egípcios desenvolver o conhecimento da anatomia humana. Isso
favoreceu o avanço da MEDICINA e o surgimento de especialistas em várias áreas, fraturas,
doenças de estômagos e do coração. Os egípcios chegaram até a realizar cirurgias cranianas com
sucesso.
O Egito também presenciou um notável desenvolvimento da Astronomia e da Engenharia. A
primeira auxiliava na determinação das épocas de plantio e de colheitas, o que permitiu a
elaboração de um calendário solar composto de 12 meses, cada mês com 30 dias. Já a Engenharia
evoluiu por meio da execução de obras públicas. A MATEMÁTICA,por sua vez, progrediu com o
sistema tributário. Vale lembrar, porém, que tais conhecimentos, produzidos e transmitidos
principalmente entre os sacerdotes, não eram acessíveis à maioria da população.
7. Arte e escrita
Esquema interior da Grande Pirâmide de Alnitak (Quéops)
Foram encontrados muitos vestígios da arte produzida pelos egípcios: esculturas, pinturas,
tumbas, templos etc. Esses últimos eram caracterizados por sua monumentalidade e sofisticação.
As pirâmides, com suas várias câmaras, são apenas uma pequena mostra do que os egípcios eram
capazes de fazer.
A grandiosidade das construções arquitetônicas, assim como as esculturas, que retratavam o faraó
e os membros de sua família, exprimiam a dimensão do poderio faraônico. A pintura caracterizava-
se pelo uso das cores nos objetos de usos funerários e cotidianos e pela representação humana.
No Egito Antigo, desenvolveram-se três tipos de escrita: a hieroglífica (sagrada), hierática (para
documentos) e a demótica (popular).
A decifração das escritas do Egito Antigo só se deu muitos séculos depois da conquista persa. Em
1799,um soldado do general francês Napoleão Bonaparte encontrou na região de Roseta, no Egito,
uma pedra com inscrições feitas em diferentes tipos de escritas. Coube ao estudioso francês Jean
François Champollion decifrá-las. A partir daí, iniciaram-se estudos cada vez mais aprofundados
sobre o Egito Antigo.
No século XX ganhou o impulso o desenvolvimento da egiptologia e dos estudos da Antiguidade
em geral. Ao trazer à tona dados e informações sobre os impérios antigos, o então governante
francês Napoleão Bonaparte buscava firmar seu prestígio e fortalecer seu próprio poder.
Os períodos da história egípcia
8. O Estado foi considerado um elemento tão marcante na vida do povo egípcio que muitos estudiosos
dessa civilização estabeleceram as divisões da história do Egito Antigo em torno das diferentes
dinastias que se sucederam no governo.
De forma simplificada, a História da antiga civilização egípcia foi dividida da seguinte maneira:
O Antigo Império (3200 a.C. - 2000 a.C.)
O Médio Império (2000 a.C. - 1580 a.C.)
O Novo Império (1580 a.C.-525 a.C.)
Existem 26 dinastias que se sucederam no poder durante quase 3 mil anos: desde a unificação do
Egito e o estabelecimento do poder dos faraós, por volta de 3200 a.C., até sua conquista pelos
persas, em 525 a.C.
O Antigo Império
Os faraós exerciam um rígido controle econômico, social e político por todo o reino, além de
promover a expansão do território para oeste, sul e nordeste. Desta forma, conseguiram consolidar
seu poder sobre todo o Egito Antigo.
Por volta do ano 2200 a.C., as cheias do Nilo diminuíram e isso trouxe sérias consequências para a
agricultura. A fome atingia camponeses e escravos, e a mortalidade era alta. Essa situação
contrastava com a riqueza dos burocratas, gerando revolta na população e conflitos entre monarcas.
Desgostosos com a situação, os nomarcas procuraram aumentar seus poderes locais para controlar
a crise. Para isso, colocaram-se acima do poder central do faraó. Foi uma época de divisão e
enfraquecimento político, o que favoreceu as invasões de povos asiáticos na região do delta do
Nilo.
O Médio Antigo
Perto de 2000 a.C., nomarcas da região de Tebas, no Alto Egito, expulsaram os invasores asiáticos e
retomaram o processo de unificação das várias províncias. Restabeleceram o poder centralizador e
a consequente unidade do Império.
Os faraós recuperaram sistemas de irrigação e áreas de plantio e anexaram novos territórios ao
império com campanhas militares vitoriosas ao sul.
Dois séculos mais tarde, por volta de 1800 a.C., começou uma nova onda de invasões de povos
vindos da Ásia, principalmente hicsos (simplificação de Hek Khasut, em egípcio, que significa
“governantes dos estrangeiros”). Eles estabeleceram seu domínio em boa parte da região, mas não
9. conseguiram submeter permanentemente Tebas, ao sul, que resistiu a sua conquista.
A dominação dos hicsos despertou forte sentimento de resistência. Os egípcios se uniram e, em
1580 a.C., sob o comando do faraó Amósis I, conseguiram expulsar os invasores. Assim, a unidade
territorial foi restabelecida e Tebas retomou a posição de capital do Egito.
O Novo Império
Nesse período, as conquistas militares ampliaram as fronteiras do império. Ganhou impulso a
atuação dos comerciantes, que exerciam atividades dentro do Egito e com a Ásia, inclusive tráfico
de escravos.
Destaca-se, ainda, o aperfeiçoamento da irrigação no século XIV a.C. Com o uso de um mecanismo
de elevação de água baseado no contrapeso, conhecido no Egito atual como shaduf.
O poderio e o esplendor alcançado nesse período podiam ser notados também nas construções,
exibidos nos templos de Karnac e Luxor, dedicado ao deus Amon.
Um destaque final cabe ao governo de Necao II (610 a.C. 595 a.C.). Além de intensificar o
comércio com a Ásia, ele também financiou a expedição do fenício Hamon. O navegador realizou
uma viagem singular para aquela época: partiu para o Mar Vermelho e, em três anos, contornou a
costa africana, retornando ao Egito pelo Mar Mediterrâneo.
Depois de Necao, surgiram divergências e disputas políticas entre a nobreza, os burocratas, os
militares e os sacerdotes. Somadas às rebeliões dos camponeses, revoltados contra as condições a
que estavam sujeitas, essas rivalidades determinaram o enfraquecimento do império. As invasões
tornaram-se frequentes e bem-sucedidas até que, em 525 a.C., os persas, comandados pelo rei
Cambises, destronaram a 26ª Dinastia e conquistaram o Egito, transformando-o em um a província
do Império Persa.