O documento discute a literatura barroca no Brasil, mencionando sua origem no início do século XVII, características como pessimismo e dualidade, e estilos como o cultismo e o conceptismo. Exemplos de obras e poetas barrocos brasileiros são apresentados, como Gregório de Matos e sua poesia lírico-amorosa e satírica. A influência do barroco também é vista na poesia sacra de autores como Padre Antônio Vieira.
29. A linguagem barrocaA linguagem barroca
I. Cultismo (Gongorismo)
- Linguagem rebuscada, extravagante;
- Jogo de palavras;
- Ênfase na forma;
- Valorização do pormenor;
- Uso exagerado da figura de
linguagem.
30. Infiéis Despedaçaram
O todo sem a parte não é todo;
A parte sem o todo não é parte;
Mas se a parte o faz todo, sendo
parte;
Não se diga que é parte, sendo o todo.
Em todo o Sacramento está Deus
todo,
E todo assiste inteiro em qualquer
parte;
E feito em partes todo em toda a
31. II. ConceptismoII. Conceptismo (Quevedismo)
- Linguagem mais acessível;
- Jogo de ideias;
- Ênfase no conteúdo;
- Valorização do argumento, do
raciocínio lógico;
- Retórica aprimorada.
32. O braço de Jesus não seja parte,
Pois que feito Jesus em partes todo,
Assiste cada parte em sua parte.
Não se sabendo parte deste todo,
Um braço que lhe acharam, sendo
parte,
Nos diz as partes todas deste todo.
(Gregório de Matos)
33. Nasce o Sol, e não dura mas que um dia,
Depois da Luz se segue a noite escura,
Em tristes sombras morre a formosura,
Em contínuas tristezas, a alegria.
Porém, se acaba o Sol, por que nascia?
Se formosa a Luz é, por que não dura?
Como a beleza assim se transfigura?
Como o gosto da pena assim e fia?
34. Mas no sol, e na Luz falte a firmeza,
Na formosura não se dê constância,
E na alegria sinta-se tristeza.
Começa o mundo enfim pela ignorância,
E tem qualquer dos bens por natureza
A firmeza somente na inconstância.
Gregório de Matos
35. porque amou sabendo. Para
inteligência desta amorosa verdade,
havemos de supor outra não menos
certa, e é que, no mundo e entre os
homens, isto que vulgarmente se
chama amor não é amor, é ignorância.
Pintaram os Antigos ao amor menino.
E a razão, dizia eu o ano passado, que
era porque nenhum amor dura tanto
que chegue a ser velho.”
(Pe.
39. Ardor em firme coração nascido;
Pranto por belos olhos derramados;
Incêndio em mares de água disfarçado;
Rio de neve em fogo convertido:
Tu, que em um peito abrasas escondido;
Tu, que em um rosto corres desatado;
Quando fogo, em cristais aprisionado;
Quando cristal em chamas derretido.
40. Se és fogo como passas
brandamente,
Se és neve, como queimas com
porfia?
Mas ai, que andou Amor e ti
prudente!
Pois para temperar a tirania,
Como quis que fosse a neve
41. Pintura admirável de uma beleza
Vês esse sol de luzes coroado?
Em pérolas a aurora convertida?
Vês a lua de estrelas guarnecida?
Vês o céu de planetas adorado?
O céu deixemos; vês naquele prado
A rosa com razão desvanecida?
A açucena por alva presumida?
O cravo por galã lisonjeado?
42. Deixa o prado ; vem cá, minha adorada:
Vês desse mar a esfera cristalina
Em sucessivo aljôvar desatada?
Parece aos olhos ser de prata fina?
Vês tudo isso bem? Pois tudo é nada
À vista do teu rosto, Catarina.
43. A mesma D. ÂngelaA mesma D. Ângela
Anjo no nome, Angélica na cara!
Isso é ser flor, e Anjo juntamente:
Ser angélica flor, e Anjo florente,
Em quem, senão em vós, se
uniformara:
Quem vira uma flor, que a não
cortara,
De verde pé, da rama florescente;
E quem um Anjo vira tão luzente,
Que por seu Deus o não idolatrara?
44. Se pois como Anjo sois dos meus
altares,
Fôreis o meu Custódio, e a minha
guarda,
Livrara eu de diabólicos azares.
Mas vejo, que por bela, e por
galharda,
Posto que os Anjos nunca dão
pesares,
46. Reprovações
Se sois homem valoroso,
Dizem que sois temerário,
Se valente, espadachim,
E atrevido, se esforçado.
Se resoluto, -arrogante,
Se pacífico, sois fraco,
Se precatado, - medroso,
E se o não sois, - confiado.
47. Se falais muito, palreiro,
Se falais pouco, sois tardo,
Se em pé, não tendes assento,
Preguiçoso, se assentado.
E assim não pode viver
Neste Brasil infestado,
Segundo o que vos refiro
Quem não seja reprovado.
48. Que falta nesta cidade? Verdade.
Que mais por sua desonra? Honra.
Falta mais que se lhe ponha? Vergonha.
O demo a viver se exponha,
Por mais que a fama a exalta,
Numa cidade onde falta
Verdade, honra, vergonha.
50. Buscando a CristoBuscando a Cristo
A vós correndo vou, braços sagrados,
Nessa cruz sacrossanta descobertos,
Que para receber-me, estais abertos,
E por não castigar-me, estais cravados.
A vós, divinos olhos
eclipsados
De tanto sangue e lágrimas
abertos,
51. A vós, pregados pés, por não
deixar-me,
A vós, sangue vertido, para ungir-
me,
A vós, cabeça baixa, p´ra chamar-
me.
A vós, lado patente, quero
52. pecado,
Da vossa piedade me despido,
Porque quanto mais tenho
delinqüido,
Vos tenho a perdoar mais
empenhado.
Se basta a vos irar tanto pecado,
A abrandar-vos sobeja um só
gemido,
Que a mesma culpa, que vos há
53. Se uma ovelha perdida, e já
cobrada
Glória tal, e prazer tão repentino
Vos deu, como afirmais na sacra
história:
Eu sou, Senhor, a ovelha
desgarrada
Cobrai-a, e não queirais, Pastor
divino,
54. A Jesus Cristo crucificado, estando oA Jesus Cristo crucificado, estando o
poeta para morrerpoeta para morrer
Meu Deus, que estais pendente em um
madeiro
Em cuja fé protesto de viver;
Em cuja santa lei hei de morrer,
Amoroso, constante, firme e inteiro:
Neste transe, por ser o derradeiro,
Pois vejo a minha vida anoitecer,
É, meu Jesus, a hora de se ver
A brandura de um pai, manso cordeiro.
55. Mui grande é vosso amor, e o meu
delito:
Porém, pode ter fim todo o pecar;
Mas não o vosso amor, que é
infinito.
Esta razão me obriga a confiar
Que por mais que pequei, neste
conflito,
Espero em vosso amor de me salvar.
57. (fragmento)
“(...) Basta, Senhor, que eu, porque
roubo em uma barca, sou ladrão, e
vós, porque roubais em uma armada,
sois imperador? Assim é. O roubar
pouco é culpa, o roubar muito é
grandeza: o roubar com pouco poder
faz os piratas, o roubar com muito,
os Alexandres... O ladrão que furta
para comer, não vai nem leva ao
58. os que não só vão mas que levam,
de que eu trato, são os outros _
ladrões de maior calibre e de mais
alta esfera... os outros ladrões
roubam um homem, estes roubam
cidades e reinos; os outros furtam
debaixo de seu risco, estes, sem
temor nem perigo; os outros se
furtam, são enforcados, estes
59. Sermão do MandatoSermão do Mandato
(fragmento)
“(...) Se amo, porque me amam,
tem o amor causa; se amo para
que me amem, tem fruto: e amor
fino não há de ter por que nem
para quê.. se amo porque me
amam, é obrigação, faço o que
devo; se amo para que me amem, é
negociação, busco o que desejo.
60. (...) amo, quia amo, amo ut
amem: amo, porque amo, e amo
para amar. Quem ama porque
o amam, é agradecido; quem
ama, para que o amem, é
interesseiro; quem ama, não
porque o amam, nem para que
o amem, esse só é fino.”