Um levantamento realizado pela Coordenadoria Setorial do Patrimônio Cultural (CSPC) mostrou que 70% dos imóveis tombados em Campinas estão em situação ruim ou razoável de conservação, enquanto apenas 172 estão em bom estado. A coordenadora da CSPC ficou chocada com os números e disse ser necessário mais incentivos para proprietários preservarem esses bens. Conselheiros propuseram novas medidas como concessões de prédios públicos à iniciativa privada.
1. “O levantamento
nos deixou
estarrecidos,
porque embora
soubéssemos que
havia muitos
imóveis em
situação ruim de
conservação, ver
os números nos
chocou.”
Coordenadora da CSPC
70% dos prédios estão sem conservação
DAISY RIBEIRO
PATRIMÔNIO CULTURAL ||| PRESERVAÇÃO
Maria Teresa Costa
DA AGÊNCIA ANHANGUERA
teresa@rac.com.br
Entre fachadas destruídas, pare-
des pichadas, deterioração pela
ação do tempo e por vândalos,
Campinas vai perdendo, nas
ruínas, boa parte de sua histó-
ria a cada dia. O tamanho do
passivo é grande: cerca de 70%
dos imóveis tombados como
patrimônio cultural da cidade
estão em estado razoável ou
ruim de conservação, viraram
ruínas ou foram demolidos, se-
gundo levantamento da Coor-
denadoria Setorial do Patrimô-
nio Cultural (CSPC). O retrato
da situação vai embasar um
plano de ação de gestão do pa-
trimônio, que o Conselho de
Defesa do Patrimônio Cultural
de Campinas (Condepacc), co-
meça elaborar neste semestre.
O levantamento, que vem
sendo realizado desde 2018 pe-
los técnicos da CSPC, Sandra
Milne-Watson e Augusto Bue-
no da Silva, mostrou que dos
582 imóveis avaliados, apenas
172 estão restaurados ou em
bom estado de conservação.
Mas 410 deles precisam de in-
tervenção urgente. “A situação
nos mostrou duas questões im-
portantes. Uma, a necessidade
de critérios mais rigorosos para
não termos excesso de tomba-
mentos porque é difícil para os
setores privado e público res-
taurarem os imóveis por causa
da disponibilidade de recursos.
Outra é a necessidade de mais
ferramentas, além da isenção
do IPTU e da transferência de
potencial construtivo, para in-
centivar proprietários a recupe-
rar os bens tombados”, infor-
mou a historiadora e coordena-
dora da CSPC, Daisy Ribeiro.
O acervo de bens tombados
em Campinas é grande e docu-
menta, nas ruas, como a cida-
de se desenvolveu ao longo das
décadas. Mas sem uma ação
efetiva de preservação, pode
ser perder. O Condepacc, se-
gundo Daisy, já vem adotando
posições em relações aos tom-
bamentos como, por exemplo,
evitar tombar um imóvel se já
existe outro, do mesmo perío-
do, técnica construtiva e impor-
tância tombado. “Por mais que
a gente fique tentada a tombar
todos, já temos com clareza
que isso não garante a preserva-
ção”, afirmou.
“O levantamento nos dei-
xou estarrecidos, porque embo-
ra soubéssemos que havia mui-
tos imóveis em situação ruim
de conservação, ver os núme-
ros nos chocou”, disse Daisy.
Na reunião do Condepacc em
que o inventário foi apresenta-
do, surgiram várias propostas
dos conselheiros, que concor-
dam com a necessidade de um
plano de ação para garantir a
sobrevivência do patrimônio
cultural da cidade.
O conselheiro Roberto Si-
mionatto propôs que os pré-
dios públicos tombados sejam
objeto de concessão e leilão, pa-
ra que os interessados possam
usar a área por 30 anos, arcan-
do com a restauração e manu-
tenção do manifesta preocupa-
ção com prédio tombado públi-
co, e cita particularmente as ruí-
nas. Propõe que para este tipo
de prédio, sejam feitas conces-
sões e leilões, de forma que os
interessados possam utilizar a
área por 30 anos, arcando com
a restauração do prédio e ma-
nutenção. O conselheiro Sinval
Dorigon sugeriu que a propos-
ta fosse estendida aos prédios
particulares e que, após os 30
anos, fosse cobrado o valor de
aluguel. Além disso, propôs
que as contrapartidas investi-
das por empresas em Campi-
nas, direcionadas para a área
de saúde e educação, incluam
também os bens tombados.
Os prédios públicos tomba-
dos, segundo Daisy Ribeiro,
vêm tendo algumas ações para
a conservação, mas as propos-
tas para restauração e recupera-
ção de exemplares importantes
para a história da cidade, ainda
estão longe de ocorrer. Mas há
alguns bons exemplos de res-
tauração de imóveis públicos
tombados, como a Estação Cul-
tura e um dos edifícios do Insti-
tuto Agronômico de Campinas
(IAC), que foram recuperados
pela mostra Campinas Decor.
A mostra também recuperou o
edifício do antigo Colégio Ate-
neu, em frente à Prefeitura.
Prédios privados, como o
Jockey Club Campinas, passa-
ram por recente recuperação
utilizando o mecanismo conhe-
cido por transferência de poten-
cial construtivo, que permite
aos proprietários vender para
investidores, o potencial que a
área tem para construção se
não houvesse no local um bem
tombado. Os R$ 1,15 milhão
usados nas intervenções do pré-
dio vieram dessa transferência.
História em ruínas ocupa
bens públicos e privados
Casarão Jambeiro, na Fazenda Jambeiro, compõe o grupo de exemplos do descaso com o passado da cidade
Prédio Lidgerwood, localizado no Centro de Campinas e onde funcionava o Museu da Cidade, pede socorro
As ruínas da história de Campi-
nas incluem bens públicos e
privados, praticamente na
mesma proporção. Há alguns
imóveis que já se tornaram
símbolos do descaso com o pa-
trimônio da cidade: a casa-se-
de da Fazenda Jambeiro, no
Parque Jambeiro, e a antiga
Cervejaria Columbia, na Aveni-
da Andrade Neves. Os dois são
ruínas: a ação do tempo e do
vandalismo levou portas, jane-
las, telhados. O da Columbia
só não caiu porque está escora-
do e a casa do Jambeiro, sem
proteção, vai pelo mesmo ca-
minho.
A historiadora da Coordena-
doria Setorial do Patrimônio
Cultural, Daisy Ribeiro, disse
que há projeto para a proteção
da casa do Jambeiro e o edital
para a contratação de conser-
vação do telhado, as estruturas
e proteção do entorno está em
andamento na Prefeitura.
“Nosso problema é falta de re-
curso”, disse.
O antigo prédio da Cerveja-
ria Colúmbia, na Avenida An-
drade Neves. Têm 2,6 mil me-
tros quadrados de área e foi
construído em 1873 para abri-
gar a Cia MacHardy, primeira
fundição de Campinas, que se
transferiu para a avenida, bem
próximo de sua concorrente, a
Fábrica Lidgerwood. Já foi
anunciada a intenção de recu-
perar o lugar para receber um
centro de cultura popular que
ainda permanece sendo ape-
nas um plano.
O complexo ferroviário cen-
tral, que foi transformado em
Parque Cultural pelo Conde-
pacc, também precisa urgente
de intervenção. A estação foi
recuperada pela Campinas De-
cor, mas o restante continua
esperando recuperação. Sem
cuidados, o prédio da oficina
da Companhia Mogiana, den-
tro do complexo, chegou a ser
utilizado pela Empresa Munici-
pal de Desenvolvimento de
Campinas (Emdec) como de-
pósito de carros apreendidos.
A CSPC interferiu e este ano
grande parte dos carros que es-
tavam dentro do prédio foi reti-
rada e a edificação foi limpa.
Andando pelas ruas, se de-
para com muitas ruínas. Na
Rua Cônego Cipião, no Cen-
tro, está o que restou da resi-
dência da professora Silvia Si-
mões Magro, do final do sécu-
lo 19. A casa foi adquirida por
uma construtora em 1988, que
em 1989 demoliu parte do pré-
dio, danificando forro e piso.
O madeiramento em pinho de
riga ficou exposto e desapare-
ceu. A lista é longa de bens
que precisam de socorro: a an-
tiga fábrica da Lidgerwood on-
de funcionava o Museu da Ci-
dade e que foi transferido por
falta de segurança da edifica-
ção para a manutenção do
acerto; vários imóveis no Cen-
tro precisam de restauro e há
um acervo ferroviário esperan-
do que o poder público arrega-
ce as mangas. (MTC/AAN)
Levantamento indica que 410 dos 582 imóveis avaliados carecem de algum tipo de intervenção
Fotos: Denny Cesare/AAN
Proposta prevê apoio
da iniciativa privada
como contrapartidas
Como o complexo ferroviário transformado em polo artístico
CORREIO POPULAR A7CIDADES
Campinas, quinta-feira, 4 de julho de 2019
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