SlideShare ist ein Scribd-Unternehmen logo
1 von 8
O Retorno a Freud de Lacan




                                                       O retorno a Freud de Lacan
                                                                   Maria Lúcia Salvo de Coimbra

Resumo
Ao retornar a Freud, Lacan reinventa a psicanálise, sem abandonar o campo freudiano. Ele
enfatiza a incidência do desejo na transmissão. Considera a dimensão do real, sua articulação
com o ato e a função da escrita. Desta forma, nos convoca a tratar o gozo e o sofrimento do
sintoma, hoje.

Palavras-Chave
Transmissão – Discurso do analista – Ato – Retorno a Freud – Ética da psicanálise




    É “... preciso que cada psicanalista                obrigada a se reinventar ao enfrentar no-
reinvente, a partir do que ele extraiu de               vos problemas e porque é exigência da sua
sua própria análise, a maneira pela qual a              própria transmissão. Precisamos continu-
psicanálise pode perdurar”1.                            ar e, quem sabe, avançar nossas indaga-
                                                        ções sobre a posição do psicanalista em
A transmissão da psicanálise                            face do mal-estar. Não sem saber que sus-
                                                        tentamos um trabalho de psicanalistas,
     A constituição desta mesa nos con-                 operando na singularidade do discurso
voca a buscar, criar, ou mesmo inventar                 psicanalítico. Um trabalho que interroga
pontos de articulação entre diferentes po-              tanto a divisão do sujeito e aquilo que cau-
sições teóricas no campo da psicanálise,                sa seu desejo quanto o limite do próprio
especificamente, entre Freud, Melanie                   saber. O sujeito está em questão na estru-
Klein e Lacan.                                          tura do aparelho psíquico e podemos nos
     Desta forma, temos a oportunidade de               perguntar se sua localização mudou des-
partilhar impasses, questões e dúvidas em               de a época freudiana.
cada prática e talvez elaborá-las melhor.                    No início do século passado, assisti-
     Atualmente, no meio psicanalítico,                 mos à decadência do pai. Freud, com o
proliferam tentativas veladas ou explíci-               complexo de Édipo e o mito do pai prime-
tas de ultrapassar a teoria freudiana ou de             vo, em parte obturou esta falha, tentando
adaptá-la a uma suposta realidade do                    dar consistência a algo que desvanecia.
“mundo moderno ou pós-moderno”. Po-                     Lacan analisa essa consistência imaginá-
rém, desde sua origem, a psicanálise foi                ria e provoca a ruptura nesse ponto já frá-
                                                        gil, mas não de qualquer forma. Aponta a
1. LACAN, J. “Congresso sobre a transmissão” (1978).
                                                        ex-sistência, ou seja, a dimensão do real;
   Rev. Letra Freudiana, ano XIV, n. 0’, p. 66.         a função da escrita e do falo como letra.
                                         Reverso • Belo Horizonte • ano 29 • n. 54 • p. 29 - 36 • Set. 2007   29
Maria Lúcia Salvo Coimbra


          Os psicanalistas, como qualquer um,                        A prática psicanalítica implica envol-
     estão inscritos no simbólico, submetidos                   vimento do analista com os acontecimen-
     à sua dimensão de verdadeiro-falso; cer-                   tos de sua época, “... pois, como poderia fa-
     to-errado. Desta forma, podem se insta-                    zer de seu ser o eixo de tantas vidas quem
     lar no lado imbecil do saber, alienados a                  nada soubesse da dialética que o compromete
     algum significante do ideal ou ao próprio                  com essas vidas em um movimento simbóli-
     fantasma. Até mesmo a teoria psicanalíti-                  co?”3 Assumir esse compromisso exigiria
     ca pode induzir ao erro – por exemplo, a                   afastarmo-nos da cômoda divisão bem-
     amarração do complexo de Édipo, perce-                     mal e sustentarmos que, até mesmo, atos
     bida como a única possível –, embotando                    perversos ou violentos são cometidos por
     a descoberta de outras possibilidades e o                  seres humanos nem sempre psicóticos e
     trabalho com o real. Daí a importância da                  têm valor tanto de gozo quanto de verda-
     interlocução com um ponto fora do dis-                     de.
     curso psicanalítico para desalojá-lo de sua                     Considerar esses dois pontos – por um
     própria debilidade mental. Assim, os ana-                  lado, a responsabilidade de cada analista
     listas ficam advertidos2 do ponto fora: o                  com seu paciente, enlaçada ao compro-
     que ex-siste é fundamental.                                misso com o simbólico, e por outro lado, a
          Se não há garantia da tomada do su-                   irrupção de atos perversos, impulsivos, sem
     jeito no campo do Outro, estar aí engan-                   sentido – significa que, como analistas, nos
     chado depende do acaso, é acidental, po-                   encontramos desalojados de uma certa
     deria não ter ocorrido e o modo como cada                  neutralidade, defendida por alguns.
     sujeito se inscreve na estrutura não só é                       Conseqüentemente, temos que con-
     precário como muito particular. Em aná-                    siderar uma nova posição clínica para o
     lise não se trata de retificação. Trata-se                 analista, a de semblante de objeto, que
     de tocar um real que não se move. A es-                    opera com o desejo do analista. Nem se-
     critura que faz a borda do real é uma in-                  ria tão nova assim, para um leitor atento
     venção de cada análise, sustentada pela                    de Freud. No seu texto “A Interpretação
     ética do bem dizer. Em que momento as                      de Sonhos”, ele nos ensina que é necessá-
     palavras passam à escritura? Quando se                     rio um trabalho para extrair a função do
     perde o sentido como significado e deses-                  desejo: o ato da interpretação articula de-
     tabiliza-se a significação metafórica e me-                sejo e o real da experiência de satisfação,
     tonímica, defrontando-se com o sentido:                    produzindo um saber específico da práti-
     não há relação sexual. Então, além deste                   ca psicanalítica. Colocamos esse saber à
     trabalho no particular, também nos impli-                  prova quando questionamos nossos con-
     camos na psicanálise em extensão – em                      ceitos para verificar se continuam funcio-
     escolas, hospitais, prisões – e somos con-                 nando. Ao fazer isto, algum novo fragmen-
     vidados a generalizar para a mídia. Acres-                 to de verdade pode irromper. Desta for-
     cente-se ainda o risco de se extraviar no                  ma, sem abandonar balizadores teóricos,
     preconceito ou na demanda.                                 transmitimos a aventura psicanalítica na
          Talvez o que o analista tenha a dizer se              criação e na invenção.
     relacione, em síntese, com limites – inclu-
     sive o da própria psicanálise –, com o fran-               Retornar a Freud
     quear destes (sintomas, comportamentos
     impulsivos) e com o abrir passagem para o                     Lacan nasceu em 1901 e faleceu em
     desejo e o gozo, sem passagem ao ato.                      1981. Durante quase 30 anos, em seus

     2. Desejo do analista é desejo “averti” (advertido, avi-   3. LACAN, J. “Fonction et champs de la parole et du
        sado, prevenido).                                          langage” (1953), Écrits, p. 321.

30   Reverso • Belo Horizonte • ano 29 • n. 54 • p. 29 - 36 • Set. 2007
O Retorno a Freud de Lacan


seminários, conferências, entrevistas e                   intervalos tornando possível a emergên-
obra escrita empenhou-se, segundo suas                    cia de algo novo.
palavras, em restaurar, “no campo aberto                       O que é o retorno a Freud, proposto
por Freud, a lâmina cortante de sua verda-                por Lacan? Qual a sua leitura? Lacan nos
de”4.                                                     fornece pistas em seus vários seminários.
     Ler o Freud de Lacan implica isolar                  Diz não ser agarrado, apreendido senão
determinadas proposições ou enunciados                    por seus segredinhos6. Por outro lado, in-
que têm o peso do ato fundador. Nesse                     quieta-se, aterroriza-se mesmo por sentir-
sentido, podemos compreender a frase de                   se responsável em abrir as comportas, atra-
Lacan, repetindo Picasso, “Eu não procu-                  vés de seu ensino, de alguma coisa sobre a
ro, acho”, pois ele inventa, ou seja, en-                 qual poderia ter silenciado7. Ao falar e es-
contra o que já estava lá e fora esquecido.               crever sobre inconsciente, desejo, gozo e
Extraiu do texto freudiano o objeto “a”, o                tantas outras coisas é responsável mesmo
real, o imaginário e o simbólico e lhes deu               que não saiba qual o destino que terão suas
esses nomes. Ao fazer isto – ao mesmo                     idéias lidas, ouvidas.
tempo em que se apropria da Lingüística,                       Assim, interrogar sobre o autor enla-
cujos conceitos muitas vezes subverteu, e                 ça-se com a questão sobre o leitor. Freud
da Matemática, Lógica e Topologia, abrin-                 autor; Lacan autor-leitor de Freud; nós
do para estas ciências, também, novas                     leitores de Lacan e Freud e também, se
possibilidades –, Lacan operou uma cons-                  me permitem a ousadia, autores em certo
trução que transformou o rumo da psica-                   sentido, pois eles nos ensinam que o tra-
nálise, sem abandonar o campo freudia-                    balho da psicanálise envolve tanto um
no. Estabeleceu o discurso psicanalítico,                 deciframento – o inconsciente é estrutu-
cuja eficácia é no real. Fundador de uma                  rado como uma linguagem – quanto um
discursividade, sua nominação foi ato cri-                ciframento de gozo. Por isto, qualquer lei-
ador de novos sentidos, inaugurador de                    tura envolve deciframento – temos que
novas direções.                                           apreender, agarrar os segredinhos espalha-
     Existem autores que se diferenciam                   dos pelo texto – e envolve ciframento –
como inauguradores de uma discursividade.                 os segredinhos que escolhemos, o trilha-
A expressão é de Foucault e com ele pode-                 mento feito nos implica como sujeitos e
se colocar uma questão: “O que é um au-                   assinala a marca de cada um. Só recebe-
tor?”, título de sua conferência em 22 de                 mos de fato uma herança quando a con-
fevereiro de 1969. Nesta ele refere-se a                  quistamos...
um tipo especial da função “autor5 – os                        “Aquilo que herdastes de teus pais, con-
fundadores, inauguradores, de uma discur-                 quista-o para possuí-lo. O que não se usa, é
sividade –, no qual o retorno ao texto e o                uma carga pesada, somente aquilo que o ins-
nome próprio são fundamentais. Contu-                     tante cria pode servir!”8 Pode-se dizer que
do este retorno transforma o texto, cria                  isto é transmissão em psicanálise? Quan-
diferenças ao se apropriar dele. Volta-se                 do o desejo de alguém se enlaça ao do
ao que o texto não diz, a seus vazios, seus               Outro, escrevendo em um contorno sin-
                                                          gular as marcações para o real?


4. LACAN, J. “Carta de Dissolução” (1980). Rev. Letra
   Freudiana, ano I, n. 0, p. 45, e na “Ata de Fundação   6. LACAN, J. ... ou pire, lição de 8 de março de 1972, p.
   da E. F. P”, 1964, p. 17.                                 66.
5. A função “autor” é exercida no lugar vazio que o       7. LACAN, J. L   ’insu que sait de l’une-bévue s’aile à mour-
   apagamento do nome do autor estabelece. Ver FOU-          re, lição de 11 de janeiro de 1977, p. 9.
   CAULT, M. Estética: literatura e pintura, música e     8. GOETHE. Théatre complet, p. 971 (Tradução da au-
   cinema, p. 274.                                           tora).

                                           Reverso • Belo Horizonte • ano 29 • n. 54 • p. 29 - 36 • Set. 2007             31
Maria Lúcia Salvo Coimbra


          Contudo, não podemos ignorar que                   mesma coisa – dito de outra forma, o que aí
     herdamos textos freudianos, lacanianos,                 está penhorado é a exigência mínima de pas-
     neles fazemos nossas escolhas. Heresias?                sagem a este questionamento renovado. A
          Considerando que a leitura é subjeti-              exigência mínima é esta: Trata-se de fazer
     va e que um texto está aberto a múltiplos               psicanalistas”10. Podemos “ouvir” que o
     sentidos, mas não todos, não podemos ig-                compromisso de Lacan com a formação
     norar também que a tradução, interpre-                  de analistas o levou a questionar a função
     tação ou leitura pode se organizar como                 dos termos freudianos? Ao longo desse
     traição. Qual a boa medida ou a justa se-               “questionamento renovado” ele constrói
     paração entre autor e leitor que afasta o               o registro do real, do gozo, do objeto “a”.
     mimetismo ou a traição e ao mesmo tem-                  Dessa dimensão além do significante, o ato
     po preserva a marca do leitor? Como po-                 analítico opera a rearticulação do sujeito
     demos ser lacanianos? Questão que, como                 ao desejo e ao gozo. A construção lacani-
     sabemos, faz eco ao texto de Montesquieu                ana – utilizando-se de restos deixados por
     “Como é possível ser persa?”. Estrangei-                Freud – muda o rumo da teoria e da práti-
     ros, como o ensino de Lacan ressoa em                   ca psicanalísticas, sem abandonar o cam-
     nós? Como saber de quais vestimentas                    po freudiano, onde cada analista de novo
     precisamos nos livrar para penetrar em                  é convocado a se apropriar dessa heran-
     seus textos? Talvez para quase trinta anos              ça. Como já lhes falei, Freud nos havia
     de ensino, o trabalho de decifrar e cifrar              indicado o imperativo ético onde o desejo
     tenha que ter uma boa lentidão... para que              está em causa.
     o ato, no princípio, se esclareça em parte.
     Como o ato fundador de Lacan se articu-                 O ato analítico
     la ao ato que nos autoriza analistas tanto
     em nossa experiência de análise quanto                       Durante anos sofrendo a crítica de só
     em nossa prática? Talvez, fora do contex-               se preocupar com palavras, ao incluir a
     to sociocultural francês, longe da captura              dimensão do ato o escândalo invade a psi-
     imaginária que acompanhou o homem                       canálise. Há algo desorganizador. Mas isto
     Lacan, possamos ler seus textos da boa                  “é confuso!”, “é complicado!” – dizem
     forma – apenas como forasteiros, que sem-               agora os críticos. E têm razão. No simbó-
     pre seremos, habitando um espaço, uma                   lico nos entendemos, somos razoáveis.
     dimensão9 que não nos pertence: a língua.               Mas, este registro apaziguador não dá con-
          Insisto na questão: Como podemos ser               ta de tudo. Todos esbarramos, tropeçamos,
     lacanianos se o próprio Lacan se dizia freu-            em maior ou menor grau, com o desmedi-
     diano? Certamente não é supor que de-                   do, com o incomensurável, até a radicali-
     vemos ser uma encarnação de Lacan, da                   dade do crime.
     mesma forma que este não é a encarna-                        Mesmo o ato falho que surge a partir
     ção de Freud. Pode-se “ouvir” o que La-                 da articulação das palavras surpreende. A
     can nos diz através de seus seminários...               pessoa não sabe o que disse... não queria
     piratas! “O que eu tento fazer é restituir aos          dizê-lo... e o próprio registro das palavras
     termos freudianos sua função. Do que se tra-            se torna enigmático.
     ta nestes termos é de uma perturbação dos                    Quando a prática psicanalítica se abre
     próprios princípios de questionamento. Dito             à dimensão do ato, profundas mudanças
     de outra forma, o que não quer dizer: dizer a           se produzem.


     9. Referência ao equívoco dimension, dit-mension, dit   10. LACAN, J. D’un Autre à l’autre, lição de 8 de janei-
        mansion.                                                 ro de 1969, p. 92 (tradução e grifo da autora).

32   Reverso • Belo Horizonte • ano 29 • n. 54 • p. 29 - 36 • Set. 2007
O Retorno a Freud de Lacan


     No período pós-freudiano, mas antes              Se sabemos que a loucura e o desme-
de Lacan, as preocupações nesta área se          dido têm um lugar na estrutura psíquica,
reduziam, com algumas exceções, a formas         não significa que tenhamos que compac-
obsessivas de evitar qualquer ação. A psi-       tuar com isto. Devemos pensar clinica-
canálise deveria se manter no pensamen-          mente. Se alguns pacientes chegam “mui-
to, ou pior, na expressão dos sentimentos,       tos loucos”, é preciso implicá-los como
isto é, no eixo imaginário.                      sujeitos. Isto não tem a ver com os princí-
     Com a chamada releitura do texto            pios morais do analista, com aquilo que
freudiano, feita por Lacan, a perturbação        ele julga ser certo ou errado. Mas, pode
profunda do pulsional emerge e à como-           levar a um certo mal-entendido, ao se re-
ção teórica corresponde a comoção na             lacionar moralismo e um outro tipo de
prática. Analistas desalojados da nossa          extravio pelo qual talvez a própria psica-
neutralidade suspeita, não podemos cru-          nálise seja responsável. A saber, que a psi-
zar os braços e fingir que o horror não está     canálise tem como objetivo libertar o in-
à nossa porta ou que o pecado não mora           divíduo, que este deve fazer tudo o que
ao lado... Acabou-se o sossego dos analis-       quer, livre de culpa.
tas, mas ganhou a psicanálise. Como La-               Não é assim. Não se pode fazer o gozo
can revelou, todo ato provoca inquieta-          da loucura. No ato analítico, temos que
ção ou mesmo horror. Portanto, dele os           implicar o sujeito, que tem, também, res-
analistas se afastaram sem nada querer           ponsabilidade pela própria análise. Se sa-
saber. É verdade que não há articulação          bemos que há um limite, não se pode fa-
entre saber e ato.                               zer de conta que não há.
     Então qual a saída?                              O sujeito diz que está louco... e vai
     Podemos passar do fracasso do saber         ter que ceder sua loucura. O analista não
para o saber em fracasso. “Como pude fa-         deve ficar só ouvindo. O sujeito precisa se
zer isto?” “Por que faço isto se sei que me      comprometer no discurso analítico (assim
prejudica?” Há algo, além do prazer, que         como o analista). O inconsciente não pode
arrasta o ser humano para ações enlou-           servir como uma desculpa. É uma respon-
quecidas. Além do princípio de prazer te-        sabilidade.
mos o gozo. Atos impulsivos, rupturas às
vezes devastadoras podem encontrar seu           A ética da psicanálise
limite, seu contorno pelo ato psicanalítico.
     Há no ato uma questão. Toca-se uma              Mas, o que é mesmo a prática psica-
área irrepresentável: a dimensão do real         nalítica que inclui o real?
que está fora-significação. O sujeito não            A constituição do sujeito (S) no cam-
sabe dizer o que aconteceu. Cabe ao ana-         po do Outro produz sempre perda, restos
lista não deixar escapar esse algo que se        não articulados na cadeia significante. É
desconhece, o não-saber.                         traumática. Esses restos de cenas vividas
     Se o real, por definição, encontra-se       e ouvidas11 retornam como fragmentos
fora-significação, o ato analítico – situa-      que não se encaixam na cadeia significan-
do na vertente do ato em geral, da mesma         te. Retorno que tem uma exterioridade
forma que o acting-out e a passagem ao ato,      para o sujeito12; resta algo inacessível ao
porém diferente de ambos, pois supõe a           simbólico: é o objeto perdido freudiano
pulsação de um tempo lógico na travessia
do fantasma – não só se diferencia de atos
impulsivos, como é a forma de tratá-los,         11. MASSON, J.M. A correspondência completa de Sig-
                                                     mund Freud para Wilhelm Fliess – Cartas de 2/5, 16/
operando a rearticulação do sujeito ao               5 e 25/5/1897.
desejo e ao gozo.                                12. FREUD, S. “O estranho” (1919), ESB, v. XVII.

                                  Reverso • Belo Horizonte • ano 29 • n. 54 • p. 29 - 36 • Set. 2007       33
Maria Lúcia Salvo Coimbra


     que Lacan formalizou como objeto “a” e                      Repetindo, a compulsão à repetição é
     articulou na dimensão do real.                         a insistência de um gozo excessivo que ir-
          Real compreendido como aquilo que                 rompe em ato. Ato que traz em si a opaci-
     retorna sempre ao mesmo lugar e como                   dade do real e, ao mesmo tempo, é tenta-
     impossível (modalidade lógica). Articula-              tiva de resposta a essa opacidade.
     se com a lógica do não-todo e não pode                      Afirmamos que o percurso de uma
     ser alcançado através da representação.                análise pode modificar a economia do
          Com o registro do real temos a for-               gozo para um sujeito. O que isto quer
     malização lacaniana da pulsão de morte,                dizer?
     do masoquismo primário, do benefício se-                    Estamos propondo nova leitura do
     cundário da doença, da reação terapêuti-               ponto de vista econômico freudiano, isto
     ca negativa, e outras noções trabalhadas               é, como se distribuem, se deslocam, se pre-
     por Freud.                                             servam e se perdem as quantidades de
          Dito de outra forma, a constituição               energia que circulam no aparelho psíqui-
     do sujeito no campo do Outro implica a                 co. Estamos propondo substituir essa ener-
     operação de alienação e, ao mesmo tem-                 gética freudiana por uma economia polí-
     po, a separação do objeto. Isto significa que          tica de gozo. Economia porque o gozo se
     o humano perde a relação com o vital ins-              produz, se perde ou se ganha, e política
     tintivo, e o corpo é perfurado pelo signifi-           porque a produção, o ganho e a perda de
     cante. Há uma máquina significante em                  gozo se inscrevem em uma estrutura de
     funcionamento, sempre produzindo algo                  discurso.13
     que cai – o objeto “a”, causa de desejo e                   Com este referencial teórico, a per-
     também condensador de gozo. Este obje-                 gunta sobre a prática se situa em uma di-
     to está fora significante e fora significado,          mensão ética, envolvendo, portanto, o
     irrompendo pela repetição em ato, que é                desejo, o gozo, a responsabilidade do ana-
     a forma como o real se apresenta. Portan-              lista e se afastando das normas e ideais
     to, temos o enlace repetição-gozo (real).              obsessivos de outrora, para regulação dos
          Considerar, trabalhar e suportar o                atos. Como conduzir uma cura se temos,
     fracasso na recuperação desse algo que                 por um lado, a trama significante do sin-
     escapa (a mítica experiência de satisfa-               toma, enigma que se oferece ao sujeito, e,
     ção, o objeto perdido que Lacan desig-                 por outro lado, temos algo a mais: a di-
     nou objeto “a”) promove mudança na                     mensão repetitiva que escapa ao falar e
     economia de gozo para um sujeito e dife-               que mostra o gozo vivido pelo sujeito?
     rencia a cura analítica dos tratamentos                Gozo que ele não quer abandonar e do
     psicoterápicos.                                        qual nada sabe.
          Se cada ser humano ao inscrever-se                     Então, o que faz o analista?
     no simbólico tem que se haver com uma                       Ele funciona como testemunha e su-
     perda estrutural, pois o que foi excluído              porte da impossibilidade de tudo dizer pela
     do simbólico, o resto da operação signifi-             via da associação livre. Não se trata de
     cante, isto é, o real (o gozo, o objeto “a”),          recuperar lembranças porque não há nada
     retorna em ato; se o corpo mortificado pelo            a ser recuperado. Também não é injetar
     significante é invadido por uma “energia”,             significantes para recobrir a hiância. E
     um gozo que – escapando ao domínio sig-                mais ainda, deve fazer avançar a análise
     nificante – está à deriva e pode ser defini-           no sentido de inventar alguma passagem
     do como satisfação de uma pulsão; então,               ao gozo inter-dito para todo ser falante.
     não podemos fingir que nada d’Isso exis-
     te. Estamos obrigados a incluir Isso em                13. COIMBRA, M.L.S. “Considerações sobre o objeto
     nossa práxis.                                              ou T.T.Y. M.U.P in Reverso, n. 47, p. 36-41.
                                                                               .T.”

34   Reverso • Belo Horizonte • ano 29 • n. 54 • p. 29 - 36 • Set. 2007
O Retorno a Freud de Lacan


Opera com o ato analítico a rearticulação                 ente, se é sujeito suposto saber... o que faz
sujeito-desejo-gozo suportando o desas-                   com esse poder?
sossego que se instaura ao recusar seguir                      Em primeiro lugar, reconhecê-lo; em
modelos identificatórios. A responsabili-                 segundo, deveria saber que esse “poder
dade do analista é sua função de causa de                 significante” está limitado pelo real, que
onde lhe retornam as conseqüências de                     não pode ser atingido pelas significações
seu ato, criando através deste a possibili-               e onde nem mesmo se coloca a questão
dade de escrita (ou escritura).                           verdadeiro-falso. Finalmente, deveria sa-
     Considerar que o real do gozo precisa                ber que se inventa, em um processo de
ser tratado em análise nos aproxima de                    análise, a verdade de cada um, com máxi-
nossos pacientes. Podemos incluir em nos-                 ma particularidade.
sa clínica os borderline de outrora, psicóti-                  Diante da redução e do extravio das
cos e perversos ousando apostar na pro-                   explicações psicologizantes e biologizan-
dução de um novo sujeito, graças a uma                    tes, Freud responde com a construção de
mudança na economia do gozo. Como                         “nossa mitologia”.
fazê-lo? Trabalhando a relação do sujeito                      Diante das “dificuldades” da prática
ao objeto a (causa de desejo e condensa-                  (resistência, compulsão à repetição...) vai
dor de gozo), considerando a fórmula do                   delimitando um território, fora do domí-
fantasma (S a e a S), sabendo que a                       nio do princípio de prazer e das leis signi-
formalização da junção-disjunção do S e                   ficantes, e ao mesmo tempo indicando a
objeto a é fundamental, axiomática (vide                  possibilidade de sua ultrapassagem.
grafo do desejo). Mas, também é funda-                         Hoje, podemos compreender o texto
mental o trabalho de construção-descons-                  freudiano nesta dimensão porque Lacan
trução fantasmática para cada sujeito. Te-                a formalizou.
mos que arriscar o “salto” do conceito,                        Trabalhar com o conceito de real pro-
fórmula ou axioma do fantasma para uma                    duz modificações profundas em toda a te-
prática singular, articulável à teoria: “...              oria e prática psicanalíticas: no conceito
nossa concepção do conceito implica que este              de inconsciente (separação Isso[das Es] e
é sempre estabelecido por uma aproximação                 inconsciente); na insistência da repetição
que não é sem relação com aquilo que nos                  em ato que se distingue da insistência do
impõe, como forma, o cálculo infinitesimal.               retorno do recalcado pela via significan-
Se o conceito se modela, com efeito, pela apro-           te; no conceito de transferência como es-
ximação à realidade que ele deve apreender,               trutura – noção de sujeito suposto saber e
não é senão por um salto, uma passagem ao                 presença do analista – diferenciado de seus
limite que ele termina por consegui-lo”14. A              efeitos imaginários euóicos; no conceito
saber, acaba por conseguir, por realizar a                de pulsão e sua articulação com o gozo. ϕ
apreensão da realidade.
     Se estamos lidando com “uma equa-                    THE LACAN’S RETURN
ção de duas incógnitas”, como escreveu                    TO FREUD
Freud, é porque falta o significante que
possa dizer a verdade sobre o real da mor-                Abstract
te e da sexualidade [S(A)]. Se o psicana-                 The return to Freud led Lacan to recreate
lista é quem dirige a cura e tem o poder                  psychoanalysis without giving up Freudian
de significar que lhe é atribuído pelo paci-              teaching. He emphasizes the incidences of the

14. LACAN, J. Les quatre concepts fondamentaux de la
    psychanalyse, lição de 22 de janeiro de 1964, p. 23
    (tradução da autora).

                                           Reverso • Belo Horizonte • ano 29 • n. 54 • p. 29 - 36 • Set. 2007   35
Maria Lúcia Salvo Coimbra


     wish in transmission, considering the dimen-           uma Escola (circulação interna). Revista Letra Freu-
                                                            diana, ano I, n. 0, p. 45-46 e p. 17-20, s/d.
     sion of real and its articulation with the act
     and the function of writing. In this way, La-          LACAN, J. “Congresso sobre a transmissão”, 1978.
     can calls us to deal with the enjoyment and            In Documentos para uma Escola II – Lacan e o
                                                            passe (circulação interna). Revista Letra Freudia-
     the suffering of symptoms, today.                      na, ano XIV, n. 0’, p. 65-67, s/d.
                                                            LACAN, J. … ou pire. Leçon du 17 février 1971;
     Keywords                                               leçon du 8 mars 1972. Inédito.
     Transmission – Analyst’s discourse – Act –
     Return to Freud – Ethics of psychoanalysis             LACAN, J. L ’insu que sait de l’une-bévue s’aile à
                                                            mourre. Leçon du 11 janvier 1977. Inédito.
                                                            LACAN, J. Le séminaire. Livre XI: Les quatre con-
                                                            cepts fondamentaux de la psychanalyse. Paris: Seuil,
                            Bibliografia                    1973.
                                                            LACAN, J. Le séminaire. Livre XVI: D’un Autre à
     COIMBRA, M.L.S. Considerações sobre o objeto           l’autre. Paris: Seuil, 2006.
     ou “T.T.Y.M.U.P .T”, p. 36-41. Reverso, n. 47, set.
     2000. Publ. do Círculo Psicanalítico de Minas Ge-      MASSON, J.M. A correspondência completa de Sig-
     rais.                                                  mund Freud para Wilhelm Fliess – 1887-1904. Rio
                                                            de Janeiro: Imago, 1986.
     COIMBRA, M.L.S. Pedaços de vida real – consi-
     derações sobre a violência, p. 57-63. Reverso, n.
     48, set. 2001. Publ. do Círculo Psicanalítico de       RECEBIDO EM 15/06/2007
     Minas Gerais.                                          APROVADO EM 27/06/2007
     COIMBRA, M.L.S. Ato analítico, p. 60-62.
     Grîfhos-psicanálise, n. 20, out. 2003. Belo Horizon-   SOBRE     A   AUTORA
     te: O Lutador, 2003. Publ. do Instituto de Estudos
     Psicanalíticos – IEPSI.
                                                            Maria Lúcia Salvo Coimbra
     COIMBRA, M.L.S. O que há de novo na clínica?           Psicóloga. Psicanalista. Membro do Círculo
     – Considerações além do princípio de prazer, p.        Psicanalítico de Minas Gerais – CPMG.
     111-121. Estudos de Psicanálise, n. 26, out. 2003.
     Belo Horizonte: O Lutador, 2003. Publ. do Círcu-       Endereço para correspondência:
     lo Brasileiro de Psicanálise – CBP.
                                                            Rua Levindo Lopes, 333/505 - Funcionários
     COIMBRA, M.L.S. Como toma corpo o sujeito              30140-911 – BELO HORIZONTE/MG
     afetado pela linguagem. In GONTJO, Thaís et al.        Tel.: (31)3281-0715
     (orgs). A escrita do analista. Belo Horizonte: Au-
     têntica, 2003.
     COIMBRA, M.L.S. O desafio da perversão. In
     PORTUGAL, Ana Maria et al. (orgs). O destino
     da sexualidade. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2004.
     COIMBRA, M.L.S. Errar é humano portanto é
     preciso escrever, p. 205-211. Transfinitos-Colóquio.
     Org. Mônica de Almeida Belisário et al. Belo Ho-
     rizonte: Autêntica, 2007. Publ. do Aleph.
     FOUCAULT, M. Estética: literatura e pintura,
     música e cinema. Org. Manoel Barros da Motta.
     Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001.
     FREUD, S. O “estranho” (1919) In ESB, v. XVII,
     p. 275-314. Rio de Janeiro: Imago, 1976.
     GOETHE, Théatre complet. Trad. Gérard de Ner-
     val. Paris: Gallimard, 1964.
     LACAN, J. “Carta de Dissolução”, 1980; “Ata de
     Fundação da E.F.P 1964. In Documentos para
                      .”,

36   Reverso • Belo Horizonte • ano 29 • n. 54 • p. 29 - 36 • Set. 2007

Weitere ähnliche Inhalte

Was ist angesagt?

O livro dos médiuns
O livro dos médiunsO livro dos médiuns
O livro dos médiunsAlfredo Lopes
 
As vidas sucessivas_-_albert_de_rochas
As vidas sucessivas_-_albert_de_rochasAs vidas sucessivas_-_albert_de_rochas
As vidas sucessivas_-_albert_de_rochashavatar
 
Regressão terapêutica espirita
Regressão terapêutica espiritaRegressão terapêutica espirita
Regressão terapêutica espiritaAnselmo Heib
 
Evangeliza - O Livro dos Médiuns
Evangeliza - O Livro dos MédiunsEvangeliza - O Livro dos Médiuns
Evangeliza - O Livro dos MédiunsAntonino Silva
 
Conceito rosacruz dos cosmos max heindel
Conceito rosacruz dos cosmos   max heindelConceito rosacruz dos cosmos   max heindel
Conceito rosacruz dos cosmos max heindelEditora Publiqer
 
Olm 101027-perguntas que se podem fazer-mistificações e contradições-charlata...
Olm 101027-perguntas que se podem fazer-mistificações e contradições-charlata...Olm 101027-perguntas que se podem fazer-mistificações e contradições-charlata...
Olm 101027-perguntas que se podem fazer-mistificações e contradições-charlata...Carlos Alberto Freire De Souza
 
Livro do médiuns - Do maravilhoso ao Sobrenatural
Livro do médiuns - Do maravilhoso ao SobrenaturalLivro do médiuns - Do maravilhoso ao Sobrenatural
Livro do médiuns - Do maravilhoso ao SobrenaturalAna Cláudia Leal Felgueiras
 
Olm 100811-método, sistema, manif.física-mesas girantes
Olm 100811-método, sistema, manif.física-mesas girantesOlm 100811-método, sistema, manif.física-mesas girantes
Olm 100811-método, sistema, manif.física-mesas girantesCarlos Alberto Freire De Souza
 
Ramatís - A Missão do Espiritismo
Ramatís - A Missão do EspiritismoRamatís - A Missão do Espiritismo
Ramatís - A Missão do Espiritismouniversalismo-7
 
150 Anos de O Livro dos Mediuns
150 Anos de O Livro dos Mediuns150 Anos de O Livro dos Mediuns
150 Anos de O Livro dos Mediunsigmateus
 
A ciência secreta vol iii
A ciência secreta vol iiiA ciência secreta vol iii
A ciência secreta vol iiiMongeTeodoro
 
Freud, o Inconsciente e Edward Hopper
Freud, o Inconsciente e Edward HopperFreud, o Inconsciente e Edward Hopper
Freud, o Inconsciente e Edward HopperZelia Lopes
 
Ramatis fisiologia da alma(completo)
Ramatis   fisiologia da alma(completo)Ramatis   fisiologia da alma(completo)
Ramatis fisiologia da alma(completo)havatar
 
O conhecimento dos mundos superiores (rudolf steiner)
O conhecimento dos mundos superiores (rudolf steiner)O conhecimento dos mundos superiores (rudolf steiner)
O conhecimento dos mundos superiores (rudolf steiner)Antonio Carlos Ferreira
 

Was ist angesagt? (20)

O livro dos médiuns - Sistemas
O livro dos médiuns -  SistemasO livro dos médiuns -  Sistemas
O livro dos médiuns - Sistemas
 
O livro dos médiuns
O livro dos médiunsO livro dos médiuns
O livro dos médiuns
 
As vidas sucessivas_-_albert_de_rochas
As vidas sucessivas_-_albert_de_rochasAs vidas sucessivas_-_albert_de_rochas
As vidas sucessivas_-_albert_de_rochas
 
Regressão terapêutica espirita
Regressão terapêutica espiritaRegressão terapêutica espirita
Regressão terapêutica espirita
 
METAPSICOLOGIA FREUDIANA
METAPSICOLOGIA FREUDIANAMETAPSICOLOGIA FREUDIANA
METAPSICOLOGIA FREUDIANA
 
Evangeliza - O Livro dos Médiuns
Evangeliza - O Livro dos MédiunsEvangeliza - O Livro dos Médiuns
Evangeliza - O Livro dos Médiuns
 
150 anos de O Livro dos Médiuns
150 anos de O Livro dos Médiuns150 anos de O Livro dos Médiuns
150 anos de O Livro dos Médiuns
 
Conceito rosacruz dos cosmos max heindel
Conceito rosacruz dos cosmos   max heindelConceito rosacruz dos cosmos   max heindel
Conceito rosacruz dos cosmos max heindel
 
Olm 101027-perguntas que se podem fazer-mistificações e contradições-charlata...
Olm 101027-perguntas que se podem fazer-mistificações e contradições-charlata...Olm 101027-perguntas que se podem fazer-mistificações e contradições-charlata...
Olm 101027-perguntas que se podem fazer-mistificações e contradições-charlata...
 
Rudolf steiner o limiar do mundo espiritual
Rudolf steiner   o limiar do mundo espiritualRudolf steiner   o limiar do mundo espiritual
Rudolf steiner o limiar do mundo espiritual
 
A Importância dos Sonhos
A Importância dos SonhosA Importância dos Sonhos
A Importância dos Sonhos
 
Livro do médiuns - Do maravilhoso ao Sobrenatural
Livro do médiuns - Do maravilhoso ao SobrenaturalLivro do médiuns - Do maravilhoso ao Sobrenatural
Livro do médiuns - Do maravilhoso ao Sobrenatural
 
Olm 100811-método, sistema, manif.física-mesas girantes
Olm 100811-método, sistema, manif.física-mesas girantesOlm 100811-método, sistema, manif.física-mesas girantes
Olm 100811-método, sistema, manif.física-mesas girantes
 
Ramatís - A Missão do Espiritismo
Ramatís - A Missão do EspiritismoRamatís - A Missão do Espiritismo
Ramatís - A Missão do Espiritismo
 
150 Anos de O Livro dos Mediuns
150 Anos de O Livro dos Mediuns150 Anos de O Livro dos Mediuns
150 Anos de O Livro dos Mediuns
 
A ciência secreta vol iii
A ciência secreta vol iiiA ciência secreta vol iii
A ciência secreta vol iii
 
O Livro dos Médiuns
O Livro dos MédiunsO Livro dos Médiuns
O Livro dos Médiuns
 
Freud, o Inconsciente e Edward Hopper
Freud, o Inconsciente e Edward HopperFreud, o Inconsciente e Edward Hopper
Freud, o Inconsciente e Edward Hopper
 
Ramatis fisiologia da alma(completo)
Ramatis   fisiologia da alma(completo)Ramatis   fisiologia da alma(completo)
Ramatis fisiologia da alma(completo)
 
O conhecimento dos mundos superiores (rudolf steiner)
O conhecimento dos mundos superiores (rudolf steiner)O conhecimento dos mundos superiores (rudolf steiner)
O conhecimento dos mundos superiores (rudolf steiner)
 

Ähnlich wie Texto35 P7

Psicanalise sobre os autores
Psicanalise sobre os autoresPsicanalise sobre os autores
Psicanalise sobre os autoreslelilana
 
A angustia carlos drawin
A  angustia    carlos drawinA  angustia    carlos drawin
A angustia carlos drawinMarcos Silvabh
 
A angustia carlos drawin
A  angustia    carlos drawinA  angustia    carlos drawin
A angustia carlos drawinMarcos Silvabh
 
Curso Lacan e a Psicanálise - Aula 1: Quem foi Jacques Lacan ?
Curso Lacan e a Psicanálise - Aula 1: Quem foi Jacques  Lacan ?Curso Lacan e a Psicanálise - Aula 1: Quem foi Jacques  Lacan ?
Curso Lacan e a Psicanálise - Aula 1: Quem foi Jacques Lacan ?Alexandre Simoes
 
Tcc repeticao: do Outro à si mesmo em Freud e Lacan
Tcc repeticao: do Outro à si mesmo em Freud e Lacan Tcc repeticao: do Outro à si mesmo em Freud e Lacan
Tcc repeticao: do Outro à si mesmo em Freud e Lacan Geraldo Natanael
 
O desejo como sustentação na formação do
O desejo como sustentação na formação doO desejo como sustentação na formação do
O desejo como sustentação na formação doEduardo Lucas Andrade
 
Clínica da adolescencia
Clínica da adolescenciaClínica da adolescencia
Clínica da adolescenciaDaniela Marques
 
Emma Jung - Anima e Animus.pdf
Emma Jung - Anima e Animus.pdfEmma Jung - Anima e Animus.pdf
Emma Jung - Anima e Animus.pdfssusere55b3f
 
Emma Jung - anima e animus psicologia analitica
Emma Jung - anima e animus psicologia analiticaEmma Jung - anima e animus psicologia analitica
Emma Jung - anima e animus psicologia analiticaHellenReisMouro
 
O LUGAR DO INCONSCIENTE NA PRÁTICA PEDAGÓGICA DE PROFESSORES PRINCIPIANTES
O LUGAR DO INCONSCIENTE NA PRÁTICA PEDAGÓGICA DE PROFESSORES PRINCIPIANTESO LUGAR DO INCONSCIENTE NA PRÁTICA PEDAGÓGICA DE PROFESSORES PRINCIPIANTES
O LUGAR DO INCONSCIENTE NA PRÁTICA PEDAGÓGICA DE PROFESSORES PRINCIPIANTESProfessorPrincipiante
 
2014 - CURSO A prática psicanalítica com Lacan – Aula 1: Lacan, a Psicanális...
2014 - CURSO A prática psicanalítica com Lacan  – Aula 1: Lacan, a Psicanális...2014 - CURSO A prática psicanalítica com Lacan  – Aula 1: Lacan, a Psicanális...
2014 - CURSO A prática psicanalítica com Lacan – Aula 1: Lacan, a Psicanális...Alexandre Simoes
 
O corte do simbólico
O corte do simbólicoO corte do simbólico
O corte do simbólicobeto8900
 
Rehfeld, a. o que diferencia uma abordagem fenomenológico existencial das demais
Rehfeld, a. o que diferencia uma abordagem fenomenológico existencial das demaisRehfeld, a. o que diferencia uma abordagem fenomenológico existencial das demais
Rehfeld, a. o que diferencia uma abordagem fenomenológico existencial das demaisÉrika Renata
 
Marcus andre vieira_dando_nomes_aos_bois
Marcus andre vieira_dando_nomes_aos_boisMarcus andre vieira_dando_nomes_aos_bois
Marcus andre vieira_dando_nomes_aos_boisCinthya Bretas
 
Aula 11 A Psicologia espírita por Joanna de Angelis
Aula 11  A Psicologia espírita por Joanna de AngelisAula 11  A Psicologia espírita por Joanna de Angelis
Aula 11 A Psicologia espírita por Joanna de AngelisProf. Paulo Ratki
 

Ähnlich wie Texto35 P7 (20)

Psicanalise sobre os autores
Psicanalise sobre os autoresPsicanalise sobre os autores
Psicanalise sobre os autores
 
A angustia carlos drawin
A  angustia    carlos drawinA  angustia    carlos drawin
A angustia carlos drawin
 
A angustia carlos drawin
A  angustia    carlos drawinA  angustia    carlos drawin
A angustia carlos drawin
 
Curso Lacan e a Psicanálise - Aula 1: Quem foi Jacques Lacan ?
Curso Lacan e a Psicanálise - Aula 1: Quem foi Jacques  Lacan ?Curso Lacan e a Psicanálise - Aula 1: Quem foi Jacques  Lacan ?
Curso Lacan e a Psicanálise - Aula 1: Quem foi Jacques Lacan ?
 
Tcc repeticao: do Outro à si mesmo em Freud e Lacan
Tcc repeticao: do Outro à si mesmo em Freud e Lacan Tcc repeticao: do Outro à si mesmo em Freud e Lacan
Tcc repeticao: do Outro à si mesmo em Freud e Lacan
 
A17v1512 freud x lacan
A17v1512 freud x lacanA17v1512 freud x lacan
A17v1512 freud x lacan
 
O desejo como sustentação na formação do
O desejo como sustentação na formação doO desejo como sustentação na formação do
O desejo como sustentação na formação do
 
4993 16334-1-sm
4993 16334-1-sm4993 16334-1-sm
4993 16334-1-sm
 
Clínica da adolescencia
Clínica da adolescenciaClínica da adolescencia
Clínica da adolescencia
 
Emma Jung - Anima e Animus.pdf
Emma Jung - Anima e Animus.pdfEmma Jung - Anima e Animus.pdf
Emma Jung - Anima e Animus.pdf
 
Emma Jung - anima e animus psicologia analitica
Emma Jung - anima e animus psicologia analiticaEmma Jung - anima e animus psicologia analitica
Emma Jung - anima e animus psicologia analitica
 
O LUGAR DO INCONSCIENTE NA PRÁTICA PEDAGÓGICA DE PROFESSORES PRINCIPIANTES
O LUGAR DO INCONSCIENTE NA PRÁTICA PEDAGÓGICA DE PROFESSORES PRINCIPIANTESO LUGAR DO INCONSCIENTE NA PRÁTICA PEDAGÓGICA DE PROFESSORES PRINCIPIANTES
O LUGAR DO INCONSCIENTE NA PRÁTICA PEDAGÓGICA DE PROFESSORES PRINCIPIANTES
 
A inquietante estranheza_pdf_1
A inquietante estranheza_pdf_1A inquietante estranheza_pdf_1
A inquietante estranheza_pdf_1
 
2014 - CURSO A prática psicanalítica com Lacan – Aula 1: Lacan, a Psicanális...
2014 - CURSO A prática psicanalítica com Lacan  – Aula 1: Lacan, a Psicanális...2014 - CURSO A prática psicanalítica com Lacan  – Aula 1: Lacan, a Psicanális...
2014 - CURSO A prática psicanalítica com Lacan – Aula 1: Lacan, a Psicanális...
 
O corte do simbólico
O corte do simbólicoO corte do simbólico
O corte do simbólico
 
Rehfeld, a. o que diferencia uma abordagem fenomenológico existencial das demais
Rehfeld, a. o que diferencia uma abordagem fenomenológico existencial das demaisRehfeld, a. o que diferencia uma abordagem fenomenológico existencial das demais
Rehfeld, a. o que diferencia uma abordagem fenomenológico existencial das demais
 
Borderlineidentificacao
BorderlineidentificacaoBorderlineidentificacao
Borderlineidentificacao
 
Marcus andre vieira_dando_nomes_aos_bois
Marcus andre vieira_dando_nomes_aos_boisMarcus andre vieira_dando_nomes_aos_bois
Marcus andre vieira_dando_nomes_aos_bois
 
Resenha
ResenhaResenha
Resenha
 
Aula 11 A Psicologia espírita por Joanna de Angelis
Aula 11  A Psicologia espírita por Joanna de AngelisAula 11  A Psicologia espírita por Joanna de Angelis
Aula 11 A Psicologia espírita por Joanna de Angelis
 

Mehr von renatotf

English Frashly Juiced - promotion 1
English Frashly Juiced - promotion 1English Frashly Juiced - promotion 1
English Frashly Juiced - promotion 1renatotf
 
Taormina Sicilia
Taormina SiciliaTaormina Sicilia
Taormina Siciliarenatotf
 
Texto43-Pipn-P7
Texto43-Pipn-P7Texto43-Pipn-P7
Texto43-Pipn-P7renatotf
 
Texto37b P7
Texto37b P7Texto37b P7
Texto37b P7renatotf
 
Texto37 P7
Texto37 P7Texto37 P7
Texto37 P7renatotf
 
Texto37a P7
Texto37a P7Texto37a P7
Texto37a P7renatotf
 
Texto37c P7
Texto37c P7Texto37c P7
Texto37c P7renatotf
 
Texto4a P7
Texto4a P7Texto4a P7
Texto4a P7renatotf
 
Texto31 P7
Texto31  P7Texto31  P7
Texto31 P7renatotf
 
Texto41-Pipn-P7
Texto41-Pipn-P7Texto41-Pipn-P7
Texto41-Pipn-P7renatotf
 
Texto42-Pipn-P7
Texto42-Pipn-P7Texto42-Pipn-P7
Texto42-Pipn-P7renatotf
 
Texto39-Pipn-P7
Texto39-Pipn-P7Texto39-Pipn-P7
Texto39-Pipn-P7renatotf
 
Texto38 P7
Texto38 P7Texto38 P7
Texto38 P7renatotf
 
Texto24 P7
Texto24 P7Texto24 P7
Texto24 P7renatotf
 
Texto20 P7
Texto20 P7Texto20 P7
Texto20 P7renatotf
 
Texto33 P7
Texto33 P7Texto33 P7
Texto33 P7renatotf
 
Texto27 P7
Texto27 P7Texto27 P7
Texto27 P7renatotf
 

Mehr von renatotf (20)

Grup4a 1
Grup4a 1Grup4a 1
Grup4a 1
 
English Frashly Juiced - promotion 1
English Frashly Juiced - promotion 1English Frashly Juiced - promotion 1
English Frashly Juiced - promotion 1
 
Home1
Home1Home1
Home1
 
Taormina Sicilia
Taormina SiciliaTaormina Sicilia
Taormina Sicilia
 
Texto4 P7
Texto4 P7Texto4 P7
Texto4 P7
 
Texto43-Pipn-P7
Texto43-Pipn-P7Texto43-Pipn-P7
Texto43-Pipn-P7
 
Texto37b P7
Texto37b P7Texto37b P7
Texto37b P7
 
Texto37 P7
Texto37 P7Texto37 P7
Texto37 P7
 
Texto37a P7
Texto37a P7Texto37a P7
Texto37a P7
 
Texto37c P7
Texto37c P7Texto37c P7
Texto37c P7
 
Texto4a P7
Texto4a P7Texto4a P7
Texto4a P7
 
Texto31 P7
Texto31  P7Texto31  P7
Texto31 P7
 
Texto41-Pipn-P7
Texto41-Pipn-P7Texto41-Pipn-P7
Texto41-Pipn-P7
 
Texto42-Pipn-P7
Texto42-Pipn-P7Texto42-Pipn-P7
Texto42-Pipn-P7
 
Texto39-Pipn-P7
Texto39-Pipn-P7Texto39-Pipn-P7
Texto39-Pipn-P7
 
Texto38 P7
Texto38 P7Texto38 P7
Texto38 P7
 
Texto24 P7
Texto24 P7Texto24 P7
Texto24 P7
 
Texto20 P7
Texto20 P7Texto20 P7
Texto20 P7
 
Texto33 P7
Texto33 P7Texto33 P7
Texto33 P7
 
Texto27 P7
Texto27 P7Texto27 P7
Texto27 P7
 

Texto35 P7

  • 1. O Retorno a Freud de Lacan O retorno a Freud de Lacan Maria Lúcia Salvo de Coimbra Resumo Ao retornar a Freud, Lacan reinventa a psicanálise, sem abandonar o campo freudiano. Ele enfatiza a incidência do desejo na transmissão. Considera a dimensão do real, sua articulação com o ato e a função da escrita. Desta forma, nos convoca a tratar o gozo e o sofrimento do sintoma, hoje. Palavras-Chave Transmissão – Discurso do analista – Ato – Retorno a Freud – Ética da psicanálise É “... preciso que cada psicanalista obrigada a se reinventar ao enfrentar no- reinvente, a partir do que ele extraiu de vos problemas e porque é exigência da sua sua própria análise, a maneira pela qual a própria transmissão. Precisamos continu- psicanálise pode perdurar”1. ar e, quem sabe, avançar nossas indaga- ções sobre a posição do psicanalista em A transmissão da psicanálise face do mal-estar. Não sem saber que sus- tentamos um trabalho de psicanalistas, A constituição desta mesa nos con- operando na singularidade do discurso voca a buscar, criar, ou mesmo inventar psicanalítico. Um trabalho que interroga pontos de articulação entre diferentes po- tanto a divisão do sujeito e aquilo que cau- sições teóricas no campo da psicanálise, sa seu desejo quanto o limite do próprio especificamente, entre Freud, Melanie saber. O sujeito está em questão na estru- Klein e Lacan. tura do aparelho psíquico e podemos nos Desta forma, temos a oportunidade de perguntar se sua localização mudou des- partilhar impasses, questões e dúvidas em de a época freudiana. cada prática e talvez elaborá-las melhor. No início do século passado, assisti- Atualmente, no meio psicanalítico, mos à decadência do pai. Freud, com o proliferam tentativas veladas ou explíci- complexo de Édipo e o mito do pai prime- tas de ultrapassar a teoria freudiana ou de vo, em parte obturou esta falha, tentando adaptá-la a uma suposta realidade do dar consistência a algo que desvanecia. “mundo moderno ou pós-moderno”. Po- Lacan analisa essa consistência imaginá- rém, desde sua origem, a psicanálise foi ria e provoca a ruptura nesse ponto já frá- gil, mas não de qualquer forma. Aponta a 1. LACAN, J. “Congresso sobre a transmissão” (1978). ex-sistência, ou seja, a dimensão do real; Rev. Letra Freudiana, ano XIV, n. 0’, p. 66. a função da escrita e do falo como letra. Reverso • Belo Horizonte • ano 29 • n. 54 • p. 29 - 36 • Set. 2007 29
  • 2. Maria Lúcia Salvo Coimbra Os psicanalistas, como qualquer um, A prática psicanalítica implica envol- estão inscritos no simbólico, submetidos vimento do analista com os acontecimen- à sua dimensão de verdadeiro-falso; cer- tos de sua época, “... pois, como poderia fa- to-errado. Desta forma, podem se insta- zer de seu ser o eixo de tantas vidas quem lar no lado imbecil do saber, alienados a nada soubesse da dialética que o compromete algum significante do ideal ou ao próprio com essas vidas em um movimento simbóli- fantasma. Até mesmo a teoria psicanalíti- co?”3 Assumir esse compromisso exigiria ca pode induzir ao erro – por exemplo, a afastarmo-nos da cômoda divisão bem- amarração do complexo de Édipo, perce- mal e sustentarmos que, até mesmo, atos bida como a única possível –, embotando perversos ou violentos são cometidos por a descoberta de outras possibilidades e o seres humanos nem sempre psicóticos e trabalho com o real. Daí a importância da têm valor tanto de gozo quanto de verda- interlocução com um ponto fora do dis- de. curso psicanalítico para desalojá-lo de sua Considerar esses dois pontos – por um própria debilidade mental. Assim, os ana- lado, a responsabilidade de cada analista listas ficam advertidos2 do ponto fora: o com seu paciente, enlaçada ao compro- que ex-siste é fundamental. misso com o simbólico, e por outro lado, a Se não há garantia da tomada do su- irrupção de atos perversos, impulsivos, sem jeito no campo do Outro, estar aí engan- sentido – significa que, como analistas, nos chado depende do acaso, é acidental, po- encontramos desalojados de uma certa deria não ter ocorrido e o modo como cada neutralidade, defendida por alguns. sujeito se inscreve na estrutura não só é Conseqüentemente, temos que con- precário como muito particular. Em aná- siderar uma nova posição clínica para o lise não se trata de retificação. Trata-se analista, a de semblante de objeto, que de tocar um real que não se move. A es- opera com o desejo do analista. Nem se- critura que faz a borda do real é uma in- ria tão nova assim, para um leitor atento venção de cada análise, sustentada pela de Freud. No seu texto “A Interpretação ética do bem dizer. Em que momento as de Sonhos”, ele nos ensina que é necessá- palavras passam à escritura? Quando se rio um trabalho para extrair a função do perde o sentido como significado e deses- desejo: o ato da interpretação articula de- tabiliza-se a significação metafórica e me- sejo e o real da experiência de satisfação, tonímica, defrontando-se com o sentido: produzindo um saber específico da práti- não há relação sexual. Então, além deste ca psicanalítica. Colocamos esse saber à trabalho no particular, também nos impli- prova quando questionamos nossos con- camos na psicanálise em extensão – em ceitos para verificar se continuam funcio- escolas, hospitais, prisões – e somos con- nando. Ao fazer isto, algum novo fragmen- vidados a generalizar para a mídia. Acres- to de verdade pode irromper. Desta for- cente-se ainda o risco de se extraviar no ma, sem abandonar balizadores teóricos, preconceito ou na demanda. transmitimos a aventura psicanalítica na Talvez o que o analista tenha a dizer se criação e na invenção. relacione, em síntese, com limites – inclu- sive o da própria psicanálise –, com o fran- Retornar a Freud quear destes (sintomas, comportamentos impulsivos) e com o abrir passagem para o Lacan nasceu em 1901 e faleceu em desejo e o gozo, sem passagem ao ato. 1981. Durante quase 30 anos, em seus 2. Desejo do analista é desejo “averti” (advertido, avi- 3. LACAN, J. “Fonction et champs de la parole et du sado, prevenido). langage” (1953), Écrits, p. 321. 30 Reverso • Belo Horizonte • ano 29 • n. 54 • p. 29 - 36 • Set. 2007
  • 3. O Retorno a Freud de Lacan seminários, conferências, entrevistas e intervalos tornando possível a emergên- obra escrita empenhou-se, segundo suas cia de algo novo. palavras, em restaurar, “no campo aberto O que é o retorno a Freud, proposto por Freud, a lâmina cortante de sua verda- por Lacan? Qual a sua leitura? Lacan nos de”4. fornece pistas em seus vários seminários. Ler o Freud de Lacan implica isolar Diz não ser agarrado, apreendido senão determinadas proposições ou enunciados por seus segredinhos6. Por outro lado, in- que têm o peso do ato fundador. Nesse quieta-se, aterroriza-se mesmo por sentir- sentido, podemos compreender a frase de se responsável em abrir as comportas, atra- Lacan, repetindo Picasso, “Eu não procu- vés de seu ensino, de alguma coisa sobre a ro, acho”, pois ele inventa, ou seja, en- qual poderia ter silenciado7. Ao falar e es- contra o que já estava lá e fora esquecido. crever sobre inconsciente, desejo, gozo e Extraiu do texto freudiano o objeto “a”, o tantas outras coisas é responsável mesmo real, o imaginário e o simbólico e lhes deu que não saiba qual o destino que terão suas esses nomes. Ao fazer isto – ao mesmo idéias lidas, ouvidas. tempo em que se apropria da Lingüística, Assim, interrogar sobre o autor enla- cujos conceitos muitas vezes subverteu, e ça-se com a questão sobre o leitor. Freud da Matemática, Lógica e Topologia, abrin- autor; Lacan autor-leitor de Freud; nós do para estas ciências, também, novas leitores de Lacan e Freud e também, se possibilidades –, Lacan operou uma cons- me permitem a ousadia, autores em certo trução que transformou o rumo da psica- sentido, pois eles nos ensinam que o tra- nálise, sem abandonar o campo freudia- balho da psicanálise envolve tanto um no. Estabeleceu o discurso psicanalítico, deciframento – o inconsciente é estrutu- cuja eficácia é no real. Fundador de uma rado como uma linguagem – quanto um discursividade, sua nominação foi ato cri- ciframento de gozo. Por isto, qualquer lei- ador de novos sentidos, inaugurador de tura envolve deciframento – temos que novas direções. apreender, agarrar os segredinhos espalha- Existem autores que se diferenciam dos pelo texto – e envolve ciframento – como inauguradores de uma discursividade. os segredinhos que escolhemos, o trilha- A expressão é de Foucault e com ele pode- mento feito nos implica como sujeitos e se colocar uma questão: “O que é um au- assinala a marca de cada um. Só recebe- tor?”, título de sua conferência em 22 de mos de fato uma herança quando a con- fevereiro de 1969. Nesta ele refere-se a quistamos... um tipo especial da função “autor5 – os “Aquilo que herdastes de teus pais, con- fundadores, inauguradores, de uma discur- quista-o para possuí-lo. O que não se usa, é sividade –, no qual o retorno ao texto e o uma carga pesada, somente aquilo que o ins- nome próprio são fundamentais. Contu- tante cria pode servir!”8 Pode-se dizer que do este retorno transforma o texto, cria isto é transmissão em psicanálise? Quan- diferenças ao se apropriar dele. Volta-se do o desejo de alguém se enlaça ao do ao que o texto não diz, a seus vazios, seus Outro, escrevendo em um contorno sin- gular as marcações para o real? 4. LACAN, J. “Carta de Dissolução” (1980). Rev. Letra Freudiana, ano I, n. 0, p. 45, e na “Ata de Fundação 6. LACAN, J. ... ou pire, lição de 8 de março de 1972, p. da E. F. P”, 1964, p. 17. 66. 5. A função “autor” é exercida no lugar vazio que o 7. LACAN, J. L ’insu que sait de l’une-bévue s’aile à mour- apagamento do nome do autor estabelece. Ver FOU- re, lição de 11 de janeiro de 1977, p. 9. CAULT, M. Estética: literatura e pintura, música e 8. GOETHE. Théatre complet, p. 971 (Tradução da au- cinema, p. 274. tora). Reverso • Belo Horizonte • ano 29 • n. 54 • p. 29 - 36 • Set. 2007 31
  • 4. Maria Lúcia Salvo Coimbra Contudo, não podemos ignorar que mesma coisa – dito de outra forma, o que aí herdamos textos freudianos, lacanianos, está penhorado é a exigência mínima de pas- neles fazemos nossas escolhas. Heresias? sagem a este questionamento renovado. A Considerando que a leitura é subjeti- exigência mínima é esta: Trata-se de fazer va e que um texto está aberto a múltiplos psicanalistas”10. Podemos “ouvir” que o sentidos, mas não todos, não podemos ig- compromisso de Lacan com a formação norar também que a tradução, interpre- de analistas o levou a questionar a função tação ou leitura pode se organizar como dos termos freudianos? Ao longo desse traição. Qual a boa medida ou a justa se- “questionamento renovado” ele constrói paração entre autor e leitor que afasta o o registro do real, do gozo, do objeto “a”. mimetismo ou a traição e ao mesmo tem- Dessa dimensão além do significante, o ato po preserva a marca do leitor? Como po- analítico opera a rearticulação do sujeito demos ser lacanianos? Questão que, como ao desejo e ao gozo. A construção lacani- sabemos, faz eco ao texto de Montesquieu ana – utilizando-se de restos deixados por “Como é possível ser persa?”. Estrangei- Freud – muda o rumo da teoria e da práti- ros, como o ensino de Lacan ressoa em ca psicanalísticas, sem abandonar o cam- nós? Como saber de quais vestimentas po freudiano, onde cada analista de novo precisamos nos livrar para penetrar em é convocado a se apropriar dessa heran- seus textos? Talvez para quase trinta anos ça. Como já lhes falei, Freud nos havia de ensino, o trabalho de decifrar e cifrar indicado o imperativo ético onde o desejo tenha que ter uma boa lentidão... para que está em causa. o ato, no princípio, se esclareça em parte. Como o ato fundador de Lacan se articu- O ato analítico la ao ato que nos autoriza analistas tanto em nossa experiência de análise quanto Durante anos sofrendo a crítica de só em nossa prática? Talvez, fora do contex- se preocupar com palavras, ao incluir a to sociocultural francês, longe da captura dimensão do ato o escândalo invade a psi- imaginária que acompanhou o homem canálise. Há algo desorganizador. Mas isto Lacan, possamos ler seus textos da boa “é confuso!”, “é complicado!” – dizem forma – apenas como forasteiros, que sem- agora os críticos. E têm razão. No simbó- pre seremos, habitando um espaço, uma lico nos entendemos, somos razoáveis. dimensão9 que não nos pertence: a língua. Mas, este registro apaziguador não dá con- Insisto na questão: Como podemos ser ta de tudo. Todos esbarramos, tropeçamos, lacanianos se o próprio Lacan se dizia freu- em maior ou menor grau, com o desmedi- diano? Certamente não é supor que de- do, com o incomensurável, até a radicali- vemos ser uma encarnação de Lacan, da dade do crime. mesma forma que este não é a encarna- Mesmo o ato falho que surge a partir ção de Freud. Pode-se “ouvir” o que La- da articulação das palavras surpreende. A can nos diz através de seus seminários... pessoa não sabe o que disse... não queria piratas! “O que eu tento fazer é restituir aos dizê-lo... e o próprio registro das palavras termos freudianos sua função. Do que se tra- se torna enigmático. ta nestes termos é de uma perturbação dos Quando a prática psicanalítica se abre próprios princípios de questionamento. Dito à dimensão do ato, profundas mudanças de outra forma, o que não quer dizer: dizer a se produzem. 9. Referência ao equívoco dimension, dit-mension, dit 10. LACAN, J. D’un Autre à l’autre, lição de 8 de janei- mansion. ro de 1969, p. 92 (tradução e grifo da autora). 32 Reverso • Belo Horizonte • ano 29 • n. 54 • p. 29 - 36 • Set. 2007
  • 5. O Retorno a Freud de Lacan No período pós-freudiano, mas antes Se sabemos que a loucura e o desme- de Lacan, as preocupações nesta área se dido têm um lugar na estrutura psíquica, reduziam, com algumas exceções, a formas não significa que tenhamos que compac- obsessivas de evitar qualquer ação. A psi- tuar com isto. Devemos pensar clinica- canálise deveria se manter no pensamen- mente. Se alguns pacientes chegam “mui- to, ou pior, na expressão dos sentimentos, tos loucos”, é preciso implicá-los como isto é, no eixo imaginário. sujeitos. Isto não tem a ver com os princí- Com a chamada releitura do texto pios morais do analista, com aquilo que freudiano, feita por Lacan, a perturbação ele julga ser certo ou errado. Mas, pode profunda do pulsional emerge e à como- levar a um certo mal-entendido, ao se re- ção teórica corresponde a comoção na lacionar moralismo e um outro tipo de prática. Analistas desalojados da nossa extravio pelo qual talvez a própria psica- neutralidade suspeita, não podemos cru- nálise seja responsável. A saber, que a psi- zar os braços e fingir que o horror não está canálise tem como objetivo libertar o in- à nossa porta ou que o pecado não mora divíduo, que este deve fazer tudo o que ao lado... Acabou-se o sossego dos analis- quer, livre de culpa. tas, mas ganhou a psicanálise. Como La- Não é assim. Não se pode fazer o gozo can revelou, todo ato provoca inquieta- da loucura. No ato analítico, temos que ção ou mesmo horror. Portanto, dele os implicar o sujeito, que tem, também, res- analistas se afastaram sem nada querer ponsabilidade pela própria análise. Se sa- saber. É verdade que não há articulação bemos que há um limite, não se pode fa- entre saber e ato. zer de conta que não há. Então qual a saída? O sujeito diz que está louco... e vai Podemos passar do fracasso do saber ter que ceder sua loucura. O analista não para o saber em fracasso. “Como pude fa- deve ficar só ouvindo. O sujeito precisa se zer isto?” “Por que faço isto se sei que me comprometer no discurso analítico (assim prejudica?” Há algo, além do prazer, que como o analista). O inconsciente não pode arrasta o ser humano para ações enlou- servir como uma desculpa. É uma respon- quecidas. Além do princípio de prazer te- sabilidade. mos o gozo. Atos impulsivos, rupturas às vezes devastadoras podem encontrar seu A ética da psicanálise limite, seu contorno pelo ato psicanalítico. Há no ato uma questão. Toca-se uma Mas, o que é mesmo a prática psica- área irrepresentável: a dimensão do real nalítica que inclui o real? que está fora-significação. O sujeito não A constituição do sujeito (S) no cam- sabe dizer o que aconteceu. Cabe ao ana- po do Outro produz sempre perda, restos lista não deixar escapar esse algo que se não articulados na cadeia significante. É desconhece, o não-saber. traumática. Esses restos de cenas vividas Se o real, por definição, encontra-se e ouvidas11 retornam como fragmentos fora-significação, o ato analítico – situa- que não se encaixam na cadeia significan- do na vertente do ato em geral, da mesma te. Retorno que tem uma exterioridade forma que o acting-out e a passagem ao ato, para o sujeito12; resta algo inacessível ao porém diferente de ambos, pois supõe a simbólico: é o objeto perdido freudiano pulsação de um tempo lógico na travessia do fantasma – não só se diferencia de atos impulsivos, como é a forma de tratá-los, 11. MASSON, J.M. A correspondência completa de Sig- mund Freud para Wilhelm Fliess – Cartas de 2/5, 16/ operando a rearticulação do sujeito ao 5 e 25/5/1897. desejo e ao gozo. 12. FREUD, S. “O estranho” (1919), ESB, v. XVII. Reverso • Belo Horizonte • ano 29 • n. 54 • p. 29 - 36 • Set. 2007 33
  • 6. Maria Lúcia Salvo Coimbra que Lacan formalizou como objeto “a” e Repetindo, a compulsão à repetição é articulou na dimensão do real. a insistência de um gozo excessivo que ir- Real compreendido como aquilo que rompe em ato. Ato que traz em si a opaci- retorna sempre ao mesmo lugar e como dade do real e, ao mesmo tempo, é tenta- impossível (modalidade lógica). Articula- tiva de resposta a essa opacidade. se com a lógica do não-todo e não pode Afirmamos que o percurso de uma ser alcançado através da representação. análise pode modificar a economia do Com o registro do real temos a for- gozo para um sujeito. O que isto quer malização lacaniana da pulsão de morte, dizer? do masoquismo primário, do benefício se- Estamos propondo nova leitura do cundário da doença, da reação terapêuti- ponto de vista econômico freudiano, isto ca negativa, e outras noções trabalhadas é, como se distribuem, se deslocam, se pre- por Freud. servam e se perdem as quantidades de Dito de outra forma, a constituição energia que circulam no aparelho psíqui- do sujeito no campo do Outro implica a co. Estamos propondo substituir essa ener- operação de alienação e, ao mesmo tem- gética freudiana por uma economia polí- po, a separação do objeto. Isto significa que tica de gozo. Economia porque o gozo se o humano perde a relação com o vital ins- produz, se perde ou se ganha, e política tintivo, e o corpo é perfurado pelo signifi- porque a produção, o ganho e a perda de cante. Há uma máquina significante em gozo se inscrevem em uma estrutura de funcionamento, sempre produzindo algo discurso.13 que cai – o objeto “a”, causa de desejo e Com este referencial teórico, a per- também condensador de gozo. Este obje- gunta sobre a prática se situa em uma di- to está fora significante e fora significado, mensão ética, envolvendo, portanto, o irrompendo pela repetição em ato, que é desejo, o gozo, a responsabilidade do ana- a forma como o real se apresenta. Portan- lista e se afastando das normas e ideais to, temos o enlace repetição-gozo (real). obsessivos de outrora, para regulação dos Considerar, trabalhar e suportar o atos. Como conduzir uma cura se temos, fracasso na recuperação desse algo que por um lado, a trama significante do sin- escapa (a mítica experiência de satisfa- toma, enigma que se oferece ao sujeito, e, ção, o objeto perdido que Lacan desig- por outro lado, temos algo a mais: a di- nou objeto “a”) promove mudança na mensão repetitiva que escapa ao falar e economia de gozo para um sujeito e dife- que mostra o gozo vivido pelo sujeito? rencia a cura analítica dos tratamentos Gozo que ele não quer abandonar e do psicoterápicos. qual nada sabe. Se cada ser humano ao inscrever-se Então, o que faz o analista? no simbólico tem que se haver com uma Ele funciona como testemunha e su- perda estrutural, pois o que foi excluído porte da impossibilidade de tudo dizer pela do simbólico, o resto da operação signifi- via da associação livre. Não se trata de cante, isto é, o real (o gozo, o objeto “a”), recuperar lembranças porque não há nada retorna em ato; se o corpo mortificado pelo a ser recuperado. Também não é injetar significante é invadido por uma “energia”, significantes para recobrir a hiância. E um gozo que – escapando ao domínio sig- mais ainda, deve fazer avançar a análise nificante – está à deriva e pode ser defini- no sentido de inventar alguma passagem do como satisfação de uma pulsão; então, ao gozo inter-dito para todo ser falante. não podemos fingir que nada d’Isso exis- te. Estamos obrigados a incluir Isso em 13. COIMBRA, M.L.S. “Considerações sobre o objeto nossa práxis. ou T.T.Y. M.U.P in Reverso, n. 47, p. 36-41. .T.” 34 Reverso • Belo Horizonte • ano 29 • n. 54 • p. 29 - 36 • Set. 2007
  • 7. O Retorno a Freud de Lacan Opera com o ato analítico a rearticulação ente, se é sujeito suposto saber... o que faz sujeito-desejo-gozo suportando o desas- com esse poder? sossego que se instaura ao recusar seguir Em primeiro lugar, reconhecê-lo; em modelos identificatórios. A responsabili- segundo, deveria saber que esse “poder dade do analista é sua função de causa de significante” está limitado pelo real, que onde lhe retornam as conseqüências de não pode ser atingido pelas significações seu ato, criando através deste a possibili- e onde nem mesmo se coloca a questão dade de escrita (ou escritura). verdadeiro-falso. Finalmente, deveria sa- Considerar que o real do gozo precisa ber que se inventa, em um processo de ser tratado em análise nos aproxima de análise, a verdade de cada um, com máxi- nossos pacientes. Podemos incluir em nos- ma particularidade. sa clínica os borderline de outrora, psicóti- Diante da redução e do extravio das cos e perversos ousando apostar na pro- explicações psicologizantes e biologizan- dução de um novo sujeito, graças a uma tes, Freud responde com a construção de mudança na economia do gozo. Como “nossa mitologia”. fazê-lo? Trabalhando a relação do sujeito Diante das “dificuldades” da prática ao objeto a (causa de desejo e condensa- (resistência, compulsão à repetição...) vai dor de gozo), considerando a fórmula do delimitando um território, fora do domí- fantasma (S a e a S), sabendo que a nio do princípio de prazer e das leis signi- formalização da junção-disjunção do S e ficantes, e ao mesmo tempo indicando a objeto a é fundamental, axiomática (vide possibilidade de sua ultrapassagem. grafo do desejo). Mas, também é funda- Hoje, podemos compreender o texto mental o trabalho de construção-descons- freudiano nesta dimensão porque Lacan trução fantasmática para cada sujeito. Te- a formalizou. mos que arriscar o “salto” do conceito, Trabalhar com o conceito de real pro- fórmula ou axioma do fantasma para uma duz modificações profundas em toda a te- prática singular, articulável à teoria: “... oria e prática psicanalíticas: no conceito nossa concepção do conceito implica que este de inconsciente (separação Isso[das Es] e é sempre estabelecido por uma aproximação inconsciente); na insistência da repetição que não é sem relação com aquilo que nos em ato que se distingue da insistência do impõe, como forma, o cálculo infinitesimal. retorno do recalcado pela via significan- Se o conceito se modela, com efeito, pela apro- te; no conceito de transferência como es- ximação à realidade que ele deve apreender, trutura – noção de sujeito suposto saber e não é senão por um salto, uma passagem ao presença do analista – diferenciado de seus limite que ele termina por consegui-lo”14. A efeitos imaginários euóicos; no conceito saber, acaba por conseguir, por realizar a de pulsão e sua articulação com o gozo. ϕ apreensão da realidade. Se estamos lidando com “uma equa- THE LACAN’S RETURN ção de duas incógnitas”, como escreveu TO FREUD Freud, é porque falta o significante que possa dizer a verdade sobre o real da mor- Abstract te e da sexualidade [S(A)]. Se o psicana- The return to Freud led Lacan to recreate lista é quem dirige a cura e tem o poder psychoanalysis without giving up Freudian de significar que lhe é atribuído pelo paci- teaching. He emphasizes the incidences of the 14. LACAN, J. Les quatre concepts fondamentaux de la psychanalyse, lição de 22 de janeiro de 1964, p. 23 (tradução da autora). Reverso • Belo Horizonte • ano 29 • n. 54 • p. 29 - 36 • Set. 2007 35
  • 8. Maria Lúcia Salvo Coimbra wish in transmission, considering the dimen- uma Escola (circulação interna). Revista Letra Freu- diana, ano I, n. 0, p. 45-46 e p. 17-20, s/d. sion of real and its articulation with the act and the function of writing. In this way, La- LACAN, J. “Congresso sobre a transmissão”, 1978. can calls us to deal with the enjoyment and In Documentos para uma Escola II – Lacan e o passe (circulação interna). Revista Letra Freudia- the suffering of symptoms, today. na, ano XIV, n. 0’, p. 65-67, s/d. LACAN, J. … ou pire. Leçon du 17 février 1971; Keywords leçon du 8 mars 1972. Inédito. Transmission – Analyst’s discourse – Act – Return to Freud – Ethics of psychoanalysis LACAN, J. L ’insu que sait de l’une-bévue s’aile à mourre. Leçon du 11 janvier 1977. Inédito. LACAN, J. Le séminaire. Livre XI: Les quatre con- cepts fondamentaux de la psychanalyse. Paris: Seuil, Bibliografia 1973. LACAN, J. Le séminaire. Livre XVI: D’un Autre à COIMBRA, M.L.S. Considerações sobre o objeto l’autre. Paris: Seuil, 2006. ou “T.T.Y.M.U.P .T”, p. 36-41. Reverso, n. 47, set. 2000. Publ. do Círculo Psicanalítico de Minas Ge- MASSON, J.M. A correspondência completa de Sig- rais. mund Freud para Wilhelm Fliess – 1887-1904. Rio de Janeiro: Imago, 1986. COIMBRA, M.L.S. Pedaços de vida real – consi- derações sobre a violência, p. 57-63. Reverso, n. 48, set. 2001. Publ. do Círculo Psicanalítico de RECEBIDO EM 15/06/2007 Minas Gerais. APROVADO EM 27/06/2007 COIMBRA, M.L.S. Ato analítico, p. 60-62. Grîfhos-psicanálise, n. 20, out. 2003. Belo Horizon- SOBRE A AUTORA te: O Lutador, 2003. Publ. do Instituto de Estudos Psicanalíticos – IEPSI. Maria Lúcia Salvo Coimbra COIMBRA, M.L.S. O que há de novo na clínica? Psicóloga. Psicanalista. Membro do Círculo – Considerações além do princípio de prazer, p. Psicanalítico de Minas Gerais – CPMG. 111-121. Estudos de Psicanálise, n. 26, out. 2003. Belo Horizonte: O Lutador, 2003. Publ. do Círcu- Endereço para correspondência: lo Brasileiro de Psicanálise – CBP. Rua Levindo Lopes, 333/505 - Funcionários COIMBRA, M.L.S. Como toma corpo o sujeito 30140-911 – BELO HORIZONTE/MG afetado pela linguagem. In GONTJO, Thaís et al. Tel.: (31)3281-0715 (orgs). A escrita do analista. Belo Horizonte: Au- têntica, 2003. COIMBRA, M.L.S. O desafio da perversão. In PORTUGAL, Ana Maria et al. (orgs). O destino da sexualidade. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2004. COIMBRA, M.L.S. Errar é humano portanto é preciso escrever, p. 205-211. Transfinitos-Colóquio. Org. Mônica de Almeida Belisário et al. Belo Ho- rizonte: Autêntica, 2007. Publ. do Aleph. FOUCAULT, M. Estética: literatura e pintura, música e cinema. Org. Manoel Barros da Motta. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. FREUD, S. O “estranho” (1919) In ESB, v. XVII, p. 275-314. Rio de Janeiro: Imago, 1976. GOETHE, Théatre complet. Trad. Gérard de Ner- val. Paris: Gallimard, 1964. LACAN, J. “Carta de Dissolução”, 1980; “Ata de Fundação da E.F.P 1964. In Documentos para .”, 36 Reverso • Belo Horizonte • ano 29 • n. 54 • p. 29 - 36 • Set. 2007