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11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 1
Lawrence M. Hinman, Ph.D.
Director, The Values InstituteUniversity of San Diego
Simpósio Internacional sobre Activação do Desenvolvimento Psicológico
Universidade de Aveiro, 2006
ÉTICA
DE
VIRTUDE E DESENVOLVIMENTO
MORAL DA PESSOA
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 2
INTRODUÇÃO
A preocupação com a
educação do carácter
desenvolveu-se no
Ocidente desde o
tempo de Platão,
cujos primeiros
diálogos exploraram
as virtudes da
coragem e da justiça.
Platão
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 3
RENASCIMENTO DA TEORIA ÉTICA
DA VIRTUDE A PARTIR DE 1980
Elisabeth Anscombe (1958) e Alasdair
MacIntyre (1990)
Contributo de Anscombe:
- A ética deontológica, baseada no dever e obrigação,
tornou-se ininteligível
- A ética deontológica, baseada na ideia de “agir não
para satisfazer um desejo ou um querer do indivíduo,
mas apenas porque é eticamente correcto fazê-lo”,
deixou de ter sentido.
- A virtude só faz sentido quando preenche
necessidades humanas (ética teleológica)
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 4
O CONTRIBUTO DE MACINTYRE
Não existe uma só tradição ética no
Ocidente, mas várias.
Somos perfeccionistas no desporto e nas
artes, utilitaristas na vida diária, lockianos
quando se trata de respeitar o direito de
propriedade, cristãos quando idealizamos
a compaixão, a caridade e a igualdade e
kantianos quando afirmamos o valor da
autonomia da pessoa e do respeito pelos
direitos humanos.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 5
O CONTRIBUTO DE MACINTYRE (2)
Qual o significado da vida?
- O significado depende da pessoa
compreender que pertence a uma ou a
várias tradições morais, as quais lhe
permitem construir uma narrativa para a
sua vida, que depende da existência de
“standards” de excelência e de certas
práticas apropriadas.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 6
O CONTRIBUTO DE MACINTYRE (3)
As virtudes só podem prosperar em
comunidades de certo tipo.
Ou seja, há comunidades que impedem o
florescimento das virtudes
O que quer dizer que a pessoa virtuosa
floresce melhor numa comunidade
virtuosa.
Diferentes tipos de comunidade
encorajam diferentes tipos de virtude.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 7
O CONTRIBUTO DE MACINTYRE (4)
Embora o carácter da pessoa tenha
condicionantes genéticas e seja, de algum
modo, fixo, é possível mudá-lo.
Na medida em que os actos são realizados
em liberdade e o agente tem oportunidade
de reflectir sobre as suas consequências,
há alguma margem para a mudança do
carácter.
A reflexão sobre as consequências exige
“ethical guidance”, hábito e envolvimento.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 8
Primeira Parte
A estrutura da Virtude
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 9
Duas Questões Morais
A questão da acção:
– Como devo agir?
A questão do carácter
– Que espécie de pessoa devo ser?
A nossa preocupação é com a
questão do carácter
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 10
Uma analogia a partir do sistema
de justiça
• Como país, depositamos a nossa vontade de
justiça, na área legal, de duas maneiras:
– Leis, que proporcionam as regras necessárias
– Pessoas, que aplicam a justiça
• Do mesmo modo, a ética baseia-se em:
– Teorias, que proporcionam regras de conduta
– A virtude, que proporciona a sabedoria necessária
para aplicar as regras aos casos particulares
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 11
Virtude
Força de carácter
(hábito)
Envolvendo o
sentimento e a acção
Procura o meio termo
entre o excesso e a
deficiência em relação
a nós próprios
Promove o
desenvolvimento
humano
Aristoteles
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 12
Duas Concepções de moralidade
Podemos contrastar duas concepções de
vida moral.
– A concepção infantil:
• Tem origem externa (os pais, por exemplo).
• É negativa.
• A formação de regras e do hábito é central.
– A concepção adulta:
• Tem origem interna.
• É positiva.
• Centrada na virtude, quase sempre modelada por ideais.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 13
Inteligência e Sabedoria
A pessoa inteligente é a que conhece
os melhores meios para qualquer
finalidade possível.
A pessoa sabedora é a que conhece
quais são os fins que são estimáveis.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 14
Desejos Bem Ordenados
Aristóteles faz um contraste entre:
– Pessoas continentes, que conseguem
controlar os desejos desordenados.
– Pessoas temperadas, cujos desejos são
bem ordenados, em função do que é
bom para elas.
– Pessoas de vontade fraca (Akrasia) ou
seja indivíduos que não são capazes de
controlarem os seus desejos.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 15
Virtude como Meio Termo
A força de carácter exige que a
pessoa encontre o equilíbrio certo
entre dois extremos.
– Excesso: ter em demasia algo.
– Deficiência: ter demasiado pouco de
algo.
Não significa mediocridade, mas sim
harmonia e equilíbrio.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 16
Virtude e Hábito
A virtude é alguma coisa que é
praticada e aprendida – é um hábito
(hexis).
Aristóteles considera que é possível
ensinar as pessoas serem virtuosas.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 17
Segunda Parte
Virtudes Particulares
Coragem
Compaixão
Amor próprio
Amizade
Perdão
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 18
A coragem e a unidade das
virtudes
Para uma pessoa ter uma virtude de
carácter, em grande escala, também deve
ter outras qualidades, em alguma medida.
– A coragem sem capacidade de julgamento é
cegueira.
– A coragem sem perseverança é apostar
apenas no curto prazo.
– Coragem sem um claro conhecimento das
nossas capacidades é uma forma de loucura.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 19
Compaixão e Piedade
A piedade significa olhar para o outro de
cima para baixo.
– Consequentemente, ninguém quer ser objecto
de piedade.
A compaixão olha para o sofrimento dos
outros como se fosse algo que pudesse
acontecer-nos.
– Consequentemente, gostamos que os outros
tenham compaixão para connosco.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 20
Compaixão
Etimologia: sentir ou sofrer com o outro.
Cognitivamente e emocionalmente.
Conduz à acção.
Excesso:o síndrome do “coração partido”.
Deficiência: Insensibilidade ou “dureza de
coração”.
Contrasta com a piedade.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 21
Compaixão como emoção
A emoção é muitas vezes
necessária:
– Para reconhecer o sofrimento dos
outros.
• Ligação emocional.
– Para dar resposta aos que sofrem.
• Os outros precisam de saber que nos
importamos com eles.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 22
Amor
Envolve sentir, conhecer e agir.
Características do amar outra
pessoa:
– Sentimentos de ternura, cuidado,
apreço e respeito.
– Conhecer essa pessoa.
– Agir de forma a promover o
florescimento dessa pessoa.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 23
Amor Próprio:
Características
Características:
– Ter sentimentos de cuidado, apreço e
respeito por si próprio.
– Valorar-se a si próprio na justa medida.
– Conhecer-se a si próprio.
– Agir de forma a promover o seu próprio
florescimento.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 24
Amor Próprio:
Deficiência
Deficiência:
– Reduzida capacidade para sentir.
– Reduzida capacidade para se auto-
avaliar e tendência para a
autodepreciação.
– Reduzida capacidade para se
autoconhecer.
– Reduzida capacidade para agir.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 25
Amor Próprio:
Excesso
Pode assumir várias formas: arrogância,
egoismo, vaidade e narcisismo.
Excesso de centração em si próprio.
Autoconceito exagerado e irrealista.
Demasiada confiança em si próprio:
narcisismo.
Demasiada acção em proveito próprio:
egoismo.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 26
Amizade
Para Aristóteles, não há
necessariamente uma dicotomia
entre o interesse próprio e a
preocupação pelos outros.
Sem amigos, não podemos ser
felizes.
– “…ninguém escolhe viver sem amigos,
ainda que tenha todos os outros bens”
EN, VIII, 1.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 27
O que é a amizade?
“O amigo é aquele que partilha o teu
prazer naquilo que é bom e a tua dor
naquilo que é desagradável, pelo teu
próprio valor e por mais nenhuma
razão.” --Retórica, Livro II, Cap. 4;
1380b36-1381a5
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 28
Tipos de Amizade
A Amizade pode ter os seguintes fins:
– Utilidade: acaba quando o propósito da
utilidade cessa.
– Prazer: acaba quando a fonte de prazer cessa.
– Um partilha pelo que é bom: “A amizade
perfeita é a amizade que se baseia na partilha
de virtudes e em mais nenhuma razão.” EN,
VIII, 3.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 29
Perdão
– É uma virtude indispensável ao florescimento
humano:
– Em qualquer relação de longo prazo (amizade,
casamento,etc.),cada um pode fazer coisas
que devem ser perdoadas pelo outro.
– Relações de longo prazo são essenciais para o
florescimento humano.
– Se não conseguirmos perdoar, não seremos
capazes de manter as relações.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 30
Perdão:
Excesso e Deficiência
Excesso: a pessoa que perdoa demasiado
facilmente e demasiado rapidamente.
– Pode subestimar-se a si própria.
– Pode subestimar a ofensa.
Deficiência: a pessoa incapaz de perdoar.
– Pode sobrestimar a sua importância.
– Geralmente leva uma vida amarga e
ressentida.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 31
Conclusão
As virtudes são os traços de carácter
que promovem o nosso
florescimento como pessoas.
A pessoa virtuosa tem sabedoria
prática, a habilidade para conhecer
quando e como aplicar melhor as
várias perspectivas morais.
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 32
Segunda Parte
Metodologia de promoção de
valores:
Os 3 Es: exortação, exemplo e
envolvimento (Thomas Lickona)
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 33
THOMAS LICKONA: MÉTODO 3 Es
ESTRATÉGIAS PARA A SALA DE
AULA:
O professor como mentor e modelo
Reflexão ética em torno de grandes
obras
Técnicas de gestão de conflitos
Reforços
Participação na tomada de decisões
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 34
MÉTODO 3 Es: OBJECTIVOS
Usar os conteúdos para desenvolver o
raciocínio moral
Estimular a cooperação entre os alunos
Desenvolver a responsabilidade e o gosto
pelo trabalho e pelo esforço
Ensinar os alunos a superarem os
conflitos sem recurso à violência
Induzir os alunos a cuidarem uns dos
outros
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 35
MÉTODO 3 Es
O conhecimento moral exige:
-reflexão
-compreensão
-formulação de juízos
-processo de escolha (cálculo
racional, deliberação e acção)
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 36
MÉTODO 3 Es
Os valores éticos devem percorrer
todo o currículo de forma transversal
A escola deve entender-se acerca do
código de conduta
O código de conduta aplica-se em
todos os espaços escolares
Uma reflexão ética que não conduza
à acção é estéril
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 37
MÉTODO 3 Es
Embora os alunos e os pais devam
associar-se ao processo de tomada
de conhecimento do código de
conduta, são as autoridades
escolares e os professores os
responsáveis pela sua elaboração,
aprovação e aplicação
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 38
MÉTODO 3 Es
Opção clara pelo reforço da
autoridade do professor
Reconhecimento da importância da
linguagem moral
Reconhecimento da importância do
hábito no processo de
desenvolvimento moral
11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 39
BIBLIOGRAFIA BÁSICA
Aristotle (1985). Nicomachean Ethics. (Introd. e
notas de Terence Irwin). Cambridge: Hackett PC
Knight, K. (1998). The MacIntyre Reader. (1998).
Indiana: University of Notre Dame
MacIntyre, A. (1984). After Virtue. Indiana:
University of Notre Dame
MacIntyre, A. (1990). Three Rival Versions of
Moral Inquiry. Indiana: University of Notre Dame
Quintana, J. (1995). Pedagogia Moral. Madrid:
Dykinson
Singer, P. (1993) (Ed.). A Companion to Ethics.
Oxford: Blackwell

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Ética de virtude e desenvolvimento do caráter

  • 1. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 1 Lawrence M. Hinman, Ph.D. Director, The Values InstituteUniversity of San Diego Simpósio Internacional sobre Activação do Desenvolvimento Psicológico Universidade de Aveiro, 2006 ÉTICA DE VIRTUDE E DESENVOLVIMENTO MORAL DA PESSOA
  • 2. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 2 INTRODUÇÃO A preocupação com a educação do carácter desenvolveu-se no Ocidente desde o tempo de Platão, cujos primeiros diálogos exploraram as virtudes da coragem e da justiça. Platão
  • 3. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 3 RENASCIMENTO DA TEORIA ÉTICA DA VIRTUDE A PARTIR DE 1980 Elisabeth Anscombe (1958) e Alasdair MacIntyre (1990) Contributo de Anscombe: - A ética deontológica, baseada no dever e obrigação, tornou-se ininteligível - A ética deontológica, baseada na ideia de “agir não para satisfazer um desejo ou um querer do indivíduo, mas apenas porque é eticamente correcto fazê-lo”, deixou de ter sentido. - A virtude só faz sentido quando preenche necessidades humanas (ética teleológica)
  • 4. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 4 O CONTRIBUTO DE MACINTYRE Não existe uma só tradição ética no Ocidente, mas várias. Somos perfeccionistas no desporto e nas artes, utilitaristas na vida diária, lockianos quando se trata de respeitar o direito de propriedade, cristãos quando idealizamos a compaixão, a caridade e a igualdade e kantianos quando afirmamos o valor da autonomia da pessoa e do respeito pelos direitos humanos.
  • 5. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 5 O CONTRIBUTO DE MACINTYRE (2) Qual o significado da vida? - O significado depende da pessoa compreender que pertence a uma ou a várias tradições morais, as quais lhe permitem construir uma narrativa para a sua vida, que depende da existência de “standards” de excelência e de certas práticas apropriadas.
  • 6. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 6 O CONTRIBUTO DE MACINTYRE (3) As virtudes só podem prosperar em comunidades de certo tipo. Ou seja, há comunidades que impedem o florescimento das virtudes O que quer dizer que a pessoa virtuosa floresce melhor numa comunidade virtuosa. Diferentes tipos de comunidade encorajam diferentes tipos de virtude.
  • 7. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 7 O CONTRIBUTO DE MACINTYRE (4) Embora o carácter da pessoa tenha condicionantes genéticas e seja, de algum modo, fixo, é possível mudá-lo. Na medida em que os actos são realizados em liberdade e o agente tem oportunidade de reflectir sobre as suas consequências, há alguma margem para a mudança do carácter. A reflexão sobre as consequências exige “ethical guidance”, hábito e envolvimento.
  • 8. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 8 Primeira Parte A estrutura da Virtude
  • 9. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 9 Duas Questões Morais A questão da acção: – Como devo agir? A questão do carácter – Que espécie de pessoa devo ser? A nossa preocupação é com a questão do carácter
  • 10. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 10 Uma analogia a partir do sistema de justiça • Como país, depositamos a nossa vontade de justiça, na área legal, de duas maneiras: – Leis, que proporcionam as regras necessárias – Pessoas, que aplicam a justiça • Do mesmo modo, a ética baseia-se em: – Teorias, que proporcionam regras de conduta – A virtude, que proporciona a sabedoria necessária para aplicar as regras aos casos particulares
  • 11. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 11 Virtude Força de carácter (hábito) Envolvendo o sentimento e a acção Procura o meio termo entre o excesso e a deficiência em relação a nós próprios Promove o desenvolvimento humano Aristoteles
  • 12. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 12 Duas Concepções de moralidade Podemos contrastar duas concepções de vida moral. – A concepção infantil: • Tem origem externa (os pais, por exemplo). • É negativa. • A formação de regras e do hábito é central. – A concepção adulta: • Tem origem interna. • É positiva. • Centrada na virtude, quase sempre modelada por ideais.
  • 13. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 13 Inteligência e Sabedoria A pessoa inteligente é a que conhece os melhores meios para qualquer finalidade possível. A pessoa sabedora é a que conhece quais são os fins que são estimáveis.
  • 14. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 14 Desejos Bem Ordenados Aristóteles faz um contraste entre: – Pessoas continentes, que conseguem controlar os desejos desordenados. – Pessoas temperadas, cujos desejos são bem ordenados, em função do que é bom para elas. – Pessoas de vontade fraca (Akrasia) ou seja indivíduos que não são capazes de controlarem os seus desejos.
  • 15. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 15 Virtude como Meio Termo A força de carácter exige que a pessoa encontre o equilíbrio certo entre dois extremos. – Excesso: ter em demasia algo. – Deficiência: ter demasiado pouco de algo. Não significa mediocridade, mas sim harmonia e equilíbrio.
  • 16. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 16 Virtude e Hábito A virtude é alguma coisa que é praticada e aprendida – é um hábito (hexis). Aristóteles considera que é possível ensinar as pessoas serem virtuosas.
  • 17. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 17 Segunda Parte Virtudes Particulares Coragem Compaixão Amor próprio Amizade Perdão
  • 18. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 18 A coragem e a unidade das virtudes Para uma pessoa ter uma virtude de carácter, em grande escala, também deve ter outras qualidades, em alguma medida. – A coragem sem capacidade de julgamento é cegueira. – A coragem sem perseverança é apostar apenas no curto prazo. – Coragem sem um claro conhecimento das nossas capacidades é uma forma de loucura.
  • 19. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 19 Compaixão e Piedade A piedade significa olhar para o outro de cima para baixo. – Consequentemente, ninguém quer ser objecto de piedade. A compaixão olha para o sofrimento dos outros como se fosse algo que pudesse acontecer-nos. – Consequentemente, gostamos que os outros tenham compaixão para connosco.
  • 20. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 20 Compaixão Etimologia: sentir ou sofrer com o outro. Cognitivamente e emocionalmente. Conduz à acção. Excesso:o síndrome do “coração partido”. Deficiência: Insensibilidade ou “dureza de coração”. Contrasta com a piedade.
  • 21. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 21 Compaixão como emoção A emoção é muitas vezes necessária: – Para reconhecer o sofrimento dos outros. • Ligação emocional. – Para dar resposta aos que sofrem. • Os outros precisam de saber que nos importamos com eles.
  • 22. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 22 Amor Envolve sentir, conhecer e agir. Características do amar outra pessoa: – Sentimentos de ternura, cuidado, apreço e respeito. – Conhecer essa pessoa. – Agir de forma a promover o florescimento dessa pessoa.
  • 23. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 23 Amor Próprio: Características Características: – Ter sentimentos de cuidado, apreço e respeito por si próprio. – Valorar-se a si próprio na justa medida. – Conhecer-se a si próprio. – Agir de forma a promover o seu próprio florescimento.
  • 24. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 24 Amor Próprio: Deficiência Deficiência: – Reduzida capacidade para sentir. – Reduzida capacidade para se auto- avaliar e tendência para a autodepreciação. – Reduzida capacidade para se autoconhecer. – Reduzida capacidade para agir.
  • 25. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 25 Amor Próprio: Excesso Pode assumir várias formas: arrogância, egoismo, vaidade e narcisismo. Excesso de centração em si próprio. Autoconceito exagerado e irrealista. Demasiada confiança em si próprio: narcisismo. Demasiada acção em proveito próprio: egoismo.
  • 26. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 26 Amizade Para Aristóteles, não há necessariamente uma dicotomia entre o interesse próprio e a preocupação pelos outros. Sem amigos, não podemos ser felizes. – “…ninguém escolhe viver sem amigos, ainda que tenha todos os outros bens” EN, VIII, 1.
  • 27. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 27 O que é a amizade? “O amigo é aquele que partilha o teu prazer naquilo que é bom e a tua dor naquilo que é desagradável, pelo teu próprio valor e por mais nenhuma razão.” --Retórica, Livro II, Cap. 4; 1380b36-1381a5
  • 28. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 28 Tipos de Amizade A Amizade pode ter os seguintes fins: – Utilidade: acaba quando o propósito da utilidade cessa. – Prazer: acaba quando a fonte de prazer cessa. – Um partilha pelo que é bom: “A amizade perfeita é a amizade que se baseia na partilha de virtudes e em mais nenhuma razão.” EN, VIII, 3.
  • 29. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 29 Perdão – É uma virtude indispensável ao florescimento humano: – Em qualquer relação de longo prazo (amizade, casamento,etc.),cada um pode fazer coisas que devem ser perdoadas pelo outro. – Relações de longo prazo são essenciais para o florescimento humano. – Se não conseguirmos perdoar, não seremos capazes de manter as relações.
  • 30. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 30 Perdão: Excesso e Deficiência Excesso: a pessoa que perdoa demasiado facilmente e demasiado rapidamente. – Pode subestimar-se a si própria. – Pode subestimar a ofensa. Deficiência: a pessoa incapaz de perdoar. – Pode sobrestimar a sua importância. – Geralmente leva uma vida amarga e ressentida.
  • 31. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 31 Conclusão As virtudes são os traços de carácter que promovem o nosso florescimento como pessoas. A pessoa virtuosa tem sabedoria prática, a habilidade para conhecer quando e como aplicar melhor as várias perspectivas morais.
  • 32. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 32 Segunda Parte Metodologia de promoção de valores: Os 3 Es: exortação, exemplo e envolvimento (Thomas Lickona)
  • 33. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 33 THOMAS LICKONA: MÉTODO 3 Es ESTRATÉGIAS PARA A SALA DE AULA: O professor como mentor e modelo Reflexão ética em torno de grandes obras Técnicas de gestão de conflitos Reforços Participação na tomada de decisões
  • 34. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 34 MÉTODO 3 Es: OBJECTIVOS Usar os conteúdos para desenvolver o raciocínio moral Estimular a cooperação entre os alunos Desenvolver a responsabilidade e o gosto pelo trabalho e pelo esforço Ensinar os alunos a superarem os conflitos sem recurso à violência Induzir os alunos a cuidarem uns dos outros
  • 35. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 35 MÉTODO 3 Es O conhecimento moral exige: -reflexão -compreensão -formulação de juízos -processo de escolha (cálculo racional, deliberação e acção)
  • 36. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 36 MÉTODO 3 Es Os valores éticos devem percorrer todo o currículo de forma transversal A escola deve entender-se acerca do código de conduta O código de conduta aplica-se em todos os espaços escolares Uma reflexão ética que não conduza à acção é estéril
  • 37. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 37 MÉTODO 3 Es Embora os alunos e os pais devam associar-se ao processo de tomada de conhecimento do código de conduta, são as autoridades escolares e os professores os responsáveis pela sua elaboração, aprovação e aplicação
  • 38. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 38 MÉTODO 3 Es Opção clara pelo reforço da autoridade do professor Reconhecimento da importância da linguagem moral Reconhecimento da importância do hábito no processo de desenvolvimento moral
  • 39. 11/20/2006 (c) Lawrence M. Hinman 39 BIBLIOGRAFIA BÁSICA Aristotle (1985). Nicomachean Ethics. (Introd. e notas de Terence Irwin). Cambridge: Hackett PC Knight, K. (1998). The MacIntyre Reader. (1998). Indiana: University of Notre Dame MacIntyre, A. (1984). After Virtue. Indiana: University of Notre Dame MacIntyre, A. (1990). Three Rival Versions of Moral Inquiry. Indiana: University of Notre Dame Quintana, J. (1995). Pedagogia Moral. Madrid: Dykinson Singer, P. (1993) (Ed.). A Companion to Ethics. Oxford: Blackwell