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Jogo da Amarelinha de Julio Cortázar


     “Toco a sua boca, com um dedo toco o contorno da sua boca, vou desenhando
essa boca como se estivesse saindo da minha mão, como se pela primeira vez a sua
boca se entreabrisse, e basta-me fechar os olhos para desfazer tudo e recomeçar.
Faço nascer, de cada vez, a boca que desejo, a boca que a minha mão escolheu e
desenha no seu rosto, e que por um acaso que não procuro compreender coincide
exatamente com a sua boca, que sorri debaixo daquela que a minha mão desenha em
você.”
      Existem três maneiras de se contar uma história sobre um incêndio. A primeira é
falar sobre os mortos, os destroços, os desastres e as conseqüências; a segunda se
remete a narrar exclusivamente o incêndio, como aconteceu, o que houve, narrando
detalhe por minudencia, tornando o meio da história o seu inicio, isto é, no caos das
labaredas é quando tudo de mais importante acontece; e a última é falar dos
sobreviventes, dos que escapuliram pelas janelas, fugiram e do reencontro com os
familiares; cada uma delas pode ou não ter um fundo ideológico que está por trás do
relato, seja um conto, um filme, um livro.
      Neste Livro, Rayuela na argentina, do Brasil simplesmente conhecido como Jogo
da Amarelinha, Cortázar demonstra o porquê que é reconhecido como o autor de um
dos livros mais importantes do contemporâneo, desconstruindo inclusive a maneira
que os livros são tratados no decorrer da história, pois a principio o leitor é convidado
a seguir duas propostas de leitura, ou aceita a imposta pelo escritor, que começa em
capítulos afastados das primeiras páginas, numa ordem não linear, indo e vindo, lendo
o livro de um modo completamente insano, ou, aceita a imposta pela sociedade
literária, começo, meio e fim, capitulo 1,2,3,4, e etecetera.
      Isto torna o livro então num complexo desestruturado, causador de inúmeras
rupturas que vai causar aos leitores, com Julio propondo uma nova maneira de ler um
livro. Como leitores, também somos condicionados, por determinadas formas de se ler
um romance, e Julio vai além, mudando nossos hábitos. Fazendo-nos questionar por
que eu leio um livro de tais maneiras. Põe em cheque-mate o jeito pelo qual
analisamos uma obra. Simplesmente, ele distorce a nossa visão de leitura dum livro.
      Sem falar na maneira como os personagens estão detalhados, faz um paralelo
duma simples brincadeira de criança, um jogo de amarelinha, criando uma metáfora
congruente ao existencialismo de Sartre, uma visão pós-dostoievskiana, ou pós-
pushkin da vida moderna; como se nossas decisões levassem ora ao céu ou inferno,
caminho à frente sem voltas para aquilo que escolhi de meu rumo.
Ademais, a narrativa lembra os grandes clássicos franceses como o escritor
célebre Marcel Proust ou Gustave Flaubert; entretanto, a crítica argentina, a maneira
de ser enxergar a vida, a sociedade e a cultura, junto com o típico sarcasmo dos
nossos hermanos estão intrínsecos ao livro para nos lembrar de que estamos lendo,
sobretudo, um livro argentino. Se por ocasião do momento, podemos dizer sem
qualquer pernosticismo, Cem anos de Solidão é o melhor romance latino-hispânico de
todos os tempos desde o grande clássico de Dom Quixote de La Mancha; logo
também deve ser enfatizado que Jogo da Amarelinha não está num nível aquém,
merece destaque pela estrutura de narrativa experimentalista, certamente um
desdobramento de James Joyce e suas propostas narrativas já no inicio do século, só
que, não perde-se (Um grave problema de muitos livros da literatura nacional
contemporânea)     na   estruturação    dos   capítulos,   narrativas   ou   princípios
experimentalistas, como se a linguagem, a língua portuguesa (No caso, Língua
Espanhola) fosse a primordial questão dum livro esquecendo-se de lado o enredo, fato
que está longe de acontecer nos livros de Julio Cortázar, podendo-nos colocá-lo no
mesmo patamar de Gabriel Garcia Marques, José Luis Borges, a grande primeira e
notável fase de Mario Vargas LIosa; visto que a história se completa com personagens
que aparecem no relato dando um verdadeiro impacto sobre a vida cotidiana com
pequenos acontecimentos carregados por uma brusca alegoria da nossa sociedade,
dos nossos conceitos e da nossa maneira de enxergar esta vida, sucumbida a um
único modo de analisá-la.
     E não estaria dizendo besteira se chamasse este escritor de Gênio e a sua obra
de excelente nível, mas não sendo uma "Obra Completa" (Moby Dick, Irmãos
Karamazóv, Em busca do tempo perdido). É, sim, de imprescindível leitura para todos
que são apaixonados por livro, sobretudo livros de excelência e literatura como diria o
filosofo Jacques Derrida, uma escrita por si só um ato de si mesmo, uma “ecriture”.
     Os personagens são de fato, ensaios modernos, como La Maga, Horacio,
Rocamadour, personas aprisionadas em arquétipos existencialistas que demonstram
duas questões de verossímil reflexão, primeiro: se as nossas decisões pertencem a
nós mesmo, segundo: que resultados e conseqüências as decisões podem nos trazer,
tal como um jogo de amarelinha, como se a vida fosse deixada ao acaso, esperando
por fim uma recompensa de ir ao céu.
     Rayuela significaria a mandala, uma estrada da humanidade em busca dos seus
objetivos, ou uma estrada para descobrir seus objetivos, àquilo que estamos sempre a
procurar. Não é à toa que este pensamento perpetuou por toda uma literatura, desde
Murakami a Samarago, desde Tolstoi a Virginia Woolf; então podemos começar um
preâmbulo a partir deste principio que Cortázar propõe com seu livro, congruente até
mesmo a capa, uma nova maneira de seu enxergar a vida para nascerem reflexões
que ainda desconheceríamos e em que tipo de sociedade estamos vivendo para
assim, iniciar uma nova reflexão, ao contrário: sem começo, sem meio ou sem fim,
porque como sociedade já provamos uma coisa. Analisar a vida da maneira em que
estamos desde os seus primórdios da civilização humana não tem repercutido efeitos,
está ai a fome, a desgraça, as guerras, a violência, o desemprego e sobretudo, a
nossa incapacidade de nos conhecer.


     P.P.F. Simões


     Jogo da Amarelinha de Julio Cortázar editora Civilização Brasileira

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  • 1. Jogo da Amarelinha de Julio Cortázar “Toco a sua boca, com um dedo toco o contorno da sua boca, vou desenhando essa boca como se estivesse saindo da minha mão, como se pela primeira vez a sua boca se entreabrisse, e basta-me fechar os olhos para desfazer tudo e recomeçar. Faço nascer, de cada vez, a boca que desejo, a boca que a minha mão escolheu e desenha no seu rosto, e que por um acaso que não procuro compreender coincide exatamente com a sua boca, que sorri debaixo daquela que a minha mão desenha em você.” Existem três maneiras de se contar uma história sobre um incêndio. A primeira é falar sobre os mortos, os destroços, os desastres e as conseqüências; a segunda se remete a narrar exclusivamente o incêndio, como aconteceu, o que houve, narrando detalhe por minudencia, tornando o meio da história o seu inicio, isto é, no caos das labaredas é quando tudo de mais importante acontece; e a última é falar dos sobreviventes, dos que escapuliram pelas janelas, fugiram e do reencontro com os familiares; cada uma delas pode ou não ter um fundo ideológico que está por trás do relato, seja um conto, um filme, um livro. Neste Livro, Rayuela na argentina, do Brasil simplesmente conhecido como Jogo da Amarelinha, Cortázar demonstra o porquê que é reconhecido como o autor de um dos livros mais importantes do contemporâneo, desconstruindo inclusive a maneira que os livros são tratados no decorrer da história, pois a principio o leitor é convidado a seguir duas propostas de leitura, ou aceita a imposta pelo escritor, que começa em capítulos afastados das primeiras páginas, numa ordem não linear, indo e vindo, lendo o livro de um modo completamente insano, ou, aceita a imposta pela sociedade literária, começo, meio e fim, capitulo 1,2,3,4, e etecetera. Isto torna o livro então num complexo desestruturado, causador de inúmeras rupturas que vai causar aos leitores, com Julio propondo uma nova maneira de ler um livro. Como leitores, também somos condicionados, por determinadas formas de se ler um romance, e Julio vai além, mudando nossos hábitos. Fazendo-nos questionar por que eu leio um livro de tais maneiras. Põe em cheque-mate o jeito pelo qual analisamos uma obra. Simplesmente, ele distorce a nossa visão de leitura dum livro. Sem falar na maneira como os personagens estão detalhados, faz um paralelo duma simples brincadeira de criança, um jogo de amarelinha, criando uma metáfora congruente ao existencialismo de Sartre, uma visão pós-dostoievskiana, ou pós- pushkin da vida moderna; como se nossas decisões levassem ora ao céu ou inferno, caminho à frente sem voltas para aquilo que escolhi de meu rumo.
  • 2. Ademais, a narrativa lembra os grandes clássicos franceses como o escritor célebre Marcel Proust ou Gustave Flaubert; entretanto, a crítica argentina, a maneira de ser enxergar a vida, a sociedade e a cultura, junto com o típico sarcasmo dos nossos hermanos estão intrínsecos ao livro para nos lembrar de que estamos lendo, sobretudo, um livro argentino. Se por ocasião do momento, podemos dizer sem qualquer pernosticismo, Cem anos de Solidão é o melhor romance latino-hispânico de todos os tempos desde o grande clássico de Dom Quixote de La Mancha; logo também deve ser enfatizado que Jogo da Amarelinha não está num nível aquém, merece destaque pela estrutura de narrativa experimentalista, certamente um desdobramento de James Joyce e suas propostas narrativas já no inicio do século, só que, não perde-se (Um grave problema de muitos livros da literatura nacional contemporânea) na estruturação dos capítulos, narrativas ou princípios experimentalistas, como se a linguagem, a língua portuguesa (No caso, Língua Espanhola) fosse a primordial questão dum livro esquecendo-se de lado o enredo, fato que está longe de acontecer nos livros de Julio Cortázar, podendo-nos colocá-lo no mesmo patamar de Gabriel Garcia Marques, José Luis Borges, a grande primeira e notável fase de Mario Vargas LIosa; visto que a história se completa com personagens que aparecem no relato dando um verdadeiro impacto sobre a vida cotidiana com pequenos acontecimentos carregados por uma brusca alegoria da nossa sociedade, dos nossos conceitos e da nossa maneira de enxergar esta vida, sucumbida a um único modo de analisá-la. E não estaria dizendo besteira se chamasse este escritor de Gênio e a sua obra de excelente nível, mas não sendo uma "Obra Completa" (Moby Dick, Irmãos Karamazóv, Em busca do tempo perdido). É, sim, de imprescindível leitura para todos que são apaixonados por livro, sobretudo livros de excelência e literatura como diria o filosofo Jacques Derrida, uma escrita por si só um ato de si mesmo, uma “ecriture”. Os personagens são de fato, ensaios modernos, como La Maga, Horacio, Rocamadour, personas aprisionadas em arquétipos existencialistas que demonstram duas questões de verossímil reflexão, primeiro: se as nossas decisões pertencem a nós mesmo, segundo: que resultados e conseqüências as decisões podem nos trazer, tal como um jogo de amarelinha, como se a vida fosse deixada ao acaso, esperando por fim uma recompensa de ir ao céu. Rayuela significaria a mandala, uma estrada da humanidade em busca dos seus objetivos, ou uma estrada para descobrir seus objetivos, àquilo que estamos sempre a procurar. Não é à toa que este pensamento perpetuou por toda uma literatura, desde Murakami a Samarago, desde Tolstoi a Virginia Woolf; então podemos começar um preâmbulo a partir deste principio que Cortázar propõe com seu livro, congruente até
  • 3. mesmo a capa, uma nova maneira de seu enxergar a vida para nascerem reflexões que ainda desconheceríamos e em que tipo de sociedade estamos vivendo para assim, iniciar uma nova reflexão, ao contrário: sem começo, sem meio ou sem fim, porque como sociedade já provamos uma coisa. Analisar a vida da maneira em que estamos desde os seus primórdios da civilização humana não tem repercutido efeitos, está ai a fome, a desgraça, as guerras, a violência, o desemprego e sobretudo, a nossa incapacidade de nos conhecer. P.P.F. Simões Jogo da Amarelinha de Julio Cortázar editora Civilização Brasileira