O râguebi está a crescer em popularidade entre crianças e jovens em Portugal. A maioria dos atletas federados tem menos de 14 anos. O evento Youth Rugby Festival reuniu 1800 jovens jogadores no Jamor para celebrar o esporte. O râguebi exige trabalho em equipe e superação pessoal.
1. miúdos
O râguebi (também)
é para meninos
O campeonato do mundo de 2007 trouxe o râguebi para os ecrãs e para a vida de
muitos miúdos em Portugal. Hoje, a maioria dos atletas federados tem menos de
14 anos e os clubes já nem conseguem aceitar todas as crianças que os procuram.
Há uma semana, o Jamor acolheu a festa da 3.ª edição do Youth Rugby Festival.
Texto Rita Pimenta Ilustração Bárbara Fonseca
2. T
odas as idades É uma questão de maturidade, “Onde vivemos, o céu está Todos os dias temos de nos
são boas para primeiro, e física, depois.” sempre nublado, o tempo é superar”, diz o responsável pela
se começar a Como se convence um miúdo chuvoso e frio. Sabe-nos muito formação dos jovens.
praticar râguebi. a jogar râguebi? “Levando-o bem estar aqui, mas vai ser Da mesma opinião é José
No entanto, o a experimentar no clube difícil jogar com este calor. É Maria Vareta, atleta da selecção
maior número de mais próximo de sua casa. Os uma experiência diferente. nacional de sub-17, com 16
atletas inscritos na federação treinadores estão preparados Na verdade, não importa.” O anos e membro da Associação
portuguesa da modalidade tem para os receber. Apesar de ser resultado atestou a confiança: Prazer de Jogar Râguebi (Porto).
menos de 14 anos. Informação um jogo de combate, de contacto venceram a selecção nacional por “Não há palavras para definir
dada por Henrique Rocha, físico, há metodologias para 55-17. o râguebi. É um desporto
responsável pela selecção ensinar os miúdos a proteger-se inacreditável, um grupo de
nacional de sub-17. “Eu, por e a saber lidar bem quer com o Superação permanente amigos que engloba tudo.”
exemplo, comecei aos 15”, diz o adversário quer com o chão.” O seleccionador nacional Começou aos cinco anos,
também director da formação Embora se associe este português já tinha enumerado as influenciado pela família, e diz
da Federação Portuguesa de desporto à violência, é daqueles virtudes do râguebi: “É um jogo sorridente: “É um desporto
Râguebi. E foi a tempo. em que se registam menos colectivo, ninguém consegue por muito bom. Os meus pais, os
“Joguei no CDUP [Centro lesões graves. “Nós estamos a si só resolver os seus problemas. meus tios e os meus avós já
Desportivo Universitário do Porto] monitorizar os miúdos, ainda hoje Tem de contar com a equipa, tem jogavam no CDUP. Eu jogo na
e na selecção nacional”, contou preencheram um inquérito sobre de ser solidário, tanto com o que o Associação Prazer de Jogar
à Pública, no Estádio do Jamor, isso. O número de lesões graves companheiro faz bem, como com Râguebi. É um novo clube
antes do jogo particular entre a é muito reduzido. Temos, sim, o que faz menos bem. E tem de ser que há no Porto desde 2004.
equipa de Clifton College (sub-19) uma percentagem relativamente o primeiro a ajudar. Só um jogador Não está cá mais ninguém do
e a selecção portuguesa de sub-17, elevada ao nível de contusões e é que tem a bola, os outros todos grupo, infelizmente. Mas podia
na 3.ª edição do TMN Youth Rugby escoriações. Há uma máxima no estão ali para ajudá-lo.” estar. É um grupo muito bom.”
Festival Portugal 2011. râguebi que é: ‘Incha, desincha e Esse espírito de equipa O meio mais alargado que é a
O treinador confirma a passa’”, explica a rir-se. serve para outras facetas selecção também é “muito bom.
suspeita de que cada vez há mais dos jogadores. “O conceito O ambiente deixa-nos à vontade
procura: “Desde a participação Técnica contra o medo de desporto é a superação. e sabemos que contamos com
de Portugal no campeonato do De violência também falou à E o râguebi é a superação a ajuda de todos”, garante José
mundo de 2007, temos vindo a Pública Jean-Baptiste Bruzulier, permanente, sobretudo ao nível Maria Vareta.
receber muito mais jogadores 18 anos e capitão da equipa de do contacto físico. Cria receio, O atleta não sente, portanto, a
nos clubes.” Mas a oferta não Clifton College sub-19 (Bristol, aprende-se a controlar os medos falta dos companheiros da equipa.
consegue corresponder a Reino Unido). “É um jogo que e exige um esforço grande. “É um trabalho diferente c
tanto interesse. “Há clubes que pode ser violento, se se quiser.
estão sobrelotados e já não Mas nós não queremos. Às vezes
têm capacidade para aceitar. É sentimos alguma violência, Há metodologias para ensinar
impossível. Até por questões de
espaço físico.”
quando nos vemos perante
‘matulões’ (big boys). Mas há
os miúdos a proteger-se e a saber
O responsável pela selecção técnicas para vencer o medo.” lidar com o adversário
diz que, de 2008 para 2010, Jean-Baptiste prefere, no
houve “um incremento de entanto, valorizar “a coragem, e com o chão
47 por cento do número de a iniciativa e a atitude” que o
treinadores”, mas ainda assim râguebi estimula. “O espírito
“são insuficientes para satisfazer de equipa, o saber reconhecer
as necessidades”. e agradecer a ajuda do outro”
são aspectos basilares que
Incha, desincha, passa diz “transportar” para outros
Henrique Rocha reforça a campos da sua vida.
ideia de que qualquer idade O jovem de 18 anos estava
é boa para se iniciar a prática radiante com o sol e o calor em
da modalidade, tanto em se Lisboa, embora soubesse que
tratando de rapazes como de iriam perturbar o desempenho
raparigas. “Normalmente, as dos atletas. Instalados em Cascais,
raparigas, entre os dez e os 13 alguns dos jogadores já tinham
anos, levam alguma vantagem desfrutado da praia e do sol, o que
relativamente aos rapazes. se notava na pele ligeiramente
Depois, começam a perdê-la. “cor-de-rosa” de muitos deles.
3. miúdos
José Vareta, 16 anos, invoca “o prazer do que fazemos no clube. Mas
entro no campo sempre da
nacionais, foram ao Jamor
jogar (e ganhar) ao sol.
de jogar râguebi”. Um desporto que mesma maneira, concentrado,
com confiança e disponível
Segundo Andrew Webb, “são
tudo bons rapazes”.
“exige felicidade e querer jogar, não para dar o meu melhor. E sei
É difícil escolher
se pode ser obrigado” que os outros estão lá para
mim, como eu estou para eles.” Treze clubes integraram a
E, claro, joga feliz, com “o selecção nacional de sub-
prazer de jogar râguebi”. Um 17 — Clube de Futebol Os
desporto que “exige a felicidade Belenenses; Grupo Dramático
e o querer jogar, não se pode ser e Sportivo de Cascais; Grupo
obrigado”. Desportivo de Direito; Clube
De acordo com o atleta, a de Rugby do Técnico; Clube de
escola não é penalizada pela Rugby de Évora; Guimarães
prática desportiva: “Quando Rugby Union Football Club;
se quer fazer desporto, Associação Académica de
consegue-se cumprir as duas Coimbra; Centro Desportivo
coisas, consegue-se tudo. Universitário de Lisboa; Rotary
Os resultados escolares Club de Montemor; Centro
estão óptimos, não Desportivo Universitário do
tenho problemas com Porto; Associação dos Antigos
a escola. E os meus Alunos do Instituto Superior de
amigos também não. O Agronomia; Associação Prazer
meu grupo de amigos é de Jogar Rugby e St. Julians.
a minha equipa de râguebi, Henrique Rocha diz que “cada
praticamente.” vez é mais difícil seleccioná-
Perante a prova iminente los, há muitos atletas bons no
frente à equipa de Clifton país e com boa preparação nos
College, o atleta dizia-se clubes. Exige-nos mais trabalho,
“concentrado e ansioso” e mais observação de jogos, mas é
admitia estar “um bocado aliciante. Nós estamos a preparar
nervoso”. Mas nunca perdeu a jogadores para o futuro. Cerca
confiança: “Vai correr bem.” de 90 por cento dos jogadores
Esse espírito positivo e que jogam na selecção de sub-15
confiante tinha sido descrito e sub-17 passaram por nós nos
anteriormente à Pública pelo últimos dez anos”.
treinador da equipa adversária, Todos os entrevistados
Andrew Webb: “Somos de pela Pública (vencedores ou
uma escola com alunos dos 16 derrotados) foram unânimes
aos 18 anos. Estudam a tempo quanto à importância do
inteiro e jogam na academia. evento que decorreu entre 15
Treinam de manhã e ao fim e 16 de Abril: “O Youth Festival
do dia. A nossa temporada é um torneio fantástico. Uma
de competição começa em organização privada que é de
Setembro e termina agora, com louvar, traz pessoas de todo o
este torneio. Para muito deles, mundo para jogar râguebi. E
este é o último jogo connosco. mobiliza os clubes portugueses,
Já atingiram os 19 anos. Embora que estão aqui representados
vindos de lugares diferentes e nos vários escalões.” Num
com níveis e cursos diversos fim-de-semana, 1800 jovens
juntam-se num objectivo jogadores, 1200 portugueses e
comum. E ajudam-se.” 600 estrangeiros, disputaram
Há cinco anos que mais de 300 jogos no Jamor. Foi
vêm encerrar a época a uma festa. a
Portugal. Este ano, depois de
conquistarem cinco troféus rpimenta@publico.pt