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CIDADANIA MUNDIAL

A BASE DA

PAZ
CIDADANIA MUNDIAL

A BASE DA

PAZ
Realização da Comunidade Bahá'í do Brasil
Organização: Marilene de Freitas

ífí-..
©2000
Direitos Reservados:

Jr
Editora Planeta Paz
CP 198
13800-970 - Moai Mirim - SP

ISBN: 85.85690.24.0

Primeira Edição: 2000
Composto em:
Times New Roman -11,5/ Modcrn -18

Organização: Marilenc de Freitas

Capa: Gustavo Pallone de Figueiredo

Impressão: R. Vieira Gráfica e Editora Ltda
Campinas - SP
ÍNDICE
Apresentação
A Cidadania Mundial
Uma ética global para o desenvolvimento
sustentável
Comunidade Internacional Bahá'í

Reflexões dos Cidadãos do Mundo - 1995/1999
Cidadania: A prática dos direitos humanos
Anton Verwey
Renato Zerbini Ribeiro Leão

21

Allo-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados

Libertação através dos direitos humanos
Antônio Augusto Cançado Trindade

29

Presidente da Corte IiUeramericana de Direitos Humanos

Reflexões sobre cidadania
Benedita da Silva

37

Vice-Governadora do Estado do Rio de Janeiro

Geisa da rocinha
Celina Vargas do Amaral
Diretora do Sebrae/RJ

43
Por uma cultura de paz
Daniel John Vaillancourt

45

Diretor Executivo da Escola das Nações, Brasília

Cidadania: construir a paz ou aceitar a violência?
Feizi Milani

51

Presidente do Instituto Nacional de Educação para a Paz e os Direitos
Humanos

59

Os direitos de cada cidadão
Hélio Bicudo
Presidente da Comissão Interamericana de Direitos Humanos

Paz: fraternidade e tolerância
Henry Sobcl
Presidente do Rabinato da Congregação Israelita Paulista

O imenso quebra-cabeças da unidade
Ivone Amando Bezerra

67

Educadora Ambiental

Um processo sem
Jorge Wcrthcin

fim

69

Representante da UNESCO no Brasil

Direitos humanos, direitos de todos
José Grcgori
Ministro da Justiça
Desafios etico-ecológicos: atitudes novas face à uma
realidade nova
Leonardo Boff

77

81

Teólogo

A promoção da cidadania mundial através da
educação
Lúcia Araújo
Diretora do Canal Futura

§7
Manifesto pró-natureza e pela ética ambiental
Miguel Serediuk Milano

87

Diretor da Fundação O Boticário de Proteção à Nature/ü

Direitos Humanos e cidadania mundial
OlmarKlich

93

Presidente do Movimento Nacional dos Direitos Humanos

As crianças, bases para Paz
Rciko Niimi

97

Representante do UNICEF no Brasil

Um avanço em nosso destino
Sônia Shafa

99

Enfermeira

Um testemunho de vida
Ti/uka Yamazaki

103

Cineasta

Notas

106
!"#$%$&'()*+
Por essas idéias muitos lutaram e muitos tombaram.
Profetas do passado tiveram visões sobre um tempo em que
o “leão e o cordeiro beberiam água da mesma fonte”. Poetas
escreveram inspirados poemas e odes louvando o tema da
fraternidade humana. Também por essa idéia muitos continuam
dedicando suas vidas à missão de dar corpo ao conceito que
enseja a visão de um novo mundo, sem fronteiras, sem discriminações, sem sectarismos, sem forças excludentes dos processos
de transformação da sociedade.
Temos nesta obra o pensamento vivo – e que não quer calar
- de uma parcela significativa de expoentes da sociedade brasileira que desde 1995 foram agraciados com o Prêmio Cidadania
Mundial. Este Prêmio, inspirado nas palavras de Bahá’u’lláh, o
fundador da Fé Bahá’í, de que “a Terra é um só país e os seres
humanos seus cidadãos”, é outorgado anualmente aos indivíduos
e instituições que se destacam na defesa dos direitos humanos,
na promoção da condição da mulher, na eliminação do racismo,
na proteção do meio-ambiente, e é uma sinalização da sociedade
civil para o fato de que há muito tempo a cidadania mundial deixou de ser uma idéia e um conceito para ser uma experiência de
vida, compartilhada pelos mais diversos líderes do pensamento
em nossa sociedade que avança para o século XXI.
A seguir, uma breve menção sobre cada uma dessas oportunas reflexões:

1
O Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), destaca que a cidadania como fundamento
da paz é uma realidade que a cada dia agiganta-se à frente daqueles que pensam e constróem a doutrina e a prática dos direitos humanos.
Antônio Augusto Cançado Trindade, presidente da Corte
Interamericana de Direitos Humanos, afirma categoricamente
que paz, justiça social e direitos humanos são indivisíveis e que a
cidadania mundial, como base da paz, está presente nas próprias
origens do Direitos Internacional, sendo que este constitui não
apenas um instrumental jurídico de regulação mas também de
libertação.
Benedita da Silva, Vice-Governadora do Estado do Rio de
Janeiro, observa que a Declaração Universal dos Direitos humanos é o marco decisivo na conquista da cidadania por todos os
povos, com o estabelecimento da liberdade, da justiça e da eqüidade para garantir a paz mundial.
Celina Vargas do Amaral, Diretora do Sebrae/RJ, expressa o anseio de que desejamos viver em uma sociedade forte e
articulada, conviver com instituições representativas, comprometidas e engajadas na missão de transformar uma realidade socialmente injusta e cruel.
Daniel John Vaillancourt, Diretor Executivo da Escola das
Nações, Brasília, afirma que o mundo carece de adultos conscientes... que nossos futuros cidadãos mundiais são, hoje, os
freqüentadores de nossas escolas primárias e secundárias e que
devemos dar a eles a visão, a esperança, a capacidade e a coragem necessárias para que criem uma cultura de paz nesta Planeta que chamamos, nosso lar.
Feizi Milani, Presidente da Instituto Nacional de Educação

2
para a Paz e os Direitos Humanos (INPAZ), discorre que fazer
o bem é algo infinitamente maior do que não fazer o mal e que
não praticar atos violentos é o mínimo que se espera de qualquer
pessoa que pretenda viver em sociedade e vai além ao afirmar
que praticar a paz é viver, construir e ensinar a paz, pois ela só
será alcançada se cada cidadão, família, organização e comunidade se engajar ativamente na construção de relações baseadas
no respeito, na unidade, na diversidade e na empatia.
Hélio Bicudo, Presidente da Comissão Interamericana de
Direitos Humanos, enfatiza que enquanto o direito da população
à saúde, à educação, ao emprego, à justiça e à liberdade de informação e expressão não forem inscritos em nossos corações e
mentes, não poderemos, então, proclamar a cidadania mundial.
Henry Sobel, Presidente do Rabinato da Congregação
Israelita Paulista, afirma que hoje, mais do que nunca, temos que
espalhar a mensagem de fraternidade e tolerância, temos que
ressaltar que somos todos filhos de um mesmo Deus e, portanto,
somos todos irmãos, temos que tentar conscientizar a sociedade
de que só atingiremos nossos objetivos se nos empenharmos,
com determinação, pelo entendimento mútuo.
Ivone Amâncio Bezerra, Educadora Ambiental, destaca que
pelo menos duas afirmativas deixaram sua marca impressa na
consciência de milhões de pessoas no Século XX: “a Terra é um
só país e os seres humanos seus cidadãos” e que “a Terra é um
só organismo e cada ser vivo é parte dele.”
Jorge Werthein, Representante da UNESCO no Brasil, é
categórico ao afirmar que a cultura de paz é uma iniciativa de
longo prazo que deve levar em conta os contextos histórico, político, econômico, social e cultural de cada ser humano e que é
necessário aprendê-la, desenvolvê-la e colocá-la em prática no
dia-a-dia familiar, regional ou nacional... é um processo sem fim!

3
José Gregori, Ministro da Justiça, afirma que a plena consciência dos direitos humanos universais, entendida como
mundialização dos direitos fundamentais, implica, também na criação das condições necessárias para que se desenvolva a consciência, em cada um de nós, das obrigações universais e enfatiza
que direitos Humanos é o único caminho seguro para a paz.
Leonardo Boff, Teólogo, afirma que devemos deixar nascer
em nós o homem/mulher novos, diferentes, complementares, solidários e unidos na construção de um destino comum para nosso
país e para o nosso planeta. Não somos chamados a sermos
galinhas, mas águias. A águia está escondida dentro de cada
anseio e de cada sonho de crescimento e de libertação que fermenta na mente e incendeia o coração. Importa dar asas à águia.
Seu habitat é o céu, as alturas e o espaço aberto e não o rastejar
pelo chão. Cumpre erguer vôo e arrastar outros na mesma aventura da liberdade e da libertação. Nesse processo se fará a revolução para um novo paradigma civilizacional que permitirá a continuação do experimento homo num sentido mais profundo e
melhor do que aquele vivido até o momento.
Lúcia Araújo, Diretora do Canal Futura, enfatiza que é preciso que se cuide, principalmente, das crianças e dos adolescentes, para que a paz se concretize e a consciência de cidadania
seja sedimentada. Para tanto, é necessário implementar, urgentemente, ao lado dos projetos voltados para a educação convencional, um projeto de educação para os valores, cujo objetivo
seja lutar pela construção de uma infância e uma adolescência
mais digna para os pequenos cidadãos e que contribua para a
consolidação de uma cultura da tolerância e da cooperação.
Miguel Serediuk Milano, Diretor da Fundação O Boticário de Proteção à Natureza, destaca que a cidadania mundial
requer respeito entre os homens e a paz; respeito este que só
será verdadeiro quando estiver pautado em amor e fraternidade;

4
paz esta que será, então, apenas uma conseqüência desse respeito e não motivo da busca.
Olmar Klich, Presidente do Movimento Nacional dos Direitos Humanos (MNDH), discorre que a caminhada pelos direitos
humanos é a própria luta do nosso povo oprimido, através de um
processo histórico que se inicia durante a colonização e que continua, hoje, na busca de uma sociedade justa, livre, igualitária,
culturalmente diferenciada e sem classes.
Reiko Niimi, Representante do UNICEF no Brasil, reflete
que todos os países do mundo, com exceção de apenas dois,
disseram “sim” a um belo projeto de mundo: a Convenção sobre
os Direitos da Criança. Afirma que as meninas e os meninos têm
direito a uma escola que respeita suas individualidades e sua cultura... além disso, as crianças cidadãs deste mundo devem ter
respeitados seus direitos ao pensamento e à religião.
Sônia Shafa, enfermeira, recomenda que a concepção de
estrangeiro deve ser abolida. Somos estranhos em quê? Na realidade somos todos idênticos nos nossos sonhos e nos nossos
desejos de Paz. (...) Vivemos num mundo de desafio, onde a
adoção da cidadania mundial dentro de nós mesmos e aplicada
na nossa vida cotidiana nos levará a um avanço no nosso destino:
a prática da verdadeira humanidade.
Tizuka Yamazaki, cineasta, testemunha que o preconceito
racial não se explica, se sente medo... e muita gente sabe disso e
usa do abuso de poder para humilhar o ser humano, humilhado e
com medo, o segregado está sem defesa para sobreviver. Conclui afirmando que através da aceitação das diferenças e do amor
perdemos o medo e transformamos nossas diferenças em armas
a serem usada no caminho que leva a paz.

5
Fica patente após a leitura destes luminosos textos que a estrada que aponta para a cidadania mundial está ao alcance desta
geração. Uma estrada onde podemos encontrar referenciais que,
de certa forma, têm uma influencia direta sobre o comportamento humano em sua experiência de viver em sociedade. Dentre
estes referenciais, destacamos os seguintes:
• A confiança inabalável na unidade do gênero humano.
• A eliminação dos preconceitos de raça, cor, credo nacionalidade, crença religiosa, classe.
• A igualdade de direitos e oportunidades para o homem e a
mulher.
• A harmonia entre a religião, a ciência e a razão.
• A implementação da Declaração Universal dos Direitos
Humanos.
Comunidade Bahá’í do Brasil

Ilustração da Capa
Título: Cidadão do Mundo
Técnica: pintura em seda - 0,70x1,00 m.
Artista plástica: Ita Andrade
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7
8
No espírito da Agenda 21, como um “programa dinâmico” destinado a “evoluir ao longo do tempo à luz das necessidades e circunstâncias em constante transformação”(1), a
Comunidade Internacional Bahá’í oferece a seguinte proposta: As campanhas de educação e conscientização recomendadas na Agenda 21 deveriam cultivar o conceito de
CIDADANIA MUNDIAL para, assim, inspirar os povos do
mundo a promoverem o desenvolvimento sustentável.
A Visão da Cidadania Mundial
O maior desafio que a comunidade mundial enfrenta na
mobilização para implementar a Agenda 21 é o de liberar os
enormes recursos financeiros, técnicos, humanos e morais necessários ao desenvolvimento sustentável. Tais recursos somente serão liberados na medida em que os povos do mundo desenvolvam um profundo senso de responsabilidade pelo destino do
planeta e pelo bem-estar da inteira família humana.
Este senso de responsabilidade somente poderá emergir da
aceitação da unidade da humanidade, e somente será sustentado
por uma visão unificadora de uma sociedade mundial pacífica e
próspera. Sem esse tipo de ética global, as pessoas não poderão
se tornar participantes ativos e construtivos no processo mundial
de desenvolvimento sustentável. (2)
Ainda que a Agenda 21 forneça arcabouço indispensável de
conhecimento científico e “know-how” técnico para a

9
implementação do desenvolvimento sustentável, ela não inspira
um compromisso pessoal a uma ética global. Isso não significa
que a ética e os valores tenham sido desconsiderados durante o
processo da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio
Ambiente e o Desenvolvimento (UNCED). A chamada por valores unificadores foi levantada durante todo aquele processo,
por Chefes de Estado, oficiais da ONU, representantes de organizações não-governamentais (ONG’s) e cidadãos individuais.
Em particular, os conceitos de “nossa humanidade comum”, “cidadania mundial” e “unidade na diversidade” foram invocados como o
sustento ético para a Agenda 21 e a Declaração do Rio.(3)
Assim, a comunidade mundial já chegou a um acordo básico
sobre a necessidade de uma ética global para revitalizar a Agenda 21. Sugerimos que a expressão, cidadania mundial, seja
adotada para englobar o conjunto dos princípios, valores, atitudes
e comportamentos que os povos do mundo devem adotar para a
realização do desenvolvimento sustentável.
A cidadania mundial começa com a aceitação da unidade
da família humana e a interconexão das nações da “Terra, nosso
lar”.(4) Ao mesmo tempo que incentiva um patriotismo são e legítimo, ela insiste também numa lealdade mais ampla, um amor à
humanidade como um todo. Na implica, entretanto, no abandono
de lealdades legítimas, na supressão da diversidade cultural, na
abolição da autonomia nacional ou na imposição da uniformidade. Ela é caracterizada pela “unidade na diversidade”. A cidadania mundial engloba os princípios de justiça social e econômica,
entre as nações e dentro das mesmas; a tomada de decisões de
maneira cooperativa em todos os níveis da sociedade; a igualdade dos sexos; a harmonia racial, étnica, nacional e religiosa; e, a
disposição de sacrificar-se pelo bem comum. Outras facetas da
cidadania mundial – todas as quais promovem a honra e a
dignidade humanas, a compreensão, a amizade, a cooperação, a
confiabilidade, a compaixão e o desejo de servir – podem ser
deduzidas daquelas já mencionadas. Alguns destes princípios(5)
têm sido articulados na Agenda 21; entretanto, a maioria chama

10
a atenção pela sua ausência. Outrossim, não foi fornecido nenhum arcabouço conceitual sob o qual eles pudessem ser harmonizados e promulgados.
Fomentar a cidadania mundial é uma estratégia pratica para
promover o desenvolvimento sustentável. Enquanto a desunião,
o antagonismo e o provincialismo caracterizarem as relações
sociais, políticas e econômicas dentro e entre as nações, um padrão global e sustentável de desenvolvimento não poderá ser
estabelecido.(6) Há mais de um século, Bahá’u’lláh advertiu: “O
bem-estar da humanidade, sua paz e segurança, são inatingíveis,
a não ser e até que se estabeleça firmemente sua unidade”. Uma
sociedade global sustentável somente poderá ser construída sobre o alicerce de unidade, harmonia e compreensão genuínas
entre os diversos povos e nações do mundo
Portanto, recomendamos que a cidadania mundial seja ensinada em todas as escolas e que a unidade da humanidade – o
princípio que fundamenta a cidadania mundial – seja constantemente declarado em cada nação.
O conceito de cidadania mundial não é novo para a comunidade mundial. Ele está implícito e explícito em muitos documentos, cartas e acordos da ONU, inclusive nas primeiras palavras da própria Carta da ONU: “Nós, os povos das Nações Unidas...”, e já está sendo promovido ao redor do mundo em todas
as culturas por diversas ONG’s, acadêmicos, grupos de cidadãos, artistas, programas educativos e pela mídia. Tais esforços
são significativos, mas precisam ser largamente ampliados. Uma
campanha de longo prazo, cuidadosamente planejada e orquestrada, e envolvendo todos os setores da sociedade em nível local,
nacional e internacional, precisa ser iniciada para fomentar a cidadania mundial. A mesma deve ser prosseguida com todo o
vigor, coragem moral e convicção que as Nações Unidas, seus
Estados membros e todos os parceiros que estiverem dispostos a
colaborar, possam reunir.

11
A Promoção da Cidadania Mundial
A seguinte proposta de uma campanha para promover a cidadania mundial(7) cabe naturalmente dentro do arcabouço para
a reorientação a educação, conscientização e capacitação visando o desenvolvimento sustentável, conforme apresentado no
Capitulo 36 da Agenda 21.

!,;/2-!IJ7
A educação – formal, não-formal e informal – é sem dúvida,
a maneira mais eficaz de moldar os valores, atitudes, comportamentos e habilidades que capacitarão os povos do mundo a agirem de acordo com os interesses de longo prazo do planeta e da
humanidade como um todo.(8) As Nações Unidas, os governos e
as agências educacionais deveriam procurar tornar o princípio da
cidadania mundial parte integrante da educação de cada criança.
Os detalhes dos programas e atividades educativas incorporando tal princípio irão variar muito entre as nações e dentro
das mesmas. Entretanto, para que a cidadania mundial seja
considerada um princípio universal, todos os programas deverão
ter certos aspectos em comum. Baseados no princípio da unidade da raça humana, eles deveriam cultivar a tolerância e a
fraternidade, fomentando uma apreciação pela riqueza e importância dos diversos sistemas culturais, religiosos e sociais do mundo
e fortalecendo aquelas tradições que contribuem para uma civilização mundial sustentável. Eles deveriam ensinar o princípio da
“unidade na diversidade” como a chave para o poder e a riqueza,
tanto para as nações quanto para a comunidade mundial. Deveriam fomentar uma ética de serviço ao bem comum e incutir
uma compreensão dos direitos e responsabilidades da cidadania
mundial. Tais programas e atividades deveriam partir dos esforços positivos do país e realçar seus sucessos tangíveis, incluindo
modelos de unidade racial, religiosa, nacional e étnica. Deveriam
enfatizar a importância da ONU na promoção de cooperação e

12
compreensão globais; suas metas, objetivos e programas universais; sua relevância imediata aos povos e nações do mundo; e o
papel que ela deve continuamente assumir em nosso mundo cada
vez mais interconectado.
Antes que seja iniciada uma campanha para promover a
cidadania mundial, será preciso desenvolver uma compreensão comum do conceito e alcançar um consenso do mesmo. A
Comissão para o Desenvolvimento Sustentável poderia desenvolver um comitê especial ou grupo de trabalho para começar a
desenvolver diretrizes para a cidadania mundial e propostas
para a incorporação deste princípio nos programas existentes de
educação formal e não-formal. Alternativamente, a Comissão
poderia buscar a ajuda do Conselho Assessor de Alto Nível para
o Desenvolvimento Sustentável. O Secretariado da ONU poderia estabelecer um Centro para a Cidadania Mundial, semelhante ao antigo Centro de Estudos da Paz, para desenvolver tais
diretrizes e coordenar a implementação em todo o sistema da
educação para a cidadania mundial. Qualquer que seja o caminho escolhido, esta tarefa terá que receber alta prioridade.
A cidadania mundial poderia facilmente ser incorporada em todas as atividades sugeridas no Capítulo 36.5. da Agenda 21, para reorientar a educação na direção do desenvolvimento sustentável. Alguns exemplos são ilustrativos:

• As assessorias nacionais/mesas redondas (36.5.c) deveriam facilitar a incorporação da cidadania mundial nos programas educacionais dentro do país.
• Os programas de treinamento e aperfeiçoamento para todos os professores, administradores, planejadores educacionais
e educadores não-formais (36.5.d) deveriam incluir o princípio
da cidadania mundial nas suas programações.
• Os materiais educativos sobre o desenvolvimento sustentável produzidos pelas agências da ONU, bem como os materiais educativos sobe as Nações Unidas, deveriam incentivar a
cidadania mundial (36.5.g).
13
• A Agenda 21 recomenda “o desenvolvimento de uma rede
internacional” para apoiar os esforços globais de educação para
o desenvolvimento sustentável (36.5.k). Tal rede poderia incentivar as agências das Nações Unidas e ONG’s afiliadas a criarem
materiais baseados nas diretrizes para a cidadania mundial e providenciarem os meios de compartilhá-los.
• Os governos e as autoridades educacionais já foram instados a “eliminar os estereótipos baseados em gênero nos currículos”, como um meio de promover o desenvolvimento sustentável (36.5.m). Recomendamos que, dentro do espírito de cidadania mundial, os estereótipos baseados em religião, cultura, raça,
classe, nacionalidade e etnicidade sejam também eliminados.
!,-70<-.;05.K!IJ7,/7,9L83.-7
As pessoas precisam considerar-se cidadãos do mundo e
entender sua responsabilidade de promoverem o desenvolvimento
sustentável.(9) As campanhas de conscientização dos desafios
da cidadania mundial devem aproveitar toda a mídia e as artes,
inclusive a televisão, vídeo, cinema, rádio, redes eletrônicas, livros, revistas, cartazes, panfletos, teatro e música. Tais campanhas deveriam envolver as indústrias de publicidade e entretenimento, os meios tradicionais e não tradicionais de comunicação,
o sistema inteiro das Nações Unidas, todos os Estados membros,
as ONG’s e personalidades populares. Elas deveriam alcançar o
lar, o local de trabalho, as áreas públicas e as escolas. As diretrizes para a cidadania mundial, cujo estabelecimento foi recomendado acima devem ser adequadas para uso em tais campanhas
de conscientização, e devem servir como uma referência básica
para toda a programação para a mídia.
A cidadania mundial poderia ser incluída nas atividades
apresentadas no capítulo 36.10. da Agenda 21, para aumentar a
consciência e a sensibilidade do público em relação ao desenvolvimento sustentável. Os seguintes exemplos são ilustrativos:

14
• Conselhos assessores nacionais e internacionais (36.10.a)
poderiam incentivar os diversos meios de comunicação a adotarem as diretrizes para a cidadania mundial. A mídia tem feito
muito para conscientizar o público sobre a interdependência global e os enormes desafios que a comunidade mundial enfrenta.
Tem, também, realçado as diferenças aparentemente insuperáveis que nos dividem.
A mídia tem a responsabilidade de ajudar as pessoas a entenderem que a diversidade não precisa ser uma fonte de conflito;
antes, a diversidade pode, e agora deve, servir como um recurso
para o desenvolvimento sustentável. A mídia poderá alcançar
esta meta, focalizando os empreendimentos construtivos,
unificadores e cooperativos que comprovam a capacidade da
humanidade de trabalhar junto para vencer os enormes desafios
que ela enfrenta.
• Ao promover “um relacionamento cooperativo com a
mídia” (36.10.e), a ONU deve corajosamente definir sua própria
identidade e a promessa que ela oferece à comunidade mundial.
A Organização das Nações Unidas foi estabelecida com elevados ideais e uma visão de um mundo pacífico e progressivo. Fornecendo um arcabouço para a comunicação e a cooperação e
iniciando inúmeros projetos construtivos, ela tem contribuído significativamente para a compreensão, esperança e boa vontade
do mundo. Contudo, suas realizações são pouco conhecidas pela
humanidade em geral.
Usando o conceito de cidadania mundial como tema
integrador, as Nações Unidas deveriam divulgar seus ideais, atividades e metas, para que as pessoas venham a entender o papel
único e vital que a ONU desempenha no mundo e, portanto, nas
suas vidas. Semelhantemente, a ONU deveria promover a cidadania mundial em todas as suas atividades públicas, inclusive
nas comemorações do qüinquagésimo aniversário das Nações
Unidas e n os passeios pela Sede da ONU. Cada documento da
ONU que trata do desenvolvimento sustentável, a começar pelo
preâmbulo da proposta Carta da Terra, deveria também incluir
15
esse princípio. A cidadania mundial deve-se tornar o ponto de
referência ético mais importante em todas as atividades da ONU.
• Os serviços da indústria da publicidade (36.10.e) devem
ser recrutados para a promoção da cidadania mundial. Campanhas poderiam ser organizadas ao redor de temas tais como:
Nós, os Povos das Nações Unidas:
Celebrando a Unidade na Diversidade.
Um Planeta, Um só Povo.
Em Toda Nossa Diversidade,
Nós Somos uma Só Família Humana.
Nosso Futuro Comum: A Unidade na Diversidade.
• Concursos deveriam ser realizados e prêmios concedidos
pela promoção da cidadania mundial (36.10.e).
• Enquanto conscientiza o público “sobre os impactos da
violência na sociedade” (36.10.1), a mídia pode gerar um compromisso para com a cidadania mundial, realçando exemplos
de empreendimentos construtivos e unificadores que mostram o
poder da unidade e de uma visão comum.
Cada país deveria ser encorajado a alocar recursos para a
promoção da cidadania mundial. Também deve-se considerar
incluir nos propostos “indicadores do desenvolvimento sustentável” (40.6.) a promoção deste princípio. Por exemplo, os países
poderiam ser incentivados a relatarem os esforços para promover o respeito e a apreciação das outras culturas, a igualdade dos
sexos e o conceito de uma única família humana, através dos
currículos escolares, do entretenimento e da mídia.

16
O Desafio da Cidadania Mundial
Em conclusão, a cidadania mundial é um conceito tão desafiador e dinâmico quanto as oportunidades que a comunidade
mundial enfrenta. A sabedoria exige que nós, os povos e nações
do mundo, corajosamente adotemos seus princípios subjacentes
e nos guiemos por eles em todos os aspectos das nossas vidas –
nas nossas relações pessoais e comunitárias e nos assuntos nacionais e internacionais; nas nossas escolas, locais de trabalho e
mídia e nas nossas instituições jurídicas, sociais e políticas. Nós,
portanto, instamos a Comissão a encorajar o sistema inteiro das
Nações Unidas a incorporar o princípio da cidadania mundial
em todos seus programas e atividades.
A Comunidade Internacional Bahá’í, que há mais de um século vem promovendo a cidadania mundial, aceitaria de bom
grado ajudar a Comissão, os Governos, as ONG’s e outros a
ampliarem os conceitos contidos neste documento; fornecer
modelos práticos de unidade racial, religiosa, nacional e étnica
para o desenvolvimento sustentável; e participar de consultas
sobre esta questão crucial. Como uma comunidade global que
abarca a diversidade da humanidade e compartilha uma visão
comum, a Comunidade Internacional Bahá’í continuará a promover o desenvolvimento sustentável, encorajando as pessoas a
considerarem cidadãos de um só mundo e construtores de uma
civilização mundial justa e próspera.

17
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Anton Verwey
Diretor Regional do ACNUR no Escritório Regional para o Sul da América
Latina.

Renato Zerbini Ribeiro Leão
Coordenador-Geral do Centro de Proteção Internacional de Direitos Humanos
(CPIDH). Consultor Jurídico no Brasil do Escritório Regional para o Sul da
América Latina do ACNUR.

Introdução
Para o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) é uma honra e um privilégio estar contribuindo
com a obra “Cidadania Mundial: A base da Paz”, publicação que
reúne todos os agraciados com o Prêmio Cidadania Mundial oferecido pela Comunidade Bahaí do Brasil, instituição que desempenha um papel fundamental na propagação dos fundamentos
dos direitos humanos ao longo do planeta.
O tema escolhido, a cidadania como fundamento para a paz,
é uma realidade que cada dia agiganta-se à frente daqueles que
pensam e constroem a doutrina e a prática dos direitos humanos.

21
Uma parte significativa dos pensadores da matéria concordam
que o conceito de cidadania está estreitamente vinculado com o
direito a ter direitos, daí o esforço do Direito Internacional Público de tutelar os direitos dos “não-cidadãos”, no contexto mais
amplo do princípio de proteção internacional.
A realidade da problemática dos refugiados e refugiadas encaixa-se nessa noção de cidadania. Dados estatísticos apontam
que no mundo atual, cerca de 50 milhões de pessoas podem,
legitimamente ser vítimas de deslocamentos forçados. Os movimentos de refugiados e outras formas de deslocamento forçado
constituem um importante instrumento para medir a segurança
e/ou insegurança humana. Geralmente, as pessoas não abandonam seus lares ou fogem de seu próprio país a não ser quando
sentem sua vida, sua liberdade ameaçadas e seus direitos
completamentes renegados.
Hoje em dia, por volta de 22 millões de pessoas estão sob a
proteção do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) e a maioria delas provêem de países pobres.
Muitos são obrigados a viver em imensos campos de refugiados
ou acampamentos provisórios, aguardando retornar a seus lares
de maneira segura para poder retomar una vida normal.
O ACNUR, criado pela Resolução 319 (IV) da Assembléia
Geral das Nações Unidas com data de 3 de dezembro de 1949,
inicia suas atividades em 1º de janeiro de 1951. O Estatuto do
ACNUR foi aprovado pela Assembléa Geral, em 14 de dezembro de 1950, conforme Anexo da Resolução 428 (V). Nessa
Resolução, a Assembléia apelava aos Governos para que
cooperassen com o Alto Comissariado no desempenho de suas
funções relativas aos refugiados amparados pela competência
de seu Comissariado. De acordo com seu Estatuto, o trabalho do
Alto Comissariado terá carácter inteiramente apolítico e será de
natureza humanitária e social.

22
O ACNUR no Brasil e na região
Uma das principais estratégias do ACNUR no Cone Sul é a
construção e o fortalecimento de uma estrutura tripartite (Governo, Sociedade Civil e ACNUR) sólida. Nesse sentido, um de
seus objetivos principais é dotar e capacitar a sociedade civil
envolvida com a temática das/os refugiadas/os dos diferentes
países que conformam a região (Argentina, Bolívia, Brasil, Chile,
Paraguai e Uruguai) no trabalho de políticas públicas, proteção e
integração local. Nesse modelo ideal, o Brasil é um país chave
na região, pois possui a estrutura mais próxima a essa realidade.
A história da presença do ACNUR no Brasil remonta-se ao
ano de 1977, quando essa instituição da ONU instalou uma sede
local na cidade do Rio de Janeiro, que se encontrava sob a supervisão da Oficina Regional para o Sul de América Latina, com
sede em Buenos Aires, Argentina. Naquela época o país começava a receber seus primeiros fluxos importantes de refugiados,
provenientes justamente de países da América do Sul como conseqüência das crises institucionais que afetaram os países da região,
recebendo assim a uruguaios, argentinos, paraguaios e chilenos.
No ano de 1989, a missão do ACNUR no Rio de Janeiro
transfere-se para Brasília, pois aí estão os órgãos federais de
tomada de decisão na matéria. Mas recentemente, com a aprovação da Lei 9474, em 22 de julho de 1997, o Brasil incorpora de
maneira oficial a seu ordenamento jurídico e político, tanto a
Convenção de 1951 como o Protocolo de 1967 relativos ao Estatuto
dos Refugiados, convertendo-se no primeiro país da região em elaborar uma legislação compreensiva e progressista na matéria.
Em dezembro de 1998, dentro de um contexto de diminuição
de recursos e permeado por uma significativa crise financeira,
conseqüência das limitações orçamentárias observadas na instituição em escala mundial, o ACNUR toma a difícil decisão de
fechar sua representação local no país, pois considera que o Brasil
já iniciava e assumia por seus próprios meios o exame criterioso

23
e profissional do tema em busca de soluções duradouras para os
refugiados e refugiadas em seu território. Portanto, os poucos
recursos disponíveis deveriam ser direcionados para as regiões e
situações de emergência nos distintos continentes. O Brasil seria, então, coberto pelo Escritório Regional de Buenos Aires.
O ACNUR, no entanto, não saia muito preocupado do Brasil,
pois esse país aprovara uma das leis mais modernas sobre refugiados e refugiadas e possuía uma estrutura tripartite (Governo,
Sociedade Civil e ACNUR) em um processo ascendente e
exitoso de consolidação, conformando um país chave na região.
A Lei Nº 9.474, de 22 de julho de 1997, define os mecanismos
para a implementação da Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951 no Brasil, e determina outras providências como
a criação do Comitê Nacional para os Refugiados –CONAREatuando como marco para o tratamento das solicitações do Estatuto de Refugiado e a busca de soluções duradouras para os
refugiados e refugiadas que procuram a proteção internacional
em seu território. Ademais, o ACNUR buscava intensificar sua
presença na temática de refugiados no país, além da supervisão
internacional desde o Escritório Regional de Argentina, através de
associações com distintas organizações (Cáritas, OAB, IBRI e
CPIDH) que, de diversas formas, podem contribuir e somar seus
esforços de trabalho em prol dos refugiados e refugiadas no Brasil.
Em busca de uma harmonização legislativa regional
No árduo caminho que tem sido percorrido desde a criação
do ACNUR e a entrada em vigor da Convenção de 1951 e seu
Protocolo de 1967, não se pode perder de vista que as situações
que vem originando os grandes fluxos de refugiados e refugiadas
ao longo das décadas têm tido sua origem nas complexas relações internacionais surgidas em conseqüência do final da Segunda Grande Guerra. Os movimentos de libertação nacional, o ressurgir de certas formas extremas de nacionalismo, o separatismo étnico, o aumento de conflitos armados internos, o desmoro-

24
namento de grandes bloques ideológicos e o surgimento de novos grupos econômicos de influência, contribuiram para uma instabilidade na qual situações de violação de direitos humanos encontram campo fértil.
Em um mundo onde as relações entre os Estados estão cada
vez mais vinculadas à realização de objetivos supranacionais e
onde os efeitos de uma medida política em um país afeta cada
vez mais a situação de seu vizinho, o caminho da coordenação
de políticas sociais, econômicas e de desenvolvimento como instrumento de progresso regional é inevitável. Os exemplos mais
claros dos beneficios e percalços da integração ou harmonização
regional estão dados nos anos de esforços necessários à
concretização da União Européia e o incipiente desenvolvimento
da comunidade do Mercosul.
No campo dos direitos humanos e nele tratando do tema dos
refugiados e refugiadas, a identificação das causas dos movimentos irregulares de pessoas que originam os fluxos massivos
em busca de proteção internacional é de importância fundamental para a prevenção destas situações. Neste sentido, durante a
2ª Conferência Mundial de Direitos Humanos em Viena em 1993,
em sua intervenção, a Alta Comissariada das Nações Unidas
para os Refugiados, Sra. Sadako Ogata, destacou a prevenção
de situações futuras geradoras de refugiados e refugiadas e instou à Conferência a reafirmar o direito dos refugiados e das refugiadas a buscar asilo e a disfrutá-lo, o princípio da não-devolução e o direito de retornar ao lar com segurança e dignidade.
Direitos esses que requerem a garantia do respeito aos direitos
humanos e um enfoque integral dos mesmos, recobrando assim,
certamente, a cidadania dessas pessoas. Os princípios de direitos humanos permanecem de importância vital para o trabajo do
ACNUR em favor dos refugiados e das refugiadas como elemento base da admissão e proteção eficaz dessas pessoas no
país de asilo. A melhoria na situação de direitos humanos no país
de origem é a melhor maneira de prevenir as condições que, de
outro modo, poderiam forçar às pessoas a tornaram-se refugia-

25
dos e refugiadas. Cada um deses aspectos do problema dos refugiados e das refugiadas pode ser visto desde uma perspectiva
diferente de direitos humanos, entretanto, encontrar uma resposta que possa resolvê-los satisfatoriamente, devolvendo a essas
pessoas uma perspectiva cidadã, somente através da visão integral e indivisível dos direitos humanos.
No marco destas apreciações gerais dos desafíos da temática
de refugiados e refugiadas a nivel internacional encontramos a
região do Cone Sul em uma etapa de relativa estabilidade
institucional, de estabelecimento dos primeros fundamentos
normativos na matéria e com perspectivas muito estimulantes
como região de acolhida de pessoas necessitadas de proteção.
Com este primeiro passo dado por Brasil com a Lei 9.474 e com
a exitosa experiência de parceria tripartita (Governo, Sociedade
Civil e ACNUR) alcançada, traça-se um rumo a seguir no qual
os demais países da região terão a possibilidade de espelhar-se
com o intuito de obterem beneficios mútuos.
Todos os países da nossa região são signatários da Convenção de 1951 e de seu Protocolo de 1967, tendo adotado em maior
ou menor grau medidas para o efetivo cumprimento de suas disposições. O desafío agora será de aproveitar os instrumentos
regionais já existentes, para lograr esta harmonização legislativa
tão sonhada. Os problemas criados pela mobilidade geográfica
devem ser enfrentados, de acordo às realidades dos países que
conformam a região, com normas comunitárias e políticas regionais
comuns. Harmonização supõe a adoção de diretrizes comuns em determinados aspectos básicos, mas sempre procurando manter as peculiaridades de cada legislação nacional e a análise concreta e individual de cada uma das solicitações de refúgio em estudo.
Assim, com a firma do Tratado de Assunção em 1991 e, posteriormente, do Protocolo de Ouro Preto em 1994, os países que integram o
Mercosul dão os primeiros passos para atender as novas necessidades geradas no processo de integração em marcha; principalmente
com a criação da Comissão Parlamentar Conjunta como órgão cujo
objetivo é facilitar o caminho às metas propostas por meio de sua

26
função consultiva, deliberativa e de formulação de propostas. Esta
Comissão, cuja presidência corresponde semestralmente a cada um
dos países fundadores do Mercosul, tem entre suas funções as de
realizar os estudos necessários tendentes a harmonizar as legislações
dos Estados Parte, propor normas de direito comunitário referidas ao
processo de integração e fazer com que as conclusões cheguem aos
Parlamentos Nacionais.
O Mercosul deve, então, ser a primera via de contato a explorar
este caminho que se iniciou há 50 anos na visão daquelas pessoas que
pensavam que a construção de um futuro melhor depende do esforço
de todos.
São essas as premissas que norteam o trabalho do Escritório Regional do ACNUR para o Sul da América Latina em prol da efetivação
de uma cidadania digna na região, em primeiro lugar, e depois que
esse esforço possa servir como um bom exemplo e influenciar as
demais regiões do planeta, colaborando assim com a construção de
uma cidadania mundial.

27
28
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Antônio Augusto Cançado Trindade
Presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos

A concepção de cidadania mundial, como base da paz, pode,
efetivamente, ser considerada de ângulos distintos. Proponho-me,
em breves palavras, abordá-la a partir do prisma de minha área de
reflexão e atuação, a do Direito Internacional dos Direitos Humanos. Preliminarmente, devo deixar consignada minha convicção
na existência de uma consciência jurídica universal, assim como
na inviabilidade da paz sem justiça social, pressupondo esta última
a plena vigência da totalidade dos direitos humanos (civis, políticos, econômicos, sociais e culturais). Todos os direitos para todos, é o único caminho seguro a seguir. Paz, justiça social e
direitos humanos são, em suma, indivisíveis. E o Direito Internacional, tal como o tenho sempre concebido, constitui um
instrumental jurídico já não só de regulação, mas sobretudo
de libertação1.
A concepção de cidadania mundial, como base da paz,
marca presença nas próprias origens do Direito Internacional (como
hoje o conhecemos). O ideal da civitas maxima gentium foi
propugnado e cultivado nos escritos dos chamados fundadores do
Direito Internacional, - quase esquecidos em nossos dias. É signi-

29
ficativa a contribuição dos teólogos espanhóis Francisco de Vitoria
e Francisco Suárez nesse sentido. Vitoria deu uma contribuição
pioneira e decisiva para a noção da prevalência do Estado de
Direito: foi ele quem sustentou, com rara lucidez, em suas célebres Relecciones Teológicas (1538-1539), sobretudo a De Indis
- Relectio Prior, que o ordenamento jurídico obriga a todos (governados e governantes), e a comunidade internacional (totus
orbis) prima sobre o arbítrio de cada Estado individual.
Para o grande mestre de Salamanca, o direito das gentes regula uma comunidade internacional constituída de seres humanos organizados socialmente em Estados e coextensiva com a
própria humanidade. Decorridos mais de quatro séculos e meio,
a mensagem de Francisco de Vitoria, - de incidência direta na
concepção de cidadania mundial, - retém uma notável atualidade. Para Suárez (autor do tratado De Legibus ac Deo
Legislatore, 1612), o direito das gentes revela a unidade e universalidade do gênero humano, sendo os Estados membros da
sociedade universal.
Na concepção do jus gentium de Hugo Grotius (autor da
célebre obra De Jure Belli ac Pacis, 1625), o Estado não é um
fim em si mesmo, mas um meio para assegurar o ordenamento
social e aperfeiçoar a sociedade comum que abarca toda a humanidade. Ainda antes de Grotius, Alberico Gentili (autor de De
Jure Belli, 1598) sustentava que é o Direito que regula a convivência entre os membros da societas gentium universal. Samuel
Pufendorf (autor de De Jure Naturae et Gentium, 1672), a seu
turno, sustentou a sujeição do legislador à “lei da razão”. Por sua
vez, Christian Wolff (autor de Jus Gentium Methodo Scientifica
Pertractatum, 1749), ponderava que assim como os indivíduos
devem promover o bem comum, a seu turno o Estado tem o
dever correlativo de buscar sua perfeição.
Lamentavelmente, estas reflexões visionárias, que concebiam o Direito Internacional nascente como um sistema verdadeiramente universal, vieram a ser suplantadas pela emergência
do positivismo jurídico, que personificou o Estado dotando-o de

30
“vontade própria”, reduzindo os direitos dos seres humanos aos
que o Estado a estes “concedia”. O consentimento ou a vontade
dos Estados (o positivismo voluntarista) tornou-se o critério predominante no Direito Internacional, que se mostrou incapaz de
impedir sucessivas atrocidades perpetradas contra os seres humanos, destinatários últimos de toda norma jurídica.
A personificação do Estado todo-poderoso, inspirada na filosofia do direito de Hegel, teve uma influência nefasta na evolução do Direito Internacional (reduzido a um direito inter-estatal)
em fins do século XIX e nas primeiras décadas do século XX.
Esta corrente doutrinária resistiu com todas as forças ao ideal de
emancipação do ser humano da tutela absoluta do Estado, e ao
reconhecimento do indivíduo como sujeito do Direito Internacional. No passado, os positivistas se gabavam da importância por
eles próprios atribuída ao método da observação (negligenciado
por outras correntes de pensamento), o que contrasta, porém,
com sua total incapacidade de apresentar diretrizes, linhas mestras de análise, e sobretudo princípios gerais orientadores. No
plano normativo, o positivismo se mostrou subserviente à ordem
legal estabelecida, e convalidou os abusos praticados contra os
seres humanos em nome de tal ordem.
Mas já em meados do século XX, a doutrina
jusinternacionalista mais esclarecida se distanciava definitivamente da formulação hegeliana e neo-hegeliana do Estado como suposto repositório final da liberdade e responsabilidade dos indivíduos que o compunham. O desencadeamento do movimento universal em prol dos direitos humanos, nas cinco últimas décadas,
contribuiu decisivamente para o resgate histórico do ser humano
como sujeito do Direito Internacional, - evolução esta que considero o legado mais precioso do desenvolvimento da ciência jurídica no século XX.
Poder-se-ia argumentar que o mundo contemporâneo é inteiramente distinto do da época dos chamados fundadores do direito internacional (supra), que propugnaram por uma civitas
maxima regida pelo direito das gentes. Mas ainda que se trate de

31
dois cenários mundiais diferentes (ninguém o negaria), a aspiração humana é a mesma, qual seja, a da construção de um
ordenamento internacional aplicável tanto aos Estados (e organizações internacionais) quanto aos seres humanos (o direito das
gentes), consoante certos padrões universais de justiça, sem a
observância dos quais não pode haver paz.
Neste sentido, visualizo em nossos dias, neste limiar do século
XXI, um grande esforço, por parte da doutrina jurídica mais lúcida,
de retorno às origens, no que diz respeito à disciplina que me
concerne, a do Direito Internacional. O atual processo histórico de
humanização do Direito Internacional, ao qual tenho buscado contribuir ao longo dos anos em minha atuação profissional, manifesta-se, a meu ver, em capítulos os mais diversos da disciplina. No
capítulo de suas fontes, por exemplo, destaca-se o papel da opinio
juris2, graças à atuação libertária, nos foros internacionais, dos
países mais fracos e oprimidos.
Recorde-se, a propósito, que a codificação do capítulo da sucessão de Estados (a respeito de tratados, e de matérias outras
que tratados)3 só foi possível após o exercício efetivo do direito
de autodeterminação dos povos, por estes últimos4. E o capítulo do reconhecimento, - outrora de Estados e governos, - com
o tempo expandiu-se, abarcando também a beligerância, ilustrada, a partir de meados do século XX, também pela emergência
dos movimentos de libertação nacional.
No capítulo dos sujeitos do Direito Internacional, a par dos
Estados e organizações internacionais, figuram hoje também os
indivíduos, a pessoa humana. Ora, se o Direito Internacional contemporâneo reconhece direitos aos indivíduos e grupos de particulares, - como o ilustram os múltiplos instrumentos internacionais de direitos humanos de nossos dias, - não há como negarlhes personalidade jurídica internacional, sem a qual não poderia dar-se aquele reconhecimento. O próprio Direito Internacional, ao proclamar direitos inerentes a todo ser humano, - por
definição anteriores e superiores ao Estado, - desautoriza o arcaico dogma positivista que pretendia autoritariamente reduzir

32
tais direitos aos “concedidos” pelo Estado.
O reconhecimento dos indivíduos como sujeitos tanto do direito
interno como do Direito Internacional representa uma verdadeira revolução jurídica, à qual temos o dever de contribuir. Permito-me aqui evocar a inspirada reflexão de um dos maiores
escritores do século XX, para quem “na nossa provação diária, a
revolta desempenha o mesmo papel que o cogito na ordem do
pensamento: ela é a primeira evidência. Mas essa evidência tira
o indivíduo de sua solidão. Ela é um território comum que fundamenta o primeiro valor dos homens”5. Trata-se, em última análise, de capacitar cada ser humano para enfrentar por si mesmo a
opressão e as injustiças da ordem estabelecida e construir assim
um mundo melhor para seus descendentes, as gerações futuras.
Esta revolução jurídica vem enfim dar um conteúdo ético às
normas tanto do direito público interno como do Direito Internacional. O próximo passo reside na consolidação da capacidade
jurídica internacional dos indivíduos, para mover, por conta própria, uma ação internacional por violação de seus direitos até
mesmo contra seu próprio Estado, diretamente ante os tribunais
internacionais (Cortes Européia e Interamericana) de direitos
humanos. O que já é uma realidade sob a Convenção Européia
de Direitos Humanos (recentemente emendada pelo Protocolo
n. 11), ainda é um ideal a ser alcançado em relação à Convenção
Americana sobre Direitos Humanos, pelo qual há tantos anos
venho lutando.
No que diz respeito ao capítulo da responsabilidade internacional, a par da dos Estados e organizações internacionais afirma-se hoje também a dos indivíduos. Exemplificam-no a criação
dos dois Tribunais Internacionais ad hoc das Nações Unidas,
para a ex-Iugoslávia e para Ruanda (em 1993 e 1994, respectivamente), assim como a adoção em 1998 do Estatuto do Tribunal Penal Internacional. A subjetividade internacional dos indivíduos passa, assim, a vincular-se inelutavelmente à temática da
responsabilidade internacional (outrora limitada à dos Estados).
Em relação ao capítulo das imunidades dos agentes dos Es-

33
tados, a consagração do princípio da jurisdição universal em
alguns instrumentos internacionais, como, e.g., a Convenção das
Nações Unidas contra a Tortura (1984), acarreta profundas implicações. Tal como demonstrado por eventos recentes, mesmo na
atual pendência da entrada em vigor do mencionado Estatuto do
Tribunal Penal Internacional, torna-se virtualmente impossível a qualquer agente estatal tentar hoje se prevalecer de imunidade, quando
responsável pela prática de tortura como política de Estado.
No tocante à regulamentação dos espaços, a antiga liberdade dos mares, por exemplo, cede terreno ao conceito de patrimônio
comum da humanidade (os fundos oceânicos), consagrado na
Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (1982). O
mesmo conceito passa, a partir dos anos sessenta, a ter aplicação
também no âmbito do capítulo do direito do espaço exterior. E o
direito ambiental internacional contemporâneo passa a cunhar uma
nova expressão, a do interesse comum da humanidade (common
concern of mankind), de que dão testemunho os preâmbulos
das Convenções sobre o Clima, e sobre a Biodiversidade (1992)6.
E os exemplos se multiplicam, refletindo, efetivamente, em
distintos capítulos do domínio específico do Direito Internacional
contemporâneo, o ideal da civitas maxima gentium, ou seja, a
cidadania mundial, como base da paz, vinculada esta - como
em uma tríade indissociável - à justiça social e à observância dos
direitos humanos. Os avanços até hoje logrados, como
exemplificado pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos7,
se devem, em grande parte, à mobilização da sociedade civil contra
todas as manifestações do poder arbitrário, nos planos tanto nacional como internacional.
O movimento universal em prol dos direitos humanos é
irreversível, não admite retrocessos. Tem sua mística própria.
Resta, no entanto, um longo caminho a percorrer. Há que equipar os mecanismos internacionais de proteção para enfrentar
novas formas de violação dos direitos humanos e combater a
impunidade. Há que lograr em definitivo a justiciabilidade dos
direitos econômicos, sociais e culturais, negligenciados até o pre-

34
sente. Há que fomentar a aceitação integral (sem reservas), pelos Estados, dos tratados de direitos humanos, e assegurar a
aplicabilidade direta de suas normas no plano do direito interno dos Estados. Há que consolidar o acesso direto dos indivíduos à justiça no plano internacional, tese pela qual venho me batendo há tanto tempo. Há que desenvolver as obrigações erga
omnes de proteção do ser humano, tomando seus direitos fundamentais como parte integrante do jus cogens. E há que disseminar o papel da sociedade civil na construção de uma cultura
universal de observância dos direitos humanos8.
Ao concluir, permito-me referir-me a um derradeiro aspecto
da questão aqui abordada, a da concepção de cidadania mundial como base da paz, sob a ótica do Direito Internacional.
O grande ciclo das Conferências Mundiais das Nações Unidas da última década do século XX (Meio Ambiente e Desenvolvimento, Rio de Janeiro, 1992; Direitos Humanos, Viena, 1993;
População e Desenvolvimento, Cairo, 1994; Desenvolvimento
Social, Copenhagen, 1995; Direitos da Mulher, Beijing, 1995;
Assentamentos Humanos - Habitat-II, Istambul, 1996) despertou a consciência jurídica universal para a necessidade de
reconceituar as próprias bases do ordenamento internacional.
Revelou, como denominador comum, a atenção especial dispensada às condições de vida da população (particularmente
dos grupos vulneráveis, em necessidade especial de proteção).
Daí resultaram o reconhecimento universal da necessidade de
situar os seres humanos de modo definitivo no centro de todo
processo de desenvolvimento9, assim como o reconhecimento
da legitimidade da preocupação de toda a comunidade internacional com a situação real de todos os seres humanos em toda
parte. O referido ciclo de Conferências Mundiais do final do
século XX alertou, em suma, para a premente necessidade do
atendimento às necessidades básicas e aspirações da população mundial.
O diálogo e concerto, em escala verdadeiramente universal,
por tais Conferências ensejados, terminaram por conformar a

35
agenda internacional do século XXI em torno do tratamento equânime das questões que afetam a humanidade como um todo. O
atual reconhecimento da centralidade, nesta agenda do novo século, das condições de vida de todos os seres humanos, em todos
os recantos do mundo, corresponde a um novo ethos de nossos
tempos, e é, em meu entender, da própria essência da concepção
de cidadania mundial como base da paz. Tal concepção, por
sua vez, corresponde, em nossos dias, à busca continuada da
realização do ideal da civitas maxima gentium, visualizado e
cultivado pelos fundadores do Direito Internacional.

36
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Benedita da Silva
Vice-Governadora do Estado do Rio de Janeiro

A 10 de dezembro de 1948 a Assembléia Geral das Nações
Unidas reuniu-se para aprovar a Declaração Universal dos Direitos Humanos, marco decisivo na conquista da cidadania por
todos os povos, com o estabelecimento da liberdade, da justiça e
da eqüidade para garantir a paz mundial.
A Declaração Universal salienta o direito à vida e à liberdade; condena a escravidão, a tortura, a perseguição política; garante o direito de propriedade, o direito de reunião e associação,
o direito ao trabalho e à educação, entre outros.
Foi, inegavelmente, uma grande conquista para os povos que,
oprimidos pelas barbaridades da guerra, procuravam soluções
pacíficas para os seus problemas. A sua importância foi tão grande que, hoje, o seu conteúdo é reconhecido como direito costumeiro de todos os povos. Ela passou a ser uma norma comum de
aplicação no que se refere à dignidade inerente e aos direitos
inalienáveis da pessoa humana.
Apesar do sucesso em alguns pontos, ainda não vivemos no
mundo prometido pela Declaração Universal. Um mundo de igualdades, sem as violações dos direitos humanos, sem as atrocida-

37
des cometidas pelos governos e, até mesmo, sem os genocídios,
como os praticados em Ruanda e no Zaire.
Acreditamos que os compromissos da Declaração Universal
sejam sempre mais fortalecidos pela comunidade internacional,
mostrando o que tem sido feito e procurando trabalhar em cima
do que ainda há por fazer. Mais do que nunca, nesta época de
globalização, é premente garantir a realização e a universalidade
dos direitos humanos para todas as pessoas, especialmente, para
as mulheres.
É preciso que as promessas feitas na Declaração Universal saiam do papel e passem a existir no mundo real. A reafirmação dos
propósitos de então, mais adaptados ao mundo moderno, poderá ser
a forma mais pragmática de se alcançar tal finalidade. Muitos governos, por motivos políticos, desrespeitam os direitos dos cidadãos
e mantêm privilégios para uma minoria. Mais de um bilhão e meio de
pessoas lutam para sobreviver à fome e à miséria.
São complexas as relações de gênero, discutidas em âmbito
nacional e internacional. Há inúmeras pessoas, mulheres e crianças em particular, numa situação vulnerável, sujeitas à tensão e às
privações. Em alguns países, a violência física, psicológica e sexual contra a mulher virou praticamente rotina. E em outros junta-se
a mesma violência à etnia. A Anistia Internacional verificou que
as principais vítimas são as de origem humilde ou habitantes de
comunidades indígenas. E a impunidade continua. Dificilmente é
identificado ou preso o autor ou autores de tais atrocidades.
Mais mulheres do que homens vivem em pobreza absoluta e
o desequilíbrio continua crescendo com graves conseqüências
para a mulher e seus filhos. Podemos falar em feminização da
pobreza, pois a mulher acaba sendo, em última instância, a
reprodutora da miséria.
Devemos lembrar que a miséria aumenta a violência de gênero, em que as mulheres são sempre as maiores vítimas. Apesar de todos os avanços do mundo moderno, a diferença entre
homem e mulher ainda é uma realidade, num contexto de exclusão social e de subordinação das mulheres. Na perspectiva de

38
gênero para o desenvolvimento, a mulher precisa lutar pela cidadania, integrar-se no espaço político, a fim de que possa, definitivamente, eliminar as desigualdades geradas pelo processo patriarcal e racista.
A perspectiva de gênero procura alcançar a igualdade entre
homens e mulheres e aumentar a participação da mulher na vida
política, civil, econômica, social e cultural. Procura, também, estabelecer a eqüidade entre as mulheres das zonas rurais e urbanas. Tenta acabar com todas as discriminações que ainda pairam sobre o sexo feminino, evitando formulação de reservas e
luta para aumentar o poder decisório da mulher.
Quanto à perspectiva da etnia, é preciso garantir que grupos
desfavorecidos e vulneráveis sejam incluídos no desenvolvimento
social; que todos, independentemente de raça, sejam participantes
ativos das sociedades às quais pertençam. A paz, a justiça e o
desenvolvimento social devem contribuir para que as diferenças
de etnia e gênero terminem para que todos possam participar em
igualdade de direitos da vida social e política de seus países.
É imperioso enfrentar o problema para aprimoramento da
humanidade. As políticas públicas modernas sob a ótica do gênero e da etnia devem visar à melhoria das condições de vida de
todos, bem como da mulheres e das minorias raciais.
O artigo 2 da Declaração Universal reza: “Todo o homem
tem capacidade de gozar os direitos e liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie,
seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou
de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento ou qualquer outra condição”.
Esperamos que nesta passagem para um novo milênio os países membros da ONU sejam mais incisivos e procurem adotar
medidas objetivas para acabar com as injustiças que ainda assolam a humanidade.
No Brasil, em particular, infelizmente, a realidade é a mesma.
Quem nunca ouviu falar que o Brasil é a maior democracia
racial do mundo? Essa expressão serviu para as nossas elites

39
dominantes justificarem a existência de uma perfeita igualdade
entre as etnias e que não existe preconceito ou discriminação
étnica entra nós. No entanto, as experiências cotidianas mostram exatamente o contrário: é evidente a desigualdade social e
racial em nosso país.
O desafio de ser negro, especialmente mulher, no Brasil neste final de milênio é muito estimulante. É aceitar ser emblema da
capacidade de vencer barreiras; é saber transformar em grandes vitória os pequenos ganhos cotidianos na luta pela sobrevivência; é saber usar o conhecimento que lhe foi passado pelos
antepassados; é saber chorar as perdas sem transformá-las em
derrotas e enfrentar com tranqüilidade as agressões, as injustiças e as provocações.
Ser mulher, negra e moradora de favela sempre me impulsionou a galgar novos degraus, a estabelecer novas metas. Mãe,
profissional competente, adepta da educação continuada, militante política são elementos de um projeto de vida que venho
construindo. O ideal de liberdade é um legado que herdei de meus
ancestrais e que tenho dividido com companheiros e companheiras que estão na luta por toda diáspora negra. Minha trajetória é
a da mulher e do homem negros, que rejeitam um destino prétraçado que lhes reserva um futuro de subalternidade, e
redirecionam.
Tenho muito orgulho de ter aceito este desafio. E quero dizer
que as dificuldades que se apresentam no meu caminho, me ajudam a construir a certeza de que é necessário avançar sempre.
Tenho a certeza de que cada superação de obstáculos estabelece novas metas a serem alcançadas e que é possível tornar realidade a utopia de que as desigualdades serão vencidas. Este é o
sonho da nação e do mundo inteiro. O caminho está aberto: não
é fácil, não é curto, mas é possível.
Esta certeza é que torna possível o surgimento da esperança
de novos dias nas relações entre os povos. Uma das tarefas
mais importantes para os negros que, como Zumbi dos Palmares,
descumpriram o roteiro do papel que lhes destinou a sociedade,

40
saíram do tom e reescreveram o seu texto, bem como todas as
minorias discriminadas, é mostrar para os outros que viver é tomar o futuro nas mãos, é tornar-se sujeito da história, afirmar e
provar que é possível ser igual, afirmando as diferenças. Resgatando e estabelecendo a cidadania em seu aspecto maior.
Eu quero contribuir sempre e cada vez mais para que todas
as iniciativas em prol da valorização humana sejam concretizadas. E que este trabalho seja um grande impulso na escalada
pelos Direitos Humanos, pela Cidadania Mundial, real e concreta e com valorização da vida, melhor distribuição de renda e
chances de acessos para todos.

41
42
6;.<!,/!,:7-.0U!
6;.<!,/!,:7-.0U!
Celina Vargas do Amaral
Socióloga e Diretora do Sebrae-RJ

A tragédia do Jardim Botânico chamou atenção para negligência da sociedade e do poder público em relação a violência
urbana. Revela, acima de tudo, o quanto temos sido incompetentes em vencer o desafio da inclusão social. Como diretora de
uma instituição como o Sebrae/RJ, tenho lidado cotidianamente
com este desafio. A entidade está começando a desenvolver
programas de maior amplitude com o objetivo de oferecer melhores perspectivas de inserção social, sobretudo aos mais jovens. Por coincidência, a jovem morta na última segunda-feira,
Geisa Firmo Gonçalves, estava participando, como instrutora de
artesanato, de um programa do Sebrae, o Poder Comunitário.
Ela já vinha trabalhando na Rocinha como professora do Projeto
Curumim, Idealizado pela FIA e pela PUC-Rio, com o objetivo de
complementar o ensino escolar para crianças e adolescentes por
meio de atividades recreativas e geradoras de trabalho e renda.
Ou seja, Geisa trabalhava para que jovens de uma comunidade carente se vissem providos de oportunidades reais de inserção social. Por uma dessas estranhas trapaças do destino, foi
morta justamente por outro jovem, com identidade desconhecida
e sobrevivente da chacina da Candelária, que não teve diante de
si, provavelmente, a oportunidade de fazer parte de um progra-

43
ma de recuperação e de capacitação profissional. De certo modo,
é como se essa característica da biografia de Geisa nos direcionasse
para algo que está a nosso alcance realizar para evitar novos episódios como o de segunda-feira e impedir a morte de novas Geisas.
Uma instituição como o Sebrae é também portadora dessa missão
social. Foi-se o tempo em poderíamos esperamos que o Estado se incumbisse integralmente de promover o bem-estar social. Instituições
como Sebrae, Firjan, CNI, CNC,CNA, e demais entidades de representação empresarial, que compõem o chamado Sistema “S”, têm a
obrigação e o dever de colaborar para a transformação social que todos
esperamos.
Para dar início a uma estratégia de redução de violência em nossa
cidade, em nosso estado e em nosso país, precisamos associar a participação do setor público e de todas as formas de representação da sociedade em torno de um projeto democrático e solidário para a redução
da miséria – uma governança não com propostas meramente
assistencialistas, mas capacitadoras e gerenciadoras de trabalho e renda. Desejamos viver em uma sociedade forte e articulada, conviver
com instituições representativas, comprometidas e engajadas na missão
de transformar uma realidade socialmente injusta e cruel.
Isso vale para todos – para os pequenos e microempresários, a
comunidade acadêmica, os profissionais liberais, os grandes empresários, as ONGs, os partidos políticos e demais entidades representativas.
Como já foi dito, Geisa vinha participando das oficinas de artesanato
da Rocinha. Ela utilizava jornais usados para confeccionar canudinhos,
com os quais ensinava a fazer cestas que eram pintadas ou envernizadas
para comercialização. Em uma de minhas visitas à comunidade, tive o
privilégio de receber uma cestinha de presente de uma das instrutoras
que trabalhavam no projeto. Não sei se a recebi das mãos de Geisa.
Não importa. Guardo esta cesta na certeza de que ela me lembrará
sempre dessa tragédia. E de que simboliza, também, uma atividade
transformadora que deveria ser multiplicada em nosso país.

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Daniel John Vaillancourt
Diretor Executivo da Escola das Nações (Brasília – Brasil), uma escola internacional bilíngue, com 500 alunos representado 38 nacionalidades, voltada à
educação dos cidadãos do mundo.

Ao nos aproximarmos do século XXI, torna-se cada vez mais
claro que estamos entrando em um mundo nunca antes imaginado pelos nossos antepassados. A civilização avança, às vezes
de forma impiedosa e, novas descobertas no campo da ciência,
tecnologia e medicina estão permitindo, na maior parte do mundo, que pessoas tenham longevidade maior e uma vida mais saudável. Apesar das atrocidades cometidas entre grupos isolados e
países lutando por estabelecer sua identidade, cada vez mais temos a indicação de que o nosso planeta está tornando-se menor,
de que nações estão tão interdependentes que é impossível ignorar o fato de que precisamos uns dos outros para sobreviver.
Tanto no contexto econômico, político, tecnológico, ambiental,
na comunicação ou na saúde, estamos vivenciando uma grande
colaboração entre facções anteriormente antagônicas. Diariamente, simpósios e conferências internacionais, acordos econômicos, empreendimentos globais e projetos multinacionais estão
empenhados em encontrar soluções para dificuldades, facilitando assim a comunicação e a interação entre os povos, promovendo desenvolvimento em áreas onde problemas tornaram-se

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complexos demais para serem resolvidos apenas por uma única
organização ou nação. Estamos aprendendo, penosamente, que
competição tem suas limitações.
Mas o que está acontecendo no campo da educação? Como
estamos preparando nossas crianças para enfrentar as exigências da nova ordem mundial emergente? Qual o papel que as escolas desempenham para formar cidadãos mundiais os quais serão capazes de tirar suas próprias contribuições para a construção de uma sociedade pacificadora?
Primeiramente, devemos examinar a questão “O que significa ser cidadão do mundo?” Como educador, creio que cidadão
do mundo é uma pessoa que tem facilidade de interagir com
outras pessoas, independente de sua raça, cor, nacionalidade,
crença religiosa ou status social. Um cidadão do mundo acredita
que todos foram criados do mesmo pó e que ninguém é superior
a ninguém e, por conseguinte, deve ser respeitado. Significa
ser alguém sensitivo e receptivo aos desafortunados, que abomina injustiça e exploração, defende o fraco e tem senso de
responsabilidade pelo planeta e por aqueles que o habitam, e opta
por ações em vez de palavras para se definir. Um cidadão do
mundo compreende e promove o conceito de unidade na diversidade, celebrando diferenças ao invés de temer ou de vir a ser
repelido por elas.
Nossas escolas precisam de mudanças. Não podemos simplesmente ser fábricas automáticas distribuidoras de informações e, ao longo dos 12 anos de escolaridade da educação de
base, produzir uma sombra seriada e pré-moldada de jovens,
que entraram em nossas instituições inocentes e ingênuos, depositando sua confiança incondicional neste processo. Como educadores, temos a oportunidade e a obrigação de auxiliar nossas
crianças a se tornarem amantes da humanidade e solucionadoras
de problemas porque vêem com seus próprios olhos, ouvem
com seus próprios ouvidos, e trabalham com suas próprias mãos.
Nossas escolas deverão ser um local transformador onde as
crianças deverão ser encorajadas a enxergar o que há de melhor

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em si e nos outros, serem valorizadas não pelo que têm, mas
primeiramente pelo que são e, depois, pelo que fazem.
Será que não é chegada a hora de desenvolver e implementar
um currículo universal, base para todas as escolas em todas as
partes do mundo? Penso que sim. Acredito que existem temas
comuns, concepções, informações e habilidades que toda a criança precisa aprender. Por exemplo, existe maneira melhor de
aprender a reconhecer as diferenças e celebrar igualdades do
que incluir no programa de estudos sociais uma perspectiva na
história mundial, na qual estaremos olhando a história não como
seqüências de várias guerras e conquistas, mas como um desdobramento da civilização, em que cada cultura e nação têm sua
parcela de contribuição no progresso da humanidade? Que nossas crianças entendam que as numerosas guerras que mancharam nosso passado foram nossos erros, que cada crise foi seguida de uma vitória e que essas vitórias têm constantemente nos
impulsionado adiante.
Comunicação é, sem dúvida, um dos grandes talentos que
distingue o homem de outros animais. Precisamos dar ênfase
em nossas escolas na expressão pessoal, tanto através da língua
bem como das artes. Nossos alunos precisam de oportunidades
para adquirir habilidades na escrita, na oratória, nas artes cênicas e nas plásticas e na música para que descubram suas vozes
e possam expressar seus próprios pensamentos e sentimentos.
Eles precisam experimentar o mundo em sua volta e responder
de sua própria maneira. E, para aumentar o significado na comunicação verbal, nossos alunos têm que aprender a usar outras
linguagens com nível de fluência, a fim de que possam compreender e serem compreendidos pelos outros com sucesso. Quanto
mais cedo começar, melhor.
Por que não dar a mesma importância ao nosso currículo
mundial para a formação do caráter, que é dada ao currículo
acadêmico formal? Nossos alunos precisam saber que valores,
virtudes, moral e ética são importantes para o seu desenvolvimento como seres humanos. Precisamos dar-lhes a oportunida-

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de para adquirir e exercer qualidades positivas e receber um
feedback honesto sobre seu crescimento pessoal.
O atual interesse de estudos em educação está centrado na
“Inteligência emocional”, demonstrando que a sociedade finalmente está chegando a uma conscientização de que não somos
somente mente e corpo, mas que também possuímos sentimentos e emoções que são fatores determinantes para termos ou
não sucesso na vida. E a “inteligência espiritual”? Seremos os
primeiros a despertar o mundo para o fato de que possuímos
uma alma, e que a mesma precisa ser nutrida? Não deveríamos
ensinar o valor da oração, da meditação e da reflexão? É chegada a hora de nos certificarmos de que nossas crianças entendam
que todas as religiões majoritárias do mundo como o Judaísmo,
Budismo, Hinduísmo, Zoroastrismo, Cristianismo, Islamismo e a
Fé Bahá’í são todas parte de uma única revelação progressiva
vinda de Deus, baseadas numa mesma verdade fundamental:
chamado “amor ao próximo”?
Que nossas crianças aprendam a resolver problemas de forma cooperativa, para que assim, possam desfrutar dos benefícios gerados pela resolução pacífica de seus conflitos. Ao trabalhar com vários projetos de matemática, ciência e estudos sociais, eles compreenderão que a mesma habilidade usada em uma
atividade dentro de sala poderá ser aplicada no mundo que os
cercam. Ao contextualizar o que seria ajudar os menos afortunados na comunidade, eles terão a sensação que de, quando adultos, poderão fazer o mesmo.
Uma grave característica na presente sociedade é a grande
disparidade que existe entre rico e pobre. Nossas crianças não
podem ser afastadas dessa realidade nem ser insensíveis a essa
existência. Elas têm que ser auxiliadas para compreender que
aqueles mais afortunados devem saber dividir com os que não
têm. Devemos, por meio de um minucioso programa coordenado, propiciar condições para que nossas crianças aprendam sobre o sofrimento alheio e a respondê-lo com atos humanitários e

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de compaixão. Projetos de serviços comunitários devem fazer
parte integrante do nosso currículo.
Nosso currículo de cidadania mundial deve proporcionar aos
nossos alunos uma leitura onde direitos humanos são dádivas
divinas e que nada justifica a exploração, a dominação ou abuso
de um indivíduo sobre o outro. Quando o aluno examina as causas e os efeitos destrutivos de doenças sociais tais como racismo, sexismo, fanatismo religioso, nacionalismo desenfreado e
multiplicidades de “ismos” que suja nosso pano social, talvez ele
descubra novos remédios. Talvez compreender com profundidade que ser humano significa ser consciente.
O mundo carece de adultos conscientes. Nossos futuros cidadãos mundiais são, hoje, os freqüentadores de nossas escolas
primárias e secundárias. Devemos dar a eles a visão, a esperança, a capacidade e a coragem necessárias para que criem uma
cultura de paz neste Planeta que chamamos, nosso lar.

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Feizi M. Milani
Médico hebeatra, doutorando do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade
Federal da Bahia e diretor-presidente do INPAZ (Instituto Nacional de Educação para a Paz e os Direitos Humanos)

Nesta virada de milênio, o clamor pela paz chegou às ruas.
Não por acaso, 2000 é o Ano Internacional da Cultura de Paz.
Freqüentemente temos testemunhado manifestações em prol
desta causa, pessoas desconhecidas e famosas, lado a lado, bradando contra a violência. Angustiadas com o clima de medo que
impera nos centros urbanos do Brasil, elas se questionam o pôr
que dessa situação e aonde vai nos levar. A paz deixou de ser
um ideal abstrato nutrido por um punhado de sonhadores e poetas; tornou-se uma necessidade concreta para a maioria da população e meta prioritária para os governantes.
Esse quadro de mobilização social difere bastante da situação que vivenciei quinze anos atrás. Recordo-me que às vésperas do Ano Internacional da Paz (1986), era divulgado, em todos
países, o documento A Promessa da Paz Mundial.10 Tenho a
impressão de que, naquela época, a maioria das pessoas não foi

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capaz de perceber a importância e urgência do que a obra propunha. A questão da paz parecia ser algo tão distante da realidade brasileira. Participei de vários eventos nos quais seu rico teor
foi debatido – em universidades, seminários, audiências com autoridades e líderes do pensamento, palestras públicas, exibições
artísticas – e presenciei comentários do tipo “O Brasil é um país
pacífico, nunca se envolveu em guerras”, “Mesmo que haja uma
guerra nuclear, estamos a salvo”, “Temos tantos problemas sociais pra resolver... para que essa preocupação toda com a paz?”,
“Eu já faço a minha parte: medito diariamente”, dentre outros.
O tempo demonstrou que, tal qual todos os povos, nós, brasileiros, precisamos aprender a construir a paz, uma vez que
paz é muito mais do que a mera ausência de guerra. Demonstrou
também que a nossa lentidão nesse aprendizado já custou a vida,
a saúde ou o bem-estar de milhares de vítimas, uma vez que
violência não se restringe a homicídios e agressões físicas. A
violência pode assumir inúmeras roupagens: fome, racismo, exclusão, abusos verbais, morais ou sexuais, falta de acesso à saúde, à educação e à justiça, opressão contra a mulher e desigualdade de oportunidades, dentre outras.
Imagine se tivéssemos aproveitado a oportunidade oferecida
pelo Ano da Paz e os princípios delineados no referido documento... teríamos implantado programas educativos direcionados aos
valores da paz em todas escolas! Assim, a geração infanto-juvenil de hoje seria a garantia e a certeza de que este país se transformará numa sociedade mais justa e solidária. No entanto, nossa escolha foi a omissão e as conseqüências disto nos horrorizam a cada dia – crianças e adolescentes assassinando e sendo
assassinados, gente com medo de gente etc.
Encontramo-nos agora diante de um grave dilema – tanto
como coletividade quanto como indivíduos: permitiremos que as
coisas continuem como estão ou assumiremos a responsabilidade que cabe a cada um de nós na concretização de profundas
mudanças que garantirão a tão desejada paz?
Se escolhermos dar uma chance à paz, creio que há alguns

52
passos fundamentais que precisamos dar. É necessário que refutemos a crença de que o ser humano é inerentemente violento.
Apesar de carecer de qualquer fundamento científico, trata-se
de um pressuposto implícito em algumas abordagens ou
posicionamentos. A Dra. Minayo sintetiza a questão afirmando
que “é, hoje, praticamente unânime (...) a idéia de que a violência não faz parte da natureza humana e que a mesma não tem
raízes biológicas”. 11
A Promessa da Paz demonstra que essa crença gera uma
“contradição paralisante nos afazeres humanos”: por um lado, as
pessoas dizem querer a paz e estar dispostas a estabelecê-la.
Por outro lado, elas se permitem acreditar que “os seres humanos são incorrigivelmente egoístas e agressivos”. Como é possível “erigir um sistema social (...) progressivo e pacífico, dinâmico e harmonioso” tendo essa premissa como verdadeira? 12
A agressão e o egoísmo não são impulsos intrínsecos e
incontroláveis, mas sim sinais de estágios menos maduros da
evolução humana – tanto em nível individual como coletivo. Basta observar o desenvolvimento infantil: o bebê não admite partilhar seus brinquedos; a criança aceita emprestar o seu brinquedo
a outra, desde que haja uma permuta; a criança maior já é capaz
de participar em esportes coletivos; e o adolescente busca ativamente engajar-se em algum grupo e sente prazer na partilha. O
amadurecimento se dá em direção a relações de cooperação,
reciprocidade e interdependência.
Um segundo passo consiste em redefinir o conceito de cidadania. Enquanto entendermos cidadania apenas como cobrar direitos e exigir que o governo resolva os problemas que afetam a
sociedade, estaremos nos restringindo a uma cidadania reativa.
Enquanto se propagar uma cidadania reducionista que se limita a
“não jogar lixo no chão”, “não furar a fila” e “não ultrapassar o
sinal vermelho”, não estaremos contribuindo para a transformação social. A conquista da paz só será possível quando exercermos uma cidadania proativa, que defino como uma postura de
vida do indivíduo caracterizada pelo exercício consciente de seus

53
direitos e deveres, pela participação ativa nos processos de busca de melhorias coletivas13, e pela responsabilidade para com
tudo aquilo que afeta a sua vida e/ou as vidas de outras pessoas.
Decorre desse conceito a noção de que ser um cidadão de
paz é muito mais do que não ser um indivíduo violento. Fazer
o bem é algo infinitamente maior do que não fazer o mal. Não
praticar atos violentos é o mínimo que se espera de qualquer
pessoa que pretenda viver em sociedade. Praticar a paz é viver,
construir e ensinar a paz, pois ela só será alcançada se cada
cidadão, família, organização e comunidade se engajar ativamente
na construção de relações baseadas no respeito, na unidade, na
diversidade e na empatia.
Mais ainda: se vivemos num mundo globalizado, interligado
instantaneamente pelas tecnologias da informação e comunicação e interdependente economicamente, é preciso que aprendamos a ser cidadãos do mundo. Bahá’u’lláh já havia proclamado essa nova visão há mais de cem anos: “A Terra é um só país
e os seres humanos, seus cidadãos”.14 É impossível estabelecer
a paz enquanto as pessoas estiverem classificando e dividindo o
mundo entre “nós” e “eles”. Nós – (quer seja) esta família, ou
moradores desta rua, ou torcedores deste time, ou seguidores
desta igreja, ou membros desta raça, ou cidadãos deste país etc.
– contra eles, os que são diferentes. Essa separação é completamente falsa e ilusória. Ser diferente não comporta qualquer
juízo de valor, portanto, não tem nenhuma relação com ser superior ou inferior, correto ou equivocado, melhor ou pior.
Além disto, não é difícil constatar que todos os seres humanos compartilham das mesmas necessidades essenciais – portanto, somos absolutamente semelhantes em nossa essência. A
única possibilidade de haver paz no mundo, no país ou no bairro é
reconhecermos essa unidade essencial e vivermos de acordo com
ela. Pois essa compreensão nos faz aceitar o outro (por mais
diferente que seja), respeitar as suas necessidades e direitos, e
buscar os meios de estabelecer a verdadeira justiça. “A ordem
mundial só pode ser estabelecida sobre uma consciência inaba-

54
lável da unidade da humanidade, uma verdade espiritual que todas as ciências humanas confirmam. (...) O reconhecimento desta
verdade requer o abandono (...) de tudo o que faz com que as
pessoas se sintam superiores umas às outras. (...) A aceitação
universal deste princípio espiritual é a essência do êxito
de qualquer tentativa de se estabelecer a paz mundial.”15
Unidade gera reciprocidade, justiça e liberdade;
consequentemente, gera a paz. Viver essa consciência é a base
da paz. Exercer a cidadania mundial é compreender, praticar
e promover a unidade do gênero humano, condição sine qua
non da paz.
Outro passo fundamental na caminhada rumo à paz consiste
em questionar como lidar com o problema da violência. É possível agrupar, grosso modo, três paradigmas distintos que implícita
ou explicitamente estão presentes nas discussões sobre esse tema
– o da repressão, o estrutural e o da cultura de paz. Parece-me
apropriado analisar os pressupostos e impactos de cada um desses modelos de pensamento.
O modelo baseado na repressão preconiza, como solução para
o problema da violência, medidas de força tais como: o aumento
do policiamento, o endurecimento das leis e a construção de mais
presídios. Esta perspectiva possui uma deficiência grave: falha
em reconhecer as mazelas estruturais e as injustiças sócio-econômicas do país. Apesar disto, é a mais popular pois, aparentemente dá resultados rápidos e contribui para uma sensação abstrata (mas fundamental) de segurança e de que os crimes serão
punidos. Sem dúvida, o Brasil necessita de reformas que permitam maior eficiência na aplicação universal das leis, que estabeleçam mecanismos de controle social sobre o poder judiciário, e
que reduzam drasticamente a corrupção e impunidade. São também prementes mudanças no sistema policial, colocando-o a serviço da coletividade, capacitando-o, e expurgando o banditismo
de seu seio. Apesar de necessárias, essas transformações são
insuficientes para se alcançar resultados efetivos e duradouros.
O segundo paradigma afirma que a causa da violência reside

55
na estrutura social e no modelo econômico. Consequentemente,
se a exclusão e as injustiças não forem sanadas, não há muito o
que se fazer para evitar a violência. Apesar de bem intencionado
ao propor mudanças que culminem numa sociedade mais justa,
esse modelo termina por gerar, a curto prazo, sentimentos de
impotência. Ao vincular a solução de um problema que afeta as
pessoas de forma imediata e concreta – violência – a questões
complexas e demoradas que se situam fora da possibilidade de
intervenção dos indivíduos – desemprego, miséria etc. – o resultado, em geral, é o desânimo e a desistência. Ao gerar imobilismo,
esse modelo contribui para o estado coletivo de medo e paranóia
que é, por sua vez, um dos fatores que retroalimenta a violência.
É importante evidenciar a violência estrutural, pois ela encontra-se incorporada ao cotidiano da sociedade brasileira. Busca
ocultar-se sob as máscaras da naturalidade ou da inevitabilidade,
mas está na raiz de outras formas de violência, mais fáceis de
serem identificadas e denunciadas. Não obstante, é essencial
que sejam dados passos concretos nos aspectos da realidade
que estão ao nosso alcance, ao mesmo tempo em que se luta por
mudanças nos sistemas econômico, político e jurídico. A batalha
por transformações nos níveis macro e micro não são excludentes;
ao contrário, são complementares.
O terceiro é o paradigma da cultura de paz, que propõe mudanças de consciência e comportamento tanto de parte de indivíduos como de instituições, inspiradas em valores de paz. Os defensores desta perspectiva não deixam de reconhecer que as
outras, acima descritas, também têm sua contribuição a oferecer. Mas enfatizam a necessidade, a urgência e a viabilidade de
se reduzir os níveis de violência através de intervenções integradas e multi-estratégicas fundamentadas na Educação, na Saúde,
na Ética, na participação cidadã e na melhoria da qualidade de
vida. Trata-se de um modelo que valoriza a prevenção, colocando ênfase em valores universais como a paz, a diversidade, o
respeito e a empatia.
Este enfoque difere dos demais tanto em sua proposta quanto

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em seus desdobramentos. O paradigma da repressão tende a
interpretar a violência como uma expressão exclusivamente individual de pessoas más ou incapacitadas para o convívio social,
enquanto o paradigma estrutural tende a considerar o indivíduo
violento ou criminoso como vítima da sociedade. No modelo da
cultura de paz, a violência é entendida como uma enfermidade
coletiva que pode manifestar-se tanto por expressões individuais, grupais ou institucionais. A cura dessa enfermidade exigirá
mudanças – culturais, espirituais, sociais – de parte de todos.
Creio ser oportuno salientar que a “cultura” materialista, voltada
para o consumo e o prazer imediato, que impera na sociedade
ocidental contemporânea (afetando em especial, a juventude),
têm uma relação de causalidade com o estado de violência que
estamos vivenciando.
A desconstrução desse estado de violência exige o
envolvimento dos sujeitos, das instituições e da sociedade, em
suas multidimensionalidades – física, mental, emocional, ética,
espiritual, econômica, jurídica, política etc. O sistema educacional tem uma responsabilidade especial nesse processo. Se, por
um lado, é fundamental não ceder à tentação de colocar a responsabilidade pela transformação da sociedade nos ombros da
educação ou de considerar que as injustiças sócio-econômicas
poderão ser solucionadas por um ensino de qualidade, por outro
lado, é inegável o papel crucial que a escola desempenha na
formação intelectual e moral das novas gerações.
Construir a paz ou aceitar a violência é uma escolha da qual
não podemos nos omitir. De nossa decisão dependerá a qualidade da vida que nós e nossos filhos experimentaremos daqui a
quinze, trinta ou cinqüenta anos. Aceitar a paz e desconstruir a
violência são o desafio que se coloca perante cada um – em sua
vida pessoal, relações familiares, papel profissional e participação cívica. Oxalá possamos nos orgulhar de nossa escolha.

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Hélio Bicudo
Presidente da Comissão Interamericana de Direitos Humanos

O tema “Cidadania Mundial: a Base da Paz” traz, em si, o
mais amplo conceito de cidadania, a abranger homens, mulheres,
crianças e jovens que vivem no planeta terra.
É na verdade, um ideal a ser atingido, em especial nos países
do chamado terceiro mundo, nos quais apenas uma minoria desfruta dos benefícios da cidadania: saúde educação, como base a
necessária para alcançar-se o pleno desenvolvimento da pessoa
humana, dentro do qual se inserem outros desafios que buscam o
respeito à vida e à integridade pessoal, o direito ao acesso à
Justiça e a quaisquer outro, sobretudo, o direito à liberdade de
informação e de expressão. Melhor dizendo, os abrangentes direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais.
Esses direitos, indivisíveis e interdependentes, como advertiu
a Conferência Mundial de Direitos Humanos, realizada em Viena, em 1993, e outros que deles derivam, que se constituem no
fundamento mesmo do Estado de Direito, não nos são outorgados, mas são e serão o resultado de uma luta de todos os dias e
de todos nós. Basta lembrar, como já se disse algures, que a
Democracia é uma conquista que se faz e refaz e que nunca se

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esgota, pois existe sempre uma dificuldade a ser superada e um
novo horizonte a ser desvendado.
No caso particular do Brasil, é preciso prestar atenção a problemas que vêm sendo subestimados pelos representantes dos
três poderes da República.
Quero me referir, antes de mais nada, à questão da criança e
do adolescente. Temos um estatuto da criança e do adolescente
que nada fica a dever às legislações mais avançada sobre a
matéria. Entretanto, na prática, nada ou quase nada se faz; depois de dez anos de vigência dessa lei é quase nula a participação popular no sistema reabilitador previsto pelo Estatuto, uma
vez que não se organizam, nos limites ali indicados, os Conselhos
previstos, órgãos chaves na implementação da política que se
deseja concretizar, para que os menores não encontrem, nas ruas
das nossas cidades, o apelo que ali se concentra ao consumo de
drogas, à exploração sexual e à violência em geral.
Hoje, no Brasil, as crianças e jovens com problemas de conduta, são tratados como delinqüentes comuns, encerrados em
estabelecimentos de contenção, onde a tônica é a corrupção e a
violência. Chega-se, mesmo, num lamentável desconhecimento
de nosso sistemas constitucional que fixa a idade de responsabilidade penal aos 18 anos (artigo 228, da Constituição Brasileira),
e que se constitui, ex vi do artigo 5º, parágrafo 2º, da Constituição
Federal, em uma cláusula pétrea, que não pode ser alterada sequer mediante emenda, a qual pretende-se o rebaixamento dessa idade, numa atitude inconseqüente em face da realidade da
lei, da falência do sistema prisional e com absoluto desprezo para
com os princípios que devem reger uma política de verdadeiro
atendimento à infância e à juventude.
Por outro lado, continua-se a negar o acesso do povo à Justiça e prossegue-se na instituição e permanência de justiças
corporativas, como são as justiças de polícias militares, responsáveis pelos altíssimos índices de impunidade nos crimes praticados por milicianos contra civis, circunstância que,
indubitavelmente, convida à violência.

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Somente em São Paulo, nos últimos dez anos, foram eliminadas cerca de seis mil e quinhentas pessoas pela Polícia Militar,
fato que não mereceu a devida consideração da justiça corporativa
que as acoroçoa.
Insiste-se, por igual, num modelo policial hoje inteiramente
esgotado, elaborado pela ditadura militar para proteger o Estado
e repudiam-se projetos que procuram estruturar uma nova polícia, com novas concepções do que deva ser a atividade policial,
na função precípua de atuar na defesa da segurança das pessoas, inclusive se for o caso, contra a própria ação do Estado.
São fatos que decorrem de uma concepção de Estado que o
modelo neoliberal intenta implantar e que aumentou, nos países
do terceiro mundo, as pautas de miséria e sujeitou a saúde e a
educação aos patamares mais baixos da atuação desse mesmo
Estado.
Enquanto, pois, não erigirmos a saúde, a educação, o emprego, a justiça e a liberdade de informação e expressão em fundamentos do Estado de Direito, como aliás impõe a Constituição de
1988, com razão chamada “cidadã”, quando dispõe que a República Federativa do Brasil tem como um de seus fundamentos a
cidadania e a dignidade da pessoa humana (artigo 1º ); como
objetivos fundamentais, dentre outros, o de erradicar a pobreza e
a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais,
bem como promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (artigo 3º ); e rege-se nas suas relações internacionais
pela prevalência dos direitos humanos (artigo 4º ); não poderemos deixar de lutar para que esses direitos não fiquem à margem
da lei, mas sobretudo, que se inscrevam em nossos corações e mentes, para que, então, possamos proclamar a cidadania mundial.
Todos somos irmãos, portanto, solidários nos bens da vida.

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Rabino Henry l. Sobel
Presidente do Rabinato da Congregação Israelita Paulista

Era uma vez um rapaz que estava tão inspirado que resolveu
mudar o mundo. Ele estava plenamente convencido de que seus
sonhos e suas idéias podiam revolucionar o universo. Mas, quando tentou implementá-los, percebeu que o mundo era grande
demais para uma pessoa mudá-lo sozinha. Então, resolveu mudar seu país. Mas logo viu que isso também era uma tarefa grande demais para uma única pessoa. Daí, decidiu mudar sua comunidade. Mas logo percebeu que até isso era difícil demais para
ele. Então, resolveu mudar a si mesmo. E, quando começou a
ser compreensivo para com os outros e passou a se comportar
corretamente ele foi contagiando todos ao seu redor. E sua comunidade ficou melhor, seu país ficou melhor, o mundo ficou
melhor.
Conto essa história porque acredito realmente que, se queremos construir a paz em nossa sociedade, temos que começar
com nós mesmos. Cada um em seu próprio pequeno mundo, desarmado o espírito, conscientizando a si mesmo, conscientizando

63
aquele ao seu redor, conscientizando seus filhos.
A cidadania mundial tem que ser cultivada desde a infância.
É na infância que a criança deve ser conscientizada de que existe outras idéias além das suas, outros credos além do seu, outras
raças além da sua, que existem diferenças entre as diversas religiões e etnias, mas todas são igualmente válidas e nenhuma é
superior às outras. Dois ensinamentos bíblicos podem servir de
ponto de partida neste sentido. O primeiro: “Vayvra Elohim et
ha’adam be’tzelem Elhim” - “O homem foi criado à imagem de
Deus”. Este princípio implica que cada ser humano é digno de
respeito e consideração, pois ele traz dentro de si uma centelha
divina do Criador. Outro ensinamento de fundamental importância é que toda raça humana provém de um único homem, Adão.
Ao aprender isto, a criança capta o conceito da igualdade entre
todas as pessoas e aprende, ao mesmo tempo, a rejeitar qualquer
idéia de superioridade.
A história já nos deu provas suficientes de que o preconceito
religioso, o triunfalismo ideológico e a discriminação étnica são
as maiores barreiras ao progresso humano. Quando uma minoria
qualquer é atacada, a sociedade como um todo torna-se uma
vítima em potencial. Quantas estratégias precisaremos suportar
para aprender essa antiga lição? Já é tempo de percebermos que
julgar um ser humano em termos do seu credo religioso, das
suas convicções políticas, da cor de sua pele, é mais do que um
erro. É uma cegueira do espírito, é um câncer da alma.
O erro mais trágico e persistente do pensamento humano é o
conceito de que as idéias são mutuamente exclusivas. Foi esse o
engano fatal que, não apenas no século XX, mas em todos o
tempos, fez falhar o ideal da fraternidade universal. Em cada
indivíduo, em cada povo, em cada cultura, existe algo que é relevante para os demais, por mais diferentes que sejam entre si.
Enquanto cada grupo pretender ser o dono exclusivo da verdade,
enquanto perdurar esta estreiteza de visão, a cidadania mundial
permanecerá um sonho inatingível.
O ingrediente básico para a construção da paz em nossa so-

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Cidadania Mundial: A Base da Paz
Cidadania Mundial: A Base da Paz
Cidadania Mundial: A Base da Paz
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Cidadania Mundial: A Base da Paz

  • 1.
  • 2.
  • 4.
  • 5. CIDADANIA MUNDIAL A BASE DA PAZ Realização da Comunidade Bahá'í do Brasil Organização: Marilene de Freitas ífí-..
  • 6. ©2000 Direitos Reservados: Jr Editora Planeta Paz CP 198 13800-970 - Moai Mirim - SP ISBN: 85.85690.24.0 Primeira Edição: 2000 Composto em: Times New Roman -11,5/ Modcrn -18 Organização: Marilenc de Freitas Capa: Gustavo Pallone de Figueiredo Impressão: R. Vieira Gráfica e Editora Ltda Campinas - SP
  • 7. ÍNDICE Apresentação A Cidadania Mundial Uma ética global para o desenvolvimento sustentável Comunidade Internacional Bahá'í Reflexões dos Cidadãos do Mundo - 1995/1999 Cidadania: A prática dos direitos humanos Anton Verwey Renato Zerbini Ribeiro Leão 21 Allo-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados Libertação através dos direitos humanos Antônio Augusto Cançado Trindade 29 Presidente da Corte IiUeramericana de Direitos Humanos Reflexões sobre cidadania Benedita da Silva 37 Vice-Governadora do Estado do Rio de Janeiro Geisa da rocinha Celina Vargas do Amaral Diretora do Sebrae/RJ 43
  • 8. Por uma cultura de paz Daniel John Vaillancourt 45 Diretor Executivo da Escola das Nações, Brasília Cidadania: construir a paz ou aceitar a violência? Feizi Milani 51 Presidente do Instituto Nacional de Educação para a Paz e os Direitos Humanos 59 Os direitos de cada cidadão Hélio Bicudo Presidente da Comissão Interamericana de Direitos Humanos Paz: fraternidade e tolerância Henry Sobcl Presidente do Rabinato da Congregação Israelita Paulista O imenso quebra-cabeças da unidade Ivone Amando Bezerra 67 Educadora Ambiental Um processo sem Jorge Wcrthcin fim 69 Representante da UNESCO no Brasil Direitos humanos, direitos de todos José Grcgori Ministro da Justiça Desafios etico-ecológicos: atitudes novas face à uma realidade nova Leonardo Boff 77 81 Teólogo A promoção da cidadania mundial através da educação Lúcia Araújo Diretora do Canal Futura §7
  • 9. Manifesto pró-natureza e pela ética ambiental Miguel Serediuk Milano 87 Diretor da Fundação O Boticário de Proteção à Nature/ü Direitos Humanos e cidadania mundial OlmarKlich 93 Presidente do Movimento Nacional dos Direitos Humanos As crianças, bases para Paz Rciko Niimi 97 Representante do UNICEF no Brasil Um avanço em nosso destino Sônia Shafa 99 Enfermeira Um testemunho de vida Ti/uka Yamazaki 103 Cineasta Notas 106
  • 10.
  • 11. !"#$%$&'()*+ Por essas idéias muitos lutaram e muitos tombaram. Profetas do passado tiveram visões sobre um tempo em que o “leão e o cordeiro beberiam água da mesma fonte”. Poetas escreveram inspirados poemas e odes louvando o tema da fraternidade humana. Também por essa idéia muitos continuam dedicando suas vidas à missão de dar corpo ao conceito que enseja a visão de um novo mundo, sem fronteiras, sem discriminações, sem sectarismos, sem forças excludentes dos processos de transformação da sociedade. Temos nesta obra o pensamento vivo – e que não quer calar - de uma parcela significativa de expoentes da sociedade brasileira que desde 1995 foram agraciados com o Prêmio Cidadania Mundial. Este Prêmio, inspirado nas palavras de Bahá’u’lláh, o fundador da Fé Bahá’í, de que “a Terra é um só país e os seres humanos seus cidadãos”, é outorgado anualmente aos indivíduos e instituições que se destacam na defesa dos direitos humanos, na promoção da condição da mulher, na eliminação do racismo, na proteção do meio-ambiente, e é uma sinalização da sociedade civil para o fato de que há muito tempo a cidadania mundial deixou de ser uma idéia e um conceito para ser uma experiência de vida, compartilhada pelos mais diversos líderes do pensamento em nossa sociedade que avança para o século XXI. A seguir, uma breve menção sobre cada uma dessas oportunas reflexões: 1
  • 12. O Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), destaca que a cidadania como fundamento da paz é uma realidade que a cada dia agiganta-se à frente daqueles que pensam e constróem a doutrina e a prática dos direitos humanos. Antônio Augusto Cançado Trindade, presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos, afirma categoricamente que paz, justiça social e direitos humanos são indivisíveis e que a cidadania mundial, como base da paz, está presente nas próprias origens do Direitos Internacional, sendo que este constitui não apenas um instrumental jurídico de regulação mas também de libertação. Benedita da Silva, Vice-Governadora do Estado do Rio de Janeiro, observa que a Declaração Universal dos Direitos humanos é o marco decisivo na conquista da cidadania por todos os povos, com o estabelecimento da liberdade, da justiça e da eqüidade para garantir a paz mundial. Celina Vargas do Amaral, Diretora do Sebrae/RJ, expressa o anseio de que desejamos viver em uma sociedade forte e articulada, conviver com instituições representativas, comprometidas e engajadas na missão de transformar uma realidade socialmente injusta e cruel. Daniel John Vaillancourt, Diretor Executivo da Escola das Nações, Brasília, afirma que o mundo carece de adultos conscientes... que nossos futuros cidadãos mundiais são, hoje, os freqüentadores de nossas escolas primárias e secundárias e que devemos dar a eles a visão, a esperança, a capacidade e a coragem necessárias para que criem uma cultura de paz nesta Planeta que chamamos, nosso lar. Feizi Milani, Presidente da Instituto Nacional de Educação 2
  • 13. para a Paz e os Direitos Humanos (INPAZ), discorre que fazer o bem é algo infinitamente maior do que não fazer o mal e que não praticar atos violentos é o mínimo que se espera de qualquer pessoa que pretenda viver em sociedade e vai além ao afirmar que praticar a paz é viver, construir e ensinar a paz, pois ela só será alcançada se cada cidadão, família, organização e comunidade se engajar ativamente na construção de relações baseadas no respeito, na unidade, na diversidade e na empatia. Hélio Bicudo, Presidente da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, enfatiza que enquanto o direito da população à saúde, à educação, ao emprego, à justiça e à liberdade de informação e expressão não forem inscritos em nossos corações e mentes, não poderemos, então, proclamar a cidadania mundial. Henry Sobel, Presidente do Rabinato da Congregação Israelita Paulista, afirma que hoje, mais do que nunca, temos que espalhar a mensagem de fraternidade e tolerância, temos que ressaltar que somos todos filhos de um mesmo Deus e, portanto, somos todos irmãos, temos que tentar conscientizar a sociedade de que só atingiremos nossos objetivos se nos empenharmos, com determinação, pelo entendimento mútuo. Ivone Amâncio Bezerra, Educadora Ambiental, destaca que pelo menos duas afirmativas deixaram sua marca impressa na consciência de milhões de pessoas no Século XX: “a Terra é um só país e os seres humanos seus cidadãos” e que “a Terra é um só organismo e cada ser vivo é parte dele.” Jorge Werthein, Representante da UNESCO no Brasil, é categórico ao afirmar que a cultura de paz é uma iniciativa de longo prazo que deve levar em conta os contextos histórico, político, econômico, social e cultural de cada ser humano e que é necessário aprendê-la, desenvolvê-la e colocá-la em prática no dia-a-dia familiar, regional ou nacional... é um processo sem fim! 3
  • 14. José Gregori, Ministro da Justiça, afirma que a plena consciência dos direitos humanos universais, entendida como mundialização dos direitos fundamentais, implica, também na criação das condições necessárias para que se desenvolva a consciência, em cada um de nós, das obrigações universais e enfatiza que direitos Humanos é o único caminho seguro para a paz. Leonardo Boff, Teólogo, afirma que devemos deixar nascer em nós o homem/mulher novos, diferentes, complementares, solidários e unidos na construção de um destino comum para nosso país e para o nosso planeta. Não somos chamados a sermos galinhas, mas águias. A águia está escondida dentro de cada anseio e de cada sonho de crescimento e de libertação que fermenta na mente e incendeia o coração. Importa dar asas à águia. Seu habitat é o céu, as alturas e o espaço aberto e não o rastejar pelo chão. Cumpre erguer vôo e arrastar outros na mesma aventura da liberdade e da libertação. Nesse processo se fará a revolução para um novo paradigma civilizacional que permitirá a continuação do experimento homo num sentido mais profundo e melhor do que aquele vivido até o momento. Lúcia Araújo, Diretora do Canal Futura, enfatiza que é preciso que se cuide, principalmente, das crianças e dos adolescentes, para que a paz se concretize e a consciência de cidadania seja sedimentada. Para tanto, é necessário implementar, urgentemente, ao lado dos projetos voltados para a educação convencional, um projeto de educação para os valores, cujo objetivo seja lutar pela construção de uma infância e uma adolescência mais digna para os pequenos cidadãos e que contribua para a consolidação de uma cultura da tolerância e da cooperação. Miguel Serediuk Milano, Diretor da Fundação O Boticário de Proteção à Natureza, destaca que a cidadania mundial requer respeito entre os homens e a paz; respeito este que só será verdadeiro quando estiver pautado em amor e fraternidade; 4
  • 15. paz esta que será, então, apenas uma conseqüência desse respeito e não motivo da busca. Olmar Klich, Presidente do Movimento Nacional dos Direitos Humanos (MNDH), discorre que a caminhada pelos direitos humanos é a própria luta do nosso povo oprimido, através de um processo histórico que se inicia durante a colonização e que continua, hoje, na busca de uma sociedade justa, livre, igualitária, culturalmente diferenciada e sem classes. Reiko Niimi, Representante do UNICEF no Brasil, reflete que todos os países do mundo, com exceção de apenas dois, disseram “sim” a um belo projeto de mundo: a Convenção sobre os Direitos da Criança. Afirma que as meninas e os meninos têm direito a uma escola que respeita suas individualidades e sua cultura... além disso, as crianças cidadãs deste mundo devem ter respeitados seus direitos ao pensamento e à religião. Sônia Shafa, enfermeira, recomenda que a concepção de estrangeiro deve ser abolida. Somos estranhos em quê? Na realidade somos todos idênticos nos nossos sonhos e nos nossos desejos de Paz. (...) Vivemos num mundo de desafio, onde a adoção da cidadania mundial dentro de nós mesmos e aplicada na nossa vida cotidiana nos levará a um avanço no nosso destino: a prática da verdadeira humanidade. Tizuka Yamazaki, cineasta, testemunha que o preconceito racial não se explica, se sente medo... e muita gente sabe disso e usa do abuso de poder para humilhar o ser humano, humilhado e com medo, o segregado está sem defesa para sobreviver. Conclui afirmando que através da aceitação das diferenças e do amor perdemos o medo e transformamos nossas diferenças em armas a serem usada no caminho que leva a paz. 5
  • 16. Fica patente após a leitura destes luminosos textos que a estrada que aponta para a cidadania mundial está ao alcance desta geração. Uma estrada onde podemos encontrar referenciais que, de certa forma, têm uma influencia direta sobre o comportamento humano em sua experiência de viver em sociedade. Dentre estes referenciais, destacamos os seguintes: • A confiança inabalável na unidade do gênero humano. • A eliminação dos preconceitos de raça, cor, credo nacionalidade, crença religiosa, classe. • A igualdade de direitos e oportunidades para o homem e a mulher. • A harmonia entre a religião, a ciência e a razão. • A implementação da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Comunidade Bahá’í do Brasil Ilustração da Capa Título: Cidadão do Mundo Técnica: pintura em seda - 0,70x1,00 m. Artista plástica: Ita Andrade 6
  • 18. 8
  • 19. No espírito da Agenda 21, como um “programa dinâmico” destinado a “evoluir ao longo do tempo à luz das necessidades e circunstâncias em constante transformação”(1), a Comunidade Internacional Bahá’í oferece a seguinte proposta: As campanhas de educação e conscientização recomendadas na Agenda 21 deveriam cultivar o conceito de CIDADANIA MUNDIAL para, assim, inspirar os povos do mundo a promoverem o desenvolvimento sustentável. A Visão da Cidadania Mundial O maior desafio que a comunidade mundial enfrenta na mobilização para implementar a Agenda 21 é o de liberar os enormes recursos financeiros, técnicos, humanos e morais necessários ao desenvolvimento sustentável. Tais recursos somente serão liberados na medida em que os povos do mundo desenvolvam um profundo senso de responsabilidade pelo destino do planeta e pelo bem-estar da inteira família humana. Este senso de responsabilidade somente poderá emergir da aceitação da unidade da humanidade, e somente será sustentado por uma visão unificadora de uma sociedade mundial pacífica e próspera. Sem esse tipo de ética global, as pessoas não poderão se tornar participantes ativos e construtivos no processo mundial de desenvolvimento sustentável. (2) Ainda que a Agenda 21 forneça arcabouço indispensável de conhecimento científico e “know-how” técnico para a 9
  • 20. implementação do desenvolvimento sustentável, ela não inspira um compromisso pessoal a uma ética global. Isso não significa que a ética e os valores tenham sido desconsiderados durante o processo da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (UNCED). A chamada por valores unificadores foi levantada durante todo aquele processo, por Chefes de Estado, oficiais da ONU, representantes de organizações não-governamentais (ONG’s) e cidadãos individuais. Em particular, os conceitos de “nossa humanidade comum”, “cidadania mundial” e “unidade na diversidade” foram invocados como o sustento ético para a Agenda 21 e a Declaração do Rio.(3) Assim, a comunidade mundial já chegou a um acordo básico sobre a necessidade de uma ética global para revitalizar a Agenda 21. Sugerimos que a expressão, cidadania mundial, seja adotada para englobar o conjunto dos princípios, valores, atitudes e comportamentos que os povos do mundo devem adotar para a realização do desenvolvimento sustentável. A cidadania mundial começa com a aceitação da unidade da família humana e a interconexão das nações da “Terra, nosso lar”.(4) Ao mesmo tempo que incentiva um patriotismo são e legítimo, ela insiste também numa lealdade mais ampla, um amor à humanidade como um todo. Na implica, entretanto, no abandono de lealdades legítimas, na supressão da diversidade cultural, na abolição da autonomia nacional ou na imposição da uniformidade. Ela é caracterizada pela “unidade na diversidade”. A cidadania mundial engloba os princípios de justiça social e econômica, entre as nações e dentro das mesmas; a tomada de decisões de maneira cooperativa em todos os níveis da sociedade; a igualdade dos sexos; a harmonia racial, étnica, nacional e religiosa; e, a disposição de sacrificar-se pelo bem comum. Outras facetas da cidadania mundial – todas as quais promovem a honra e a dignidade humanas, a compreensão, a amizade, a cooperação, a confiabilidade, a compaixão e o desejo de servir – podem ser deduzidas daquelas já mencionadas. Alguns destes princípios(5) têm sido articulados na Agenda 21; entretanto, a maioria chama 10
  • 21. a atenção pela sua ausência. Outrossim, não foi fornecido nenhum arcabouço conceitual sob o qual eles pudessem ser harmonizados e promulgados. Fomentar a cidadania mundial é uma estratégia pratica para promover o desenvolvimento sustentável. Enquanto a desunião, o antagonismo e o provincialismo caracterizarem as relações sociais, políticas e econômicas dentro e entre as nações, um padrão global e sustentável de desenvolvimento não poderá ser estabelecido.(6) Há mais de um século, Bahá’u’lláh advertiu: “O bem-estar da humanidade, sua paz e segurança, são inatingíveis, a não ser e até que se estabeleça firmemente sua unidade”. Uma sociedade global sustentável somente poderá ser construída sobre o alicerce de unidade, harmonia e compreensão genuínas entre os diversos povos e nações do mundo Portanto, recomendamos que a cidadania mundial seja ensinada em todas as escolas e que a unidade da humanidade – o princípio que fundamenta a cidadania mundial – seja constantemente declarado em cada nação. O conceito de cidadania mundial não é novo para a comunidade mundial. Ele está implícito e explícito em muitos documentos, cartas e acordos da ONU, inclusive nas primeiras palavras da própria Carta da ONU: “Nós, os povos das Nações Unidas...”, e já está sendo promovido ao redor do mundo em todas as culturas por diversas ONG’s, acadêmicos, grupos de cidadãos, artistas, programas educativos e pela mídia. Tais esforços são significativos, mas precisam ser largamente ampliados. Uma campanha de longo prazo, cuidadosamente planejada e orquestrada, e envolvendo todos os setores da sociedade em nível local, nacional e internacional, precisa ser iniciada para fomentar a cidadania mundial. A mesma deve ser prosseguida com todo o vigor, coragem moral e convicção que as Nações Unidas, seus Estados membros e todos os parceiros que estiverem dispostos a colaborar, possam reunir. 11
  • 22. A Promoção da Cidadania Mundial A seguinte proposta de uma campanha para promover a cidadania mundial(7) cabe naturalmente dentro do arcabouço para a reorientação a educação, conscientização e capacitação visando o desenvolvimento sustentável, conforme apresentado no Capitulo 36 da Agenda 21. !,;/2-!IJ7 A educação – formal, não-formal e informal – é sem dúvida, a maneira mais eficaz de moldar os valores, atitudes, comportamentos e habilidades que capacitarão os povos do mundo a agirem de acordo com os interesses de longo prazo do planeta e da humanidade como um todo.(8) As Nações Unidas, os governos e as agências educacionais deveriam procurar tornar o princípio da cidadania mundial parte integrante da educação de cada criança. Os detalhes dos programas e atividades educativas incorporando tal princípio irão variar muito entre as nações e dentro das mesmas. Entretanto, para que a cidadania mundial seja considerada um princípio universal, todos os programas deverão ter certos aspectos em comum. Baseados no princípio da unidade da raça humana, eles deveriam cultivar a tolerância e a fraternidade, fomentando uma apreciação pela riqueza e importância dos diversos sistemas culturais, religiosos e sociais do mundo e fortalecendo aquelas tradições que contribuem para uma civilização mundial sustentável. Eles deveriam ensinar o princípio da “unidade na diversidade” como a chave para o poder e a riqueza, tanto para as nações quanto para a comunidade mundial. Deveriam fomentar uma ética de serviço ao bem comum e incutir uma compreensão dos direitos e responsabilidades da cidadania mundial. Tais programas e atividades deveriam partir dos esforços positivos do país e realçar seus sucessos tangíveis, incluindo modelos de unidade racial, religiosa, nacional e étnica. Deveriam enfatizar a importância da ONU na promoção de cooperação e 12
  • 23. compreensão globais; suas metas, objetivos e programas universais; sua relevância imediata aos povos e nações do mundo; e o papel que ela deve continuamente assumir em nosso mundo cada vez mais interconectado. Antes que seja iniciada uma campanha para promover a cidadania mundial, será preciso desenvolver uma compreensão comum do conceito e alcançar um consenso do mesmo. A Comissão para o Desenvolvimento Sustentável poderia desenvolver um comitê especial ou grupo de trabalho para começar a desenvolver diretrizes para a cidadania mundial e propostas para a incorporação deste princípio nos programas existentes de educação formal e não-formal. Alternativamente, a Comissão poderia buscar a ajuda do Conselho Assessor de Alto Nível para o Desenvolvimento Sustentável. O Secretariado da ONU poderia estabelecer um Centro para a Cidadania Mundial, semelhante ao antigo Centro de Estudos da Paz, para desenvolver tais diretrizes e coordenar a implementação em todo o sistema da educação para a cidadania mundial. Qualquer que seja o caminho escolhido, esta tarefa terá que receber alta prioridade. A cidadania mundial poderia facilmente ser incorporada em todas as atividades sugeridas no Capítulo 36.5. da Agenda 21, para reorientar a educação na direção do desenvolvimento sustentável. Alguns exemplos são ilustrativos: • As assessorias nacionais/mesas redondas (36.5.c) deveriam facilitar a incorporação da cidadania mundial nos programas educacionais dentro do país. • Os programas de treinamento e aperfeiçoamento para todos os professores, administradores, planejadores educacionais e educadores não-formais (36.5.d) deveriam incluir o princípio da cidadania mundial nas suas programações. • Os materiais educativos sobre o desenvolvimento sustentável produzidos pelas agências da ONU, bem como os materiais educativos sobe as Nações Unidas, deveriam incentivar a cidadania mundial (36.5.g). 13
  • 24. • A Agenda 21 recomenda “o desenvolvimento de uma rede internacional” para apoiar os esforços globais de educação para o desenvolvimento sustentável (36.5.k). Tal rede poderia incentivar as agências das Nações Unidas e ONG’s afiliadas a criarem materiais baseados nas diretrizes para a cidadania mundial e providenciarem os meios de compartilhá-los. • Os governos e as autoridades educacionais já foram instados a “eliminar os estereótipos baseados em gênero nos currículos”, como um meio de promover o desenvolvimento sustentável (36.5.m). Recomendamos que, dentro do espírito de cidadania mundial, os estereótipos baseados em religião, cultura, raça, classe, nacionalidade e etnicidade sejam também eliminados. !,-70<-.;05.K!IJ7,/7,9L83.-7 As pessoas precisam considerar-se cidadãos do mundo e entender sua responsabilidade de promoverem o desenvolvimento sustentável.(9) As campanhas de conscientização dos desafios da cidadania mundial devem aproveitar toda a mídia e as artes, inclusive a televisão, vídeo, cinema, rádio, redes eletrônicas, livros, revistas, cartazes, panfletos, teatro e música. Tais campanhas deveriam envolver as indústrias de publicidade e entretenimento, os meios tradicionais e não tradicionais de comunicação, o sistema inteiro das Nações Unidas, todos os Estados membros, as ONG’s e personalidades populares. Elas deveriam alcançar o lar, o local de trabalho, as áreas públicas e as escolas. As diretrizes para a cidadania mundial, cujo estabelecimento foi recomendado acima devem ser adequadas para uso em tais campanhas de conscientização, e devem servir como uma referência básica para toda a programação para a mídia. A cidadania mundial poderia ser incluída nas atividades apresentadas no capítulo 36.10. da Agenda 21, para aumentar a consciência e a sensibilidade do público em relação ao desenvolvimento sustentável. Os seguintes exemplos são ilustrativos: 14
  • 25. • Conselhos assessores nacionais e internacionais (36.10.a) poderiam incentivar os diversos meios de comunicação a adotarem as diretrizes para a cidadania mundial. A mídia tem feito muito para conscientizar o público sobre a interdependência global e os enormes desafios que a comunidade mundial enfrenta. Tem, também, realçado as diferenças aparentemente insuperáveis que nos dividem. A mídia tem a responsabilidade de ajudar as pessoas a entenderem que a diversidade não precisa ser uma fonte de conflito; antes, a diversidade pode, e agora deve, servir como um recurso para o desenvolvimento sustentável. A mídia poderá alcançar esta meta, focalizando os empreendimentos construtivos, unificadores e cooperativos que comprovam a capacidade da humanidade de trabalhar junto para vencer os enormes desafios que ela enfrenta. • Ao promover “um relacionamento cooperativo com a mídia” (36.10.e), a ONU deve corajosamente definir sua própria identidade e a promessa que ela oferece à comunidade mundial. A Organização das Nações Unidas foi estabelecida com elevados ideais e uma visão de um mundo pacífico e progressivo. Fornecendo um arcabouço para a comunicação e a cooperação e iniciando inúmeros projetos construtivos, ela tem contribuído significativamente para a compreensão, esperança e boa vontade do mundo. Contudo, suas realizações são pouco conhecidas pela humanidade em geral. Usando o conceito de cidadania mundial como tema integrador, as Nações Unidas deveriam divulgar seus ideais, atividades e metas, para que as pessoas venham a entender o papel único e vital que a ONU desempenha no mundo e, portanto, nas suas vidas. Semelhantemente, a ONU deveria promover a cidadania mundial em todas as suas atividades públicas, inclusive nas comemorações do qüinquagésimo aniversário das Nações Unidas e n os passeios pela Sede da ONU. Cada documento da ONU que trata do desenvolvimento sustentável, a começar pelo preâmbulo da proposta Carta da Terra, deveria também incluir 15
  • 26. esse princípio. A cidadania mundial deve-se tornar o ponto de referência ético mais importante em todas as atividades da ONU. • Os serviços da indústria da publicidade (36.10.e) devem ser recrutados para a promoção da cidadania mundial. Campanhas poderiam ser organizadas ao redor de temas tais como: Nós, os Povos das Nações Unidas: Celebrando a Unidade na Diversidade. Um Planeta, Um só Povo. Em Toda Nossa Diversidade, Nós Somos uma Só Família Humana. Nosso Futuro Comum: A Unidade na Diversidade. • Concursos deveriam ser realizados e prêmios concedidos pela promoção da cidadania mundial (36.10.e). • Enquanto conscientiza o público “sobre os impactos da violência na sociedade” (36.10.1), a mídia pode gerar um compromisso para com a cidadania mundial, realçando exemplos de empreendimentos construtivos e unificadores que mostram o poder da unidade e de uma visão comum. Cada país deveria ser encorajado a alocar recursos para a promoção da cidadania mundial. Também deve-se considerar incluir nos propostos “indicadores do desenvolvimento sustentável” (40.6.) a promoção deste princípio. Por exemplo, os países poderiam ser incentivados a relatarem os esforços para promover o respeito e a apreciação das outras culturas, a igualdade dos sexos e o conceito de uma única família humana, através dos currículos escolares, do entretenimento e da mídia. 16
  • 27. O Desafio da Cidadania Mundial Em conclusão, a cidadania mundial é um conceito tão desafiador e dinâmico quanto as oportunidades que a comunidade mundial enfrenta. A sabedoria exige que nós, os povos e nações do mundo, corajosamente adotemos seus princípios subjacentes e nos guiemos por eles em todos os aspectos das nossas vidas – nas nossas relações pessoais e comunitárias e nos assuntos nacionais e internacionais; nas nossas escolas, locais de trabalho e mídia e nas nossas instituições jurídicas, sociais e políticas. Nós, portanto, instamos a Comissão a encorajar o sistema inteiro das Nações Unidas a incorporar o princípio da cidadania mundial em todos seus programas e atividades. A Comunidade Internacional Bahá’í, que há mais de um século vem promovendo a cidadania mundial, aceitaria de bom grado ajudar a Comissão, os Governos, as ONG’s e outros a ampliarem os conceitos contidos neste documento; fornecer modelos práticos de unidade racial, religiosa, nacional e étnica para o desenvolvimento sustentável; e participar de consultas sobre esta questão crucial. Como uma comunidade global que abarca a diversidade da humanidade e compartilha uma visão comum, a Comunidade Internacional Bahá’í continuará a promover o desenvolvimento sustentável, encorajando as pessoas a considerarem cidadãos de um só mundo e construtores de uma civilização mundial justa e próspera. 17
  • 28. 18
  • 30. 20
  • 31. -./!/ !/!0.!T -./!/!0.!T !,9:>5.-!,/7<,/.:;.57< !,9:>5.-!,/7<,/.:;.57< U21!07< Anton Verwey Diretor Regional do ACNUR no Escritório Regional para o Sul da América Latina. Renato Zerbini Ribeiro Leão Coordenador-Geral do Centro de Proteção Internacional de Direitos Humanos (CPIDH). Consultor Jurídico no Brasil do Escritório Regional para o Sul da América Latina do ACNUR. Introdução Para o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) é uma honra e um privilégio estar contribuindo com a obra “Cidadania Mundial: A base da Paz”, publicação que reúne todos os agraciados com o Prêmio Cidadania Mundial oferecido pela Comunidade Bahaí do Brasil, instituição que desempenha um papel fundamental na propagação dos fundamentos dos direitos humanos ao longo do planeta. O tema escolhido, a cidadania como fundamento para a paz, é uma realidade que cada dia agiganta-se à frente daqueles que pensam e constroem a doutrina e a prática dos direitos humanos. 21
  • 32. Uma parte significativa dos pensadores da matéria concordam que o conceito de cidadania está estreitamente vinculado com o direito a ter direitos, daí o esforço do Direito Internacional Público de tutelar os direitos dos “não-cidadãos”, no contexto mais amplo do princípio de proteção internacional. A realidade da problemática dos refugiados e refugiadas encaixa-se nessa noção de cidadania. Dados estatísticos apontam que no mundo atual, cerca de 50 milhões de pessoas podem, legitimamente ser vítimas de deslocamentos forçados. Os movimentos de refugiados e outras formas de deslocamento forçado constituem um importante instrumento para medir a segurança e/ou insegurança humana. Geralmente, as pessoas não abandonam seus lares ou fogem de seu próprio país a não ser quando sentem sua vida, sua liberdade ameaçadas e seus direitos completamentes renegados. Hoje em dia, por volta de 22 millões de pessoas estão sob a proteção do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) e a maioria delas provêem de países pobres. Muitos são obrigados a viver em imensos campos de refugiados ou acampamentos provisórios, aguardando retornar a seus lares de maneira segura para poder retomar una vida normal. O ACNUR, criado pela Resolução 319 (IV) da Assembléia Geral das Nações Unidas com data de 3 de dezembro de 1949, inicia suas atividades em 1º de janeiro de 1951. O Estatuto do ACNUR foi aprovado pela Assembléa Geral, em 14 de dezembro de 1950, conforme Anexo da Resolução 428 (V). Nessa Resolução, a Assembléia apelava aos Governos para que cooperassen com o Alto Comissariado no desempenho de suas funções relativas aos refugiados amparados pela competência de seu Comissariado. De acordo com seu Estatuto, o trabalho do Alto Comissariado terá carácter inteiramente apolítico e será de natureza humanitária e social. 22
  • 33. O ACNUR no Brasil e na região Uma das principais estratégias do ACNUR no Cone Sul é a construção e o fortalecimento de uma estrutura tripartite (Governo, Sociedade Civil e ACNUR) sólida. Nesse sentido, um de seus objetivos principais é dotar e capacitar a sociedade civil envolvida com a temática das/os refugiadas/os dos diferentes países que conformam a região (Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai) no trabalho de políticas públicas, proteção e integração local. Nesse modelo ideal, o Brasil é um país chave na região, pois possui a estrutura mais próxima a essa realidade. A história da presença do ACNUR no Brasil remonta-se ao ano de 1977, quando essa instituição da ONU instalou uma sede local na cidade do Rio de Janeiro, que se encontrava sob a supervisão da Oficina Regional para o Sul de América Latina, com sede em Buenos Aires, Argentina. Naquela época o país começava a receber seus primeiros fluxos importantes de refugiados, provenientes justamente de países da América do Sul como conseqüência das crises institucionais que afetaram os países da região, recebendo assim a uruguaios, argentinos, paraguaios e chilenos. No ano de 1989, a missão do ACNUR no Rio de Janeiro transfere-se para Brasília, pois aí estão os órgãos federais de tomada de decisão na matéria. Mas recentemente, com a aprovação da Lei 9474, em 22 de julho de 1997, o Brasil incorpora de maneira oficial a seu ordenamento jurídico e político, tanto a Convenção de 1951 como o Protocolo de 1967 relativos ao Estatuto dos Refugiados, convertendo-se no primeiro país da região em elaborar uma legislação compreensiva e progressista na matéria. Em dezembro de 1998, dentro de um contexto de diminuição de recursos e permeado por uma significativa crise financeira, conseqüência das limitações orçamentárias observadas na instituição em escala mundial, o ACNUR toma a difícil decisão de fechar sua representação local no país, pois considera que o Brasil já iniciava e assumia por seus próprios meios o exame criterioso 23
  • 34. e profissional do tema em busca de soluções duradouras para os refugiados e refugiadas em seu território. Portanto, os poucos recursos disponíveis deveriam ser direcionados para as regiões e situações de emergência nos distintos continentes. O Brasil seria, então, coberto pelo Escritório Regional de Buenos Aires. O ACNUR, no entanto, não saia muito preocupado do Brasil, pois esse país aprovara uma das leis mais modernas sobre refugiados e refugiadas e possuía uma estrutura tripartite (Governo, Sociedade Civil e ACNUR) em um processo ascendente e exitoso de consolidação, conformando um país chave na região. A Lei Nº 9.474, de 22 de julho de 1997, define os mecanismos para a implementação da Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951 no Brasil, e determina outras providências como a criação do Comitê Nacional para os Refugiados –CONAREatuando como marco para o tratamento das solicitações do Estatuto de Refugiado e a busca de soluções duradouras para os refugiados e refugiadas que procuram a proteção internacional em seu território. Ademais, o ACNUR buscava intensificar sua presença na temática de refugiados no país, além da supervisão internacional desde o Escritório Regional de Argentina, através de associações com distintas organizações (Cáritas, OAB, IBRI e CPIDH) que, de diversas formas, podem contribuir e somar seus esforços de trabalho em prol dos refugiados e refugiadas no Brasil. Em busca de uma harmonização legislativa regional No árduo caminho que tem sido percorrido desde a criação do ACNUR e a entrada em vigor da Convenção de 1951 e seu Protocolo de 1967, não se pode perder de vista que as situações que vem originando os grandes fluxos de refugiados e refugiadas ao longo das décadas têm tido sua origem nas complexas relações internacionais surgidas em conseqüência do final da Segunda Grande Guerra. Os movimentos de libertação nacional, o ressurgir de certas formas extremas de nacionalismo, o separatismo étnico, o aumento de conflitos armados internos, o desmoro- 24
  • 35. namento de grandes bloques ideológicos e o surgimento de novos grupos econômicos de influência, contribuiram para uma instabilidade na qual situações de violação de direitos humanos encontram campo fértil. Em um mundo onde as relações entre os Estados estão cada vez mais vinculadas à realização de objetivos supranacionais e onde os efeitos de uma medida política em um país afeta cada vez mais a situação de seu vizinho, o caminho da coordenação de políticas sociais, econômicas e de desenvolvimento como instrumento de progresso regional é inevitável. Os exemplos mais claros dos beneficios e percalços da integração ou harmonização regional estão dados nos anos de esforços necessários à concretização da União Européia e o incipiente desenvolvimento da comunidade do Mercosul. No campo dos direitos humanos e nele tratando do tema dos refugiados e refugiadas, a identificação das causas dos movimentos irregulares de pessoas que originam os fluxos massivos em busca de proteção internacional é de importância fundamental para a prevenção destas situações. Neste sentido, durante a 2ª Conferência Mundial de Direitos Humanos em Viena em 1993, em sua intervenção, a Alta Comissariada das Nações Unidas para os Refugiados, Sra. Sadako Ogata, destacou a prevenção de situações futuras geradoras de refugiados e refugiadas e instou à Conferência a reafirmar o direito dos refugiados e das refugiadas a buscar asilo e a disfrutá-lo, o princípio da não-devolução e o direito de retornar ao lar com segurança e dignidade. Direitos esses que requerem a garantia do respeito aos direitos humanos e um enfoque integral dos mesmos, recobrando assim, certamente, a cidadania dessas pessoas. Os princípios de direitos humanos permanecem de importância vital para o trabajo do ACNUR em favor dos refugiados e das refugiadas como elemento base da admissão e proteção eficaz dessas pessoas no país de asilo. A melhoria na situação de direitos humanos no país de origem é a melhor maneira de prevenir as condições que, de outro modo, poderiam forçar às pessoas a tornaram-se refugia- 25
  • 36. dos e refugiadas. Cada um deses aspectos do problema dos refugiados e das refugiadas pode ser visto desde uma perspectiva diferente de direitos humanos, entretanto, encontrar uma resposta que possa resolvê-los satisfatoriamente, devolvendo a essas pessoas uma perspectiva cidadã, somente através da visão integral e indivisível dos direitos humanos. No marco destas apreciações gerais dos desafíos da temática de refugiados e refugiadas a nivel internacional encontramos a região do Cone Sul em uma etapa de relativa estabilidade institucional, de estabelecimento dos primeros fundamentos normativos na matéria e com perspectivas muito estimulantes como região de acolhida de pessoas necessitadas de proteção. Com este primeiro passo dado por Brasil com a Lei 9.474 e com a exitosa experiência de parceria tripartita (Governo, Sociedade Civil e ACNUR) alcançada, traça-se um rumo a seguir no qual os demais países da região terão a possibilidade de espelhar-se com o intuito de obterem beneficios mútuos. Todos os países da nossa região são signatários da Convenção de 1951 e de seu Protocolo de 1967, tendo adotado em maior ou menor grau medidas para o efetivo cumprimento de suas disposições. O desafío agora será de aproveitar os instrumentos regionais já existentes, para lograr esta harmonização legislativa tão sonhada. Os problemas criados pela mobilidade geográfica devem ser enfrentados, de acordo às realidades dos países que conformam a região, com normas comunitárias e políticas regionais comuns. Harmonização supõe a adoção de diretrizes comuns em determinados aspectos básicos, mas sempre procurando manter as peculiaridades de cada legislação nacional e a análise concreta e individual de cada uma das solicitações de refúgio em estudo. Assim, com a firma do Tratado de Assunção em 1991 e, posteriormente, do Protocolo de Ouro Preto em 1994, os países que integram o Mercosul dão os primeiros passos para atender as novas necessidades geradas no processo de integração em marcha; principalmente com a criação da Comissão Parlamentar Conjunta como órgão cujo objetivo é facilitar o caminho às metas propostas por meio de sua 26
  • 37. função consultiva, deliberativa e de formulação de propostas. Esta Comissão, cuja presidência corresponde semestralmente a cada um dos países fundadores do Mercosul, tem entre suas funções as de realizar os estudos necessários tendentes a harmonizar as legislações dos Estados Parte, propor normas de direito comunitário referidas ao processo de integração e fazer com que as conclusões cheguem aos Parlamentos Nacionais. O Mercosul deve, então, ser a primera via de contato a explorar este caminho que se iniciou há 50 anos na visão daquelas pessoas que pensavam que a construção de um futuro melhor depende do esforço de todos. São essas as premissas que norteam o trabalho do Escritório Regional do ACNUR para o Sul da América Latina em prol da efetivação de uma cidadania digna na região, em primeiro lugar, e depois que esse esforço possa servir como um bom exemplo e influenciar as demais regiões do planeta, colaborando assim com a construção de uma cidadania mundial. 27
  • 38. 28
  • 39. 3.8;:5!IJ7,!5:! 5:!=4< 3.8;:5!IJ7,!5:!=4< /7<,/.:;.57<,U21!07< Antônio Augusto Cançado Trindade Presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos A concepção de cidadania mundial, como base da paz, pode, efetivamente, ser considerada de ângulos distintos. Proponho-me, em breves palavras, abordá-la a partir do prisma de minha área de reflexão e atuação, a do Direito Internacional dos Direitos Humanos. Preliminarmente, devo deixar consignada minha convicção na existência de uma consciência jurídica universal, assim como na inviabilidade da paz sem justiça social, pressupondo esta última a plena vigência da totalidade dos direitos humanos (civis, políticos, econômicos, sociais e culturais). Todos os direitos para todos, é o único caminho seguro a seguir. Paz, justiça social e direitos humanos são, em suma, indivisíveis. E o Direito Internacional, tal como o tenho sempre concebido, constitui um instrumental jurídico já não só de regulação, mas sobretudo de libertação1. A concepção de cidadania mundial, como base da paz, marca presença nas próprias origens do Direito Internacional (como hoje o conhecemos). O ideal da civitas maxima gentium foi propugnado e cultivado nos escritos dos chamados fundadores do Direito Internacional, - quase esquecidos em nossos dias. É signi- 29
  • 40. ficativa a contribuição dos teólogos espanhóis Francisco de Vitoria e Francisco Suárez nesse sentido. Vitoria deu uma contribuição pioneira e decisiva para a noção da prevalência do Estado de Direito: foi ele quem sustentou, com rara lucidez, em suas célebres Relecciones Teológicas (1538-1539), sobretudo a De Indis - Relectio Prior, que o ordenamento jurídico obriga a todos (governados e governantes), e a comunidade internacional (totus orbis) prima sobre o arbítrio de cada Estado individual. Para o grande mestre de Salamanca, o direito das gentes regula uma comunidade internacional constituída de seres humanos organizados socialmente em Estados e coextensiva com a própria humanidade. Decorridos mais de quatro séculos e meio, a mensagem de Francisco de Vitoria, - de incidência direta na concepção de cidadania mundial, - retém uma notável atualidade. Para Suárez (autor do tratado De Legibus ac Deo Legislatore, 1612), o direito das gentes revela a unidade e universalidade do gênero humano, sendo os Estados membros da sociedade universal. Na concepção do jus gentium de Hugo Grotius (autor da célebre obra De Jure Belli ac Pacis, 1625), o Estado não é um fim em si mesmo, mas um meio para assegurar o ordenamento social e aperfeiçoar a sociedade comum que abarca toda a humanidade. Ainda antes de Grotius, Alberico Gentili (autor de De Jure Belli, 1598) sustentava que é o Direito que regula a convivência entre os membros da societas gentium universal. Samuel Pufendorf (autor de De Jure Naturae et Gentium, 1672), a seu turno, sustentou a sujeição do legislador à “lei da razão”. Por sua vez, Christian Wolff (autor de Jus Gentium Methodo Scientifica Pertractatum, 1749), ponderava que assim como os indivíduos devem promover o bem comum, a seu turno o Estado tem o dever correlativo de buscar sua perfeição. Lamentavelmente, estas reflexões visionárias, que concebiam o Direito Internacional nascente como um sistema verdadeiramente universal, vieram a ser suplantadas pela emergência do positivismo jurídico, que personificou o Estado dotando-o de 30
  • 41. “vontade própria”, reduzindo os direitos dos seres humanos aos que o Estado a estes “concedia”. O consentimento ou a vontade dos Estados (o positivismo voluntarista) tornou-se o critério predominante no Direito Internacional, que se mostrou incapaz de impedir sucessivas atrocidades perpetradas contra os seres humanos, destinatários últimos de toda norma jurídica. A personificação do Estado todo-poderoso, inspirada na filosofia do direito de Hegel, teve uma influência nefasta na evolução do Direito Internacional (reduzido a um direito inter-estatal) em fins do século XIX e nas primeiras décadas do século XX. Esta corrente doutrinária resistiu com todas as forças ao ideal de emancipação do ser humano da tutela absoluta do Estado, e ao reconhecimento do indivíduo como sujeito do Direito Internacional. No passado, os positivistas se gabavam da importância por eles próprios atribuída ao método da observação (negligenciado por outras correntes de pensamento), o que contrasta, porém, com sua total incapacidade de apresentar diretrizes, linhas mestras de análise, e sobretudo princípios gerais orientadores. No plano normativo, o positivismo se mostrou subserviente à ordem legal estabelecida, e convalidou os abusos praticados contra os seres humanos em nome de tal ordem. Mas já em meados do século XX, a doutrina jusinternacionalista mais esclarecida se distanciava definitivamente da formulação hegeliana e neo-hegeliana do Estado como suposto repositório final da liberdade e responsabilidade dos indivíduos que o compunham. O desencadeamento do movimento universal em prol dos direitos humanos, nas cinco últimas décadas, contribuiu decisivamente para o resgate histórico do ser humano como sujeito do Direito Internacional, - evolução esta que considero o legado mais precioso do desenvolvimento da ciência jurídica no século XX. Poder-se-ia argumentar que o mundo contemporâneo é inteiramente distinto do da época dos chamados fundadores do direito internacional (supra), que propugnaram por uma civitas maxima regida pelo direito das gentes. Mas ainda que se trate de 31
  • 42. dois cenários mundiais diferentes (ninguém o negaria), a aspiração humana é a mesma, qual seja, a da construção de um ordenamento internacional aplicável tanto aos Estados (e organizações internacionais) quanto aos seres humanos (o direito das gentes), consoante certos padrões universais de justiça, sem a observância dos quais não pode haver paz. Neste sentido, visualizo em nossos dias, neste limiar do século XXI, um grande esforço, por parte da doutrina jurídica mais lúcida, de retorno às origens, no que diz respeito à disciplina que me concerne, a do Direito Internacional. O atual processo histórico de humanização do Direito Internacional, ao qual tenho buscado contribuir ao longo dos anos em minha atuação profissional, manifesta-se, a meu ver, em capítulos os mais diversos da disciplina. No capítulo de suas fontes, por exemplo, destaca-se o papel da opinio juris2, graças à atuação libertária, nos foros internacionais, dos países mais fracos e oprimidos. Recorde-se, a propósito, que a codificação do capítulo da sucessão de Estados (a respeito de tratados, e de matérias outras que tratados)3 só foi possível após o exercício efetivo do direito de autodeterminação dos povos, por estes últimos4. E o capítulo do reconhecimento, - outrora de Estados e governos, - com o tempo expandiu-se, abarcando também a beligerância, ilustrada, a partir de meados do século XX, também pela emergência dos movimentos de libertação nacional. No capítulo dos sujeitos do Direito Internacional, a par dos Estados e organizações internacionais, figuram hoje também os indivíduos, a pessoa humana. Ora, se o Direito Internacional contemporâneo reconhece direitos aos indivíduos e grupos de particulares, - como o ilustram os múltiplos instrumentos internacionais de direitos humanos de nossos dias, - não há como negarlhes personalidade jurídica internacional, sem a qual não poderia dar-se aquele reconhecimento. O próprio Direito Internacional, ao proclamar direitos inerentes a todo ser humano, - por definição anteriores e superiores ao Estado, - desautoriza o arcaico dogma positivista que pretendia autoritariamente reduzir 32
  • 43. tais direitos aos “concedidos” pelo Estado. O reconhecimento dos indivíduos como sujeitos tanto do direito interno como do Direito Internacional representa uma verdadeira revolução jurídica, à qual temos o dever de contribuir. Permito-me aqui evocar a inspirada reflexão de um dos maiores escritores do século XX, para quem “na nossa provação diária, a revolta desempenha o mesmo papel que o cogito na ordem do pensamento: ela é a primeira evidência. Mas essa evidência tira o indivíduo de sua solidão. Ela é um território comum que fundamenta o primeiro valor dos homens”5. Trata-se, em última análise, de capacitar cada ser humano para enfrentar por si mesmo a opressão e as injustiças da ordem estabelecida e construir assim um mundo melhor para seus descendentes, as gerações futuras. Esta revolução jurídica vem enfim dar um conteúdo ético às normas tanto do direito público interno como do Direito Internacional. O próximo passo reside na consolidação da capacidade jurídica internacional dos indivíduos, para mover, por conta própria, uma ação internacional por violação de seus direitos até mesmo contra seu próprio Estado, diretamente ante os tribunais internacionais (Cortes Européia e Interamericana) de direitos humanos. O que já é uma realidade sob a Convenção Européia de Direitos Humanos (recentemente emendada pelo Protocolo n. 11), ainda é um ideal a ser alcançado em relação à Convenção Americana sobre Direitos Humanos, pelo qual há tantos anos venho lutando. No que diz respeito ao capítulo da responsabilidade internacional, a par da dos Estados e organizações internacionais afirma-se hoje também a dos indivíduos. Exemplificam-no a criação dos dois Tribunais Internacionais ad hoc das Nações Unidas, para a ex-Iugoslávia e para Ruanda (em 1993 e 1994, respectivamente), assim como a adoção em 1998 do Estatuto do Tribunal Penal Internacional. A subjetividade internacional dos indivíduos passa, assim, a vincular-se inelutavelmente à temática da responsabilidade internacional (outrora limitada à dos Estados). Em relação ao capítulo das imunidades dos agentes dos Es- 33
  • 44. tados, a consagração do princípio da jurisdição universal em alguns instrumentos internacionais, como, e.g., a Convenção das Nações Unidas contra a Tortura (1984), acarreta profundas implicações. Tal como demonstrado por eventos recentes, mesmo na atual pendência da entrada em vigor do mencionado Estatuto do Tribunal Penal Internacional, torna-se virtualmente impossível a qualquer agente estatal tentar hoje se prevalecer de imunidade, quando responsável pela prática de tortura como política de Estado. No tocante à regulamentação dos espaços, a antiga liberdade dos mares, por exemplo, cede terreno ao conceito de patrimônio comum da humanidade (os fundos oceânicos), consagrado na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (1982). O mesmo conceito passa, a partir dos anos sessenta, a ter aplicação também no âmbito do capítulo do direito do espaço exterior. E o direito ambiental internacional contemporâneo passa a cunhar uma nova expressão, a do interesse comum da humanidade (common concern of mankind), de que dão testemunho os preâmbulos das Convenções sobre o Clima, e sobre a Biodiversidade (1992)6. E os exemplos se multiplicam, refletindo, efetivamente, em distintos capítulos do domínio específico do Direito Internacional contemporâneo, o ideal da civitas maxima gentium, ou seja, a cidadania mundial, como base da paz, vinculada esta - como em uma tríade indissociável - à justiça social e à observância dos direitos humanos. Os avanços até hoje logrados, como exemplificado pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos7, se devem, em grande parte, à mobilização da sociedade civil contra todas as manifestações do poder arbitrário, nos planos tanto nacional como internacional. O movimento universal em prol dos direitos humanos é irreversível, não admite retrocessos. Tem sua mística própria. Resta, no entanto, um longo caminho a percorrer. Há que equipar os mecanismos internacionais de proteção para enfrentar novas formas de violação dos direitos humanos e combater a impunidade. Há que lograr em definitivo a justiciabilidade dos direitos econômicos, sociais e culturais, negligenciados até o pre- 34
  • 45. sente. Há que fomentar a aceitação integral (sem reservas), pelos Estados, dos tratados de direitos humanos, e assegurar a aplicabilidade direta de suas normas no plano do direito interno dos Estados. Há que consolidar o acesso direto dos indivíduos à justiça no plano internacional, tese pela qual venho me batendo há tanto tempo. Há que desenvolver as obrigações erga omnes de proteção do ser humano, tomando seus direitos fundamentais como parte integrante do jus cogens. E há que disseminar o papel da sociedade civil na construção de uma cultura universal de observância dos direitos humanos8. Ao concluir, permito-me referir-me a um derradeiro aspecto da questão aqui abordada, a da concepção de cidadania mundial como base da paz, sob a ótica do Direito Internacional. O grande ciclo das Conferências Mundiais das Nações Unidas da última década do século XX (Meio Ambiente e Desenvolvimento, Rio de Janeiro, 1992; Direitos Humanos, Viena, 1993; População e Desenvolvimento, Cairo, 1994; Desenvolvimento Social, Copenhagen, 1995; Direitos da Mulher, Beijing, 1995; Assentamentos Humanos - Habitat-II, Istambul, 1996) despertou a consciência jurídica universal para a necessidade de reconceituar as próprias bases do ordenamento internacional. Revelou, como denominador comum, a atenção especial dispensada às condições de vida da população (particularmente dos grupos vulneráveis, em necessidade especial de proteção). Daí resultaram o reconhecimento universal da necessidade de situar os seres humanos de modo definitivo no centro de todo processo de desenvolvimento9, assim como o reconhecimento da legitimidade da preocupação de toda a comunidade internacional com a situação real de todos os seres humanos em toda parte. O referido ciclo de Conferências Mundiais do final do século XX alertou, em suma, para a premente necessidade do atendimento às necessidades básicas e aspirações da população mundial. O diálogo e concerto, em escala verdadeiramente universal, por tais Conferências ensejados, terminaram por conformar a 35
  • 46. agenda internacional do século XXI em torno do tratamento equânime das questões que afetam a humanidade como um todo. O atual reconhecimento da centralidade, nesta agenda do novo século, das condições de vida de todos os seres humanos, em todos os recantos do mundo, corresponde a um novo ethos de nossos tempos, e é, em meu entender, da própria essência da concepção de cidadania mundial como base da paz. Tal concepção, por sua vez, corresponde, em nossos dias, à busca continuada da realização do ideal da civitas maxima gentium, visualizado e cultivado pelos fundadores do Direito Internacional. 36
  • 47. :;V3;WX;<,<78:; -./!/ !/!0.! -./!/!0.! Benedita da Silva Vice-Governadora do Estado do Rio de Janeiro A 10 de dezembro de 1948 a Assembléia Geral das Nações Unidas reuniu-se para aprovar a Declaração Universal dos Direitos Humanos, marco decisivo na conquista da cidadania por todos os povos, com o estabelecimento da liberdade, da justiça e da eqüidade para garantir a paz mundial. A Declaração Universal salienta o direito à vida e à liberdade; condena a escravidão, a tortura, a perseguição política; garante o direito de propriedade, o direito de reunião e associação, o direito ao trabalho e à educação, entre outros. Foi, inegavelmente, uma grande conquista para os povos que, oprimidos pelas barbaridades da guerra, procuravam soluções pacíficas para os seus problemas. A sua importância foi tão grande que, hoje, o seu conteúdo é reconhecido como direito costumeiro de todos os povos. Ela passou a ser uma norma comum de aplicação no que se refere à dignidade inerente e aos direitos inalienáveis da pessoa humana. Apesar do sucesso em alguns pontos, ainda não vivemos no mundo prometido pela Declaração Universal. Um mundo de igualdades, sem as violações dos direitos humanos, sem as atrocida- 37
  • 48. des cometidas pelos governos e, até mesmo, sem os genocídios, como os praticados em Ruanda e no Zaire. Acreditamos que os compromissos da Declaração Universal sejam sempre mais fortalecidos pela comunidade internacional, mostrando o que tem sido feito e procurando trabalhar em cima do que ainda há por fazer. Mais do que nunca, nesta época de globalização, é premente garantir a realização e a universalidade dos direitos humanos para todas as pessoas, especialmente, para as mulheres. É preciso que as promessas feitas na Declaração Universal saiam do papel e passem a existir no mundo real. A reafirmação dos propósitos de então, mais adaptados ao mundo moderno, poderá ser a forma mais pragmática de se alcançar tal finalidade. Muitos governos, por motivos políticos, desrespeitam os direitos dos cidadãos e mantêm privilégios para uma minoria. Mais de um bilhão e meio de pessoas lutam para sobreviver à fome e à miséria. São complexas as relações de gênero, discutidas em âmbito nacional e internacional. Há inúmeras pessoas, mulheres e crianças em particular, numa situação vulnerável, sujeitas à tensão e às privações. Em alguns países, a violência física, psicológica e sexual contra a mulher virou praticamente rotina. E em outros junta-se a mesma violência à etnia. A Anistia Internacional verificou que as principais vítimas são as de origem humilde ou habitantes de comunidades indígenas. E a impunidade continua. Dificilmente é identificado ou preso o autor ou autores de tais atrocidades. Mais mulheres do que homens vivem em pobreza absoluta e o desequilíbrio continua crescendo com graves conseqüências para a mulher e seus filhos. Podemos falar em feminização da pobreza, pois a mulher acaba sendo, em última instância, a reprodutora da miséria. Devemos lembrar que a miséria aumenta a violência de gênero, em que as mulheres são sempre as maiores vítimas. Apesar de todos os avanços do mundo moderno, a diferença entre homem e mulher ainda é uma realidade, num contexto de exclusão social e de subordinação das mulheres. Na perspectiva de 38
  • 49. gênero para o desenvolvimento, a mulher precisa lutar pela cidadania, integrar-se no espaço político, a fim de que possa, definitivamente, eliminar as desigualdades geradas pelo processo patriarcal e racista. A perspectiva de gênero procura alcançar a igualdade entre homens e mulheres e aumentar a participação da mulher na vida política, civil, econômica, social e cultural. Procura, também, estabelecer a eqüidade entre as mulheres das zonas rurais e urbanas. Tenta acabar com todas as discriminações que ainda pairam sobre o sexo feminino, evitando formulação de reservas e luta para aumentar o poder decisório da mulher. Quanto à perspectiva da etnia, é preciso garantir que grupos desfavorecidos e vulneráveis sejam incluídos no desenvolvimento social; que todos, independentemente de raça, sejam participantes ativos das sociedades às quais pertençam. A paz, a justiça e o desenvolvimento social devem contribuir para que as diferenças de etnia e gênero terminem para que todos possam participar em igualdade de direitos da vida social e política de seus países. É imperioso enfrentar o problema para aprimoramento da humanidade. As políticas públicas modernas sob a ótica do gênero e da etnia devem visar à melhoria das condições de vida de todos, bem como da mulheres e das minorias raciais. O artigo 2 da Declaração Universal reza: “Todo o homem tem capacidade de gozar os direitos e liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento ou qualquer outra condição”. Esperamos que nesta passagem para um novo milênio os países membros da ONU sejam mais incisivos e procurem adotar medidas objetivas para acabar com as injustiças que ainda assolam a humanidade. No Brasil, em particular, infelizmente, a realidade é a mesma. Quem nunca ouviu falar que o Brasil é a maior democracia racial do mundo? Essa expressão serviu para as nossas elites 39
  • 50. dominantes justificarem a existência de uma perfeita igualdade entre as etnias e que não existe preconceito ou discriminação étnica entra nós. No entanto, as experiências cotidianas mostram exatamente o contrário: é evidente a desigualdade social e racial em nosso país. O desafio de ser negro, especialmente mulher, no Brasil neste final de milênio é muito estimulante. É aceitar ser emblema da capacidade de vencer barreiras; é saber transformar em grandes vitória os pequenos ganhos cotidianos na luta pela sobrevivência; é saber usar o conhecimento que lhe foi passado pelos antepassados; é saber chorar as perdas sem transformá-las em derrotas e enfrentar com tranqüilidade as agressões, as injustiças e as provocações. Ser mulher, negra e moradora de favela sempre me impulsionou a galgar novos degraus, a estabelecer novas metas. Mãe, profissional competente, adepta da educação continuada, militante política são elementos de um projeto de vida que venho construindo. O ideal de liberdade é um legado que herdei de meus ancestrais e que tenho dividido com companheiros e companheiras que estão na luta por toda diáspora negra. Minha trajetória é a da mulher e do homem negros, que rejeitam um destino prétraçado que lhes reserva um futuro de subalternidade, e redirecionam. Tenho muito orgulho de ter aceito este desafio. E quero dizer que as dificuldades que se apresentam no meu caminho, me ajudam a construir a certeza de que é necessário avançar sempre. Tenho a certeza de que cada superação de obstáculos estabelece novas metas a serem alcançadas e que é possível tornar realidade a utopia de que as desigualdades serão vencidas. Este é o sonho da nação e do mundo inteiro. O caminho está aberto: não é fácil, não é curto, mas é possível. Esta certeza é que torna possível o surgimento da esperança de novos dias nas relações entre os povos. Uma das tarefas mais importantes para os negros que, como Zumbi dos Palmares, descumpriram o roteiro do papel que lhes destinou a sociedade, 40
  • 51. saíram do tom e reescreveram o seu texto, bem como todas as minorias discriminadas, é mostrar para os outros que viver é tomar o futuro nas mãos, é tornar-se sujeito da história, afirmar e provar que é possível ser igual, afirmando as diferenças. Resgatando e estabelecendo a cidadania em seu aspecto maior. Eu quero contribuir sempre e cada vez mais para que todas as iniciativas em prol da valorização humana sejam concretizadas. E que este trabalho seja um grande impulso na escalada pelos Direitos Humanos, pela Cidadania Mundial, real e concreta e com valorização da vida, melhor distribuição de renda e chances de acessos para todos. 41
  • 52. 42
  • 53. 6;.<!,/!,:7-.0U! 6;.<!,/!,:7-.0U! Celina Vargas do Amaral Socióloga e Diretora do Sebrae-RJ A tragédia do Jardim Botânico chamou atenção para negligência da sociedade e do poder público em relação a violência urbana. Revela, acima de tudo, o quanto temos sido incompetentes em vencer o desafio da inclusão social. Como diretora de uma instituição como o Sebrae/RJ, tenho lidado cotidianamente com este desafio. A entidade está começando a desenvolver programas de maior amplitude com o objetivo de oferecer melhores perspectivas de inserção social, sobretudo aos mais jovens. Por coincidência, a jovem morta na última segunda-feira, Geisa Firmo Gonçalves, estava participando, como instrutora de artesanato, de um programa do Sebrae, o Poder Comunitário. Ela já vinha trabalhando na Rocinha como professora do Projeto Curumim, Idealizado pela FIA e pela PUC-Rio, com o objetivo de complementar o ensino escolar para crianças e adolescentes por meio de atividades recreativas e geradoras de trabalho e renda. Ou seja, Geisa trabalhava para que jovens de uma comunidade carente se vissem providos de oportunidades reais de inserção social. Por uma dessas estranhas trapaças do destino, foi morta justamente por outro jovem, com identidade desconhecida e sobrevivente da chacina da Candelária, que não teve diante de si, provavelmente, a oportunidade de fazer parte de um progra- 43
  • 54. ma de recuperação e de capacitação profissional. De certo modo, é como se essa característica da biografia de Geisa nos direcionasse para algo que está a nosso alcance realizar para evitar novos episódios como o de segunda-feira e impedir a morte de novas Geisas. Uma instituição como o Sebrae é também portadora dessa missão social. Foi-se o tempo em poderíamos esperamos que o Estado se incumbisse integralmente de promover o bem-estar social. Instituições como Sebrae, Firjan, CNI, CNC,CNA, e demais entidades de representação empresarial, que compõem o chamado Sistema “S”, têm a obrigação e o dever de colaborar para a transformação social que todos esperamos. Para dar início a uma estratégia de redução de violência em nossa cidade, em nosso estado e em nosso país, precisamos associar a participação do setor público e de todas as formas de representação da sociedade em torno de um projeto democrático e solidário para a redução da miséria – uma governança não com propostas meramente assistencialistas, mas capacitadoras e gerenciadoras de trabalho e renda. Desejamos viver em uma sociedade forte e articulada, conviver com instituições representativas, comprometidas e engajadas na missão de transformar uma realidade socialmente injusta e cruel. Isso vale para todos – para os pequenos e microempresários, a comunidade acadêmica, os profissionais liberais, os grandes empresários, as ONGs, os partidos políticos e demais entidades representativas. Como já foi dito, Geisa vinha participando das oficinas de artesanato da Rocinha. Ela utilizava jornais usados para confeccionar canudinhos, com os quais ensinava a fazer cestas que eram pintadas ou envernizadas para comercialização. Em uma de minhas visitas à comunidade, tive o privilégio de receber uma cestinha de presente de uma das instrutoras que trabalhavam no projeto. Não sei se a recebi das mãos de Geisa. Não importa. Guardo esta cesta na certeza de que ela me lembrará sempre dessa tragédia. E de que simboliza, também, uma atividade transformadora que deveria ser multiplicada em nosso país. 44
  • 55. 97:,21!,-2352:!,/;,9!K 97:,21!,-2352:!,/;,9 52:!,/;,9!K Daniel John Vaillancourt Diretor Executivo da Escola das Nações (Brasília – Brasil), uma escola internacional bilíngue, com 500 alunos representado 38 nacionalidades, voltada à educação dos cidadãos do mundo. Ao nos aproximarmos do século XXI, torna-se cada vez mais claro que estamos entrando em um mundo nunca antes imaginado pelos nossos antepassados. A civilização avança, às vezes de forma impiedosa e, novas descobertas no campo da ciência, tecnologia e medicina estão permitindo, na maior parte do mundo, que pessoas tenham longevidade maior e uma vida mais saudável. Apesar das atrocidades cometidas entre grupos isolados e países lutando por estabelecer sua identidade, cada vez mais temos a indicação de que o nosso planeta está tornando-se menor, de que nações estão tão interdependentes que é impossível ignorar o fato de que precisamos uns dos outros para sobreviver. Tanto no contexto econômico, político, tecnológico, ambiental, na comunicação ou na saúde, estamos vivenciando uma grande colaboração entre facções anteriormente antagônicas. Diariamente, simpósios e conferências internacionais, acordos econômicos, empreendimentos globais e projetos multinacionais estão empenhados em encontrar soluções para dificuldades, facilitando assim a comunicação e a interação entre os povos, promovendo desenvolvimento em áreas onde problemas tornaram-se 45
  • 56. complexos demais para serem resolvidos apenas por uma única organização ou nação. Estamos aprendendo, penosamente, que competição tem suas limitações. Mas o que está acontecendo no campo da educação? Como estamos preparando nossas crianças para enfrentar as exigências da nova ordem mundial emergente? Qual o papel que as escolas desempenham para formar cidadãos mundiais os quais serão capazes de tirar suas próprias contribuições para a construção de uma sociedade pacificadora? Primeiramente, devemos examinar a questão “O que significa ser cidadão do mundo?” Como educador, creio que cidadão do mundo é uma pessoa que tem facilidade de interagir com outras pessoas, independente de sua raça, cor, nacionalidade, crença religiosa ou status social. Um cidadão do mundo acredita que todos foram criados do mesmo pó e que ninguém é superior a ninguém e, por conseguinte, deve ser respeitado. Significa ser alguém sensitivo e receptivo aos desafortunados, que abomina injustiça e exploração, defende o fraco e tem senso de responsabilidade pelo planeta e por aqueles que o habitam, e opta por ações em vez de palavras para se definir. Um cidadão do mundo compreende e promove o conceito de unidade na diversidade, celebrando diferenças ao invés de temer ou de vir a ser repelido por elas. Nossas escolas precisam de mudanças. Não podemos simplesmente ser fábricas automáticas distribuidoras de informações e, ao longo dos 12 anos de escolaridade da educação de base, produzir uma sombra seriada e pré-moldada de jovens, que entraram em nossas instituições inocentes e ingênuos, depositando sua confiança incondicional neste processo. Como educadores, temos a oportunidade e a obrigação de auxiliar nossas crianças a se tornarem amantes da humanidade e solucionadoras de problemas porque vêem com seus próprios olhos, ouvem com seus próprios ouvidos, e trabalham com suas próprias mãos. Nossas escolas deverão ser um local transformador onde as crianças deverão ser encorajadas a enxergar o que há de melhor 46
  • 57. em si e nos outros, serem valorizadas não pelo que têm, mas primeiramente pelo que são e, depois, pelo que fazem. Será que não é chegada a hora de desenvolver e implementar um currículo universal, base para todas as escolas em todas as partes do mundo? Penso que sim. Acredito que existem temas comuns, concepções, informações e habilidades que toda a criança precisa aprender. Por exemplo, existe maneira melhor de aprender a reconhecer as diferenças e celebrar igualdades do que incluir no programa de estudos sociais uma perspectiva na história mundial, na qual estaremos olhando a história não como seqüências de várias guerras e conquistas, mas como um desdobramento da civilização, em que cada cultura e nação têm sua parcela de contribuição no progresso da humanidade? Que nossas crianças entendam que as numerosas guerras que mancharam nosso passado foram nossos erros, que cada crise foi seguida de uma vitória e que essas vitórias têm constantemente nos impulsionado adiante. Comunicação é, sem dúvida, um dos grandes talentos que distingue o homem de outros animais. Precisamos dar ênfase em nossas escolas na expressão pessoal, tanto através da língua bem como das artes. Nossos alunos precisam de oportunidades para adquirir habilidades na escrita, na oratória, nas artes cênicas e nas plásticas e na música para que descubram suas vozes e possam expressar seus próprios pensamentos e sentimentos. Eles precisam experimentar o mundo em sua volta e responder de sua própria maneira. E, para aumentar o significado na comunicação verbal, nossos alunos têm que aprender a usar outras linguagens com nível de fluência, a fim de que possam compreender e serem compreendidos pelos outros com sucesso. Quanto mais cedo começar, melhor. Por que não dar a mesma importância ao nosso currículo mundial para a formação do caráter, que é dada ao currículo acadêmico formal? Nossos alunos precisam saber que valores, virtudes, moral e ética são importantes para o seu desenvolvimento como seres humanos. Precisamos dar-lhes a oportunida- 47
  • 58. de para adquirir e exercer qualidades positivas e receber um feedback honesto sobre seu crescimento pessoal. O atual interesse de estudos em educação está centrado na “Inteligência emocional”, demonstrando que a sociedade finalmente está chegando a uma conscientização de que não somos somente mente e corpo, mas que também possuímos sentimentos e emoções que são fatores determinantes para termos ou não sucesso na vida. E a “inteligência espiritual”? Seremos os primeiros a despertar o mundo para o fato de que possuímos uma alma, e que a mesma precisa ser nutrida? Não deveríamos ensinar o valor da oração, da meditação e da reflexão? É chegada a hora de nos certificarmos de que nossas crianças entendam que todas as religiões majoritárias do mundo como o Judaísmo, Budismo, Hinduísmo, Zoroastrismo, Cristianismo, Islamismo e a Fé Bahá’í são todas parte de uma única revelação progressiva vinda de Deus, baseadas numa mesma verdade fundamental: chamado “amor ao próximo”? Que nossas crianças aprendam a resolver problemas de forma cooperativa, para que assim, possam desfrutar dos benefícios gerados pela resolução pacífica de seus conflitos. Ao trabalhar com vários projetos de matemática, ciência e estudos sociais, eles compreenderão que a mesma habilidade usada em uma atividade dentro de sala poderá ser aplicada no mundo que os cercam. Ao contextualizar o que seria ajudar os menos afortunados na comunidade, eles terão a sensação que de, quando adultos, poderão fazer o mesmo. Uma grave característica na presente sociedade é a grande disparidade que existe entre rico e pobre. Nossas crianças não podem ser afastadas dessa realidade nem ser insensíveis a essa existência. Elas têm que ser auxiliadas para compreender que aqueles mais afortunados devem saber dividir com os que não têm. Devemos, por meio de um minucioso programa coordenado, propiciar condições para que nossas crianças aprendam sobre o sofrimento alheio e a respondê-lo com atos humanitários e 48
  • 59. de compaixão. Projetos de serviços comunitários devem fazer parte integrante do nosso currículo. Nosso currículo de cidadania mundial deve proporcionar aos nossos alunos uma leitura onde direitos humanos são dádivas divinas e que nada justifica a exploração, a dominação ou abuso de um indivíduo sobre o outro. Quando o aluno examina as causas e os efeitos destrutivos de doenças sociais tais como racismo, sexismo, fanatismo religioso, nacionalismo desenfreado e multiplicidades de “ismos” que suja nosso pano social, talvez ele descubra novos remédios. Talvez compreender com profundidade que ser humano significa ser consciente. O mundo carece de adultos conscientes. Nossos futuros cidadãos mundiais são, hoje, os freqüentadores de nossas escolas primárias e secundárias. Devemos dar a eles a visão, a esperança, a capacidade e a coragem necessárias para que criem uma cultura de paz neste Planeta que chamamos, nosso lar. 49
  • 60. 50
  • 61. -./!/ !/!0.!,T -./!/!0.!,T -70<5:2.:,,!,,9!K,,72 -70<5:2.:,,!,,9!K,,72 !-;.5!:,,!,,=.73Y0-.!,Z !-;.5!:,,!,,=.73Y0-.!,Z Feizi M. Milani Médico hebeatra, doutorando do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia e diretor-presidente do INPAZ (Instituto Nacional de Educação para a Paz e os Direitos Humanos) Nesta virada de milênio, o clamor pela paz chegou às ruas. Não por acaso, 2000 é o Ano Internacional da Cultura de Paz. Freqüentemente temos testemunhado manifestações em prol desta causa, pessoas desconhecidas e famosas, lado a lado, bradando contra a violência. Angustiadas com o clima de medo que impera nos centros urbanos do Brasil, elas se questionam o pôr que dessa situação e aonde vai nos levar. A paz deixou de ser um ideal abstrato nutrido por um punhado de sonhadores e poetas; tornou-se uma necessidade concreta para a maioria da população e meta prioritária para os governantes. Esse quadro de mobilização social difere bastante da situação que vivenciei quinze anos atrás. Recordo-me que às vésperas do Ano Internacional da Paz (1986), era divulgado, em todos países, o documento A Promessa da Paz Mundial.10 Tenho a impressão de que, naquela época, a maioria das pessoas não foi 51
  • 62. capaz de perceber a importância e urgência do que a obra propunha. A questão da paz parecia ser algo tão distante da realidade brasileira. Participei de vários eventos nos quais seu rico teor foi debatido – em universidades, seminários, audiências com autoridades e líderes do pensamento, palestras públicas, exibições artísticas – e presenciei comentários do tipo “O Brasil é um país pacífico, nunca se envolveu em guerras”, “Mesmo que haja uma guerra nuclear, estamos a salvo”, “Temos tantos problemas sociais pra resolver... para que essa preocupação toda com a paz?”, “Eu já faço a minha parte: medito diariamente”, dentre outros. O tempo demonstrou que, tal qual todos os povos, nós, brasileiros, precisamos aprender a construir a paz, uma vez que paz é muito mais do que a mera ausência de guerra. Demonstrou também que a nossa lentidão nesse aprendizado já custou a vida, a saúde ou o bem-estar de milhares de vítimas, uma vez que violência não se restringe a homicídios e agressões físicas. A violência pode assumir inúmeras roupagens: fome, racismo, exclusão, abusos verbais, morais ou sexuais, falta de acesso à saúde, à educação e à justiça, opressão contra a mulher e desigualdade de oportunidades, dentre outras. Imagine se tivéssemos aproveitado a oportunidade oferecida pelo Ano da Paz e os princípios delineados no referido documento... teríamos implantado programas educativos direcionados aos valores da paz em todas escolas! Assim, a geração infanto-juvenil de hoje seria a garantia e a certeza de que este país se transformará numa sociedade mais justa e solidária. No entanto, nossa escolha foi a omissão e as conseqüências disto nos horrorizam a cada dia – crianças e adolescentes assassinando e sendo assassinados, gente com medo de gente etc. Encontramo-nos agora diante de um grave dilema – tanto como coletividade quanto como indivíduos: permitiremos que as coisas continuem como estão ou assumiremos a responsabilidade que cabe a cada um de nós na concretização de profundas mudanças que garantirão a tão desejada paz? Se escolhermos dar uma chance à paz, creio que há alguns 52
  • 63. passos fundamentais que precisamos dar. É necessário que refutemos a crença de que o ser humano é inerentemente violento. Apesar de carecer de qualquer fundamento científico, trata-se de um pressuposto implícito em algumas abordagens ou posicionamentos. A Dra. Minayo sintetiza a questão afirmando que “é, hoje, praticamente unânime (...) a idéia de que a violência não faz parte da natureza humana e que a mesma não tem raízes biológicas”. 11 A Promessa da Paz demonstra que essa crença gera uma “contradição paralisante nos afazeres humanos”: por um lado, as pessoas dizem querer a paz e estar dispostas a estabelecê-la. Por outro lado, elas se permitem acreditar que “os seres humanos são incorrigivelmente egoístas e agressivos”. Como é possível “erigir um sistema social (...) progressivo e pacífico, dinâmico e harmonioso” tendo essa premissa como verdadeira? 12 A agressão e o egoísmo não são impulsos intrínsecos e incontroláveis, mas sim sinais de estágios menos maduros da evolução humana – tanto em nível individual como coletivo. Basta observar o desenvolvimento infantil: o bebê não admite partilhar seus brinquedos; a criança aceita emprestar o seu brinquedo a outra, desde que haja uma permuta; a criança maior já é capaz de participar em esportes coletivos; e o adolescente busca ativamente engajar-se em algum grupo e sente prazer na partilha. O amadurecimento se dá em direção a relações de cooperação, reciprocidade e interdependência. Um segundo passo consiste em redefinir o conceito de cidadania. Enquanto entendermos cidadania apenas como cobrar direitos e exigir que o governo resolva os problemas que afetam a sociedade, estaremos nos restringindo a uma cidadania reativa. Enquanto se propagar uma cidadania reducionista que se limita a “não jogar lixo no chão”, “não furar a fila” e “não ultrapassar o sinal vermelho”, não estaremos contribuindo para a transformação social. A conquista da paz só será possível quando exercermos uma cidadania proativa, que defino como uma postura de vida do indivíduo caracterizada pelo exercício consciente de seus 53
  • 64. direitos e deveres, pela participação ativa nos processos de busca de melhorias coletivas13, e pela responsabilidade para com tudo aquilo que afeta a sua vida e/ou as vidas de outras pessoas. Decorre desse conceito a noção de que ser um cidadão de paz é muito mais do que não ser um indivíduo violento. Fazer o bem é algo infinitamente maior do que não fazer o mal. Não praticar atos violentos é o mínimo que se espera de qualquer pessoa que pretenda viver em sociedade. Praticar a paz é viver, construir e ensinar a paz, pois ela só será alcançada se cada cidadão, família, organização e comunidade se engajar ativamente na construção de relações baseadas no respeito, na unidade, na diversidade e na empatia. Mais ainda: se vivemos num mundo globalizado, interligado instantaneamente pelas tecnologias da informação e comunicação e interdependente economicamente, é preciso que aprendamos a ser cidadãos do mundo. Bahá’u’lláh já havia proclamado essa nova visão há mais de cem anos: “A Terra é um só país e os seres humanos, seus cidadãos”.14 É impossível estabelecer a paz enquanto as pessoas estiverem classificando e dividindo o mundo entre “nós” e “eles”. Nós – (quer seja) esta família, ou moradores desta rua, ou torcedores deste time, ou seguidores desta igreja, ou membros desta raça, ou cidadãos deste país etc. – contra eles, os que são diferentes. Essa separação é completamente falsa e ilusória. Ser diferente não comporta qualquer juízo de valor, portanto, não tem nenhuma relação com ser superior ou inferior, correto ou equivocado, melhor ou pior. Além disto, não é difícil constatar que todos os seres humanos compartilham das mesmas necessidades essenciais – portanto, somos absolutamente semelhantes em nossa essência. A única possibilidade de haver paz no mundo, no país ou no bairro é reconhecermos essa unidade essencial e vivermos de acordo com ela. Pois essa compreensão nos faz aceitar o outro (por mais diferente que seja), respeitar as suas necessidades e direitos, e buscar os meios de estabelecer a verdadeira justiça. “A ordem mundial só pode ser estabelecida sobre uma consciência inaba- 54
  • 65. lável da unidade da humanidade, uma verdade espiritual que todas as ciências humanas confirmam. (...) O reconhecimento desta verdade requer o abandono (...) de tudo o que faz com que as pessoas se sintam superiores umas às outras. (...) A aceitação universal deste princípio espiritual é a essência do êxito de qualquer tentativa de se estabelecer a paz mundial.”15 Unidade gera reciprocidade, justiça e liberdade; consequentemente, gera a paz. Viver essa consciência é a base da paz. Exercer a cidadania mundial é compreender, praticar e promover a unidade do gênero humano, condição sine qua non da paz. Outro passo fundamental na caminhada rumo à paz consiste em questionar como lidar com o problema da violência. É possível agrupar, grosso modo, três paradigmas distintos que implícita ou explicitamente estão presentes nas discussões sobre esse tema – o da repressão, o estrutural e o da cultura de paz. Parece-me apropriado analisar os pressupostos e impactos de cada um desses modelos de pensamento. O modelo baseado na repressão preconiza, como solução para o problema da violência, medidas de força tais como: o aumento do policiamento, o endurecimento das leis e a construção de mais presídios. Esta perspectiva possui uma deficiência grave: falha em reconhecer as mazelas estruturais e as injustiças sócio-econômicas do país. Apesar disto, é a mais popular pois, aparentemente dá resultados rápidos e contribui para uma sensação abstrata (mas fundamental) de segurança e de que os crimes serão punidos. Sem dúvida, o Brasil necessita de reformas que permitam maior eficiência na aplicação universal das leis, que estabeleçam mecanismos de controle social sobre o poder judiciário, e que reduzam drasticamente a corrupção e impunidade. São também prementes mudanças no sistema policial, colocando-o a serviço da coletividade, capacitando-o, e expurgando o banditismo de seu seio. Apesar de necessárias, essas transformações são insuficientes para se alcançar resultados efetivos e duradouros. O segundo paradigma afirma que a causa da violência reside 55
  • 66. na estrutura social e no modelo econômico. Consequentemente, se a exclusão e as injustiças não forem sanadas, não há muito o que se fazer para evitar a violência. Apesar de bem intencionado ao propor mudanças que culminem numa sociedade mais justa, esse modelo termina por gerar, a curto prazo, sentimentos de impotência. Ao vincular a solução de um problema que afeta as pessoas de forma imediata e concreta – violência – a questões complexas e demoradas que se situam fora da possibilidade de intervenção dos indivíduos – desemprego, miséria etc. – o resultado, em geral, é o desânimo e a desistência. Ao gerar imobilismo, esse modelo contribui para o estado coletivo de medo e paranóia que é, por sua vez, um dos fatores que retroalimenta a violência. É importante evidenciar a violência estrutural, pois ela encontra-se incorporada ao cotidiano da sociedade brasileira. Busca ocultar-se sob as máscaras da naturalidade ou da inevitabilidade, mas está na raiz de outras formas de violência, mais fáceis de serem identificadas e denunciadas. Não obstante, é essencial que sejam dados passos concretos nos aspectos da realidade que estão ao nosso alcance, ao mesmo tempo em que se luta por mudanças nos sistemas econômico, político e jurídico. A batalha por transformações nos níveis macro e micro não são excludentes; ao contrário, são complementares. O terceiro é o paradigma da cultura de paz, que propõe mudanças de consciência e comportamento tanto de parte de indivíduos como de instituições, inspiradas em valores de paz. Os defensores desta perspectiva não deixam de reconhecer que as outras, acima descritas, também têm sua contribuição a oferecer. Mas enfatizam a necessidade, a urgência e a viabilidade de se reduzir os níveis de violência através de intervenções integradas e multi-estratégicas fundamentadas na Educação, na Saúde, na Ética, na participação cidadã e na melhoria da qualidade de vida. Trata-se de um modelo que valoriza a prevenção, colocando ênfase em valores universais como a paz, a diversidade, o respeito e a empatia. Este enfoque difere dos demais tanto em sua proposta quanto 56
  • 67. em seus desdobramentos. O paradigma da repressão tende a interpretar a violência como uma expressão exclusivamente individual de pessoas más ou incapacitadas para o convívio social, enquanto o paradigma estrutural tende a considerar o indivíduo violento ou criminoso como vítima da sociedade. No modelo da cultura de paz, a violência é entendida como uma enfermidade coletiva que pode manifestar-se tanto por expressões individuais, grupais ou institucionais. A cura dessa enfermidade exigirá mudanças – culturais, espirituais, sociais – de parte de todos. Creio ser oportuno salientar que a “cultura” materialista, voltada para o consumo e o prazer imediato, que impera na sociedade ocidental contemporânea (afetando em especial, a juventude), têm uma relação de causalidade com o estado de violência que estamos vivenciando. A desconstrução desse estado de violência exige o envolvimento dos sujeitos, das instituições e da sociedade, em suas multidimensionalidades – física, mental, emocional, ética, espiritual, econômica, jurídica, política etc. O sistema educacional tem uma responsabilidade especial nesse processo. Se, por um lado, é fundamental não ceder à tentação de colocar a responsabilidade pela transformação da sociedade nos ombros da educação ou de considerar que as injustiças sócio-econômicas poderão ser solucionadas por um ensino de qualidade, por outro lado, é inegável o papel crucial que a escola desempenha na formação intelectual e moral das novas gerações. Construir a paz ou aceitar a violência é uma escolha da qual não podemos nos omitir. De nossa decisão dependerá a qualidade da vida que nós e nossos filhos experimentaremos daqui a quinze, trinta ou cinqüenta anos. Aceitar a paz e desconstruir a violência são o desafio que se coloca perante cada um – em sua vida pessoal, relações familiares, papel profissional e participação cívica. Oxalá possamos nos orgulhar de nossa escolha. 57
  • 68. 58
  • 69. 7<,/.:;.57< /;,-!/!,-./!/J7 !/!,-./ /;,-!/!,-./!/J7 Hélio Bicudo Presidente da Comissão Interamericana de Direitos Humanos O tema “Cidadania Mundial: a Base da Paz” traz, em si, o mais amplo conceito de cidadania, a abranger homens, mulheres, crianças e jovens que vivem no planeta terra. É na verdade, um ideal a ser atingido, em especial nos países do chamado terceiro mundo, nos quais apenas uma minoria desfruta dos benefícios da cidadania: saúde educação, como base a necessária para alcançar-se o pleno desenvolvimento da pessoa humana, dentro do qual se inserem outros desafios que buscam o respeito à vida e à integridade pessoal, o direito ao acesso à Justiça e a quaisquer outro, sobretudo, o direito à liberdade de informação e de expressão. Melhor dizendo, os abrangentes direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais. Esses direitos, indivisíveis e interdependentes, como advertiu a Conferência Mundial de Direitos Humanos, realizada em Viena, em 1993, e outros que deles derivam, que se constituem no fundamento mesmo do Estado de Direito, não nos são outorgados, mas são e serão o resultado de uma luta de todos os dias e de todos nós. Basta lembrar, como já se disse algures, que a Democracia é uma conquista que se faz e refaz e que nunca se 59
  • 70. esgota, pois existe sempre uma dificuldade a ser superada e um novo horizonte a ser desvendado. No caso particular do Brasil, é preciso prestar atenção a problemas que vêm sendo subestimados pelos representantes dos três poderes da República. Quero me referir, antes de mais nada, à questão da criança e do adolescente. Temos um estatuto da criança e do adolescente que nada fica a dever às legislações mais avançada sobre a matéria. Entretanto, na prática, nada ou quase nada se faz; depois de dez anos de vigência dessa lei é quase nula a participação popular no sistema reabilitador previsto pelo Estatuto, uma vez que não se organizam, nos limites ali indicados, os Conselhos previstos, órgãos chaves na implementação da política que se deseja concretizar, para que os menores não encontrem, nas ruas das nossas cidades, o apelo que ali se concentra ao consumo de drogas, à exploração sexual e à violência em geral. Hoje, no Brasil, as crianças e jovens com problemas de conduta, são tratados como delinqüentes comuns, encerrados em estabelecimentos de contenção, onde a tônica é a corrupção e a violência. Chega-se, mesmo, num lamentável desconhecimento de nosso sistemas constitucional que fixa a idade de responsabilidade penal aos 18 anos (artigo 228, da Constituição Brasileira), e que se constitui, ex vi do artigo 5º, parágrafo 2º, da Constituição Federal, em uma cláusula pétrea, que não pode ser alterada sequer mediante emenda, a qual pretende-se o rebaixamento dessa idade, numa atitude inconseqüente em face da realidade da lei, da falência do sistema prisional e com absoluto desprezo para com os princípios que devem reger uma política de verdadeiro atendimento à infância e à juventude. Por outro lado, continua-se a negar o acesso do povo à Justiça e prossegue-se na instituição e permanência de justiças corporativas, como são as justiças de polícias militares, responsáveis pelos altíssimos índices de impunidade nos crimes praticados por milicianos contra civis, circunstância que, indubitavelmente, convida à violência. 60
  • 71. Somente em São Paulo, nos últimos dez anos, foram eliminadas cerca de seis mil e quinhentas pessoas pela Polícia Militar, fato que não mereceu a devida consideração da justiça corporativa que as acoroçoa. Insiste-se, por igual, num modelo policial hoje inteiramente esgotado, elaborado pela ditadura militar para proteger o Estado e repudiam-se projetos que procuram estruturar uma nova polícia, com novas concepções do que deva ser a atividade policial, na função precípua de atuar na defesa da segurança das pessoas, inclusive se for o caso, contra a própria ação do Estado. São fatos que decorrem de uma concepção de Estado que o modelo neoliberal intenta implantar e que aumentou, nos países do terceiro mundo, as pautas de miséria e sujeitou a saúde e a educação aos patamares mais baixos da atuação desse mesmo Estado. Enquanto, pois, não erigirmos a saúde, a educação, o emprego, a justiça e a liberdade de informação e expressão em fundamentos do Estado de Direito, como aliás impõe a Constituição de 1988, com razão chamada “cidadã”, quando dispõe que a República Federativa do Brasil tem como um de seus fundamentos a cidadania e a dignidade da pessoa humana (artigo 1º ); como objetivos fundamentais, dentre outros, o de erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais, bem como promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (artigo 3º ); e rege-se nas suas relações internacionais pela prevalência dos direitos humanos (artigo 4º ); não poderemos deixar de lutar para que esses direitos não fiquem à margem da lei, mas sobretudo, que se inscrevam em nossos corações e mentes, para que, então, possamos proclamar a cidadania mundial. Todos somos irmãos, portanto, solidários nos bens da vida. 61
  • 72. 62
  • 73. 9!KT V:!5;:0./ 5;:0./!/;,; V:!5;:0./!/;,; 573;:[0-.! Rabino Henry l. Sobel Presidente do Rabinato da Congregação Israelita Paulista Era uma vez um rapaz que estava tão inspirado que resolveu mudar o mundo. Ele estava plenamente convencido de que seus sonhos e suas idéias podiam revolucionar o universo. Mas, quando tentou implementá-los, percebeu que o mundo era grande demais para uma pessoa mudá-lo sozinha. Então, resolveu mudar seu país. Mas logo viu que isso também era uma tarefa grande demais para uma única pessoa. Daí, decidiu mudar sua comunidade. Mas logo percebeu que até isso era difícil demais para ele. Então, resolveu mudar a si mesmo. E, quando começou a ser compreensivo para com os outros e passou a se comportar corretamente ele foi contagiando todos ao seu redor. E sua comunidade ficou melhor, seu país ficou melhor, o mundo ficou melhor. Conto essa história porque acredito realmente que, se queremos construir a paz em nossa sociedade, temos que começar com nós mesmos. Cada um em seu próprio pequeno mundo, desarmado o espírito, conscientizando a si mesmo, conscientizando 63
  • 74. aquele ao seu redor, conscientizando seus filhos. A cidadania mundial tem que ser cultivada desde a infância. É na infância que a criança deve ser conscientizada de que existe outras idéias além das suas, outros credos além do seu, outras raças além da sua, que existem diferenças entre as diversas religiões e etnias, mas todas são igualmente válidas e nenhuma é superior às outras. Dois ensinamentos bíblicos podem servir de ponto de partida neste sentido. O primeiro: “Vayvra Elohim et ha’adam be’tzelem Elhim” - “O homem foi criado à imagem de Deus”. Este princípio implica que cada ser humano é digno de respeito e consideração, pois ele traz dentro de si uma centelha divina do Criador. Outro ensinamento de fundamental importância é que toda raça humana provém de um único homem, Adão. Ao aprender isto, a criança capta o conceito da igualdade entre todas as pessoas e aprende, ao mesmo tempo, a rejeitar qualquer idéia de superioridade. A história já nos deu provas suficientes de que o preconceito religioso, o triunfalismo ideológico e a discriminação étnica são as maiores barreiras ao progresso humano. Quando uma minoria qualquer é atacada, a sociedade como um todo torna-se uma vítima em potencial. Quantas estratégias precisaremos suportar para aprender essa antiga lição? Já é tempo de percebermos que julgar um ser humano em termos do seu credo religioso, das suas convicções políticas, da cor de sua pele, é mais do que um erro. É uma cegueira do espírito, é um câncer da alma. O erro mais trágico e persistente do pensamento humano é o conceito de que as idéias são mutuamente exclusivas. Foi esse o engano fatal que, não apenas no século XX, mas em todos o tempos, fez falhar o ideal da fraternidade universal. Em cada indivíduo, em cada povo, em cada cultura, existe algo que é relevante para os demais, por mais diferentes que sejam entre si. Enquanto cada grupo pretender ser o dono exclusivo da verdade, enquanto perdurar esta estreiteza de visão, a cidadania mundial permanecerá um sonho inatingível. O ingrediente básico para a construção da paz em nossa so- 64