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Epistemologia de um Caminho


       Á primeira vista, a Baía da Babitonga nos surpreende com suas águas calmas que
banham e encantam esse lugar. De barco, circundando suas majestosas ilhas, desviamos nosso
olhar para o interior, onde repousa imponente a Serra do Mar.
       O clima histórico e envolvente da Babitonga nos remete a época da chegada dos
primeiros navegadores europeus, que encontraram na geografia da Baía um lugar perfeito para
se aproximarem do continente com suas grandes embarcações. A busca pelas riquezas
intocáveis que se ouvira falar, remetiam sempre para além das montanhas, o que motivou os
conquistadores a percorrerem os antigos caminhos indígenas que cortavam as escarpas da
serra rumo ao desconhecido.
       Esses caminhos que outrora deram passagem aos conquistadores, tem sido objeto de
estudo de vários pesquisadores que buscam preservar essa memorável história. O Prof. Olavo
Raul Quandt, que escreveu “Peabiru: O caminho Velho”, alude que foi através da Babitonga
que os europeus alcançaram o tão afamado Caminho de Peabiru, a mais extensa malha viária
pré-colombiana, o caminho que levava aos Andes.
       Nessa perspectiva histórica, é que o Grupo de Estudos Manoa vem desenvolvendo
estudos sobre esses antigos caminhos indígenas e coloniais, que partem dos canais da
Babitonga rumo a Serra do Mar, no litoral norte catarinense. Embora muitos dos vestígios
históricos encontrados nesses caminhos estejam desgastados pela ação do tempo e do homem,
encontramos nessa serra não apenas um simples caminho rumo ao interior, mas uma extensa
rede de caminhos históricos que se interligaram através do tempo.
       O antigo caminho do Monte Crista, vem sendo investigado com mais atenção e
servindo como base para nosso trabalho. O pesquisador austríaco Heinz Budiwig alerta para a
importância histórica desta via, onde acredita ter encontrado os vestígios mais preservados no
Brasil do antigo caminho do Peabiru.
        Também chamado de “Caminho Velho”, “Caminho Três Barras”, “Caminho dos
Jesuítas”, “Caminho do Ambrósios”, “Caminho dos Tropeiros”, entre outras, das muitas
denominações conhecidas, essa via alimentou o intenso trânsito colonial em direção ao
planalto e a “Vila de Curitiba”. Nessa época, o caminho teria recebido melhorias por ordem da
coroa portuguesa, e a principal benfeitoria seria o calçamento de parte do caminho. Desta
forma, o investimento garantiria um melhor acesso para o transporte de mercadorias do litoral
ao planalto.
        As partes preservadas desse caminho calçado tem sido objeto de pesquisa e discussão
por parte dos historiadores. Enquanto alguns estudiosos defendem que a enigmática escadaria
de pedra que conduz ao topo do monte crista tenha sido feita durante a abertura da estrada
Três Barras na época da colônia, outros atentam que a obra teria suas raízes no período pré-
cabralino, quando os incas tentaram ampliar seu domínio territorial, destacando assim, a
inexplicável engenhosidade da construção.
        Não desconsideramos nenhuma das hipóteses levantadas, preferimos coletar
informações, investigar todas as evidências entendendo que seja qual for a verdadeira origem
do caminho, é necessário acima de tudo preserva-lo, pois é imensurável sua riqueza histórica
e beleza natural.
        A exposição fotográfica “Epistemologia de um caminho”, do Grupo de Estudos Manoa
pretende demonstrar através de uma série de imagens coletadas pela equipe, durante cinco
anos de pesquisa investigativa, o enorme potencial histórico e natural do norte catarinense. O
espaço gentilmente cedido pelo Museu Nacional do Mar para abrigar nosso trabalho, foi um
ambiente perfeito, pois entendemos que São Francisco do Sul é parte fundamental dessa
história.
                                    Wlademir Vieira e Romão Kath
                         Pesquisadores do Grupo de Estudos Manoa



Referências:

GALDINO, lUIZ. Peabiru: Os Incas no Brasil, Belo Horizonte: Ed.
Estrada Real, 2002.

EHLKE, Cyro. A Conquista do Planalto Catarinense. Florianópolis: Ed.
Laudes, 1973.

FIORI, Julio César; FAGNANI, José Paulo; WAGECK, José Carlos Penna.
Caminhos Colônias da Serra do Mar. Curitiba: Ed. Natugraf Ltda, 2006.

QUANDT, Olavo Raul. título Peabiru o Caminho Velho. Joinville: ed.
Letra D’agua, 2003.

NUNES, Alvar. Naufrágios & Comentários.Trad. Jurandir Soares dos
Santos. Porto Alegre: Ed. L&PM, 1999.

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Epistemologia de um Caminho

  • 1. Epistemologia de um Caminho Á primeira vista, a Baía da Babitonga nos surpreende com suas águas calmas que banham e encantam esse lugar. De barco, circundando suas majestosas ilhas, desviamos nosso olhar para o interior, onde repousa imponente a Serra do Mar. O clima histórico e envolvente da Babitonga nos remete a época da chegada dos primeiros navegadores europeus, que encontraram na geografia da Baía um lugar perfeito para se aproximarem do continente com suas grandes embarcações. A busca pelas riquezas intocáveis que se ouvira falar, remetiam sempre para além das montanhas, o que motivou os conquistadores a percorrerem os antigos caminhos indígenas que cortavam as escarpas da serra rumo ao desconhecido. Esses caminhos que outrora deram passagem aos conquistadores, tem sido objeto de estudo de vários pesquisadores que buscam preservar essa memorável história. O Prof. Olavo Raul Quandt, que escreveu “Peabiru: O caminho Velho”, alude que foi através da Babitonga que os europeus alcançaram o tão afamado Caminho de Peabiru, a mais extensa malha viária pré-colombiana, o caminho que levava aos Andes. Nessa perspectiva histórica, é que o Grupo de Estudos Manoa vem desenvolvendo estudos sobre esses antigos caminhos indígenas e coloniais, que partem dos canais da Babitonga rumo a Serra do Mar, no litoral norte catarinense. Embora muitos dos vestígios históricos encontrados nesses caminhos estejam desgastados pela ação do tempo e do homem, encontramos nessa serra não apenas um simples caminho rumo ao interior, mas uma extensa rede de caminhos históricos que se interligaram através do tempo. O antigo caminho do Monte Crista, vem sendo investigado com mais atenção e servindo como base para nosso trabalho. O pesquisador austríaco Heinz Budiwig alerta para a importância histórica desta via, onde acredita ter encontrado os vestígios mais preservados no
  • 2. Brasil do antigo caminho do Peabiru. Também chamado de “Caminho Velho”, “Caminho Três Barras”, “Caminho dos Jesuítas”, “Caminho do Ambrósios”, “Caminho dos Tropeiros”, entre outras, das muitas denominações conhecidas, essa via alimentou o intenso trânsito colonial em direção ao planalto e a “Vila de Curitiba”. Nessa época, o caminho teria recebido melhorias por ordem da coroa portuguesa, e a principal benfeitoria seria o calçamento de parte do caminho. Desta forma, o investimento garantiria um melhor acesso para o transporte de mercadorias do litoral ao planalto. As partes preservadas desse caminho calçado tem sido objeto de pesquisa e discussão por parte dos historiadores. Enquanto alguns estudiosos defendem que a enigmática escadaria de pedra que conduz ao topo do monte crista tenha sido feita durante a abertura da estrada Três Barras na época da colônia, outros atentam que a obra teria suas raízes no período pré- cabralino, quando os incas tentaram ampliar seu domínio territorial, destacando assim, a inexplicável engenhosidade da construção. Não desconsideramos nenhuma das hipóteses levantadas, preferimos coletar informações, investigar todas as evidências entendendo que seja qual for a verdadeira origem do caminho, é necessário acima de tudo preserva-lo, pois é imensurável sua riqueza histórica e beleza natural. A exposição fotográfica “Epistemologia de um caminho”, do Grupo de Estudos Manoa pretende demonstrar através de uma série de imagens coletadas pela equipe, durante cinco anos de pesquisa investigativa, o enorme potencial histórico e natural do norte catarinense. O espaço gentilmente cedido pelo Museu Nacional do Mar para abrigar nosso trabalho, foi um ambiente perfeito, pois entendemos que São Francisco do Sul é parte fundamental dessa história. Wlademir Vieira e Romão Kath Pesquisadores do Grupo de Estudos Manoa Referências: GALDINO, lUIZ. Peabiru: Os Incas no Brasil, Belo Horizonte: Ed. Estrada Real, 2002. EHLKE, Cyro. A Conquista do Planalto Catarinense. Florianópolis: Ed. Laudes, 1973. FIORI, Julio César; FAGNANI, José Paulo; WAGECK, José Carlos Penna.
  • 3. Caminhos Colônias da Serra do Mar. Curitiba: Ed. Natugraf Ltda, 2006. QUANDT, Olavo Raul. título Peabiru o Caminho Velho. Joinville: ed. Letra D’agua, 2003. NUNES, Alvar. Naufrágios & Comentários.Trad. Jurandir Soares dos Santos. Porto Alegre: Ed. L&PM, 1999.