2. - Não sei minha idade. Nasci no Deserto do Saara, sem
documentos.
3. - Nasci em um acampamento dos nômades tuaregs entre
Timbuctu e Gao, ao norte de Mali. Fui pastor dos camelos,
cabras, cordeiros e vacas de meu pai. Hoje estudo gestão na
Universidade de Montpellier.
4. - Estou solteiro. Defendo aos pastores tuaregs. Sou
muçulmano, sem fanatismo.
- Que turbante bonito!
- É uma fina tela de algodão: permite tapar o rosto no deserto,
e continuar a ver e respirar através dela.
5. - É de um azul belíssimo…
- Nós, os tuaregs, somos chamados de homens azuis por isso:
o tecido solta alguma tinta e nossa pele adquire tons azulados.
- Como conseguem esse tom de azul anil?
- Com uma planta chamada índigo, mesclada com outros pigmentos
naturais. Para os tuaregs o azul é a cor do mundo.
- Porque?
- É a cor dominante: é a cor do céu, do teto de nossa casa.
6. - Quem são os tuaregs?
- Tuareg significa “abandonados”, porque somos um velho povo nômade do
deserto, solitários e orgulhosos. “Senhores do Deserto”, é como nos chamam.
Nossa etnia é a amasigh (bérbere), e o nosso alfabeto, o tifinagh.
- Quantos são?
-Uns três milhões, e a maioria permanece nômade. Mas a população diminue.
“É preciso que um povo desapareça, para que saibamos que ele existiu!”,
apregoava um sábio. Eu luto para preservar esse povo.
- A que se dedicam?
- Pastoreamos rebanhos de camelos, cabras, cordeiros, vacas e asnos num
reino de imensidão e de silêncio.
7. -O deserto é realmente tão silencioso?
- Quando se está sozinho naquele silêncio, ouve-se o batimento do próprio
coração. Não há lugar melhor para se estar sozinho.
- Que recordações de sua infância você conserva com maior nitidez?
- Desperto com a luz do sol e ali estão as cabras de meu pai. Elas nos dão
leite e carne, nós as levamos onde há água e pasto… Assim fizeram meu
bisavô, meu avô e meu pai… e eu.
Não havia outra coisa no mundo além disso. E eu era muito feliz com isso.
8. -De fato não parece muito estimulante…
- Mas é muito! Aos sete anos já deixam que você se afaste do acampamento
para que aprenda coisas importantes: farejar o ar, escutar, apurar a vista,
orientar-se pelo sol e pelas estrelas… E a deixar-se levar pelo camelo, se você
se perder. Ele te levará onde há água.
-Saber isso é valioso, sem dúvida…
-Ali tudo é simples e profundo. Existem muito poucas coisas. E cada uma tem
um enorme valor!
9. - Então esse mundo e aquele outro são muito diferentes, não?
- Ali cada pequena coisa nos proporciona felicidade. Cada toque é valorizado.
Sentimos uma enorme alegria pelo simples fato de nos tocarmos e estarmos
juntos. Ali ninguém sonha com chegar a ser, porque cada um já o é!
- O que mais o chocou em sua primeira viagem à Europa?
- Ver as pessoas correndo pelo aeroporto. No deserto só se corre quando vem
uma tempestade de areia. Me assustei, é claro!
10. - Eles apenas iam buscar suas malas…
- Sim, era isso. Também vi cartazes de mulheres nuas. Me perguntei: porque
essa falta de respeito para com a mulher?
Depois, no Íbis Hotel, vi a primeira torneira da minha vida, vi a água correndo
e senti vontade de chorar…
- Que abundância! Que desperdício! Não?
- Todos os dias da minha vida consistiam em procurar água. Quando vejo
as fontes ornamentais aquí e acolá, continuo sentindo por dentro uma dor tão
intensa…
11. -Tanto assim?
- Sim! No começo dos anos 90 houve uma grande seca. Morreram os animais
e nós adoecemos. Eu tinha uns 12 anos e minha mãe morreu. Ela era tudo
para mim! Me contava histórias e ensinou-me a contá-las muito bem. Ela me
ensinou a ser eu mesmo.
12. -O que aconteceu com você?
- Convenci meu pai que me deixasse ir à escola. Quase todo dia caminhava
15km. Até que um dia o professor me arranjou um lugar para dormir e uma
senhora me dava o que comer, quando eu passava em frente à sua casa.
Entendi que essa ajuda vinha de minha mãe.
-De onde surgiu esse desejo de estudar?
- Uns dois anos antes, havia passado pelo nosso acampamento o rally
Paris-Dakar, e uma jornalista deixou cair um livro de sua mochila. Eu o
apanhei e lhe entreguei. Ela me deu o livro de presente. Era um exemplar
do Pequeno Príncipe e eu prometi a mim mesmo que um dia conseguiria lê-lo.
13. - E conseguiu.
-Sim! Foi assim que consegui uma bolsa de estudos na França.
- Um Tuareg na universidade!
- Ah, o que mais sinto falta aqui é o leite de camela... E o calor da fogueira,
e de andar com os pés descalços na areia quente.
Lá nós olhamos as estrelas todas as noites e cada estrela é diferente das
outras, como cada cabra é diferente.
Aqui, à noite, você olha para TV.
14. -Sim! E o que você acha pior aqui?
- Vocês tem tudo, mas não acham suficiente. Vocês se queixam. Na França
passam a vida reclamando! Aprisionam-se pelo resto da vida a uma dívida
bancária, num desejo de possuir tudo rapidamente ...
No deserto não há congestionamentos, e você sabe por quê? Porque lá
ninguém quer ultrapassar ninguém!
- Conte-me um momento de extrema felicidade no seu deserto distante.
- Todo dia, duas horas antes do pôr do sol, a temperatura abaixa, mas
ainda não chegou o frio, e os homens e os animais lentamente voltam
para o acampamento e seus perfis ficam recortados em um céu cor de
rosa, azul, vermelho, amarelo, verde...
15. - Fascinante, na verdade...
- É um momento mágico ...
Entramos todos na cabana e colocamos o chá para ferver. Sentamo-nos em
silêncio, a ouvir a ebulição ...
- A calma invade todos nós, e o nosso coração bate ao ritmo do barulho
da fervura...
-Que paz!
17. NÓS TEMOS O RELÓGIO, ELES TEM O TEMPO!
NESSA NOSSA VIDA MARCADA PELO RELÓGIO,
QUANTAS VEZES POR DIA NOS FALTA “O TEMPO”?
18. O tempo é como um rio.
Você não pode tocar a mesma água duas vezes,
porque a água que passou, não passará de novo.
Aproveite cada momento da vida...
ENCONTRE TEMPO PARA VIVER!
Se você vive dizendo o quanto está ocupado, você nunca estará livre.
Se você vive dizendo que não tem tempo, você nunca terá tempo.
Se você vive protelando tudo para amanhã, esse amanhã nunca chegará.