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Universidade do Estado do Rio de Janeiro

              Centro de Educação e Humanidades

       Colégio de Aplicação Fernando Rodrigues da Silveira

     Departamento de Ciências Humanas e Integração Social




   Anais do Ciclo de Debates e Palestras sobre

  Reformulação Curricular e Ensino de Geografia




                          Organização:

                Cesar Alvarez Campos de Oliveira

                     Miguel Tavares Mathias

               Rejane Cristina de Araújo Rodrigues

                     Ronaldo Goulart Duarte




                         Rio de Janeiro

Departamento de Ciências Humanas e Integração Social / CAp-UERJ

                      NAPE/DEPEXT/SR3

                             UERJ

                              2002




                                1
Sumário

Apresentação ................................................................................................... 04

A contribuição social do ensino de Geografia .................................................. 08

         Antonio Carlos Robert Moraes

Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Geografia: o ecletismo a serviço da

alienação humana ............................................................................................ 27

         Marcos Antônio Campos Couto

O livro didático e a construção do conhecimento no ensino de Geografia nas

séries iniciais do Ensino Fundamental ............................................................. 52

         Irene de Barcelos Alves

A importância do ensino da Geografia no Ensino Fundamental e Médio ........ 56

         Marília Gomes de Oliveira Bacellar

O exame vestibular e suas relações com o ensino de Geografia .................... 61

         Ana Regina Vasconcelos Ribeiro Bastos




                                                        2
Apresentação



A educação no Brasil passa por um grande movimento de reestruturação. Há

inúmeras demandas de ordem política, econômica e social, que impelem ações

de reflexão e reestruturação, nem sempre com objetivos e valores

convergentes. Todavia, este processo afeta a escola, desde sua estrutura

organizacional e administrativa, até as propostas curriculares e práticas

pedagógicas das diferentes disciplinas, incluindo, também, os preceitos da

transdisciplinaridade. Frente a esse quadro, torna-se imperativo uma tomada

de posição, definindo que escola, que ensino e que sociedade queremos.

Diferentes governos vêem-se pressionados no sentido de oferecer educação

formal a parcelas cada vez mais amplas da sociedade. Há desde interesses

pragmáticos de renovação e qualificação de mão-de-obra, às reivindicações

por cidadania ou por ressocialização de jovens marginalizados. Generaliza-se o

conceito de inclusão que, para além da inserção dos indivíduos portadores de

necessidades educativas especiais, propõe uma estrutura educacional

abrangente, onde todas as diferenças - sociais, étnicas, culturais - se somem

na construção de espaços coletivos mais democráticos, pluralistas e solidários.

Em contraponto, o cotidiano escolar e sua realidade nos desafiam:

desinteresse, evasão escolar, relações de ensino-aprendizagem tradicionais

que não encontram nos alunos e suas famílias os elementos de apoio que no

passado os tornavam satisfatórios, pelo menos para certos grupos sociais.

Entre esses elementos, assumem fundamental importância o valor dado à

educação e aos próprios professores.




                                       3
A agravar o quadro, a sociedade atual cada vez mais se estrutura com base na

massificação do consumo e dos valores do capital – individualismo,

competitividade, acumulação (de bens e poder). Soma-se a aceleração dos

processos produtivos, substituindo trabalhadores, valores e padrões culturais,

numa escala em que o tecido social não dispõe mais de tempo para assimilar e

questionar. Cria-se uma constante tensão junto aos jovens: para que serve a

escola? E também para os professores: o que, por que e como ensinar?

Perguntamo-nos então: é possível construir uma escola capaz de enfrentar tais

desafios? O que nos parece premente, é a necessidade de construir uma

escola que, tanto em termos filosóficos, quanto acadêmicos e metodológicos,

apresente uma proposta alternativa aos padrões tradicionais de ensino –

reprodução, acúmulo de dados/informações – e às demandas imediatistas e

pragmáticas do sistema econômico vigente. Todavia, como construí-la?

Para a maioria dos professores esse movimento de mudança ainda é um salto

no escuro. Frente a este pressuposto e às nossas próprias demandas por

repensarmos nossos valores e práticas, é que nasceu a proposta de um Ciclo

de Palestras focado no ensino e na estrutura curricular da Geografia.

Deseja-se a mudança, precisa-se da mudança, mas, enquanto professores,

sabemos que isso se dará de forma contínua, dialética, processual. Todavia,

urge criar espaços de reflexão e troca, já que essa transformação só será

efetiva quando se tornar coletiva.

Um Colégio de Aplicação, por sua vez, tem funções específicas, caras frente à

situação apresentada. Por um lado, é lócus de formação de mão-de-obra. O

modelo de formação e atuação que é apresentado aos futuros professores,




                                       4
será fator condicionante para a construção de valores e práticas que os

mesmos desenvolverão no mercado de trabalho. Isso implica repensar a

concepção que temos acerca da formação de professores e que campo de

estágio devemos oferecer.

Por outro lado, põe em evidência nossas próprias práticas e o tipo de formação

que oferecemos ao aluno do ensino fundamental e médio. Deve-se considerar,

ainda, que o papel do Colégio transcende o atendimento aos alunos do ensino

regular e a formação de professores. Como espaço de pesquisa e extensão,

deve gerar e socializar conhecimento.

O Ciclo de Debates e Palestras sobre Reformulação Curricular e Ensino

de Geografia foi estruturado, dentro destes princípios, para aglutinar diferentes

profissionais e instituições, de forma a apresentarem suas reflexões acerca

dessas questões e as experiências e/ou propostas que apontam ou podem

nortear a construção de uma nova postura do professor no ensino, em

particular o de Geografia. Para tanto, além dos professores que desenvolveram

palestras sobre os temas centrais elencados pela equipe organizadora, foram

convidados professores de alguns dos principais colégios da cidade do Rio de

Janeiro, para exporem seus encaminhamentos frente a essas questões,

principalmente quanto à estrutura curricular adotada.

Considerando que o principal fato político que medeia esse processo foi o

lançamento dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), optamos por

centrar as discussões nas propostas de implantação/assimilação dos mesmos,

discutindo suas motivações políticas, dificuldades de execução, vantagens e

desvantagens, espaços de ação e de resistência.




                                        5
Esta coletânea apresenta os textos referentes às palestras proferidas na

abertura de cada encontro. O evento ocorreu no período de 18 de setembro a

16 de novembro, na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, promovido

pelos professores de Geografia do Departamento de Ciências Humanas e

Integração Social – DCHIS – do Colégio de Aplicação desta Universidade.

Desejamos, em breve, dar continuidade a este trabalho, promovendo novos

encontros e publicações, esperando contribuir para a construção de uma nova

perspectiva no ensino de Geografia no Brasil.

A todos os participantes do evento, nosso sincero agradecimento.




Comissão Organizadora




                                      6
A contribuição social do ensino de Geografia



                                                    Antonio Carlos Robert Moraes1



Mesmo não trabalhando diretamente com o ensino de Geografia, mantenho

contatos com as discussões desta área, devido às demandas do meu campo

de atuação na Universidade de São Paulo: o ensino de metodologia da ciência.

Eu já tive uma experiência, mais ou menos antiga, de docência no ensino

fundamental e médio e sou convidado, com alguma freqüência, para opinar

sobre currículos e livros didáticos. Recentemente, realizei a avaliação dos

currículos de Ensino fundamental para a Fundação Carlos Chagas, que serviria

de subsídio para os Parâmetros Curriculares Nacionais, mas, não sei porque

razão, o MEC “colocou a carroça na frente dos burros” e lançaram os

Parâmetros Curriculares antes de publicarmos a avaliação dos currículos. Mas,

foi um trabalho muito interessante, cobrindo o país como um todo, vendo,

inclusive, a grande diversidade que há de estado para estado, em termos de

conteúdo mínimo que é abordado pela Geografia. Será a partir dessa

experiência que vou trazer algumas idéias e contribuições para o debate.

Como as boas sessões são aquelas que geram polêmicas, vou começar a

minha exposição com uma posição que defendo, já há alguns anos, que é, não

somente, bastante polêmica nos fóruns da Geografia, como também

minoritária. E eu gostaria de trazer isto, porque acho que é um ponto que vale a

pena ser discutido e noto muitos setores da Geografia refratários, sequer

dispostos a fazer esta discussão.
1
    Professor da Universidade de São Paulo.


                                              7
Há muitos anos eu venho defendendo uma posição singular, que é a de uma

maior diferenciação entre a formação do geógrafo e a formação do professor

de Geografia. Eu acredito que na atual formação unificada, como no caso da

USP, o diploma de Bacharel praticamente não se diferencia do diploma do

Licenciado. O Licenciado faz apenas três ou quatro disciplinas a mais na

Faculdade de Educação. Eu acho que essa foi uma ação excessivamente

unificada (e estou tomando a USP como parâmetro) que, na verdade, traz

malefícios à formação dos dois profissionais.

Quando um determinado curso é voltado diretamente para um só desses

profissionais, ou para o geógrafo ou para o professor de Geografia, o formando

sai sem uma das duas habilitações. Já é um primeiro problema.

Agora, problema maior é quando os cursos tentam cobrir as duas

necessidades de formação. Na verdade, acaba-se tendo uma carga, às vezes,

muito aprofundada de conteúdo em certos assuntos, ou de pouco conteúdo em

outros. Vou explicar melhor: a formação, seja a do professor de Geografia, seja

a do geógrafo, é muito pesada. São vários os campos de estudo, são várias as

discussões que participamos, todas extremamente diferenciadas, indo desde

diálogos com as Ciências Naturais até diálogos com as Ciências Sociais,

passando pelo necessário diálogo com a área de Educação, no caso de quem

será professor.

Nesse sentido, com a tentativa de cobrir as duas coisas, acaba-se utilizando

um tempo que seria melhor aproveitado, no meu modo de entender, num

aprofundamento de cada uma das formações específicas. Por exemplo, no

caso da USP, uma pessoa que vai ser professor acaba tendo conteúdo, talvez




                                       8
aprofundado demais, em sensoreamento remoto, em cartografia digital e, por

outro lado, não temos uma disciplina no nosso currículo que aborde um tema

fundamental para o professor e que poderíamos chamar de “didática

cartográfica”. Isto é, aprender a utilizar um mapa como recurso educacional em

uma sala de aula. Então o indivíduo vai aprender técnicas extremamente

sofisticadas de cartografia digital e não sabe fazer o uso elementar de uma

carta como recurso em sala de aula. Isso seria válido também para vários

campos da Geografia Física que formam o indivíduo para ser um pesquisador

altamente especializado como a Pedologia, a Climatologia etc., oferecendo

conteúdos que dificilmente o professor utilizará em sala de aula e, por outro

lado, deixando lacunas incrivelmente grandes e fundamentais na formação

didático-pedagógica desse profissional.

Muitos outros exemplos poderiam ser dados. Muitas vezes a indefinição

propicia isso. Há professores que dão aula pensando que estão formando

professores e há professores que dão aula achando que estão formando

pesquisadores altamente especializados.

E essa carga, que já é pesada nos dois casos, acaba gerando uma situação

maléfica para a Geografia. Na verdade, na minha opinião, a recusa clara em

discutir esse ponto nos fóruns de Geografia está associada a um conjunto de

preconceitos e, porque não dizer, um certo conservadorismo e uma certa

inércia das Instituições. Para não se promover essa discussão, se apresenta,

como argumentação (que do ponto de vista abstrato é até simpática e

charmosa), a velha idéia da unidade entre ensino e pesquisa, ou seja, a idéia

de que ambos são indissociáveis. Isso é verdade, mas não anula a diversidade




                                      9
do campo onde se exerce o ensino e a pesquisa. Nós poderíamos falar,

tranqüilamente, de uma unidade entre ensino e pesquisa, na pesquisa

acadêmica da Geografia, e numa unidade entre ensino e pesquisa, no ensino

da Geografia.

Desse modo, tal argumento perderia totalmente a eficácia. Por exemplo, a área

de ensino necessita ter um diálogo profundo, constante, com as próprias

ciências da Educação e realizar pesquisas que apontem nesse sentido. Seja o

professor de Geografia, seja o geógrafo profissional, ele tem um campo de

interlocução bastante amplo. Na verdade ninguém consegue fazer, por

exemplo, Geografia Econômica sem ter um diálogo razoável da Geografia com

a Economia. Ninguém consegue fazer Geografia Política sem estabelecer um

diálogo profundo com a Ciência Política. Ninguém consegue gerar uma boa

Climatologia sem entrar no campo da Física e da Mecânica dos Fluídos. A

mesma coisa é válida para o ensino. Uma reflexão profunda sobre o ensino de

Geografia não pode, de modo algum, abrir mão de um diálogo constante com a

Psicologia da Educação, com a Filosofia da Educação e todo um campo de

diálogo necessário e extremamente grande, o que torna essa formação

unificada ainda mais problemática.

Em nome da unidade entre o ensino e a pesquisa, na minha avaliação, na

maioria das Instituições, a área de ensino acabou ficando como uma espécie

de apêndice do curso de Geografia. Isso é real, é uma constatação. Isso fica

muito claro em algumas atitudes que são comuns no campo da atuação da

Geografia. A primeira delas e que felizmente começa a mudar, mas que até

cinco ou dez anos atrás era preponderante, podia ser visualizada muito bem na




                                     10
pós-graduação. Era o caso daquele professor de Geografia, que vivia como

professor de Geografia, que era um profissional de ensino da Geografia e que,

ao ir fazer a pós-graduação, adotava temas de grande especialização em

alguma área de pesquisa da Ciência, temas profundamente estranhos ao seu

cotidiano de trabalho docente. Isso era um quadro muito generalizado que,

volto a dizer, por felicidade, está mudando e hoje há um volume muito maior de

pesquisas de pós-graduação específicas a respeito do ensino de Geografia.

Na verdade, por trás disso, ficava clara a desvalorização que o próprio

profissional fazia do seu trabalho. Ele almejava fazer a “Grande Geografia”,

como se esta fosse apenas a Geografia de pesquisa não ligada ao ensino e

que trazia por contraste uma certa desvalorização do ensino de Geografia. Era

como se o ensino da Geografia fosse uma espécie de “bico”, e o indivíduo

ficava trabalhando até que encontrasse uma coisa melhor e a pós-graduação

era vista como um caminho para sair da área de ensino.

Acho que esse tipo de raciocínio estava presente na cabeça de muita gente e a

não discussão das especificidades entre o ensino e a pesquisa acadêmica, no

campo da Geografia, apenas escondia, ou então perpetuava, esse tipo de

visão. Isso trouxe uma série de malefícios, principalmente para o ensino.

O primeiro deles correspondia a uma postura, entendida por alguns como de

vanguarda na área de ensino, de tomar as discussões de ponta da Teoria

Geográfica e tentar repassar essas discussões para o ensino básico. Isso

aconteceu muito no Brasil. Seria algo como se nós começássemos o ensino de

Física e discutíssemos Mecânica Quântica e a Teoria dos Fractais. Quer dizer,

você foca a discussão mais avançada na área e tenta “jogá-la” como conteúdo




                                      11
mínimo para a Educação Básica. Isso acarretou, entre outras coisas, algo que

ainda se faz presente, que é uma ausência de “pedagogização” das teorias

mais complexas da Geografia contemporânea. Não é raro encontrarmos em

currículos ou em livros didáticos a tentativa de tirar a última teoria de Harvey ou

do Milton Santos e aplicar isso em classes do ensino fundamental, o que é um

despropósito total.

Falta “traduzir” essas teorias, que são muito importantes, para que elas

venham a iluminar o que seria um conteúdo básico de Geografia. Não dá para

fazer uma transposição direta de uma discussão de ponta, de vanguarda sem

nenhum tipo de “pedagogização” para o campo do ensino. Enfim, eu não aceito

essa idéia da Educação como “bico” ou como uma área marginal do universo

da Geografia. Essa coisa que você é professor até “melhorar de vida”. Isto é de

uma perversidade social muito grande, pois o ensino, ao meu ver, é a tarefa

socialmente mais importante da Geografia. Sem abrir mão dos outros campos,

no que toca à incidência social, no que toca ao impacto social da Geografia,

sem dúvida nenhuma, a área de ensino é prioritária.

O professor de Geografia, nesse modo de entender, é mais importante do que

o geógrafo. Não quero dizer que um prescinda do outro, mas, do ponto de vista

social, o professor de Geografia é a figura essencial para a Geografia fornecer

algo para o avanço social, para as discussões sociais.

O geógrafo incide diretamente na formação social do cidadão. O professor de

Geografia está participando com um conteúdo e com uma temática essencial

na formação da cidadania. A visão de mundo do estudante-cidadão, a visão do




                                        12
país, a visão da realidade local em que ele vive, tudo isso está profundamente

permeado pelo conteúdo da Geografia escolar.

A auto localização do indivíduo no mundo é essencial na formação da sua

consciência social. O indivíduo precisa se localizar no mundo em variadas

escalas, para o entender e se entender nele. Então, na verdade, o conteúdo da

Geografia ilumina uma série de campos que dizem respeito à construção de

valores morais e à própria sociabilidade do indivíduo. Por isso, o professor de

Geografia atua num terreno extremamente delicado, de alta responsabilidade

social. Realmente, é uma tarefa extremamente importante, extremamente

delicada e de uma responsabilidade social imensa, a respeito da qual nós

temos que estar a todo o momento atentos.

O professor de Geografia tem a necessidade de desenvolver o raciocínio crítico

do aluno, porém, ao mesmo tempo, de fornecer-lhe um conjunto de

informações fundamentais para ele entender o mundo. Ele não pode, de modo

algum, passar uma visão fechada e sectária da vida social, isto é, uma

explicação pronta e acabada da realidade, o que iria significativamente contra o

desenvolvimento do raciocínio crítico. Ele tem necessidade de estimular a

reflexão política do aluno, porém, sem engessar essa reflexão política em

modelos ideológicos acabados e inquestionáveis. É difícil, mas são exatamente

esses os desafios que se colocam. Desenvolver o raciocínio crítico, sem passar

uma visão fechada de mundo; estimular a reflexão política, contudo, sem

engessá-la em modelos inquestionáveis; valorizar o multiculturalismo, o direito

às diferenças, ao mesmo tempo em que alerta para as desigualdades

existentes na sociedade.




                                      13
São sempre questões tênues e delicadas e não se trata de tarefa fácil combinar

essas coisas. Nesse quadro, parece-me que o simplismo teórico e explicativo

destaca-se como primeiro componente a ser evitado. Ter a consciência de que

nós   vivemos   num   mundo     extremamente    complexo,    numa   sociedade

extremamente complexa. Estamos inseridos, hoje, em processos e relações de

uma complexidade que nenhum raciocínio maniqueísta, simplista – do bem e

do mal, do certo e do errado – conseguirá equacionar.

Nós vivemos numa sociabilidade muito mais multifacetada que aquela vigente

no mundo do século XIX. Logo, teorias do século XIX não podem explicar o

mundo de hoje. Há processos novos, há atores sociais novos, há dinâmicas

novas. Nenhuma teoria do século XIX, gestada em uma época que não

vivenciou esses processos, teria condição de dar conta desse mundo.

Poderíamos dizer, fazendo uso do raciocínio de um enunciado bastante

dialético, que o Capitalismo que nós vivemos hoje, ainda é o mesmo daquele

do século XIX mas, ao mesmo tempo, é outro. Formulação que seria

impossível de fazer à luz da lógica formal, que consideraria isso um contra-

senso: ou é o mesmo ou é diferente. Não. É o mesmo, mas é outro. Eu não vou

me alongar nisso, mas poderia listar vários elementos para mostrar que o

Capitalismo, que vivemos hoje, é o mesmo do século XIX, mas é diferente

daquele do século XIX.

Para pegar um único ponto que é central: nós vivemos num Capitalismo que

hoje prescinde muito do trabalho vivo. Então, hoje em dia, o capital se realiza

de forma diferente. Se o Capitalismo do século XIX teve na exploração do

trabalho seu elemento chave de geração de lucro, hoje ele prescinde cada vez




                                      14
mais de trabalho vivo. Tomando, por exemplo, o desemprego, que não é algo

mais funcional ao capital para abaixar salário, mantendo um exército industrial

de reserva, como era no século XIX, mas considerado como um dado

estrutural, gerador de problemas sociais em qualquer sociedade capitalista

hoje, mesmo no centro do sistema.

Então, o Capitalismo, ainda hoje, é o mesmo e é outro. É estruturalmente o

mesmo, mas historicamente outro. E há muito que explicar nessa realidade que

nós vivemos. Há muitas novidades surgindo e numa velocidade desconhecida

em épocas anteriores. Talvez, essa aceleração do tempo, como já apontaram

vários autores, seja a marca mais forte da nossa época: uma profunda

aceleração, uma profunda rapidez na mudança das coisas. Há, inclusive,

autores que dizem que essa velocidade da inovação contemporânea é o

processo, o elemento central para explicarmos essa angústia do ser humano

na atualidade.

No passado, vivia-se num mundo comandado pela tradição e as pessoas

nasciam e morriam no mesmo mundo. Hoje, vivemos num mundo que se move

a cada momento, inclusive do ponto de vista dos valores culturais. Essa

velocidade, essa mutação das inovações é de tal ordem, de tal ritmo, que deixa

inclusive grande parte das Ciências Humanas atordoadas com o seu objeto. O

ritmo atual das inovações faz com que muitas teorias, muitos pensadores

cheguem a abrir mão do desejo de uma totalização, do desejo de uma busca

de sentindo na História, caindo para aquilo que é chamado de uma postura

Pós-moderna. Eis aí outro ponto bom para discussão. O Pós-modernismo

como expressão dessa insegurança advinda da rapidez das inovações




                                      15
vivenciadas na contemporaneidade. Então, de um lado, temos que abrir mão

de buscar um sentido, uma lógica nessa realidade na qual estamos inseridos.

Outros, na antípoda desses, se apegam a um passado teórico, onde as coisas

estavam mais claramente nos seus lugares, onde a realidade era mais simples,

onde os “mocinhos e bandidos” do processo histórico ficavam melhor

demarcados, acreditando que o apego ao dogma forneça um sentido que as

ruas, que a realidade nega. E esses passam a dar respostas metodológicas

para tudo. Qualquer problema empírico tem resposta metodológica. Respostas

metodológicas que, inclusive, explicam as coisas antes delas serem

pesquisadas. Quer dizer, nem pesquisei ainda e já sei a resposta, pois a

resposta está no método, não está na realidade. Essa é outra postura

absolutamente inadequada. Tudo está explicado no método. Pena que a

realidade, muitas vezes, não tenha sido avisada disso e contrarie totalmente

essas teorias. Isso me faz lembrar algo de bom nas tradições críticas do século

XIX, em Karl Marx, em particular, ao dizer que as teorias tinham que vir da

realidade para os livros e não o inverso, dos livros para a realidade.

Nessa Babel metodológica, ideológica que vivemos hoje, a questão, talvez,

mais central que se coloca, e aí toca direto naquelas tarefas que estão lá,

difíceis para o professor de Geografia, é a questão da legitimação das teorias

científicas. Esse problema emerge como o tema central para as Ciências

Humanas e para a Geografia nesse início do novo século.

Como se legitimam as teorias? Essa é uma questão para a qual já não se

aceitam as respostas do passado, principalmente não se aceita a

autolegitimação. Eu reúno uns dez amigos que pensam igual a mim e dizemos




                                        16
um para o outro: “Você está certo, você está certo, você está certo!” e você

acaba se iludindo de que está certo mesmo. Porém, como legitimar as teorias?

Como dizer que uma dada explicação da realidade social é certa ou errada, é

verdadeira ou falsa? Eu diria que esse é o tema central que se apresenta para

as teorizações mais avançadas em Ciências Humanas hoje em dia. E isso

vem, de certa forma, aduzir complicações nas já difíceis tarefas que se põem

para o professor. Explicar o mundo complexo sem simplificá-lo. Quer dizer,

explicar simplisticamente, abrindo mão da complexidade, é fácil. Agora,

explicar esse mundo complexo, “pedagogizá-lo”, sem cair na simplificação, é

extremamente difícil. Quer dizer, explicar criticamente o mundo, sem

transformar essa explicação num dogma, que cristaliza acriticamente pretensas

verdades. É a tarefa que está aí fora, difícil, extremamente difícil, mas é o

desafio que se põe. Acatar o pluralismo democrático sem cair num relativismo

cínico que a tudo justifica. Acatar as diversidades de opiniões como um valor,

sem pretender ser uma espécie de “dono da verdade”, porém, sem cair

naquela posição da “noite escura” do relativismo onde “todos os gatos são

pardos”, justificando qualquer atitude. Principalmente, justificando e reforçando

esse traço tão nefasto da nossa época que é o individualismo exacerbado.

Enfim, trata-se de uma agenda considerável que pede ao professor de

Geografia, não apenas o domínio do conteúdo específico da disciplina, mas

também uma formação pedagógica e humanista ampla. Certos temas da

Filosofia e da Ciência Política, por exemplo, se impõem na sua formação,

somando-se aos temas didáticos e pedagógicos, já comentados, e ao conteúdo

específico da disciplina. Por isso, acredito que deve haver separação na




                                       17
formação do geógrafo e do professor de Geografia. Além do conteúdo

específico da disciplina, além do conteúdo específico da Pedagogia, há a

necessidade dessa formação crítica e humanista, em cujo campo básico nós

teremos de avançar, no meu modo de entender, em termos de Filosofia e de

Ciência Política.

E aqui se abre, por essa necessidade de diálogo, a possibilidade de outros

equívocos. E o principal deles, que é outro ponto que eu gostaria de trazer para

a nossa discussão, é que, nesse diálogo com áreas afins, acabe-se saindo do

campo da Geografia, posição que também não é difícil de se encontrar no

universo do geógrafo. Quer dizer, eu começo a dialogar tanto com a Sociologia,

com a Ciência Política que, de repente, eu perco o foco da Geografia. Isso me

parece um equívoco muito grande. Ter uma visão clara da disciplina é um

pressuposto básico para um bom ensino de Geografia.

Eis o primeiro lugar, onde já se pode fazer um exercício da aceitação do

pluralismo, tendo claro que não existe apenas uma Geografia ou apenas uma

teoria em Geografia, mas, como em qualquer outro campo do conhecimento,

vai viver e se alimentar de polêmicas entre posicionamentos teóricos distintos,

inclusive sobre a própria natureza desse conhecimento.

Eu tenho uma visão sobre o que seja esse objeto da Geografia, mas tenho

claro, também, que essa visão não é a única e nem é exclusiva. Num campo

tão vasto podem conviver hipóteses bastante diferenciadas, cada uma podendo

trazer, inclusive, contribuições extremamente ricas para a explicação desse

mundo complexo e opaco no qual vivemos. Sem dúvida alguma, a idéia de

uma relação entre a sociedade e o espaço se impõe como uma idéia forte para




                                      18
clarificar esse campo da Geografia. Porém, vendo essa relação sociedade-

espaço como uma relação social, posição que já traria alguma polêmica entre

os que vêem o espaço diretamente como objeto e não a relação, e os que

vêem a relação sociedade-espaço como uma relação própria e não como uma

das relações sociais.

Enfim, aí temos um grande ponto de polêmica e estamos mexendo com o

cerne, com a essência mesmo do que se considera Geografia. O estudo da

espacialidade da vida social, o estudo da dimensão espacial da totalidade

social. São muitas as formulações e é necessário, para não sair da Geografia,

baixar esse nível de generalidades para explicações mais específicas, para

conceitos mais operacionais, tendo claro que a perda da abordagem geográfica

seria uma perda extremamente grande no poder explicativo da realidade social

como um todo. Isto é, a Geografia, a especificidade da abordagem geográfica,

tem uma potencialidade crítica e explicativa imensa. A maior contribuição que

podemos dar para explicar o Brasil, no campo das Ciências Humanas, é

exatamente gerar uma bela interpretação geográfica do Brasil. Na verdade, a

Geografia e a dimensão espacial tem uma grande centralidade na explicação

da realidade social como um todo. Eu acho que, se há algo nesse final de

século que as Ciências Humanas como um todo acataram, é exatamente essa

revalorização da Geografia, que andou, em um certo momento, meio em baixa

no rol das Ciências Humanas. Hoje em dia, ela conhece um momento que

propicia até algumas estultices como a de achar que a Geografia é a coisa

mais importante que existe no mundo, posição também que encontramos em

alguns autores contemporâneos, gerando idéias estapafúrdias como, por




                                     19
exemplo, Edward Soja, sugerindo substituir o materialismo-histórico dialético

por um materialismo-geográfico dialético. Aí já é um exagero, uma certa

soberba da Geografia, mas, sem dúvida nenhuma, a consciência da

centralidade explicativa desta ciência, com relação à totalidade social, é um

fato que hoje está evidente, mesmo quando lemos em autores de outras áreas.

Acredito que, por exemplo, a aceitação do livro de David Harvey sobre a

condição pós-moderna nas áreas de Antropologia, Ciência Política, Economia

etc., é um exemplo claro dessa revalorização da dimensão espacial e da

Geografia. Então, quanto mais geógrafos nós conseguirmos ser, maior

contribuição daremos para a interpretação de nossa realidade social.

Uma posição que venho defendendo, já há algum tempo, e da qual estou

plenamente convencido, é a de que nos países de formação colonial essa

centralidade da Geografia adquire ainda maior relevo. Por quê? Porque

exatamente os países que tiveram berço colonial, são países que surgem de

processos de expansão espacial e de conquista de territórios. A própria

colonização é isso: uma apropriação de terras. Então, nesses países, a

Geografia teria um peso explicativo ainda maior do que em outros.

O Brasil é exemplar, nesse sentido. Não dá para compreender o Brasil sem

entender a Geografia do Brasil. E isso, não sou eu que estou falando, isso está

numa das últimas entrevistas dadas pelo Prof. Caio Prado Júnior que, sem

dúvida nenhuma, foi uma das figuras centrais na explicação deste país. Ele

disse, numa entrevista à Folha de São Paulo pouco antes de morrer, que sem

entender a Geografia, não se entende o Brasil. Eu estou plenamente de acordo




                                      20
com ele. Este é um país extremamente complexo. A Geografia é reveladora da

sua essência.

Nós vivemos num país que é, ao mesmo tempo, periférico e moderno. Um país

que é pobre e rico. Está aí, de novo, a dialética. Um país profundamente

desigual. Não é novidade nenhuma para ninguém, mas é mais uma razão para

estarmos atentos contra simplificações e simplismos teóricos. Nenhuma teoria

simples vai dar conta da complexidade da armação social deste país. Um país

que combina traços de pré-modernidade com traços de pós-modernidade. O

Brasil vive desde situações que poderíamos chamar de super-modernidade,

pois estão aí as redes, a informática, o Just-in-time em vários processos, tudo

isso convivendo com traços pré-modernos, a exemplo do desigual acesso à

cidadania. São traços da pré-modernidade que nos marcam profundamente.

Então, esse jogo entre atraso e modernidade vai ser um dos elementos

caracterizadores do país, e eu, particularmente, acho que, se fizermos um

balanço, nós estamos mais para um país pré-moderno do que para um país

pós-moderno. A pós-modernidade é residual, é espacialmente seletiva,

enquanto que os elementos da pré-modernidade são majoritários e estão em

qualquer lado que se olhe o país. Isso coloca, como foco central para a

reflexão (de todas as Ciências Humanas e da Geografia em particular), a

questão da inclusão/exclusão. Esse é o tema central no equacionamento do

país. É uma questão que vale para segmentos sociais e também para lugares.

Há lugares incluídos e há lugares não-incluídos, por exemplo, às redes. E a

não-inclusão nas redes significa atraso, miséria. Eu inclusive tenho uma

posição muito particular a respeito de um conceito, originário da Antropologia,




                                      21
que vem sendo bastante utilizado pelo geógrafo, que é o conceito de não-

lugar. Na concepção original de Marc Augé, que propôs esse conceito, um

não-lugar seria um lugar da super-modernidade, aquele lugar sem identidade: o

aeroporto, o shopping center etc. Porém, acho isso equivocado, acho que o

não-lugar é exatamente o contrário disso. Não-lugar é o lugar não inserido nas

redes. Aquele lugar que o Capitalismo não quer explorar. O Haiti é um bom

exemplo de não-lugar. O problema do Haiti, e aí há outro ponto para

pensarmos, não é a exploração direta do capital, mas sim o desinteresse do

capital em relação a esse país. Esses seriam os verdadeiros não-lugares, os

lugares excluídos das redes que, cada vez mais, conformam e comandam a

vida econômica contemporânea.

Bem, com isso, aponto para aquilo que seria a principal tarefa posta para a

nossa geração de geógrafos, e para a qual o papel dos professores de

Geografia adquire um relevo fantástico: a de articular a Geografia com um

PROJETO NACIONAL nesses tempos de Globalização. Tendo claro, em

primeiro lugar, que não é a Geografia nem o geógrafo que farão isso sozinhos.

Seria uma grande soberba achar que os geógrafos são ungidos para

determinar, decidir e fazer esse projeto. Não! Um Projeto Nacional deve

expressar a vontade nacional, logo não poderia ser obra só de geógrafos, mas

do conjunto dos cidadãos. Porém, o ensino da Geografia atua diretamente na

formação desse cidadão. E isso coloca para nós, como questão-chave, definir

qual é o conteúdo básico dessa disciplina que deve interessar na formação de

todos os cidadãos. Acho que é esta a questão. Ao pensar um currículo, ao

estruturar um livro didático, ao pensar uma reforma educacional, acho que é




                                     22
esta a questão básica, até para fugir daqueles erros, que eu coloquei, de

“pegar” teorias de ponta e sair da Geografia. A questão básica é esta: qual é o

conteúdo básico dessa disciplina que deve estar presente na formação de

todos os cidadãos? A pedra angular é discutirmos o conteúdo geográfico

mínimo. Não é a formação do Geógrafo, mas a formação do cidadão. Quer

dizer, o grande livro deveria ser assim: o que todo o cidadão deve entender de

Geografia? é isso que seria a virtude de um programa de ensino de Geografia

para o ensino fundamental e médio, tendo clareza que apenas uma parcela

diminuta daquelas pessoas se tornarão geógrafos. Os que se encantarem com

a Geografia farão, depois, uma Faculdade de Geografia. Mas o que o

trabalhador, o médico, o técnico, deve saber de Geografia para que ele tenha

capacidade de influir, decidir, opinar nesse Projeto Nacional?

Então, estaríamos discutindo a questão do conteúdo mínimo. Não as

especificidades, mas o básico, o universalizado, aquilo que deveria estar

presente na formação de todo o cidadão. Ou até fazer a pergunta invertida:

quais as informações geográficas que não podem faltar, e o caminho para nós

elaborarmos isso, na formação do cidadão? Acoplada a estas duas, porém

bem mais perigosa e delicada, já que não resolvemos as questões fugindo

delas, mas discutindo-as com seriedade e a fundo, uma questão que emerge é

a seguinte: qual o conteúdo ideológico de tratamento dessa informação

geográfica mínima, que é democraticamente aceitável, para uma formação

pluralista do indivíduo? Acho essa pergunta básica. É chata, mas essencial.

Com isto eu estou balançando o dirigismo ideológico muito presente no ensino

de Geografia.




                                       23
Não estou propondo uma Geografia asséptica, apolítica, mas discutindo os

limites até onde uma explicação parcial do mundo pode ser apresentada para

os alunos como uma explicação universal do mesmo. Isso decorre de posições

didático-pedagógicas e volto àquelas questões iniciais: como estimular o juízo

crítico pessoal do aluno, isto é, sua capacidade de julgamento? Ou posto em

outros termos: como estimular o livre arbítrio dos indivíduos?

Vimos que há uma agenda razoável. Realizar isso não é pouca coisa. E a

pergunta básica que se impõe, que nós devemos nos fazer é: o professor de

Geografia está preparado para o exercício dessa tarefa? Os atuais currículos, a

atual formação nos capacita a saber o que é esse conteúdo mínimo? Será que

sabemos qual é esse limite ideológico na sala de aula? E aí, realmente, o

professor é o elemento básico. Não há sistema de ensino adequado que não

seja calcado na figura do professor. Não há boa educação sem um bom

educador. Qualquer iniciativa, nesse setor, deve partir dessas primícias. Não

adianta inovações teóricas, não adianta investimentos em infra-estrutura, não

adianta nada disso, se não tocarmos nesse ponto básico: o professor e sua

formação.

Eu diria que, de um ponto de vista amplo sobre o Brasil, o quadro não é dos

mais alentadores. Movimentos ou campanhas de capacitação aguerridas são

fundamentais. Há um grande número de professores há muito tempo afastados

de qualquer atividade de reciclagem, e aí se abre uma grande tarefa para as

Universidades, especialmente as públicas. Faz-se necessário pressionar as

Secretarias de Educação municipais, estaduais, o MEC, porque não teremos




                                       24
nenhum avanço no ensino se não houver um cuidado na melhoria da

capacitação dos professores.

Buscando chegar a um conhecimento efetivo do país, dentro daquelas

informações mínimas necessárias, precisamos claramente delimitar qual é a

carga empírica essencial para ser passada nos cursos, assim como, por outro

lado, ou conectado a isso, definir uma visão clara do próprio objeto geográfico.

Isto é, combinar a constatação da realidade brasileira com o estímulo a

construção de ideais. Eu acho que esse é o ponto que interessa, ou seja, de

um lado o realismo de avaliação do mundo empírico e, de outro lado, o esforço

pelo desenvolvimento da capacidade crítica do aluno. Aí está o nosso desafio,

que é um desafio coletivo e nele está o grande, talvez o maior, engate que a

Geografia pode ter com a transformação dessa ordem social nacional

profundamente injusta. Se há algo que nos anima na Geografia brasileira,

diante do tamanho dos desafios propostos, é o fato dela ser, majoritariamente,

uma Geografia progressista, uma Geografia preocupada com a problemática

social.




             Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Geografia:




                                      25
o ecletismo a serviço da alienação humana.



                                                          Marcos Antônio Campos Couto2.



Gostaria de registrar a importância deste debate sobre o ensino de Geografia,

inserido nessa articulação entre a Universidade e a escola básica. Considero

que, para o enfrentamento das questões políticas e teórico-metodológicas de

nossa carreira, de nossa profissão, no magistério de Geografia, a escola básica

não se basta. Mas a Universidade também não. Assim, temos ainda muitos

frutos a tirar de um relacionamento mais estreito entre ambos. É claro que

quando falo escola básica e Universidade, estou me referindo a essa parcela

que está interessada em fazer essa aproximação. Então, parabéns aos

organizadores pelo evento.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) de Geografia tem uma estrutura

bem ampla. Eles partem de uma avaliação do ensino-currículo de Geografia,

apresentam definições e propõem objetivos para a Geografia na escola e,

conseqüentemente, o que se quer da escola e com a Geografia dentro dela.

Enfim, apresentam objetivos, metodologias, avaliação, bibliografia; então, é um

documento interessante para estudar e debater. Não quero afirmar, com isso,

que ele resolva todos os problemas dos currículos escolares de Geografia.

Aliás, o que vou tentar demonstrar é que o texto dos PCNs mais nos confunde

do que nos esclarecem.




2
 Professor Assistente do Departamento de Geografia da Faculdade de Formação de Professores – FFP
UERJ.


                                                26
Eu não sei se vocês já leram os PCNs, mas, de qualquer forma, eu trouxe

alguns elementos de análise para estabelecer a nossa conversa. Em função de

sua abrangência, nós podemos analisá-los a partir de diferentes perspectivas,

por vários caminhos. Podemos discuti-lo no interior da política educacional

neoliberal do governo federal. Acho que é um caminho para o debate. Se cabe,

ou não cabe, um Parâmetro Curricular de caráter nacional, a quem cabe

construir um Parâmetro Curricular e como se deve fazê-lo (de maneira

democrática ou antidemocrática). Todos estes aspectos são importantes de

serem debatidos e questionados.

O caminho de análise que escolhi tem a ver, um pouco, com aquilo que eu

estou estudando agora na Faculdade de Formação de Professores – FFP, que

são os conceitos geográficos. Eu vou centrar um pouco a conversa nos

conceitos geográficos que os PCNs trazem, a partir do seu conceito de

Geografia, de sua concepção de Geografia. Então esse é um caminho que eu

estou propondo para, a partir daí, podermos estabelecer o debate e para que

vocês tragam as questões dos caminhos que querem trilhar.

Mas, na verdade, eu queria dividir a nossa conversa em três partes. O primeiro

momento, que considero importante, é a apresentação de algumas idéias,

antecedentes dos PCNs, através de um texto escrito pelo professor Antônio

Carlos Robert Moraes (1995) do Departamento de Geografia da Universidade

de São Paulo, onde realiza uma avaliação de 18 currículos oficiais de

Geografia de vários estados e municípios do Brasil. O texto resultante dessa

avaliação é muito interessante e importante para entendermos muitas das

idéias que estão nos PCNs. Há uma continuidade clara entre o texto do




                                     27
professor Robert Moraes, que está nesse documento da Fundação Carlos

Chagas, e muitas concepções que estão dentro dos PCNs. Então, eu

começaria por ele. Depois, partiríamos para alguns elementos dos PCNs e,

finalmente, para o terceiro momento, que estou chamando de debate, que

talvez seja o momento mais interessante.



A avaliação dos currículos oficiais brasileiros.



Retiramos do texto apenas aqueles comentários mais genéricos, que marcam,

não esta ou aquela proposta curricular, mas o conjunto das propostas

analisadas.

Há dois elementos que o professor Moraes considera fundamentais na

avaliação dos currículos de Geografia do Brasil. O primeiro problema é que os

programas e currículos padecem do

                “desejo militante de fazer do próprio currículo um instrumento
                de conscientização política, o que redunda num elevado grau
                de dirigismo ideológico na maioria das propostas analisadas”.
                (MORAES, 1995).

Segundo Robert Moraes, isso ocorreu em função dessas propostas curriculares

terem nascido após a redemocratização do Brasil, pós-regime militar, e que,

portanto, se inseriam na redemocratização da sociedade, na crítica ao regime

autoritário, na crítica da Geografia, enfim, já é resultado de um processo mais

amplo de crítica.

Este é o primeiro elemento de sua avaliação. Nós concordamos com a idéia da

presença de dirigismo ideológico nos currículos de Geografia? O que significa




                                         28
propostas curriculares com forte dirigismo ideológico? Vamos pensando sobre

isso para o debate.

E combinado com isso, ao par disso, afirma o autor que a “sobrevivência de

posturas tradicionais e um elevado grau de incoerência epistemológica”

marcam as propostas curriculares.

Então, vejamos: em primeiro lugar, o que pode significar dirigismo ideológico,

inserido no debate ideológico do Capitalismo e do socialismo, da sociedade de

classes? Consideramos que o autor se referiu ao debate da relação da

Geografia com o Marxismo. Combinado com o dirigismo, há incoerência

epistemológica. Ao perguntar aos nossos alunos – e costumo fazer isso na

graduação – a razão da escolha da carreira de professor de Geografia, muitos

respondem que foi porque um professor do terceiro ou do segundo ano do

ensino médio, muito crítico, o despertou para o pensar a sociedade. Então, de

certa forma, esta Geografia ensinada na década de 80 e 90, tem dentro de si

um grande teor de crítica social, de crítica ideológica, que o professor Robert

Moraes acha exagerado no sentido militante do termo.

A minha opinião é que o currículo – a sua construção – é, por essência, uma

relação de poder, de escolha, de estabelecimento de prioridades, vale dizer, de

reprodução de visões de mundo. Portanto, aquilo que faz parte dele não pode

constituir-se, digamos assim, em seu maior problema; sobretudo quando se

considera, como o próprio Moraes, a conjuntura de combate com outras

concepções ideológicas naquele momento da história brasileira.

Por outro lado, concordamos com o autor quanto às estranhas carências

epistemológicas da Geografia e sua permanência no que denominamos de




                                      29
“Geografia Crítica”; ou seja, nós ainda patinamos em termos de conceitos. Ora,

nós confundimos paisagem com espaço, espaço com região, região com

território, território com lugar, lugar com paisagem, de forma que a crítica social

não foi acompanhada de uma crítica aos fundamentos teórico-metodológicos.

Então, considero que é a isso que ele está se referindo e concordo com ele, em

parte. Em parte porque a crítica da Geografia não foi levada às últimas

conseqüências – a crítica da alienação burguesa – transformando-se a

Geografia Crítica em um rótulo, em uma nova oficialidade curricular e didática.

Depois, o professor Moraes apresenta suas concepções e pressupostos de

análise, os pontos de vista, a partir dos quais, fez a avaliação dos currículos. O

autor confronta dirigismo ideológico com pluralismo de idéias. O que nos leva a

entender que dirigismo ideológico significa, na verdade, que as propostas

curriculares assumem apenas uma metodologia ou uma concepção teórica

exclusiva, ao contrário de concepções teóricas mais variadas. Então há um

confronto entre uma proposta de dirigismo ideológico e outra de pluralismo de

idéias. E, conseqüentemente, a partir disso, o autor estabelece a sua critica ao

dogmatismo. Ou seja, se tem uma proposta que é o Marxismo, ou que não

seja, mas que se assume como única, ela acaba por assumir fóruns de

verdade, de verdade absoluta inquestionável. Segundo ele, é importante

colocar no mesmo estatuto, valorizar da mesma forma, os aspectos sociais,

valores do mesmo calibre, utopias igualitárias do pensamento crítico social e

respeito às individualidades, respeito às diferenças. Ou seja, o dogmatismo e o

dirigismo ideológico, a que ele se referia antes, nessa avaliação, não estariam

respeitando a diferença e as individualidades. Por isso, então, que, acrescido à




                                        30
luta por igualdade social, há uma revalorização da idéia de Democracia. Ou

seja, se a crítica social da pobreza e da exploração é importante, ela torna-se

limitada se não alcançar a crítica da política, do poder e da democratização,

segundo a avaliação do autor.

Para Moraes (1995) a posse dos conhecimentos englobados no ensino

fundamental formal “aparece, cada vez mais, como o qualificativo essencial

para a alocação dos indivíduos na sociedade e no mercado”. Desta forma,

considera o autor, que em um...

               "sistema democrático espera-se que o conteúdo deste
               aprendizado apresente um perfil crítico e pluralista, onde o
               aluno não apenas receba uma carga adequada de informações
               factuais e técnicas, mas também todo um instrumental teórico
               que lhe ajude a interpretar o mundo e a se posicionar face aos
               fenômenos." (MORAES, 1995).

Assim, a escola – e a Geografia dentro dela – tem o papel de contribuir para

esse acesso gratuito de conhecimentos que qualificam as pessoas para o

mercado, vale dizer, para a sociedade de mercado capitalista. Voltamos aqui

ao significado do termo dirigismo ideológico, da manipulação das consciências.

Formar para o mercado burguês, de forma crítica e pluralista, não significa dar

uma direção, uma intencionalidade a nossa prática e, conseqüentemente, à

história humana? Por outro lado, considero que tudo que fazemos na escola

forma consciência, constitui direções, desde os óculos que nós usamos ou os

sapatos, a maneira como nos vestimos, a maneira como falamos, até os

conteúdos que porventura desenvolvemos com nossos alunos; tudo isso vai

produzindo/reproduzindo formas de sociabilidade. Então, em qualquer das

hipóteses, nós estamos dando uma direção às consciências.




                                       31
Bom, mas o que é a Geografia para o autor? Como ele analisou a Geografia

nos currículos oficiais brasileiros? Moraes identificou três denominações para

os conteúdos geográficos: Estudos Sociais, Integração Social ou Geografia;

embora, para ele, as três denominações não apresentem diferenças

substanciais quanto aos conteúdos propostos. Entretanto, esta ambigüidade,

na interpretação do autor, não constitui um problema menor. Por quê? Porque

diz respeito ao papel da Geografia nas Ciências Sociais e na interpretação da

realidade e, por conseguinte, na escola. Ou seja, é preciso verificar claramente

o papel da Geografia no conjunto das Ciências Sociais. Então, falar Estudos

Sociais ou Geografia não é uma questão pequena para o autor. Eu também

concordo. Veremos, mais adiante, que os textos que compõem os PCNs

reproduzem outras ambigüidades ao conceituar a Geografia.

Para Moraes, então, a Geografia faz parte de uma tradição discursiva sobre o

mundo, que conforma um campo de saber, um campo disciplinar circunscrito

aos estudos que tematizam o espaço, ou melhor, nas letras do autor,

tematizam a relação sociedade-espaço.

O autor afirma que, embora haja concordância entre os geógrafos sobre sua

temática de análise – o espaço – a “totalidade das propostas de currículo

analisadas encaixam-se na [resistente e não abandonada] busca de nexos

entre fenômenos naturais e fenômenos sociais”. Portanto, são duas

concepções de Geografia. Nós vamos ver que os PCNs oscilam entre ambas.

Segundo o professor, “as propostas curriculares analisadas apresentam

razoável similaridade de concepções e propósitos”. Além do dirigismo

ideológico, já comentado, há ainda similaridade nas concepções e objetivos da




                                      32
Geografia. O autor dividiu a sua síntese crítica em dois grandes grupos: “de um

lado as propostas que apresentam coerência interna e, de outro, as que podem

ser qualificadas como incoerentes”.

Enquanto as primeiras apresentam articulação entre objetivos, fundamentação

metodológica e conteúdos, o segundo grupo, mesmo assumindo proposições

críticas – discurso da crítica ao Capitalismo, à sociedade – reproduz programas

de corte bem tradicional, o que ele chama de Geografia Tradicional.

Segundo o autor, há um modelo que preside a organização dos conteúdos,

sobretudo nas séries iniciais (1ª a 4ª séries) que é a visão de círculos

concêntricos, de progressiva apreensão do espaço, seguindo a seguinte

seqüência de abordagem: “o indivíduo (unidade corpórea), a casa, a escola, a

rua, o bairro, o município e o estado”. Parte-se do espaço mais próximo e,

progressivamente, aumenta-se a escala de análise.

O autor afirma, entretanto, que, embora os programas tomem o espaço de

vivência mais próximo como um ponto de partida, eles não apresentam a

fundamentação teórico-metodológica da Fenomenologia e da chamada

Geografia Humanista que, para ele, “constituem orientação metodológica que

mais diretamente trabalha tal concepção na Geografia”.

Assim, para ele, a Fenomenologia é o suporte teórico metodológico

fundamental para pensar o próximo e o vivido. Nós concordamos com isso?

Avalio que, fundamentalmente, os PCNs constituam uma tentativa de construir

uma proposta curricular baseada na Fenomenologia. Tenho dúvidas se

conseguiram. Mas considero este aspecto lapidar, porque os PCNs estão todos

costurados por aí. É por isso, então, que os PCNs realçam muito o subjetivo, o




                                      33
indivíduo, a experiência, o vivido, a valorização do imaginário, a experiência

das pessoas. E aí eu quero reforçar a pergunta: o Marxismo tem contribuições

para pensar o indivíduo e seu espaço vivido, produzido e concebido? E outras

correntes do pensamento? Ou será apenas a Fenomenologia? A resposta dos

PCNs me parece que é, sobretudo, a Fenomenologia.

O autor afirma que esta ausência da Fenomenologia

               “contraria certa tendência mundial de tratar a questão do
               ensino fundamental de Geografia dentro de bases
               fenomenológicas, realçando os temas da consciência e
               representação do espaço como experiência de vida”.
               (MORAES, 1995).

Mas os temas da representação e da consciência não são, também, temas do

Marxismo? Entretanto, os temas da consciência e da subjetividade estão, nos

textos dos PCNs, vinculados às percepções individuais.

Outra questão apontada é a do lugar e do local, onde Moraes (1995) avalia,

negativamente, a idéia de uma proposta de círculos concêntricos, que parta do

local, da casa e depois vá ampliando os espaços até chegar ao espaço

brasileiro, na quarta série, ou ao espaço mundial, entre a quinta e a oitava

séries; pois o autor indaga sobre o “estatuto da realidade local num mundo

globalizado, ou em rápido processo de globalização”. Isso porque, segundo o

autor, o “mundo é bem mais do que a sua rua”. Conseqüentemente, é

necessário contemplar as escalas simultaneamente, combinando “os níveis

local/nacional/global”, através da idéia de um “espaço relacional” e da

“moderna noção de rede”.

Para o autor, as propostas possuem uma “grande confusão conceitual”, pois

juntam ou combinam conceitos provenientes de diferentes concepções

metodológicas como, por exemplo, espaço geográfico e produção do espaço


                                      34
ou modo de produção e gênero de vida, sem o aprofundamento teórico-

metodológico que esta articulação exige.

Para Moraes, as propostas curriculares padecem de uma revisão bibliográfica;

característica que os PCNs buscaram resolver. Apesar de falarem da

interdisciplinaridade, os documentos analisados acabam não transformando

isso em proposta curricular. Para ele,

                “os trabalhos interdisciplinares se alimentam de conhecimentos
                que lhes são prévios, gerados nos campos disciplinares, e,
                nesse sentido, não eliminam a especificidade de cada
                abordagem. Antes, têm o resultado destas como matéria-
                prima”. (MORAES, 1995).

Ou seja, na verdade, apostar na interdisciplinaridade não significa diluir a

Geografia, ou desfazê-la, ou fragmentá-la no processo de aproximação com as

outras ciências. Pelo contrário, nós vamos nos integrar com outras ciências

sabendo exatamente quem nós somos e o que queremos, ou seja, qual é o

aspecto da realidade que queremos avaliar, que como disse anteriormente,

para o autor, significa o estudo da relação sociedade-espaço. A partir daí, ele

indica três interfaces para a interdisciplinaridade: uma com a História, através

da formação dos territórios; outra com a questão ambiental, articulada com as

Ciências, a Biologia e, também, as representações do espaço com a Língua e

com a Literatura Portuguesa.

Em minha avaliação, estes aspectos anteriormente apresentados estão muito

presentes nos PCNs de Geografia – tanto nos da 1ª a 4ª , quanto nos da 5ª a

8ª séries – isto é, estão muito coerentes com essas avaliações e,

fundamentalmente, buscam respondê-la.

Então, o primeiro ponto de partida para nossa conversa é se nós concordamos

com essa avaliação? Concordamos em parte? Concordamos com o seu núcleo


                                         35
fundamental de argumentação? Esse é o primeiro ponto de partida para o

debate.

Eu queria antecipar a minha opinião. Considero que, ao se referir à questão do

dirigismo ideológico, o professor Moraes está se referindo, sobretudo, a

proposta curricular do estado de São Paulo; que também teve participação, em

sua elaboração, de professores da Universidade de São Paulo. Então, me

parece (eu queria ter estado aqui no debate com o professor Robert Moraes,

mas não pude) que, na verdade, trata-se de um debate entre duas partes, ou

dois grupos, do Departamento de Geografia da USP. Embora considere o

economicismo que marca a proposta curricular do estado de São Paulo e,

assim, esta qualidade de dirigismo ideológico, não concordo que isto tenha

ocorrido de forma generalizada, como o autor está afirmando. E mesmo, o que

significa isso? Se pensarmos no título do livro do professor Moraes, em que ele

rotula, na minha avaliação, de Geografia Tradicional tudo o que passou, e de

Geografia Crítica o que é atual, considero, isso sim, o supra-sumo do dirigismo

ideológico. De qualquer forma, foi aquele o momento histórico em que o livro

estava sendo escrito, no combate com a Geografia mais clássica, no combate

dentro da AGB, dentro dos Departamentos; então é compreensível relacionar

àquele combate, tudo que estava se passando. Assim, eu acho que o

fundamental da crítica das propostas curriculares não cabe aí. O lugar da

crítica não é esse.

Mas vamos então agora aos PCNs.




                                      36
PCNs de Geografia: ecletismo ou confusão teórico-metodológica



Queria começar pelo conceito de Geografia. Eu fui peneirando os PCNs para

achar este conceito, que é o ponto de partida. E aí, considero que os PCNs não

respondem a uma questão que o Robert Moraes colocou em seu texto, que

considero fundamental: o de definir, claramente, de que se trata a Geografia.

Então, para os PCNs:

                "A Geografia estuda as relações entre o processo histórico que
                regula a formação das sociedades humanas e o funcionamento
                da natureza, por meio da leitura do espaço geográfico e da
                paisagem.
                A divisão da Geografia em campos de conhecimento da
                sociedade e da natureza tem propiciado um aprofundamento
                temático de seus objetos de estudo. Essa divisão é necessária,
                como um recurso didático, para distinguir os elementos sociais
                ou naturais, mas é artificial, na medida em que o objetivo da
                Geografia é explicar e compreender as relações entre a
                sociedade e a natureza, e como ocorre a apropriação desta por
                aquela.
                (...)
                Identificar e relacionar aquilo que na paisagem representa as
                heranças das sucessivas relações no tempo entre a sociedade
                e a natureza é um de seus objetivos.
                (...)
                A preocupação básica é abranger os modos de produzir, de
                existir e de perceber os diferentes espaços geográficos; como
                os fenômenos que constituem as paisagens se relacionam com
                a vida que as anima." (PCNs: 1997, 109)

                "A Geografia estaria, então, identificada como a ciência que
                busca decodificar as imagens presentes no cotidiano,
                impressas e expressas nas paisagens e em suas
                representações, numa reflexão direta e imediata sobre o
                espaço geográfico e o lugar." (PCNs, 1997: 112/113)

Nos PCNs (1999) de Geografia para o terceiro e quarto ciclo do ensino

fundamental (5ª à 8ª séries), os autores assim definem a Geografia:

                "Área de conhecimento comprometida em tornar o mundo
                compreensível para os alunos, explicável e passível de
                transformações (...) em sua meta de buscar um ensino para a
                conquista da cidadania brasileira e (...) em prol da
                democratização da escola. (...) Seu estudo proporciona aos


                                        37
alunos a possibilidade de compreenderem sua própria posição
               no conjunto de interações entre sociedade e natureza.
               A Geografia tem por objetivo estudar as relações entre o
               processo histórico na formação das sociedades humanas e o
               funcionamento da natureza por meio da leitura do lugar, do
               território, a partir de sua paisagem." (PCNs, 1999: 26)

Não vou fazer comentários sobre a vinculação escola-cidadania, dos limites

políticos do conceito de cidadania. Não vou me referir a isso neste momento.

Identificamos, pelo menos, três conceitos de Geografia, provenientes de

diferentes matrizes teórico-metodológicas: o que define a Geografia como o

estudo da relação homem-meio (homem-natureza, sociedade-natureza), o que

a define como o estudo da paisagem, e, finalmente, o conceito que define a

Geografia como o estudo da produção do espaço.

Qual é o problema? Na falta de articulação clara e explícita das contribuições

das diferentes concepções de Geografia, o que se reproduz é a imprecisão e a

ambigüidade. Como selecionar/hierarquizar os conceitos e conteúdos de forma

coerente, se não sabemos onde queremos chegar, sem ter certeza da pergunta

que queremos responder?

Por outro lado, a definição da Geografia como o estudo da relação

sociedade/natureza nos parece muito abrangente, pois, a rigor, esta temática é

comum ao conjunto das ciências, além de outras formas de conhecimento. A

Economia, a História, a Biologia, também estudam a relação sociedade-

natureza, mas cada uma por um viés particular. Então, na verdade, este

conceito não nos ajuda em várias coisas: uma é na identificação do nosso

papel dentro do conjunto das ciências e, outro, é no melhor entendimento dos

conceitos geográficos. Ou seja, os textos dos PCNs não conseguiram




                                      38
responder a uma indicação, proposta pelo professor Moraes (1995): a de nos

identificar enquanto um campo do conhecimento.

Por outro lado, fragmentar sociedade e natureza, mesmo apresentando o álibi

didático, tem sido a tradição do discurso clássico da Geografia que,

contraditoriamente, se reivindica como o estudo da relação sociedade-

natureza.

A identificação de nosso objeto de estudo, não podemos esquecer, só será útil

se o utilizarmos para a interpretação do seu sujeito. Entretanto, se o objeto de

estudo se perde na dispersão e empiricidade dos conteúdos, o sujeito – o ser

humano – não passará de mais um dos seus conteúdos.

Mas os autores dos PCNs apresentam as idéias de espaço e de espacialização

dos fenômenos, articulados aos conceitos geográficos de paisagem, território e

lugar. Para eles:

                "o estudo da paisagem local, global não deve se restringir à
                mera constatação e descrição dos fenômenos que a
                constituem. Será de grande valia pedagógica explicar e
                compreender os processos de interação entre a sociedade e a
                natureza, situando-as em diferentes escalas espaciais e
                temporais, comparando-as, conferindo-lhes significados. O
                ensino da Geografia, nesses ciclos, pode intensificar ainda
                mais a compreensão, por parte dos alunos, dos processos
                envolvidos na construção das paisagens, territórios e lugares.
                A preocupação da Geografia é com o espaço terrestre."
                (PCNs, 1999)

Como estamos “acostumados” com a ambigüidade conceitual, utilizamos, com

o mesmo sentido, conceitos que não correspondem à mesma coisa: espaço

terrestre, espaço geográfico, relação sociedade/natureza não são a mesma

coisa.

Para os autores, é “na construção do território, como parte integrante da

sociedade humana e suas interações dinâmicas, que se fundamenta o conceito


                                        39
de espaço geográfico, como uma categoria no interior das ciências humanas e

sociais”. Assim, ficamos em dúvida se a Geografia é o estudo da relação

sociedade/natureza, do espaço ou do território. Gostaria de conversar com

vocês sobre isso. Mas os autores voltam a afirmar que é essencial que não se

perca de vista que o seu objeto de estudo, e de ensino, é o espaço geográfico

(voltou ao espaço), seu território, paisagens e lugares. Procuram trabalhar com

a busca da compreensão, da diversidade das paisagens e lugares onde o

modo de vida, a cultura e a natureza interagem.

Então, na minha avaliação, eu vou voltar mais uma vez, os PCNs não resolvem

um problema que é chave: o que se quer com esse campo do saber, com esse

campo disciplinar que é a Geografia. E, me parece, também, que nós já temos

elementos bastante interessantes para pensar a questão da sociedade e do

seu espaço, que o próprio professor Moraes (1995) fez referência. Temos a

obra do Milton Santos e outras que nos dão elementos importantes para pensar

a Geografia como um discurso sobre o homem, sobre o ser humano

produzindo o seu espaço. Porque é isso que nos diz respeito. A Geografia é

um discurso sobre a condição humana, através de um dos caminhos da

produção da condição humana, que são as práticas espaciais da sociedade.

Isso é relação homem/natureza? É também. Mas, a nossa questão, acho que é

pensar o homem e a sociedade através da produção do espaço e, a partir daí,

pensar as categorias geográficas.

Agora, o problema dessa imprecisão, eu queria adiantar, é que na verdade nós

carecemos de discutir e entender o que é o espaço. Quando falamos espaço

terrestre, espaço natural ou espaço geográfico, estes termos não significam a




                                      40
mesma coisa. Se pensarmos espaço natural, nós podemos pensar o espaço

anterior à existência humana, não é isso? O espaço natural, o espaço da

natureza. Mas se eu estou chamando de Geografia o que diz respeito à

sociedade humana, cria-se uma confusão teórica que é preciso esclarecer.

Bom, de que se trata, então? É um espaço como existência humana ou não é,

afinal de contas? É o espaço terrestre que parece esse espaço natural anterior

ao próprio homem? Ou seja, do que se trata?

Em função dessa imprecisão conceitual da Geografia, e conseqüentemente do

espaço, o que vem depois piora, ou seja, os conceitos que os PCNs nos

trazem. O que considero como um ponto positivo, a recuperação dos conceitos

geográficos, que nos ajudam a focalizar o olhar geográfico sobre a realidade,

acaba por nos confundir. Os conceitos centrais da Geografia, eleitos pelos

autores dos PCNs, são: paisagem, território/territorialidade e lugar (Quadro 1).

Em primeiro lugar, cabe uma pergunta: são estes os conceitos centrais da

Geografia? São os conceitos fundamentais? Não caberia discuti-los? Não

poderiam ser outros? Mas estes foram eleitos. Estou me referindo também,

neste momento, aos critérios de construção dos PCNs e a maneira de elaborá-

los. Embora não possamos creditar ao professor Moraes os problemas teórico-

metodológicos dos PCNs, o ponto de partida para sua elaboração foi a

avaliação dos currículos brasileiros de Geografia produzida por apenas um

intelectual. E o texto dos PCNs foi construído por outros dois professores,

sendo que os três são membros do Departamento de Geografia da

Universidade de São Paulo.




                                       41
Esses conceitos realmente permitem pensar a experiência concreta de vida?

Mas a experiência concreta de vida dos nossos alunos, o vivido, não é o vivido

do espaço do Capitalismo? E aí o Marxismo não tem contribuições para a

analise da experiência de vida do Capitalismo? Embora os autores façam

referência a importância do Marxismo para a Geografia, a sua contribuição

para tal análise é descartada. Enfim, essas são perguntas para alimentar o

nosso debate.

A Geografia é considerada como um discurso sobre o espaço – dentro dos

PCNs está essa idéia, mesmo que vagamente – sem que este conceito esteja

incluído como um dos fundamentais. Onde está o conceito de espaço? Por que

essa fuga do conceito de espaço? Em minha avaliação da “Geografia Crítica”,

ou qualquer nome que se queira dar, ou avaliando a Geografia que se ensina

nessa renovação, considero que está aí um dos problemas fundamentais: nós

fugimos da discussão do conceito de espaço. E aí vamos discutir o território, a

paisagem, o lugar, sem ter resolvido esse problema que, para mim, é anterior.

Porque, se nós chamamos esses conceitos – território, territorialidade,

paisagem, lugar – de geográficos, e são conceitos geográficos, tem que

haver, entre eles, algo de comum, para que eu afirme que eles são

geográficos. O que há de comum entre território, territorialidade, paisagem e

lugar? Porque no fundo, no fundo, o que há de comum entre eles, o que deve

haver de comum entre eles, é justamente a idéia de espaço, ou o conceito de

Geografia. E, aí, os PCNs não nos ajudam nesta reflexão. Aliás, pelo contrário,

nos confundem mais do que nos esclarecem. Eu estou dizendo eles nos




                                      42
confundem aqui no Rio de Janeiro, diria também que em São Paulo, então eu

acho que a confusão, aí, pode ser muito pior em outros lugares do Brasil.

A confusão e a imprecisão conceituais, apontados pelo professor Moraes

(1995), também se reproduz nos conceitos de paisagem, lugar e território que

ora se diferenciam, ora se confundem. O território parece ser a relação

sociedade/natureza e, por outro lado, o conjunto das paisagens; parece, às

vezes, que território é espaço e, ainda, lugar. Ainda incorpora as idéias de

Milton Santos (1996) e apresenta o conceito de território como o sistema de

objetos e, assim, a Geografia ora é compreendida como o estudo do território,

ora como o estudo do espaço. O mesmo acontecendo com os conceitos de

paisagem e lugar.

A paisagem, para os autores, é “algo criado pelos homens, é uma forma de

apropriação da natureza”. Se, em lugar de paisagem, afirma-se que o espaço é

algo criado pelos homens e é uma forma de apropriação da natureza, os dois

conceitos teriam o mesmo sentido.

E finalmente o conceito de lugar. Para os autores, o “sentimento de pertencer a

um território, e à sua paisagem, significa fazer deles o seu lugar de vida e

estabelecer uma identidade com eles”.

Os conceitos são permeados pela idéia de subjetividade, imaginário,

concedendo um peso muito forte ao espaço vivido, ao espaço da experiência

imediata, que, embora possa se transformar em uma contribuição, não deve se

limitar a isso. O espaço é vivido, é experienciado, mas é também concebido, é

também produzido. E produzido e concebido de acordo com o que é a

sociedade e construindo-se enquanto sociedade. E aí não dá para fugir da




                                        43
escala global, se refugiar na escala local, sem fazer análise do Capitalismo

enquanto tal. Em função do Marxismo, que influenciou o pensamento

geográfico, não ter realçado os aspectos da subjetividade humana, e ter

privilegiado as categorias da luta de classes ou as categorias econômicas, o

que se propõe agora é jogar a água suja fora com o bebê.

Eu vou encerrando por aqui, queria só fazer algumas considerações finais. Do

meu ponto de vista, os PCNs nos confundem mais do que nos ajudam.

Considero que os aspectos da consciência, do vivido, da experiência de vida,

que a Fenomenologia nos traz como uma reflexão, são importantes e não

devem ser desprezados, pois dizem respeito à condição humana. Mas, de

certa forma, os PCNs não nos ajudam nessa reflexão. Porque se nós ainda

entendemos que o homem é essa síntese da objetividade/subjetividade, as

duas dimensões são fundamentais para entendê-lo e, portanto, a produção do

seu espaço e vice-versa. Então, talvez seja interessante começarmos a

debater a relação entre a Fenomenologia e o Marxismo, que considero um

caminho interessante. Não é jogar as duas coisas no mesmo saco, mas

conversar sobre a relação entre essas coisas. Mas, o peso dado aos PCNs é o

peso do indivíduo e da individualidade e, aí, me parece que cai, sobretudo, na

concepção liberal de homem, de sociedade, de indivíduo e que perde de vista

vários aspectos que também são importantes. Porque se nós somos sexo,

etnia, gênero, nós ainda continuamos sendo classe, porque o Capitalismo

ainda continua sendo a luta de classes. Talvez aí seja o nosso ponto de

conversa com os PCNs e com as propostas curriculares. Pensar a condição

humana e, sobretudo, pensar a crítica à sociedade capitalista – aliás é assim




                                      44
que eu entendo a crítica: a crítica para mim deve se confundir com a crítica à

sociedade capitalista – a partir destas contribuições do vivido, do concebido, do

produzido, como, de certa forma, uma parcela de geógrafos vem buscando

apresentar nestes anos de renovação.

Para finalizar, apenas um comentário sobre a estrutura temática dos PCNs.

Quando analiso os conteúdos (página 40 do documento), percebo problemas

maiores. Por quê? Nos eixos temáticos, colocados para o terceiro ciclo, estão:

“a Geografia como uma possibilidade de leitura e compreensão do mundo”; “o

estudo da natureza e a sua importância para o homem”; “o campo e a cidade

como formações sócio-espaciais”; “a cartografia como instrumento de

aproximação dos lugares e do mundo”. (PCNs, 1999: 40).

Mais uma vez se reproduz a questão teórica do “lugar” da natureza nos

estudos geográficos que, nos PCNs, aparece apartada das questões

relacionadas    ao   lugar,   a   paisagem,   ao    território,   ao   espaço   e,

fundamentalmente, ao próprio homem.

Embora considere a cartografia como instrumento da análise geográfica da

realidade, tenho dúvidas, como apontado por Sposito (1999), se ela deva se

transformar em uma temática do programa, ou deva permear todo o currículo

de Geografia.

De qualquer forma, essa distribuição dos eixos temáticos nos faz pensar nas

velhas fragmentações homem/natureza, sociedade/espaço, que conhecemos e

criticamos bastante, mas que, ainda, são nossos fantasmas.




                                       45
Conclusão



Para finalizar, diria que os PCNs, do ponto de vista de seu conteúdo teórico,

constituem um documento a mais para o debate. Não é o principal, não é o

único, mas é um documento para o debate, para a reflexão. Observando as

propostas de Geografia do Colégio Pedro II, dos municípios do Rio de Janeiro

e de Niterói, os PCNs não trazem muitas novidades. Quando observo os livros

didáticos de primeira à quarta série – e os currículos que lhes são apenas

cópias – verdadeiros amontoados de conteúdos geográficos, considero que os

PCNs podem significar algum avanço. Porque em muitas obras didáticas não

há perguntas, questões a responder, a problematizar, mas apenas conteúdos

com pouca ou nenhuma articulação.

É lamentável que os autores dos PCNs, utilizando-se, mesmo que

confusamente, dos temas e debates que vinham sendo travados, desde o final

da década de 1970, nos Departamentos, nos Congressos da AGB, não nos

permitiram o papel de interlocutores.

Do ponto de vista da política educacional, os PCNs assumem um caráter

perverso, dado que o próprio MEC explicita que a política de currículo lança

luzes para as políticas do livro didático, de formação de professores, de

avaliação externa. Então, todos os problemas que possamos identificar nos

PCNs, com certeza, trarão conseqüências para esses outros campos de nossa

atuação política e profissional.

A Geografia deveria ser um discurso sobre a condição humana, pelo viés de

sua espacialidade. Quando Milton Santos insiste nisso, eu acho que não é por




                                        46
capricho, mas porque cada vez mais a nossa experiência de vida é o espaço,

não é mais aquela natureza pretérita, passada, natural. Cada vez mais o

espaço é a sociedade. O espaço cada vez mais denso de História, de

sociedade e de técnica. E mais, o mundo hoje tem a cara da escala, que é um

conceito que nos é muito próximo. Então, analisar a condição humana, nessa

virada de século, pelo instrumental da Geografia, é uma coisa que não

podemos perder de vista. Mas nós temos que aprofundar o debate sobre o que

é espaço, sobretudo porque ainda vigora entre nós a idéia do espaço absoluto,

aquele espaço eterno, que existe independente da ação humana, anterior a ela

e que, portanto, impõem-se ao homem como condição eterna, Ou seja, nós

ainda não conseguimos visualizar o homem em nossas análises do espaço.

Para finalizar, diria o seguinte: eu vinha para cá ouvindo o Cartola, o que me

despertou para o debate sobre a condição humana, sobre tudo isso de que

tratamos, sobre a Fenomenologia. Assim, gostaria de construir, numa mesa, a

crítica da sociedade, que fosse a síntese das idéias de Marx e Rosa

Luxemburgo - crítica à sociedade capitalista - do Guevara - um homem que

viveu, construiu a revolução - do Cartola - biscateiro e poeta da Mangueira - e

do Noel Rosa - poeta da Vila Isabel. De maneira que ela seja construída, de

onde viesse - do gênero, da raça, do lugar, da crítica política, da crítica

ideológica, da cultura - como, fundamentalmente, crítica à alienação humana

na sociedade capitalista, que ainda precisa ser transformada.




                                      47
Quadro 1

                          Os Conceitos Geográficos nos PCNs



                                         Território

Área de vida em que a espécie desempenha todas as suas funções vitais ao longo do seu

desenvolvimento. Território é o domínio que os animais e as plantas têm sobre porções

da superfície terrestre (Biologia, séc. XVIII. Augusto Comte incorporou aos estudos da

sociedade).

Apropriação do espaço, ou seja, o território, para as sociedades humanas, representa

uma parcela do espaço identificada pela posse. É dominado por uma comunidade ou por

um Estado (Geografia, Ratzel). Na geopolítica, o território é o espaço nacional ou a área

controlada por um Estado-nacional: é um conceito político que serve como ponto de

partida para explicar muitos fenômenos geográficos relacionados à organização da

sociedade e suas interações com as paisagens. (p. 27).

O território é uma categoria fundamental quando se estuda a sua conceitualização ligada

à formação econômica e social de uma nação. Nesse sentido, é o trabalho que qualifica o

território como produto do trabalho social.

Além disso, compreender o que é território implica também compreender a complexidade

da convivência, nem sempre harmônica, em um mesmo espaço, da diversidade de

tendências, idéias, crenças, sistemas de pensamento e tradições de diferentes povos e

etnias.

O território refere-se a um campo específico do estudo da Geografia. Ele é representado

por um sistema de objetos fixos e móveis, como, por exemplo, o sistema viário urbano

representando o fixo e o conjunto dos transportes como os móveis. (p. 28)

Pode até mesmo ser considerado o território como o conjunto de paisagens.




                                              48
Territorialidade

É fundamental reconhecer a diferenciação entre a categoria território e o conceito de

territorialidade. Enquanto a categoria território representa para a Geografia um sistema de

objetos, sendo básica para a análise geográfica, o conceito de territorialidade representa

a condição necessária para a própria existência da sociedade como um todo.



                                        Paisagem

Compreensão subjetiva da paisagem como lugar, o que significa dizer: a paisagem

ganhando significados para aqueles que a constroem e nela vivem; as percepções que os

indivíduos, grupos ou sociedades têm da paisagem em que se encontram e as relações

singulares que com ela estabelecem. (p. 27). Pode até mesmo ser considerado o território

como o conjunto de paisagens. A paisagem é algo criado pelos homens, é uma forma de

apropriação da natureza.

A paisagem é definida como sendo uma unidade visível do território, que possui

identidade visual, caracterizada por fatores de ordem social, cultural e natural, contendo

espaços e tempos distintos; o passado e o presente. A paisagem é o velho no novo e o

novo no velho!

Quando se fala da paisagem de uma cidade, dela fazem parte seu relevo, a orientação

dos rios e córregos da região, sobre o quais se implantaram suas vias expressas, o

conjunto de construções humanas, a distribuição de sua população, o registro das

tensões, sucessos e fracassos da história dos indivíduos que nela se encontram. É nela

que estão expressas as marcas da história de uma sociedade, fazendo assim da

paisagem um acúmulo de tempos desiguais. (p. 28)




                                           49
Lugar

A categoria paisagem, por sua vez, também está relacionada à categoria lugar, tanto na visão

da Geografia Tradicional quanto nas novas abordagens. O sentimento de pertencer a um

território e a sua paisagem significa fazer deles o seu lugar de vida e estabelecer uma

identidade com eles. Nesse contexto, a categoria lugar traduz os espaços com os quais as

pessoas têm vínculos afetivos: uma praça onde se brinca desde criança, a janela de onde se

vê a rua, o alto de uma colina de onde se avista a cidade. O lugar é onde estão as referências

pessoais e o sistema de valores que direcionam as diferentes formas de perceber e constituir a

paisagem e o espaço geográfico. É por intermédio dos lugares que se dá a comunicação entre

o homem e o mundo.



Bibliografia

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    de Educação Fundamental – MEC/SEF, 1ª à 4ª séries, 1997.

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Geografia. Brasília: Secretaria de
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    Campinas: Papirus, 1988.

MARX, K. Manuscritos económicos-filosóficos. Lisboa: Edições 70, 1989.

MORAES, A. C. R. "Propostas Curriculares de Geografia". In "As Propostas
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   Carlos Chagas, Departamento de Pesquisas Educacionais, Projeto
   MEC/UNESCO/FCC: Subsídios à elaboração dos PCNs, 1995.

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SPOSITO, M. E. B. "Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino de Geografia:
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     – parâmetros curriculares e Geografia. São Paulo: Contexto, 1999.




                                             50
O livro didático e a construção do conhecimento no ensino de Geografia

                          nas séries iniciais do Ensino Fundamental



                                                                  Irene de Barcelos Alves3



Nossa história com o livro didático para as primeiras séries do Ensino

Fundamental, em parceria com a professora Marília Bacellar, teve início

quando participamos do trabalho de reformulação curricular do ensino de

Geografia na rede pública municipal do Rio de Janeiro, no final da década de

1980. Trabalho este realizado em duas fases, do qual participei apenas da

primeira. Foi a partir do contato com professores de todo o Ensino

Fundamental, que identificamos as dificuldades que encontram no trabalho

com as disciplinas de História e Geografia, uma vez que, em geral, são

carentes de uma formação especifica nessas áreas. Faltavam-lhes os

conceitos básicos das disciplinas. Por outro lado, são professores que têm uma

maior disponibilidade de tempo, um maior contato com as crianças e uma

formação que lhes confere um domínio didático que o professor de 5 a a 8a

séries, muitas vezes, não dispõe. Esta carência na formação dos professores a

partir da 5a série, decorre do modelo adotado pelas Universidades que não os

prepara para este convívio com a criança, nem para a criação de trabalhos

adequados à faixa etária dos menores, tão pouco para o trabalho lúdico na sala

de aula etc.

Surgiu, daí, a necessidade de elaborar um livro que contemplasse a base

teórico-conceitual, através dos conceitos fundamentais de História e Geografia,
3
    Professora do Centro Federal de Ensino Tecnológico – CEFET.


                                                  51
adequando-os à prática didática do professor das primeiras séries do Ensino

Fundamental. Em nossa concepção, o professor de 1 a a 4a séries não vai

desenvolver a História e a Geografia, mas construir os alicerces fundamentais

para a aprendizagem dessas disciplinas. Na realidade, ele vai apresentar os

conceitos e desenvolver as habilidades que, mais tarde, os professores do

segundo segmento irão ampliar. Considerando que as duas disciplinas ainda

são trabalhadas em conjunto, mesmo que já se discuta no MEC a separação,

priorizamos os seguintes conceitos na construção da coleção de livros:

trabalho, natureza, espaço, grupos sociais/sociedade, tempo e cultura.

Estes conceitos são apresentados através de uma série de atividades

propostas que possibilitam sua compreensão pela criança. O conceito de

espaço, por exemplo, tão importante para a Geografia, é apresentado e

trabalhado a partir das vivências espaciais dos próprios alunos, partindo-se

sempre do mais próximo e conhecido para, depois, trazer realidades mais

distantes.

E quanto às habilidades: quais são aquelas fundamentais para serem

desenvolvidas nessa faixa etária? Em termos gerais, trabalhamos com

classificação, ordenação, orientação e localização, levando o aluno a observar

mudanças e permanências, bem como estabelecer relações que possibilitem

algum grau de análise e posicionamento crítico perante fatos e situações.

Contudo, ao longo do trabalho com os conceitos geográficos, há uma

habilidade que se torna fundamental: é a capacidade de leitura e confecção de

mapas. É transformar o aluno em um sujeito mapeador, capaz de elaborar e ler




                                     52
mapas. Também é importante o resgate da história dos mapas e seu papel

fundamental na conquista e domínio do território.

O desenvolvimento da habilidade de leitura de mapas é um dos grandes eixos

de introdução ao saber geográfico nos primeiros anos do Ensino Fundamental.

As dificuldades que depois surgirão, para a leitura e interpretação dos mesmos,

decorrem da não realização/efetivação destes procedimentos. O aluno deve,

primeiro, se tornar um mapeador para, depois, ser capaz de compreender o

código formal que compõe o mapa. Para alcançar este objetivo, propomos a

elaboração de maquetes, confecção de plantas baixas, exercícios de

interpretação e localização, para que o aluno entenda a construção/

composição dos mapas através do uso da legenda e da escala. De início, o

aluno não domina todos esses elementos e a escala aparece como um

problema específico. O aluno não consegue realizar as operações matemáticas

de conversão. Isto acaba induzindo-o a decorar as relações métricas que a

escala representa, sem entender o que aquilo quer dizer. Se começarmos

medindo a sala de aula, utilizando objetos concretos como barbante e cabo de

vassoura, e depois relacionarmos as medidas encontradas com objetos

menores, como pedaços de pau, fósforo ou borracha, a criança será capaz de

perceber as relações de proporção, independente da operação numérica. Este

processo é gradual e, por vezes, o professor, na ansiedade de que o aluno

aprenda, acaba atropelando o tempo de aprendizado da criança. É necessário

sinalizar ao professor que a criança muitas vezes ainda não está madura para

a execução do raciocínio matemático formal, o que não impede a compreensão

do conceito.




                                      53
Inicialmente os alunos se encantam pelo estudo da História e da Geografia,

depois afirmam que ambas são disciplinas para decorar. O que acontece?

Percebemos que a resposta está nas estratégias e nos instrumentos que nós

passamos a utilizar. Deixamos de observar o cotidiano e supervalorizamos o

texto formal, como se o texto em si encerrasse toda a percepção da Geografia.

A partir desta constatação, procuramos resgatar outras linguagens. A presença

do lúdico, dos trabalhos de campo e do estudo das artes procura tornar o livro

um veículo de informação e descobertas prazerosas. A inclusão do manual

procura dar ao professor um embasamento teórico para o desenvolvimento dos

conteúdos e atividades. É essencial que tanto o aluno quanto o professor se

sintam atraídos pelo livro.

Enfim, elaborar material didático é um trabalho de Penélope. É um processo de

construção ininterrupto e longo, num contínuo fazer e refazer para que haja a

possibilidade do aprender e de progredir. Esperamos que o livro didático,

especificamente a coleção de nossa responsabilidade, seja uma contribuição

para o professor, dando-lhe a oportunidade de ampliar ainda mais o seu

trabalho em sala de aula.




    A importância do ensino de Geografia no Ensino Fundamental e Médio




                                      54
Marília Gomes de Oliveira Bacellar 4



O objetivo de nossa presença neste encontro é de tentar trazer uma

contribuição ao ensino de Geografia, a partir de nossa experiência, acumulada

ao longo de muitos anos, como professora de Geografia no segundo segmento

do Ensino Fundamental, no Ensino Médio e no Ensino Superior em instituições

privadas.

Porque, e para que, fazer ou estudar Geografia?

As pessoas ainda não perceberam que a Geografia faz parte de nossas vidas,

de nosso cotidiano.

Há pouco tempo, um aluno de 7a série virou-se em sala e disse:

                     “Professora! A senhora poderia falar um pouco sobre aquele
                     ‘cara’ que tem um mapa na cabeça? Meu pai estava
                     conversando com alguns amigos e ele não sabia quem era. Eu
                     disse que iria perguntar para a minha professora que sabe
                     tudo!”

O conteúdo que estávamos trabalhando no momento era justamente Europa e

aproveitei para falar de Gorbatchev e de sua importância política, para que o

aluno pudesse “dar aula” ao pai.

Então, ele me disse: “Isto é muito importante! Vou ganhar pontos ‘à beça’ com

meu pai, se eu lhe ensinar tudo isso sobre aquele tal ‘homem com o mapa na

cabeça’.”

Outro exemplo, para mostrar como as pessoas, indiretamente, estão fazendo

Geografia, é o interesse nos conflitos do Oriente Médio. As lutas constantes

naquela região provocam curiosidade. Onde ficam Israel, Cisjordânia,

Palestina? Quem é Yasser Arafat?

4
    Professora do Centro Universitário Augusto Motta e do Colégio Pedro II.


                                                55
Se pensarmos nos trajetos que percorremos todos os dias, circulando pela

cidade e observando as mudanças que a paisagem sofre, estamos fazendo

Geografia; quando analisamos notícias de jornais ou acompanhamos em

tempo real, pela mídia, ações que estão acontecendo do outro lado do mundo,

estamos fazendo Geografia; quando saímos para trabalhar ou passear e

observamos o tempo, isso também é fazer Geografia, só que as pessoas não

percebem.

Então vejam! Para a escola, ensinar Geografia dessa forma é muito importante.

Ela não deve ignorar os conceitos espontâneos que o aluno possui, ou seja,

uma bagagem de conhecimentos adquiridos gradativamente ao longo da vida e

que não podem ser substituídos de uma hora para outra por conteúdos formais,

que para esse aluno não têm nenhum significado. Mesmo porque, o tempo de

permanência na escola é muito pequeno para que nossas “verdades

acadêmicas” tornem-se oficiais.

O papel da escola é transformar esses conceitos (geográficos) espontâneos,

principalmente no Ensino Fundamental, em conceitos científicos e habilidades,

tais como mapear o seu espaço na escola ou seu espaço de vida, incentivando

a sua transposição para o papel, com a criação de símbolos para os

“acidentes” que ele encontrar em seus trajetos e achar mais relevantes. Assim,

estará criando habilidades para, no futuro, perceber e ler legendas, interpretar

mapas etc.

Uma atividade muito utilizada para o ensino fundamental é fazer a criança

contar os componentes da turma, separando-os por sexo, idade, altura ou outro

parâmetro que o professor indicar e depois construir um gráfico bem simples e




                                      56
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Anais do Ciclo de Debates e Palestras sobre Reformulação Curricular e Ensino de Geografia

  • 1. Universidade do Estado do Rio de Janeiro Centro de Educação e Humanidades Colégio de Aplicação Fernando Rodrigues da Silveira Departamento de Ciências Humanas e Integração Social Anais do Ciclo de Debates e Palestras sobre Reformulação Curricular e Ensino de Geografia Organização: Cesar Alvarez Campos de Oliveira Miguel Tavares Mathias Rejane Cristina de Araújo Rodrigues Ronaldo Goulart Duarte Rio de Janeiro Departamento de Ciências Humanas e Integração Social / CAp-UERJ NAPE/DEPEXT/SR3 UERJ 2002 1
  • 2. Sumário Apresentação ................................................................................................... 04 A contribuição social do ensino de Geografia .................................................. 08 Antonio Carlos Robert Moraes Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Geografia: o ecletismo a serviço da alienação humana ............................................................................................ 27 Marcos Antônio Campos Couto O livro didático e a construção do conhecimento no ensino de Geografia nas séries iniciais do Ensino Fundamental ............................................................. 52 Irene de Barcelos Alves A importância do ensino da Geografia no Ensino Fundamental e Médio ........ 56 Marília Gomes de Oliveira Bacellar O exame vestibular e suas relações com o ensino de Geografia .................... 61 Ana Regina Vasconcelos Ribeiro Bastos 2
  • 3. Apresentação A educação no Brasil passa por um grande movimento de reestruturação. Há inúmeras demandas de ordem política, econômica e social, que impelem ações de reflexão e reestruturação, nem sempre com objetivos e valores convergentes. Todavia, este processo afeta a escola, desde sua estrutura organizacional e administrativa, até as propostas curriculares e práticas pedagógicas das diferentes disciplinas, incluindo, também, os preceitos da transdisciplinaridade. Frente a esse quadro, torna-se imperativo uma tomada de posição, definindo que escola, que ensino e que sociedade queremos. Diferentes governos vêem-se pressionados no sentido de oferecer educação formal a parcelas cada vez mais amplas da sociedade. Há desde interesses pragmáticos de renovação e qualificação de mão-de-obra, às reivindicações por cidadania ou por ressocialização de jovens marginalizados. Generaliza-se o conceito de inclusão que, para além da inserção dos indivíduos portadores de necessidades educativas especiais, propõe uma estrutura educacional abrangente, onde todas as diferenças - sociais, étnicas, culturais - se somem na construção de espaços coletivos mais democráticos, pluralistas e solidários. Em contraponto, o cotidiano escolar e sua realidade nos desafiam: desinteresse, evasão escolar, relações de ensino-aprendizagem tradicionais que não encontram nos alunos e suas famílias os elementos de apoio que no passado os tornavam satisfatórios, pelo menos para certos grupos sociais. Entre esses elementos, assumem fundamental importância o valor dado à educação e aos próprios professores. 3
  • 4. A agravar o quadro, a sociedade atual cada vez mais se estrutura com base na massificação do consumo e dos valores do capital – individualismo, competitividade, acumulação (de bens e poder). Soma-se a aceleração dos processos produtivos, substituindo trabalhadores, valores e padrões culturais, numa escala em que o tecido social não dispõe mais de tempo para assimilar e questionar. Cria-se uma constante tensão junto aos jovens: para que serve a escola? E também para os professores: o que, por que e como ensinar? Perguntamo-nos então: é possível construir uma escola capaz de enfrentar tais desafios? O que nos parece premente, é a necessidade de construir uma escola que, tanto em termos filosóficos, quanto acadêmicos e metodológicos, apresente uma proposta alternativa aos padrões tradicionais de ensino – reprodução, acúmulo de dados/informações – e às demandas imediatistas e pragmáticas do sistema econômico vigente. Todavia, como construí-la? Para a maioria dos professores esse movimento de mudança ainda é um salto no escuro. Frente a este pressuposto e às nossas próprias demandas por repensarmos nossos valores e práticas, é que nasceu a proposta de um Ciclo de Palestras focado no ensino e na estrutura curricular da Geografia. Deseja-se a mudança, precisa-se da mudança, mas, enquanto professores, sabemos que isso se dará de forma contínua, dialética, processual. Todavia, urge criar espaços de reflexão e troca, já que essa transformação só será efetiva quando se tornar coletiva. Um Colégio de Aplicação, por sua vez, tem funções específicas, caras frente à situação apresentada. Por um lado, é lócus de formação de mão-de-obra. O modelo de formação e atuação que é apresentado aos futuros professores, 4
  • 5. será fator condicionante para a construção de valores e práticas que os mesmos desenvolverão no mercado de trabalho. Isso implica repensar a concepção que temos acerca da formação de professores e que campo de estágio devemos oferecer. Por outro lado, põe em evidência nossas próprias práticas e o tipo de formação que oferecemos ao aluno do ensino fundamental e médio. Deve-se considerar, ainda, que o papel do Colégio transcende o atendimento aos alunos do ensino regular e a formação de professores. Como espaço de pesquisa e extensão, deve gerar e socializar conhecimento. O Ciclo de Debates e Palestras sobre Reformulação Curricular e Ensino de Geografia foi estruturado, dentro destes princípios, para aglutinar diferentes profissionais e instituições, de forma a apresentarem suas reflexões acerca dessas questões e as experiências e/ou propostas que apontam ou podem nortear a construção de uma nova postura do professor no ensino, em particular o de Geografia. Para tanto, além dos professores que desenvolveram palestras sobre os temas centrais elencados pela equipe organizadora, foram convidados professores de alguns dos principais colégios da cidade do Rio de Janeiro, para exporem seus encaminhamentos frente a essas questões, principalmente quanto à estrutura curricular adotada. Considerando que o principal fato político que medeia esse processo foi o lançamento dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), optamos por centrar as discussões nas propostas de implantação/assimilação dos mesmos, discutindo suas motivações políticas, dificuldades de execução, vantagens e desvantagens, espaços de ação e de resistência. 5
  • 6. Esta coletânea apresenta os textos referentes às palestras proferidas na abertura de cada encontro. O evento ocorreu no período de 18 de setembro a 16 de novembro, na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, promovido pelos professores de Geografia do Departamento de Ciências Humanas e Integração Social – DCHIS – do Colégio de Aplicação desta Universidade. Desejamos, em breve, dar continuidade a este trabalho, promovendo novos encontros e publicações, esperando contribuir para a construção de uma nova perspectiva no ensino de Geografia no Brasil. A todos os participantes do evento, nosso sincero agradecimento. Comissão Organizadora 6
  • 7. A contribuição social do ensino de Geografia Antonio Carlos Robert Moraes1 Mesmo não trabalhando diretamente com o ensino de Geografia, mantenho contatos com as discussões desta área, devido às demandas do meu campo de atuação na Universidade de São Paulo: o ensino de metodologia da ciência. Eu já tive uma experiência, mais ou menos antiga, de docência no ensino fundamental e médio e sou convidado, com alguma freqüência, para opinar sobre currículos e livros didáticos. Recentemente, realizei a avaliação dos currículos de Ensino fundamental para a Fundação Carlos Chagas, que serviria de subsídio para os Parâmetros Curriculares Nacionais, mas, não sei porque razão, o MEC “colocou a carroça na frente dos burros” e lançaram os Parâmetros Curriculares antes de publicarmos a avaliação dos currículos. Mas, foi um trabalho muito interessante, cobrindo o país como um todo, vendo, inclusive, a grande diversidade que há de estado para estado, em termos de conteúdo mínimo que é abordado pela Geografia. Será a partir dessa experiência que vou trazer algumas idéias e contribuições para o debate. Como as boas sessões são aquelas que geram polêmicas, vou começar a minha exposição com uma posição que defendo, já há alguns anos, que é, não somente, bastante polêmica nos fóruns da Geografia, como também minoritária. E eu gostaria de trazer isto, porque acho que é um ponto que vale a pena ser discutido e noto muitos setores da Geografia refratários, sequer dispostos a fazer esta discussão. 1 Professor da Universidade de São Paulo. 7
  • 8. Há muitos anos eu venho defendendo uma posição singular, que é a de uma maior diferenciação entre a formação do geógrafo e a formação do professor de Geografia. Eu acredito que na atual formação unificada, como no caso da USP, o diploma de Bacharel praticamente não se diferencia do diploma do Licenciado. O Licenciado faz apenas três ou quatro disciplinas a mais na Faculdade de Educação. Eu acho que essa foi uma ação excessivamente unificada (e estou tomando a USP como parâmetro) que, na verdade, traz malefícios à formação dos dois profissionais. Quando um determinado curso é voltado diretamente para um só desses profissionais, ou para o geógrafo ou para o professor de Geografia, o formando sai sem uma das duas habilitações. Já é um primeiro problema. Agora, problema maior é quando os cursos tentam cobrir as duas necessidades de formação. Na verdade, acaba-se tendo uma carga, às vezes, muito aprofundada de conteúdo em certos assuntos, ou de pouco conteúdo em outros. Vou explicar melhor: a formação, seja a do professor de Geografia, seja a do geógrafo, é muito pesada. São vários os campos de estudo, são várias as discussões que participamos, todas extremamente diferenciadas, indo desde diálogos com as Ciências Naturais até diálogos com as Ciências Sociais, passando pelo necessário diálogo com a área de Educação, no caso de quem será professor. Nesse sentido, com a tentativa de cobrir as duas coisas, acaba-se utilizando um tempo que seria melhor aproveitado, no meu modo de entender, num aprofundamento de cada uma das formações específicas. Por exemplo, no caso da USP, uma pessoa que vai ser professor acaba tendo conteúdo, talvez 8
  • 9. aprofundado demais, em sensoreamento remoto, em cartografia digital e, por outro lado, não temos uma disciplina no nosso currículo que aborde um tema fundamental para o professor e que poderíamos chamar de “didática cartográfica”. Isto é, aprender a utilizar um mapa como recurso educacional em uma sala de aula. Então o indivíduo vai aprender técnicas extremamente sofisticadas de cartografia digital e não sabe fazer o uso elementar de uma carta como recurso em sala de aula. Isso seria válido também para vários campos da Geografia Física que formam o indivíduo para ser um pesquisador altamente especializado como a Pedologia, a Climatologia etc., oferecendo conteúdos que dificilmente o professor utilizará em sala de aula e, por outro lado, deixando lacunas incrivelmente grandes e fundamentais na formação didático-pedagógica desse profissional. Muitos outros exemplos poderiam ser dados. Muitas vezes a indefinição propicia isso. Há professores que dão aula pensando que estão formando professores e há professores que dão aula achando que estão formando pesquisadores altamente especializados. E essa carga, que já é pesada nos dois casos, acaba gerando uma situação maléfica para a Geografia. Na verdade, na minha opinião, a recusa clara em discutir esse ponto nos fóruns de Geografia está associada a um conjunto de preconceitos e, porque não dizer, um certo conservadorismo e uma certa inércia das Instituições. Para não se promover essa discussão, se apresenta, como argumentação (que do ponto de vista abstrato é até simpática e charmosa), a velha idéia da unidade entre ensino e pesquisa, ou seja, a idéia de que ambos são indissociáveis. Isso é verdade, mas não anula a diversidade 9
  • 10. do campo onde se exerce o ensino e a pesquisa. Nós poderíamos falar, tranqüilamente, de uma unidade entre ensino e pesquisa, na pesquisa acadêmica da Geografia, e numa unidade entre ensino e pesquisa, no ensino da Geografia. Desse modo, tal argumento perderia totalmente a eficácia. Por exemplo, a área de ensino necessita ter um diálogo profundo, constante, com as próprias ciências da Educação e realizar pesquisas que apontem nesse sentido. Seja o professor de Geografia, seja o geógrafo profissional, ele tem um campo de interlocução bastante amplo. Na verdade ninguém consegue fazer, por exemplo, Geografia Econômica sem ter um diálogo razoável da Geografia com a Economia. Ninguém consegue fazer Geografia Política sem estabelecer um diálogo profundo com a Ciência Política. Ninguém consegue gerar uma boa Climatologia sem entrar no campo da Física e da Mecânica dos Fluídos. A mesma coisa é válida para o ensino. Uma reflexão profunda sobre o ensino de Geografia não pode, de modo algum, abrir mão de um diálogo constante com a Psicologia da Educação, com a Filosofia da Educação e todo um campo de diálogo necessário e extremamente grande, o que torna essa formação unificada ainda mais problemática. Em nome da unidade entre o ensino e a pesquisa, na minha avaliação, na maioria das Instituições, a área de ensino acabou ficando como uma espécie de apêndice do curso de Geografia. Isso é real, é uma constatação. Isso fica muito claro em algumas atitudes que são comuns no campo da atuação da Geografia. A primeira delas e que felizmente começa a mudar, mas que até cinco ou dez anos atrás era preponderante, podia ser visualizada muito bem na 10
  • 11. pós-graduação. Era o caso daquele professor de Geografia, que vivia como professor de Geografia, que era um profissional de ensino da Geografia e que, ao ir fazer a pós-graduação, adotava temas de grande especialização em alguma área de pesquisa da Ciência, temas profundamente estranhos ao seu cotidiano de trabalho docente. Isso era um quadro muito generalizado que, volto a dizer, por felicidade, está mudando e hoje há um volume muito maior de pesquisas de pós-graduação específicas a respeito do ensino de Geografia. Na verdade, por trás disso, ficava clara a desvalorização que o próprio profissional fazia do seu trabalho. Ele almejava fazer a “Grande Geografia”, como se esta fosse apenas a Geografia de pesquisa não ligada ao ensino e que trazia por contraste uma certa desvalorização do ensino de Geografia. Era como se o ensino da Geografia fosse uma espécie de “bico”, e o indivíduo ficava trabalhando até que encontrasse uma coisa melhor e a pós-graduação era vista como um caminho para sair da área de ensino. Acho que esse tipo de raciocínio estava presente na cabeça de muita gente e a não discussão das especificidades entre o ensino e a pesquisa acadêmica, no campo da Geografia, apenas escondia, ou então perpetuava, esse tipo de visão. Isso trouxe uma série de malefícios, principalmente para o ensino. O primeiro deles correspondia a uma postura, entendida por alguns como de vanguarda na área de ensino, de tomar as discussões de ponta da Teoria Geográfica e tentar repassar essas discussões para o ensino básico. Isso aconteceu muito no Brasil. Seria algo como se nós começássemos o ensino de Física e discutíssemos Mecânica Quântica e a Teoria dos Fractais. Quer dizer, você foca a discussão mais avançada na área e tenta “jogá-la” como conteúdo 11
  • 12. mínimo para a Educação Básica. Isso acarretou, entre outras coisas, algo que ainda se faz presente, que é uma ausência de “pedagogização” das teorias mais complexas da Geografia contemporânea. Não é raro encontrarmos em currículos ou em livros didáticos a tentativa de tirar a última teoria de Harvey ou do Milton Santos e aplicar isso em classes do ensino fundamental, o que é um despropósito total. Falta “traduzir” essas teorias, que são muito importantes, para que elas venham a iluminar o que seria um conteúdo básico de Geografia. Não dá para fazer uma transposição direta de uma discussão de ponta, de vanguarda sem nenhum tipo de “pedagogização” para o campo do ensino. Enfim, eu não aceito essa idéia da Educação como “bico” ou como uma área marginal do universo da Geografia. Essa coisa que você é professor até “melhorar de vida”. Isto é de uma perversidade social muito grande, pois o ensino, ao meu ver, é a tarefa socialmente mais importante da Geografia. Sem abrir mão dos outros campos, no que toca à incidência social, no que toca ao impacto social da Geografia, sem dúvida nenhuma, a área de ensino é prioritária. O professor de Geografia, nesse modo de entender, é mais importante do que o geógrafo. Não quero dizer que um prescinda do outro, mas, do ponto de vista social, o professor de Geografia é a figura essencial para a Geografia fornecer algo para o avanço social, para as discussões sociais. O geógrafo incide diretamente na formação social do cidadão. O professor de Geografia está participando com um conteúdo e com uma temática essencial na formação da cidadania. A visão de mundo do estudante-cidadão, a visão do 12
  • 13. país, a visão da realidade local em que ele vive, tudo isso está profundamente permeado pelo conteúdo da Geografia escolar. A auto localização do indivíduo no mundo é essencial na formação da sua consciência social. O indivíduo precisa se localizar no mundo em variadas escalas, para o entender e se entender nele. Então, na verdade, o conteúdo da Geografia ilumina uma série de campos que dizem respeito à construção de valores morais e à própria sociabilidade do indivíduo. Por isso, o professor de Geografia atua num terreno extremamente delicado, de alta responsabilidade social. Realmente, é uma tarefa extremamente importante, extremamente delicada e de uma responsabilidade social imensa, a respeito da qual nós temos que estar a todo o momento atentos. O professor de Geografia tem a necessidade de desenvolver o raciocínio crítico do aluno, porém, ao mesmo tempo, de fornecer-lhe um conjunto de informações fundamentais para ele entender o mundo. Ele não pode, de modo algum, passar uma visão fechada e sectária da vida social, isto é, uma explicação pronta e acabada da realidade, o que iria significativamente contra o desenvolvimento do raciocínio crítico. Ele tem necessidade de estimular a reflexão política do aluno, porém, sem engessar essa reflexão política em modelos ideológicos acabados e inquestionáveis. É difícil, mas são exatamente esses os desafios que se colocam. Desenvolver o raciocínio crítico, sem passar uma visão fechada de mundo; estimular a reflexão política, contudo, sem engessá-la em modelos inquestionáveis; valorizar o multiculturalismo, o direito às diferenças, ao mesmo tempo em que alerta para as desigualdades existentes na sociedade. 13
  • 14. São sempre questões tênues e delicadas e não se trata de tarefa fácil combinar essas coisas. Nesse quadro, parece-me que o simplismo teórico e explicativo destaca-se como primeiro componente a ser evitado. Ter a consciência de que nós vivemos num mundo extremamente complexo, numa sociedade extremamente complexa. Estamos inseridos, hoje, em processos e relações de uma complexidade que nenhum raciocínio maniqueísta, simplista – do bem e do mal, do certo e do errado – conseguirá equacionar. Nós vivemos numa sociabilidade muito mais multifacetada que aquela vigente no mundo do século XIX. Logo, teorias do século XIX não podem explicar o mundo de hoje. Há processos novos, há atores sociais novos, há dinâmicas novas. Nenhuma teoria do século XIX, gestada em uma época que não vivenciou esses processos, teria condição de dar conta desse mundo. Poderíamos dizer, fazendo uso do raciocínio de um enunciado bastante dialético, que o Capitalismo que nós vivemos hoje, ainda é o mesmo daquele do século XIX mas, ao mesmo tempo, é outro. Formulação que seria impossível de fazer à luz da lógica formal, que consideraria isso um contra- senso: ou é o mesmo ou é diferente. Não. É o mesmo, mas é outro. Eu não vou me alongar nisso, mas poderia listar vários elementos para mostrar que o Capitalismo, que vivemos hoje, é o mesmo do século XIX, mas é diferente daquele do século XIX. Para pegar um único ponto que é central: nós vivemos num Capitalismo que hoje prescinde muito do trabalho vivo. Então, hoje em dia, o capital se realiza de forma diferente. Se o Capitalismo do século XIX teve na exploração do trabalho seu elemento chave de geração de lucro, hoje ele prescinde cada vez 14
  • 15. mais de trabalho vivo. Tomando, por exemplo, o desemprego, que não é algo mais funcional ao capital para abaixar salário, mantendo um exército industrial de reserva, como era no século XIX, mas considerado como um dado estrutural, gerador de problemas sociais em qualquer sociedade capitalista hoje, mesmo no centro do sistema. Então, o Capitalismo, ainda hoje, é o mesmo e é outro. É estruturalmente o mesmo, mas historicamente outro. E há muito que explicar nessa realidade que nós vivemos. Há muitas novidades surgindo e numa velocidade desconhecida em épocas anteriores. Talvez, essa aceleração do tempo, como já apontaram vários autores, seja a marca mais forte da nossa época: uma profunda aceleração, uma profunda rapidez na mudança das coisas. Há, inclusive, autores que dizem que essa velocidade da inovação contemporânea é o processo, o elemento central para explicarmos essa angústia do ser humano na atualidade. No passado, vivia-se num mundo comandado pela tradição e as pessoas nasciam e morriam no mesmo mundo. Hoje, vivemos num mundo que se move a cada momento, inclusive do ponto de vista dos valores culturais. Essa velocidade, essa mutação das inovações é de tal ordem, de tal ritmo, que deixa inclusive grande parte das Ciências Humanas atordoadas com o seu objeto. O ritmo atual das inovações faz com que muitas teorias, muitos pensadores cheguem a abrir mão do desejo de uma totalização, do desejo de uma busca de sentindo na História, caindo para aquilo que é chamado de uma postura Pós-moderna. Eis aí outro ponto bom para discussão. O Pós-modernismo como expressão dessa insegurança advinda da rapidez das inovações 15
  • 16. vivenciadas na contemporaneidade. Então, de um lado, temos que abrir mão de buscar um sentido, uma lógica nessa realidade na qual estamos inseridos. Outros, na antípoda desses, se apegam a um passado teórico, onde as coisas estavam mais claramente nos seus lugares, onde a realidade era mais simples, onde os “mocinhos e bandidos” do processo histórico ficavam melhor demarcados, acreditando que o apego ao dogma forneça um sentido que as ruas, que a realidade nega. E esses passam a dar respostas metodológicas para tudo. Qualquer problema empírico tem resposta metodológica. Respostas metodológicas que, inclusive, explicam as coisas antes delas serem pesquisadas. Quer dizer, nem pesquisei ainda e já sei a resposta, pois a resposta está no método, não está na realidade. Essa é outra postura absolutamente inadequada. Tudo está explicado no método. Pena que a realidade, muitas vezes, não tenha sido avisada disso e contrarie totalmente essas teorias. Isso me faz lembrar algo de bom nas tradições críticas do século XIX, em Karl Marx, em particular, ao dizer que as teorias tinham que vir da realidade para os livros e não o inverso, dos livros para a realidade. Nessa Babel metodológica, ideológica que vivemos hoje, a questão, talvez, mais central que se coloca, e aí toca direto naquelas tarefas que estão lá, difíceis para o professor de Geografia, é a questão da legitimação das teorias científicas. Esse problema emerge como o tema central para as Ciências Humanas e para a Geografia nesse início do novo século. Como se legitimam as teorias? Essa é uma questão para a qual já não se aceitam as respostas do passado, principalmente não se aceita a autolegitimação. Eu reúno uns dez amigos que pensam igual a mim e dizemos 16
  • 17. um para o outro: “Você está certo, você está certo, você está certo!” e você acaba se iludindo de que está certo mesmo. Porém, como legitimar as teorias? Como dizer que uma dada explicação da realidade social é certa ou errada, é verdadeira ou falsa? Eu diria que esse é o tema central que se apresenta para as teorizações mais avançadas em Ciências Humanas hoje em dia. E isso vem, de certa forma, aduzir complicações nas já difíceis tarefas que se põem para o professor. Explicar o mundo complexo sem simplificá-lo. Quer dizer, explicar simplisticamente, abrindo mão da complexidade, é fácil. Agora, explicar esse mundo complexo, “pedagogizá-lo”, sem cair na simplificação, é extremamente difícil. Quer dizer, explicar criticamente o mundo, sem transformar essa explicação num dogma, que cristaliza acriticamente pretensas verdades. É a tarefa que está aí fora, difícil, extremamente difícil, mas é o desafio que se põe. Acatar o pluralismo democrático sem cair num relativismo cínico que a tudo justifica. Acatar as diversidades de opiniões como um valor, sem pretender ser uma espécie de “dono da verdade”, porém, sem cair naquela posição da “noite escura” do relativismo onde “todos os gatos são pardos”, justificando qualquer atitude. Principalmente, justificando e reforçando esse traço tão nefasto da nossa época que é o individualismo exacerbado. Enfim, trata-se de uma agenda considerável que pede ao professor de Geografia, não apenas o domínio do conteúdo específico da disciplina, mas também uma formação pedagógica e humanista ampla. Certos temas da Filosofia e da Ciência Política, por exemplo, se impõem na sua formação, somando-se aos temas didáticos e pedagógicos, já comentados, e ao conteúdo específico da disciplina. Por isso, acredito que deve haver separação na 17
  • 18. formação do geógrafo e do professor de Geografia. Além do conteúdo específico da disciplina, além do conteúdo específico da Pedagogia, há a necessidade dessa formação crítica e humanista, em cujo campo básico nós teremos de avançar, no meu modo de entender, em termos de Filosofia e de Ciência Política. E aqui se abre, por essa necessidade de diálogo, a possibilidade de outros equívocos. E o principal deles, que é outro ponto que eu gostaria de trazer para a nossa discussão, é que, nesse diálogo com áreas afins, acabe-se saindo do campo da Geografia, posição que também não é difícil de se encontrar no universo do geógrafo. Quer dizer, eu começo a dialogar tanto com a Sociologia, com a Ciência Política que, de repente, eu perco o foco da Geografia. Isso me parece um equívoco muito grande. Ter uma visão clara da disciplina é um pressuposto básico para um bom ensino de Geografia. Eis o primeiro lugar, onde já se pode fazer um exercício da aceitação do pluralismo, tendo claro que não existe apenas uma Geografia ou apenas uma teoria em Geografia, mas, como em qualquer outro campo do conhecimento, vai viver e se alimentar de polêmicas entre posicionamentos teóricos distintos, inclusive sobre a própria natureza desse conhecimento. Eu tenho uma visão sobre o que seja esse objeto da Geografia, mas tenho claro, também, que essa visão não é a única e nem é exclusiva. Num campo tão vasto podem conviver hipóteses bastante diferenciadas, cada uma podendo trazer, inclusive, contribuições extremamente ricas para a explicação desse mundo complexo e opaco no qual vivemos. Sem dúvida alguma, a idéia de uma relação entre a sociedade e o espaço se impõe como uma idéia forte para 18
  • 19. clarificar esse campo da Geografia. Porém, vendo essa relação sociedade- espaço como uma relação social, posição que já traria alguma polêmica entre os que vêem o espaço diretamente como objeto e não a relação, e os que vêem a relação sociedade-espaço como uma relação própria e não como uma das relações sociais. Enfim, aí temos um grande ponto de polêmica e estamos mexendo com o cerne, com a essência mesmo do que se considera Geografia. O estudo da espacialidade da vida social, o estudo da dimensão espacial da totalidade social. São muitas as formulações e é necessário, para não sair da Geografia, baixar esse nível de generalidades para explicações mais específicas, para conceitos mais operacionais, tendo claro que a perda da abordagem geográfica seria uma perda extremamente grande no poder explicativo da realidade social como um todo. Isto é, a Geografia, a especificidade da abordagem geográfica, tem uma potencialidade crítica e explicativa imensa. A maior contribuição que podemos dar para explicar o Brasil, no campo das Ciências Humanas, é exatamente gerar uma bela interpretação geográfica do Brasil. Na verdade, a Geografia e a dimensão espacial tem uma grande centralidade na explicação da realidade social como um todo. Eu acho que, se há algo nesse final de século que as Ciências Humanas como um todo acataram, é exatamente essa revalorização da Geografia, que andou, em um certo momento, meio em baixa no rol das Ciências Humanas. Hoje em dia, ela conhece um momento que propicia até algumas estultices como a de achar que a Geografia é a coisa mais importante que existe no mundo, posição também que encontramos em alguns autores contemporâneos, gerando idéias estapafúrdias como, por 19
  • 20. exemplo, Edward Soja, sugerindo substituir o materialismo-histórico dialético por um materialismo-geográfico dialético. Aí já é um exagero, uma certa soberba da Geografia, mas, sem dúvida nenhuma, a consciência da centralidade explicativa desta ciência, com relação à totalidade social, é um fato que hoje está evidente, mesmo quando lemos em autores de outras áreas. Acredito que, por exemplo, a aceitação do livro de David Harvey sobre a condição pós-moderna nas áreas de Antropologia, Ciência Política, Economia etc., é um exemplo claro dessa revalorização da dimensão espacial e da Geografia. Então, quanto mais geógrafos nós conseguirmos ser, maior contribuição daremos para a interpretação de nossa realidade social. Uma posição que venho defendendo, já há algum tempo, e da qual estou plenamente convencido, é a de que nos países de formação colonial essa centralidade da Geografia adquire ainda maior relevo. Por quê? Porque exatamente os países que tiveram berço colonial, são países que surgem de processos de expansão espacial e de conquista de territórios. A própria colonização é isso: uma apropriação de terras. Então, nesses países, a Geografia teria um peso explicativo ainda maior do que em outros. O Brasil é exemplar, nesse sentido. Não dá para compreender o Brasil sem entender a Geografia do Brasil. E isso, não sou eu que estou falando, isso está numa das últimas entrevistas dadas pelo Prof. Caio Prado Júnior que, sem dúvida nenhuma, foi uma das figuras centrais na explicação deste país. Ele disse, numa entrevista à Folha de São Paulo pouco antes de morrer, que sem entender a Geografia, não se entende o Brasil. Eu estou plenamente de acordo 20
  • 21. com ele. Este é um país extremamente complexo. A Geografia é reveladora da sua essência. Nós vivemos num país que é, ao mesmo tempo, periférico e moderno. Um país que é pobre e rico. Está aí, de novo, a dialética. Um país profundamente desigual. Não é novidade nenhuma para ninguém, mas é mais uma razão para estarmos atentos contra simplificações e simplismos teóricos. Nenhuma teoria simples vai dar conta da complexidade da armação social deste país. Um país que combina traços de pré-modernidade com traços de pós-modernidade. O Brasil vive desde situações que poderíamos chamar de super-modernidade, pois estão aí as redes, a informática, o Just-in-time em vários processos, tudo isso convivendo com traços pré-modernos, a exemplo do desigual acesso à cidadania. São traços da pré-modernidade que nos marcam profundamente. Então, esse jogo entre atraso e modernidade vai ser um dos elementos caracterizadores do país, e eu, particularmente, acho que, se fizermos um balanço, nós estamos mais para um país pré-moderno do que para um país pós-moderno. A pós-modernidade é residual, é espacialmente seletiva, enquanto que os elementos da pré-modernidade são majoritários e estão em qualquer lado que se olhe o país. Isso coloca, como foco central para a reflexão (de todas as Ciências Humanas e da Geografia em particular), a questão da inclusão/exclusão. Esse é o tema central no equacionamento do país. É uma questão que vale para segmentos sociais e também para lugares. Há lugares incluídos e há lugares não-incluídos, por exemplo, às redes. E a não-inclusão nas redes significa atraso, miséria. Eu inclusive tenho uma posição muito particular a respeito de um conceito, originário da Antropologia, 21
  • 22. que vem sendo bastante utilizado pelo geógrafo, que é o conceito de não- lugar. Na concepção original de Marc Augé, que propôs esse conceito, um não-lugar seria um lugar da super-modernidade, aquele lugar sem identidade: o aeroporto, o shopping center etc. Porém, acho isso equivocado, acho que o não-lugar é exatamente o contrário disso. Não-lugar é o lugar não inserido nas redes. Aquele lugar que o Capitalismo não quer explorar. O Haiti é um bom exemplo de não-lugar. O problema do Haiti, e aí há outro ponto para pensarmos, não é a exploração direta do capital, mas sim o desinteresse do capital em relação a esse país. Esses seriam os verdadeiros não-lugares, os lugares excluídos das redes que, cada vez mais, conformam e comandam a vida econômica contemporânea. Bem, com isso, aponto para aquilo que seria a principal tarefa posta para a nossa geração de geógrafos, e para a qual o papel dos professores de Geografia adquire um relevo fantástico: a de articular a Geografia com um PROJETO NACIONAL nesses tempos de Globalização. Tendo claro, em primeiro lugar, que não é a Geografia nem o geógrafo que farão isso sozinhos. Seria uma grande soberba achar que os geógrafos são ungidos para determinar, decidir e fazer esse projeto. Não! Um Projeto Nacional deve expressar a vontade nacional, logo não poderia ser obra só de geógrafos, mas do conjunto dos cidadãos. Porém, o ensino da Geografia atua diretamente na formação desse cidadão. E isso coloca para nós, como questão-chave, definir qual é o conteúdo básico dessa disciplina que deve interessar na formação de todos os cidadãos. Acho que é esta a questão. Ao pensar um currículo, ao estruturar um livro didático, ao pensar uma reforma educacional, acho que é 22
  • 23. esta a questão básica, até para fugir daqueles erros, que eu coloquei, de “pegar” teorias de ponta e sair da Geografia. A questão básica é esta: qual é o conteúdo básico dessa disciplina que deve estar presente na formação de todos os cidadãos? A pedra angular é discutirmos o conteúdo geográfico mínimo. Não é a formação do Geógrafo, mas a formação do cidadão. Quer dizer, o grande livro deveria ser assim: o que todo o cidadão deve entender de Geografia? é isso que seria a virtude de um programa de ensino de Geografia para o ensino fundamental e médio, tendo clareza que apenas uma parcela diminuta daquelas pessoas se tornarão geógrafos. Os que se encantarem com a Geografia farão, depois, uma Faculdade de Geografia. Mas o que o trabalhador, o médico, o técnico, deve saber de Geografia para que ele tenha capacidade de influir, decidir, opinar nesse Projeto Nacional? Então, estaríamos discutindo a questão do conteúdo mínimo. Não as especificidades, mas o básico, o universalizado, aquilo que deveria estar presente na formação de todo o cidadão. Ou até fazer a pergunta invertida: quais as informações geográficas que não podem faltar, e o caminho para nós elaborarmos isso, na formação do cidadão? Acoplada a estas duas, porém bem mais perigosa e delicada, já que não resolvemos as questões fugindo delas, mas discutindo-as com seriedade e a fundo, uma questão que emerge é a seguinte: qual o conteúdo ideológico de tratamento dessa informação geográfica mínima, que é democraticamente aceitável, para uma formação pluralista do indivíduo? Acho essa pergunta básica. É chata, mas essencial. Com isto eu estou balançando o dirigismo ideológico muito presente no ensino de Geografia. 23
  • 24. Não estou propondo uma Geografia asséptica, apolítica, mas discutindo os limites até onde uma explicação parcial do mundo pode ser apresentada para os alunos como uma explicação universal do mesmo. Isso decorre de posições didático-pedagógicas e volto àquelas questões iniciais: como estimular o juízo crítico pessoal do aluno, isto é, sua capacidade de julgamento? Ou posto em outros termos: como estimular o livre arbítrio dos indivíduos? Vimos que há uma agenda razoável. Realizar isso não é pouca coisa. E a pergunta básica que se impõe, que nós devemos nos fazer é: o professor de Geografia está preparado para o exercício dessa tarefa? Os atuais currículos, a atual formação nos capacita a saber o que é esse conteúdo mínimo? Será que sabemos qual é esse limite ideológico na sala de aula? E aí, realmente, o professor é o elemento básico. Não há sistema de ensino adequado que não seja calcado na figura do professor. Não há boa educação sem um bom educador. Qualquer iniciativa, nesse setor, deve partir dessas primícias. Não adianta inovações teóricas, não adianta investimentos em infra-estrutura, não adianta nada disso, se não tocarmos nesse ponto básico: o professor e sua formação. Eu diria que, de um ponto de vista amplo sobre o Brasil, o quadro não é dos mais alentadores. Movimentos ou campanhas de capacitação aguerridas são fundamentais. Há um grande número de professores há muito tempo afastados de qualquer atividade de reciclagem, e aí se abre uma grande tarefa para as Universidades, especialmente as públicas. Faz-se necessário pressionar as Secretarias de Educação municipais, estaduais, o MEC, porque não teremos 24
  • 25. nenhum avanço no ensino se não houver um cuidado na melhoria da capacitação dos professores. Buscando chegar a um conhecimento efetivo do país, dentro daquelas informações mínimas necessárias, precisamos claramente delimitar qual é a carga empírica essencial para ser passada nos cursos, assim como, por outro lado, ou conectado a isso, definir uma visão clara do próprio objeto geográfico. Isto é, combinar a constatação da realidade brasileira com o estímulo a construção de ideais. Eu acho que esse é o ponto que interessa, ou seja, de um lado o realismo de avaliação do mundo empírico e, de outro lado, o esforço pelo desenvolvimento da capacidade crítica do aluno. Aí está o nosso desafio, que é um desafio coletivo e nele está o grande, talvez o maior, engate que a Geografia pode ter com a transformação dessa ordem social nacional profundamente injusta. Se há algo que nos anima na Geografia brasileira, diante do tamanho dos desafios propostos, é o fato dela ser, majoritariamente, uma Geografia progressista, uma Geografia preocupada com a problemática social. Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Geografia: 25
  • 26. o ecletismo a serviço da alienação humana. Marcos Antônio Campos Couto2. Gostaria de registrar a importância deste debate sobre o ensino de Geografia, inserido nessa articulação entre a Universidade e a escola básica. Considero que, para o enfrentamento das questões políticas e teórico-metodológicas de nossa carreira, de nossa profissão, no magistério de Geografia, a escola básica não se basta. Mas a Universidade também não. Assim, temos ainda muitos frutos a tirar de um relacionamento mais estreito entre ambos. É claro que quando falo escola básica e Universidade, estou me referindo a essa parcela que está interessada em fazer essa aproximação. Então, parabéns aos organizadores pelo evento. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) de Geografia tem uma estrutura bem ampla. Eles partem de uma avaliação do ensino-currículo de Geografia, apresentam definições e propõem objetivos para a Geografia na escola e, conseqüentemente, o que se quer da escola e com a Geografia dentro dela. Enfim, apresentam objetivos, metodologias, avaliação, bibliografia; então, é um documento interessante para estudar e debater. Não quero afirmar, com isso, que ele resolva todos os problemas dos currículos escolares de Geografia. Aliás, o que vou tentar demonstrar é que o texto dos PCNs mais nos confunde do que nos esclarecem. 2 Professor Assistente do Departamento de Geografia da Faculdade de Formação de Professores – FFP UERJ. 26
  • 27. Eu não sei se vocês já leram os PCNs, mas, de qualquer forma, eu trouxe alguns elementos de análise para estabelecer a nossa conversa. Em função de sua abrangência, nós podemos analisá-los a partir de diferentes perspectivas, por vários caminhos. Podemos discuti-lo no interior da política educacional neoliberal do governo federal. Acho que é um caminho para o debate. Se cabe, ou não cabe, um Parâmetro Curricular de caráter nacional, a quem cabe construir um Parâmetro Curricular e como se deve fazê-lo (de maneira democrática ou antidemocrática). Todos estes aspectos são importantes de serem debatidos e questionados. O caminho de análise que escolhi tem a ver, um pouco, com aquilo que eu estou estudando agora na Faculdade de Formação de Professores – FFP, que são os conceitos geográficos. Eu vou centrar um pouco a conversa nos conceitos geográficos que os PCNs trazem, a partir do seu conceito de Geografia, de sua concepção de Geografia. Então esse é um caminho que eu estou propondo para, a partir daí, podermos estabelecer o debate e para que vocês tragam as questões dos caminhos que querem trilhar. Mas, na verdade, eu queria dividir a nossa conversa em três partes. O primeiro momento, que considero importante, é a apresentação de algumas idéias, antecedentes dos PCNs, através de um texto escrito pelo professor Antônio Carlos Robert Moraes (1995) do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo, onde realiza uma avaliação de 18 currículos oficiais de Geografia de vários estados e municípios do Brasil. O texto resultante dessa avaliação é muito interessante e importante para entendermos muitas das idéias que estão nos PCNs. Há uma continuidade clara entre o texto do 27
  • 28. professor Robert Moraes, que está nesse documento da Fundação Carlos Chagas, e muitas concepções que estão dentro dos PCNs. Então, eu começaria por ele. Depois, partiríamos para alguns elementos dos PCNs e, finalmente, para o terceiro momento, que estou chamando de debate, que talvez seja o momento mais interessante. A avaliação dos currículos oficiais brasileiros. Retiramos do texto apenas aqueles comentários mais genéricos, que marcam, não esta ou aquela proposta curricular, mas o conjunto das propostas analisadas. Há dois elementos que o professor Moraes considera fundamentais na avaliação dos currículos de Geografia do Brasil. O primeiro problema é que os programas e currículos padecem do “desejo militante de fazer do próprio currículo um instrumento de conscientização política, o que redunda num elevado grau de dirigismo ideológico na maioria das propostas analisadas”. (MORAES, 1995). Segundo Robert Moraes, isso ocorreu em função dessas propostas curriculares terem nascido após a redemocratização do Brasil, pós-regime militar, e que, portanto, se inseriam na redemocratização da sociedade, na crítica ao regime autoritário, na crítica da Geografia, enfim, já é resultado de um processo mais amplo de crítica. Este é o primeiro elemento de sua avaliação. Nós concordamos com a idéia da presença de dirigismo ideológico nos currículos de Geografia? O que significa 28
  • 29. propostas curriculares com forte dirigismo ideológico? Vamos pensando sobre isso para o debate. E combinado com isso, ao par disso, afirma o autor que a “sobrevivência de posturas tradicionais e um elevado grau de incoerência epistemológica” marcam as propostas curriculares. Então, vejamos: em primeiro lugar, o que pode significar dirigismo ideológico, inserido no debate ideológico do Capitalismo e do socialismo, da sociedade de classes? Consideramos que o autor se referiu ao debate da relação da Geografia com o Marxismo. Combinado com o dirigismo, há incoerência epistemológica. Ao perguntar aos nossos alunos – e costumo fazer isso na graduação – a razão da escolha da carreira de professor de Geografia, muitos respondem que foi porque um professor do terceiro ou do segundo ano do ensino médio, muito crítico, o despertou para o pensar a sociedade. Então, de certa forma, esta Geografia ensinada na década de 80 e 90, tem dentro de si um grande teor de crítica social, de crítica ideológica, que o professor Robert Moraes acha exagerado no sentido militante do termo. A minha opinião é que o currículo – a sua construção – é, por essência, uma relação de poder, de escolha, de estabelecimento de prioridades, vale dizer, de reprodução de visões de mundo. Portanto, aquilo que faz parte dele não pode constituir-se, digamos assim, em seu maior problema; sobretudo quando se considera, como o próprio Moraes, a conjuntura de combate com outras concepções ideológicas naquele momento da história brasileira. Por outro lado, concordamos com o autor quanto às estranhas carências epistemológicas da Geografia e sua permanência no que denominamos de 29
  • 30. “Geografia Crítica”; ou seja, nós ainda patinamos em termos de conceitos. Ora, nós confundimos paisagem com espaço, espaço com região, região com território, território com lugar, lugar com paisagem, de forma que a crítica social não foi acompanhada de uma crítica aos fundamentos teórico-metodológicos. Então, considero que é a isso que ele está se referindo e concordo com ele, em parte. Em parte porque a crítica da Geografia não foi levada às últimas conseqüências – a crítica da alienação burguesa – transformando-se a Geografia Crítica em um rótulo, em uma nova oficialidade curricular e didática. Depois, o professor Moraes apresenta suas concepções e pressupostos de análise, os pontos de vista, a partir dos quais, fez a avaliação dos currículos. O autor confronta dirigismo ideológico com pluralismo de idéias. O que nos leva a entender que dirigismo ideológico significa, na verdade, que as propostas curriculares assumem apenas uma metodologia ou uma concepção teórica exclusiva, ao contrário de concepções teóricas mais variadas. Então há um confronto entre uma proposta de dirigismo ideológico e outra de pluralismo de idéias. E, conseqüentemente, a partir disso, o autor estabelece a sua critica ao dogmatismo. Ou seja, se tem uma proposta que é o Marxismo, ou que não seja, mas que se assume como única, ela acaba por assumir fóruns de verdade, de verdade absoluta inquestionável. Segundo ele, é importante colocar no mesmo estatuto, valorizar da mesma forma, os aspectos sociais, valores do mesmo calibre, utopias igualitárias do pensamento crítico social e respeito às individualidades, respeito às diferenças. Ou seja, o dogmatismo e o dirigismo ideológico, a que ele se referia antes, nessa avaliação, não estariam respeitando a diferença e as individualidades. Por isso, então, que, acrescido à 30
  • 31. luta por igualdade social, há uma revalorização da idéia de Democracia. Ou seja, se a crítica social da pobreza e da exploração é importante, ela torna-se limitada se não alcançar a crítica da política, do poder e da democratização, segundo a avaliação do autor. Para Moraes (1995) a posse dos conhecimentos englobados no ensino fundamental formal “aparece, cada vez mais, como o qualificativo essencial para a alocação dos indivíduos na sociedade e no mercado”. Desta forma, considera o autor, que em um... "sistema democrático espera-se que o conteúdo deste aprendizado apresente um perfil crítico e pluralista, onde o aluno não apenas receba uma carga adequada de informações factuais e técnicas, mas também todo um instrumental teórico que lhe ajude a interpretar o mundo e a se posicionar face aos fenômenos." (MORAES, 1995). Assim, a escola – e a Geografia dentro dela – tem o papel de contribuir para esse acesso gratuito de conhecimentos que qualificam as pessoas para o mercado, vale dizer, para a sociedade de mercado capitalista. Voltamos aqui ao significado do termo dirigismo ideológico, da manipulação das consciências. Formar para o mercado burguês, de forma crítica e pluralista, não significa dar uma direção, uma intencionalidade a nossa prática e, conseqüentemente, à história humana? Por outro lado, considero que tudo que fazemos na escola forma consciência, constitui direções, desde os óculos que nós usamos ou os sapatos, a maneira como nos vestimos, a maneira como falamos, até os conteúdos que porventura desenvolvemos com nossos alunos; tudo isso vai produzindo/reproduzindo formas de sociabilidade. Então, em qualquer das hipóteses, nós estamos dando uma direção às consciências. 31
  • 32. Bom, mas o que é a Geografia para o autor? Como ele analisou a Geografia nos currículos oficiais brasileiros? Moraes identificou três denominações para os conteúdos geográficos: Estudos Sociais, Integração Social ou Geografia; embora, para ele, as três denominações não apresentem diferenças substanciais quanto aos conteúdos propostos. Entretanto, esta ambigüidade, na interpretação do autor, não constitui um problema menor. Por quê? Porque diz respeito ao papel da Geografia nas Ciências Sociais e na interpretação da realidade e, por conseguinte, na escola. Ou seja, é preciso verificar claramente o papel da Geografia no conjunto das Ciências Sociais. Então, falar Estudos Sociais ou Geografia não é uma questão pequena para o autor. Eu também concordo. Veremos, mais adiante, que os textos que compõem os PCNs reproduzem outras ambigüidades ao conceituar a Geografia. Para Moraes, então, a Geografia faz parte de uma tradição discursiva sobre o mundo, que conforma um campo de saber, um campo disciplinar circunscrito aos estudos que tematizam o espaço, ou melhor, nas letras do autor, tematizam a relação sociedade-espaço. O autor afirma que, embora haja concordância entre os geógrafos sobre sua temática de análise – o espaço – a “totalidade das propostas de currículo analisadas encaixam-se na [resistente e não abandonada] busca de nexos entre fenômenos naturais e fenômenos sociais”. Portanto, são duas concepções de Geografia. Nós vamos ver que os PCNs oscilam entre ambas. Segundo o professor, “as propostas curriculares analisadas apresentam razoável similaridade de concepções e propósitos”. Além do dirigismo ideológico, já comentado, há ainda similaridade nas concepções e objetivos da 32
  • 33. Geografia. O autor dividiu a sua síntese crítica em dois grandes grupos: “de um lado as propostas que apresentam coerência interna e, de outro, as que podem ser qualificadas como incoerentes”. Enquanto as primeiras apresentam articulação entre objetivos, fundamentação metodológica e conteúdos, o segundo grupo, mesmo assumindo proposições críticas – discurso da crítica ao Capitalismo, à sociedade – reproduz programas de corte bem tradicional, o que ele chama de Geografia Tradicional. Segundo o autor, há um modelo que preside a organização dos conteúdos, sobretudo nas séries iniciais (1ª a 4ª séries) que é a visão de círculos concêntricos, de progressiva apreensão do espaço, seguindo a seguinte seqüência de abordagem: “o indivíduo (unidade corpórea), a casa, a escola, a rua, o bairro, o município e o estado”. Parte-se do espaço mais próximo e, progressivamente, aumenta-se a escala de análise. O autor afirma, entretanto, que, embora os programas tomem o espaço de vivência mais próximo como um ponto de partida, eles não apresentam a fundamentação teórico-metodológica da Fenomenologia e da chamada Geografia Humanista que, para ele, “constituem orientação metodológica que mais diretamente trabalha tal concepção na Geografia”. Assim, para ele, a Fenomenologia é o suporte teórico metodológico fundamental para pensar o próximo e o vivido. Nós concordamos com isso? Avalio que, fundamentalmente, os PCNs constituam uma tentativa de construir uma proposta curricular baseada na Fenomenologia. Tenho dúvidas se conseguiram. Mas considero este aspecto lapidar, porque os PCNs estão todos costurados por aí. É por isso, então, que os PCNs realçam muito o subjetivo, o 33
  • 34. indivíduo, a experiência, o vivido, a valorização do imaginário, a experiência das pessoas. E aí eu quero reforçar a pergunta: o Marxismo tem contribuições para pensar o indivíduo e seu espaço vivido, produzido e concebido? E outras correntes do pensamento? Ou será apenas a Fenomenologia? A resposta dos PCNs me parece que é, sobretudo, a Fenomenologia. O autor afirma que esta ausência da Fenomenologia “contraria certa tendência mundial de tratar a questão do ensino fundamental de Geografia dentro de bases fenomenológicas, realçando os temas da consciência e representação do espaço como experiência de vida”. (MORAES, 1995). Mas os temas da representação e da consciência não são, também, temas do Marxismo? Entretanto, os temas da consciência e da subjetividade estão, nos textos dos PCNs, vinculados às percepções individuais. Outra questão apontada é a do lugar e do local, onde Moraes (1995) avalia, negativamente, a idéia de uma proposta de círculos concêntricos, que parta do local, da casa e depois vá ampliando os espaços até chegar ao espaço brasileiro, na quarta série, ou ao espaço mundial, entre a quinta e a oitava séries; pois o autor indaga sobre o “estatuto da realidade local num mundo globalizado, ou em rápido processo de globalização”. Isso porque, segundo o autor, o “mundo é bem mais do que a sua rua”. Conseqüentemente, é necessário contemplar as escalas simultaneamente, combinando “os níveis local/nacional/global”, através da idéia de um “espaço relacional” e da “moderna noção de rede”. Para o autor, as propostas possuem uma “grande confusão conceitual”, pois juntam ou combinam conceitos provenientes de diferentes concepções metodológicas como, por exemplo, espaço geográfico e produção do espaço 34
  • 35. ou modo de produção e gênero de vida, sem o aprofundamento teórico- metodológico que esta articulação exige. Para Moraes, as propostas curriculares padecem de uma revisão bibliográfica; característica que os PCNs buscaram resolver. Apesar de falarem da interdisciplinaridade, os documentos analisados acabam não transformando isso em proposta curricular. Para ele, “os trabalhos interdisciplinares se alimentam de conhecimentos que lhes são prévios, gerados nos campos disciplinares, e, nesse sentido, não eliminam a especificidade de cada abordagem. Antes, têm o resultado destas como matéria- prima”. (MORAES, 1995). Ou seja, na verdade, apostar na interdisciplinaridade não significa diluir a Geografia, ou desfazê-la, ou fragmentá-la no processo de aproximação com as outras ciências. Pelo contrário, nós vamos nos integrar com outras ciências sabendo exatamente quem nós somos e o que queremos, ou seja, qual é o aspecto da realidade que queremos avaliar, que como disse anteriormente, para o autor, significa o estudo da relação sociedade-espaço. A partir daí, ele indica três interfaces para a interdisciplinaridade: uma com a História, através da formação dos territórios; outra com a questão ambiental, articulada com as Ciências, a Biologia e, também, as representações do espaço com a Língua e com a Literatura Portuguesa. Em minha avaliação, estes aspectos anteriormente apresentados estão muito presentes nos PCNs de Geografia – tanto nos da 1ª a 4ª , quanto nos da 5ª a 8ª séries – isto é, estão muito coerentes com essas avaliações e, fundamentalmente, buscam respondê-la. Então, o primeiro ponto de partida para nossa conversa é se nós concordamos com essa avaliação? Concordamos em parte? Concordamos com o seu núcleo 35
  • 36. fundamental de argumentação? Esse é o primeiro ponto de partida para o debate. Eu queria antecipar a minha opinião. Considero que, ao se referir à questão do dirigismo ideológico, o professor Moraes está se referindo, sobretudo, a proposta curricular do estado de São Paulo; que também teve participação, em sua elaboração, de professores da Universidade de São Paulo. Então, me parece (eu queria ter estado aqui no debate com o professor Robert Moraes, mas não pude) que, na verdade, trata-se de um debate entre duas partes, ou dois grupos, do Departamento de Geografia da USP. Embora considere o economicismo que marca a proposta curricular do estado de São Paulo e, assim, esta qualidade de dirigismo ideológico, não concordo que isto tenha ocorrido de forma generalizada, como o autor está afirmando. E mesmo, o que significa isso? Se pensarmos no título do livro do professor Moraes, em que ele rotula, na minha avaliação, de Geografia Tradicional tudo o que passou, e de Geografia Crítica o que é atual, considero, isso sim, o supra-sumo do dirigismo ideológico. De qualquer forma, foi aquele o momento histórico em que o livro estava sendo escrito, no combate com a Geografia mais clássica, no combate dentro da AGB, dentro dos Departamentos; então é compreensível relacionar àquele combate, tudo que estava se passando. Assim, eu acho que o fundamental da crítica das propostas curriculares não cabe aí. O lugar da crítica não é esse. Mas vamos então agora aos PCNs. 36
  • 37. PCNs de Geografia: ecletismo ou confusão teórico-metodológica Queria começar pelo conceito de Geografia. Eu fui peneirando os PCNs para achar este conceito, que é o ponto de partida. E aí, considero que os PCNs não respondem a uma questão que o Robert Moraes colocou em seu texto, que considero fundamental: o de definir, claramente, de que se trata a Geografia. Então, para os PCNs: "A Geografia estuda as relações entre o processo histórico que regula a formação das sociedades humanas e o funcionamento da natureza, por meio da leitura do espaço geográfico e da paisagem. A divisão da Geografia em campos de conhecimento da sociedade e da natureza tem propiciado um aprofundamento temático de seus objetos de estudo. Essa divisão é necessária, como um recurso didático, para distinguir os elementos sociais ou naturais, mas é artificial, na medida em que o objetivo da Geografia é explicar e compreender as relações entre a sociedade e a natureza, e como ocorre a apropriação desta por aquela. (...) Identificar e relacionar aquilo que na paisagem representa as heranças das sucessivas relações no tempo entre a sociedade e a natureza é um de seus objetivos. (...) A preocupação básica é abranger os modos de produzir, de existir e de perceber os diferentes espaços geográficos; como os fenômenos que constituem as paisagens se relacionam com a vida que as anima." (PCNs: 1997, 109) "A Geografia estaria, então, identificada como a ciência que busca decodificar as imagens presentes no cotidiano, impressas e expressas nas paisagens e em suas representações, numa reflexão direta e imediata sobre o espaço geográfico e o lugar." (PCNs, 1997: 112/113) Nos PCNs (1999) de Geografia para o terceiro e quarto ciclo do ensino fundamental (5ª à 8ª séries), os autores assim definem a Geografia: "Área de conhecimento comprometida em tornar o mundo compreensível para os alunos, explicável e passível de transformações (...) em sua meta de buscar um ensino para a conquista da cidadania brasileira e (...) em prol da democratização da escola. (...) Seu estudo proporciona aos 37
  • 38. alunos a possibilidade de compreenderem sua própria posição no conjunto de interações entre sociedade e natureza. A Geografia tem por objetivo estudar as relações entre o processo histórico na formação das sociedades humanas e o funcionamento da natureza por meio da leitura do lugar, do território, a partir de sua paisagem." (PCNs, 1999: 26) Não vou fazer comentários sobre a vinculação escola-cidadania, dos limites políticos do conceito de cidadania. Não vou me referir a isso neste momento. Identificamos, pelo menos, três conceitos de Geografia, provenientes de diferentes matrizes teórico-metodológicas: o que define a Geografia como o estudo da relação homem-meio (homem-natureza, sociedade-natureza), o que a define como o estudo da paisagem, e, finalmente, o conceito que define a Geografia como o estudo da produção do espaço. Qual é o problema? Na falta de articulação clara e explícita das contribuições das diferentes concepções de Geografia, o que se reproduz é a imprecisão e a ambigüidade. Como selecionar/hierarquizar os conceitos e conteúdos de forma coerente, se não sabemos onde queremos chegar, sem ter certeza da pergunta que queremos responder? Por outro lado, a definição da Geografia como o estudo da relação sociedade/natureza nos parece muito abrangente, pois, a rigor, esta temática é comum ao conjunto das ciências, além de outras formas de conhecimento. A Economia, a História, a Biologia, também estudam a relação sociedade- natureza, mas cada uma por um viés particular. Então, na verdade, este conceito não nos ajuda em várias coisas: uma é na identificação do nosso papel dentro do conjunto das ciências e, outro, é no melhor entendimento dos conceitos geográficos. Ou seja, os textos dos PCNs não conseguiram 38
  • 39. responder a uma indicação, proposta pelo professor Moraes (1995): a de nos identificar enquanto um campo do conhecimento. Por outro lado, fragmentar sociedade e natureza, mesmo apresentando o álibi didático, tem sido a tradição do discurso clássico da Geografia que, contraditoriamente, se reivindica como o estudo da relação sociedade- natureza. A identificação de nosso objeto de estudo, não podemos esquecer, só será útil se o utilizarmos para a interpretação do seu sujeito. Entretanto, se o objeto de estudo se perde na dispersão e empiricidade dos conteúdos, o sujeito – o ser humano – não passará de mais um dos seus conteúdos. Mas os autores dos PCNs apresentam as idéias de espaço e de espacialização dos fenômenos, articulados aos conceitos geográficos de paisagem, território e lugar. Para eles: "o estudo da paisagem local, global não deve se restringir à mera constatação e descrição dos fenômenos que a constituem. Será de grande valia pedagógica explicar e compreender os processos de interação entre a sociedade e a natureza, situando-as em diferentes escalas espaciais e temporais, comparando-as, conferindo-lhes significados. O ensino da Geografia, nesses ciclos, pode intensificar ainda mais a compreensão, por parte dos alunos, dos processos envolvidos na construção das paisagens, territórios e lugares. A preocupação da Geografia é com o espaço terrestre." (PCNs, 1999) Como estamos “acostumados” com a ambigüidade conceitual, utilizamos, com o mesmo sentido, conceitos que não correspondem à mesma coisa: espaço terrestre, espaço geográfico, relação sociedade/natureza não são a mesma coisa. Para os autores, é “na construção do território, como parte integrante da sociedade humana e suas interações dinâmicas, que se fundamenta o conceito 39
  • 40. de espaço geográfico, como uma categoria no interior das ciências humanas e sociais”. Assim, ficamos em dúvida se a Geografia é o estudo da relação sociedade/natureza, do espaço ou do território. Gostaria de conversar com vocês sobre isso. Mas os autores voltam a afirmar que é essencial que não se perca de vista que o seu objeto de estudo, e de ensino, é o espaço geográfico (voltou ao espaço), seu território, paisagens e lugares. Procuram trabalhar com a busca da compreensão, da diversidade das paisagens e lugares onde o modo de vida, a cultura e a natureza interagem. Então, na minha avaliação, eu vou voltar mais uma vez, os PCNs não resolvem um problema que é chave: o que se quer com esse campo do saber, com esse campo disciplinar que é a Geografia. E, me parece, também, que nós já temos elementos bastante interessantes para pensar a questão da sociedade e do seu espaço, que o próprio professor Moraes (1995) fez referência. Temos a obra do Milton Santos e outras que nos dão elementos importantes para pensar a Geografia como um discurso sobre o homem, sobre o ser humano produzindo o seu espaço. Porque é isso que nos diz respeito. A Geografia é um discurso sobre a condição humana, através de um dos caminhos da produção da condição humana, que são as práticas espaciais da sociedade. Isso é relação homem/natureza? É também. Mas, a nossa questão, acho que é pensar o homem e a sociedade através da produção do espaço e, a partir daí, pensar as categorias geográficas. Agora, o problema dessa imprecisão, eu queria adiantar, é que na verdade nós carecemos de discutir e entender o que é o espaço. Quando falamos espaço terrestre, espaço natural ou espaço geográfico, estes termos não significam a 40
  • 41. mesma coisa. Se pensarmos espaço natural, nós podemos pensar o espaço anterior à existência humana, não é isso? O espaço natural, o espaço da natureza. Mas se eu estou chamando de Geografia o que diz respeito à sociedade humana, cria-se uma confusão teórica que é preciso esclarecer. Bom, de que se trata, então? É um espaço como existência humana ou não é, afinal de contas? É o espaço terrestre que parece esse espaço natural anterior ao próprio homem? Ou seja, do que se trata? Em função dessa imprecisão conceitual da Geografia, e conseqüentemente do espaço, o que vem depois piora, ou seja, os conceitos que os PCNs nos trazem. O que considero como um ponto positivo, a recuperação dos conceitos geográficos, que nos ajudam a focalizar o olhar geográfico sobre a realidade, acaba por nos confundir. Os conceitos centrais da Geografia, eleitos pelos autores dos PCNs, são: paisagem, território/territorialidade e lugar (Quadro 1). Em primeiro lugar, cabe uma pergunta: são estes os conceitos centrais da Geografia? São os conceitos fundamentais? Não caberia discuti-los? Não poderiam ser outros? Mas estes foram eleitos. Estou me referindo também, neste momento, aos critérios de construção dos PCNs e a maneira de elaborá- los. Embora não possamos creditar ao professor Moraes os problemas teórico- metodológicos dos PCNs, o ponto de partida para sua elaboração foi a avaliação dos currículos brasileiros de Geografia produzida por apenas um intelectual. E o texto dos PCNs foi construído por outros dois professores, sendo que os três são membros do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo. 41
  • 42. Esses conceitos realmente permitem pensar a experiência concreta de vida? Mas a experiência concreta de vida dos nossos alunos, o vivido, não é o vivido do espaço do Capitalismo? E aí o Marxismo não tem contribuições para a analise da experiência de vida do Capitalismo? Embora os autores façam referência a importância do Marxismo para a Geografia, a sua contribuição para tal análise é descartada. Enfim, essas são perguntas para alimentar o nosso debate. A Geografia é considerada como um discurso sobre o espaço – dentro dos PCNs está essa idéia, mesmo que vagamente – sem que este conceito esteja incluído como um dos fundamentais. Onde está o conceito de espaço? Por que essa fuga do conceito de espaço? Em minha avaliação da “Geografia Crítica”, ou qualquer nome que se queira dar, ou avaliando a Geografia que se ensina nessa renovação, considero que está aí um dos problemas fundamentais: nós fugimos da discussão do conceito de espaço. E aí vamos discutir o território, a paisagem, o lugar, sem ter resolvido esse problema que, para mim, é anterior. Porque, se nós chamamos esses conceitos – território, territorialidade, paisagem, lugar – de geográficos, e são conceitos geográficos, tem que haver, entre eles, algo de comum, para que eu afirme que eles são geográficos. O que há de comum entre território, territorialidade, paisagem e lugar? Porque no fundo, no fundo, o que há de comum entre eles, o que deve haver de comum entre eles, é justamente a idéia de espaço, ou o conceito de Geografia. E, aí, os PCNs não nos ajudam nesta reflexão. Aliás, pelo contrário, nos confundem mais do que nos esclarecem. Eu estou dizendo eles nos 42
  • 43. confundem aqui no Rio de Janeiro, diria também que em São Paulo, então eu acho que a confusão, aí, pode ser muito pior em outros lugares do Brasil. A confusão e a imprecisão conceituais, apontados pelo professor Moraes (1995), também se reproduz nos conceitos de paisagem, lugar e território que ora se diferenciam, ora se confundem. O território parece ser a relação sociedade/natureza e, por outro lado, o conjunto das paisagens; parece, às vezes, que território é espaço e, ainda, lugar. Ainda incorpora as idéias de Milton Santos (1996) e apresenta o conceito de território como o sistema de objetos e, assim, a Geografia ora é compreendida como o estudo do território, ora como o estudo do espaço. O mesmo acontecendo com os conceitos de paisagem e lugar. A paisagem, para os autores, é “algo criado pelos homens, é uma forma de apropriação da natureza”. Se, em lugar de paisagem, afirma-se que o espaço é algo criado pelos homens e é uma forma de apropriação da natureza, os dois conceitos teriam o mesmo sentido. E finalmente o conceito de lugar. Para os autores, o “sentimento de pertencer a um território, e à sua paisagem, significa fazer deles o seu lugar de vida e estabelecer uma identidade com eles”. Os conceitos são permeados pela idéia de subjetividade, imaginário, concedendo um peso muito forte ao espaço vivido, ao espaço da experiência imediata, que, embora possa se transformar em uma contribuição, não deve se limitar a isso. O espaço é vivido, é experienciado, mas é também concebido, é também produzido. E produzido e concebido de acordo com o que é a sociedade e construindo-se enquanto sociedade. E aí não dá para fugir da 43
  • 44. escala global, se refugiar na escala local, sem fazer análise do Capitalismo enquanto tal. Em função do Marxismo, que influenciou o pensamento geográfico, não ter realçado os aspectos da subjetividade humana, e ter privilegiado as categorias da luta de classes ou as categorias econômicas, o que se propõe agora é jogar a água suja fora com o bebê. Eu vou encerrando por aqui, queria só fazer algumas considerações finais. Do meu ponto de vista, os PCNs nos confundem mais do que nos ajudam. Considero que os aspectos da consciência, do vivido, da experiência de vida, que a Fenomenologia nos traz como uma reflexão, são importantes e não devem ser desprezados, pois dizem respeito à condição humana. Mas, de certa forma, os PCNs não nos ajudam nessa reflexão. Porque se nós ainda entendemos que o homem é essa síntese da objetividade/subjetividade, as duas dimensões são fundamentais para entendê-lo e, portanto, a produção do seu espaço e vice-versa. Então, talvez seja interessante começarmos a debater a relação entre a Fenomenologia e o Marxismo, que considero um caminho interessante. Não é jogar as duas coisas no mesmo saco, mas conversar sobre a relação entre essas coisas. Mas, o peso dado aos PCNs é o peso do indivíduo e da individualidade e, aí, me parece que cai, sobretudo, na concepção liberal de homem, de sociedade, de indivíduo e que perde de vista vários aspectos que também são importantes. Porque se nós somos sexo, etnia, gênero, nós ainda continuamos sendo classe, porque o Capitalismo ainda continua sendo a luta de classes. Talvez aí seja o nosso ponto de conversa com os PCNs e com as propostas curriculares. Pensar a condição humana e, sobretudo, pensar a crítica à sociedade capitalista – aliás é assim 44
  • 45. que eu entendo a crítica: a crítica para mim deve se confundir com a crítica à sociedade capitalista – a partir destas contribuições do vivido, do concebido, do produzido, como, de certa forma, uma parcela de geógrafos vem buscando apresentar nestes anos de renovação. Para finalizar, apenas um comentário sobre a estrutura temática dos PCNs. Quando analiso os conteúdos (página 40 do documento), percebo problemas maiores. Por quê? Nos eixos temáticos, colocados para o terceiro ciclo, estão: “a Geografia como uma possibilidade de leitura e compreensão do mundo”; “o estudo da natureza e a sua importância para o homem”; “o campo e a cidade como formações sócio-espaciais”; “a cartografia como instrumento de aproximação dos lugares e do mundo”. (PCNs, 1999: 40). Mais uma vez se reproduz a questão teórica do “lugar” da natureza nos estudos geográficos que, nos PCNs, aparece apartada das questões relacionadas ao lugar, a paisagem, ao território, ao espaço e, fundamentalmente, ao próprio homem. Embora considere a cartografia como instrumento da análise geográfica da realidade, tenho dúvidas, como apontado por Sposito (1999), se ela deva se transformar em uma temática do programa, ou deva permear todo o currículo de Geografia. De qualquer forma, essa distribuição dos eixos temáticos nos faz pensar nas velhas fragmentações homem/natureza, sociedade/espaço, que conhecemos e criticamos bastante, mas que, ainda, são nossos fantasmas. 45
  • 46. Conclusão Para finalizar, diria que os PCNs, do ponto de vista de seu conteúdo teórico, constituem um documento a mais para o debate. Não é o principal, não é o único, mas é um documento para o debate, para a reflexão. Observando as propostas de Geografia do Colégio Pedro II, dos municípios do Rio de Janeiro e de Niterói, os PCNs não trazem muitas novidades. Quando observo os livros didáticos de primeira à quarta série – e os currículos que lhes são apenas cópias – verdadeiros amontoados de conteúdos geográficos, considero que os PCNs podem significar algum avanço. Porque em muitas obras didáticas não há perguntas, questões a responder, a problematizar, mas apenas conteúdos com pouca ou nenhuma articulação. É lamentável que os autores dos PCNs, utilizando-se, mesmo que confusamente, dos temas e debates que vinham sendo travados, desde o final da década de 1970, nos Departamentos, nos Congressos da AGB, não nos permitiram o papel de interlocutores. Do ponto de vista da política educacional, os PCNs assumem um caráter perverso, dado que o próprio MEC explicita que a política de currículo lança luzes para as políticas do livro didático, de formação de professores, de avaliação externa. Então, todos os problemas que possamos identificar nos PCNs, com certeza, trarão conseqüências para esses outros campos de nossa atuação política e profissional. A Geografia deveria ser um discurso sobre a condição humana, pelo viés de sua espacialidade. Quando Milton Santos insiste nisso, eu acho que não é por 46
  • 47. capricho, mas porque cada vez mais a nossa experiência de vida é o espaço, não é mais aquela natureza pretérita, passada, natural. Cada vez mais o espaço é a sociedade. O espaço cada vez mais denso de História, de sociedade e de técnica. E mais, o mundo hoje tem a cara da escala, que é um conceito que nos é muito próximo. Então, analisar a condição humana, nessa virada de século, pelo instrumental da Geografia, é uma coisa que não podemos perder de vista. Mas nós temos que aprofundar o debate sobre o que é espaço, sobretudo porque ainda vigora entre nós a idéia do espaço absoluto, aquele espaço eterno, que existe independente da ação humana, anterior a ela e que, portanto, impõem-se ao homem como condição eterna, Ou seja, nós ainda não conseguimos visualizar o homem em nossas análises do espaço. Para finalizar, diria o seguinte: eu vinha para cá ouvindo o Cartola, o que me despertou para o debate sobre a condição humana, sobre tudo isso de que tratamos, sobre a Fenomenologia. Assim, gostaria de construir, numa mesa, a crítica da sociedade, que fosse a síntese das idéias de Marx e Rosa Luxemburgo - crítica à sociedade capitalista - do Guevara - um homem que viveu, construiu a revolução - do Cartola - biscateiro e poeta da Mangueira - e do Noel Rosa - poeta da Vila Isabel. De maneira que ela seja construída, de onde viesse - do gênero, da raça, do lugar, da crítica política, da crítica ideológica, da cultura - como, fundamentalmente, crítica à alienação humana na sociedade capitalista, que ainda precisa ser transformada. 47
  • 48. Quadro 1 Os Conceitos Geográficos nos PCNs Território Área de vida em que a espécie desempenha todas as suas funções vitais ao longo do seu desenvolvimento. Território é o domínio que os animais e as plantas têm sobre porções da superfície terrestre (Biologia, séc. XVIII. Augusto Comte incorporou aos estudos da sociedade). Apropriação do espaço, ou seja, o território, para as sociedades humanas, representa uma parcela do espaço identificada pela posse. É dominado por uma comunidade ou por um Estado (Geografia, Ratzel). Na geopolítica, o território é o espaço nacional ou a área controlada por um Estado-nacional: é um conceito político que serve como ponto de partida para explicar muitos fenômenos geográficos relacionados à organização da sociedade e suas interações com as paisagens. (p. 27). O território é uma categoria fundamental quando se estuda a sua conceitualização ligada à formação econômica e social de uma nação. Nesse sentido, é o trabalho que qualifica o território como produto do trabalho social. Além disso, compreender o que é território implica também compreender a complexidade da convivência, nem sempre harmônica, em um mesmo espaço, da diversidade de tendências, idéias, crenças, sistemas de pensamento e tradições de diferentes povos e etnias. O território refere-se a um campo específico do estudo da Geografia. Ele é representado por um sistema de objetos fixos e móveis, como, por exemplo, o sistema viário urbano representando o fixo e o conjunto dos transportes como os móveis. (p. 28) Pode até mesmo ser considerado o território como o conjunto de paisagens. 48
  • 49. Territorialidade É fundamental reconhecer a diferenciação entre a categoria território e o conceito de territorialidade. Enquanto a categoria território representa para a Geografia um sistema de objetos, sendo básica para a análise geográfica, o conceito de territorialidade representa a condição necessária para a própria existência da sociedade como um todo. Paisagem Compreensão subjetiva da paisagem como lugar, o que significa dizer: a paisagem ganhando significados para aqueles que a constroem e nela vivem; as percepções que os indivíduos, grupos ou sociedades têm da paisagem em que se encontram e as relações singulares que com ela estabelecem. (p. 27). Pode até mesmo ser considerado o território como o conjunto de paisagens. A paisagem é algo criado pelos homens, é uma forma de apropriação da natureza. A paisagem é definida como sendo uma unidade visível do território, que possui identidade visual, caracterizada por fatores de ordem social, cultural e natural, contendo espaços e tempos distintos; o passado e o presente. A paisagem é o velho no novo e o novo no velho! Quando se fala da paisagem de uma cidade, dela fazem parte seu relevo, a orientação dos rios e córregos da região, sobre o quais se implantaram suas vias expressas, o conjunto de construções humanas, a distribuição de sua população, o registro das tensões, sucessos e fracassos da história dos indivíduos que nela se encontram. É nela que estão expressas as marcas da história de uma sociedade, fazendo assim da paisagem um acúmulo de tempos desiguais. (p. 28) 49
  • 50. Lugar A categoria paisagem, por sua vez, também está relacionada à categoria lugar, tanto na visão da Geografia Tradicional quanto nas novas abordagens. O sentimento de pertencer a um território e a sua paisagem significa fazer deles o seu lugar de vida e estabelecer uma identidade com eles. Nesse contexto, a categoria lugar traduz os espaços com os quais as pessoas têm vínculos afetivos: uma praça onde se brinca desde criança, a janela de onde se vê a rua, o alto de uma colina de onde se avista a cidade. O lugar é onde estão as referências pessoais e o sistema de valores que direcionam as diferentes formas de perceber e constituir a paisagem e o espaço geográfico. É por intermédio dos lugares que se dá a comunicação entre o homem e o mundo. Bibliografia BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: História, Geografia. Brasília: Secretaria de Educação Fundamental – MEC/SEF, 1ª à 4ª séries, 1997. BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Geografia. Brasília: Secretaria de Educação Fundamental – MEC/SEF, 5ª à 8ª séries, 1999. CARLOS, A. F. A. & OLIVEIRA, A. U. Org. Reformas no mundo da Educação – parâmetros curriculares e Geografia. São Paulo: Contexto, 1999. LACOSTE, Y. A Geografia – isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra. Campinas: Papirus, 1988. MARX, K. Manuscritos económicos-filosóficos. Lisboa: Edições 70, 1989. MORAES, A. C. R. "Propostas Curriculares de Geografia". In "As Propostas curriculares oficiais – análise das propostas curriculares dos estados e de alguns municípios das capitais para o ensino fundamental". São Paulo: Fundação Carlos Chagas, Departamento de Pesquisas Educacionais, Projeto MEC/UNESCO/FCC: Subsídios à elaboração dos PCNs, 1995. MOREIRA, R. O discurso do avesso (para a crítica da Geografia que se ensina). Rio de Janeiro: Dois Pontos, 1987. SANTOS, M. A natureza do espaço - técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 1996. SPOSITO, M. E. B. "Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino de Geografia: pontos e contrapontos para uma análise". In Reformas no mundo da Educação – parâmetros curriculares e Geografia. São Paulo: Contexto, 1999. 50
  • 51. O livro didático e a construção do conhecimento no ensino de Geografia nas séries iniciais do Ensino Fundamental Irene de Barcelos Alves3 Nossa história com o livro didático para as primeiras séries do Ensino Fundamental, em parceria com a professora Marília Bacellar, teve início quando participamos do trabalho de reformulação curricular do ensino de Geografia na rede pública municipal do Rio de Janeiro, no final da década de 1980. Trabalho este realizado em duas fases, do qual participei apenas da primeira. Foi a partir do contato com professores de todo o Ensino Fundamental, que identificamos as dificuldades que encontram no trabalho com as disciplinas de História e Geografia, uma vez que, em geral, são carentes de uma formação especifica nessas áreas. Faltavam-lhes os conceitos básicos das disciplinas. Por outro lado, são professores que têm uma maior disponibilidade de tempo, um maior contato com as crianças e uma formação que lhes confere um domínio didático que o professor de 5 a a 8a séries, muitas vezes, não dispõe. Esta carência na formação dos professores a partir da 5a série, decorre do modelo adotado pelas Universidades que não os prepara para este convívio com a criança, nem para a criação de trabalhos adequados à faixa etária dos menores, tão pouco para o trabalho lúdico na sala de aula etc. Surgiu, daí, a necessidade de elaborar um livro que contemplasse a base teórico-conceitual, através dos conceitos fundamentais de História e Geografia, 3 Professora do Centro Federal de Ensino Tecnológico – CEFET. 51
  • 52. adequando-os à prática didática do professor das primeiras séries do Ensino Fundamental. Em nossa concepção, o professor de 1 a a 4a séries não vai desenvolver a História e a Geografia, mas construir os alicerces fundamentais para a aprendizagem dessas disciplinas. Na realidade, ele vai apresentar os conceitos e desenvolver as habilidades que, mais tarde, os professores do segundo segmento irão ampliar. Considerando que as duas disciplinas ainda são trabalhadas em conjunto, mesmo que já se discuta no MEC a separação, priorizamos os seguintes conceitos na construção da coleção de livros: trabalho, natureza, espaço, grupos sociais/sociedade, tempo e cultura. Estes conceitos são apresentados através de uma série de atividades propostas que possibilitam sua compreensão pela criança. O conceito de espaço, por exemplo, tão importante para a Geografia, é apresentado e trabalhado a partir das vivências espaciais dos próprios alunos, partindo-se sempre do mais próximo e conhecido para, depois, trazer realidades mais distantes. E quanto às habilidades: quais são aquelas fundamentais para serem desenvolvidas nessa faixa etária? Em termos gerais, trabalhamos com classificação, ordenação, orientação e localização, levando o aluno a observar mudanças e permanências, bem como estabelecer relações que possibilitem algum grau de análise e posicionamento crítico perante fatos e situações. Contudo, ao longo do trabalho com os conceitos geográficos, há uma habilidade que se torna fundamental: é a capacidade de leitura e confecção de mapas. É transformar o aluno em um sujeito mapeador, capaz de elaborar e ler 52
  • 53. mapas. Também é importante o resgate da história dos mapas e seu papel fundamental na conquista e domínio do território. O desenvolvimento da habilidade de leitura de mapas é um dos grandes eixos de introdução ao saber geográfico nos primeiros anos do Ensino Fundamental. As dificuldades que depois surgirão, para a leitura e interpretação dos mesmos, decorrem da não realização/efetivação destes procedimentos. O aluno deve, primeiro, se tornar um mapeador para, depois, ser capaz de compreender o código formal que compõe o mapa. Para alcançar este objetivo, propomos a elaboração de maquetes, confecção de plantas baixas, exercícios de interpretação e localização, para que o aluno entenda a construção/ composição dos mapas através do uso da legenda e da escala. De início, o aluno não domina todos esses elementos e a escala aparece como um problema específico. O aluno não consegue realizar as operações matemáticas de conversão. Isto acaba induzindo-o a decorar as relações métricas que a escala representa, sem entender o que aquilo quer dizer. Se começarmos medindo a sala de aula, utilizando objetos concretos como barbante e cabo de vassoura, e depois relacionarmos as medidas encontradas com objetos menores, como pedaços de pau, fósforo ou borracha, a criança será capaz de perceber as relações de proporção, independente da operação numérica. Este processo é gradual e, por vezes, o professor, na ansiedade de que o aluno aprenda, acaba atropelando o tempo de aprendizado da criança. É necessário sinalizar ao professor que a criança muitas vezes ainda não está madura para a execução do raciocínio matemático formal, o que não impede a compreensão do conceito. 53
  • 54. Inicialmente os alunos se encantam pelo estudo da História e da Geografia, depois afirmam que ambas são disciplinas para decorar. O que acontece? Percebemos que a resposta está nas estratégias e nos instrumentos que nós passamos a utilizar. Deixamos de observar o cotidiano e supervalorizamos o texto formal, como se o texto em si encerrasse toda a percepção da Geografia. A partir desta constatação, procuramos resgatar outras linguagens. A presença do lúdico, dos trabalhos de campo e do estudo das artes procura tornar o livro um veículo de informação e descobertas prazerosas. A inclusão do manual procura dar ao professor um embasamento teórico para o desenvolvimento dos conteúdos e atividades. É essencial que tanto o aluno quanto o professor se sintam atraídos pelo livro. Enfim, elaborar material didático é um trabalho de Penélope. É um processo de construção ininterrupto e longo, num contínuo fazer e refazer para que haja a possibilidade do aprender e de progredir. Esperamos que o livro didático, especificamente a coleção de nossa responsabilidade, seja uma contribuição para o professor, dando-lhe a oportunidade de ampliar ainda mais o seu trabalho em sala de aula. A importância do ensino de Geografia no Ensino Fundamental e Médio 54
  • 55. Marília Gomes de Oliveira Bacellar 4 O objetivo de nossa presença neste encontro é de tentar trazer uma contribuição ao ensino de Geografia, a partir de nossa experiência, acumulada ao longo de muitos anos, como professora de Geografia no segundo segmento do Ensino Fundamental, no Ensino Médio e no Ensino Superior em instituições privadas. Porque, e para que, fazer ou estudar Geografia? As pessoas ainda não perceberam que a Geografia faz parte de nossas vidas, de nosso cotidiano. Há pouco tempo, um aluno de 7a série virou-se em sala e disse: “Professora! A senhora poderia falar um pouco sobre aquele ‘cara’ que tem um mapa na cabeça? Meu pai estava conversando com alguns amigos e ele não sabia quem era. Eu disse que iria perguntar para a minha professora que sabe tudo!” O conteúdo que estávamos trabalhando no momento era justamente Europa e aproveitei para falar de Gorbatchev e de sua importância política, para que o aluno pudesse “dar aula” ao pai. Então, ele me disse: “Isto é muito importante! Vou ganhar pontos ‘à beça’ com meu pai, se eu lhe ensinar tudo isso sobre aquele tal ‘homem com o mapa na cabeça’.” Outro exemplo, para mostrar como as pessoas, indiretamente, estão fazendo Geografia, é o interesse nos conflitos do Oriente Médio. As lutas constantes naquela região provocam curiosidade. Onde ficam Israel, Cisjordânia, Palestina? Quem é Yasser Arafat? 4 Professora do Centro Universitário Augusto Motta e do Colégio Pedro II. 55
  • 56. Se pensarmos nos trajetos que percorremos todos os dias, circulando pela cidade e observando as mudanças que a paisagem sofre, estamos fazendo Geografia; quando analisamos notícias de jornais ou acompanhamos em tempo real, pela mídia, ações que estão acontecendo do outro lado do mundo, estamos fazendo Geografia; quando saímos para trabalhar ou passear e observamos o tempo, isso também é fazer Geografia, só que as pessoas não percebem. Então vejam! Para a escola, ensinar Geografia dessa forma é muito importante. Ela não deve ignorar os conceitos espontâneos que o aluno possui, ou seja, uma bagagem de conhecimentos adquiridos gradativamente ao longo da vida e que não podem ser substituídos de uma hora para outra por conteúdos formais, que para esse aluno não têm nenhum significado. Mesmo porque, o tempo de permanência na escola é muito pequeno para que nossas “verdades acadêmicas” tornem-se oficiais. O papel da escola é transformar esses conceitos (geográficos) espontâneos, principalmente no Ensino Fundamental, em conceitos científicos e habilidades, tais como mapear o seu espaço na escola ou seu espaço de vida, incentivando a sua transposição para o papel, com a criação de símbolos para os “acidentes” que ele encontrar em seus trajetos e achar mais relevantes. Assim, estará criando habilidades para, no futuro, perceber e ler legendas, interpretar mapas etc. Uma atividade muito utilizada para o ensino fundamental é fazer a criança contar os componentes da turma, separando-os por sexo, idade, altura ou outro parâmetro que o professor indicar e depois construir um gráfico bem simples e 56