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KEITHISMO:
OS 26 DEZ MANDAMENTOS
DE KEITH RICHARDS
OU: COMO
KEITH RICHARDS
PODE SALVAR SUA VIDA
1. CONHEÇA A SI PRÓPRIO.
“Para mim, o principal para se viver neste planeta é saber quem você é de
fato e ser verdadeiro sobre isso. Essa é a razão de eu ainda estar vivo...
Vivi minha vida do meu jeito e estou aqui porque me dei ao trabalho de
descobrir quem eu sou.”

Acima de tudo, esta é a regra de ouro do Keithismo: conheça-se. A
partir dessa doutrina, todo o resto se encaixará em seu devido lugar.
      E, além de se conhecer, conheça os seus limites. Saiba o quanto
você pode aguentar e o quanto pode aceitar.
      Deixe essa sabedoria entrar pelos ouvidos.
      Somos todos obras musicais — escute a canção. Talvez você
precise tapar os ouvidos de vez em quando, mas tudo bem.
      Uma vez que tiver percebido quais são as suas limitações —
quanto, onde e quando —, não será tão perturbador viver consigo
mesmo. E você não precisa lutar tanto contra isso. Se você é do
tipo mais devagar, tudo bem, seja devagar. Se tem um tempe-
ramento mais acelerado, tudo bem de novo. Se só pode dar 64
passos por dia, ou não consegue comer em meio a muita gente, ou
não resiste a pintar seu cabelo de roxo, tudo bem. Mas se você fica
todo empolado sempre que a tinta cor de lavanda encosta no seu
couro cabeludo, cuidado. Aceite suas qualidades e suas limitações.
Outras pessoas podem lhe dizer quem você é, e quem pensam que
você é, mas, no final das contas, só você realmente sabe.

“Você já viu de tudo, já fez de tudo. Sobreviveu. É esse o jogo, não é:
sobreviver?” — Jack Sparrow, personagem interpretado por Johnny
Depp em Piratas do Caribe.

“Não estou só falando de viver para sempre, Jackie. O negócio é viver
consigo mesmo para sempre.” — Capitão Teague, pai de Sparrow,
interpretado por Keith Richards.

“Ele é uma das pessoas que admiro pelo que fez e pela maneira de ad-
ministrar os acontecimentos. Quarenta e tantos anos sendo esse deus.
E ele é simplesmente cool.” — Johnny Depp, contando que baseou seu
personagem, Jack Sparrow, em Keith.

18
Você pode imitar o quanto quiser, mas sempre voltará para
casa em sua companhia. Pode vestir uma fantasia de Halloween,
mas ela é somente um disfarce. Você pode fugir, mas não pode se
esconder. No final da maratona, você ainda está lá. O trem para
com você. Siga sempre o que você acha que é certo — moral, ética
e esteticamente.


2. SOMOS TODOS IGUAIS DEBAIXO DA
PELE.
“O crânio — ele não tem nada a ver com bravatas e besteiras superficiais...
A beleza é tão superficial quanto a pele. É assim que somos sob a carne,
irmão. Tire o cabelo, arranque a pele, e você está diante de mim e do eu.”

Olhe para uma foto de Keith Richards e, além do cigarro aceso,
você sempre verá duas coisas em suas mãos: o bracelete de alge-
mas e o anel de caveira. Estão sempre lá, como um lembrete. As
algemas lembram que a liberdade deve ser valorizada. O anel de
caveira diz que sob a pele somos todos iguais. E não há tempo
para bobagens. Somos todos iguais.
      Esse conceito vem sendo expresso ao longo do tempo por
grandes mentes, tanto nas artes maiores como nas tidas como
menores. Vamos pegar um exemplo mundano: em um antigo
episódio do programa de TV The Brady Bunch, Marcia, uma
personagem que se revela problemática diante de autoridades,
só consegue passar no teste de motorista quando imagina o seu
instrutor de cueca e camiseta. A lição e o segredo aprendido com
The Brady Bunch: quando você está intimidado por alguém, ima-
gine-o de cueca (ou calcinha). Funciona. O medo vai embora
como fumaça. A caveira serve ao mesmo propósito da cueca — só
é um pouco mais sombria. Mas a mensagem, no final das con-
tas, não é dizer “dane-se”. E sim inspirar a compaixão. Como
escreveu o irmão de alma de Keith, Platão: “Seja gentil, porque
cada pessoa que você encontra está lutando uma batalha difícil.”
Como disse Keith: “Caveiras nos lembram que, no fundo, somos
todos iguais.”


                                                                        19
3. NÃO EXISTEM SEGREDOS.
“Não tenho nada a esconder. Nada é segredo comigo.”

Essa não é uma regra ruim para a vida. Existe um princípio se-
melhante nos Alcoólicos Anônimos: “Você é tão doente quanto
seus segredos.” E você já deve ter ouvido esta máxima bastante
conhecida: “A verdade liberta.” Ou, de Mark Twain: “Se você diz
a verdade, não precisa se lembrar de nada.” A verdade é mais es-
tranha que a ficção, e muito mais interessante. A verdade é um
bom vinho, a mentira é um sangue de boi. Por que não usufruir
do melhor? A vida é muito curta.
     Keith sempre sustentou que se você quer olhar para dentro
da casa dele, ele abrirá mais as cortinas para que você possa ter
uma visão melhor.

“Qualquer coisa que você coloque nas manchetes de primeira pá-
gina posso superar. Porque lhe darei a verdadeira visão de dentro,
que é sempre bem mais interessante... Não quero que ninguém
pense ser uma vantagem espionar minha vida do meu jardim,
achando que pode descobrir alguma coisa que não saberá se não
me perguntar.”

Seja o agressor. Quando você é totalmente franco, ninguém pode
bisbilhotar sua intimidade.

“Não há nada que se possa dizer sobre mim que todo mundo já não
saiba. Você não pode ter uma reputação pior do que a minha. Me
dei conta nos anos 70 de que não tinha motivos para mentir, de que
todo mundo acreditaria no pior de qualquer maneira. Não tinha
mais nada a esconder... Não tem nada sobre o qual valha a pena
mentir.”

Não tenha medo de questionamentos. Deixe qualquer tema o
mais aberto possível à discussão. Introduza o assunto e deixe que
perguntem. Você pode decidir se quer ou não responder às per-
guntas, mas não há nada de errado em perguntar.

20
Só existe uma exceção: qualquer assunto que tenha a ver com
o Elton John. Deixe esse assunto quieto. No mais, tudo bem. Só
fique longe do Elton. É uma porta aberta para problemas.


4. ACEITE OS ROLLING STONES COMO
SEU SENHOR METAFÓRICO.
“Existe o Sol, existe a Lua, existe o ar que respiramos e existem os Rolling
Stones.”

Esse é um favorito de Keith. E não é somente uma opinião arro-
gante sobre a banda na qual ele toca guitarra. Assim como outros
temas bastante conhecidos de Keith — as drogas, a individua-
lidade, a guitarra e, claro, Mick —, os Rolling Stones têm um
sentido metafórico mais amplo quando Keith começa a explanar.
Os Stones ganham o título de grande senhor — uma entidade
que ajudamos a criar, mas que se tornou maior que nós.
      Todos somos parte de alguma coisa, seja família, comunida-
de, uma multidão na rua, uma economia. Ou uma pequena parte
de um cenário maior — o mundo como um todo.
      Temos um papel na criação de coisas que se transformam
em Frankensteins. Esse monstro pode depois ser algo criativo ou
destrutivo, que estimule ou negligencie. O monstro de Shelley,
afinal, nunca foi demoníaco em si — simplesmente foi empurra-
do para o lado negro por aqueles que o criaram.
      Quais são os outros Rolling Stones que existem por aí?
Empresas. Corporações. Sociedades — as abertas e as secretas,
e aquelas tentando ser utópicas. Vizinhos. Governos. Coisas às
quais no referimos como “outras presenças” perigosas — “eles”.
Mas quem cria os “eles”? Quem cria a mística força invisível
que, de alguma maneira, ganhou forma e se transformou num
substantivo?
      Reconheça que você é essencial para a criação e a continua-
ção de qualquer que seja seu Rolling Stone particular. Você pode
acalentá-lo ou se afastar dele, mas, lembre-se: “É maior que eu e
você, baby.”

                                                                         21
Ele existe sem nós, mas existe também dentro de nós.
      Dirija-se. Crie-se.

“Os Stones sempre devem procurar os Stones que estão dentro deles.”


5. O FORMATO DA BANDA É UM
MODELO DE INTERAÇÃO.
“Química foi uma das matérias em que nunca fui bom na escola... Mas
acho que é o desconhecido — a centelha misteriosa — que faz a diferença.
É o mesmo com os Stones. Quer dizer, coloque todos em fila na parede, e
eles são a mais improvável boa banda de rock ’n’ roll que existe por aí!...
Há algo a ser dito sobre uma certa química entre as pessoas que resulta
num certo tipo de música.”

Tem sido apontado repetidamente sobre os Stones que, assim
como com os Beatles, muito de seu sucesso e de sua mágica vem
da combinação certa de pessoas. Simplesmente a química certa.
Ron Wood acrescentou: “Individualmente, dificilmente impres-
sionaríamos, mas, juntos, temos um poder acima de nós mes-
mos.” A soma de diferentes personalidades — assim como dos
instrumentos — cria uma sinfonia, uma canção. A unidade de
uma banda é a conglomeração de personalidades e instrumentos
em equilíbrio. É mais forte como um todo.
      Para viver a vida como Keith Richards, aceitamos diferen-
tes personalidades e estilos como entidades separadas, necessárias
para o trabalho em conjunto. Todas têm uma necessidade e um
propósito. Até mesmo Mick. Os membros da banda são “outros
seres”. Todos trabalham em harmonia, criando um som.
      Claro, algumas bandas são melhores que outras. E preste o
máximo de atenção na música para decifrar quais são as boas e
quais são as ruins. Volte-se para as melhores, fique longe das ruins.
Se boa música faz bem para a alma, música ruim pode destruí-la.
Ou levar você à loucura.
      Se os outros membros da banda parecem precisar se colocar em
frente ao espelho para treinar como cuspir, diga não. Algumas dicas
rápidas relativas a bandas ruins: sempre que houver muita pose, saia

22
correndo. Nesse caso, de acordo com Keith: David Bowie, Beck,
Duran Duran. Ou qualquer coisa que precise de barbeador, como
George Michael. Ou que precise envelhecer uns dez anos antes de
ser visto em público sem cair no ridículo, como Oasis. E qualquer
coisa que tenha um toque Elton John — corra como vento. Como se
velas acesas tivessem sido derrubadas pelo vento e estivessem prestes
a incendiar o lugar. Corra como se Satã estivesse atrás de você.
      Boas bandas: AC/DC. Motorhead. Qualquer coisa verdadei-
ra, que tenha uma “pegada humana” autêntica. Little Richard,
Elvis, Buddy Holly. Não deve haver nenhuma dúvida de que o
cantor acredita no que está dizendo.
      Excesso de saxofone: proteja os que você ama disso. Dezesseis
violões: estão fingindo. Ausência de bateria: suspeite. Se não tem
batimento cardíaco, não está vivo. E fique longe de Eric Clapton.
Você acabará como Eric Clapton e os Rolling Stones. Você precisa
de uma banda.
      E se a banda na qual você está não é necessariamente a melhor,
lembre-se de uma das crenças principais de Keith: “Sempre existe o
futuro.” Cada trabalho leva você adiante e, com sorte, a algo melhor.
      Apesar de termos de nos conhecer e ser verdadeiros com nós
mesmos, saiba que é através do bem maior do grupo que a mágica
acontece. É por intermédio do grupo que as coisas mais bonitas,
inclusive a arte, se manifestam:

“Rock ’n’ roll é interação... Consiste em uma tensão e uma comuni-
cação interessantes entre um cara e outro... Não é possível encontrar
isso em nenhum medidor em estúdio. Para mim, as canções vêm por
osmose. Todas as melhores músicas são basicamente belos acidentes.”


6. ACEITE (OU PELO MENOS TOLERE)
SEU MICK INTERIOR E EXTERIOR.
“Mick é rock. Eu sou roll.”

Natureza dupla? Gêmeo do mal? Todo mundo tem. Não adianta
lutar contra isso. Se você tentar sufocar seu gêmeo do mal com um

                                                                  23
travesseiro no meio da noite, ele se transformará em um fantasma.
Assombrará seus sonhos.
      O melhor é se acostumar com ele.
      E enquanto você vai se acostumando, coloque-o para traba-
lhar a seu favor. Ou ao seu lado.
      Mick Jagger e Keith Richards são os dois lados de um par de
gêmeos siameses. Conectados, inseparáveis. Mas diferentes. Keith é
o gêmeo do mal para Mick, e Mick é o gêmeo do mal para Keith.
      Mas manter o gêmeo do mal sob controle é uma arte. No Kei-
thismo, chamamos de “aceitando seu Mick interior e exterior”.
      Toda vez que Keith Richards se senta e começa a falar, o
assunto Mick Jagger é inevitável, e, quando isso acontece, Mick
se transforma em metáfora para seu segundo eu. E, apesar desse
segundo eu parecer frustrante ou irritante, está lá por uma razão.
É um equilíbrio para seu verdadeiro eu. Aquele que você passa a
conhecer através do primeiro mandamento. É como a Lua para o
Sol. Uma cor escura para uma cor clara.
      Às vezes, o gêmeo do mal vive dentro de você, o que não
é tão ruim, desde que fique de olho nele. Mas, quando ele é sua
própria criatura, andando por aí na forma de outra pessoa, pode
ser um pouco mais difícil. Ele se transforma na guerra entre o
Mick interior e o Mick exterior. Ainda assim, os dois podem ser
administrados sob a mesma fórmula.
      Existem cinco passos para que você aceite o Mick interior
ou o exterior: 1) Identifique-o; 2) Compreenda a criatura; 3) Abra-
ce-a como tal; 4) Ajude a trazer à luz o que há de melhor nela; 5)
Aprenda com ela.
      O Yin existe para seu Yang. O rock existe para o roll.
      Sem Keith não haveria Mick e vice-versa. Temos tudo isso
dentro de nós e dentro dos mundos em que vivemos.


7. ALIMENTE SEU CHARLIE INTERIOR.
“Se Mozart tivesse tido um bom baterista...”

A pessoa quase perfeita, aos olhos de Keith, sempre foi Charlie
Watts. Ele é o individualista por excelência, alguém que fica longe

24
dos holofotes, um pouco tímido, excêntrico, humilde. Tem sua
própria batida. A espinha dorsal do grupo e também do indivíduo
é o baterista. Tenha uma viga mestra de moral sólida, modesta,
ética, sem pretensão, e estará em boa forma. A partir de um ba-
terista sólido, tudo toma seu devido lugar. Encontre os Rolling
Stones dentro de você mesmo, mas assegure-se de que o baterista
é forte e não um poseur.
      “E se Bach tivesse tido um bom baterista... E se...”


8. ACEITE SEUS VÍCIOS, ENCARE-OS
COM HUMOR E LIVRE-SE DA CULPA.
“Não gosto de me arrepender da heroína, porque aprendi muito com ela.
Foi algo por que passei e que administrei. Iria me arrepender se não tives-
se conseguido lidar com ela.”

Existe um antigo ditado: “Uma opinião é como o cu. Todo mun-
do tem um.” Outra verdade: vício é como o cu. Todo mundo tem
um também. Ou dois. Ou três. É fácil julgar o outro quando o
vício dele é diferente do seu, mas, se você experimentar o dele
para comparar, ou vice-versa, começará a compreender. Como
Rousseau escreveu: “Só temos pena dos demônios alheios que já
experimentamos.”
      Mas, no mundo de Keith, a chave é não eliminar os vícios, e
sim, sobreviver a eles. Aqui vão as chaves:
      1) Aceite seu vício e saiba que a experiência advinda dele fez de você quem é
          e ampliou sua individualidade.
      2) Tenha senso de humor em relação a seu lado negro.
      3) Que se dane a culpa.
      O número três é o que empurra tudo para o lugar.
      E, finalmente, o importante é onde você sai quando chega ao
outro lado. O fundamental é encarar o problema, lidar com ele e
superá-lo.
      Saiba, também, que vícios não são necessariamente fraque-
zas. São aflições, doenças. Podem ser muitas coisas. Uma inca-
pacidade de parar de espirrar. Ansiedade. Transtorno obsessivo-


                                                                               25
compulsivo. Depressão. Um intestino apaixonado pela diarreia.
Uma perna bamba. Todas essas coisas nos parecem monstros de
fraqueza. Tenha calma e não desista até que elas desistam. Porque
nós temos como acabar com elas.
     Não é nosso vício que nos mata. Não se sobrevivermos a ele.
Como diz Keith: “Eu nunca tive problemas com drogas. Só tive
problemas com a polícia.”
     Todos temos um problema de heroína metafórica. Talvez to-
dos nós tenhamos uma polícia metafórica também.


9. USE A MÚSICA À SUA VOLTA, SUA
ANTENA E SUA GUITARRA INTERIOR.
“Eu não acho que escrevo canções; sou uma antena. Na verdade, você recebe
as canções... Você simplesmente se senta ao piano ou pega uma guitarra, e,
para mim, depois de uns dez ou quinze minutos, algo que eu nunca tinha
ouvido começa a surgir; só preciso dar forma a isso e transmitir, entende?”

O instrumento escolhido por Keith, a guitarra, é mais que madeira e
cordas. O instrumento se conecta a uma antena interna e capta ondas
do mundo que estão à sua volta, transformando-as em algo novo.

“Eu olho para a guitarra às vezes e penso: ela só tem seis cordas e doze
espaços, cara. Mas quanto mais você toca, mais coisas saem dela...
As coisas chegam numa ordem estranha. Se você consegue manter o
mistério e a excitação de descobri-las, não é capaz de desistir do troço.
É muito intrigante.”

Encontre um instrumento. Pode ser a voz, a escrita, a pintura, a
carpintaria, a cerâmica. Você ficaria surpreso com o que uma an-
tena pode transmitir a um vaso de cerâmica.
     Então, levante a antena e deixe que as ondas cheguem até você.

“As canções já estão por aí. Estão por aí... As pessoas acham que você
é um compositor, que você escreve as canções, que elas são todas suas,
que você é totalmente responsável por elas. De verdade, você é só um

26
meio, um veículo, alguém que desenvolveu a facilidade de reconhecer
e alcançar coisas, basta que esteja pronto para estar lá, como num
encontro espiritual; elas simplesmente saltam no ar. Canções inteiras
simplesmente chegam a você, você não as escreve. Eu não fiz nada
além de ter a sorte de estar acordado quando elas chegaram.”
      Sintonize a canção do éter, esteja ela vindo do vento, da fu-
maça que sai elegantemente de dentro da torradeira ou das laba-
redas tremeluzentes da casa mais uma vez em chamas. Os belos
acidentes estão à espera.


10. COLOQUE EM PRÁTICA A ANTIGA
ARTE DA TECELAGEM.
“Tínhamos duas guitarras entrelaçando-se. Já havíamos tocado tanto que
conhecíamos bem a parte de cada um. Então, quando chegávamos no pon-
to crucial, no ponto explosivo, de repente, trocávamos. A guitarra prin-
cipal pega a base, e a base pega a guitarra principal. É o que Ronnie e eu
chamamos de antiga arte da tecelagem. Nem precisamos olhar um para o
outro, quase. É pura sensação.”

Na tecelagem, não existe guitarra principal nem de base. Os músi-
cos trocam de posição o tempo todo. Ninguém toma as rédeas do
controle absoluto. Essa é uma chave metafórica para a comunica-
ção em qualquer relacionamento, seja entre pai e filho, professor e
aluno, traficante e viciado.
      No palco, é uma questão entre duas guitarras. Fora dele, é
algo entre duas pessoas. Duas pessoas dançando em um nível físi-
co, espiritual e musical.
      Existe democracia, igualdade. É uma dança, e a dança, defi-
nitivamente, ensina a aceitar o que há de individual nos outros e
a dançar com as pessoas ao seu redor.

“Tem um cara só,mas ele tem quatro braços.”

“Quando estamos no nosso melhor, Ronnie e eu fazemos tapeçaria
Bayeux no palco.”

                                                                       27
Você pode aprender muito com a guitarra. Ela pode ser uma me-
táfora para a vida — como um instrumento não só para fazer
música, mas também para se aprender a criar e a interagir.
“Cinco cordas, três notas, dois dedos e coragem; é isso! Você pode tocar
a danada. É só disso que precisa. O que você faz com ela são outros
quinhentos.”


11. CONQUISTE OS CLÁSSICOS.
“Todo mundo começa imitando seus heróis.”

“Os grandes são os grandes. Você sabe quem eles são.”
Aos 15 anos, Keith sentou no topo da escadaria de sua casa e ficou
tocando Chuck Berry e Elvis Presley até que se tornassem parte
dele. A música se transformou no seu ser mais profundo; virou
parte de seu sangue. Mais tarde, ele fez o mesmo com o blues e
com Hoagy Carmichael.
      A partir de uma fundação sólida, pode-se construir uma casa.
E uma que seja altamente original.
      Não importa a disciplina que você escolhe. Essa regra é es-
sencial. É a razão pela qual Picasso começou aprendendo a dese-
nhar maçãs que realmente pareciam maçãs.

“Fora Chuck Berry, eu faço melhor o Chuck Berry do que quase todo
mundo. Mas eu preciso parar de fazer Chuck Berry e começar a fazer
Keith Richards.”


12. SAIA DE DENTRO DA PRÓPRIA
CABEÇA E PERMITA-SE SENTIR.
“Aí vai uma do Ronnie: ‘Às vezes tenho a sensação de que milhares de pes-
soas estão olhando para mim. Eu sou paranoico?’ Se você pensasse demais
nisso acabaria ficando paralisado.”

Ronnie, também conhecido como Keith Jr, estava falando sobre
estar no palco em frente a um mar de pessoas, mas isso pode se

28
referir a muitas das experiências diárias. O que importa: analisar e
pensar em excesso são atitudes que podem deixá-lo exausto. Con-
fie na sua intuição e nos seus instintos. A racionalidade pode ser
uma maneira de evitar contato e de criar uma rota de fuga. Muita
análise pode aleijar você.

“Sempre fiz coisas de maneira intuitiva, sabe? Acho que o cérebro
empata muitas coisas.”

      Pensar pode virar uma droga. E como qualquer droga, em
excesso, pode ser letal. Para sobreviver no palco da vida, basta
sentir a música. Ouça-a e sinta-a. Existe música nas atividades
do dia a dia — seja quando você pega o metrô, quando atra-
vessa a rua ou quando entra num elevador. Faça alguma coisa.
Construa uma casa. Se não uma casa, um templo para Jimmy
Hendrix e um quartinho para ficar doidão. Toque um acorde
poderoso. Incendeie outra casa ou uma cama. Jogue outro carro
num despenhadeiro e assista à sua queda e à sua explosão numa
rica combinação de labaredas. Saia de dentro da cabeça e entre no
corpo. O cérebro é ótimo, mas não come, não se reproduz nem
salva uma mulher de um prédio em chamas. Só o seu corpo pode
ajudá-lo nesse caso.

“Eu não penso quando estou no palco. Eu sinto. Uma vez lá, você é o
que você é. Nós somos só sentimento.”

Sinta a música. Viaje com ela.
     E use o toque. Já reparou como esses caras dos Stones se to-
cam? É uma conexão visceral. Toque no que está perto e no que
ama. Toque nas pessoas que conhece. Se não houver ninguém, to-
que nas coisas. Texturas. Temperaturas. Tente de tudo: enrugada,
dura, espetada, sedosa, macia, gelada, sob a água. Coloque suas
mãos nas coisas. Você sempre pode recorrer a um Band-Aid caso
se machuque.




                                                                 29
13. MESMO QUE TENHA QUE FAZER
ISSO EM SEGREDO, SEJA GENTIL.
Ajude quem tem menos sorte e é menos afortunado.
      Não dar a mínima não é o mesmo que ser cruel.
      Não deixe a imagem de bad boy de Keith enganar você. Essa
imagem é bastante romanceada. Ele é um cara secretamente co-
nhecido por uma conduta moral que beira seriamente a caretice.
Talvez seja um pouco mais do que isso. Talvez você não deva se
importar em fazer um favor a alguém. Às vezes é bom para seu
ego. Ou ajuda a criar acordes mais potentes.
      Como disse um antigo membro dos Stones, Ian Stewart: “Eu
vi o velho demônio fazer coisas boas na surdina.” O rastro de
gentileza vai bem mais longe. Dê uma olhada nesta carta de um
fã à revista Tiger Beat em 1964: “Eu sei que a última vez em que
eles estiveram na cidade, Keith telefonou pessoalmente para uma
garota inválida que estava doente havia anos. Depois de ouvir sua
voz, ela começou a melhorar. Agora, está quase boa. Não me diga
que os Stones são garotos sem Deus.”
      O carma é um bumerangue. Um ato de gentileza voltou voan-
do como um poderoso bumerangue durante o julgamento — por
uso de drogas — de Keith no Canadá.
      Havia uma adolescente cega de Toronto que sempre ia aos
shows dos Stones, e Keith era quem tomava conta dela, garantindo
que fosse levada para casa em segurança. Como ele dizia: “Deus
sabe o que pode acontecer com uma garota cega na estrada.”
Durante o julgamento, a jovem foi até a casa do juiz, contou-lhe
a simples história da gentileza de Keith e assim o livrou da cadeia.
A sentença foi um show gratuito para os cegos. Keith descreveu a
resolução do caso: “Foi uma das sentenças mais bizarras de todos
os tempos: ‘o cara é pego com 28 gramas de heroína e sentenciado
a fazer um show de graça para os cegos!’ Essa tem que entrar para
os anais da história legal, não?”
      Por meio da gentileza vem o amor, e coisas místicas
acontecem.
      É o mais perto que podemos chegar de Deus. E, através da
gentileza, vem a absolvição.

30
Keith chama a jovem de Toronto de seu anjo cego. Todos temos
esses anjos por aí. Talvez existam anjos cegos escondidos no departa-
mento de sapatos da Macy´s ou na barraquinha de cachorro-quente.
Podem aparecer para ajudá-lo quando você menos esperar. Talvez se-
jam cegos, mas raramente são tolos, e você pode precisar deles quan-
do os braços da lei se abrirem e o tocarem no lugar errado.
      Seja gentil. Isso o mantém no caminho.
      E, se puder, faça doações anônimas. E perdoe as dívidas.
(Dois atributos não tão conhecidos, mas bastante característicos
de Keith).


14. APRECIE UMA VIDA NÔMADE —
MESMO QUE NOS CONFINS DE UMA
PEQUENA CIDADE.
“Eu gosto de ver as maneiras como o mundo gira.”

Ande por aí. Mude. Veja coisas novas. Vá a lugares onde as coisas
são diferentes, onde existe música diferente. Siga as setas ou vá até
onde os cães não podem achá-lo. Mantenha-se aberto à transfor-
mação. Existe um mundo enorme lá fora. Quanto mais você vê,
quanto mais lugares você visita, maior você é. E há uma recompensa
a mais para esse contínuo movimento: ele mantém a polícia longe.
      Observe seu universo e os universos atrás da sua casa.
      Como escreveu Descartes: “Viajar é quase como conversar
com pessoas de outros séculos.” Mantenha-se em movimento,
vendo “as maneiras como o mundo gira”; mas fique com um olho
na frente e outro atrás (ou seja, Mandamento 15).


15. ACEITE E VIVA COM O PASSADO (A
GRANDE HISTÓRIA) E O FUTURO (A
POSSIBILIDADE).
Olhe para uma foto de rosto de Keith. O olho esquerdo olha de
maneira otimista, com energia juvenil, para o futuro. O direito é
um pouco fundo, introspectivo.

                                                                  31
O canto esquerdo da boca aponta um pouquinho para bai-
xo; o canto direito repuxa um tanto para cima.
      Existe um equilíbrio entre o futuro otimista e o olhar intros-
pectivo para o passado.
      O rosto nos conta uma história, nos direciona através de um
mapa e revela segredos. E, no rosto de Keith, essa história pode ser
resumida como “aqui e lá, ao mesmo tempo”.
      Como escreveu Cícero: “o rosto é a imagem da alma.” E você
pode ver no rosto de Keith uma certa visão filosófica do tempo —
uma visão simultânea de passado, presente e futuro.
      A necessidade de estar atento ao que já passou é algo que
nos foi dito milhares de vezes, como na citação muito repetida de
George Santayana: “Aqueles que não se lembram do passado estão
fadados a repeti-lo.”
      Também é importante não somente lembrar do passado,
mas senti-lo — assim como o presente.
      Filósofos New Age acentuam a necessidade de se “estar aqui
e agora” e de se sentir o poder do agora. Isso é bom e verdadeiro,
mas ter consciência do quadro geral nos conecta com todos os
tempos — o presente, o passado e o futuro, que está por vir —,
com tudo isso que é tão real quanto o momento que estamos
vivendo.
      Em relação ao seu passado pessoal, possivelmente duvidoso
(o que, segundo Keith, é uma bola presa em uma corrente de
ferro que segue você aonde quer que vá), lembre-se de que você
tem o direito de “se aposentar do serviço militar” e colocar esse
passado no passado. O passado tem pernas e pode segui-lo. Mas,
como com tudo que pode segui-lo — um fã obcecado, a polí-
cia, traficantes que não desistem, as tietes de Mick —, você pode
colocá-lo em seu devido lugar e olhar em outra direção. Prenda-o
num quartinho no fundo do Hotel da Memória. Escreva uma
canção sobre o assunto, tranque-a lá no quartinho e jogue fora
a chave. Feito. OK. O passado continua existindo, mas você o
colocou onde queria. Onde merece ficar. E onde você pode ter
algum controle. O Hotel da Memória: você é o dono e o gerente
encarregado desse lugar.

32
16. A RESPIRAÇÃO CRIATIVA — INSPIRE
O QUE VOCÊ AMA.
“Eu cheirei o meu pai. Ele foi cremado, e eu não pude resistir misturar
um pouco de suas cinzas com um pouco de pó. Meu pai não se importaria.
Desceu bastante bem, e eu ainda estou vivo.”

Cheirar as cinzas do pai. Uau! Gostaria de ter bolado isso.
      Quando a revista britânica New Music Express perguntou a
Keith em 2007 qual tinha sido a coisa mais estranha que já cheira-
ra, esse comentário sobre o pai foi recebido com uma tempestade
de choque e horror.
      Keith rapidamente recuou — disse que estava brincando.
      Depois recuou novamente: sim, é verdade, ele disse; e afir-
mou ter fingido que inventara somente para não magoar a mãe,
que estava morrendo. Talvez ele não quisesse que a mãe pensasse
que ele pretendia fazer o mesmo com ela.
      É verdade que um bocado do que Keith inalou criativamente
ao longo dos anos, além do pai, se enquadra na categoria de “subs-
tâncias ilegais” ou “medicina recreativa”, mas ele também sempre
inalou, de maneira exuberante, aquilo que o sustenta: música, fa-
mília, amigos, sinuca, gargalhadas.
      De acordo com Harold Schechter em um editorial do New
York Times, cheirar o pai não é tão absurdo assim. Vem de uma
prática de canibalismo funerário, a qual “brota de um impulso
profundo e muito humano: o desejo de incorporar a essência de
alguém amado dentro do próprio corpo; a crença de que, quando
alguém próximo morre, a pessoa vive dentro de nós, tornando-se
uma parte imortal de nosso ser mais profundo.”
      Talvez todos nós devêssemos participar desse tipo de inala-
ção. E com frequência.
      Inspire o que você ama.




                                                                    33
17. SEJA FORTE, SEJA CORAJOSO
E NÃO CEDA ÀS ORDENS DAS
AUTORIDADES.
“Desde que saí da escola, ninguém ouviu um ‘Sim, senhor’ vindo de mim.
Fora algumas exceções: no tribunal e na cadeia.”

Pode não ser tão fácil viver de acordo com essa assertiva; mas, no
fundo do coração, podemos fazê-lo. A única ordem que você pre-
cisa ouvir é a que vem de dentro.
      Se você é alguém cujo relógio interno diz que deve ficar acor-
dado até tarde, fique acordado até tarde. Desafiar a autoridade
não significa sair pichando o metrô (se bem que isso ajuda), mas
sim fazer de você mesmo a autoridade real — como apontado
nas regras um e dois de Keith — e não se render ao que os outros
acham que deve ser. E, dentro disso, é claro, conheça seus limites.
Só se pode ir adiante com certo tipo de desafio até instantes antes
de ele se virar contra você e o atingir. Não tenha medo. Como
Keith diz: “Eu não fico com medo, fico com raiva.” Tem mais
energia na raiva. Basta perguntar ao Johnny Rotten.


18. DÊ VALOR À FAMÍLIA E AOS
AMIGOS INDEPENDENTEMENTE
DA LOUCURA QUE ELES PODEM
PROVOCAR.
“A única maneira de você ser como eu é tendo uma boa família.”

Num primeiro olhar, esse pode ser um chocante sentimento anti-
Keith. O fora da lei todo sentimental sobre família? Mas isso vem
de um cara que já foi uma criança orelhuda que entrava em pânico
toda vez que não encontrava sua mãe no lugar combinado para
buscá-lo depois da aula. É também o mesmo cara que, na prisão,
escreveu uma carta enquanto olhava para o céu pela janelinha mí-
nima da cela: “Querida mamãe, não se preocupe...”
     Ninguém poderia dizer que Keith é o queridinho da mamãe,
mas fatos são fatos. E isso acabou sendo uma coisa boa. Ele tratava

34
bem sua mãe. E, depois de vinte anos de estranhamento com o
pai, eles se reconciliaram, tornaram-se amigos chegados e parceiros
de dominó. Seu pai, sua ex-mulher, sua mulher atual e seus filhos
sempre foram aos seus shows. Seu casamento tem quase trinta anos.
Ele jamais revelou qualquer coisa íntima sobre a vida dos filhos.
      E, apesar de não ser, certamente, um pai, um marido ou um
filho tradicional, sua família sempre sabe onde encontrá-lo e sabe
que seu amor está sempre presente.
      Uma palavra de sabedoria de Keith: cuide de sua família,
mesmo que tenha que fazê-lo em segredo. Sempre funcionou para
ele. Pode apostar que essa é uma das razões para que tenha man-
tido a amizade com Mick Jagger desde os anos 40. Existem boas
ações acontecendo discretamente. Mesmo que você carregue uma
faca no bolso da calça, ou tenha que levantar um machado ou um
revólver para Ron Wood de vez em quando, isso não significa que
você não é leal.

Sobre família: “Se você tiver uma chance, experimente, porque é uma
das coisas mais especiais da face da terra. Ela oferece aquele último elo
perdido sobre o sentido da vida.”

Sobre os amigos: “A única maneira de saber se um cara vale alguma
coisa é apostando nele. Às vezes os amigos nos decepcionam, às vezes não.
Mas você precisa apostar, caso contrário, não ganha nada de nada.”


19. COLOQUE-SE. A HONESTIDADE É
MEDICINAL.
Você acredita nas coisas que Keith diz sobre Mick para a imprensa?
     E o que Mick diz de Keith?
     E o que Keith diz sobre Ronnie? E o que Ronnie diz sobre
Keith?
     E o que Charlie diz sobre Mick?
     Talvez nem todos consigam sair ilesos, mas, de alguma for-
ma, isso funciona com os Stones. Uma porção de cachorros latin-
do. É algo a ser imitado.

                                                                      35
É melhor botar para fora que guardar.
      Existe uma regra aqui, no entanto, relativa àquilo que pode
e ao que não pode vazar. Já reparou que, com todos os membros
da banda falando abertamente sobre os outros publicamente,
nenhum deixou escapar algum segredo do outro? O que eles
estão manifestando publicamente são opiniões. Coisa pequena.
Fazer piada da roupa de lycra colante incrivelmente embaraçosa
do gêmeo do mal, do vexame de entrar em palco dentro de uma
máquina usada para colher frutas, ou da interminável pulação à
la Peter Pan durante a performance. Ou pegar no pé de namo-
radas cujos papos são tão interessantes quanto falar com uma
janela aberta. Ou fazer pouco das pretensões políticas do gêmeo
do mal. O que está por baixo das relações é sempre mantido em
silêncio de honra. Perceba que confidências são guardadas. Nin-
guém entrega ninguém. Siga essa regra. Como costumam dizer
aqueles que o conhecem: “Não se quebra uma promessa feita a
Keith.” E pode ter certeza de que isso funciona em mão dupla.
Você pode falar, descarregar, ter uma boca grande, mas conheça
sempre os limites éticos. Passe dessas linhas e você entrará no
território: “Você ferrou com o Keith?” Não existe floresta mais
escura que essa.


20. TALISMÃS TÊM PODER.
Sair de casa pode ser o mesmo que entrar num campo de batalha,
especialmente se você não avisou seu supervisor de condicional.
Mas você nem precisa atravessar a porta da frente para entrar na
zona de combate. Todos precisamos nos sentir protegidos — e pro-
teção pode ser encontrada em coisas pequenas. Pode ser algo fun-
damental como um anel que lembra sua coragem, ou o cheiro de
um perfume que o acalma. Um elástico amarelo com uma mensa-
gem impressa. Uma chave num cordão escondida sob sua camisa.
Uma tatuagem que ninguém vê. Que tal um punhado de metal e
de couro preso no seu cabelo?
      Dê uma olhada em Keith. Com todos aqueles badulaques e
penas no cabelo, ele parece um guerreiro enfeitado. Existe uma

36
força concentrada em tudo aquilo pintado e preso em seu cor-
po. É um arsenal. Existe poder naquilo que nos faz lembrar de
algo ou que nos distrai. Os talismãs existem há centenas de anos
por uma razão. Não se intimide. Tenha sua própria coleção. Faça
uso dela.


21. ACEITE MAX MILLER NA SUA VIDA.
(OU: É TUDO UMA TREMENDA PIADA,
PORRA. RIA.)
“É maravilhoso estar aqui. É maravilhoso estar em qualquer lugar.” —
Max Miller.

Antes de aceitar o conceito metafórico dos Rolling Stones como
um poder superior e grande senhor, saiba que Max Miller é o seu
profeta.
      Pode ser uma surpresa, mas o príncipe das trevas tem retira-
do boa parte de sua filosofia e algumas de suas melhores frases de
Miller, um músico britânico papagaiado, importante dos anos 20
aos 50. A frase “É maravilhoso estar aqui, é maravilhoso estar em
qualquer lugar” era o marco de Miller; e é como Keith cumpri-
menta rotineiramente a plateia.
      Miller pode não ser conhecido hoje como era em seus dias, mas
está vivo em Keith Richards. Miller era conhecido por levar suas cau-
sas a limites extremos, perigosos — e isso incluía seu guarda-roupa.
Seu vestuário era uma mistura de estilos bizarros de várias classes,
culturas e vários gêneros, juntos em uma apresentação ligeiramente
louca. Pode-se dizer o mesmo de Keith, com sua a combinação de
gravata borboleta de bolinha, jaqueta de onça, echarpe marroquina,
brinco de pirata, botas cubanas e bijuteria feminina. É um Max re-
trô. O vaudevile e a música de orquestra se transformando em rock
’n’ roll. Como disse Keith: “A melhor arma do rock ’n’ roll é o hu-
mor.” Só fica faltando uma flor que esguicha água na lapela.
      Quando os Stones estavam testando novos guitarristas nos
anos 60 e 70, se o candidato não soubesse nada de Max Miller,
sua ficha era destruída.

                                                                  37
É como aceitar religiosamente os Irmãos Marx. O humor
sempre salva. Como disse Andrew Carnegie: “Existe pouco suces-
so onde existe pouca gargalhada.” Ou como disse Viktor Frankl
no livro Em Busca de Sentido: “A tentativa de desenvolver um sen-
so de humor e de ver as coisas de maneira bem-humorada é um
tipo de truque aprendido enquanto se aperfeiçoa a arte de viver.”

“Ainda que os policiais estejam mais uma vez acordando você, é pre-
ciso encontrar uma maneira de rir.”

Rir vicia. É o melhor tipo de vício. Cheire o riso e coloque-o para
fora. Conte uma ou outra piada idiota de vez em quando.


22. A EXPERIÊNCIA É O “PREÇO DA
EDUCAÇÃO”.
“Seja o que for que tenha acontecido — mesmo que tenha sido um saco —,
aprendi coisas com a experiência. E ganhei algo com ela... Nunca me preocu-
pei com quem tirou quem de onde. Acho que esse é o preço da educação.”

Pague o preço. E siga em frente. Não olhe pelo retrovisor se puder
evitar. Pise no acelerador e vá em frente. (Só não bata o carro de
novo na saída.)
      O preço da educação. Esse é um mantra a ser repetido. É di-
nheiro bem gasto. Talvez não pareça ser assim no momento, mas
confie nas leis da justiça econômica. Você ganhará o dinheiro de
volta do outro lado da viagem depois que sair do túnel. E prova-
velmente em maior escala, com direito à gorjeta.

“Keith Richards faz tudo uma vez.”


23. VIVA E DEIXE VIVER.
É realmente muito mais fácil passar pela vida obedecendo a essa
máxima. Mas também é uma dessas frases que são bem mais bo-
nitas no papel e nada fáceis de pôr em prática. Afinal, existem

38
toneladas de imbecis e cabeças de merda por aí. Mas mesmo os
imbecis e os cabeças de merda merecem um lugar ao sol nesse
planeta. Está tudo relacionado ao conceito de aceitação. Assim
como você tem que aceitar a si mesmo, precisa aceitar que outras
pessoas estão por aí também. Exatamente como o Mick interior
e o exterior. Uma maneira fácil de colocar em prática o Man-
damento 23 é ficar craque no Mandamento 21, ou seja, aceite
Max Miller em sua vida. Se você conseguir achar graça, não será
tão ruim. E, se não funcionar, lembre-se de que é exatamente o
que acontece quando você vê um monte de cocô de cachorro no
meio da calçada. Não há nada que possa fazer a respeito. É me-
lhor aceitar. Viva e deixe o cocô na calçada viver. Isso nos leva ao
próximo preceito:


24. MERDAS ACONTECEM.
Murmurar essas duas palavras é como tomar 5 miligramas de Va-
lium. Aceitação acalma. E, como muitos dos segredos de Keith,
aqui vai mais um baseado nessa ideia.
     Aceite que merdas acontecem. Faz parte da vida. E, se você
acha que não vai acontecer nenhuma, pode aceitar, a partir de
agora, que você está ferrado. Merdas acontecem de fato e aconte-
cem de novo, e depois mais um pouco. Portanto, diga essas duas
palavras em voz alta, baixa, em silêncio, sempre que algo estranho
acontecer. É como espantar uma mosca. Tão fácil como acender a
luz ou o quinquagésimo Marlboro do dia. Clique. A luz acendeu.
Merdas acontecem.


25. QUANDO SE DESESPERAR,
LEMBRE-SE: TEM SEMPRE O FUTURO.
As coisas nem sempre são tão ruins quanto parecem de primeira.
Claro, no momento pode ser péssimo. Você caiu de um coqueiro.
Botou fogo num quarto de hotel. Mas o tempo não para, e, de
fato, “tem sempre o futuro”. O futuro virá, mesmo quando você
estiver tomado pelos tremores da desintoxicação ou quando vir

                                                                 39
novamente aquele homem com algemas vindo na sua direção. As
leis da física e da ciência — do tempo — ainda estão do seu lado.
O tempo anda para a frente, o tempo cura de fato. E esses mo-
mentos Belzebu chegam a um fim.
      Se você mantiver isso em mente, conseguirá passar por esses
momentos. Se vir isso como uma estrela brilhando no horizonte
das possibilidades, como um reino do “eu chego lá”, terá algo
capaz de ajudá-lo nos momentos difíceis. É uma expressão que
costuma pontuar as frases de Keith quando fala sobre algo nada
glorioso, uma falha pessoal, um show que não foi bem: “Tem
sempre o futuro.” É um bilhete para sair do presente quando este
não corresponde à maravilha do “aqui e agora.”
      Por mais que se diga que o presente é um presente, às ve-
zes você acha que pode sobreviver sem a caridade de tal donativo
maldito. É quando o futuro se torna seu amigo. E ele pode ser um
bom amigo.


26. PASSE ADIANTE.
Faça como fez Muddy Waters. E Robert Johnson, Buddy Holly,
Elvis. Eles passaram adiante a tradição, o conhecimento que veio
do passado; tudo o que experimentaram e aprenderam. Você
aprende, aperfeiçoa e passa para as gerações que virão depois de
você. E esta é a mensagem que Keith diz querer gravada no seu
túmulo: “Ele passou adiante.”
      Existem várias maneiras de passar algo adiante, e há muito
o que passar — sejam lições de gentileza, de como tocar um ins-
trumento ou compreender os blues (e as outras cores) da sua vida.
Passe adiante amor, gentileza, boas ações secretas, alegria, música
e sabedoria. E, através disso, você passará adiante sua própria es-
sência. Mesmo que o processo para adquirir o conhecimento seja
mais parecido com a passagem de uma pedra pelos rins, ainda
assim a arte de passar adiante é uma das ações mais profundas em
direção à imortalidade.




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  • 1. KEITHISMO: OS 26 DEZ MANDAMENTOS DE KEITH RICHARDS OU: COMO KEITH RICHARDS PODE SALVAR SUA VIDA
  • 2. 1. CONHEÇA A SI PRÓPRIO. “Para mim, o principal para se viver neste planeta é saber quem você é de fato e ser verdadeiro sobre isso. Essa é a razão de eu ainda estar vivo... Vivi minha vida do meu jeito e estou aqui porque me dei ao trabalho de descobrir quem eu sou.” Acima de tudo, esta é a regra de ouro do Keithismo: conheça-se. A partir dessa doutrina, todo o resto se encaixará em seu devido lugar. E, além de se conhecer, conheça os seus limites. Saiba o quanto você pode aguentar e o quanto pode aceitar. Deixe essa sabedoria entrar pelos ouvidos. Somos todos obras musicais — escute a canção. Talvez você precise tapar os ouvidos de vez em quando, mas tudo bem. Uma vez que tiver percebido quais são as suas limitações — quanto, onde e quando —, não será tão perturbador viver consigo mesmo. E você não precisa lutar tanto contra isso. Se você é do tipo mais devagar, tudo bem, seja devagar. Se tem um tempe- ramento mais acelerado, tudo bem de novo. Se só pode dar 64 passos por dia, ou não consegue comer em meio a muita gente, ou não resiste a pintar seu cabelo de roxo, tudo bem. Mas se você fica todo empolado sempre que a tinta cor de lavanda encosta no seu couro cabeludo, cuidado. Aceite suas qualidades e suas limitações. Outras pessoas podem lhe dizer quem você é, e quem pensam que você é, mas, no final das contas, só você realmente sabe. “Você já viu de tudo, já fez de tudo. Sobreviveu. É esse o jogo, não é: sobreviver?” — Jack Sparrow, personagem interpretado por Johnny Depp em Piratas do Caribe. “Não estou só falando de viver para sempre, Jackie. O negócio é viver consigo mesmo para sempre.” — Capitão Teague, pai de Sparrow, interpretado por Keith Richards. “Ele é uma das pessoas que admiro pelo que fez e pela maneira de ad- ministrar os acontecimentos. Quarenta e tantos anos sendo esse deus. E ele é simplesmente cool.” — Johnny Depp, contando que baseou seu personagem, Jack Sparrow, em Keith. 18
  • 3. Você pode imitar o quanto quiser, mas sempre voltará para casa em sua companhia. Pode vestir uma fantasia de Halloween, mas ela é somente um disfarce. Você pode fugir, mas não pode se esconder. No final da maratona, você ainda está lá. O trem para com você. Siga sempre o que você acha que é certo — moral, ética e esteticamente. 2. SOMOS TODOS IGUAIS DEBAIXO DA PELE. “O crânio — ele não tem nada a ver com bravatas e besteiras superficiais... A beleza é tão superficial quanto a pele. É assim que somos sob a carne, irmão. Tire o cabelo, arranque a pele, e você está diante de mim e do eu.” Olhe para uma foto de Keith Richards e, além do cigarro aceso, você sempre verá duas coisas em suas mãos: o bracelete de alge- mas e o anel de caveira. Estão sempre lá, como um lembrete. As algemas lembram que a liberdade deve ser valorizada. O anel de caveira diz que sob a pele somos todos iguais. E não há tempo para bobagens. Somos todos iguais. Esse conceito vem sendo expresso ao longo do tempo por grandes mentes, tanto nas artes maiores como nas tidas como menores. Vamos pegar um exemplo mundano: em um antigo episódio do programa de TV The Brady Bunch, Marcia, uma personagem que se revela problemática diante de autoridades, só consegue passar no teste de motorista quando imagina o seu instrutor de cueca e camiseta. A lição e o segredo aprendido com The Brady Bunch: quando você está intimidado por alguém, ima- gine-o de cueca (ou calcinha). Funciona. O medo vai embora como fumaça. A caveira serve ao mesmo propósito da cueca — só é um pouco mais sombria. Mas a mensagem, no final das con- tas, não é dizer “dane-se”. E sim inspirar a compaixão. Como escreveu o irmão de alma de Keith, Platão: “Seja gentil, porque cada pessoa que você encontra está lutando uma batalha difícil.” Como disse Keith: “Caveiras nos lembram que, no fundo, somos todos iguais.” 19
  • 4. 3. NÃO EXISTEM SEGREDOS. “Não tenho nada a esconder. Nada é segredo comigo.” Essa não é uma regra ruim para a vida. Existe um princípio se- melhante nos Alcoólicos Anônimos: “Você é tão doente quanto seus segredos.” E você já deve ter ouvido esta máxima bastante conhecida: “A verdade liberta.” Ou, de Mark Twain: “Se você diz a verdade, não precisa se lembrar de nada.” A verdade é mais es- tranha que a ficção, e muito mais interessante. A verdade é um bom vinho, a mentira é um sangue de boi. Por que não usufruir do melhor? A vida é muito curta. Keith sempre sustentou que se você quer olhar para dentro da casa dele, ele abrirá mais as cortinas para que você possa ter uma visão melhor. “Qualquer coisa que você coloque nas manchetes de primeira pá- gina posso superar. Porque lhe darei a verdadeira visão de dentro, que é sempre bem mais interessante... Não quero que ninguém pense ser uma vantagem espionar minha vida do meu jardim, achando que pode descobrir alguma coisa que não saberá se não me perguntar.” Seja o agressor. Quando você é totalmente franco, ninguém pode bisbilhotar sua intimidade. “Não há nada que se possa dizer sobre mim que todo mundo já não saiba. Você não pode ter uma reputação pior do que a minha. Me dei conta nos anos 70 de que não tinha motivos para mentir, de que todo mundo acreditaria no pior de qualquer maneira. Não tinha mais nada a esconder... Não tem nada sobre o qual valha a pena mentir.” Não tenha medo de questionamentos. Deixe qualquer tema o mais aberto possível à discussão. Introduza o assunto e deixe que perguntem. Você pode decidir se quer ou não responder às per- guntas, mas não há nada de errado em perguntar. 20
  • 5. Só existe uma exceção: qualquer assunto que tenha a ver com o Elton John. Deixe esse assunto quieto. No mais, tudo bem. Só fique longe do Elton. É uma porta aberta para problemas. 4. ACEITE OS ROLLING STONES COMO SEU SENHOR METAFÓRICO. “Existe o Sol, existe a Lua, existe o ar que respiramos e existem os Rolling Stones.” Esse é um favorito de Keith. E não é somente uma opinião arro- gante sobre a banda na qual ele toca guitarra. Assim como outros temas bastante conhecidos de Keith — as drogas, a individua- lidade, a guitarra e, claro, Mick —, os Rolling Stones têm um sentido metafórico mais amplo quando Keith começa a explanar. Os Stones ganham o título de grande senhor — uma entidade que ajudamos a criar, mas que se tornou maior que nós. Todos somos parte de alguma coisa, seja família, comunida- de, uma multidão na rua, uma economia. Ou uma pequena parte de um cenário maior — o mundo como um todo. Temos um papel na criação de coisas que se transformam em Frankensteins. Esse monstro pode depois ser algo criativo ou destrutivo, que estimule ou negligencie. O monstro de Shelley, afinal, nunca foi demoníaco em si — simplesmente foi empurra- do para o lado negro por aqueles que o criaram. Quais são os outros Rolling Stones que existem por aí? Empresas. Corporações. Sociedades — as abertas e as secretas, e aquelas tentando ser utópicas. Vizinhos. Governos. Coisas às quais no referimos como “outras presenças” perigosas — “eles”. Mas quem cria os “eles”? Quem cria a mística força invisível que, de alguma maneira, ganhou forma e se transformou num substantivo? Reconheça que você é essencial para a criação e a continua- ção de qualquer que seja seu Rolling Stone particular. Você pode acalentá-lo ou se afastar dele, mas, lembre-se: “É maior que eu e você, baby.” 21
  • 6. Ele existe sem nós, mas existe também dentro de nós. Dirija-se. Crie-se. “Os Stones sempre devem procurar os Stones que estão dentro deles.” 5. O FORMATO DA BANDA É UM MODELO DE INTERAÇÃO. “Química foi uma das matérias em que nunca fui bom na escola... Mas acho que é o desconhecido — a centelha misteriosa — que faz a diferença. É o mesmo com os Stones. Quer dizer, coloque todos em fila na parede, e eles são a mais improvável boa banda de rock ’n’ roll que existe por aí!... Há algo a ser dito sobre uma certa química entre as pessoas que resulta num certo tipo de música.” Tem sido apontado repetidamente sobre os Stones que, assim como com os Beatles, muito de seu sucesso e de sua mágica vem da combinação certa de pessoas. Simplesmente a química certa. Ron Wood acrescentou: “Individualmente, dificilmente impres- sionaríamos, mas, juntos, temos um poder acima de nós mes- mos.” A soma de diferentes personalidades — assim como dos instrumentos — cria uma sinfonia, uma canção. A unidade de uma banda é a conglomeração de personalidades e instrumentos em equilíbrio. É mais forte como um todo. Para viver a vida como Keith Richards, aceitamos diferen- tes personalidades e estilos como entidades separadas, necessárias para o trabalho em conjunto. Todas têm uma necessidade e um propósito. Até mesmo Mick. Os membros da banda são “outros seres”. Todos trabalham em harmonia, criando um som. Claro, algumas bandas são melhores que outras. E preste o máximo de atenção na música para decifrar quais são as boas e quais são as ruins. Volte-se para as melhores, fique longe das ruins. Se boa música faz bem para a alma, música ruim pode destruí-la. Ou levar você à loucura. Se os outros membros da banda parecem precisar se colocar em frente ao espelho para treinar como cuspir, diga não. Algumas dicas rápidas relativas a bandas ruins: sempre que houver muita pose, saia 22
  • 7. correndo. Nesse caso, de acordo com Keith: David Bowie, Beck, Duran Duran. Ou qualquer coisa que precise de barbeador, como George Michael. Ou que precise envelhecer uns dez anos antes de ser visto em público sem cair no ridículo, como Oasis. E qualquer coisa que tenha um toque Elton John — corra como vento. Como se velas acesas tivessem sido derrubadas pelo vento e estivessem prestes a incendiar o lugar. Corra como se Satã estivesse atrás de você. Boas bandas: AC/DC. Motorhead. Qualquer coisa verdadei- ra, que tenha uma “pegada humana” autêntica. Little Richard, Elvis, Buddy Holly. Não deve haver nenhuma dúvida de que o cantor acredita no que está dizendo. Excesso de saxofone: proteja os que você ama disso. Dezesseis violões: estão fingindo. Ausência de bateria: suspeite. Se não tem batimento cardíaco, não está vivo. E fique longe de Eric Clapton. Você acabará como Eric Clapton e os Rolling Stones. Você precisa de uma banda. E se a banda na qual você está não é necessariamente a melhor, lembre-se de uma das crenças principais de Keith: “Sempre existe o futuro.” Cada trabalho leva você adiante e, com sorte, a algo melhor. Apesar de termos de nos conhecer e ser verdadeiros com nós mesmos, saiba que é através do bem maior do grupo que a mágica acontece. É por intermédio do grupo que as coisas mais bonitas, inclusive a arte, se manifestam: “Rock ’n’ roll é interação... Consiste em uma tensão e uma comuni- cação interessantes entre um cara e outro... Não é possível encontrar isso em nenhum medidor em estúdio. Para mim, as canções vêm por osmose. Todas as melhores músicas são basicamente belos acidentes.” 6. ACEITE (OU PELO MENOS TOLERE) SEU MICK INTERIOR E EXTERIOR. “Mick é rock. Eu sou roll.” Natureza dupla? Gêmeo do mal? Todo mundo tem. Não adianta lutar contra isso. Se você tentar sufocar seu gêmeo do mal com um 23
  • 8. travesseiro no meio da noite, ele se transformará em um fantasma. Assombrará seus sonhos. O melhor é se acostumar com ele. E enquanto você vai se acostumando, coloque-o para traba- lhar a seu favor. Ou ao seu lado. Mick Jagger e Keith Richards são os dois lados de um par de gêmeos siameses. Conectados, inseparáveis. Mas diferentes. Keith é o gêmeo do mal para Mick, e Mick é o gêmeo do mal para Keith. Mas manter o gêmeo do mal sob controle é uma arte. No Kei- thismo, chamamos de “aceitando seu Mick interior e exterior”. Toda vez que Keith Richards se senta e começa a falar, o assunto Mick Jagger é inevitável, e, quando isso acontece, Mick se transforma em metáfora para seu segundo eu. E, apesar desse segundo eu parecer frustrante ou irritante, está lá por uma razão. É um equilíbrio para seu verdadeiro eu. Aquele que você passa a conhecer através do primeiro mandamento. É como a Lua para o Sol. Uma cor escura para uma cor clara. Às vezes, o gêmeo do mal vive dentro de você, o que não é tão ruim, desde que fique de olho nele. Mas, quando ele é sua própria criatura, andando por aí na forma de outra pessoa, pode ser um pouco mais difícil. Ele se transforma na guerra entre o Mick interior e o Mick exterior. Ainda assim, os dois podem ser administrados sob a mesma fórmula. Existem cinco passos para que você aceite o Mick interior ou o exterior: 1) Identifique-o; 2) Compreenda a criatura; 3) Abra- ce-a como tal; 4) Ajude a trazer à luz o que há de melhor nela; 5) Aprenda com ela. O Yin existe para seu Yang. O rock existe para o roll. Sem Keith não haveria Mick e vice-versa. Temos tudo isso dentro de nós e dentro dos mundos em que vivemos. 7. ALIMENTE SEU CHARLIE INTERIOR. “Se Mozart tivesse tido um bom baterista...” A pessoa quase perfeita, aos olhos de Keith, sempre foi Charlie Watts. Ele é o individualista por excelência, alguém que fica longe 24
  • 9. dos holofotes, um pouco tímido, excêntrico, humilde. Tem sua própria batida. A espinha dorsal do grupo e também do indivíduo é o baterista. Tenha uma viga mestra de moral sólida, modesta, ética, sem pretensão, e estará em boa forma. A partir de um ba- terista sólido, tudo toma seu devido lugar. Encontre os Rolling Stones dentro de você mesmo, mas assegure-se de que o baterista é forte e não um poseur. “E se Bach tivesse tido um bom baterista... E se...” 8. ACEITE SEUS VÍCIOS, ENCARE-OS COM HUMOR E LIVRE-SE DA CULPA. “Não gosto de me arrepender da heroína, porque aprendi muito com ela. Foi algo por que passei e que administrei. Iria me arrepender se não tives- se conseguido lidar com ela.” Existe um antigo ditado: “Uma opinião é como o cu. Todo mun- do tem um.” Outra verdade: vício é como o cu. Todo mundo tem um também. Ou dois. Ou três. É fácil julgar o outro quando o vício dele é diferente do seu, mas, se você experimentar o dele para comparar, ou vice-versa, começará a compreender. Como Rousseau escreveu: “Só temos pena dos demônios alheios que já experimentamos.” Mas, no mundo de Keith, a chave é não eliminar os vícios, e sim, sobreviver a eles. Aqui vão as chaves: 1) Aceite seu vício e saiba que a experiência advinda dele fez de você quem é e ampliou sua individualidade. 2) Tenha senso de humor em relação a seu lado negro. 3) Que se dane a culpa. O número três é o que empurra tudo para o lugar. E, finalmente, o importante é onde você sai quando chega ao outro lado. O fundamental é encarar o problema, lidar com ele e superá-lo. Saiba, também, que vícios não são necessariamente fraque- zas. São aflições, doenças. Podem ser muitas coisas. Uma inca- pacidade de parar de espirrar. Ansiedade. Transtorno obsessivo- 25
  • 10. compulsivo. Depressão. Um intestino apaixonado pela diarreia. Uma perna bamba. Todas essas coisas nos parecem monstros de fraqueza. Tenha calma e não desista até que elas desistam. Porque nós temos como acabar com elas. Não é nosso vício que nos mata. Não se sobrevivermos a ele. Como diz Keith: “Eu nunca tive problemas com drogas. Só tive problemas com a polícia.” Todos temos um problema de heroína metafórica. Talvez to- dos nós tenhamos uma polícia metafórica também. 9. USE A MÚSICA À SUA VOLTA, SUA ANTENA E SUA GUITARRA INTERIOR. “Eu não acho que escrevo canções; sou uma antena. Na verdade, você recebe as canções... Você simplesmente se senta ao piano ou pega uma guitarra, e, para mim, depois de uns dez ou quinze minutos, algo que eu nunca tinha ouvido começa a surgir; só preciso dar forma a isso e transmitir, entende?” O instrumento escolhido por Keith, a guitarra, é mais que madeira e cordas. O instrumento se conecta a uma antena interna e capta ondas do mundo que estão à sua volta, transformando-as em algo novo. “Eu olho para a guitarra às vezes e penso: ela só tem seis cordas e doze espaços, cara. Mas quanto mais você toca, mais coisas saem dela... As coisas chegam numa ordem estranha. Se você consegue manter o mistério e a excitação de descobri-las, não é capaz de desistir do troço. É muito intrigante.” Encontre um instrumento. Pode ser a voz, a escrita, a pintura, a carpintaria, a cerâmica. Você ficaria surpreso com o que uma an- tena pode transmitir a um vaso de cerâmica. Então, levante a antena e deixe que as ondas cheguem até você. “As canções já estão por aí. Estão por aí... As pessoas acham que você é um compositor, que você escreve as canções, que elas são todas suas, que você é totalmente responsável por elas. De verdade, você é só um 26
  • 11. meio, um veículo, alguém que desenvolveu a facilidade de reconhecer e alcançar coisas, basta que esteja pronto para estar lá, como num encontro espiritual; elas simplesmente saltam no ar. Canções inteiras simplesmente chegam a você, você não as escreve. Eu não fiz nada além de ter a sorte de estar acordado quando elas chegaram.” Sintonize a canção do éter, esteja ela vindo do vento, da fu- maça que sai elegantemente de dentro da torradeira ou das laba- redas tremeluzentes da casa mais uma vez em chamas. Os belos acidentes estão à espera. 10. COLOQUE EM PRÁTICA A ANTIGA ARTE DA TECELAGEM. “Tínhamos duas guitarras entrelaçando-se. Já havíamos tocado tanto que conhecíamos bem a parte de cada um. Então, quando chegávamos no pon- to crucial, no ponto explosivo, de repente, trocávamos. A guitarra prin- cipal pega a base, e a base pega a guitarra principal. É o que Ronnie e eu chamamos de antiga arte da tecelagem. Nem precisamos olhar um para o outro, quase. É pura sensação.” Na tecelagem, não existe guitarra principal nem de base. Os músi- cos trocam de posição o tempo todo. Ninguém toma as rédeas do controle absoluto. Essa é uma chave metafórica para a comunica- ção em qualquer relacionamento, seja entre pai e filho, professor e aluno, traficante e viciado. No palco, é uma questão entre duas guitarras. Fora dele, é algo entre duas pessoas. Duas pessoas dançando em um nível físi- co, espiritual e musical. Existe democracia, igualdade. É uma dança, e a dança, defi- nitivamente, ensina a aceitar o que há de individual nos outros e a dançar com as pessoas ao seu redor. “Tem um cara só,mas ele tem quatro braços.” “Quando estamos no nosso melhor, Ronnie e eu fazemos tapeçaria Bayeux no palco.” 27
  • 12. Você pode aprender muito com a guitarra. Ela pode ser uma me- táfora para a vida — como um instrumento não só para fazer música, mas também para se aprender a criar e a interagir. “Cinco cordas, três notas, dois dedos e coragem; é isso! Você pode tocar a danada. É só disso que precisa. O que você faz com ela são outros quinhentos.” 11. CONQUISTE OS CLÁSSICOS. “Todo mundo começa imitando seus heróis.” “Os grandes são os grandes. Você sabe quem eles são.” Aos 15 anos, Keith sentou no topo da escadaria de sua casa e ficou tocando Chuck Berry e Elvis Presley até que se tornassem parte dele. A música se transformou no seu ser mais profundo; virou parte de seu sangue. Mais tarde, ele fez o mesmo com o blues e com Hoagy Carmichael. A partir de uma fundação sólida, pode-se construir uma casa. E uma que seja altamente original. Não importa a disciplina que você escolhe. Essa regra é es- sencial. É a razão pela qual Picasso começou aprendendo a dese- nhar maçãs que realmente pareciam maçãs. “Fora Chuck Berry, eu faço melhor o Chuck Berry do que quase todo mundo. Mas eu preciso parar de fazer Chuck Berry e começar a fazer Keith Richards.” 12. SAIA DE DENTRO DA PRÓPRIA CABEÇA E PERMITA-SE SENTIR. “Aí vai uma do Ronnie: ‘Às vezes tenho a sensação de que milhares de pes- soas estão olhando para mim. Eu sou paranoico?’ Se você pensasse demais nisso acabaria ficando paralisado.” Ronnie, também conhecido como Keith Jr, estava falando sobre estar no palco em frente a um mar de pessoas, mas isso pode se 28
  • 13. referir a muitas das experiências diárias. O que importa: analisar e pensar em excesso são atitudes que podem deixá-lo exausto. Con- fie na sua intuição e nos seus instintos. A racionalidade pode ser uma maneira de evitar contato e de criar uma rota de fuga. Muita análise pode aleijar você. “Sempre fiz coisas de maneira intuitiva, sabe? Acho que o cérebro empata muitas coisas.” Pensar pode virar uma droga. E como qualquer droga, em excesso, pode ser letal. Para sobreviver no palco da vida, basta sentir a música. Ouça-a e sinta-a. Existe música nas atividades do dia a dia — seja quando você pega o metrô, quando atra- vessa a rua ou quando entra num elevador. Faça alguma coisa. Construa uma casa. Se não uma casa, um templo para Jimmy Hendrix e um quartinho para ficar doidão. Toque um acorde poderoso. Incendeie outra casa ou uma cama. Jogue outro carro num despenhadeiro e assista à sua queda e à sua explosão numa rica combinação de labaredas. Saia de dentro da cabeça e entre no corpo. O cérebro é ótimo, mas não come, não se reproduz nem salva uma mulher de um prédio em chamas. Só o seu corpo pode ajudá-lo nesse caso. “Eu não penso quando estou no palco. Eu sinto. Uma vez lá, você é o que você é. Nós somos só sentimento.” Sinta a música. Viaje com ela. E use o toque. Já reparou como esses caras dos Stones se to- cam? É uma conexão visceral. Toque no que está perto e no que ama. Toque nas pessoas que conhece. Se não houver ninguém, to- que nas coisas. Texturas. Temperaturas. Tente de tudo: enrugada, dura, espetada, sedosa, macia, gelada, sob a água. Coloque suas mãos nas coisas. Você sempre pode recorrer a um Band-Aid caso se machuque. 29
  • 14. 13. MESMO QUE TENHA QUE FAZER ISSO EM SEGREDO, SEJA GENTIL. Ajude quem tem menos sorte e é menos afortunado. Não dar a mínima não é o mesmo que ser cruel. Não deixe a imagem de bad boy de Keith enganar você. Essa imagem é bastante romanceada. Ele é um cara secretamente co- nhecido por uma conduta moral que beira seriamente a caretice. Talvez seja um pouco mais do que isso. Talvez você não deva se importar em fazer um favor a alguém. Às vezes é bom para seu ego. Ou ajuda a criar acordes mais potentes. Como disse um antigo membro dos Stones, Ian Stewart: “Eu vi o velho demônio fazer coisas boas na surdina.” O rastro de gentileza vai bem mais longe. Dê uma olhada nesta carta de um fã à revista Tiger Beat em 1964: “Eu sei que a última vez em que eles estiveram na cidade, Keith telefonou pessoalmente para uma garota inválida que estava doente havia anos. Depois de ouvir sua voz, ela começou a melhorar. Agora, está quase boa. Não me diga que os Stones são garotos sem Deus.” O carma é um bumerangue. Um ato de gentileza voltou voan- do como um poderoso bumerangue durante o julgamento — por uso de drogas — de Keith no Canadá. Havia uma adolescente cega de Toronto que sempre ia aos shows dos Stones, e Keith era quem tomava conta dela, garantindo que fosse levada para casa em segurança. Como ele dizia: “Deus sabe o que pode acontecer com uma garota cega na estrada.” Durante o julgamento, a jovem foi até a casa do juiz, contou-lhe a simples história da gentileza de Keith e assim o livrou da cadeia. A sentença foi um show gratuito para os cegos. Keith descreveu a resolução do caso: “Foi uma das sentenças mais bizarras de todos os tempos: ‘o cara é pego com 28 gramas de heroína e sentenciado a fazer um show de graça para os cegos!’ Essa tem que entrar para os anais da história legal, não?” Por meio da gentileza vem o amor, e coisas místicas acontecem. É o mais perto que podemos chegar de Deus. E, através da gentileza, vem a absolvição. 30
  • 15. Keith chama a jovem de Toronto de seu anjo cego. Todos temos esses anjos por aí. Talvez existam anjos cegos escondidos no departa- mento de sapatos da Macy´s ou na barraquinha de cachorro-quente. Podem aparecer para ajudá-lo quando você menos esperar. Talvez se- jam cegos, mas raramente são tolos, e você pode precisar deles quan- do os braços da lei se abrirem e o tocarem no lugar errado. Seja gentil. Isso o mantém no caminho. E, se puder, faça doações anônimas. E perdoe as dívidas. (Dois atributos não tão conhecidos, mas bastante característicos de Keith). 14. APRECIE UMA VIDA NÔMADE — MESMO QUE NOS CONFINS DE UMA PEQUENA CIDADE. “Eu gosto de ver as maneiras como o mundo gira.” Ande por aí. Mude. Veja coisas novas. Vá a lugares onde as coisas são diferentes, onde existe música diferente. Siga as setas ou vá até onde os cães não podem achá-lo. Mantenha-se aberto à transfor- mação. Existe um mundo enorme lá fora. Quanto mais você vê, quanto mais lugares você visita, maior você é. E há uma recompensa a mais para esse contínuo movimento: ele mantém a polícia longe. Observe seu universo e os universos atrás da sua casa. Como escreveu Descartes: “Viajar é quase como conversar com pessoas de outros séculos.” Mantenha-se em movimento, vendo “as maneiras como o mundo gira”; mas fique com um olho na frente e outro atrás (ou seja, Mandamento 15). 15. ACEITE E VIVA COM O PASSADO (A GRANDE HISTÓRIA) E O FUTURO (A POSSIBILIDADE). Olhe para uma foto de rosto de Keith. O olho esquerdo olha de maneira otimista, com energia juvenil, para o futuro. O direito é um pouco fundo, introspectivo. 31
  • 16. O canto esquerdo da boca aponta um pouquinho para bai- xo; o canto direito repuxa um tanto para cima. Existe um equilíbrio entre o futuro otimista e o olhar intros- pectivo para o passado. O rosto nos conta uma história, nos direciona através de um mapa e revela segredos. E, no rosto de Keith, essa história pode ser resumida como “aqui e lá, ao mesmo tempo”. Como escreveu Cícero: “o rosto é a imagem da alma.” E você pode ver no rosto de Keith uma certa visão filosófica do tempo — uma visão simultânea de passado, presente e futuro. A necessidade de estar atento ao que já passou é algo que nos foi dito milhares de vezes, como na citação muito repetida de George Santayana: “Aqueles que não se lembram do passado estão fadados a repeti-lo.” Também é importante não somente lembrar do passado, mas senti-lo — assim como o presente. Filósofos New Age acentuam a necessidade de se “estar aqui e agora” e de se sentir o poder do agora. Isso é bom e verdadeiro, mas ter consciência do quadro geral nos conecta com todos os tempos — o presente, o passado e o futuro, que está por vir —, com tudo isso que é tão real quanto o momento que estamos vivendo. Em relação ao seu passado pessoal, possivelmente duvidoso (o que, segundo Keith, é uma bola presa em uma corrente de ferro que segue você aonde quer que vá), lembre-se de que você tem o direito de “se aposentar do serviço militar” e colocar esse passado no passado. O passado tem pernas e pode segui-lo. Mas, como com tudo que pode segui-lo — um fã obcecado, a polí- cia, traficantes que não desistem, as tietes de Mick —, você pode colocá-lo em seu devido lugar e olhar em outra direção. Prenda-o num quartinho no fundo do Hotel da Memória. Escreva uma canção sobre o assunto, tranque-a lá no quartinho e jogue fora a chave. Feito. OK. O passado continua existindo, mas você o colocou onde queria. Onde merece ficar. E onde você pode ter algum controle. O Hotel da Memória: você é o dono e o gerente encarregado desse lugar. 32
  • 17. 16. A RESPIRAÇÃO CRIATIVA — INSPIRE O QUE VOCÊ AMA. “Eu cheirei o meu pai. Ele foi cremado, e eu não pude resistir misturar um pouco de suas cinzas com um pouco de pó. Meu pai não se importaria. Desceu bastante bem, e eu ainda estou vivo.” Cheirar as cinzas do pai. Uau! Gostaria de ter bolado isso. Quando a revista britânica New Music Express perguntou a Keith em 2007 qual tinha sido a coisa mais estranha que já cheira- ra, esse comentário sobre o pai foi recebido com uma tempestade de choque e horror. Keith rapidamente recuou — disse que estava brincando. Depois recuou novamente: sim, é verdade, ele disse; e afir- mou ter fingido que inventara somente para não magoar a mãe, que estava morrendo. Talvez ele não quisesse que a mãe pensasse que ele pretendia fazer o mesmo com ela. É verdade que um bocado do que Keith inalou criativamente ao longo dos anos, além do pai, se enquadra na categoria de “subs- tâncias ilegais” ou “medicina recreativa”, mas ele também sempre inalou, de maneira exuberante, aquilo que o sustenta: música, fa- mília, amigos, sinuca, gargalhadas. De acordo com Harold Schechter em um editorial do New York Times, cheirar o pai não é tão absurdo assim. Vem de uma prática de canibalismo funerário, a qual “brota de um impulso profundo e muito humano: o desejo de incorporar a essência de alguém amado dentro do próprio corpo; a crença de que, quando alguém próximo morre, a pessoa vive dentro de nós, tornando-se uma parte imortal de nosso ser mais profundo.” Talvez todos nós devêssemos participar desse tipo de inala- ção. E com frequência. Inspire o que você ama. 33
  • 18. 17. SEJA FORTE, SEJA CORAJOSO E NÃO CEDA ÀS ORDENS DAS AUTORIDADES. “Desde que saí da escola, ninguém ouviu um ‘Sim, senhor’ vindo de mim. Fora algumas exceções: no tribunal e na cadeia.” Pode não ser tão fácil viver de acordo com essa assertiva; mas, no fundo do coração, podemos fazê-lo. A única ordem que você pre- cisa ouvir é a que vem de dentro. Se você é alguém cujo relógio interno diz que deve ficar acor- dado até tarde, fique acordado até tarde. Desafiar a autoridade não significa sair pichando o metrô (se bem que isso ajuda), mas sim fazer de você mesmo a autoridade real — como apontado nas regras um e dois de Keith — e não se render ao que os outros acham que deve ser. E, dentro disso, é claro, conheça seus limites. Só se pode ir adiante com certo tipo de desafio até instantes antes de ele se virar contra você e o atingir. Não tenha medo. Como Keith diz: “Eu não fico com medo, fico com raiva.” Tem mais energia na raiva. Basta perguntar ao Johnny Rotten. 18. DÊ VALOR À FAMÍLIA E AOS AMIGOS INDEPENDENTEMENTE DA LOUCURA QUE ELES PODEM PROVOCAR. “A única maneira de você ser como eu é tendo uma boa família.” Num primeiro olhar, esse pode ser um chocante sentimento anti- Keith. O fora da lei todo sentimental sobre família? Mas isso vem de um cara que já foi uma criança orelhuda que entrava em pânico toda vez que não encontrava sua mãe no lugar combinado para buscá-lo depois da aula. É também o mesmo cara que, na prisão, escreveu uma carta enquanto olhava para o céu pela janelinha mí- nima da cela: “Querida mamãe, não se preocupe...” Ninguém poderia dizer que Keith é o queridinho da mamãe, mas fatos são fatos. E isso acabou sendo uma coisa boa. Ele tratava 34
  • 19. bem sua mãe. E, depois de vinte anos de estranhamento com o pai, eles se reconciliaram, tornaram-se amigos chegados e parceiros de dominó. Seu pai, sua ex-mulher, sua mulher atual e seus filhos sempre foram aos seus shows. Seu casamento tem quase trinta anos. Ele jamais revelou qualquer coisa íntima sobre a vida dos filhos. E, apesar de não ser, certamente, um pai, um marido ou um filho tradicional, sua família sempre sabe onde encontrá-lo e sabe que seu amor está sempre presente. Uma palavra de sabedoria de Keith: cuide de sua família, mesmo que tenha que fazê-lo em segredo. Sempre funcionou para ele. Pode apostar que essa é uma das razões para que tenha man- tido a amizade com Mick Jagger desde os anos 40. Existem boas ações acontecendo discretamente. Mesmo que você carregue uma faca no bolso da calça, ou tenha que levantar um machado ou um revólver para Ron Wood de vez em quando, isso não significa que você não é leal. Sobre família: “Se você tiver uma chance, experimente, porque é uma das coisas mais especiais da face da terra. Ela oferece aquele último elo perdido sobre o sentido da vida.” Sobre os amigos: “A única maneira de saber se um cara vale alguma coisa é apostando nele. Às vezes os amigos nos decepcionam, às vezes não. Mas você precisa apostar, caso contrário, não ganha nada de nada.” 19. COLOQUE-SE. A HONESTIDADE É MEDICINAL. Você acredita nas coisas que Keith diz sobre Mick para a imprensa? E o que Mick diz de Keith? E o que Keith diz sobre Ronnie? E o que Ronnie diz sobre Keith? E o que Charlie diz sobre Mick? Talvez nem todos consigam sair ilesos, mas, de alguma for- ma, isso funciona com os Stones. Uma porção de cachorros latin- do. É algo a ser imitado. 35
  • 20. É melhor botar para fora que guardar. Existe uma regra aqui, no entanto, relativa àquilo que pode e ao que não pode vazar. Já reparou que, com todos os membros da banda falando abertamente sobre os outros publicamente, nenhum deixou escapar algum segredo do outro? O que eles estão manifestando publicamente são opiniões. Coisa pequena. Fazer piada da roupa de lycra colante incrivelmente embaraçosa do gêmeo do mal, do vexame de entrar em palco dentro de uma máquina usada para colher frutas, ou da interminável pulação à la Peter Pan durante a performance. Ou pegar no pé de namo- radas cujos papos são tão interessantes quanto falar com uma janela aberta. Ou fazer pouco das pretensões políticas do gêmeo do mal. O que está por baixo das relações é sempre mantido em silêncio de honra. Perceba que confidências são guardadas. Nin- guém entrega ninguém. Siga essa regra. Como costumam dizer aqueles que o conhecem: “Não se quebra uma promessa feita a Keith.” E pode ter certeza de que isso funciona em mão dupla. Você pode falar, descarregar, ter uma boca grande, mas conheça sempre os limites éticos. Passe dessas linhas e você entrará no território: “Você ferrou com o Keith?” Não existe floresta mais escura que essa. 20. TALISMÃS TÊM PODER. Sair de casa pode ser o mesmo que entrar num campo de batalha, especialmente se você não avisou seu supervisor de condicional. Mas você nem precisa atravessar a porta da frente para entrar na zona de combate. Todos precisamos nos sentir protegidos — e pro- teção pode ser encontrada em coisas pequenas. Pode ser algo fun- damental como um anel que lembra sua coragem, ou o cheiro de um perfume que o acalma. Um elástico amarelo com uma mensa- gem impressa. Uma chave num cordão escondida sob sua camisa. Uma tatuagem que ninguém vê. Que tal um punhado de metal e de couro preso no seu cabelo? Dê uma olhada em Keith. Com todos aqueles badulaques e penas no cabelo, ele parece um guerreiro enfeitado. Existe uma 36
  • 21. força concentrada em tudo aquilo pintado e preso em seu cor- po. É um arsenal. Existe poder naquilo que nos faz lembrar de algo ou que nos distrai. Os talismãs existem há centenas de anos por uma razão. Não se intimide. Tenha sua própria coleção. Faça uso dela. 21. ACEITE MAX MILLER NA SUA VIDA. (OU: É TUDO UMA TREMENDA PIADA, PORRA. RIA.) “É maravilhoso estar aqui. É maravilhoso estar em qualquer lugar.” — Max Miller. Antes de aceitar o conceito metafórico dos Rolling Stones como um poder superior e grande senhor, saiba que Max Miller é o seu profeta. Pode ser uma surpresa, mas o príncipe das trevas tem retira- do boa parte de sua filosofia e algumas de suas melhores frases de Miller, um músico britânico papagaiado, importante dos anos 20 aos 50. A frase “É maravilhoso estar aqui, é maravilhoso estar em qualquer lugar” era o marco de Miller; e é como Keith cumpri- menta rotineiramente a plateia. Miller pode não ser conhecido hoje como era em seus dias, mas está vivo em Keith Richards. Miller era conhecido por levar suas cau- sas a limites extremos, perigosos — e isso incluía seu guarda-roupa. Seu vestuário era uma mistura de estilos bizarros de várias classes, culturas e vários gêneros, juntos em uma apresentação ligeiramente louca. Pode-se dizer o mesmo de Keith, com sua a combinação de gravata borboleta de bolinha, jaqueta de onça, echarpe marroquina, brinco de pirata, botas cubanas e bijuteria feminina. É um Max re- trô. O vaudevile e a música de orquestra se transformando em rock ’n’ roll. Como disse Keith: “A melhor arma do rock ’n’ roll é o hu- mor.” Só fica faltando uma flor que esguicha água na lapela. Quando os Stones estavam testando novos guitarristas nos anos 60 e 70, se o candidato não soubesse nada de Max Miller, sua ficha era destruída. 37
  • 22. É como aceitar religiosamente os Irmãos Marx. O humor sempre salva. Como disse Andrew Carnegie: “Existe pouco suces- so onde existe pouca gargalhada.” Ou como disse Viktor Frankl no livro Em Busca de Sentido: “A tentativa de desenvolver um sen- so de humor e de ver as coisas de maneira bem-humorada é um tipo de truque aprendido enquanto se aperfeiçoa a arte de viver.” “Ainda que os policiais estejam mais uma vez acordando você, é pre- ciso encontrar uma maneira de rir.” Rir vicia. É o melhor tipo de vício. Cheire o riso e coloque-o para fora. Conte uma ou outra piada idiota de vez em quando. 22. A EXPERIÊNCIA É O “PREÇO DA EDUCAÇÃO”. “Seja o que for que tenha acontecido — mesmo que tenha sido um saco —, aprendi coisas com a experiência. E ganhei algo com ela... Nunca me preocu- pei com quem tirou quem de onde. Acho que esse é o preço da educação.” Pague o preço. E siga em frente. Não olhe pelo retrovisor se puder evitar. Pise no acelerador e vá em frente. (Só não bata o carro de novo na saída.) O preço da educação. Esse é um mantra a ser repetido. É di- nheiro bem gasto. Talvez não pareça ser assim no momento, mas confie nas leis da justiça econômica. Você ganhará o dinheiro de volta do outro lado da viagem depois que sair do túnel. E prova- velmente em maior escala, com direito à gorjeta. “Keith Richards faz tudo uma vez.” 23. VIVA E DEIXE VIVER. É realmente muito mais fácil passar pela vida obedecendo a essa máxima. Mas também é uma dessas frases que são bem mais bo- nitas no papel e nada fáceis de pôr em prática. Afinal, existem 38
  • 23. toneladas de imbecis e cabeças de merda por aí. Mas mesmo os imbecis e os cabeças de merda merecem um lugar ao sol nesse planeta. Está tudo relacionado ao conceito de aceitação. Assim como você tem que aceitar a si mesmo, precisa aceitar que outras pessoas estão por aí também. Exatamente como o Mick interior e o exterior. Uma maneira fácil de colocar em prática o Man- damento 23 é ficar craque no Mandamento 21, ou seja, aceite Max Miller em sua vida. Se você conseguir achar graça, não será tão ruim. E, se não funcionar, lembre-se de que é exatamente o que acontece quando você vê um monte de cocô de cachorro no meio da calçada. Não há nada que possa fazer a respeito. É me- lhor aceitar. Viva e deixe o cocô na calçada viver. Isso nos leva ao próximo preceito: 24. MERDAS ACONTECEM. Murmurar essas duas palavras é como tomar 5 miligramas de Va- lium. Aceitação acalma. E, como muitos dos segredos de Keith, aqui vai mais um baseado nessa ideia. Aceite que merdas acontecem. Faz parte da vida. E, se você acha que não vai acontecer nenhuma, pode aceitar, a partir de agora, que você está ferrado. Merdas acontecem de fato e aconte- cem de novo, e depois mais um pouco. Portanto, diga essas duas palavras em voz alta, baixa, em silêncio, sempre que algo estranho acontecer. É como espantar uma mosca. Tão fácil como acender a luz ou o quinquagésimo Marlboro do dia. Clique. A luz acendeu. Merdas acontecem. 25. QUANDO SE DESESPERAR, LEMBRE-SE: TEM SEMPRE O FUTURO. As coisas nem sempre são tão ruins quanto parecem de primeira. Claro, no momento pode ser péssimo. Você caiu de um coqueiro. Botou fogo num quarto de hotel. Mas o tempo não para, e, de fato, “tem sempre o futuro”. O futuro virá, mesmo quando você estiver tomado pelos tremores da desintoxicação ou quando vir 39
  • 24. novamente aquele homem com algemas vindo na sua direção. As leis da física e da ciência — do tempo — ainda estão do seu lado. O tempo anda para a frente, o tempo cura de fato. E esses mo- mentos Belzebu chegam a um fim. Se você mantiver isso em mente, conseguirá passar por esses momentos. Se vir isso como uma estrela brilhando no horizonte das possibilidades, como um reino do “eu chego lá”, terá algo capaz de ajudá-lo nos momentos difíceis. É uma expressão que costuma pontuar as frases de Keith quando fala sobre algo nada glorioso, uma falha pessoal, um show que não foi bem: “Tem sempre o futuro.” É um bilhete para sair do presente quando este não corresponde à maravilha do “aqui e agora.” Por mais que se diga que o presente é um presente, às ve- zes você acha que pode sobreviver sem a caridade de tal donativo maldito. É quando o futuro se torna seu amigo. E ele pode ser um bom amigo. 26. PASSE ADIANTE. Faça como fez Muddy Waters. E Robert Johnson, Buddy Holly, Elvis. Eles passaram adiante a tradição, o conhecimento que veio do passado; tudo o que experimentaram e aprenderam. Você aprende, aperfeiçoa e passa para as gerações que virão depois de você. E esta é a mensagem que Keith diz querer gravada no seu túmulo: “Ele passou adiante.” Existem várias maneiras de passar algo adiante, e há muito o que passar — sejam lições de gentileza, de como tocar um ins- trumento ou compreender os blues (e as outras cores) da sua vida. Passe adiante amor, gentileza, boas ações secretas, alegria, música e sabedoria. E, através disso, você passará adiante sua própria es- sência. Mesmo que o processo para adquirir o conhecimento seja mais parecido com a passagem de uma pedra pelos rins, ainda assim a arte de passar adiante é uma das ações mais profundas em direção à imortalidade. 40