Sem assistência e informação, população tem ‘muito medo’ da doença; 13o Fórum Nacional Oncoguia debate os desafios para reduzir desigualdades e ampliar acesso à saúde
Pesquisas do Oncoguia mostra visão sobre câncer por quem mora na favela
Pesquisas do Oncoguia mostra visão sobre câncer por quem mora na favela
1. domingo, 21 dE maio dE 2023 A11
A10 domingo, 21 dE maio dE 2023 a eee a eee
APRESENTA APRESENTA
PROPOSTAS DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE PATOLOGIA PARA DIAGNÓSTICO PRECOCE
O IMPACTO DO CÂNCER
O
diagnóstico do cân-
cer avançou a passos
largos nas últimas
décadas, possibilitan-
do detalhar a doença em nível
molecular: hoje, o câncer tem
nome, sobrenome, CPF e RG.
Mas o principal desafio enfren-
tado pelos pacientes com câncer
do Sistema Único de Saúde (SUS)
estájustamente nadificuldade de
acesso ao diagnóstico.
“A biópsia é o exame que
muda a vida da pessoa da noite
para o dia. E a média para re-
sultado das biópsias no Brasil,
no SUS, é de mais de 30 dias.
Mas temos muitos relatos de
demora de meses. Enquanto
o paciente espera, a doença
avança”, afirma Luciana Holtz,
fundadora e presidente do On-
coguia. Na rede privada, esse
processo leva quatro dias.
O diagnóstico do câncer
evoluiu muito. Antes o exame
mostrava apenas que a doença
era um câncer. “Hoje, sabemos
que o câncer é uma doença de
caráter biomolecular, que tem
subtipos. Existem tratamen-
tos mais adequados para cada
subtipo de câncer, e isso faz
com que o conhecimento sobre
isso seja importante em diver-
sas etapas desse cuidado”, diz
Sandro Martins, pesquisador e
oncologista.
Segundo Clóvis Klock, pre-
sidente da Sociedade Brasileira
de Patologia (SBP), a demora no
resultado da biópsia no SUS se
deve a problemas que vão do
armazenamento inadequado
dos tecidos para biópsia à fal-
ta de patologistas por conta da
baixa remuneração. “A tabela
do SUS paga R$ 40,78 pelo exa-
me anatomopatológico, que faz
o diagnóstico do câncer, e R$
13,72 pelo exame preventivo de
câncer de colo de útero.”
Por vezes o atraso está na
parte técnica: alâmina não che-
ga para o patologista ou chega
com qualidade inadequada.
“O governo precisa criar pro-
cessos: automatizaralgumas eta-
pas da biópsia e fazer o gerencia-
mento do fluxo para identificar
onde está problema: no trans-
porte, no laboratório, na falta
equipamento, na falta de pato-
logistas para laudar”, diz Isabela
Werneck, coordenadora médica
de patologia da Rede D’Or.
Ela e Klock sugerem a cria-
ção de centros regionais de
referência em patologia, com
utilização de telepatologia e
de mecanismos de inteligência
artificial.
DESIGUALDADE
NO ACESSO
A demora no diagnóstico
do câncer impacta no atraso
para iniciar o tratamento, que
muitas vezes começa quando a
doença já está em estágio avan-
çado, com metástases.
“Hoje existe uma concentra-
ção dos recursos em quimiote-
rapia paliativa, quando o câncer
não tem cura. Mais de 80% do or-
çamento da oncologia no SUS es-
tão direcionados para o momen-
to com o menor retorno”, afirma
Rodrigo Pinheiro,vice-presiden-
te da Sociedade Brasileira de Ci-
Laboratório criado para a Covid pode reduzir gargalos
O
s desafios para o
combate ao câncer
são inúmeros, mas
as soluções também
são. Durante o 13º Fórum Na-
cional Oncoguia, foram apre-
sentados exemplos bem-suce-
didos de iniciativas que podem
agilizar o diagnóstico e o trata-
mento da doença.
Um desses exemplos é a
Unadig (Unidade de Apoio ao
Diagnóstico), lab de inovação da
Fiocruz, construída durante a
pandemia de Covid, no Rio de Ja-
neiro. A unidade conta com dois
laboratórios, de biologia mole-
cular e de sorologia, com plata-
formas automatizadas, dotadas
de equipamentos para ampliar o
processamento de testes.
“Durante a pandemia, tive-
mos quatro unidades, que, em
3 anos, processaram 10 milhões
de amostras de RT-PCR de todo
o Brasil. Chegamos a processar
mais de 20 mil amostras por dia
e devolvíamos o resultado em
48 horas”, lembra Érika de Car-
valho, coordenadora geral da
Unadig-RJ.
Ela afirma que a proposta
agora é levar o know how con-
quistado na pandemia para o
câncer. “Temos capacidade de
trabalhar full time, 24 horas por
dia, sete dias por semana, e po-
demos ser um centro estratégico
comaltacapacidadedeprocessa-
mento.” Trabalhando emhorário
comercial, é possível processar 9
mil amostras pordia, assim como
no lab de biologia molecular.
“Sabemos que o diagnóstico
molecular é uma das principais
lacunas do SUS. Além de painéis
de câncer, podemos fazer análi-
se preditiva, de diagnóstico e de
acompanhamento da resposta
terapêutica e de recidiva.” A en-
tidade já está em tratativas para
fechar uma parceria com o Inca.
Serviços qualificados
e com programas de
controle de qualidade
(PACQ)
rurgia Oncológica (SBCO).
Quando consegue o diag-
nóstico, o paciente do SUS tem
acesso a menos opções de tra-
tamentos que as oferecidas na
rede privada. Fernando Korkes,
chefe do Grupo de Uro-Onco-
logia da Faculdade de Medicina
do ABC (FMABC), apresentou
um estudo que compara os
tratamentos oferecidos pelo
hospital AC Camargo para
pacientes do SUS e da saúde
suplementar com câncer de
próstata metastático. Segundo
esse estudo, os pacientes com
acesso à saúde suplementar
têm uma sobrevida média de
40 meses a mais do que os pa-
cientes do SUS.
Luciana concorda, mas
chama a atenção para o fato
de que os pacientes não estão
descobrindo a doença nas fa-
ses avançadas porque querem.
“Eles simplesmente não con-
seguem ter acesso a exames,
médicos, enfim ao diagnóstico
precoce”, diz. Diante da doença
avançada, há que se ter acesso
ao tratamento mais efetivo.
Fernando Henrique de Al-
buquerque Maia, coordena-
dor-geral da Política Nacional
de Prevenção e Controle do
Câncer do Ministério da Saú-
de, reconhece os desafios. “Nos
últimos anos, o aumento dos
gastos com quimioterapia e ra-
dioterapia não resultou em re-
dução de mortalidade. Estamos
gastando mais com cânceres
em estágios mais avançados, e
esse não é o melhor uso possí-
vel dos recursos”, disse.
Ele afirma que um dos focos
fundamentais neste momento
é a prevenção. Maia citou es-
tudos que associam a maior
incidência de câncer a má
alimentação, sedentarismo,
tabagismo e exposição solar.
“Estamos discutindo uma re-
forma tributária e a tributação
de produtos comprovadamen-
te nocivos à saúde. Tem que ter
tributação de tabaco, álcool e
alimentos ultraprocessados.”
Outro ponto de discussão
foram as regras para incor-
poração de tratamentos pela
Conitec (Comissão Nacional de
Incorporação de Tecnologias
no SUS). “É preciso definir es-
tratégias de priorização e fazer
a previsão de impacto orça-
mentário: todo medicamento
de alto custo deve ter compra
centralizada para poder ter
negociação de preços”, afirma
Vania Canuto, ex-secretária de
Ciência e Tecnologia do Minis-
tério da Saúde.
Vanessa Teich, superinten-
dente de Economia da Saúde do
Hospital Israelita Albert Eins-
tein, afirma não ser sustentável
incorporar terapias sem definir
de onde virá o dinheiro. “Minha
sugestão, diante desse quadro,
é ter incorporações em perío-
dos definidos. Receber os pe-
didos de incorporação ao longo
do ano e priorizar as tecnolo-
gias dentro do orçamento dis-
ponível, usando os critérios de
custo-efetividade, para ter cer-
teza de que se está maximizan-
do a saúde da população frente
aos critérios disponíveis.”
TRATAMENTO DE CÂNCER NO SUS
ESBARRA NO ATRASO DO DIAGNÓSTICO
Resultado da biópsia, que chega
a sair em quatro dias na saúde
privada, pode demorar mais de
30 dias no sistema público
DESIGUALDADE NO ACESSO
Nova
maneira de
remuneração
Melhoria das residências
médicas: corpo clínico
qualificado e estrutura
para imuno-histoquímica
e patologia molecular
Parcerias
público-privadas
nos hospitais
universitários
Parcerias público-
privadas para a
demanda reprimida
do SUS
Utilização de telepatologia
e inteligência artificial no
SUS, para melhorar os
diagnósticos
Entre 80% e 90%
dos casos de câncer
estão associados a
causas externas, isto
é, são, em princípio,
Entre as estratégias de controle da doença, a
prevenção primáriaé a única capaz
de diminuir tanto os casos novos como as
mortes por câncer, sendo a com melhor
custo-benefíciopara o longo prazo.
Isso inclui a adoção de hábitos de
vida saudáveise evitar a exposição às
substâncias causadoras de câncer
PROBLEMAS
ENFRENTADOS PELOS
PACIENTES DO SUS
DIFICULDADES DE
ACESSO À SAÚDE
Demora para marcar exames;
falta de vagas para atendimento
médico/demora em marcar
consulta; falta de acesso e
acompanhamento médico
FALTA DE INFORMAÇÃO
Sobre o câncer, seu diagnóstico e
prevenção; baixa percepção sobre
risco de desenvolver câncer
FALTA DE INFRAESTRUTURA DE
SERVIÇOS E PROFISSIONAIS
Falta de especialidades médicas/
exames específicos na unidade
de saúde mais próxima de
seu endereço; falta de acesso
aos equipamentos de saúde
adequados (exames, médicos e
serviços de saúde)
FALTA DE POLÍTICAS DE
PREVENÇÃO
Diversos tipos de câncer estão
associados a um estilo de vida
pouco saudável (tabagismo,
alta ingestão de alimentos
ultraprocessados, excesso de
álcool e sedentarismo)
DEMORA NO DIAGNÓSTICO
Cerca de mais de 30 dias para
receber o resultado da biópsia
preveníveis
Fonte: Inca (Instituto Nacional do Câncer)
Entre 2020
e 2040
Hoje
Em
2018
Em
2040
No Brasil, o câncer
é a segunda causa
mais frequente de
morte. A cada ano,
são cerca de
O governo
federal
gastou
cerca de
e
(excluindo os casos
de câncer não
melanoma)
232 mil
450 mil
novos
casos
mortes
diagnosticados
R$
3,50 bi
R$
7,84 bi
com
procedimentos
hospitalares e
ambulatoriais
no SUS
em
pacientes
oncológicos
com 30 anos
ou mais de
idade
nas
mortes
por câncer
no Brasil
Estimativas
apontam que, com
o crescimento e
envelhecimento
populacional,
haverá um
aumento de
66%
81%
no número
de novos
casos e
Se nada for
feito, e a
tendência
de aumento
de casos se
mantiver
na mesma
velocidade,
a projeção
é de que
o governo
federal
gastará
PERCEPÇÕES E PRIORIDADES SOBRE O CÂNCER NAS FAVELAS
Pesquisa revela barreiras enfrentadas por moradores para ter acesso à saúde
QUAL A PRINCIPAL DIFICULDADE QUE ATRAPALHA/DIFICULTA A PREVENÇÃO E DIAGNÓSTICO PRECOCE DO CÂNCER?
PRINCIPAIS AÇÕES PEDIDAS POR QUEM MORA NA FAVELA
DOS ENTREVISTADOS
PESQUISA DO ONCOGUIA MOSTRA VISÃO
SOBRE CÂNCER POR QUEM MORA NA FAVELA
Sem assistência e informação, população tem ‘muito medo’ da doença; 13º Fórum Nacional
Oncoguia debate os desafios para reduzir desigualdades e ampliar acesso à saúde
DIFERENÇAS NA SAÚDE
N
unca se avançou tanto
emrelaçãoaodiagnós-
tico e ao tratamento do
câncer no Brasil e no
mundo. Para milhões de brasi-
leiros, porém, ainda há enormes
barreiras para o acesso a cuida-
dos básicos de saúde.
Pesquisa inédita do Insti-
tuto Oncoguia revela os desa-
fios enfrentados pelos mora-
dores das favelas do país, uma
população que depende do SUS
(Sistema Único de Saúde) e que
sofre com a falta de serviços,
de equipes de saúde e até mes-
mo de informação sobre a do-
ença que, segundo dados do
Instituto Nacional do Câncer
(Inca), atinge mais de 700 mil
novas pessoas por ano.
A pesquisa “Percepções e
prioridades do câncer nas fave-
las brasileiras”, realizada pelo
DataFavela, foi apresentada na
abertura do 13º Fórum Nacional
Oncoguia, evento que, durante
três dias, reuniu representan-
tes da sociedade, da classe mé-
dica e autoridades para debater
caminhos para ampliaro acesso
de todos à saúde de qualidade.
O levantamento ouviu 2.963
pessoas, em sua maioria pretos
e pardos das classes D e E, de
todas as regiões do país. Esse
universo pesquisado reflete a
realidade de 17,9 milhões de
pessoas que moram em fave-
las no país.
Os dados são alarmantes:
73% dos entrevistados dizem
tentar cuidar da saúde, mas que
nunca há médico para atendê-
-los. A grande maioria, 85%,
concorda que cuidaria melhor
da saúde se tivesse condições
financeiras e 77% dizem que
fariam o mesmo com maior
acesso a informações.
Diante desse quadro, o re-
sultado não poderia ser outro:
65% dizem ter muito medo de
descobrir um diagnóstico de
câncer. “A experiência dessa
população com o diagnóstico
de câncer é muito negativa. Há
consciência sobre a prevenção
e há medo, mas não há aces-
so aos cuidados”, diz Luciana
Holtz, fundadora e presidente
do Instituto Oncoguia.
“Atrás de cada uma das es-
tatísticas dessa pesquisa há
uma pessoa. Os números re-
presentam histórias de vida e
de medo sobre uma doença tão
estigmatizada quanto os pró-
prios moradores das favelas”,
afirma Renato Meirelles, fun-
dador do Instituto Locomotiva.
A pesquisa do Instituto On-
Estudo
ajuda a
nortear
ações do
ministério, diz
coordenador
A
pesquisa “Percep-
ções e Prioridades
sobre Câncer nas Fa-
velas” traz elementos
para a nova política de preven-
ção e combate ao câncer, afir-
ma Fernando Henrique Maia,
coordenador-geral da Política
Nacional de Prevenção e Con-
trole do Câncer. Os dados, diz
ele, enfatizam a necessidade de
haver serviços mais próximos
dos moradores de favelas e com
horários flexíveis para evitar a
perda de um dia de trabalho.
Maia defende que é preciso
capacitar médicos e agentes de
Saúde para atuar na ponta nes-
sas comunidades, além de re-
organizar protocolos clínicos.
Em especial, a priorização da
fila de exames.
“Concordo que há falta de
profissionais nas unidades de
Saúde das comunidades. Mas
a recriação do programa Mais
Médicos terá impacto positivo
nesse quadro e, especialmente,
na prevenção e no diagnóstico
precoce do câncer em favelas e
regiões periféricas”, afirma.
Um dos principais desafios,
em sua opinião, será superar
os seis anos de limitações dos
gastos de Saúde —algo com o
qual o atual governo federal está
comprometido. Outro, mais di-
fícil, será combater a herança
da “epidemia de desinformação”
na área. “Precisamos trabalhar o
resgate da ciência. Uma questão
ilustrativa é a rejeição, susten-
tada em fake news, à vacina que
protege contra o câncer de colo
de útero”, explica.
coguia também revela que há
muita desinformação sobre a
doença, mas que, ao mesmo
tempo, as pessoas querem sa-
ber mais sobre o câncer e for-
mas de prevenção. Uma das
principais ações pedidas por
quem mora nas favelas é jus-
tamente a realização de mais
campanhas de conscientização.
Preto Zezé, ex-presidente da
Cufa Nacional (Central Única das
Favelas), explica que, durante a
pandemia de Covid, as comuni-
dades acumularam experiências
de mobilização –da distribuição
de chips para celulares a absor-
ventes–, de produção de dados
e de combate à desinformação.
Esse conhecimento, diz ele, deve
agora ser usado na prevenção ao
câncer e outras doenças.
Além da falta de recursos e
de informação, há outras bar-
reiras a serem superadas, como
o racismo. Dos entrevistados,
81% se declararam negros. “É
preciso haver mais oncologis-
tas negros para o atendimento
nas favelas. O racismo está pre-
sente, e a quantidade de negros
especializados em Oncologia é
muito baixa”, afirma Ana Amé-
lia de Almeida Vianna, do Co-
mitê de Diversidade da Socie-
dade Brasileira de Oncologia
Clínica (SBOC).
A declaração da especialis-
ta foi logo após o depoimento
de Léia de Jesus Silva, 36 anos,
moradora da Cohab Itapevi, em
São Paulo, que contou ter pas-
sado por quatro médicos desde
que notou um nódulo, em 2016.
Segundo ela, “por nojo”, ne-
nhum deles fez o exame clínico
em suas mamas. Ao final, foi
submetida à mastectomia.
A necessidade de ampliar
os investimentos em saúde e de
reestruturar o atendimento foi
consenso entre os especialistas.
A oncologistaAnaAmélia defen-
de a descentralização de unida-
des de diagnóstico e tratamento
do câncer para alcançar as co-
munidades mais vulneráveis.
Já o ex-ministro da Saúde
Luiz Henrique Mandetta lem-
bra que há um aumento de ca-
sos da doença, já que, durante
a pandemia, as pessoas adia-
ram a realização de consultas
e exames. Casos que poderiam
ter sido diagnosticados preco-
cemente evoluíram para os de
maior complexidade. “O go-
verno terá de colocar dinhei-
ro para valer na Saúde. Temos
como horizonte o ano de 2035
para o setor voltar à normali-
dade”, afirma.
Dimmy Falcão de Brito/Divulgação
Luciana Holtz, fundadora
e presidente da Fundação
Oncoguia, durante a
abertura do 13º Fórum
Dificuldade
para se
cuidar
Campanhas/
Mais
informações
AS PRINCIPAIS PERCEPÇÕES
Cuidaria melhor da saúde se:
Dizem que a primeira
palavra que vem à
mente ao ouvir falar
em câncer é: Morte/
Morrer/Fatal
Dizem
fazer exames
de rotina
Dizem ter
muito medo de
descobrir um
diagnóstico de
câncer
Tivesse
condições
financeiras
Sendo
estes:
Sendo
estes:
Tivesse mais
acesso a
informações e
exames
Tivesse com
quem deixar
os filhos
59% 29% 65% 85% 77% 44%
Pesquisa foi realizada com 2.963 moradores de favelas de todas as regiões do país entre os dias 18/01/2023 a 01/02/2023
40%
54%
37%
9%
25%
21%
15%
Dificuldade
de acesso
ao cuidado
Desinformação
Investimento
em saúde
Falta de
infraestrutura
Ampliação
de formas de
cuidado: Agente
de saúde
São negros São de classes sociais D/E Têm escolaridade até o
ensino médio
Usam exclusivamente o SUS
18% • Dificuldade e demora para marcar exames
15% • Falta de vagas para atendimento médico
12% • Falta de especialidades médicas
10% • Falta de informação
9% • Falta de acesso aos equipamentos de saúde adequados
9% • Dificuldade em deixar hábitos que são prejudiciais à saúde
7% • Falta de acesso e acompanhamento médico
6% • Medo de receber o diagnóstico da doença
5% • Medo de realizar exames preventivos
4% • Falta de tempo para se cuidar
2% • Baixa percepção sobre o risco de desenvolver câncer
2% • Falta de tempo para realizar exames
1% • Informações falsas
20% • Maior investimento em instituições de saúde nas favelas
17% • Espaço em serviços de saúde para tirar dúvidas
17% • Mais médicos disponíveis perto da minha casa
14% • Mais campanhas de conscientização na mídia
9% • Acompanhamento frequente e contínuo
7% • Mais campanhas de conscientização em redes sociais
7% • Maior divulgação dos programas governamentais sobre o câncer
3% • Acompanhamento frequente e contínuo realizado por ONGs
3% • Eventos e ações sociais para informação e conscientização
3% • Campanhas de prevenção realizadas por figuras públicas
81% 81% 91% 82%
2. domingo, 21 dE maio dE 2023 A11
a eee
APRESENTA
PROPOSTAS DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE PATOLOGIA PARA DIAGNÓSTICO PRECOCE
O IMPACTO DO CÂNCER
O
diagnóstico do cân-
cer avançou a passos
largos nas últimas
décadas, possibilitan-
do detalhar a doença em nível
molecular: hoje, o câncer tem
nome, sobrenome, CPF e RG.
Mas o principal desafio enfren-
tado pelos pacientes com câncer
do Sistema Único de Saúde (SUS)
estájustamente nadificuldade de
acesso ao diagnóstico.
“A biópsia é o exame que
muda a vida da pessoa da noite
para o dia. E a média para re-
sultado das biópsias no Brasil,
no SUS, é de mais de 30 dias.
Mas temos muitos relatos de
demora de meses. Enquanto
o paciente espera, a doença
avança”, afirma Luciana Holtz,
fundadora e presidente do On-
coguia. Na rede privada, esse
processo leva quatro dias.
O diagnóstico do câncer
evoluiu muito. Antes o exame
mostrava apenas que a doença
era um câncer. “Hoje, sabemos
que o câncer é uma doença de
caráter biomolecular, que tem
subtipos. Existem tratamen-
tos mais adequados para cada
subtipo de câncer, e isso faz
com que o conhecimento sobre
isso seja importante em diver-
sas etapas desse cuidado”, diz
Sandro Martins, pesquisador e
oncologista.
Segundo Clóvis Klock, pre-
sidente da Sociedade Brasileira
de Patologia (SBP), a demora no
resultado da biópsia no SUS se
deve a problemas que vão do
armazenamento inadequado
dos tecidos para biópsia à fal-
ta de patologistas por conta da
baixa remuneração. “A tabela
do SUS paga R$ 40,78 pelo exa-
me anatomopatológico, que faz
o diagnóstico do câncer, e R$
13,72 pelo exame preventivo de
câncer de colo de útero.”
Por vezes o atraso está na
parte técnica: alâmina não che-
ga para o patologista ou chega
com qualidade inadequada.
“O governo precisa criar pro-
cessos: automatizaralgumas eta-
pas da biópsia e fazer o gerencia-
mento do fluxo para identificar
onde está problema: no trans-
porte, no laboratório, na falta
equipamento, na falta de pato-
logistas para laudar”, diz Isabela
Werneck, coordenadora médica
de patologia da Rede D’Or.
Ela e Klock sugerem a cria-
ção de centros regionais de
referência em patologia, com
utilização de telepatologia e
de mecanismos de inteligência
artificial.
DESIGUALDADE
NO ACESSO
A demora no diagnóstico
do câncer impacta no atraso
para iniciar o tratamento, que
muitas vezes começa quando a
doença já está em estágio avan-
çado, com metástases.
“Hoje existe uma concentra-
ção dos recursos em quimiote-
rapia paliativa, quando o câncer
não tem cura. Mais de 80% do or-
çamento da oncologia no SUS es-
tão direcionados para o momen-
to com o menor retorno”, afirma
Rodrigo Pinheiro,vice-presiden-
te da Sociedade Brasileira de Ci-
Laboratório criado para a Covid pode reduzir gargalos
O
s desafios para o
combate ao câncer
são inúmeros, mas
as soluções também
são. Durante o 13º Fórum Na-
cional Oncoguia, foram apre-
sentados exemplos bem-suce-
didos de iniciativas que podem
agilizar o diagnóstico e o trata-
mento da doença.
Um desses exemplos é a
Unadig (Unidade de Apoio ao
Diagnóstico), lab de inovação da
Fiocruz, construída durante a
pandemia de Covid, no Rio de Ja-
neiro. A unidade conta com dois
laboratórios, de biologia mole-
cular e de sorologia, com plata-
formas automatizadas, dotadas
de equipamentos para ampliar o
processamento de testes.
“Durante a pandemia, tive-
mos quatro unidades, que, em
3 anos, processaram 10 milhões
de amostras de RT-PCR de todo
o Brasil. Chegamos a processar
mais de 20 mil amostras por dia
e devolvíamos o resultado em
48 horas”, lembra Érika de Car-
valho, coordenadora geral da
Unadig-RJ.
Ela afirma que a proposta
agora é levar o know how con-
quistado na pandemia para o
câncer. “Temos capacidade de
trabalhar full time, 24 horas por
dia, sete dias por semana, e po-
demos ser um centro estratégico
comaltacapacidadedeprocessa-
mento.” Trabalhando emhorário
comercial, é possível processar 9
mil amostras pordia, assim como
no lab de biologia molecular.
“Sabemos que o diagnóstico
molecular é uma das principais
lacunas do SUS. Além de painéis
de câncer, podemos fazer análi-
se preditiva, de diagnóstico e de
acompanhamento da resposta
terapêutica e de recidiva.” A en-
tidade já está em tratativas para
fechar uma parceria com o Inca.
Serviços qualificados
e com programas de
controle de qualidade
(PACQ)
rurgia Oncológica (SBCO).
Quando consegue o diag-
nóstico, o paciente do SUS tem
acesso a menos opções de tra-
tamentos que as oferecidas na
rede privada. Fernando Korkes,
chefe do Grupo de Uro-Onco-
logia da Faculdade de Medicina
do ABC (FMABC), apresentou
um estudo que compara os
tratamentos oferecidos pelo
hospital AC Camargo para
pacientes do SUS e da saúde
suplementar com câncer de
próstata metastático. Segundo
esse estudo, os pacientes com
acesso à saúde suplementar
têm uma sobrevida média de
40 meses a mais do que os pa-
cientes do SUS.
Luciana concorda, mas
chama a atenção para o fato
de que os pacientes não estão
descobrindo a doença nas fa-
ses avançadas porque querem.
“Eles simplesmente não con-
seguem ter acesso a exames,
médicos, enfim ao diagnóstico
precoce”, diz. Diante da doença
avançada, há que se ter acesso
ao tratamento mais efetivo.
Fernando Henrique de Al-
buquerque Maia, coordena-
dor-geral da Política Nacional
de Prevenção e Controle do
Câncer do Ministério da Saú-
de, reconhece os desafios. “Nos
últimos anos, o aumento dos
gastos com quimioterapia e ra-
dioterapia não resultou em re-
dução de mortalidade. Estamos
gastando mais com cânceres
em estágios mais avançados, e
esse não é o melhor uso possí-
vel dos recursos”, disse.
Ele afirma que um dos focos
fundamentais neste momento
é a prevenção. Maia citou es-
tudos que associam a maior
incidência de câncer a má
alimentação, sedentarismo,
tabagismo e exposição solar.
“Estamos discutindo uma re-
forma tributária e a tributação
de produtos comprovadamen-
te nocivos à saúde. Tem que ter
tributação de tabaco, álcool e
alimentos ultraprocessados.”
Outro ponto de discussão
foram as regras para incor-
poração de tratamentos pela
Conitec (Comissão Nacional de
Incorporação de Tecnologias
no SUS). “É preciso definir es-
tratégias de priorização e fazer
a previsão de impacto orça-
mentário: todo medicamento
de alto custo deve ter compra
centralizada para poder ter
negociação de preços”, afirma
Vania Canuto, ex-secretária de
Ciência e Tecnologia do Minis-
tério da Saúde.
Vanessa Teich, superinten-
dente de Economia da Saúde do
Hospital Israelita Albert Eins-
tein, afirma não ser sustentável
incorporar terapias sem definir
de onde virá o dinheiro. “Minha
sugestão, diante desse quadro,
é ter incorporações em perío-
dos definidos. Receber os pe-
didos de incorporação ao longo
do ano e priorizar as tecnolo-
gias dentro do orçamento dis-
ponível, usando os critérios de
custo-efetividade, para ter cer-
teza de que se está maximizan-
do a saúde da população frente
aos critérios disponíveis.”
TRATAMENTO DE CÂNCER NO SUS
ESBARRA NO ATRASO DO DIAGNÓSTICO
Resultado da biópsia, que chega
a sair em quatro dias na saúde
privada, pode demorar mais de
30 dias no sistema público
DESIGUALDADE NO ACESSO
Nova
maneira de
remuneração
Melhoria das residências
médicas: corpo clínico
qualificado e estrutura
para imuno-histoquímica
e patologia molecular
Parcerias
público-privadas
nos hospitais
universitários
Parcerias público-
privadas para a
demanda reprimida
do SUS
Utilização de telepatologia
e inteligência artificial no
SUS, para melhorar os
diagnósticos
Entre 80% e 90%
dos casos de câncer
estão associados a
causas externas, isto
é, são, em princípio,
Entre as estratégias de controle da doença, a
prevenção primáriaé a única capaz
de diminuir tanto os casos novos como as
mortes por câncer, sendo a com melhor
custo-benefíciopara o longo prazo.
Isso inclui a adoção de hábitos de
vida saudáveise evitar a exposição às
substâncias causadoras de câncer
PROBLEMAS
ENFRENTADOS PELOS
PACIENTES DO SUS
DIFICULDADES DE
ACESSO À SAÚDE
Demora para marcar exames;
falta de vagas para atendimento
médico/demora em marcar
consulta; falta de acesso e
acompanhamento médico
FALTA DE INFORMAÇÃO
Sobre o câncer, seu diagnóstico e
prevenção; baixa percepção sobre
risco de desenvolver câncer
FALTA DE INFRAESTRUTURA DE
SERVIÇOS E PROFISSIONAIS
Falta de especialidades médicas/
exames específicos na unidade
de saúde mais próxima de
seu endereço; falta de acesso
aos equipamentos de saúde
adequados (exames, médicos e
serviços de saúde)
FALTA DE POLÍTICAS DE
PREVENÇÃO
Diversos tipos de câncer estão
associados a um estilo de vida
pouco saudável (tabagismo,
alta ingestão de alimentos
ultraprocessados, excesso de
álcool e sedentarismo)
DEMORA NO DIAGNÓSTICO
Cerca de mais de 30 dias para
receber o resultado da biópsia
preveníveis
Fonte: Inca (Instituto Nacional do Câncer)
Entre 2020
e 2040
Hoje
Em
2018
Em
2040
No Brasil, o câncer
é a segunda causa
mais frequente de
morte. A cada ano,
são cerca de
O governo
federal
gastou
cerca de
e
(excluindo os casos
de câncer não
melanoma)
232 mil
450 mil
novos
casos
mortes
diagnosticados
R$
3,50 bi
R$
7,84 bi
com
procedimentos
hospitalares e
ambulatoriais
no SUS
em
pacientes
oncológicos
com 30 anos
ou mais de
idade
nas
mortes
por câncer
no Brasil
Estimativas
apontam que, com
o crescimento e
envelhecimento
populacional,
haverá um
aumento de
66%
81%
no número
de novos
casos e
Se nada for
feito, e a
tendência
de aumento
de casos se
mantiver
na mesma
velocidade,
a projeção
é de que
o governo
federal
gastará
3. A12 domingo, 21 dE maio dE 2023 a eee
APRESENTA
Ateliê de produção de conteúdo em todas as plataformas | ESTUDIO.FOLHA.COM.BR
Quando ele
[o paciente]
pergunta
ao médico
sobre uma
medicação,
não está sendo
teimoso, está
sendo ativo e
responsável
SILVIA FERRITE
É preciso
passar ao
paciente as
informações
corretas, mas
lembrando
que ali tem
alguém com
esperança de
se curar
EVELIN SCARELLI
Entidades firmam compromisso para incentivar o diagnóstico precoce
INFORMAÇÃO AJUDA NA PREVENÇÃO E
NO EMPODERAMENTO DOS PACIENTES
Combater
as fake news
e ampliar o
acesso a dados
confiáveis
também são
importantes
para melhorar
a qualidade de
vida de quem
tem câncer
REFLEXÕES E INSPIRAÇÕES
A
falta de informação
de qualidade é um
dos principais pro-
blemas enfrentados
por pacientes oncológicos. Com
informação, é possível entender
melhor a doença, fazer escolhas
mais conscientes e evitar que,
em momentos de fragilidade,
sejam atraídos por soluções sem
comprovação científica.
“Me incomodo demais com
fakenews.Hojemesmofuiabor-
dada no hospital para comprar
uma cápsula para tratar câncer.
Confesso que entendo essa bus-
ca por uma solução rápida. Você
quer algo que resolva seu pro-
blema, mas é perigoso”, afirma
Quézia Queiroz, que teve câncer
de ovário e hoje é voluntária da
Oncoguia. Sua missão é com-
bater as fake news por meio do
perfil do Instagram @oncofake.
Quézia participou da mesa
“O que importa para os pacien-
tes: reflexões e inspirações”,
uma das mais concorridas do
13º Fórum Nacional Oncoguia.
Ela não foi a única a afirmar que
a busca por informações corre-
tas é fundamental durante toda
a jornada do paciente.
“É preciso passar ao pa-
ciente as informações corre-
tas, mas lembrando que ali tem
alguém com esperança de se
curar. A forma como falamos
sobre isso faz toda diferença
em sua jornada”, ressalta Eve-
lin Scarelli, que teve câncer
de mama e é coordenadora de
relacionamento institucional e
voluntariado do Oncoguia.
Informação é poder, mas
também uma forma de prote-
ção, lembra Iane Cardin, que
tem câncer de pulmão com
metástase nos ossos. “Às vezes
de Urologia, afirma que um dos
desafios de sua área é vencer a
resistência dos homens. "Inde-
pendentemente do nível eco-
nômico e intelectual, 50% dos
homens não vão ao urologista."
No caso dos cânceres de in-
testino, é importante informar a
população sobre os riscos do ci-
garro, do álcool e a importância
de uma dieta saudável. Antônio
Lacerda Filho, presidente da So-
ciedade Brasileira de Coloproc-
tologia, lembra que há dois tipos
de exame pararastrearadoença:
a colonoscopia e a pesquisa de
sangue oculto nas fezes.
Gustavo Prado, coordena-
dor da Comissão de Câncer de
Pulmão da Sociedade Brasi-
leira de Pneumologia, destaca
que há evidências consolidadas
da eficiência do rastreamento
do câncer de pulmão com to-
mografia com baixo índice de
radiação em pacientes de alto
risco (tabagistas e ex-tabagistas
com mais de 50 anos). "O exame
não só faz o diagnóstico como
reduz a mortalidade", afirma.
Agnaldo Lopes, da Federa-
ção Brasileira das Associações
de Ginecologia e Obstetrícia,
destaca que o câncer de colo
de útero é um dos mais preve-
níveis e tratáveis. No entanto, a
expectativa é que, se mantidos
os números atuais, até 2040 au-
mente em quase 50% o número
de mortes no Brasil. A preven-
ção primária pode ser feita por
meio da vacina contra o HPV e
do uso de preservativos.
Marisa Madi, diretora-exe-
cutiva da Sociedade Brasileira de
Oncologia Clínica, levanta três
pontos que precisam ser olhados
para a melhora do diagnóstico
precoce: discussão dos valores
de remuneração do SUS, in-
vestimento em infraestrutura e
formação de profissionais, prin-
cipalmente da atenção primária.
O compromisso do Oncoguia
e das sociedades médicas foi
apresentado à coordenadora-ge-
ral de Prevenção às Condições
Crônicas do Ministério da Saú-
de, Gilmara Lúcia Santos. Ela diz
que estão sendo tomadas medi-
das para melhorar o diagnóstico
precoce, como o fortalecimento
de ações para grupos com fatores
de risco como alcoolismo, obesi-
dade e tabagismo; ampliação do
trabalho interprofissional e mul-
tiprofissional na atenção primá-
ria; investimento na formação
dos trabalhadores; fortalecimen-
to do vínculo com os Núcleos de
Apoio à Saúde da Família (NASF);
vacinação contra HPV em parce-
ria com o MEC; incorporação de
novosprocedimentosnaConitec;
e melhoria dos sistemas digitais
de atendimento.
RodrigoPepeCosta,vice-pre-
sidente da região centro-oeste da
Sociedade Brasileira de Masto-
logia, destaca a importância de
ampliar o acesso à mamografia
na rede pública. "Além de acesso,
é precioso qualidade de serviço,
com exames bem feitos", diz.
No câncer dermatológico,
um dos principais desafios é
combater o mito de que o corpo
bronzeado é sinônimo de saúde.
Além disso, afirmaFranciscaRe-
gina, secretária geral da Socie-
dade Brasileirade Dermatologia,
o filtro e o protetor solar não são
acessíveis a toda a população.
Ubirajara Ferreira, coorde-
nador da Sociedade Brasileira
O
Instituto Oncoguia e
sociedades médicas
brasileiras firmaram
um compromisso para
incentivar a prevenção e o diag-
nóstico precoce do câncer. No
encerramento do 13º Fórum Na-
cional Oncoguia, apresentaram
um documento com 13 pontos,
que propõe de campanhas sobre
prevenção à ampliação do aces-
so a exames e mais capacitação e
disponibilização dos profissionais
de saúde.
Representantes de oito so-
ciedades médicas falaram sobre
as dificuldades de cada área e o
que estão fazendo para tentar
reverter a situação atual.
familiares e amigos oferecem
tratamentos milagrosos e, ao
dizer não, o paciente passa por
teimoso. Ele tem que saber por-
que aquela solução mágica não
funciona ou é prejudicial para o
seu caso. Precisa ter argumen-
tos para defender sua decisão.”
Luciana Holtz, fundado-
ra e presidente do Oncoguia,
destaca que a entidade nasceu
exatamente pela crença na im-
portância e na relevância da in-
formação de qualidade no en-
frentamento do câncer.
Paulo Henrique Fraccaro,
CEO da Associação Brasileira da
Indústria de Dispositivos Médi-
cos (ABIMO) e paciente de me-
lanoma, chama a atenção para a
falta de informações confiáveis
para os homens, principalmen-
te na prevenção e no tratamento
do câncer de próstata, doença
que ainda é cercada por estig-
mas, como perda da virilidade e
incontinência urinária.
Fraccaro já fez cirurgia na
próstata, usou absorvente e
lida com todo o processo com
humor. Hoje divide sua expe-
riência com outros pacientes e
vai criar um site sobre sexuali-
dade na velhice.
“Mesmo pessoas formadas,
empresários, quando chegam
no tema da próstata caem em
fake news. É humano”, pondera.
Os participantes reforçaram
a importância de o paciente ser
protagonista de sua jornada. Para
isso, ele precisa ser ativo e ter um
corpo médico que o acolha, saiba
informar e também escutar.
Silvia Ferrite, paciente de
câncer de mama metastático,
lembra da importância de se ou-
vir o paciente. “Quando ele per-
gunta ao médico sobre uma me-
dicação, não está sendo teimoso,
está sendo ativo e responsável.”
“É importante mudar o cor-
po médico para que ele não seja
só o que informa e determina,
mas preferencialmente ajude,
dê dicas e mostre caminhos.
E o paciente tem que ser um
agente ativo, procurar saber
sobre sua medicação, seu tra-
tamento, cuidar da alimentação
e da atividade física, coisas que
nenhum médico fará por você”,
completa Iane Cardin.
Evelin Scarelli, que teve cân-
cer de mama e carrega a muta-
ção BRCA, lembra o impacto da
falta de informação para pa-
cientes como ela. “A sociedade
não está preparada para falar de
mutações, e os pacientes ficam
num limbo. A partir da informa-
ção, posso falar com os médicos
para tomar decisões preventi-
vas e olhar para mim com mais
carinho. Sei da minha parcela
de responsabilidade para fazer
esse organismo funcionar da
melhor maneira possível”, diz.
As fake news
esfriam e
voltam. Você
precisa estar
atento, ter
informação
e mostrar
que aquilo
que estão
vendendo
não funciona
QUÉZIA QUEIROZ
Mesmo
pessoas
formadas,
empresários,
quando
chegam no
tema da
próstata caem
em fake news.
É humano
PAULO HENRIQUE
FRACCARO
É importante
mudar o
corpo médico
para que ele
não seja só o
que informa e
determina, mas
preferencialmente
ajude, dê
dicas e mostre
caminhos
IANE CARDIN
Fotos Dimmy Falcão de Brito/Divulgação
Arquivo Pessoal
Com Luciana Holtz
(centro), pacientes
conversam durante a
mesa “O que importa
para os pacientes:
reflexões e inspirações”
no 13º Fórum Oncoguia
4. domingo, 21 dE maio dE 2023 A13
a eee
CÂNCER
NO MUNDO
Uma em cada cinco pessoas terá
câncer durante a vida1
11,7%
PULMÃO
MAMA
11,4%2
2,3 milhões 2,2 milhões
1º da lista 2º da lista
74 mil
(10,5%)
37,3%
das mortes
foram de
mulheres entre
30 e 69 anos5
52%
do total de casos foram
diagnosticados em estágio
localmente avançado e
avançado (III e IV) em 20225
50,4%
dos pacientes em média
iniciaram seus tratamentos
depois de 60 dias desde a
data do diagnóstico5
90%
dos casos de câncer de
pulmão no Brasil foram
diagnosticados em estágios
avançados (III e IV) em 20226
25,2%
dos pacientes iniciaram
seus tratamentos depois
de 60 dias desde a data
do diagnóstico6
1º
em causa de mortes de
homens por câncer no
Brasil e o segundo mais letal
entre as mulheres4
Caroço fixo e
geralmente
indolor na mama
Pele da mama
avermelhada,
retraída ou parecida
com casca de laranja
Alterações
no mamilo
Pequenos caroços
nas axilas ou no
pescoço
Saída espontânea
de líquido
anormal pelos
mamilos
Tosse ou
rouquidão
persistentes
Sangramento
pelas vias
respiratórias
Dor no peito Fraqueza e perda
de peso sem
causa aparente
Dificuldade
de respirar
Mamografia e ultrassom
de mamas são utilizados
para buscar nódulos, que
podem ser um tumor
Tomografia
computadorizada de baixa
dose é indicada para
rastrear a doença
•No SUS, a mamografia de
rastreamento, quando não há
sintomas, é recomendada a partir
dos 50 anos, a cada 2 anos
•Na saúde suplementar, de acordo com
a Sociedade Brasileira de Mastologia, a
mamografia é recomendada a partir
dos 40 anos, anualmente
Indicação: Pessoas a
partir dos 50 anos que
fumaram 1 maço por dia,
nos últimos 20 anos
Casos novos
Mortes por ano no Brasil em 2020
704 mil
novos casos de
câncer por ano
No Brasil
32 mil
(4,6%)
17.8251
29.0004
PREVENÇÃO>>
O exame também é recomendado para pacientes de
qualquer idade quando há os seguintes sintomas:
Também é recomendado para pessoas que, mesmo não
fumantes, apresentem os principais sintomas da doença, como:
APRESENTA
Política de rastreamento aliada à celeridade no início dos cuidados adequados
pode reduzir taxas de mortalidade e trazer mais qualidade de vida às pessoas
Diagnósticoemestágioinicialécrucialpara
pacientescomcâncerdemamaedepulmão
U
ma em cada cinco pesso-
asterácâncerduranteavi-
da1
.Notopodalistadetipos
maisfrequentes,nomundotodo3
e
também no Brasil1
, estão o câncer
de mama e o de pulmão, que tam-
bémtêmaltastaxasdeletalidade1,3
.
Nos dois casos, porém, as chances
decontroleecuraaumentammui-
toquandoadoençaédetectadaem
estágio inicial.
Os exames de rastreamento,
comoamamografiaeatomografia
detóraxdebaixadosagem,servem
parafazerumdiagnósticoprecoce,
mesmo em pessoas com os fato-
res de risco e que não apresentam
sintomas. “Quando a doença é de-
tectada de forma microscópica, as
chances de cura são maiores e há
possibilidade de tratamentos me-
nos invasivos”, esclarece a oncolo-
gistaDanieleAssad, dohospital Sí-
rio Libanês de Brasília.
Foi graças a esse rastreamento
sistemático que a jornalista Rejane
Monteiro, de 45 anos, foi diagnos-
ticada quando o câncer de mama
ainda estava em fase inicial. “Tive
umnódulonamamaaos24anos,fiz
umacirurgia,maserasóumnódulo
degordura.Naépoca,amastologista
recomendoumamografiaeultras-
som todos os anos, porque minha
avó teve câncer de mama. Desde
então,façoosexamesanualmente.
Quando tinha 38, apareceram três
nódulos pequenos, mas com for-
matodiferente,pediramumabióp-
sia e recebi o diagnóstico.”
“Sempre penso que, se por al-
gum motivo, tivesse passado um
tempo sem fazer o exame, pode-
ria estar numa situação bem pior,
com o câncer maior ou já em me-
tástase”, afirma.
Rejane teve alta oncológica no
final de 2022. “Minha médica disse
que,apartirdeagora,ésóacompa-
nhamentoclínico.Étudooquevo-
cê querouvir.”
Foram cinco anos desde o tér-
mino do tratamento com quimio-
terapia, radioterapia, terapia alvo
e cirurgia de quadrantectomia, na
qualfoiretiradaapenasaparteon-
deestavamosnóduloseconservou
a maiorparte da mama.
Um saltotecnológico possibili-
tounovasopçõesterapêuticaspara
as mulheres com câncerde mama,
explicaaoncologista.Comosavan-
çosdamedicina,hojeépossívelco-
nhecerotipoesubtipodecadacân-
cer e, com o diagnóstico preciso, a
equipemédicaconseguetomarde-
cisões personalizadas sobre cirur-
gias e sinalizara melhorsequência
de terapias.
Paraocâncerdemama,issoin-
clui desde cuidados prévios à ci-
rurgia,quepossibilitamummelhor
prognóstico, até o resgate de pa-
cientes que poderiam evoluir para
adoençametastática,aumentando
aschancesdecura.Daíaimportân-
cia da mamografia anual para au-
mentaros casos diagnosticados da
M-BR-00011368
pediu atomografia”, recorda.
Foram seis meses de consul-
tascomváriosespecialistasatéque
ela, por conta própria, decidiu ir a
uma oncologista especializada em
pulmão.
Após ser internada por inter-
corrências em broncoscopias, ela
finalmente recebeu o diagnóstico.
Porcausadademorae detudo que
passou até ser diagnosticada, Iane
hojeatuaparaconscientizaraspes-
soas sobre a importância do diag-
nóstico precoce. “Falta um proto-
colo. Se eu me declaro fumante,
qualquer médico deveria pedir o
exame. Por exemplo, para as mu-
lheres, a partir de certa idade, tem
a mamografia, o homem tem exa-
medepróstata.Então,sevocêéfu-
mante,apartirde45,50anosdeve-
ria serpedido.”
Para o doutor William, as polí-
ticas brasileiras contra o tabagis-
mo foram fundamentais para uma
queda na taxa de mortalidade do
câncer de pulmão. “O Brasil é mo-
delo no mundo inteiro no controle
dotabagismopormeiodepolíticas
públicas. Mas outro ponto impor-
tanteéorastreamento.Secomeçar
afazerodiagnósticomaisprecoce,
provavelmente a gente vai melho-
rarainda mais.”
Ostratamentosparaocâncerde
pulmão também evoluíram muito
nos últimos anos. É o caso de Iane,
que descobriu o câncer já em me-
tástase e convive com a doença há
quase oito anos. “É como se eu ti-
vesse uma doença crônica. Tenho
câncer, mas nãovejo diferençaen-
tremimeumapessoacompressão
alta,porexemplo.”Muitacoisamu-
dou desde o início de sua jornada
comopacienteoncológica:elaparou
defumar,fazatividadefísica,parti-
cipa de pesquisas e de projetos de
voluntariado,entreeles,noInstituto
Oncoguia,organizaçãonão-gover-
namentalvoltadaparaapromoção
deinformaçãoedefesadosdireitos
do paciente com câncer.
Para Luciana Holtz, fundadora
epresidentedoInstitutoOncoguia,
odiagnósticoprecoceéfundamen-
talparagarantirmaisqualidadede
vidaaospacientes.“Avidadaspes-
soassempreéimpactadapelodiag-
nósticodeumcâncer.Comoelavai
viver durante a fase de tratamen-
to da doença, quais os efeitos cola-
terais esperados dos tratamentos.
Existemmudançasfísicas,emocio-
nais e até sociais que precisam ser
administradas. Tudo isso importa
e precisa serlevado em considera-
ção nessa fase.”
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iris/handle/10665/330745 8.NationalLungScreeningTrial
ResearchTeam,AberleDR,AdamsAMetal.Reducedlun-
g-cancermortalitywithlow-dosecomputedtomographic
screening.NEnglJMed.2011;365(5):395-409
doença enquanto é potencialmen-
te curável.
“Otratamentoevoluiusobrema-
neira. Temos mecanismos novos e
tratamos o câncer de mama base-
ado em subtipos moleculares, não
é mais amesmafórmulaparatodos
os casos. Otratamento é personali-
zado”, afirma a oncologista.
Segundoaespecialista,odesafio
agoraébuscar,cadavezmais,diag-
nósticos precoces. No ano passado,
52% dos casos de câncer de mama
noBrasilforamdescobertosemes-
tágiolocalmenteavançadoemetas-
tático (III e IV)5
, quando as chances
decurasãomenores.Comapande-
miade Covid-19,menos mamogra-
fias foram realizadas e aumentou
onúmerodediagnósticostardios.
Além do desafio para a pa-
ciente, há um grande impac-
to econômico, tendo em vista
que os atendimentos dos ca-
sos de câncer mais avançados
sãomaisprolongadosecusto-
sos ao sistema de saúde7
.
Em relação ao câncer de
pulmão, o que mais mata no
mundo, os índices são ainda pio-
res: 90% dos casos diagnosticados
no país, em 2022, jáestavam em es-
tágios avançados (III e IV)6
.
“Já há três estudos mostrando
que o rastreamento do câncer de
pulmão em fumantes di-
minui a mortalidade.
Realizar tomogra-
fianessaspessoas
é uma forma de
pegar essa do-
ença em está-
gio mais precoce, o que leva a uma
maior sobrevida e até a chance de
cura”,afirmaomédicoWilliamNas-
sibWilliam Jr. , coordenador do co-
mitêdetumorestorácicosdaSocie-
dadeBrasileiradeOncologiaClínica
eprofessoradjuntoassociadodoMD
Anderson Cancer Center, nos EUA.
Em um dos estudos, houve maior
detecçãodadoençaemestágiosini-
ciais, resultando em diminuição de
até 20% do risco relativo de morte
porcâncerde pulmão8
.
Omédicolamentaque,apesarde
osdadosdessaspesquisasseremco-
nhecidoshámaisdedezanos,pouco
sefalasobreorastreamentodocân-
cer de pulmão. “Precisamos cons-
cientizar pacientes e médicos”,
alerta. Ele explica que,hoje, a re-
comendaçãoépediratomografia
de tórax de baixa dosagem pa-
rapacientesde50a80anosque
fumam o equivalente a 20 ma-
ços/ano.“Éumamultiplicação:
onúmerodemaçospordiave-
zes o número de anos. Alguém
quefumouummaçopordiapor
20anosoudoismaçospor10anos,
porexemplo,devefazer”.Esseexa-
me deve serrepetido anualmente.
O caso da aposentada baiana
Iane Cardim, de 54 anos, ilustra a
necessidade de conscientizar pa-
cientes e médicos. Antes de rece-
berodiagnósticodecâncerde
pulmão,elapassoupor14
profissionaisdesaúde.
“Mesmo eu me de-
clarando ser uma
grande fuman-
te,ninguémme