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Quim. Nova, Vol. 31, No. 4, 921-923, 2008

A LINGUAGEM QUÍMICA E O ENSINO DA QUÍMICA ORGÂNICA#




                                                                                                                                                        Educação
Nídia Franca Roque* e José Luis P. B. Silva
Instituto de Química, Universidade Federal da Bahia, Campus Universitário de Ondina, 40170-115 Salvador - BA, Brasil

Recebido em 14/1/08; aceito em 4/3/08; publicado na web em 9/4/08




            CHEMICAL LANGUAGE AND ORGANIC CHEMISTRY TEACHING. The importance of chemical language and specifically of
            molecular models and their representations in the development of chemistry is discussed. Structural formulas are projections of molecular
            models used as a specific language by chemists. The meaningful learning of chemistry requires knowledge of this language. The use
            of these analogical symbols without the necessary understanding engenders difficulties for the learning of chemistry.

            Keywords: molecular models; chemical language; chemistry teaching.




INTRODUÇÃO                                                                         tenha sobrevivido cerca de 2.000 anos ela e muitas outras não con-
                                                                                   seguiram explicar racionalmente os fenômenos químicos.
     Helena Maria C. Ferraz tornou-se conhecida como pesquisa-                          A teoria atômica empregada, hoje, para explicar os fenômenos
dora na área de síntese orgânica e foi também uma professora muito                 químicos, embora tenha tido suas raízes ainda na Grécia antiga,
querida por seus alunos. Com ela dividi (N. F. Roque) algumas                      com as idéias de Leucipo e Demócrito (460 a.C.- 370 a.C.), e
vezes disciplinas de química orgânica para alunos de graduação e,                  permeado as várias civilizações até a Idade Moderna, só começou
embora tivéssemos algumas divergências na abordagem dos con-                       a ter sucesso há cerca de 200 anos atrás com as argumentações de
teúdos, em um aspecto concordávamos cem por cento: a necessi-                      Dalton2 (1766-1844).
dade da compreensão da linguagem química. Esta é uma homena-                            Uma grande dificuldade para o entendimento dos fenômenos
gem que prestamos à Professora Helena Ferraz.                                      químicos está em se conhecer a constituição das substâncias que
     Em seu livro “O que é ciência afinal”, Chalmers1 discute a                    formam os organismos vivos e os objetos. O mundo material em
dificuldade em se definir ciência e, conhecimento científico. Con-                 que vivemos é percebido pelos animais através dos seus sentidos.
siderando que um conjunto de conhecimentos, sobre um dado as-                      Essa percepção é, no entanto, limitada, e foi superada com a des-
sunto, adquiridos através de estudos teóricos e/ou experimentais é                 crição das substâncias em termos atômicos. O átomo veio funda-
um conhecimento científico, o químico trilhou um caminho pró-                      mentar teoricamente a experiência dos sentidos, possibilitando uma
prio entre as ciências enfrentando a dificuldade de interpretação e                descrição mais ampla e profunda do mundo material, justificando
descrição dos fenômenos de transformação da matéria, o que le-                     sua enorme diversidade. Hoje, aceitamos a matéria como constitu-
vou à criação de uma linguagem química. As transformações ma-                      ída por substâncias que por sua vez são compostas por átomos, que
teriais — reações químicas — fazem parte dos processos naturais,                   se ligam formando moléculas ou íons. Átomos isolados só existem
fazendo parte do dia-a-dia do ser humano desde tempos imemoriais.                  em alguns gases, conhecidos como gases nobres. Outros átomos se
Um dos fenômenos químicos mais comuns é a transformação do                         unem de uma forma diferente formando os metais. Por serem par-
dióxido de carbono (CO2) e da água (H2O) presentes na atmosfera                    tículas muito pequenas, as porções de matéria que percebemos
em folhas, galhos, raízes, frutos e flores, em suma, no corpo dos                  correspondem a aglomerados de quintilhões, ou mais, de átomos.
vegetais. A combustão é uma outra transformação da matéria tam-                         Átomos e moléculas têm estruturas reais que, no entanto, não
bém muito comum. Entre as reações de combustão estão as quei-                      podem ser percebidas através dos sentidos. Como estudar o imper-
mas da lenha, do carvão, de combustíveis de carros, de ônibus, de                  ceptível? A correlação entre o comportamento dessas minúsculas
caminhões e de gás de cozinha. A corrosão de metais, como a do                     partículas, que fazem parte do microcosmo, e as propriedades das
ferro produzindo a ferrugem é, também, uma transformação facil-                    substâncias pertencentes ao sistema macroscópico foi e continua
mente observável. Essas últimas são transformações da matéria                      sendo um grande desafio da ciência química e, conseqüentemente,
inanimada ao reagirem com o oxigênio presente na atmosfera.                        do ensino de Química. Como vencê-lo?
     Então, por que somente há duzentos anos surgiu uma teoria                          Para estabelecer essa correlação o homem precisou criar uma
que explica e descreve, satisfatoriamente, os fenômenos quími-                     linguagem para discutir o microcosmo, ou seja, os átomos, íons e
cos?                                                                               moléculas.3 E toda linguagem, já nos ensinou Vigotski, desenvol-
     Várias teorias para explicar a formação e a transformação da                  ve-se na mesma medida que as estruturas do pensamento evoluem
matéria foram sugeridas, no transcorrer das civilizações. A mais                   do concreto para o abstrato e vice-versa.4 A linguagem da Química
duradoura, defendida pelo filósofo grego Aristóteles (384 a.C.-322                 descreve através de modelos, representados por fórmulas estrutu-
a.C.), proposta por Empédocles (490 a.C.-430 a.C.) admitia que                     rais, equações, gráficos e figuras, as coisas do mundo como com-
todos os objetos e seres seriam compostos por proporções diferen-                  preendidas pelo químico. As Ciências Naturais, e a Química, em
tes de quatro elementos: terra, ar, água e fogo.2 Embora essa teoria               particular, fazem extensivo uso de modelos, ou seja, representa-
                                                                                   ções simplificadas ou idealizadas de um mundo real.5 Para estudar
#
  Artigo em homenagem à Profa. Dra. Helena M. C. Ferraz                            e entender a ciência química é necessário em primeiro lugar apren-
*e-mail: nifroque@ufba.br                                                          der essa linguagem. As dificuldades de aprendizagem da lingua-
922                                                             Roque e Silva                                                      Quim. Nova

gem da química estão associadas à distinção em relação à lingua-         os modelos moleculares eram rígidos e representados em duas di-
gem comum,6 à sua especificidade quase hermética7 e, muito pro-          mensões. O desafio da terceira dimensão das moléculas só surge
vavelmente, às dificuldades em se estabelecer as necessárias rela-       após a descoberta de Pasteur do desvio do plano da luz polarizada
ções entre os entes químicos do mundo microscópico e do macros-          provocado pelos ácidos tartáricos, aliada à forma tetraédrica pro-
cópico.                                                                  posta para o átomo de carbono por van’t Hoff e Le Bell. A partir
                                                                         daí tornou-se necessário imaginar e representar as moléculas em
Contribuições da química orgânica para a linguagem química               três dimensões. Tarefa difícil que exigiu a elaboração de modelos
                                                                         moleculares, que passaram a ser construídos, não apenas com bo-
     A idéia do átomo como uma partícula indivisível permaneceu          las e varetas, mas também com bolas e molas. Hoje, modelos vir-
até o início do século XX, quando as evidências da existência de         tuais somam-se aos demais, constituindo uma nova ferramenta no
partículas com cargas na sua constituição foram detectadas. A par-       estudo da química.
tir dessas evidências vários modelos para a configuração do átomo             A analogia entre os modelos e as estruturas moleculares facilita
foram propostos até chegarmos no modelo atualmente aceito. Por           o estudo da constituição, da configuração (estrutura tridimensional)
incrível que pareça, as fórmulas estruturais e modelos moleculares       e das diferentes conformações, formas que uma molécula pode as-
surgiram antes mesmo das concepções dos modelos atômicos. Acei-          sumir. Surge então um novo problema. Como representar esses mo-
ta a idéia da constituição atômica da matéria, era fundamental co-       delos no papel?
nhecer como os átomos se uniam constituindo as moléculas.                     Há casos, em que a representação da estrutura tridimensional
     Por volta de 1850 a química orgânica tornava-se uma especia-        da molécula é fundamental. Por exemplo, as estruturas dos
lidade dentro da química. A falta de homogeneidade dos pesos atô-        carboidratos diferem apenas na distribuição espacial de átomos
micos, dos nomes e das fórmulas moleculares, além do grande              idênticos ligados a um mesmo carbono, ou seja, apenas na confi-
número de isômeros observados para os compostos orgânicos, tor-          guração de carbonos assimétricos. Foi Emil Fischer quem estabe-
nava a comunicação dos trabalhos na área bastante difícil e, com         leceu a primeira maneira de representar a configuração dos
isto, o seu desenvolvimento era prejudicado.                             carboidratos. A representação possui uma série de pré-requisitos: a
     Em 1860 era urgentemente necessária uma homogeneidade na            molécula deve estar na conformação eclipsada, com a cadeia
linguagem da química orgânica. Couper havia tido a excelente idéia       carbônica principal dirigida para baixo e o observador visualizando
de representar as ligações por traços ou pontos e Kekulé, Loschmidt,     o modelo pela parte de cima, onde se encontram os átomos ligados
Gerhardt, Kolbe, entre outros químicos, haviam tentado estabele-         aos carbonos da cadeia. Nesta representação, cadeia carbônica é
cer fórmulas gráficas que representassem os compostos orgânicos.8        representada por um traço vertical e as hidroxilas por traços hori-
Estas eram, no entanto, ou ambíguas ou muito complexas para se-          zontais, uma representação simples porém que dá total informação
rem usadas e, desta forma, não foram aceitas. Nesta época, o ácido       a respeito da estrutura molecular. Hoje, na projeção de Fischer os
acético, por exemplo, tinha dezenove diferentes representações,          pré-requisitos são mantidos, porem os átomos ligados à cadeia prin-
inclusive com diferentes números de átomos de carbono, hidrogê-          cipal são discriminados, de maneira a ampliar o seu uso para ou-
nio e oxigênio.                                                          tras classes de compostos.
     A linguagem escrita e falada dos compostos orgânicos só co-              Várias outras projeções de modelos foram surgindo, ainda no
meçou a ser organizada após o Congresso de Karlsruhe (1860).9            século XIX;10 uso do hexágono e do pentágono para o cicloexano e
Durante o Congresso não houve consenso na maneira de represen-           o ciclopentano, respectivamente, e para representar cadeias aber-
tar os compostos orgânicos. No entanto, um trabalho levado por           tas, linhas quebradas nas quais os átomos de carbono encontram-
Cannizzaro, sem repercussão durante o evento, foi distribuído para       se nos vértices, como as usadas hoje. No século XX algumas ou-
vários participantes que, após o lerem, aceitaram seus argumentos.       tras projeções de modelos moleculares foram propostas, como a de
Cannizzaro trazia de volta a hipótese de Avogadro, mostrando que         Natta para representar polímeros com grandes cadeias carbônicas
ela poderia ser útil na diferenciação entre os conceitos de átomos e     e a de Newman para o estudo de conformações e de interações
moléculas e uma defesa dos pesos atômicos do carbono como 12,            entre carbonos vizinhos.
do oxigênio como 16 e do hidrogênio como 1, sugeridos por Laurent             Cada uma dessas representações gráficas implica em uma pers-
e Gerhardt e apoiados por Kekulé.                                        pectiva de observação do modelo e contém uma série de requisitos
     A precisão da análise elementar, idealizada por Lavoisier e         necessários para que o leitor entenda a estrutura em questão. O
aperfeiçoada por Liebig e Dumas, a homogeneização dos pesos              modelo molecular propiciou uma maneira de se estudar e entender
atômicos e a determinação das fórmulas moleculares trouxeram             melhor a estrutura molecular invisível a nossos olhos, uma vez que
uma primeira coerência à linguagem e à representação dos com-            proporcionou uma forma de representá-las. Com o aprendizado
postos orgânicos. As estruturas moleculares começaram a ser re-          dessa forma de representação o químico não precisa mais ter o
presentadas por letras caracterizando os átomos e traços represen-       modelo concreto em suas mãos, ele consegue imaginá-lo a partir
tando as ligações. No caso das estruturas cíclicas, elas eram repre-     da fórmula estrutural desenhada.
sentadas por desenhos de poliedros como a do benzeno, proposta                Os modelos moleculares e suas representações são de extrema
por Kekulé.                                                              importância, não só na química, como na bioquímica, no estudo de
                                                                         macromoléculas naturais como as proteínas. Eles constituem uma
Modelos moleculares                                                      linguagem específica dos químicos.

     Ainda em 1865 A. W. Hoffmann apresentou, em uma confe-              CONSIDERAÇÕES FINAIS
rência, modelos moleculares confeccionados com bolas e varas de
madeira,8 salientando a importância do conhecimento da estrutura             Pelo exposto, fica clara a impossibilidade de estudar-se quími-
molecular.                                                               ca orgânica sem compreender o significado das várias representa-
     Naquele momento, o grande desafio era a determinação da cons-       ções moleculares. Significados esses que nem sempre são apresen-
tituição da molécula, ou seja, a determinação do número de áto-          tados aos alunos e discutidos em sala de aula, durante os cursos de
mos dos elementos presentes e a conectividade entre eles. Assim,         química orgânica no ensino superior. Às vezes, os modelos são
Vol. 31, No. 4                               A linguagem química e o ensino da química orgânica                                                     923

considerados assunto sabido; outras vezes, são simplesmente ig-             Em função do exposto, clara está a necessidade de investiga-
norados, prejudicando o aprendizado significativo do aluno.             ções em ensino de química orgânica para o grande público e para
    Situação muito mais grave é a que se apresenta no ensino mé-        os futuros químicos, especificamente, das representações das es-
dio quando essas representações estruturais simbólicas são apre-        truturas químicas, em função da importância da química na com-
sentadas sem nenhuma explicação. O aluno associa a molécula do          preensão do mundo contemporâneo e da participação nas decisões
benzeno, por exemplo, a um hexágono com uma bolinha dentro.             públicas.11
Esta situação torna o estudo da química orgânica uma memorização            A Profa. Helena, com o entusiasmo que lhe era peculiar, certa-
de nomes e símbolos que, sem os devidos esclarecimentos, nada           mente aceitaria o desafio de participar de um estudo dessa natureza.
têm a ver com a realidade microscópica que eles representam. Da
linguagem da química, aprende-se, quando muito, apenas os no-           REFERÊNCIAS
mes das coisas, sem maior significado.
    Como acabamos de discutir, a aprendizagem da química se               1. Chalmers, A. F.; O que é ciência afinal, Editora Brasiliense: São Paulo,
caracteriza pela apropriação de uma linguagem específica e apro-             2000.
                                                                          2. Maar, J. H.; Pequena história da química, Papa-livros: Florianópolis, 1999,
priada para a descrição dos fenômenos materiais. Precisamos, no              cap. 2.
entanto, facilitar o aprendizado inicial da mesma se quisermos que        3. Hoffmann, R.; Laszlo, P.; Angew. Chem., Int. Ed. 1991, 30, 1; Laszlo, P.;
os alunos se envolvam com o estudo, condição essencial para o seu            A Palavra das Coisas ou A Linguagem da Química, Gradiva: Lisboa, 1995.
sucesso. Para isto temos que elaborar estratégias de ensino apro-         4. Vigotski, L. S.; A Construção do Pensamento e da Linguagem, Martins
                                                                             Fontes: São Paulo, 2001.
priadas aos estudantes, estabelecendo relações entre os materiais
                                                                          5. Del Re, G.; Hyle, Int. J. Phil. Chem. 2000, 6, 5.
macroscópicos e suas representações microscópicas, discutindo os          6. Mortimer, E. F. Em Ciência, ética e cultura na educação; Chassot, A.;
modelos químicos em detalhe, ajudando-os a apropriar-se das pa-              Oliveira, R. J., orgs.;. Ed. Unisinos: São Leopoldo, 1998, cap. 4.
lavras da química.                                                        7. Chassot, A.; Alfabetização Científica: questões e desafio para a educação,
    Alguns livros mais modernos abordam a química, indo do con-              Ed. Unijuí: Ijuí, 2003, cap. 5.
                                                                          8. Ihde, A. J.; The development of the modern chemistry, Dover: New York,
texto para o conceito a ser ensinado, mostrando a importância do             1984, cap. 12.
conhecimento químico a ser adquirido, o que é uma forma de en-            9. Oki, M. C. M.; Química Nova na Escola 2007, no. 26, 24.
volver o aluno. Porém, mesmo esses livros, quando tratam da quí-         10. Mayo. P.; Mono and sesquiterpenoids, Interscience: New York, 1956.
mica orgânica, ainda cometem o deslize de apresentá-la de uma            11. Santos, W. L. P.; Schnetzler, R. P.; Educação em química: compromisso
                                                                             com a cidadania. Ed. Unijuí: Ijuí,1997.
forma pouco significativa, sobretudo na questão da representação
molecular.

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  • 1. Quim. Nova, Vol. 31, No. 4, 921-923, 2008 A LINGUAGEM QUÍMICA E O ENSINO DA QUÍMICA ORGÂNICA# Educação Nídia Franca Roque* e José Luis P. B. Silva Instituto de Química, Universidade Federal da Bahia, Campus Universitário de Ondina, 40170-115 Salvador - BA, Brasil Recebido em 14/1/08; aceito em 4/3/08; publicado na web em 9/4/08 CHEMICAL LANGUAGE AND ORGANIC CHEMISTRY TEACHING. The importance of chemical language and specifically of molecular models and their representations in the development of chemistry is discussed. Structural formulas are projections of molecular models used as a specific language by chemists. The meaningful learning of chemistry requires knowledge of this language. The use of these analogical symbols without the necessary understanding engenders difficulties for the learning of chemistry. Keywords: molecular models; chemical language; chemistry teaching. INTRODUÇÃO tenha sobrevivido cerca de 2.000 anos ela e muitas outras não con- seguiram explicar racionalmente os fenômenos químicos. Helena Maria C. Ferraz tornou-se conhecida como pesquisa- A teoria atômica empregada, hoje, para explicar os fenômenos dora na área de síntese orgânica e foi também uma professora muito químicos, embora tenha tido suas raízes ainda na Grécia antiga, querida por seus alunos. Com ela dividi (N. F. Roque) algumas com as idéias de Leucipo e Demócrito (460 a.C.- 370 a.C.), e vezes disciplinas de química orgânica para alunos de graduação e, permeado as várias civilizações até a Idade Moderna, só começou embora tivéssemos algumas divergências na abordagem dos con- a ter sucesso há cerca de 200 anos atrás com as argumentações de teúdos, em um aspecto concordávamos cem por cento: a necessi- Dalton2 (1766-1844). dade da compreensão da linguagem química. Esta é uma homena- Uma grande dificuldade para o entendimento dos fenômenos gem que prestamos à Professora Helena Ferraz. químicos está em se conhecer a constituição das substâncias que Em seu livro “O que é ciência afinal”, Chalmers1 discute a formam os organismos vivos e os objetos. O mundo material em dificuldade em se definir ciência e, conhecimento científico. Con- que vivemos é percebido pelos animais através dos seus sentidos. siderando que um conjunto de conhecimentos, sobre um dado as- Essa percepção é, no entanto, limitada, e foi superada com a des- sunto, adquiridos através de estudos teóricos e/ou experimentais é crição das substâncias em termos atômicos. O átomo veio funda- um conhecimento científico, o químico trilhou um caminho pró- mentar teoricamente a experiência dos sentidos, possibilitando uma prio entre as ciências enfrentando a dificuldade de interpretação e descrição mais ampla e profunda do mundo material, justificando descrição dos fenômenos de transformação da matéria, o que le- sua enorme diversidade. Hoje, aceitamos a matéria como constitu- vou à criação de uma linguagem química. As transformações ma- ída por substâncias que por sua vez são compostas por átomos, que teriais — reações químicas — fazem parte dos processos naturais, se ligam formando moléculas ou íons. Átomos isolados só existem fazendo parte do dia-a-dia do ser humano desde tempos imemoriais. em alguns gases, conhecidos como gases nobres. Outros átomos se Um dos fenômenos químicos mais comuns é a transformação do unem de uma forma diferente formando os metais. Por serem par- dióxido de carbono (CO2) e da água (H2O) presentes na atmosfera tículas muito pequenas, as porções de matéria que percebemos em folhas, galhos, raízes, frutos e flores, em suma, no corpo dos correspondem a aglomerados de quintilhões, ou mais, de átomos. vegetais. A combustão é uma outra transformação da matéria tam- Átomos e moléculas têm estruturas reais que, no entanto, não bém muito comum. Entre as reações de combustão estão as quei- podem ser percebidas através dos sentidos. Como estudar o imper- mas da lenha, do carvão, de combustíveis de carros, de ônibus, de ceptível? A correlação entre o comportamento dessas minúsculas caminhões e de gás de cozinha. A corrosão de metais, como a do partículas, que fazem parte do microcosmo, e as propriedades das ferro produzindo a ferrugem é, também, uma transformação facil- substâncias pertencentes ao sistema macroscópico foi e continua mente observável. Essas últimas são transformações da matéria sendo um grande desafio da ciência química e, conseqüentemente, inanimada ao reagirem com o oxigênio presente na atmosfera. do ensino de Química. Como vencê-lo? Então, por que somente há duzentos anos surgiu uma teoria Para estabelecer essa correlação o homem precisou criar uma que explica e descreve, satisfatoriamente, os fenômenos quími- linguagem para discutir o microcosmo, ou seja, os átomos, íons e cos? moléculas.3 E toda linguagem, já nos ensinou Vigotski, desenvol- Várias teorias para explicar a formação e a transformação da ve-se na mesma medida que as estruturas do pensamento evoluem matéria foram sugeridas, no transcorrer das civilizações. A mais do concreto para o abstrato e vice-versa.4 A linguagem da Química duradoura, defendida pelo filósofo grego Aristóteles (384 a.C.-322 descreve através de modelos, representados por fórmulas estrutu- a.C.), proposta por Empédocles (490 a.C.-430 a.C.) admitia que rais, equações, gráficos e figuras, as coisas do mundo como com- todos os objetos e seres seriam compostos por proporções diferen- preendidas pelo químico. As Ciências Naturais, e a Química, em tes de quatro elementos: terra, ar, água e fogo.2 Embora essa teoria particular, fazem extensivo uso de modelos, ou seja, representa- ções simplificadas ou idealizadas de um mundo real.5 Para estudar # Artigo em homenagem à Profa. Dra. Helena M. C. Ferraz e entender a ciência química é necessário em primeiro lugar apren- *e-mail: nifroque@ufba.br der essa linguagem. As dificuldades de aprendizagem da lingua-
  • 2. 922 Roque e Silva Quim. Nova gem da química estão associadas à distinção em relação à lingua- os modelos moleculares eram rígidos e representados em duas di- gem comum,6 à sua especificidade quase hermética7 e, muito pro- mensões. O desafio da terceira dimensão das moléculas só surge vavelmente, às dificuldades em se estabelecer as necessárias rela- após a descoberta de Pasteur do desvio do plano da luz polarizada ções entre os entes químicos do mundo microscópico e do macros- provocado pelos ácidos tartáricos, aliada à forma tetraédrica pro- cópico. posta para o átomo de carbono por van’t Hoff e Le Bell. A partir daí tornou-se necessário imaginar e representar as moléculas em Contribuições da química orgânica para a linguagem química três dimensões. Tarefa difícil que exigiu a elaboração de modelos moleculares, que passaram a ser construídos, não apenas com bo- A idéia do átomo como uma partícula indivisível permaneceu las e varetas, mas também com bolas e molas. Hoje, modelos vir- até o início do século XX, quando as evidências da existência de tuais somam-se aos demais, constituindo uma nova ferramenta no partículas com cargas na sua constituição foram detectadas. A par- estudo da química. tir dessas evidências vários modelos para a configuração do átomo A analogia entre os modelos e as estruturas moleculares facilita foram propostos até chegarmos no modelo atualmente aceito. Por o estudo da constituição, da configuração (estrutura tridimensional) incrível que pareça, as fórmulas estruturais e modelos moleculares e das diferentes conformações, formas que uma molécula pode as- surgiram antes mesmo das concepções dos modelos atômicos. Acei- sumir. Surge então um novo problema. Como representar esses mo- ta a idéia da constituição atômica da matéria, era fundamental co- delos no papel? nhecer como os átomos se uniam constituindo as moléculas. Há casos, em que a representação da estrutura tridimensional Por volta de 1850 a química orgânica tornava-se uma especia- da molécula é fundamental. Por exemplo, as estruturas dos lidade dentro da química. A falta de homogeneidade dos pesos atô- carboidratos diferem apenas na distribuição espacial de átomos micos, dos nomes e das fórmulas moleculares, além do grande idênticos ligados a um mesmo carbono, ou seja, apenas na confi- número de isômeros observados para os compostos orgânicos, tor- guração de carbonos assimétricos. Foi Emil Fischer quem estabe- nava a comunicação dos trabalhos na área bastante difícil e, com leceu a primeira maneira de representar a configuração dos isto, o seu desenvolvimento era prejudicado. carboidratos. A representação possui uma série de pré-requisitos: a Em 1860 era urgentemente necessária uma homogeneidade na molécula deve estar na conformação eclipsada, com a cadeia linguagem da química orgânica. Couper havia tido a excelente idéia carbônica principal dirigida para baixo e o observador visualizando de representar as ligações por traços ou pontos e Kekulé, Loschmidt, o modelo pela parte de cima, onde se encontram os átomos ligados Gerhardt, Kolbe, entre outros químicos, haviam tentado estabele- aos carbonos da cadeia. Nesta representação, cadeia carbônica é cer fórmulas gráficas que representassem os compostos orgânicos.8 representada por um traço vertical e as hidroxilas por traços hori- Estas eram, no entanto, ou ambíguas ou muito complexas para se- zontais, uma representação simples porém que dá total informação rem usadas e, desta forma, não foram aceitas. Nesta época, o ácido a respeito da estrutura molecular. Hoje, na projeção de Fischer os acético, por exemplo, tinha dezenove diferentes representações, pré-requisitos são mantidos, porem os átomos ligados à cadeia prin- inclusive com diferentes números de átomos de carbono, hidrogê- cipal são discriminados, de maneira a ampliar o seu uso para ou- nio e oxigênio. tras classes de compostos. A linguagem escrita e falada dos compostos orgânicos só co- Várias outras projeções de modelos foram surgindo, ainda no meçou a ser organizada após o Congresso de Karlsruhe (1860).9 século XIX;10 uso do hexágono e do pentágono para o cicloexano e Durante o Congresso não houve consenso na maneira de represen- o ciclopentano, respectivamente, e para representar cadeias aber- tar os compostos orgânicos. No entanto, um trabalho levado por tas, linhas quebradas nas quais os átomos de carbono encontram- Cannizzaro, sem repercussão durante o evento, foi distribuído para se nos vértices, como as usadas hoje. No século XX algumas ou- vários participantes que, após o lerem, aceitaram seus argumentos. tras projeções de modelos moleculares foram propostas, como a de Cannizzaro trazia de volta a hipótese de Avogadro, mostrando que Natta para representar polímeros com grandes cadeias carbônicas ela poderia ser útil na diferenciação entre os conceitos de átomos e e a de Newman para o estudo de conformações e de interações moléculas e uma defesa dos pesos atômicos do carbono como 12, entre carbonos vizinhos. do oxigênio como 16 e do hidrogênio como 1, sugeridos por Laurent Cada uma dessas representações gráficas implica em uma pers- e Gerhardt e apoiados por Kekulé. pectiva de observação do modelo e contém uma série de requisitos A precisão da análise elementar, idealizada por Lavoisier e necessários para que o leitor entenda a estrutura em questão. O aperfeiçoada por Liebig e Dumas, a homogeneização dos pesos modelo molecular propiciou uma maneira de se estudar e entender atômicos e a determinação das fórmulas moleculares trouxeram melhor a estrutura molecular invisível a nossos olhos, uma vez que uma primeira coerência à linguagem e à representação dos com- proporcionou uma forma de representá-las. Com o aprendizado postos orgânicos. As estruturas moleculares começaram a ser re- dessa forma de representação o químico não precisa mais ter o presentadas por letras caracterizando os átomos e traços represen- modelo concreto em suas mãos, ele consegue imaginá-lo a partir tando as ligações. No caso das estruturas cíclicas, elas eram repre- da fórmula estrutural desenhada. sentadas por desenhos de poliedros como a do benzeno, proposta Os modelos moleculares e suas representações são de extrema por Kekulé. importância, não só na química, como na bioquímica, no estudo de macromoléculas naturais como as proteínas. Eles constituem uma Modelos moleculares linguagem específica dos químicos. Ainda em 1865 A. W. Hoffmann apresentou, em uma confe- CONSIDERAÇÕES FINAIS rência, modelos moleculares confeccionados com bolas e varas de madeira,8 salientando a importância do conhecimento da estrutura Pelo exposto, fica clara a impossibilidade de estudar-se quími- molecular. ca orgânica sem compreender o significado das várias representa- Naquele momento, o grande desafio era a determinação da cons- ções moleculares. Significados esses que nem sempre são apresen- tituição da molécula, ou seja, a determinação do número de áto- tados aos alunos e discutidos em sala de aula, durante os cursos de mos dos elementos presentes e a conectividade entre eles. Assim, química orgânica no ensino superior. Às vezes, os modelos são
  • 3. Vol. 31, No. 4 A linguagem química e o ensino da química orgânica 923 considerados assunto sabido; outras vezes, são simplesmente ig- Em função do exposto, clara está a necessidade de investiga- norados, prejudicando o aprendizado significativo do aluno. ções em ensino de química orgânica para o grande público e para Situação muito mais grave é a que se apresenta no ensino mé- os futuros químicos, especificamente, das representações das es- dio quando essas representações estruturais simbólicas são apre- truturas químicas, em função da importância da química na com- sentadas sem nenhuma explicação. O aluno associa a molécula do preensão do mundo contemporâneo e da participação nas decisões benzeno, por exemplo, a um hexágono com uma bolinha dentro. públicas.11 Esta situação torna o estudo da química orgânica uma memorização A Profa. Helena, com o entusiasmo que lhe era peculiar, certa- de nomes e símbolos que, sem os devidos esclarecimentos, nada mente aceitaria o desafio de participar de um estudo dessa natureza. têm a ver com a realidade microscópica que eles representam. Da linguagem da química, aprende-se, quando muito, apenas os no- REFERÊNCIAS mes das coisas, sem maior significado. Como acabamos de discutir, a aprendizagem da química se 1. Chalmers, A. F.; O que é ciência afinal, Editora Brasiliense: São Paulo, caracteriza pela apropriação de uma linguagem específica e apro- 2000. 2. Maar, J. H.; Pequena história da química, Papa-livros: Florianópolis, 1999, priada para a descrição dos fenômenos materiais. Precisamos, no cap. 2. entanto, facilitar o aprendizado inicial da mesma se quisermos que 3. Hoffmann, R.; Laszlo, P.; Angew. Chem., Int. Ed. 1991, 30, 1; Laszlo, P.; os alunos se envolvam com o estudo, condição essencial para o seu A Palavra das Coisas ou A Linguagem da Química, Gradiva: Lisboa, 1995. sucesso. Para isto temos que elaborar estratégias de ensino apro- 4. Vigotski, L. S.; A Construção do Pensamento e da Linguagem, Martins Fontes: São Paulo, 2001. priadas aos estudantes, estabelecendo relações entre os materiais 5. Del Re, G.; Hyle, Int. J. Phil. Chem. 2000, 6, 5. macroscópicos e suas representações microscópicas, discutindo os 6. Mortimer, E. F. Em Ciência, ética e cultura na educação; Chassot, A.; modelos químicos em detalhe, ajudando-os a apropriar-se das pa- Oliveira, R. J., orgs.;. Ed. Unisinos: São Leopoldo, 1998, cap. 4. lavras da química. 7. Chassot, A.; Alfabetização Científica: questões e desafio para a educação, Alguns livros mais modernos abordam a química, indo do con- Ed. Unijuí: Ijuí, 2003, cap. 5. 8. Ihde, A. J.; The development of the modern chemistry, Dover: New York, texto para o conceito a ser ensinado, mostrando a importância do 1984, cap. 12. conhecimento químico a ser adquirido, o que é uma forma de en- 9. Oki, M. C. M.; Química Nova na Escola 2007, no. 26, 24. volver o aluno. Porém, mesmo esses livros, quando tratam da quí- 10. Mayo. P.; Mono and sesquiterpenoids, Interscience: New York, 1956. mica orgânica, ainda cometem o deslize de apresentá-la de uma 11. Santos, W. L. P.; Schnetzler, R. P.; Educação em química: compromisso com a cidadania. Ed. Unijuí: Ijuí,1997. forma pouco significativa, sobretudo na questão da representação molecular.