1. Archaea:
Pesquisa
Potencial Biotecnológico
Utilização e aplicação de arqueas na biotecnologia
Alexander Machado Cardoso
Departamento de Bioquímica Médica,
Instituto de Ciências Biomédicas, UFRJ. 1. Introdução Os benefícios científicos espera-
amcardoso@bioqmed.ufrj.br dos de um conhecimento maior da
O domínio Archaea é formado biologia das arqueas incluem, entre
Maysa B. Mandetta Clementino principalmente por organismos outros, a compreensão das funções
Departamento de Microbiologia, Instituto Nacional
de Controle de Qualidade em Saúde, FIOCRUZ. extremofílicos, isto é, microrganismos exercidas por esses organismos nos
maysa@incqs.fiocruz.br que não apenas toleram, mas crescem ambientes aquáticos e terrestres, bem
otimamente em ambientes normalmen- como suas interações com outros com-
Orlando Bonifácio Martins te considerados inóspitos para a vida, ponentes da biodiversidade. Os bene-
Departamento de Bioquímica Médica,
Instituto de Ciências Biomédicas, UFRJ.
como fontes termais, águas extrema- fícios econômicos e estratégicos estão
omartins@bioqmed.ufrj.br mente salgadas, temperaturas baixas e relacionados com a descoberta de mi-
condições extremas de pH. Pode-se crorganismos potencialmente explo-
Ricardo Pilz Vieira dizer que certas espécies de arqueas ráveis nos processos biotecnológicos
Departamento de Biologia Marinha, definem claramente os limites de tole- para obtenção de agentes terapêuti-
Instituto de Biologia, UFRJ.
pilz@bioqmed.ufrj.br rância biológica nos extremos físicos e cos, probióticos, produtos químicos,
químicos da vida. O estudo dos micror- enzimas e polímeros para aplicações
Rodrigo Volcan Almeida ganismos provenientes desses ambi- industriais e tecnológicas, biorremedi-
Programa de Engenharia Química, entes extremos pode nos fornecer in- ação e biolixiviação de poluentes e
COPPE, UFRJ.
volcan@peq.coppe.ufrj.br formações valiosas acerca da origem recuperação de minérios. Outros be-
da vida na Terra, bem como das estra- nefícios incluem a otimização da capa-
Sylvia M. Campbell Alqueres tégias adaptativas aos ambientes onde cidade microbiana para processamen-
Departamento de Bioquímica Médica, Instituto de esta prosperou (Woese, 1998). to de alimentos, tratamento e/ou
Ciências Biomédicas, UFRJ.
alqueres@bioqmed.ufrj.br
A adaptação de organismos a remediação de resíduos (esgoto do-
esses ambientes obrigou-os a desen- méstico e lixo). Embora ainda não
Welington Inácio de Almeida volver componentes celulares e estra- sejam totalmente conhecidas as estra-
Departamento de Bioquímica Médica, tégias bioquímicas para sua sobrevi- tégias moleculares para sua sobrevi-
Instituto de Ciências Biomédicas, UFRJ. vência. Por outro lado, devido às vência em tais ambientes inóspitos,
welington@bioqmed.ufrj.br
características “exóticas” que têm, e sabe-se que esses organismos possu-
Ilustrações cedidas pelos autores às suas propriedades únicas, esses em enzimas adaptadas a tais ambien-
microrganismos geram bioprodutos tes, e isso desperta o interesse tanto
que podem ser empregados em con- acadêmico quanto industrial.
dições drásticas, que freqüentemente
ocorrem em processos industriais. Os 2. Filogenia e Fisiologia
componentes moleculares deles reti-
rados possuem muitas vezes proprie- Há cerca de vinte anos, Carl
dades que os tornam especialmente Woese e colaboradores sugeriram
adequados para serem utilizados nes- que os organismos vivos fossem
ses processos. Nesse contexto, é hoje classificados em três grupos princi-
geralmente aceito que esses micror- pais: Archaea, Bacteria e Eukarya,
ganismos constituem um precioso com base no estudo das seqüências
repositório de moléculas de interesse das moléculas do gene 16S do RNA
industrial e um excelente recurso para ribossomal (16S rRNA). Esses gru-
o desenvolvimento de novas aplica- pos são chamados de domínios e
ções biotecnológicas. acredita-se que surgiram através de
Revista Biotecnologia Ciência e Desenvolvimento - Edição nº 30 - janeiro/junho 2003 71
2. Tab ela 1: Diferen ças fu n d amen tais en tre o s três d o mín io s.
C aracterísticas Bacteria A rch aea E u carya
Membrana nuclear Ausente Ausente Presente
Número de
1 1 >1
cromossomos
Celulose em plantas,
Pseudo-peptideoglicano,
Parede Celular Peptideoglicano quitina em fungos e
glicoproteínas e outros
nenhuma em animais
Mureína na parede
Sim Não Não
celular
Glicerídeos ligados a éster, Glicerídeos ligados a éster;
Lipídeos da membrana Isoprenóide; glicerol diéter
não ramificado; saturado não ramificado; poli-
celular ou di-glicerol tetraéter
ou mono-insaturado insaturado
Organelas (mitocôndria
Ausente Ausente Presente
e cloroplastos)
Ribossomo 70S 70S 80S
Síntese de proteínas
inibida por
Sim Não Não
cloranfenicol e
estreptomicina
Síntese de proteínas
inibida pela toxina da Não Sim Sim
difteria
vias evolutivas distintas a partir de são únicos de cada domínio, enquan- O hábitat das arqueas halofílicas
um ancestral comum. A noção de to outros são compartilhados entre extremas é hipersalino e as espécies
dicotomia da vida entre eucariontes dois ou até entre todos os três domí- em cultivo laboratorial requerem para
e procariontes, que ainda domina a nios, como pode ser observado na o crescimento, entre 1,5 a 4 M de
biologia e influencia, em particular, Tabela 1. NaCl, o que significa um ambiente
a percepção sobre o domínio com cerca de 10 vezes a salinidade
Archaea, está sendo lentamente re- 3. Ambientes extremos encontrada na água do mar. As
vista por grupos atuantes em metanogênicas são organismos obri-
microbiologia. A diversidade e a Os primeiros organismos identi- gatoriamente anaeróbios e liberam
biologia das arqueas representam ficados pertencentes ao domínio gás metano (CH4) como resíduo me-
uma enorme contribuição à compre- Archaea viviam em ambientes extre- tabólico. São encontradas em ambi-
ensão da Ecologia Microbiana mos de temperatura, salinidade ou entes com ausência de oxigênio e
(Woese et al., 1990). acidez, sugerindo que a preferência abundância de matéria orgânica,
O domínio Archaea consiste de por tais hábitats, era um traço carac- como pântanos, açudes, lagos, sedi-
três divisões: Crenarchaeota, que terístico do grupo. Estudos mais re- mentos marinhos e rúmen de bovi-
contém as arqueas hipertermofílicas centes mostraram várias eubactérias nos. Elas retiram hidrogênio e gás
redutoras de enxofre; Euryarchaeota, e organismos eucarióticos que sobre- carbônico desses ambientes e os uti-
que compreende uma grande diver- vivem também em ambientes extre- lizam em seu metabolismo. Vivem
sidade de organismos, incluídas as mos, como observaram igualmente a como simbiontes de uma grande va-
espécies metanogênicas, as halofílicas presença de arqueas em ambientes riedade de protozoários também
extremas e algumas espécies mais amenos, demonstrando, dessa anaeróbicos, convertendo produtos
hipertermofílicas; e Korarchaeota, forma, a contribuição desse grupo na finais de fermentação em gás metano.
uma divisão descrita mais recente- biomassa global (Forterre, 1997). En- São de grande importância ao ambi-
mente, que engloba organismos hi- tretanto, as arqueas parecem ser os ente em que vivem pela alta eficiên-
pertermofílicos pouco conhecidos, únicos organismos descobertos até o cia de sua enzima hidrogenase que,
identificados a partir de seqüências presente momento que podem so- mantendo uma baixa pressão parcial
do gene 16S do rRNA isolados de breviver a temperaturas acima de de H2 para que a metanogênese ocor-
fontes termais terrestres, porém ain- 95ºC, e o fenótipo hipertermofílico ra, permite que os demais organis-
da não cultivados em laboratório. só é encontrado nesse domínio da mos fermentadores façam reoxida-
Após serem divididos os três vida. Uma outra característica exclu- ção do NADH, o que corresponde a
grandes domínios a partir do seqüen- siva de Archaea é o metabolismo um maior rendimento de ATP e um
ciamento do 16S rRNA, estudos sub- metanogênico: não se conhecem aumento da biomassa (Brock et al.,
seqüentes mostraram que cada do- eubactérias nem eucariotos capazes 1994).
mínio está associado a uma série de de produzir metano como resíduo de As arqueas termoacidófilas com-
fenótipos. Alguns desses fenótipos seu metabolismo. põem um grupo heterogêneo, defini-
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3. Tab ela 2: E stratégias d e ad aptação d as arq u eas ao s amb ien tes extremo s.
A mb ien te P ro b lemas Mecan ismo s d e ad aptação
Mantém altas concentrações de K+ intracelularmente
Lise celular por diferença de
pressão osmótica A parede celular é composta por glicoproteínas que tem
Hipersalin o uma maior porcentagem de aminoácidos ácidos que
atraem os íons Na+ para o redor da célula. A ligação dos
íons com a parede celular estabiliza esta, impedindo a lise
Essas proteínas expõem aminoácidos de carga negativa,
Desnaturação das proteínas de maneira que, quando os íons positivos entram em
contato com a proteína, esta é estabilizada
Lise celular Maior rigidez da parede celular
Maior quantidade de histonas
Desnaturação do DNA
Maior empacotamento do DNA
A ltas temperatu ras
Aumento do número de pontes de hidrogênio
Desnaturação das proteínas Aumento das interações hidrofóbicas
Menor porcentagem de aminoácidos termolábeis
Menor quantidade de pontes de hidrogênio, dissulfeto e
Baixas temperatu ras Inativação das proteínas interações hidrofóbicas, o que aumenta a flexibilidade da
proteína
do pela capacidade dos organismos diversidade microbiana, a potencial
de crescerem em altas temperaturas faixa de processos para utilização de
que vão de 55ºC a 85oC, com pH que enzimas também se ampliou, princi-
varia de 1,0 até 6,0. O gênero Sulfolobus palmente porque as extremozimas
apresenta parede celular composta (enzimas provenientes de microrga-
principalmente por lipoproteína e nismos extremófilos) sendo natural-
carboidratos; oxidam H2S, mas o prin- mente estáveis em ambientes extre-
cípio para essa oxidação ainda não foi mos, vieram suprir a demanda industri-
esclarecido. Os principais substratos al, para a qual, de certa forma, sempre
de crescimento parecem ser fontes estiveram em desvantagem as enzimas
quentes e também solos quentes que Meios de Cultivo para Arqueas Termofílicas tradicionais. Um problema inerente às
contenham enxofre, e que, então, extremozimas é a dificuldade de pro-
oxidam tal elemento em ácido sulfú- A pesquisa envolvendo esses or- duzi-las utilizando microrganismos sel-
rico, responsável pela acidez desses ganismos tem sido intensificada nas vagens, já que estes, em geral, neces-
hábitats. O grupo dos termoplasmas é duas últimas décadas por duas razões sitam de condições especiais para se
caracterizado pela ausência de pare- principais: pelo conhecimento das con- reproduzirem, como ambientes
de celular e é encontrado em minas de dições sob as quais a vida pode existir anaeróbios estritos, altas temperatu-
carvão, com quantidades substanciais através do estudo de muitos hábitats ras, meios definidos, etc. Contudo esse
de sulfeto ferroso. nunca antes explorados e pelo atual problema pode ser contornado ex-
Uma das perguntas que mais reconhecimento do potencial biotec- pressando essas enzimas em outros
intrigam os pesquisadores é como nológico desses organismos, bem organismos de mais fácil manipulação,
esses incríveis organismos conse- como de seus produtos. já que existem vários exemplos em
guem viver em tais ambientes? Dei- que essas enzimas, quando expressas
xam constantemente uma interroga- 4. Aplicações em microrganismos heterólogos, man-
ção sobre qual será o limite para o Biotecnológicas têm suas características originais
desenvolvimento da vida. Embora (Eichler, 2001).
muitas dúvidas ainda pairem sobre A tecnologia enzimática experi- Dentre as enzimas de arqueas de
os mecanismos de adaptação a tais mentou um grande avanço quando as grande potencial para a aplicação
ambientes hostis, muitos fatores já enzimas microbianas passaram a ser biotecnológica, destacam-se as
são apontados como os responsá- utilizadas, principalmente por causa hipertermofílicas, psicrofílicas,
veis pela resistência desses organis- da grande variedade de reações que alcalofílicas, halofílicas e barofílicas.
mos. A Tabela 2 reúne os principais essas enzimas são capazes de catalisar. Entre as enzimas de arqueas
mecanismos de adaptação aos pro- Com o descobrimento dos microrga- que têm recebido maior atenção, estão
blemas causados pelos ambientes nismos extremofílicos (em sua maioria as termozimas, sendo que os princi-
extremos. arqueas), o que ampliou ainda mais a pais processos de potencial utilização
Revista Biotecnologia Ciência e Desenvolvimento - Edição nº 30 - janeiro/junho 2003 73
4. dessas enzimas são o beneficiamento vertido a sacarídeos de baixo peso ácidos (processo Sulfite) ou bases (pro-
do amido, a manufatura e o branquea- molecular e, posteriormente, em cesso Kraft) em altas temperaturas. Os
mento da polpa para produção de glicose, utilizando-se pululanase e processos de polpeamento, por envol-
papel e a bem estabelecida prática glicoamilase, e em maltose, utilizan- verem condições muito drásticas
laboratorial da reação em cadeia da do-se pululanase e β-amilase. (160ºC-190oC em concentrações eleva-
polimerase (PCR), entre outras. Nesse processo, potencialmente das de álcalis ou ácidos), são potenci-
poderiam ser feitas duas melhorias almente próprios para utilização de
4.1. Processamento do com a utilização de extremozimas: a enzimas extremofílicas. Embora as
Amido primeira seria a utilização de a-amilases celulases sejam bem distribuídas entre
hipertermofílicas com maior tempo os domínios Eukarya e Bacteria, so-
O amido é um dos polímeros mais de resistência, de forma que não se mente uma celulase de Archaea é
abundantes na natureza, estando pre- necessitasse gastar energia com o relatada, a endoglicanase de Pyrococcus
sente principalmente nos vegetais, onde resfriamento de 105ºC para 95oC, da furiosus, que é capaz de hidrolisar
ele é utilizado para o armazenamento gelatinização para a liquefação. A se- ligações b,1-4 com uma atividade óti-
de energia na forma de grânulos inso- gunda seria a em que o pH natural de ma ocorrendo em 100oC e pH 6,0
lúveis, compostos basicamente de soluções de amidos gelatinizados, que (Bauer e Kelly, 1998). Contudo, segun-
amilose e amilopectina, que são dife- é de, aproximadamente, 4,5 e que do Eichler (2001), várias arqueas termo
rentes polímeros de glicose. Além de força o ajuste para 5,8 na liquefação, e hipertermofílicas possuem enzimas
servir diretamente como alimento na e, posteriormente, redução para 4,2; β-glicosídicas.
dieta animal, o amido presente nos na sacarificação, de maneira que uma A polpa resultante de um dos
vegetais pode ser hidrolisado, gerando a-amilase apta a trabalhar em pHs processos acima é levada ao branque-
glicose, maltose e xarope de oligossa- mais baixos reduziria, em muito, os amento, que ocorrerá em menor ou
carídeos, que, por sua vez, são utiliza- custos do processo. maior grau dependendo da utilização
dos para produção de outros químicos A Tabela 3 mostra algumas do papel. Nesse processo, a quantida-
ou como substratos em fermentações enzimas isoladas de arqueas com gran- de remanescente de lignina do
(Bentley e Willians, 1996; Vieille e de potencial de aplicação na indústria polpeamento é retirada com a utiliza-
Zeikus, 2001). de processamento de amido. Embora ção, dependendo do processo, de:
De uma forma geral, o processo nenhuma dessas reúna todas as carac- cloro, dióxido de cloro, ozônio,
de hidrólise do amido envolve a terísticas necessárias apontadas aci- peróxido de hidrogênio e altas tempe-
liquefação e a sacarificação, as quais ma, elas indicam, no entanto, que raturas. A utilização desses agentes
ocorrem em altas temperaturas. Du- com técnicas de engenharia de prote- oxidantes acaba gerando uma quanti-
rante a liquefação, os grãos de amido ínas, esses catalisadores poderiam ser dade muito grande de poluentes, e,
são gelatinizados em soluções aquo- aperfeiçoados. por isso, vem sofrendo sanções das
sas entre 105ºC e 110°C, num pH agências ambientais. Uma das alterna-
entre 5,8 a 6,5 , quando então, são 4.2. Manufatura do Papel tivas pesquisadas para reduzir esses
utilizadas a-amilases termoestáveis a compostos, principalmente os deriva-
95°C, que hidrolisam parcialmente O processo de manufatura do dos de cloro, é a utilização de enzimas.
as ligações a-1,4. Nesse processo, o papel envolve, de uma maneira geral, Entre as enzimas pesquisadas, as xila-
controle de temperatura e pH é mui- dois estágios: o polpeamento e o bran- nases, segundo Tolan (1996), são as
to importante pois, se a temperatura queamento. O polpeamento é o está- que possuem uma boa aceitação in-
estiver abaixo de 105°C, a gelatiniza- gio no qual a estrutura macroscópica dustrial e têm sido utilizadas em indús-
ção ocorre parcialmente, e se aumen- da fibra da madeira é quebrada, remo- trias onde está havendo um decrésci-
tar muito, há a inativação das a- vendo-se dela a lignina, gerando daí mo na utilização dos oxidantes, da
amilases; se o pH estiver mais ácido uma fibra mais maleável e com carac- ordem de 10% a 15%. Ainda segundo
que 5,5 também ocorre a inativação terísticas próprias para a produção do esse autor, as características ótimas
dessas enzimas, mas, se vai acima de papel (Tolan, 1996; Vieille e Zeikus, para uma xilanase seriam sua ação em
6,5 são gerados muitos subprodutos. 2001). Esse processo é conduzido me- temperaturas por volta de 70°C e pH
Após a liquefação, o produto é con- cânica ou quimicamente por adição de entre 10-12, o que abre uma excelente
Tabela 3. Enzimas com potencial de aplicação na indústria de processamento do amido.
Enzima Origem Temperatura pH Referência
Pyrococcus furiosus 100°C 5,5-6,0 Dong et al., 1997
-amilase Pyrococcus woesei 100°C 5,5 Koch et al., 1997
Pyrodictium abyssi 100°C 5,0 Niehaus et al., 1999
Pululanase Thermus caldophilus 75°C 5,5 Kim et al., 1996
Thermoan aerobacterium Ganghofner et al.,
Glicoamilase 50 a 60°C 4,0-5,5
thermosaccharolycticum 1998
Amilopululanases Pyrococcus furiosus 105°C 6,0 Dong et al., 1997
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5. oportunidade para a exploração de de vacinas, proporciona captação 3 a
xilanases de arqueas extremofílicas 50 vezes maior pelas células fagocíticas
como as de Pyrococcus furiosus, do sistema imune quando compara-
Thermococcus sp. e Thermococcus das com formulações de lipossomos
zilligii (Eichler, 2001). convencionais, além de geração de
Um outro problema na fabricação resposta imune prolongada (Tolson et
de papel, principalmente pelo al., 1996; Sprott et al., 1997; Krishnan
polpeamento mecânico, é a deposição et al., 2000). Todos os estudos realiza-
do “pitch”, denominação atribuída ao dos in vitro e in vivo indicam que os
conjunto de substâncias hidrofóbicas arqueossomos são moléculas seguras
da madeira, principalmente triglicerí- e não invocam nenhuma toxicidade
deos e graxas, que causam muitos em ratos. Em geral, os arqueossomos
problemas na manufatura da polpa e demonstram alta estabilidade ao
do papel (Jaeger e Reetz, 1998). As estresse oxidativo, à alta temperatura,
lipases já vêm sendo utilizadas na ao pH alcalino, à ação de fosfolipases,
remoção dessas substâncias. Gutierrez de sais biliares e de proteínas do soro.
et al. (2001) comentam que muitos Algumas formulações podem ser es-
estudos estão sendo realizados, por terilizadas em autoclave, sem proble-
meio de técnicas de engenharia de mas como fusão ou agregação das
proteínas, no intuito de aumentar a vesículas (Patel e Sprott, 1999).
amplitude de substratos hidrolisáveis,
atividade e estabilidade em pH e tem- 5. Genômica
peratura elevados, sendo importante
que a enzima esteja ativa a altas tempe- Uma nova era sobre o conheci-
raturas, uma vez que para um desem- mento das arqueas começou em 1996
penho ótimo, a lipase deveria ser adi- em decorrência do seqüenciamento
cionada à polpa a uma temperatura de, completo do primeiro genoma de
aproximadamente, 85oC. Nosso labo- arquea (Bult et al., 1996). Com o sub-
ratório vem trabalhando no isolamen- seqüente desenvolvimento de novos
to, clonagem, expressão e caracteriza- Pyrodictium abyssi projetos de seqüenciamento de outros
ção de uma enzima lipolítica de arquea organismos pertencentes ao domínio
cuja atividade já foi testada a 80oC uma maior capacidade de correção Archaea, foi produzida uma rica
(manuscrito em preparação). de pareamentos errôneos, diminuin- amostragem de genomas desse grupo
do a freqüência de erros na replicação taxonomicamente bastante diversos.
4.3. Utilização de in vitro (Lundberg et al., 1991). Esse repertório de genomas completa-
Polimerases Não somente as enzimas adapta- mente seqüenciados inclui múltiplos
das às altas temperaturas têm potencia- representantes das duas maiores divi-
A reação em cadeia da polimera- lidades biotecnológicas. As enzimas de sões de arqueas estabelecidas pela
se (PCR) revolucionou a prática da organismos que crescem entre 5ºC e análise filogenética dos genes de rRNA:
biologia molecular, ou seja, a surpre- 25oC (Psicrofílicos) podem ser empre- a Euryarchaeota e Crenarchaeota, bem
endente replicação in vitro de se- gadas em vários processos e produtos, como as principais variantes ecológi-
qüências específicas de DNA possi- como proteases, lipases, amilases, b- cas de arquea: os hipertermofílicos,
bilitou que o isolamento de genes, glicanases em detergentes, pectinases termofílicos moderados e mesofílicos,
seu seqüenciamento e mutações es- em sucos de frutas, b-galactosidases assim como halofílicos e metanogêni-
pecíficas, antes uma prática laborio- para produção de leite deslactosado, cos, formas autotróficas e heterotrófi-
sa, se tornasse uma atividade cotidi- lipases para maturação de queijos cas, e múltiplas espécies que represen-
ana de qualquer laboratório de enge- (Herbert, 1992; Eichler, 2001). tam organismos anaeróbios e aeróbios.
nharia genética. O método da reação Infelizmente os bancos de dados ainda
em cadeia da polimerase, por sua 4.4. Arqueossomos não contam com seqüências genômi-
vez, foi extremamente simplificado cas de alguns organismos pertencen-
com a utilização de enzimas As aplicações biotecnológicas das tes a ramos de arquea potencialmente
hipertermofílicas. Embora a princi- arqueas não se restringem a produ- importantes, como as misteriosas
pal DNA polimerase termofílica utili- ção, expressão heteróloga e purifica- Korarchaeota, que devem ter divergi-
zada seja a de uma bactéria (Thermus ção de extremozimas. Pelo menos do das demais arqueas nos primórdios
aquaticus), as DNA polimerases de uma outra potencialidade biotecnoló- da evolução, e a igualmente intrigante
arqueas, como as de Pyrococcus gica deve ser ressaltada. A utilização nanoarchaea, que parece ter o menor
furiosus, Pyrococcus woesei e outras, dos arqueossomos (preparação de genoma entre todos os organismos de
apresentam uma vantagem sobre a lipídeos de membrana arqueana), vida livre já descritos (Huber et al.,
Taq polimerase, pois elas possuem como coadjuvantes em formulações 2002)
Revista Biotecnologia Ciência e Desenvolvimento - Edição nº 30 - janeiro/junho 2003 75
6. seqüenciadas corrobora a identifica- 6. Considerações Finais
ção destas como um grupo de orga-
nismos que têm uma base sólida e Estudos que envolvem o domí-
estável de genes, os quais, primaria- nio Archaea vêm confirmando as duas
mente, codificam proteínas envolvi- hipóteses iniciais de Woese e Fox
das na replicação e expressão do (1977), isto é, que as arqueas exibem
genoma. Além desses, existe um se- uma diversidade fenotípica no míni-
gundo grupo de genes que é compar- mo comparavél àquela apresentada
tilhado pelas arqueas e eucariotos, pelo domínio Bacteria e que os orga-
Métodos de Preservação de Arqueas genes que são claramente associados nismos do domínio Archaea serão
ao processamento da informação. O caracterizados por aspectos únicos
A comparação dos genomas já fato da afinidade arquea-eucariótica em âmbito molecular. Outrossim, o
seqüenciados de arqueas e bactérias ser quantitativamente pequena, de- fato de Archaea exibir um mosaico
permite concluir que a diferença monstra, no entanto, que o processo contendo características dos dois ou-
mais marcante entre os domínios de evolução tem sido mais comple- tros domínios continua a estimular
Archaea e Bacteria está na organi- xo que a simples herança vertical, e discussões entre os evolucionistas
zação de seus sistemas de processa- tem envolvido uma extensiva trans- (Forterre et al, 2002).
mento de informações. A estrutura ferência lateral de genes entre No contexto de extremofilia, a
dos ribossomas e da cromatina, a Archaea e Bacteria. Após a diver- descoberta contemporânea mais sur-
presença de histonas, assim como a gência evolutiva entre as linhagens preendente foi, sem dúvida, a dos
similaridade entre seqüências das de arqueas e bactérias, vem ocor- organismos hipertermófilos, que
proteínas envolvidas na tradução, rendo uma grande mistura de genes extendeu a sobrevivência desse or-
transcrição, replicação e reparo do codificantes para enzimas metabóli- ganismo para cerca de 121ºC de tem-
DNA; todos esses pontos apontam cas, componentes estruturais da cé- peratura em que células vivas proli-
para uma maior proximidade entre lula e outras proteínas que não par- feram eficientemente. Essa caracte-
arqueas e eucariotos. Por outro lado, ticipam da maquinaria central de rística notável implica na estabiliza-
alguns componentes chaves da ma- processamento da informação (Nel- ção de todos os componentes celula-
quinaria de replicação de DNA não son et al., 1999). res, de modo que a sua funcionalida-
são homólogos nos eucariotos nem Além dos estudos funcionais, a de seja mantida em condições de
nas bactérias. Essa observação per- genômica de Archaea é fundamen- temperatura que seriam danosas para
mite sugerir a hipótese de que a tal para o conhecimento que temos a maioria das biomoléculas dos orga-
replicação da dupla fita de DNA de duas transições cruciais na evolu- nismos mesófilos. A elucidação das
como principal forma de replicação ção da vida: a primeira é a divergên- estratégias usadas na estabilização
do material genético dos seres vivos cia entre as linhagens de bactérias e de componentes celulares e, em es-
pode ter, na sua evolução, surgido, as de arquea-eucarióticas, que pode pecial, de proteínas, representa um
independentemente, duas vezes: ter envolvido a origem da maquina- desafio fascinante para a biologia
uma nas bactérias e uma outra no ria de replicação de DNA. A segunda atual (Kashe e Lovley, 2003).
ancestral de arqueas e eucariotos. é a origem dos eucariotos. Em rela- Os microrganismos apresentam
No entanto, muitas, mas não todas ção a esse ponto, a arquea é uma uma imensa diversidade genética e
as rotas metabólicas de Archaea, fonte fantástica de informação, par- desempenham funções únicas e deci-
são mais parecidas com as de bacté- ticularmente porque, em muitas si- sivas na manutenção de ecossistemas,
rias que as de eucariotos. Esses tuações, ela tem retido as caracterís- como componentes fundamentais de
estudos são concordes quanto ao ticas primitivas, enquanto os cadeias alimentares e ciclos biogeo-
posicionamento das arqueas como eucariotos têm sofrido modificações químicos. É importante ressaltar que
um domínio distinto da vida, com muito maiores. Um exemplo carac- grande parte dos avanços da biotec-
conecções específicas com os terístico é a subunidade menor da nologia moderna e da agricultura é
eucariotos, e enfatizam a natureza DNA polimerase, que possui todas derivada das descobertas recentes nas
misteriosa e única dos genomas das as marcas de uma fosfatase ativa em áreas de genética, fisiologia e metabo-
arqueas (Gaasterland, 1999). arqueas, mas não em eucariotos, lismo de microrganismos.
Quando analisamos os 18 geno- onde a atividade fosfatásica está Considerando que o Brasil pos-
mas de arqueas seqüenciados total- provavelmente inativada. Sem som- sui uma grande extensão territorial
mente até hoje, podemos concluir bra de dúvidas, arquea representa com inúmeros e variados ambientes
que 16 proteínas são exclusivas de um ancestral comum das linhagens extremos, como: águas termais, sali-
arqueas, enquanto 61 são exclusivas arquea-eucarióticas descendentes. nas, inúmeras estações de tratamento
de arquea-eucariotos. Interessante- Portanto, a genômica de arquea é a de esgoto, rejeitos industriais, entre
mente, desses 61 genes, apenas 2 nossa melhor oportunidade de re- outros. A biodiversidade microbiana
não pertencem à maquinaria do pro- construir essa fase intermediária crí- brasileira, ainda não explorada, pode-
cessamento de informação. Portanto, tica da evolução da vida (Makarova se tornar uma fonte para o desenvol-
a análise genômica das arqueas já e Koonin, 2003) . vimento biotecnológico do país.
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