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PROCESSO Nº: 0800046-63.2015.4.05.8306 - AÇÃO CIVIL DE IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA
AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RÉU: JOSE EDBERTO TAVARES DE QUENTAL
ADVOGADO: MARCO ANTONIO VELOSO SOARES (e outro)
25ª VARA FEDERAL - JUIZ FEDERAL TITULAR
SENTENÇA
I - RELATÓRIO
Trata-se de ação civil pública, por ato de improbidade administrativa, proposta pelo
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em face do ex-prefeito do Município de
Condado/PE, JOSÉ EDBERTO TAVARES DE QUENTAL, devidamente qualificado
nos autos, por conduta que, supostamente, se enquadra no art. 10, caput e inciso X, ou
no art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92).
Consta da inicial que o demandado, na condição de prefeito do Município de
Condado/PE, no ano de 2007, deixou de recolher aos cofres da Previdência Social
(RGPS) o montante de R$ 1.041.545,39 (um milhão, quarenta e um mil, quinhentos e
quarenta e cinco reais e trinta e nove centavos), sendo R$ 319.551,89 (trezentos e
dezenove mil, quinhentos e cinquenta e um reais e oitenta e nove centavos) relativos às
contribuições de servidores sobre a remuneração retidas na fonte, e R$ 721.993,50
(setecentos e vinte e um mil, novecentos e noventa e três reais e cinquenta centavos)
referentes às contribuições patronais, consoante a conclusão exarada na Prestação de
Contas nº TCE-PE nº 0810062-7.
Narra a parte autora que a Receita Federal procedeu à constituição definitiva do crédito
tributário, por meio das NFLDs Debcad números 372453490 e 372453503, tendo o
Município de Condado/PE requerido o parcelamento dos referidos débitos, conforme o
processo administrativo nº 14770.720014/2013-60, com retenção dos valores das
prestações do Fundo de Participação dos Municípios (FPM).
O Ministério Público Federal defende, ainda, que a conduta do réu implica a prática de
atos de improbidade administrativa que causaram prejuízo ao erário (Art. 10, caput e
inciso X, da Lei nº 8.429/92), bem como, subsidiariamente, atos de improbidade que
atentam contra os princípios da administração pública, em face da previsão do art. 11,
caput e inciso II, da Lei nº 8.429/92.
Foram apresentados os documentos relativos ao processo de Prestação de Contas nº
TCE-PE nº 0810062-7 (Id. 901.614 ao 901.768), bem como os concernentes à Notícia
de Fato (Id. 901.789 ao 901.806).
Devidamente notificado para oferecer manifestação por escrito (Art. 17, §7º, da Lei nº
8.429/92), o demandado deixou transcorrer in albis o prazo para cumprimento do mister
(Id. 1.088.507).
A União manifestou seu desinteresse em integrar a lide (Id. 1.178.811).
Decisão exarada no id. 1.310.283 recebeu a petição inicial e determinou a citação do
réu.
Citado, o réu apresentou contestação (Id. 1.403.624), em que aduziu, em síntese: (i) ao
assumir a administração municipal, em janeiro de 2005, deparou-se com situação de
desmando e desorganização de grande proporção, como também dificuldades
financeiras; (ii) diante do quadro relatado, priorizou a liquidação dos débitos
remanescentes da administração anterior relativos à folha de pagamento de pessoal; (iii)
priorizou, ainda, com aportes financeiros mensais o Regime Próprio de Previdência
(RPPS); (iv) havia comprometimento mensal da receita do município da ordem de 9%
(nove por cento), destinado ao pagamento de parcelamentos realizados com o INSS,
CELPE, COMPESA, Telefonia, FUNPRECON, Precatórios, PASEP e outros, além dos
gastos administrativos em geral, estes, da ordem de 40% (quarenta por cento) da receita;
(v) houve oscilação da receita, no tocante aos repasses do Fundo de Participação dos
Municípios (FPM), única fonte de recursos financeiros, e redução do fator de 1.4 para
1.2; (vi) que o parcelamento do débito previdenciário abrangeu dívida, inclusive, do ano
de 2003.
Designada audiência de instrução e julgamento, foram ouvidas as testemunhas Ivadelci
Hipólito de Medeiros Filho e Tatiana Gomes da Silva, bem como tomado o depoimento
pessoal do réu (Id. 1.852.232).
O Ministério Público Federal apresentou razões finais, consoante o identificador
1.881.578.
É o relatório
II - FUNDAMENTAÇÃO
O cerne da presente lide reside em saber se a conduta do réu, consistente em efetuar os
descontos das contribuições previdenciárias das remunerações pagas aos servidores,
sem o devido repasse à Previdência, como também o não recolhimento das
contribuições patronais, configurou ato de improbidade administrativa, a merecer as
reprimendas contidas na Lei nº 8.429/92. Veja-se.
A Carta da República, no art. 37, caput, dispõe que a administração pública direta e
indireta deve obedecer aos princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade,
da publicidade e da eficiência, estabelecendo, no § 4º do mesmo dispositivo, que "os
atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a
perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, da
forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível".
Sabe-se que o conceito de improbidade, assim denominado pela Carta Magna o ato
lesivo à moralidade administrativa, está intimamente ligado à necessidade de o agente
público agir sempre, impreterivelmente, com honestidade e em atendimento aos
interesses públicos, sem aproveitar-se indevidamente dos poderes e facilidades que lhes
são conferidos no exercício de mandato, função, emprego ou cargo público.
Segundo Maria Sylvia Zanella di Pietro, para que o ato de improbidade administrativa
possa acarretar a aplicação das medidas sancionatórias presentes no art. 37, § 4.º, da
CR/88, devem estar presentes determinados elementos, quais sejam: o sujeito passivo
ser uma das entidades mencionadas no art. 1.º da Lei n.º 8.429/92; o sujeito ativo ser um
agente público ou terceiro que induza ou concorra para a prática de ato de improbidade
ou dele se beneficie; a ocorrência de ato danoso causador de enriquecimento ilícito para
o sujeito ativo, prejuízo para o erário ou atentado contra os princípios da Administração
Pública e a presença de elemento subjetivo: dolo ou culpa.[1]
Analiso a presença desses componentes no caso em tela.
O art. 1º da Lei n.º 8.429/92 explicita quais os entes administrativos passíveis de sofrer
a prática de um ato de improbidade:
Art. 1° Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou
não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes
da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa
incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o
erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou
da receita anual, serão punidos na forma desta lei.
Parágrafo único. Estão também sujeitos às penalidades desta lei os atos de
improbidade praticados contra o patrimônio de entidade que receba subvenção,
benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, de órgão público bem como daquelas para
cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com menos de cinqüenta
por cento do patrimônio ou da receita anual, limitando-se, nestes casos, a sanção
patrimonial à repercussão do ilícito sobre a contribuição dos cofres públicos.
Observe-se que aí estão relacionados os órgãos da administração direta, à qual pertence
a municipalidade pretensamente atingida pelas irregularidades elencadas na exordial.
A mesma lei dispõe, nos arts. 2º e 3º, aqueles que podem ser sujeito ativo do ato de
improbidade administrativa:
Art. 2° Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce,
ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação,
contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo,
emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior.
Art. 3° As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não
sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele
se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.
Aperfeiçoado igualmente esse requisito, vez que o réu era, à época da ocorrência dos
atos descritos na vestibular, prefeito do município de Condado/PE, fato incontroverso
nos presentes autos.
Resta, assim, apurar a ocorrência dos demais elementos, quais sejam: a ocorrência do
ato ímprobo e a prática deste com dolo ou culpa, conforme o tipo de improbidade.
Sabe-se que, nos termos do disposto nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429/92, os atos de
improbidade administrativa compreendem 3 (três) modalidades, quais sejam: a) os que
importem enriquecimento ilícito; b) os que causam prejuízo ao erário; c) os que atentam
contra os princípios da Administração Pública.
In casu, pretende-se a imputação aos demandados de ato de improbidade causador de
dano ao erário, previsto na primeira parte do art. 10, caput e inciso X, e do art. 11, caput
e inciso II, da Lei de Improbidade Administrativa. In verbis:
"Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário
qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio,
apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades
referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:
(...)
X - agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz
respeito à conservação do patrimônio público;
(...)
"Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios
da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de
honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:
(...)
II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício".
No caso dos autos, a acusação do Ministério Público acerca da omissão quanto ao
repasse das contribuições previdenciárias descontadas dos servidores do município,
como também a parcela patronal, trata-se de ponto incontroverso, uma vez que o
próprio demandado reconhece a ilicitude do ato, embora não lhe atribuam a qualidade
de ímprobo.
Extrai-se dos autos que, de fato, foram efetuados descontos de contribuições
previdenciárias na folha de pagamento dos servidores do município de Condado/PE,
sem o devido recolhimento aos cofres da Previdência Social, bem como não foram
recolhidas contribuições patronais. É o que se verifica das NFLDs Debcad números
37245349-0 e 372453503.
Infere-se que o município, à época dos fatos, possuía regime próprio de previdência, vez
que este fora implantado no ano de 2003. Contudo, as irregularidades constatadas
referem-se tanto a contribuições de servidores sem vínculo efetivo, que não integram o
RPPS (FUNPRECON), como também aquelas relativas ao regime geral (RGPS). Estas,
objeto da presente ação.
Caracterizada, portanto, a ilicitude praticada, resta averiguar se a referida conduta
possui o condão de caracterizar-se como ato de improbidade administrativa, nos moldes
previstos no art. 10, caput e inciso X, e art. 11, inciso II, da Lei de Improbidade
Administrativa.
No que concerne ao art. 10, que define o ato de improbidade que acarrete lesão ao
erário, não obstante a gravidade da conduta praticada, há que se reconhecer a não
ocorrência de dano patrimonial aos cofres da Previdência, tendo em vista a existência de
parcelamento do débito pelo município junto à Receita Federal do Brasil, na esteira dos
posicionamentos doutrinário e jurisprudencial a respeito da questão:
Além da ilegalidade, é requisito de sua configuração a ocorrência de efetivo dano
material aos cofres públicos. Nem o prejuízo presumido nem o dano moral serve para
sua caracterização. Pelo contrário, sem a prova da perda patrimonial certa não se
verifica esse tipo de improbidade administrativa, restando ao autor da ação civil
respectiva responsabilizar o agente público, desde que comprove que sua conduta
funcional antijurídica infringiu os princípios constitucionais reguladores da
Administração Pública, por violação do art. 11 da LIA.[2]
Nesse sentido, a RFB, por meio do Ofício nº 946/2014, de 02/12/2014 (Id. 901.806),
informou que o município de Condado/PE requereu, em 26/03/2013, e foi deferido o
parcelamento da totalidade dos débitos, com adimplemento das parcelas por meio de
retenção de valores do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), na forma do caput
do art. 1º da Lei nº 12.810/2013.
Não se trata, ademais, de condutas que possam ser enquadradas na hipótese do ato de
improbidade administrativa inserto no inciso X do art. 10, da Lei nº 8.429/92: "X - agir
negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz respeito à
conservação do patrimônio público;"
É que não se cuida de arrecadação de crédito tributário do município, mas de crédito
previdenciário. Em que pese a previsão dos artigos 15, inciso I, e 30, inciso I, "a", da
Lei 8.212/91, o sujeito ativo da obrigação tributária é a União. O município, equiparado
a empresa para essa finalidade, é apenas o responsável tributário.
Veja-se o precedente:
"Processual Civil e Administrativo. Recurso do demandante, em ação civil pública por
improbidade administrativa, buscando a condenação do demandado, ex-prefeito de
Palmares, por omissão no recolhimento de contribuições previdenciárias, na invocação
do art. 10, inc. X, e subsidiariamente, no art. 11, inc. II, da Lei 8.429, de 1992, ante
decisão que indefere a inicial, por já ter o município celebrado acordo de parcelamento
com a Previdência, não subsistindo prejuízo ao erário federal. A omissão no
recolhimento de contribuições previdenciárias não se encaixe no art. 10, inc. X, da
Lei 8.429, nem tampouco, no art. 11, inc. II. Primeiramente, várias pedras se colocam
no caminho da pretensão embutida na inicial. A primeira, na falta de legitimidade do
demandante, visto a ausência de prejuízo de ente federal, ante a celebração de
parcelamento, o que, de logo, afasta o interesse federal, apunhalando a legitimidade
do autor-apelante. Não bastasse, depois, se deve buscar o perfeito enquadramento dos
fatos - omissão no recolhimento das contribuições previdenciárias -, para, depois,
então, se enfrentar os argumentos do apelo. A omissão no recolhimento das
contribuições previdenciárias não se acomoda, com naturalidade, no agir
negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz respeito a
conservação do patrimônio público. Não se cuida de arrecadar tributos ou renda, mas
de deixar de recolher aos cofres da Previdência Social a contribuição devida relativa
aos seus servidores. Contudo, é na gaveta do art. 10, inc. X, que a conduta tem sido
colocada, como se observa do único julgado citado neste sentido, f. 228. Já o art. 11,
inc. II, enfatiza o retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício.Também
não há como proceder ao encaixe, por uma questão bem singela. O ato de ofício em
foco só se reveste de improbidade [administrativa] quando o retardar ou o deixar de
praticar se verifica de modo indevido. Ou seja, se há motivo, que justifique o retardar
ou o deixar de praticar, o ato não se cobre de nenhuma cor da improbidade. Aqui,
contudo, a omissão no recolhimento das contribuições previdenciárias, que é obrigação
de lei, porque o regime da previdência social vive do que arrecada para poder cumprir
seus fins, não há como adentrar no campo subjetivo para verificar o motivo pelo qual o
ente público deixou de recolher as contribuições previdenciárias. Não há, assim,
proceder ao enquadramento no art. 10, inc. X, nem tampouco, subsidiariamente, no art.
11, inc. II. Imperioso observar que nem toda conduta, praticada pelo administrador
público, se transforma em improbidade administrativa catalogada pela Lei 8.429.
Necessário, para tanto, que o enquadramento se faça de maneira perfeita, via parto
natural, não se admitindo o encaixe através de fórcipe, ou no martelo, ou seja, na
força. Em consequencia, as razões recursais do apelante se revelam frágeis em contato
com a realidade do não enquadramento. Improvimento do apelo." (AC
00124463420134058300, Relator Desembargador Federal Vladimir Carvalho, TRF5, 2ª
Turma, DJE - Data: 06/03/2015, pág. 40) [Destaquei]
Pois bem. O demandado alegou em sua defesa, em síntese:
(i) ao assumir a administração municipal, em janeiro de 2005, deparou-se com situação
de desmando e desorganização de grandes proporções, como também dificuldades
financeiras;
(ii) diante do quadro relatado, priorizou a liquidação dos débitos remanescentes da
administração anterior relativos à folha de pagamento de pessoal;
(iii) priorizou, ainda, com aportes financeiros mensais o Regime Próprio de Previdência
(RPPS);
(iv) havia comprometimento mensal da receita do município da ordem de 9% (nove por
cento), destinado ao pagamento de parcelamentos realizados com o INSS, CELPE,
COMPESA, Telefonia, FUNPRECON, Precatórios, PASEP e outros, além dos gastos
administrativos em geral, estes, da ordem de 40% (quarenta por cento) da receita;
(v) houve oscilação da receita, no tocante aos repasses do Fundo de Participação dos
Municípios (FPM), única fonte de recursos financeiros, e redução do fator de 1.4 para
1.2;
(vi) que o parcelamento do débito previdenciário abrangeu dívida, inclusive, do ano de
2003.
Em que pese ter o Ministério Público de Contas do Estado opinado pela rejeição das
contas e julgamento irregular delas, relativas ao exercício financeiro de 2007, o que de
fato restou decidido pelo Tribunal de Contas do Estado, não se extrai da documentação
acostada aos autos, notadamente do id. 901.792, qualquer alusão à prática de atos
realizados com dolo ou má-fé.
Na verdade, verifica-se dos relatórios e pareceres examinados, tão somente a
constatação de ausência de recolhimento de contribuições previdenciárias descontadas
dos servidores, dos regimes RPPS e RGPS. Veja-se.
Com efeito, consta dos itens 2.2. Ausência de informações obrigatórias nos documentos
da prestação de contas e 2.3. Irregularidades contábeis (item 5.3 do relatório de
auditoria) - Id. 901.792:
"Segundo a Auditoria, alguns documentos insertos na prestação de contas contêm
informações incompletas, a exemplo de: a) ofício de encaminhamento da prestação de
contas da Câmara Municipal; b) demonstrativo da movimentação dos bens
patrimoniais; c) relação de campanhas publicitárias realizadas; d) resumo geral
consolidado das folhas de pagamento dos segurados vinculados ao RPPS; e)
comprovantes de repasses das contribuições devidas ao RPPS.
(...)
Apesar de não terem sido apresentadas as informações omitidas, à oportunidade de
exibição da Defesa, deve-se reconhecer a ausência de prejuízos daí decorrentes para a
ação do controle externo, razão pela qual, considerando, ainda, inexistência de
evidência de dolo ou má fé por parte do gestor, deve o vício propiciar apenas a
aposição de ressalvas, com expedição de recomendação à atual Administração
Municipal, com vistas a sua não repetição em exercícios futuros."
"A equipe técnica realizou a análise comparativa nos demonstrativos contábeis
acostados aos autos do processo, detectando as seguintes irregularidades
caracterizadoras da falta de transparência e de confiabilidade nos demonstrativos
verificados:
a. Diferenças em saldos de contas no Balanço Patrimonial- 2007 (item 3.3. do
Relatório de Auditoria);
b. Ausência de reconhecimento de dívida junto à Celpe, no valor de R$ 956.091,24
(item 4.6. do Relatório de Auditoria);
c. inconsistência das contabilizações das contribuições previdenciárias devidas ao
RPPS e RGPS (itens 5.4.1. e 5.4.2. do Relatório de Auditoria).
(...)
Assim, considerando que não se vislumbra no caso vertente o dolo de gestor de
mascarar a real situação da Prefeitura, opino que fique a falta restrita ao campo das
ressalvas e recomendações."
[Destaquei]
As alegações de defesa do demandado encontram eco, como se vê, na vasta
documentação carreada aos autos
Nesse contexto, a conclusão a que se chega é que a conduta do réu, na gestão municipal
em tela, está recheada de irregularidades e ilegalidades. Contudo, no caso sob exame,
não é possível chancelar tais irregularidades/ilegalidades como atos ímprobos, a
merecer a aplicação das severas reprimendas estabelecidas pela LIA.
Seguindo essa linha de raciocínio, não se pode confundir meras irregularidades e/ou
ilegalidades com improbidade, porquanto ausente, ou não demonstrado, o elemento
volitivo - o dolo
Essa inferência não discrepa da percepção oriunda dos depoimentos colhidos em
audiência.
A testemunha Ivadelci Hipólito de Medeiros Filho, Contador, afirmou:
(i) "o motivo do não repasse das contribuições foi falta de disponibilidade financeira;
tem conhecimento de que sempre houve, mesmo nas gestões anteriores de Condado,
falta de repasse";
(ii) "o prefeito nunca disse para não recolher as contribuições, apenas não havia
capacidade financeira";
(iii) "trabalhou em outras gestões - enfrentou a mesma situação - sempre houve
parcelamento";
(iv) "documentos contábeis anteriores já registravam débitos escriturados não
repassados, objeto de parcelamento";
(v) "priorizava educação e saúde - metas constitucionais";
(vi) "a despesa total com servidores ficava sempre acima de 50% da receita do
município";
(vii) "havia contratações temporárias ou cargos comissionados nas área de saúde e
educação, mas em menor número do que os concursados";
Por sua vez, a testemunha Tatiana Gomes da Silva, do Controle Interno do município,
afirmou:
(i) nas reuniões de que participava, costumavam falar da crise, de parcelamento do
INSS e da prioridade de pagamento dos servidores;
(ii) havia muita queda de receita do município;
(iii) havia aproximadamente 500 servidores concursados e aproximadamente 50
comissionados;
(iv) era necessário realizar contratações temporárias para situações excepcionais.
Ora, é evidente a conduta irregular e ilegal do demandado. Contudo, não é possível a
chancela de ato ímprobo. Conquanto ilegal a conduta, inexiste prova da desonestidade
ou do proveito próprio ou de outrem (a situação caótica do município e as
consequências decorrentes desse caos não bastam à configuração do ato ímprobo).
Assim, as irregularidades verificadas, quanto à não observância da legislação
previdenciária (Art. 15, I, e art. 30, I, "a", da Lei 8.212/91), não é motivo suficiente para
ensejar o reconhecimento de improbidade administrativa.
Acerca do tema, confira-se a lição de José Afonso da Silva (Curso de Direito
Constitucional Positivo, 24ª edição, São Paulo, Malheiros Editores, 2005, p-669):
"A probidade administrativa é uma forma de moralidade administrativa que mereceu
consideração especial da Constituição, que pune o ímprobo com a suspensão de
direitos políticos (art. 37, §4º). A probidade administrativa consiste no dever de o
"funcionário servir a Administração com honestidade, procedendo no exercício das
suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito
pessoal ou de outrem a quem queira favorecer". O desrespeito a esse dever é que
caracteriza a improbidade administrativa. Cuida-se de uma imoralidade administrativa
qualificada. A improbidade administrativa é uma imoralidade qualificada pelo dano
ao erário e correspondente vantagem ao ímprobo ou a outrem (...)."
Por outro prisma, não há que se falar na ocorrência de dano irreversível ao erário, uma
vez que houve rigorosa apuração fiscal acerca dos fatos narrados na exordial, por parte
da Receita Federal, consoante se infere do documento constante do id. 901.802 -
Informação SAPAC/DRF/RECIFE nº 294, de 28/08/2014.
Ademais, de acordo com Ofício nº 946/2014, da Receita Federal do Brasil (Id.
901.806), a totalidade do débito apurado foi objeto de parcelamento, no ano de 2013.
Vejam-se os seguintes precedentes:
ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DE
RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS PELO MUNICÍPIO
DE RIO FORMOSO/PE. EX-PREFEITA. AUSÊNCIA DE ATO REPUTADO
ÍMPROBO. I. Trata-se de apelação de sentença que julgou improcedente o pedido de
condenação da ré Maria das Graças Araújo Hacker, ex-Prefeita de Rio Formoso/PE,
por ato de improbidade administrativa ante o não recolhimento das contribuições
previdenciárias ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS. II. Sustenta o
recorrente que a apelada deve ser condenada pela práticas das infrações descritas no
art. 10, caput, da Lei nº 8.429/92, e, subsidiariamente, no art. 11, da mesma lei, pois na
condição de Prefeita do Município de Rio Formoso/PE, deixou de recolher ao INSS os
valores das contribuições previdenciárias relativas ao exercício de 2006, descontados
dos funcionários, mas não repassados em sua totalidade à Previdência, posteriormente,
parceladas em outra gestão da edilidade. III. A improbidade administrativa que dá
ensejo à responsabilização correspondente materializa-se pelo ato marcadamente
corrupto, desonesto, devasso, praticado de má-fé ou caracterizado pela "imoralidade
qualificada" do agir. A conduta ilegal só se torna ímproba se revestida também de
má-fé do agente público. IV. O ato de improbidade não deve ser confundido com o de
mera irregularidade ou ilegalidade, o primeiro corresponde a uma conduta ilegal
tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente. Assim, para a
verificação do ato ímprobo, nos termos do art. 10, em todos os seus incisos, da Lei nº
8.429/1992, é preciso que se comprove a culpa grave na conduta do agente, e, nos
termos do art. 11, do mesmo Estatuto, que seja demonstrado o dolo. V. A
jurisprudência do STJ e desta Corte Regional, já vem se posicionando no sentido de
que não caracteriza ato ímprobo o não recolhimento de contribuição previdenciária
no afã de evitar-se lesão a um bem maior ou quando não há prejuízo para o erário.
Precedentes: STJ, REsp 1206741 / SP, rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, DJe
23.5.2012; TRF 5ª Região, Apelreex 23605/PB, Des. Federal Manoel Erhardt, DJE:
07/03/2014. VI. Na hipótese, não se vislumbra elementos suficientes a levar à ré a
uma condenação por ato de improbidade, seja pela falta de maiores evidências de um
ato doloso, seja por não se caracterizar a situação de acessoriedade de tributo como
apresentação de GFIP, uma responsabilidade que caracterize improbidade de um
prefeito municipal. A conduta não ocasionou dano irreversível ao erário, uma vez que
o total da importância não recolhida está sendo pago pelo Município, por meio de
parcelamento tributário. VII. Apelação improvida. (AC 00092234420114058300,
Relator Desembargador Federal Ivan Lira de Carvalho, TRF5, 2ª Turma, DJE:
07/04/2016, pág. 143) [Destaquei]
ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. EX-PREFEITO. PRELIMINAR. CERCEAMENTO DE
DEFESA NÃO CONFIGURADO. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE.
AUSÊNCIA DE REPASSE DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS AO INSS.
AUSÊNCIA DE ELEMENTOS MÍNIMOS DE PROVA DA PARTICIPAÇÃO OU
OMISSÃO DIRETA DO EX-PREFEITO. DESCARACTERIZADO ATO DE OFÍCIO.
PARCELAMENTO. DILIGÊNCIA. NÃO DEMONSTRADO O ELEMENTO
SUBJETIVO. DESCONFIGURADO ATO ÍMPROBO. APELAÇÃO PROVIDA. 1. A
presente Ação de Improbidade Administrativa foi ajuizada pelo Ministério Público
Federal em face de JOÃO DA SILVA LIMA NETO, prefeito do Município de
Redenção (mandato de 2001 a 2004), em razão da falta de repasse ao Instituto Nacional
do Seguro Social das contribuições recolhidas, relativas às folhas de pagamento de
servidores comissionados, contribuintes individuais e trabalhadores temporários. 2. A
sentença concluiu pela condenação do réu baseando sua decisão, em suma, nos
seguintes fundamentos: (i) o parcelamento do débito afasta apenas a tipificação da
conduta como ato de improbidade administrativa que importe prejuízo ao erário,
podendo enquadrar-se em conduta ímproba que atente contra os princípios da
Administração Pública; (ii) como não havia delegação para que um funcionário se
responsabilizasse pelo repasse, tem-se que a pessoa do prefeito era o responsável direto
pelo devido repasse, cuja omissão seria suficiente para comprovar a má-fé. 3. O réu
apresentou apelação alegando: em sede de preliminar, a nulidade de todos os atos
processuais realizados a partir da decisão relativa a desnecessidade de produção de
provas, tendo em vista que a ausência de intimação das partes para apresentação de
alegações finais ofendeu o contraditório e ampla defesa, contaminando os atos
posteriores. Em relação ao mérito, o recorrente alegou que não houve prática de ato de
improbidade administrativa por: ausência de nexo causal entre os atos do ex-prefeito e a
prática do comportamento considerado ímprobo, já que o procedimento exigido deveria
ter sido feito pela contabilidade e não pela pessoa do prefeito; falta de comprovação do
elemento subjetivo, tanto de má-fé do gestor (dolo) quanto de displicência injustificável
(culpa); a conduta do gestor não configurou ato ímprobo, tendo sido, inclusive,
posteriormente confessado e remediado, com o parcelamento da dívida. Alega, ainda,
que a condenação depende de prova robusta, no entanto, a decisão baseou-se em
simples especulação. 5. Apresentadas contra-razões pelo Ministério Público Federal,
todos os pontos da apelação foram rebatidos; alegou, ainda, descaso do prefeito com sua
obrigação legal, pois a falta de repasse só deveria ser aceita caso restasse demonstrado o
emprego emergencial dos recursos, o que não houve. 6. No tocante a preliminar arguida
pelo apelante, convém confirmar o entendimento pacífico no sentido de que é cabível o
julgamento antecipado da lide em sede de ação de civil pública, sem que haja, com isso,
o cerceamento de defesa. E, dada a similaridade da ação de improbidade administrativa
com a seara criminal, faz-se oportuno orientar-se pelo teor da súmula 523 do STF, que
estabelece que ainda que se considerasse cerceamento de defesa pela falta de intimação
para alegações finais, não caberia suscitar a nulidade absoluta se não restasse
demonstrado que a referida deficiência acarretou em prejuízo para o réu. Portanto, não
tendo sido apresentado o efetivo prejuízo do réu decorrente da falta de alegações finais
em relação às conclusões da sentença atacada, tem-se como afastada a preliminar
levantada no apelo. 8. Adiante, o cerne da controvérsia passa a consistir na
verificação da existência de ato de improbidade administrativa na conduta do réu.
9. É certo que a Lei 8.112/91 (art. 15, I e art. 30, I, "a") estabelece que a
responsabilidade pelo recolhimento da contribuição previdenciária dos seus
empregados é do Município. Contudo, é razoável considerar que, diante da
necessidade de delegação de atividades administrativas na gestão, tais repasses são,
em tese, de responsabilidade imediata da área responsável pela contabilidade da
prefeitura. Merece análise o elucidativo julgado de caso semelhante nesta Corte,
"(...) no que se refere à conduta abraçada pelo inc. II, do art. 11, o caminho para
orientar o julgador na ocorrência ou não de ato de improbidade administrativa
repousa na interpretação que a expressão - ato de ofício -, utilizado no inc. II, do
art. 11, da Lei de Improbidade Administrativa, denota. O ato de ofício abarca
todos os atos inerentes ao cargo de prefeito, - no caso é um prefeito o demandado -
com conotação política, entendida esta como ampla liberdade para praticar o ato
sem estar adstrito a qualquer norma. Ou seja, atos exclusivamente do cargo, que
só pelo prefeito, no caso, podem ser praticados, não se admitindo, desta forma,
delegação nem transferência do ato a qualquer secretário ou servidor municipal. O
ato de ofício é exclusivamente do prefeito, de sua vontade pessoal, como, v. g.,
nomear diretor de uma escola municipal, escolher um secretário, enviar uma
mensagem de lei para a Câmara de Vereadores,etc. A descrição dos atos na douta
sentença apelada, f. 1081, exibe feitos de cunho meramente administrativo, que não
são realizados diretamente pelo prefeito, mas por servidores do Município, em seus
diversos setores, não estando arrolados como privativos do prefeito. Não são,
portanto, atos de ofício." (AC554902/CE, Tribunal Regional Federal - 5ª Região, 2ª
Turma, Rel.: Desembargador Federal Vladimir Carvalho, DJE 29/05/2013,
Decisão por Maioria). 10. Não se pretende afirmar que, no caso concreto, o prefeito
não tem responsabilidade sobre os atos de sua gestão. A responsabilidade, no caso,
é derivada da condição de ordenador de despesas e gestor, e não imediata de seus
atos de punho próprio, o que impõe tratamento distinto. Porquanto, para recair
sobre o apelante a pretensa responsabilidade, haveria de restar demonstrado que
ele agiu diretamente ou, ao menos autorizou de maneira expressa, a retenção dos
recursos. 11. Portanto, em que pese a responsabilidade do prefeito pelo
gerenciamento dos recursos públicos do respectivo Município, não se pode, de
forma objetiva, atribuir a responsabilização pela conduta ímproba de todas as
irregularidades passíveis de ocorrer no âmbito da administração municipal, sem
que haja elementos probatórios suficientes que o vincule diretamente a tais
condutas ímprobas. 12. Desconfiguradas as ações do apelante com "ato de ofício",
resta afastado o enquadramento no inciso II do art. 11 da LIA. 13. No tocante ao
elemento subjetivo, tem-se que a própria sentença atacada reconheceu que a
adesão ao programa de parcelamento demonstrou a intenção do prefeito em
solucionar a irregularidade fiscal. Diante da irregularidade reconhecida, o
apelante agiu de maneira diligente dentro dos parâmetros legais. Não restou
demonstrado que o parcelamento trouxe algum benefício para o gestor ou para
qualquer outro agente público ou particular, nem que a verba não tenha sido
utilizada para outra destinação. 14. No caso concreto, seria forçoso considerar que
houve intenção, por parte do prefeito, de agir em desconformidade com a
moralidade pública. Mais coerente compreender que sua conduta decorreu de
inabilitação ou despreparo escusável, desprovida de dolo, má-fé ou culpa grave. 15.
Destarte, ausente o elemento subjetivo da conduta do prefeito, não há se falar em
improbidade administrativa, tendo em vista que "afigura-se indispensável a
presença do dolo ou culpa do agente para ensejar a aplicação das sanções previstas
na Lei n. 8.429/1992, sendo insuficiente, para tanto, meras irregularidades
administrativas" (REsp 1186435/DF, Superior Tribunal de Justiça, Rel. Min. OG
FERNANDES, 2ª TURMA, DJe 29/04/2014). 16. Afastada a condenação do réu.
Apelação provida. (AC 200981000128143, Relator Desembargador Federal Manoel
Erhardt, TRF5, 1ª Turma, DJE: 16/04/2015, pág. 76) [Destaquei]
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. EX-PREFEITO. OMISSÃO NO RECOLHIMENO DE
CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS E AUSÊNCIA DE DECLARAÇÃO NA GUIA
DE RECOLHIMENTO DO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO E
INFORMAÇÕES À PREVIDÊNCIA SOCIAL - GFIP. OMISSÃO DE INFORMAÇÕES.
INEXISTÊNCIA DE DANO. DÉBITO PARCELADO. NÃO DEMONSTRADO DOLO
OU MÁ-FÉ NA CONDUTA DO AGENTE. ATO DE IMPROBIDADE
INCONFIGURADO. 1. A omissão no recolhimento de contribuição previdenciária,
objeto de parcelamento posterior, e de informações na GFIP do Município, bem como
de obrigações acessórias, sem a demonstração de dolo ou má-fé na conduta do agente
público, não caracteriza ato de improbidade. 2. O ato de improbidade administrativa
não pode ser entendido como mera atuação do agente público em desconformidade
com a lei. A intenção do legislador ordinário na produção da norma (Lei n. 8.429/92),
em observância ao texto constitucional (CF, art. 37, § 4º), não foi essa. Mas sim a de
impor a todos os agentes públicos o dever de, no exercício de suas funções, pautarem
as suas condutas pelos princípios da legalidade e moralidade, sob pena de sofrem
sanções pelos seus atos considerados ímprobos. 3. A improbidade administrativa, no
ato contra a legalidade, deve ter relação com a falta de boa-fé, com a desonestidade.
É que a Lei n. 8.429/92, além de coibir o dano material advindo da prática de atos
desonestos, busca também punir a lesividade à moral pública. 4. Imprescindível, para
a caracterização do ato de improbidade, a atuação do administrador que destoe nítida
e manifestamente das pautas morais básicas, transgredindo, assim, os deveres de
retidão e de lealdade ao interesse público, o que não restou comprovado nos autos. 5.
Não se devem confundir meras irregularidades administrativas com as graves faltas
funcionais de improbidade, sujeitas às sanções da Lei n. 8.429/92. Todo ato ímprobo é
um ato ilícito, irregular, mas nem todo ilícito ou irregularidade constitui-se em ato de
improbidade. 6. Na espécie, não há prova de desonestidade por parte do requerido, e
sim desrespeito à formalidade. Também não houve prejuízo. O débito é do Município,
foi por ele parcelado e está sendo pago. 7. Apelação improvida. (AC
00120650720114014000, Relator Juiz Federal Pablo Zuniga Dourado (Conv.), TRF1, 4ª
Turma, e-DJF1, Data: 10/11/2015, pág. 1263) [Destaquei]
Acertada a consolidação dos entendimentos jurisprudenciais, pois se a própria esfera
penal, ultima ratio, aceita o parcelamento como forma de suspensão das ações penais
que buscam a pretensão punitiva estatal, e se a própria Receita Federal classifica o
devedor-parcelante como sujeito quite com suas obrigações, a ponto de lhe emitir uma
certidão positiva com efeitos negativos, a imposição de sanções da lei de improbidade
administrativa, no mesmo caso, mostra-se como fortemente excessiva, pois nem mesmo
a execução fiscal tem prosseguimento.
Com efeito, o MPF, autor da demanda, não se desincumbiu do ônus probatório que lhe
cabia, conforme a regra do art. 373, inciso I, do novel Código de Processo Civil, uma
vez que não há nos autos, ainda que em sede de procedimento administrativo, qualquer
prova no sentido de que houve desvio da verba pública oriunda do não recolhimento das
contribuições previdenciárias.
Ainda que não se possa negar a existência de conduta altamente irregular, conclui-se,
portanto, que não há nos autos prova acerca da existência de dano ao erário, tanto pela
análise da prova documental, como pela existência de parcelamento do débito efetuado
pelo município na Receita Federal do Brasil.
No que tange à pretensa violação da norma de reserva, prevista no art. 11 da Lei
8.429/92, caput e inciso II, para tanto é indispensável a presença do elemento subjetivo
- dolo - para configuração do ato de improbidade ali descrito.
Em razão da absoluta pertinência com o tema, transcrevo trecho do voto-vista proferido
pelo Ministro MAURO CAMPBELL no Recurso Especial nº 246.746 - MG
(2000/0007864-6 - 19/05/2010):
"Se por negligência, imprudência ou imperícia, os administradores violam os deveres
de legalidade, honestidade, imparcialidade e lealdade às instituições (que é o substrato
fático que autoriza a incidência do art. 11 da Lei n. 8.429/92), por mais
desaconselhável que isso seja, haverá irregularidade administrativa (e não
improbidade), que também é uma infração, merecendo sanção por outras esferas de
controle, tais como a de responsabilização fiscal, a dos processos administrativos
disciplinares, a da fiscalização dos Tribunais de Contas e os demais mecanismos de
controle interno da Administração Pública, sem embargos do não menos eficiente
controle exercido pelos novéis Conselhos Nacionais de Justiça e do Ministério Público.
Note-se: essas irregularidades não podem ser entendidas como um "diminutivo" dos
atos de improbidade - ensejando tratamentos pejorativos, tais como "meras"
irregularidades - e elas merecem combate via controles interno e externo da
Administração Pública, mas não atraem a aplicação de sanções da ordem das
expressas na LIA.
Não se trata de ser por demais permissivo, e sim de compreender o espírito das normas
que resguardam a probidade administrativa. Nesse sentido, aproveito as lições de
Juarez Freitas acerca dos arts. 9º e 11 da LIA: "[p]ara mim, para que haja
improbidade administrativa, em qualquer uma das três espécies, há dois requisitos
fundamentais. [...] O juiz precisa, simplesmente, de um princípio constitucional
importantíssimo chamado 'princípio da sensatez'. [...] Então, o primeiro pressuposto é
que, com bom senso, se examine o seguinte: há grave violação do senso médio superior
de moralidade da comunidade? [...] É a primeira e mais grave pergunta para que haja
uma improbidade administrativa, dada a gravidade das sanções em relação às três
espécies. [...] E o segundo requisito, inequívoca intenção desonesta. [...] A mera
irregularidade, a mera ilegalidade, para mim é insuficiente para condenar alguém por
improbidade administrativa" (Ação civil pública - Improbidade administrativa, Boletim
de Direito Administrativo n. 5, 2005, p. 543/544)."
Nessa esteira, ausente o propósito de alcançar objetivos que vão de encontro à
moralidade administrativa, vez que não demonstrado o dolo ou a má-fé, não vislumbro a
possibilidade de aplicação das severas sanções previstas na Lei de Improbidade
Administrativa.
Nesse contexto, não comprovado o dano ao erário a caracterizar o enquadramento no
art. 10 e presente, tão somente, a culpa no ato ilegal praticado, sendo esta insuficiente ao
enquadramento da conduta no art. 11 da Lei n.º 8.429/92, impõe-se a improcedência dos
pedidos.
III - DISPOSITIVO
Em face do que se expôs, julgo improcedentes os pedidos deduzidos na inicial,
extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do
novel do Código de Processo Civil.
Sem condenação em custas processuais, em face da isenção prevista no art. 4º, inciso
III, da Lei nº 9.289/96. Sem condenação em honorários advocatícios (art. 18, Lei n º
7.347/85).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Goiana (PE), data da validação.
MADJA DE SOUSA MOURA FLORÊNCIO
Juíza Federal

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Processo Justiça Federal - Edberto Quental

  • 1. PROCESSO Nº: 0800046-63.2015.4.05.8306 - AÇÃO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL RÉU: JOSE EDBERTO TAVARES DE QUENTAL ADVOGADO: MARCO ANTONIO VELOSO SOARES (e outro) 25ª VARA FEDERAL - JUIZ FEDERAL TITULAR SENTENÇA I - RELATÓRIO Trata-se de ação civil pública, por ato de improbidade administrativa, proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em face do ex-prefeito do Município de Condado/PE, JOSÉ EDBERTO TAVARES DE QUENTAL, devidamente qualificado nos autos, por conduta que, supostamente, se enquadra no art. 10, caput e inciso X, ou no art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92). Consta da inicial que o demandado, na condição de prefeito do Município de Condado/PE, no ano de 2007, deixou de recolher aos cofres da Previdência Social (RGPS) o montante de R$ 1.041.545,39 (um milhão, quarenta e um mil, quinhentos e quarenta e cinco reais e trinta e nove centavos), sendo R$ 319.551,89 (trezentos e dezenove mil, quinhentos e cinquenta e um reais e oitenta e nove centavos) relativos às contribuições de servidores sobre a remuneração retidas na fonte, e R$ 721.993,50 (setecentos e vinte e um mil, novecentos e noventa e três reais e cinquenta centavos) referentes às contribuições patronais, consoante a conclusão exarada na Prestação de Contas nº TCE-PE nº 0810062-7. Narra a parte autora que a Receita Federal procedeu à constituição definitiva do crédito tributário, por meio das NFLDs Debcad números 372453490 e 372453503, tendo o Município de Condado/PE requerido o parcelamento dos referidos débitos, conforme o processo administrativo nº 14770.720014/2013-60, com retenção dos valores das prestações do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). O Ministério Público Federal defende, ainda, que a conduta do réu implica a prática de atos de improbidade administrativa que causaram prejuízo ao erário (Art. 10, caput e inciso X, da Lei nº 8.429/92), bem como, subsidiariamente, atos de improbidade que atentam contra os princípios da administração pública, em face da previsão do art. 11, caput e inciso II, da Lei nº 8.429/92. Foram apresentados os documentos relativos ao processo de Prestação de Contas nº TCE-PE nº 0810062-7 (Id. 901.614 ao 901.768), bem como os concernentes à Notícia de Fato (Id. 901.789 ao 901.806). Devidamente notificado para oferecer manifestação por escrito (Art. 17, §7º, da Lei nº 8.429/92), o demandado deixou transcorrer in albis o prazo para cumprimento do mister (Id. 1.088.507).
  • 2. A União manifestou seu desinteresse em integrar a lide (Id. 1.178.811). Decisão exarada no id. 1.310.283 recebeu a petição inicial e determinou a citação do réu. Citado, o réu apresentou contestação (Id. 1.403.624), em que aduziu, em síntese: (i) ao assumir a administração municipal, em janeiro de 2005, deparou-se com situação de desmando e desorganização de grande proporção, como também dificuldades financeiras; (ii) diante do quadro relatado, priorizou a liquidação dos débitos remanescentes da administração anterior relativos à folha de pagamento de pessoal; (iii) priorizou, ainda, com aportes financeiros mensais o Regime Próprio de Previdência (RPPS); (iv) havia comprometimento mensal da receita do município da ordem de 9% (nove por cento), destinado ao pagamento de parcelamentos realizados com o INSS, CELPE, COMPESA, Telefonia, FUNPRECON, Precatórios, PASEP e outros, além dos gastos administrativos em geral, estes, da ordem de 40% (quarenta por cento) da receita; (v) houve oscilação da receita, no tocante aos repasses do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), única fonte de recursos financeiros, e redução do fator de 1.4 para 1.2; (vi) que o parcelamento do débito previdenciário abrangeu dívida, inclusive, do ano de 2003. Designada audiência de instrução e julgamento, foram ouvidas as testemunhas Ivadelci Hipólito de Medeiros Filho e Tatiana Gomes da Silva, bem como tomado o depoimento pessoal do réu (Id. 1.852.232). O Ministério Público Federal apresentou razões finais, consoante o identificador 1.881.578. É o relatório II - FUNDAMENTAÇÃO O cerne da presente lide reside em saber se a conduta do réu, consistente em efetuar os descontos das contribuições previdenciárias das remunerações pagas aos servidores, sem o devido repasse à Previdência, como também o não recolhimento das contribuições patronais, configurou ato de improbidade administrativa, a merecer as reprimendas contidas na Lei nº 8.429/92. Veja-se. A Carta da República, no art. 37, caput, dispõe que a administração pública direta e indireta deve obedecer aos princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência, estabelecendo, no § 4º do mesmo dispositivo, que "os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, da forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível". Sabe-se que o conceito de improbidade, assim denominado pela Carta Magna o ato lesivo à moralidade administrativa, está intimamente ligado à necessidade de o agente público agir sempre, impreterivelmente, com honestidade e em atendimento aos interesses públicos, sem aproveitar-se indevidamente dos poderes e facilidades que lhes são conferidos no exercício de mandato, função, emprego ou cargo público.
  • 3. Segundo Maria Sylvia Zanella di Pietro, para que o ato de improbidade administrativa possa acarretar a aplicação das medidas sancionatórias presentes no art. 37, § 4.º, da CR/88, devem estar presentes determinados elementos, quais sejam: o sujeito passivo ser uma das entidades mencionadas no art. 1.º da Lei n.º 8.429/92; o sujeito ativo ser um agente público ou terceiro que induza ou concorra para a prática de ato de improbidade ou dele se beneficie; a ocorrência de ato danoso causador de enriquecimento ilícito para o sujeito ativo, prejuízo para o erário ou atentado contra os princípios da Administração Pública e a presença de elemento subjetivo: dolo ou culpa.[1] Analiso a presença desses componentes no caso em tela. O art. 1º da Lei n.º 8.429/92 explicita quais os entes administrativos passíveis de sofrer a prática de um ato de improbidade: Art. 1° Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei. Parágrafo único. Estão também sujeitos às penalidades desta lei os atos de improbidade praticados contra o patrimônio de entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, de órgão público bem como daquelas para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com menos de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, limitando-se, nestes casos, a sanção patrimonial à repercussão do ilícito sobre a contribuição dos cofres públicos. Observe-se que aí estão relacionados os órgãos da administração direta, à qual pertence a municipalidade pretensamente atingida pelas irregularidades elencadas na exordial. A mesma lei dispõe, nos arts. 2º e 3º, aqueles que podem ser sujeito ativo do ato de improbidade administrativa: Art. 2° Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior. Art. 3° As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta. Aperfeiçoado igualmente esse requisito, vez que o réu era, à época da ocorrência dos atos descritos na vestibular, prefeito do município de Condado/PE, fato incontroverso nos presentes autos. Resta, assim, apurar a ocorrência dos demais elementos, quais sejam: a ocorrência do ato ímprobo e a prática deste com dolo ou culpa, conforme o tipo de improbidade.
  • 4. Sabe-se que, nos termos do disposto nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429/92, os atos de improbidade administrativa compreendem 3 (três) modalidades, quais sejam: a) os que importem enriquecimento ilícito; b) os que causam prejuízo ao erário; c) os que atentam contra os princípios da Administração Pública. In casu, pretende-se a imputação aos demandados de ato de improbidade causador de dano ao erário, previsto na primeira parte do art. 10, caput e inciso X, e do art. 11, caput e inciso II, da Lei de Improbidade Administrativa. In verbis: "Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: (...) X - agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz respeito à conservação do patrimônio público; (...) "Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: (...) II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício". No caso dos autos, a acusação do Ministério Público acerca da omissão quanto ao repasse das contribuições previdenciárias descontadas dos servidores do município, como também a parcela patronal, trata-se de ponto incontroverso, uma vez que o próprio demandado reconhece a ilicitude do ato, embora não lhe atribuam a qualidade de ímprobo. Extrai-se dos autos que, de fato, foram efetuados descontos de contribuições previdenciárias na folha de pagamento dos servidores do município de Condado/PE, sem o devido recolhimento aos cofres da Previdência Social, bem como não foram recolhidas contribuições patronais. É o que se verifica das NFLDs Debcad números 37245349-0 e 372453503. Infere-se que o município, à época dos fatos, possuía regime próprio de previdência, vez que este fora implantado no ano de 2003. Contudo, as irregularidades constatadas referem-se tanto a contribuições de servidores sem vínculo efetivo, que não integram o RPPS (FUNPRECON), como também aquelas relativas ao regime geral (RGPS). Estas, objeto da presente ação. Caracterizada, portanto, a ilicitude praticada, resta averiguar se a referida conduta possui o condão de caracterizar-se como ato de improbidade administrativa, nos moldes
  • 5. previstos no art. 10, caput e inciso X, e art. 11, inciso II, da Lei de Improbidade Administrativa. No que concerne ao art. 10, que define o ato de improbidade que acarrete lesão ao erário, não obstante a gravidade da conduta praticada, há que se reconhecer a não ocorrência de dano patrimonial aos cofres da Previdência, tendo em vista a existência de parcelamento do débito pelo município junto à Receita Federal do Brasil, na esteira dos posicionamentos doutrinário e jurisprudencial a respeito da questão: Além da ilegalidade, é requisito de sua configuração a ocorrência de efetivo dano material aos cofres públicos. Nem o prejuízo presumido nem o dano moral serve para sua caracterização. Pelo contrário, sem a prova da perda patrimonial certa não se verifica esse tipo de improbidade administrativa, restando ao autor da ação civil respectiva responsabilizar o agente público, desde que comprove que sua conduta funcional antijurídica infringiu os princípios constitucionais reguladores da Administração Pública, por violação do art. 11 da LIA.[2] Nesse sentido, a RFB, por meio do Ofício nº 946/2014, de 02/12/2014 (Id. 901.806), informou que o município de Condado/PE requereu, em 26/03/2013, e foi deferido o parcelamento da totalidade dos débitos, com adimplemento das parcelas por meio de retenção de valores do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), na forma do caput do art. 1º da Lei nº 12.810/2013. Não se trata, ademais, de condutas que possam ser enquadradas na hipótese do ato de improbidade administrativa inserto no inciso X do art. 10, da Lei nº 8.429/92: "X - agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz respeito à conservação do patrimônio público;" É que não se cuida de arrecadação de crédito tributário do município, mas de crédito previdenciário. Em que pese a previsão dos artigos 15, inciso I, e 30, inciso I, "a", da Lei 8.212/91, o sujeito ativo da obrigação tributária é a União. O município, equiparado a empresa para essa finalidade, é apenas o responsável tributário. Veja-se o precedente: "Processual Civil e Administrativo. Recurso do demandante, em ação civil pública por improbidade administrativa, buscando a condenação do demandado, ex-prefeito de Palmares, por omissão no recolhimento de contribuições previdenciárias, na invocação do art. 10, inc. X, e subsidiariamente, no art. 11, inc. II, da Lei 8.429, de 1992, ante decisão que indefere a inicial, por já ter o município celebrado acordo de parcelamento com a Previdência, não subsistindo prejuízo ao erário federal. A omissão no recolhimento de contribuições previdenciárias não se encaixe no art. 10, inc. X, da Lei 8.429, nem tampouco, no art. 11, inc. II. Primeiramente, várias pedras se colocam no caminho da pretensão embutida na inicial. A primeira, na falta de legitimidade do demandante, visto a ausência de prejuízo de ente federal, ante a celebração de parcelamento, o que, de logo, afasta o interesse federal, apunhalando a legitimidade do autor-apelante. Não bastasse, depois, se deve buscar o perfeito enquadramento dos fatos - omissão no recolhimento das contribuições previdenciárias -, para, depois, então, se enfrentar os argumentos do apelo. A omissão no recolhimento das contribuições previdenciárias não se acomoda, com naturalidade, no agir
  • 6. negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz respeito a conservação do patrimônio público. Não se cuida de arrecadar tributos ou renda, mas de deixar de recolher aos cofres da Previdência Social a contribuição devida relativa aos seus servidores. Contudo, é na gaveta do art. 10, inc. X, que a conduta tem sido colocada, como se observa do único julgado citado neste sentido, f. 228. Já o art. 11, inc. II, enfatiza o retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício.Também não há como proceder ao encaixe, por uma questão bem singela. O ato de ofício em foco só se reveste de improbidade [administrativa] quando o retardar ou o deixar de praticar se verifica de modo indevido. Ou seja, se há motivo, que justifique o retardar ou o deixar de praticar, o ato não se cobre de nenhuma cor da improbidade. Aqui, contudo, a omissão no recolhimento das contribuições previdenciárias, que é obrigação de lei, porque o regime da previdência social vive do que arrecada para poder cumprir seus fins, não há como adentrar no campo subjetivo para verificar o motivo pelo qual o ente público deixou de recolher as contribuições previdenciárias. Não há, assim, proceder ao enquadramento no art. 10, inc. X, nem tampouco, subsidiariamente, no art. 11, inc. II. Imperioso observar que nem toda conduta, praticada pelo administrador público, se transforma em improbidade administrativa catalogada pela Lei 8.429. Necessário, para tanto, que o enquadramento se faça de maneira perfeita, via parto natural, não se admitindo o encaixe através de fórcipe, ou no martelo, ou seja, na força. Em consequencia, as razões recursais do apelante se revelam frágeis em contato com a realidade do não enquadramento. Improvimento do apelo." (AC 00124463420134058300, Relator Desembargador Federal Vladimir Carvalho, TRF5, 2ª Turma, DJE - Data: 06/03/2015, pág. 40) [Destaquei] Pois bem. O demandado alegou em sua defesa, em síntese: (i) ao assumir a administração municipal, em janeiro de 2005, deparou-se com situação de desmando e desorganização de grandes proporções, como também dificuldades financeiras; (ii) diante do quadro relatado, priorizou a liquidação dos débitos remanescentes da administração anterior relativos à folha de pagamento de pessoal; (iii) priorizou, ainda, com aportes financeiros mensais o Regime Próprio de Previdência (RPPS); (iv) havia comprometimento mensal da receita do município da ordem de 9% (nove por cento), destinado ao pagamento de parcelamentos realizados com o INSS, CELPE, COMPESA, Telefonia, FUNPRECON, Precatórios, PASEP e outros, além dos gastos administrativos em geral, estes, da ordem de 40% (quarenta por cento) da receita; (v) houve oscilação da receita, no tocante aos repasses do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), única fonte de recursos financeiros, e redução do fator de 1.4 para 1.2; (vi) que o parcelamento do débito previdenciário abrangeu dívida, inclusive, do ano de 2003. Em que pese ter o Ministério Público de Contas do Estado opinado pela rejeição das contas e julgamento irregular delas, relativas ao exercício financeiro de 2007, o que de
  • 7. fato restou decidido pelo Tribunal de Contas do Estado, não se extrai da documentação acostada aos autos, notadamente do id. 901.792, qualquer alusão à prática de atos realizados com dolo ou má-fé. Na verdade, verifica-se dos relatórios e pareceres examinados, tão somente a constatação de ausência de recolhimento de contribuições previdenciárias descontadas dos servidores, dos regimes RPPS e RGPS. Veja-se. Com efeito, consta dos itens 2.2. Ausência de informações obrigatórias nos documentos da prestação de contas e 2.3. Irregularidades contábeis (item 5.3 do relatório de auditoria) - Id. 901.792: "Segundo a Auditoria, alguns documentos insertos na prestação de contas contêm informações incompletas, a exemplo de: a) ofício de encaminhamento da prestação de contas da Câmara Municipal; b) demonstrativo da movimentação dos bens patrimoniais; c) relação de campanhas publicitárias realizadas; d) resumo geral consolidado das folhas de pagamento dos segurados vinculados ao RPPS; e) comprovantes de repasses das contribuições devidas ao RPPS. (...) Apesar de não terem sido apresentadas as informações omitidas, à oportunidade de exibição da Defesa, deve-se reconhecer a ausência de prejuízos daí decorrentes para a ação do controle externo, razão pela qual, considerando, ainda, inexistência de evidência de dolo ou má fé por parte do gestor, deve o vício propiciar apenas a aposição de ressalvas, com expedição de recomendação à atual Administração Municipal, com vistas a sua não repetição em exercícios futuros." "A equipe técnica realizou a análise comparativa nos demonstrativos contábeis acostados aos autos do processo, detectando as seguintes irregularidades caracterizadoras da falta de transparência e de confiabilidade nos demonstrativos verificados: a. Diferenças em saldos de contas no Balanço Patrimonial- 2007 (item 3.3. do Relatório de Auditoria); b. Ausência de reconhecimento de dívida junto à Celpe, no valor de R$ 956.091,24 (item 4.6. do Relatório de Auditoria); c. inconsistência das contabilizações das contribuições previdenciárias devidas ao RPPS e RGPS (itens 5.4.1. e 5.4.2. do Relatório de Auditoria). (...) Assim, considerando que não se vislumbra no caso vertente o dolo de gestor de mascarar a real situação da Prefeitura, opino que fique a falta restrita ao campo das ressalvas e recomendações."
  • 8. [Destaquei] As alegações de defesa do demandado encontram eco, como se vê, na vasta documentação carreada aos autos Nesse contexto, a conclusão a que se chega é que a conduta do réu, na gestão municipal em tela, está recheada de irregularidades e ilegalidades. Contudo, no caso sob exame, não é possível chancelar tais irregularidades/ilegalidades como atos ímprobos, a merecer a aplicação das severas reprimendas estabelecidas pela LIA. Seguindo essa linha de raciocínio, não se pode confundir meras irregularidades e/ou ilegalidades com improbidade, porquanto ausente, ou não demonstrado, o elemento volitivo - o dolo Essa inferência não discrepa da percepção oriunda dos depoimentos colhidos em audiência. A testemunha Ivadelci Hipólito de Medeiros Filho, Contador, afirmou: (i) "o motivo do não repasse das contribuições foi falta de disponibilidade financeira; tem conhecimento de que sempre houve, mesmo nas gestões anteriores de Condado, falta de repasse"; (ii) "o prefeito nunca disse para não recolher as contribuições, apenas não havia capacidade financeira"; (iii) "trabalhou em outras gestões - enfrentou a mesma situação - sempre houve parcelamento"; (iv) "documentos contábeis anteriores já registravam débitos escriturados não repassados, objeto de parcelamento"; (v) "priorizava educação e saúde - metas constitucionais"; (vi) "a despesa total com servidores ficava sempre acima de 50% da receita do município"; (vii) "havia contratações temporárias ou cargos comissionados nas área de saúde e educação, mas em menor número do que os concursados"; Por sua vez, a testemunha Tatiana Gomes da Silva, do Controle Interno do município, afirmou: (i) nas reuniões de que participava, costumavam falar da crise, de parcelamento do INSS e da prioridade de pagamento dos servidores; (ii) havia muita queda de receita do município; (iii) havia aproximadamente 500 servidores concursados e aproximadamente 50 comissionados;
  • 9. (iv) era necessário realizar contratações temporárias para situações excepcionais. Ora, é evidente a conduta irregular e ilegal do demandado. Contudo, não é possível a chancela de ato ímprobo. Conquanto ilegal a conduta, inexiste prova da desonestidade ou do proveito próprio ou de outrem (a situação caótica do município e as consequências decorrentes desse caos não bastam à configuração do ato ímprobo). Assim, as irregularidades verificadas, quanto à não observância da legislação previdenciária (Art. 15, I, e art. 30, I, "a", da Lei 8.212/91), não é motivo suficiente para ensejar o reconhecimento de improbidade administrativa. Acerca do tema, confira-se a lição de José Afonso da Silva (Curso de Direito Constitucional Positivo, 24ª edição, São Paulo, Malheiros Editores, 2005, p-669): "A probidade administrativa é uma forma de moralidade administrativa que mereceu consideração especial da Constituição, que pune o ímprobo com a suspensão de direitos políticos (art. 37, §4º). A probidade administrativa consiste no dever de o "funcionário servir a Administração com honestidade, procedendo no exercício das suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira favorecer". O desrespeito a esse dever é que caracteriza a improbidade administrativa. Cuida-se de uma imoralidade administrativa qualificada. A improbidade administrativa é uma imoralidade qualificada pelo dano ao erário e correspondente vantagem ao ímprobo ou a outrem (...)." Por outro prisma, não há que se falar na ocorrência de dano irreversível ao erário, uma vez que houve rigorosa apuração fiscal acerca dos fatos narrados na exordial, por parte da Receita Federal, consoante se infere do documento constante do id. 901.802 - Informação SAPAC/DRF/RECIFE nº 294, de 28/08/2014. Ademais, de acordo com Ofício nº 946/2014, da Receita Federal do Brasil (Id. 901.806), a totalidade do débito apurado foi objeto de parcelamento, no ano de 2013. Vejam-se os seguintes precedentes: ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS PELO MUNICÍPIO DE RIO FORMOSO/PE. EX-PREFEITA. AUSÊNCIA DE ATO REPUTADO ÍMPROBO. I. Trata-se de apelação de sentença que julgou improcedente o pedido de condenação da ré Maria das Graças Araújo Hacker, ex-Prefeita de Rio Formoso/PE, por ato de improbidade administrativa ante o não recolhimento das contribuições previdenciárias ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS. II. Sustenta o recorrente que a apelada deve ser condenada pela práticas das infrações descritas no art. 10, caput, da Lei nº 8.429/92, e, subsidiariamente, no art. 11, da mesma lei, pois na condição de Prefeita do Município de Rio Formoso/PE, deixou de recolher ao INSS os valores das contribuições previdenciárias relativas ao exercício de 2006, descontados dos funcionários, mas não repassados em sua totalidade à Previdência, posteriormente, parceladas em outra gestão da edilidade. III. A improbidade administrativa que dá ensejo à responsabilização correspondente materializa-se pelo ato marcadamente corrupto, desonesto, devasso, praticado de má-fé ou caracterizado pela "imoralidade qualificada" do agir. A conduta ilegal só se torna ímproba se revestida também de
  • 10. má-fé do agente público. IV. O ato de improbidade não deve ser confundido com o de mera irregularidade ou ilegalidade, o primeiro corresponde a uma conduta ilegal tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente. Assim, para a verificação do ato ímprobo, nos termos do art. 10, em todos os seus incisos, da Lei nº 8.429/1992, é preciso que se comprove a culpa grave na conduta do agente, e, nos termos do art. 11, do mesmo Estatuto, que seja demonstrado o dolo. V. A jurisprudência do STJ e desta Corte Regional, já vem se posicionando no sentido de que não caracteriza ato ímprobo o não recolhimento de contribuição previdenciária no afã de evitar-se lesão a um bem maior ou quando não há prejuízo para o erário. Precedentes: STJ, REsp 1206741 / SP, rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, DJe 23.5.2012; TRF 5ª Região, Apelreex 23605/PB, Des. Federal Manoel Erhardt, DJE: 07/03/2014. VI. Na hipótese, não se vislumbra elementos suficientes a levar à ré a uma condenação por ato de improbidade, seja pela falta de maiores evidências de um ato doloso, seja por não se caracterizar a situação de acessoriedade de tributo como apresentação de GFIP, uma responsabilidade que caracterize improbidade de um prefeito municipal. A conduta não ocasionou dano irreversível ao erário, uma vez que o total da importância não recolhida está sendo pago pelo Município, por meio de parcelamento tributário. VII. Apelação improvida. (AC 00092234420114058300, Relator Desembargador Federal Ivan Lira de Carvalho, TRF5, 2ª Turma, DJE: 07/04/2016, pág. 143) [Destaquei] ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EX-PREFEITO. PRELIMINAR. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. AUSÊNCIA DE REPASSE DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS AO INSS. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS MÍNIMOS DE PROVA DA PARTICIPAÇÃO OU OMISSÃO DIRETA DO EX-PREFEITO. DESCARACTERIZADO ATO DE OFÍCIO. PARCELAMENTO. DILIGÊNCIA. NÃO DEMONSTRADO O ELEMENTO SUBJETIVO. DESCONFIGURADO ATO ÍMPROBO. APELAÇÃO PROVIDA. 1. A presente Ação de Improbidade Administrativa foi ajuizada pelo Ministério Público Federal em face de JOÃO DA SILVA LIMA NETO, prefeito do Município de Redenção (mandato de 2001 a 2004), em razão da falta de repasse ao Instituto Nacional do Seguro Social das contribuições recolhidas, relativas às folhas de pagamento de servidores comissionados, contribuintes individuais e trabalhadores temporários. 2. A sentença concluiu pela condenação do réu baseando sua decisão, em suma, nos seguintes fundamentos: (i) o parcelamento do débito afasta apenas a tipificação da conduta como ato de improbidade administrativa que importe prejuízo ao erário, podendo enquadrar-se em conduta ímproba que atente contra os princípios da Administração Pública; (ii) como não havia delegação para que um funcionário se responsabilizasse pelo repasse, tem-se que a pessoa do prefeito era o responsável direto pelo devido repasse, cuja omissão seria suficiente para comprovar a má-fé. 3. O réu apresentou apelação alegando: em sede de preliminar, a nulidade de todos os atos processuais realizados a partir da decisão relativa a desnecessidade de produção de provas, tendo em vista que a ausência de intimação das partes para apresentação de alegações finais ofendeu o contraditório e ampla defesa, contaminando os atos posteriores. Em relação ao mérito, o recorrente alegou que não houve prática de ato de improbidade administrativa por: ausência de nexo causal entre os atos do ex-prefeito e a prática do comportamento considerado ímprobo, já que o procedimento exigido deveria ter sido feito pela contabilidade e não pela pessoa do prefeito; falta de comprovação do elemento subjetivo, tanto de má-fé do gestor (dolo) quanto de displicência injustificável
  • 11. (culpa); a conduta do gestor não configurou ato ímprobo, tendo sido, inclusive, posteriormente confessado e remediado, com o parcelamento da dívida. Alega, ainda, que a condenação depende de prova robusta, no entanto, a decisão baseou-se em simples especulação. 5. Apresentadas contra-razões pelo Ministério Público Federal, todos os pontos da apelação foram rebatidos; alegou, ainda, descaso do prefeito com sua obrigação legal, pois a falta de repasse só deveria ser aceita caso restasse demonstrado o emprego emergencial dos recursos, o que não houve. 6. No tocante a preliminar arguida pelo apelante, convém confirmar o entendimento pacífico no sentido de que é cabível o julgamento antecipado da lide em sede de ação de civil pública, sem que haja, com isso, o cerceamento de defesa. E, dada a similaridade da ação de improbidade administrativa com a seara criminal, faz-se oportuno orientar-se pelo teor da súmula 523 do STF, que estabelece que ainda que se considerasse cerceamento de defesa pela falta de intimação para alegações finais, não caberia suscitar a nulidade absoluta se não restasse demonstrado que a referida deficiência acarretou em prejuízo para o réu. Portanto, não tendo sido apresentado o efetivo prejuízo do réu decorrente da falta de alegações finais em relação às conclusões da sentença atacada, tem-se como afastada a preliminar levantada no apelo. 8. Adiante, o cerne da controvérsia passa a consistir na verificação da existência de ato de improbidade administrativa na conduta do réu. 9. É certo que a Lei 8.112/91 (art. 15, I e art. 30, I, "a") estabelece que a responsabilidade pelo recolhimento da contribuição previdenciária dos seus empregados é do Município. Contudo, é razoável considerar que, diante da necessidade de delegação de atividades administrativas na gestão, tais repasses são, em tese, de responsabilidade imediata da área responsável pela contabilidade da prefeitura. Merece análise o elucidativo julgado de caso semelhante nesta Corte, "(...) no que se refere à conduta abraçada pelo inc. II, do art. 11, o caminho para orientar o julgador na ocorrência ou não de ato de improbidade administrativa repousa na interpretação que a expressão - ato de ofício -, utilizado no inc. II, do art. 11, da Lei de Improbidade Administrativa, denota. O ato de ofício abarca todos os atos inerentes ao cargo de prefeito, - no caso é um prefeito o demandado - com conotação política, entendida esta como ampla liberdade para praticar o ato sem estar adstrito a qualquer norma. Ou seja, atos exclusivamente do cargo, que só pelo prefeito, no caso, podem ser praticados, não se admitindo, desta forma, delegação nem transferência do ato a qualquer secretário ou servidor municipal. O ato de ofício é exclusivamente do prefeito, de sua vontade pessoal, como, v. g., nomear diretor de uma escola municipal, escolher um secretário, enviar uma mensagem de lei para a Câmara de Vereadores,etc. A descrição dos atos na douta sentença apelada, f. 1081, exibe feitos de cunho meramente administrativo, que não são realizados diretamente pelo prefeito, mas por servidores do Município, em seus diversos setores, não estando arrolados como privativos do prefeito. Não são, portanto, atos de ofício." (AC554902/CE, Tribunal Regional Federal - 5ª Região, 2ª Turma, Rel.: Desembargador Federal Vladimir Carvalho, DJE 29/05/2013, Decisão por Maioria). 10. Não se pretende afirmar que, no caso concreto, o prefeito não tem responsabilidade sobre os atos de sua gestão. A responsabilidade, no caso, é derivada da condição de ordenador de despesas e gestor, e não imediata de seus atos de punho próprio, o que impõe tratamento distinto. Porquanto, para recair sobre o apelante a pretensa responsabilidade, haveria de restar demonstrado que ele agiu diretamente ou, ao menos autorizou de maneira expressa, a retenção dos recursos. 11. Portanto, em que pese a responsabilidade do prefeito pelo gerenciamento dos recursos públicos do respectivo Município, não se pode, de forma objetiva, atribuir a responsabilização pela conduta ímproba de todas as
  • 12. irregularidades passíveis de ocorrer no âmbito da administração municipal, sem que haja elementos probatórios suficientes que o vincule diretamente a tais condutas ímprobas. 12. Desconfiguradas as ações do apelante com "ato de ofício", resta afastado o enquadramento no inciso II do art. 11 da LIA. 13. No tocante ao elemento subjetivo, tem-se que a própria sentença atacada reconheceu que a adesão ao programa de parcelamento demonstrou a intenção do prefeito em solucionar a irregularidade fiscal. Diante da irregularidade reconhecida, o apelante agiu de maneira diligente dentro dos parâmetros legais. Não restou demonstrado que o parcelamento trouxe algum benefício para o gestor ou para qualquer outro agente público ou particular, nem que a verba não tenha sido utilizada para outra destinação. 14. No caso concreto, seria forçoso considerar que houve intenção, por parte do prefeito, de agir em desconformidade com a moralidade pública. Mais coerente compreender que sua conduta decorreu de inabilitação ou despreparo escusável, desprovida de dolo, má-fé ou culpa grave. 15. Destarte, ausente o elemento subjetivo da conduta do prefeito, não há se falar em improbidade administrativa, tendo em vista que "afigura-se indispensável a presença do dolo ou culpa do agente para ensejar a aplicação das sanções previstas na Lei n. 8.429/1992, sendo insuficiente, para tanto, meras irregularidades administrativas" (REsp 1186435/DF, Superior Tribunal de Justiça, Rel. Min. OG FERNANDES, 2ª TURMA, DJe 29/04/2014). 16. Afastada a condenação do réu. Apelação provida. (AC 200981000128143, Relator Desembargador Federal Manoel Erhardt, TRF5, 1ª Turma, DJE: 16/04/2015, pág. 76) [Destaquei] PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EX-PREFEITO. OMISSÃO NO RECOLHIMENO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS E AUSÊNCIA DE DECLARAÇÃO NA GUIA DE RECOLHIMENTO DO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO E INFORMAÇÕES À PREVIDÊNCIA SOCIAL - GFIP. OMISSÃO DE INFORMAÇÕES. INEXISTÊNCIA DE DANO. DÉBITO PARCELADO. NÃO DEMONSTRADO DOLO OU MÁ-FÉ NA CONDUTA DO AGENTE. ATO DE IMPROBIDADE INCONFIGURADO. 1. A omissão no recolhimento de contribuição previdenciária, objeto de parcelamento posterior, e de informações na GFIP do Município, bem como de obrigações acessórias, sem a demonstração de dolo ou má-fé na conduta do agente público, não caracteriza ato de improbidade. 2. O ato de improbidade administrativa não pode ser entendido como mera atuação do agente público em desconformidade com a lei. A intenção do legislador ordinário na produção da norma (Lei n. 8.429/92), em observância ao texto constitucional (CF, art. 37, § 4º), não foi essa. Mas sim a de impor a todos os agentes públicos o dever de, no exercício de suas funções, pautarem as suas condutas pelos princípios da legalidade e moralidade, sob pena de sofrem sanções pelos seus atos considerados ímprobos. 3. A improbidade administrativa, no ato contra a legalidade, deve ter relação com a falta de boa-fé, com a desonestidade. É que a Lei n. 8.429/92, além de coibir o dano material advindo da prática de atos desonestos, busca também punir a lesividade à moral pública. 4. Imprescindível, para a caracterização do ato de improbidade, a atuação do administrador que destoe nítida e manifestamente das pautas morais básicas, transgredindo, assim, os deveres de retidão e de lealdade ao interesse público, o que não restou comprovado nos autos. 5. Não se devem confundir meras irregularidades administrativas com as graves faltas funcionais de improbidade, sujeitas às sanções da Lei n. 8.429/92. Todo ato ímprobo é um ato ilícito, irregular, mas nem todo ilícito ou irregularidade constitui-se em ato de improbidade. 6. Na espécie, não há prova de desonestidade por parte do requerido, e
  • 13. sim desrespeito à formalidade. Também não houve prejuízo. O débito é do Município, foi por ele parcelado e está sendo pago. 7. Apelação improvida. (AC 00120650720114014000, Relator Juiz Federal Pablo Zuniga Dourado (Conv.), TRF1, 4ª Turma, e-DJF1, Data: 10/11/2015, pág. 1263) [Destaquei] Acertada a consolidação dos entendimentos jurisprudenciais, pois se a própria esfera penal, ultima ratio, aceita o parcelamento como forma de suspensão das ações penais que buscam a pretensão punitiva estatal, e se a própria Receita Federal classifica o devedor-parcelante como sujeito quite com suas obrigações, a ponto de lhe emitir uma certidão positiva com efeitos negativos, a imposição de sanções da lei de improbidade administrativa, no mesmo caso, mostra-se como fortemente excessiva, pois nem mesmo a execução fiscal tem prosseguimento. Com efeito, o MPF, autor da demanda, não se desincumbiu do ônus probatório que lhe cabia, conforme a regra do art. 373, inciso I, do novel Código de Processo Civil, uma vez que não há nos autos, ainda que em sede de procedimento administrativo, qualquer prova no sentido de que houve desvio da verba pública oriunda do não recolhimento das contribuições previdenciárias. Ainda que não se possa negar a existência de conduta altamente irregular, conclui-se, portanto, que não há nos autos prova acerca da existência de dano ao erário, tanto pela análise da prova documental, como pela existência de parcelamento do débito efetuado pelo município na Receita Federal do Brasil. No que tange à pretensa violação da norma de reserva, prevista no art. 11 da Lei 8.429/92, caput e inciso II, para tanto é indispensável a presença do elemento subjetivo - dolo - para configuração do ato de improbidade ali descrito. Em razão da absoluta pertinência com o tema, transcrevo trecho do voto-vista proferido pelo Ministro MAURO CAMPBELL no Recurso Especial nº 246.746 - MG (2000/0007864-6 - 19/05/2010): "Se por negligência, imprudência ou imperícia, os administradores violam os deveres de legalidade, honestidade, imparcialidade e lealdade às instituições (que é o substrato fático que autoriza a incidência do art. 11 da Lei n. 8.429/92), por mais desaconselhável que isso seja, haverá irregularidade administrativa (e não improbidade), que também é uma infração, merecendo sanção por outras esferas de controle, tais como a de responsabilização fiscal, a dos processos administrativos disciplinares, a da fiscalização dos Tribunais de Contas e os demais mecanismos de controle interno da Administração Pública, sem embargos do não menos eficiente controle exercido pelos novéis Conselhos Nacionais de Justiça e do Ministério Público. Note-se: essas irregularidades não podem ser entendidas como um "diminutivo" dos atos de improbidade - ensejando tratamentos pejorativos, tais como "meras" irregularidades - e elas merecem combate via controles interno e externo da Administração Pública, mas não atraem a aplicação de sanções da ordem das expressas na LIA. Não se trata de ser por demais permissivo, e sim de compreender o espírito das normas que resguardam a probidade administrativa. Nesse sentido, aproveito as lições de
  • 14. Juarez Freitas acerca dos arts. 9º e 11 da LIA: "[p]ara mim, para que haja improbidade administrativa, em qualquer uma das três espécies, há dois requisitos fundamentais. [...] O juiz precisa, simplesmente, de um princípio constitucional importantíssimo chamado 'princípio da sensatez'. [...] Então, o primeiro pressuposto é que, com bom senso, se examine o seguinte: há grave violação do senso médio superior de moralidade da comunidade? [...] É a primeira e mais grave pergunta para que haja uma improbidade administrativa, dada a gravidade das sanções em relação às três espécies. [...] E o segundo requisito, inequívoca intenção desonesta. [...] A mera irregularidade, a mera ilegalidade, para mim é insuficiente para condenar alguém por improbidade administrativa" (Ação civil pública - Improbidade administrativa, Boletim de Direito Administrativo n. 5, 2005, p. 543/544)." Nessa esteira, ausente o propósito de alcançar objetivos que vão de encontro à moralidade administrativa, vez que não demonstrado o dolo ou a má-fé, não vislumbro a possibilidade de aplicação das severas sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa. Nesse contexto, não comprovado o dano ao erário a caracterizar o enquadramento no art. 10 e presente, tão somente, a culpa no ato ilegal praticado, sendo esta insuficiente ao enquadramento da conduta no art. 11 da Lei n.º 8.429/92, impõe-se a improcedência dos pedidos. III - DISPOSITIVO Em face do que se expôs, julgo improcedentes os pedidos deduzidos na inicial, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do novel do Código de Processo Civil. Sem condenação em custas processuais, em face da isenção prevista no art. 4º, inciso III, da Lei nº 9.289/96. Sem condenação em honorários advocatícios (art. 18, Lei n º 7.347/85). Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Goiana (PE), data da validação. MADJA DE SOUSA MOURA FLORÊNCIO Juíza Federal