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Cad. CEDES vol. 19 n. 44 Campinas Apr. 1998


   Uma proposta metodológica para a
 formação continuada de professores na
      perspectiva histórico-social
Francisco José Carvalho Mazzeu*



RESUMO: O texto apresenta uma proposta para a formação de professores, baseada
na pedagogia histórico-crítica. São apresentados três eixos básicos para orientar esse
trabalho: domínio dos conteúdos escolares e formas de ensinar; estudo da concepção
dialética; formação de uma nova atitude ético-política. A metodologia sugerida é
similar àquela que os professores poderão usar com seus alunos. Procura seguir os
cinco passos propostos por Saviani: a prática social, a problematização, a
instrumentalização, a catarse e a prática social.

Palavras-chave: Formação de professores, concepção dialética, pedagogia histórico-
crítica



Apresentação

O presente texto é um resultado e um instrumento de trabalho de uma equipe de
pesquisadores que foi se constituindo em função de um referencial teórico comum: a
perspectiva histórico-social. Com base nesse referencial, a equipe tem desenvolvido
pesquisas sobre a formação de professores e sobre diferentes aspectos do processo de
ensino na escola, com ênfase especial no ensino do 1º grau.

Mais recentemente, a partir do início de 1995, a equipe vem realizando estudos
sistemáticos sobre as idéias de Vigotski e seus colaboradores, através da leitura e da
discussão de textos, alguns inéditos no Brasil, buscando identificar as implicações
pedagógicas dessa corrente teórica.

O próximo passo desse grupo de pesquisadores é envolver professores da rede
pública, através de um processo de formação continuada, de modo que esses estudos
possam ser aprofundados a partir das necessidades e dos desafios do cotidiano da
escola e da sala de aula. Esse trabalho de formação continuada, dentro da perspectiva
histórico-social, implica a elaboração não só de novos conteúdos a serem explicitados
a partir dos textos de autores dessa corrente, mas de uma forma de atuar junto aos
professores que esteja coerente com esses pressupostos teóricos. Pretendo que este
texto seja uma contribuição nesse sentido e possa, portanto, estimular a reflexão de
outros educadores que têm atuado ou pretendem atuar com base nesse referencial
teórico.



Alguns pressupostos teóricos

A compreensão mais profunda do processo de formação de professores na
perspectiva aqui adotada implica uma reflexão sobre o próprio significado do
processo educativo, na sua relação com o processo mais amplo de constituição e
desenvolvimento histórico-social do ser humano.

A educação é um processo fundamental para o homem porque, ao contrário dos
outros animais, o indivíduo humano não recebe na sua herança genética toda a
herança acumulada pelas gerações anteriores no seu processo de ação sobre a
realidade.

Sendo assim, aquilo que caracteriza, de fato, um indivíduo humano, do ponto de vista
histórico e social, é o seu ser genérico, ou seja, a herança cultural da humanidade, da
qual esse indivíduo vai se apropriando ao longo de sua existência e que contribui para
expandir.

Como se constitui essa herança cultural? Através do processo de apropriação e
objetivação que caracteriza a atividade humana (cf. Duarte 1993, p. 27 ss.). O
homem, ao agir sobre a realidade, apropria-se dos elementos naturais, transformando-
os em objetos humanos. Nessa atividade, cria conhecimentos e habilidades que
permitem reproduzir esses objetos e produzir novos objetos. A cultura humana
acumula-se tanto nos objetos em si quanto na linguagem (em suas várias formas) e
nos usos e costumes. A história da humanidade tem se caracterizado por esse
processo de apropriação subjetiva da realidade, na forma de idéias, conhecimentos,
imagens etc. e na criação de objetivações (produtos gerados a partir dessas idéias ou
de sua transformação).

Também a história de cada indivíduo humano está marcada por esse processo na
medida em que cada um precisa se apropriar da cultura acumulada pelas gerações
anteriores, mas ao mesmo tempo precisa criar novas objetivações correspondentes às
suas idéias e aos desafios de seu tempo. Cabe à educação propiciar que tal
apropriação ocorra, bem como dotar o indivíduo de instrumentos para criar essas
novas objetivações.
Esse referencial possibilita compreender de modo articulado tanto o processo de
aprendizagem do aluno quanto o processo de formação de professores e demais
agentes da prática educativa. Freqüentemente, a análise da prática pedagógica tem se
baseado em uma dicotomia na qual se separam o processo de aprendizagem do aluno
e o processo de formação continuada de professores. Dessa dicotomização resulta a
utilização de diferentes paradigmas teórico-metodológicos para analisar esses dois
processos. Nesse aspecto, a situação atual da pedagogia parece semelhante à situação
da crise apontada por Vygotski (1991, pp.259-450) na psicologia, no que se refere à
falta de uma concepção teórica geral que dê conta das questões comuns às áreas
específicas de conhecimento, possibilitando perceber, ao mesmo tempo, a unidade e a
diversidade dessas áreas.

Embora sem ignorar essa especificidade, é fundamental compreender os processos
envolvidos na prática educativa de modo integrado, e analisá-los à luz dos mesmos
pressupostos teóricos. A perspectiva histórico-social pode dar uma contribuição para
essa tarefa, na medida em que possibilita compreender a aprendizagem do aluno
como um processo ativo, sem secundarizar a ação mediadora do professor nessa
atividade (a importância dessa ação fica clara, por exemplo, no conceito de "zona de
desenvolvimento próximo" proposto por Vigotski).

A formação continuada do professor, por sua vez, na perspectiva histórico-social
toma como base a prática pedagógica e situa como finalidade dessa prática levar os
alunos a dominarem os conhecimentos acumulados historicamente pela humanidade.
Para conseguir que os alunos se apropriem do saber escolar de modo a se tornarem
autônomos e críticos, o professor precisa estar, ele próprio, apropriando-se desse
saber e tornando-se cada vez mais autônomo e crítico.

Portanto, a formação continuada é analisada neste trabalho com base no conceito de
humanização (cf. Duarte 1993, p. 57 ss.). Esse conceito, no meu entender, possibilita
uma compreensão mais ampla e profunda dessa formação do que outros conceitos
como o de profissionalização, quer essa profissionalização seja entendida sob um
enfoque funcionalista (como uma equiparação do professorado a categorias
profissionais com mais vantagens no âmbito da sociedade atual, como os médicos,
por exemplo) quer essa profissionalização seja compreendida apenas como aquisição
de uma postura prático-reflexiva ou crítico-reflexiva, na qual não seja dado o devido
peso ao processo de apropriação, pelo professor, do saber acumulado historicamente.

A humanização do trabalho docente implica uma ampliação da autonomia do
professor e, ao mesmo tempo, uma apropriação, por ele, de conhecimentos,
habilidades e valores fundamentais da cultura existente, bem como de conhecimentos
necessários para assegurar aos alunos a apropriação ativa e criativa dessa cultura.
Essa humanização está limitada por relações e formas de ação no âmbito da prática
pedagógica, que refletem a influência de relações mais amplas, em outras instâncias
da prática social.
A separação entre significado e sentido do trabalho docente, separação essa que faz
com que o professor e a escola muitas vezes percam de vista os fins sociais de sua
existência, decorre de relações de dominação existentes na própria estrutura da
sociedade. Apostar nas possibilidades da escola como instância que pode contribuir
para uma transformação da sociedade não significa retomar a crença ingênua na
escola como "redentora da humanidade", mas buscar a identificação e a exploração
de limites e possibilidades oferecidos pelas condições existentes para promover as
transformações possíveis nessas condições.

Esse processo requer, por parte dos educadores envolvidos na escola, um processo
permanente e sistemático de reflexão. No entanto, tendo em vista esse caráter
complexo e contraditório do processo educativo no qual os pólos opostos como as
dimensões reprodutora e transformadora da escola, a apropriação e a criação se
complementam em lugar de se excluir, entendemos que uma reflexão inspirada no
pensamento dialético tem melhores condições de compreender os problemas do
aprendizado escolar e da formação continuada de professores, e, conseqüentemente,
encontrar soluções viáveis para esses problemas.

Em síntese, o processo de formação continuada de professores que se está propondo
aqui centra-se em três eixos básicos:

• o domínio do saber acumulado no que se refere ao conteúdo escolar e às formas de
ensiná-lo;

• o domínio da concepção dialética como meio de desenvolver uma ação e reflexão
autônomas e críticas;

• a formação de uma postura ético-política guiada por sentimentos e valores que
possibilitem ao professor utilizar esse saber acumulado como meio para o
desenvolvimento pleno do aluno e para seu próprio desenvolvimento como ser
humano.



Propostas de ação

A orientação metodológica a ser sugerida neste texto será baseada na discussão
desenvolvida por Saviani (1984, p. 71) a propósito dos métodos de ensino, na qual o
autor sugere uma seqüência de trabalho composta de cinco passos que se articulam.
Esses "passos", sem serem encarados como fórmula ou orientação rígida, podem
fornecer um importante subsídio para uma direção do processo pedagógico na
perspectiva do desenvolvimento pleno de alunos e educadores. Essa seqüência tem
servido de referência tanto para a elaboração de propostas para o ensino dos
conteúdos escolares, quanto para a orientação do trabalho formativo com os
professores, de modo que eles vivenciam nesse trabalho um processo análogo ao que
poderão realizar com seus alunos. Os passos sugeridos pelo autor são: a prática
social, a problematização, a instrumentalização, a catarse e a prática social.



A prática social

Dentro da perspectiva histórico-social, o conceito de prática social envolve o
processo mais amplo através do qual a humanidade vai produzindo e reproduzindo as
condições (materiais e ideais) e as relações sociais que possibilitam sua existência.
Nessa perspectiva, a prática social do professor não se identifica com a prática
cotidiana, nem com a experiência de cada indivíduo. A prática social tem como
aspecto central exatamente a relação contraditória entre o cotidiano e o não-cotidiano,
bem como a relação entre a experiência de cada um e as experiências acumuladas
pelo conjunto da sociedade ao longo de sua história. São essas relações contraditórias
que estão no ponto de partida da formação de professores, uma vez que essa
formação ocorre nessa prática social e não apenas no momento em que o professor
recebe algum tipo de curso. Segundo Vieira Pinto (PInto 1982, p. 109):

O educador deve compreender que a fonte de sua aprendizagem, de sua formação, é
sempre a sociedade. Mas esta atua de dois modos: um, indiretamente, mas que
aparece ao educando (futuro educador) como direto (pois é aquele que sente como
ação imediata): é o educador, do qual recebe ordenadamente os conhecimentos. E
outro, diretamente, ainda que apareça ao educando (futuro educador) como indireto,
pois não o sente como pressão imediatamente perceptível: é a consciência, em geral,
com o meio natural e humano no qual se encontra o homem e do qual recebe os
estímulos, os desafios, os problemas que o educam em sua consciência de educador.

Compreender a formação do educador nessa perspectiva conduz a uma abordagem da
questão do saber desenvolvido pelo professor, na qual se busca superar tanto a
negação desse saber, quanto uma valorização que não considera seus limites e acaba
reificando esse saber. Nessa questão é fundamental a idéia de que a prática cotidiana
do professor é movida pelo senso comum pedagógico, o qual é constituído de
fragmentos de teorias, assimilados geralmente sob a forma de clichês. O senso
comum acaba criando a ilusão de um domínio das "teorias" cujos elementos ele
incorpora. O professor que está imerso na sua prática muitas vezes não percebe a
necessidade de romper com essa relação imediata entre pensamento e ação, o que
leva a uma rejeição da reflexão filosófica e das teorias educacionais mais elaboradas.
O professor em formação assume, muitas vezes uma postura semelhante à do homem
comum, o qual, segundo Vazquez (1968, p. 14), "vê a si mesmo como ser prático que
não precisa de teorias; os problemas encontram sua solução na própria prática, ou
nessa forma de reviver uma prática passada que é a experiência".
Portanto, partir da prática social na formação de professores implica não só um
conhecimento da experiência de cada professor, de sua memória, de seu saber prático,
mas uma ruptura com a forma de pensamento e ação próprios do cotidiano.

Uma das formas essenciais para promover essa ruptura consiste em levar o professor
a se apropriar cada vez mais do saber acumulado historicamente, especialmente dos
conceitos científicos e das formas artísticas de apreender a realidade. Vygotski
(1979), ao analisar o processo de formação de conceitos, aponta essa função
mediadora dos conceitos científicos na superação dos conceitos espontâneos. Luria
(1990), a partir de pesquisa com adultos pouco escolarizados, mostra a importância
dos conhecimentos elaborados, transmitidos na escola, para a superação da forma
prático-utilitária de perceber a realidade.

Como promover uma apropriação significativa do saber acumulado, por parte dos
professores em formação? Como desencadear um processo de reflexão que supere,
sem ignorar, a experiência cotidiana desses professores?



A problematização

Segundo Saviani (1985, p. 17) a necessidade de refletir filosoficamente evidencia-se
quando o ser humano se encontra diante de uma situação problemática:

Com efeito, todos e cada um de nós nos descobrimos existindo no mundo (existência
que é agir, sentir, pensar). Tal existência transcorre naturalmente, espontaneamente,
até que algo interrompe o seu curso, interfere no processo alterando a sua seqüência
natural. Aí, então, o homem é levado, é obrigado mesmo, a se deter e examinar,
procurar descobrir o que é esse algo. E é a partir desse momento que ele começa a
filosofar. O ponto de partida da filosofia é, pois, esse algo a que damos o nome de
problema.

A problematização, nesse sentido, precisa ser entendida não apenas como
identificação das necessidades que a prática cotidiana coloca para o professor, e que
são por ele captadas, ou como levantamento dos temas que emergem de sua
experiência anterior ou de sua história de vida, mas também (e sobretudo) como
criação de necessidades novas e como colocação de novos temas como objeto de sua
reflexão, em função de necessidades da prática social.

Esses temas e necessidades, para que possam romper com a forma cotidiana de
apropriação (que o professor já possui), precisam ser apresentados não como algo
natural, como simples "atividade" ou como informações, mas sim como situações a
serem superadas, como objeto com o qual é preciso estabelecer uma relação
consciente para que se possa apreendê-lo.
A problematização implica levar o professor a tomar contato com os conhecimentos
acumulados de uma forma tal que:

- seja levado a considerá-los como produtos da atividade humana, como respostas
encontradas e selecionadas (dentre um elenco de possibilidades) para resolver
determinados impasses;

- atue perante esses conteúdos movido pela necessidade de promover seu próprio
desenvolvimento como ser genérico, isto é, como membro da comunidade humana e
não como ser particular, movido apenas por interesses prático-utilitários;

- perceba esses conteúdos como instrumentos necessários (tanto individualmente
como coletivamente) para a libertação em relação a condições opressoras e para a
ampliação das possibilidades de escolha em relação ao seu próprio futuro. Além de
condição para a liberdade, é preciso mostrar que a apropriação de novos
conhecimentos pode ser um momento de exercício dessa liberdade, na medida em
que a apropriação efetiva de determinados conteúdos requer a realização de escolhas
e a tomada de decisões.

A formação de professores aqui proposta toma como ponto de partida os problemas
enfrentados pelos professores na tentativa de assegurar o domínio efetivo do saber
escolar pelos alunos. Parte, portanto, das próprias dificuldades de aprendizagem da
criança, considerando-as como desafio cuja superação possibilita o crescimento do
professor na medida em que revela suas próprias dificuldades, seja em relação ao
conteúdo escolar, seja em relação aos procedimentos de ensino. Como explica Vieira
Pinto (1982, pp. 21-22),

O caminho que o professor escolheu para aprender foi ensinar. No ato do ensino ele
se defronta com as verdadeiras dificuldades, obstáculos reais, concretos, que precisa
superar. Nessa situação ele aprende. (...) A educação implica uma modificação de
personalidade e é por isso que é difícil de se aprender, porque ela modifica a
personalidade do educador ao mesmo tempo que vai modificando a do aluno. Desse
modo, a educação é eminentemente ameaçadora. Ela consiste em abalar a segurança,
a firmeza do professor, sua consciência professoral (que teme perder o estabelecido,
que é o seu forte no plano da prática empírica) para se flexionar de acordo com as
circunstâncias. A resistência do aluno ao aprendizado é um fator de modificação da
consciência do educador, e não uma obstinação, uma incompetência.

Provocar nos professores a necessidade de dominar conhecimentos e teorias, a partir
do desafio de dar conta das dificuldades de aprendizagem dos alunos, já traz em si
alguns pressupostos da maior importância para a perspectiva histórico-social:

• que a finalidade principal do processo de ensino é dirigir a aprendizagem para
assegurar uma efetiva apropriação do saber escolar;
• que as dificuldades de aprendizagem não são uma "incompetência" do aluno, mas o
produto de determinadas condições que podem ser alteradas;

• que o professor pode ser o principal sujeito de sua própria formação, na medida em
que for capaz de tomar sua prática como objeto de reflexão crítica.

É importante ressaltar que a problematização aqui proposta não se limita a constatar
as dificuldades de aprendizagem que o professor espontaneamente identifica no
aluno, mas implica uma análise conjunta com o professor que contribua para alterar a
própria visão que possui a respeito das dificuldades do aluno. Na alfabetização, por
exemplo, é comum a identificação, pela professora, de dificuldades de aprendizagem
em relação ao sistema ortográfico ou ao desenho das letras, deixando de perceber
aspectos relacionados ao texto e às orações como um todo, tanto em termos de
significado, quanto em termos de estrutura formal.

A partir das dificuldades de aprendizagem, pode-se levantar as formas como os
professores compreendem esses problemas. Nesse momento, surgem explicações que
resultam das "teorias" que de fato estão orientando o trabalho em sala de aula. Pode-
se explorar as incoerências desse saber próprio do senso comum, buscando seu
núcleo válido e contrapondo esse núcleo válido aos elementos de diferentes
ideologias que vão deixando suas marcas no discurso pedagógico, geralmente sob a
forma de clichês esvaziados de significado. Esse núcleo válido envolve, por exemplo,
a percepção da importância dos conteúdos para a formação do aluno e da ação do
professor para a apropriação desse conteúdo. Esse núcleo válido (que precisa ser
trabalhado com vistas a superar uma prática verbalista e mecanicista) é, muitas vezes,
abafado pelo discurso escolanovista arraigado no senso comum pedagógico.

Nessa reflexão sobre as dificuldades dos alunos, os professores podem perceber suas
próprias dificuldades em relação a determinados tópicos ou componentes curriculares
do ensino básico. Perceber e admitir essas dificuldades é um passo importantíssimo
para elaborar uma nova postura perante os alunos e sua prática.

Nesse processo de problematização, o debate entre professores é de vital importância,
uma vez que no confronto de visões opostas, os interlocutores atuam como
mediadores entre cada professor e os problemas sobre os quais se está refletindo,
possibilitando a criação do que Vigotski denominou zona de desenvolvimento
próximo, ou seja, cada professor no grupo poderá elaborar análises que não elaboraria
sozinho e, a partir daí, realizar atividades que promovam e consolidem novos
patamares de desenvolvimento intelectual. Note-se que esse resultado não decorre, de
modo natural, da interação e do diálogo entre os professores, mas depende do objeto
e da forma dessa reflexão e desse diálogo. Se não se toma como ponto de partida da
reflexão os problemas essenciais da prática pedagógica, a interação entre professores
pode se deteriorar em bate-papo, sem maiores conseqüências para um avanço do
trabalho docente. A perspectiva histórico-social concebe a aprendizagem em termos
de uma relação complexa de mediação das relações sociais (mais amplas e mais
imediatas) na atividade do sujeito sobre objetivações, bem como de mediação dessas
objetivações na comunicação e nas atividades coletivas. A concepção de
aprendizagem proposta por Vigotski é, por vezes, erroneamente interpretada como
um modelo centrado apenas no dialogismo e na interação social (entendida,
geralmente no sentido construtivista, sobretudo como interação entre os pares).

Entre as principais objetivações que possibilitam compreender e buscar a superação
de situações problemáticas estão os instrumentos e os signos. A superação de
problemas de aprendizagem exige que o professor se aproprie e crie instrumentos de
trabalho (procedimentos, técnicas, materiais didáticos) e, ao mesmo tempo,
desenvolva um discurso significativo, fundamentado teoricamente, que possibilite
compreender esses problemas e reorientar a prática no sentido da superação deles.



A instrumentalização

A realização dessas atividades vai requerer a criação de novos procedimentos e,
talvez, novos materiais didáticos, o que poderá exigir a busca de novos
conhecimentos.

A instrumentalização consiste nesse processo de apropriação dos instrumentos e
signos produzidos pela humanidade, que fazem parte da herança cultural, e, ao
mesmo tempo, de criação de novos instrumentos e signos.

Essa herança cultural é constituída pelo saber (conhecimentos, informações,
conceitos, idéias, normas etc.). No entanto, o domínio desse saber requer a
assimilação de um saber-fazer (habilidades, técnicas, operações etc.). A utilização (ou
não) desse saber implica, por sua vez, um envolvimento afetivo com ele e a adesão a
valores que orientem sua utilização em benefício do desenvolvimento da humanidade
e de cada indivíduo. É preciso assimilar uma postura perante o saber.

Vale frisar que esses aspectos (conhecimentos, habilidades e valores) não estão
desvinculados. Por exemplo, as habilidades podem ser formadas através da própria
assimilação de informações dependendo da maneira como essa assimilação é feita.
Nesse mesmo processo, pelas relações que o professor estabelece com os conteúdos
escolares e com as teorias educacionais, mediado pela sua relação com os colegas,
com a direção e o sistema escolar, bem como com a sociedade como um todo, é que
se mudam e se consolidam valores e sentimentos que vão ajudar a orientar suas ações
no cotidiano da sala de aula e, até mesmo, em outras situações da prática escolar e da
prática social mais ampla.
Como esperar que um professor desperte o interesse dos alunos pela busca do
conhecimento, se ele apenas receber informações de outros agentes educacionais ou
de "especialistas" com a orientação de assimilar e aplicar na sua prática?

O desafio da instrumentalização aqui proposta consiste em levar o professor a
elaborar seus próprios instrumentos e seu discurso, através da apropriação da
produção de outros. O caminho para conseguir isso seria articular essa
instrumentalização com a reflexão sobre os problemas e as necessidades de uma
prática, que pretende assegurar o sucesso escolar e, ao mesmo tempo, propor
procedimentos, materiais didáticos e textos de fundamentação teórica que respondam
às necessidades dessa prática e não se baseiem em condições idealizadas de trabalho.

Portanto, o discurso pedagógico resultante de uma teoria educacional e os meios de
ensino coerentes com essa teoria, para que sejam apropriados pelo professor como
instrumentos de superação dos limites da prática cotidiana e do senso comum,
precisam estar atuando como mediadores na relação desse professor com sua prática
e com seus alunos. Isso só é possível na medida em que forem trabalhados de modo
sistemático e constante, a fim de que se incorporem de modo irreversível ao
pensamento e à ação do professor, passando a fazer parte, por assim dizer, "de sua
natureza". Para designar o momento em que ocorre efetivamente essa internalização,
pelo indivíduo, de conhecimentos acumulados socialmente, Saviani (1984, p. 75)
utilizou-se do conceito de catarse.



A catarse

Saviani (1984, p. 75) conceitua a catarse utilizando a definição de Gramsci, para
quem a catarse significa a "elaboração superior da estrutura em superestrutura na
consciência dos homens". Trata-se da constituição de uma espécie de "segunda
natureza", isto é, são formas de pensar e agir produzidas histórica e socialmente, que
se incorporam de tal maneira na estrutura psíquica do indivíduo que as utiliza que
aparecem como formas naturais, mas que na verdade resultam de um longo processo
educativo.

Essa internalização do pensamento, do conhecimento e do discurso dos outros não
constitui, neste caso, uma socialização na qual o indivíduo tenha que sacrificar seus
impulsos e valores para se ajustar à sociedade, mas uma criação, no indivíduo, de
impulsos cada vez mais humanos que possibilitam a formação de uma verdadeira
autonomia.

Para que esse momento da catarse realize-se na formação do professor, é essencial
que os conhecimentos, as habilidades e os valores dos quais ele se apropriou, por
meio da instrumentalização, sejam trabalhados de modo reiterado a fim de
constituírem automatismos. Por essa razão, a formação continuada de professores
precisa buscar a irreversibilidade das mudanças provocadas na reflexão e na ação dos
sujeitos envolvidos, o que demanda tempo e um esforço contínuo.

É importante ressaltar também que a formação de automatismos na perspectiva aqui
esboçada ocorre de forma consciente e reflexiva. Um dos procedimentos
fundamentais para esse processo é o momento em que, após conquistar um novo
patamar em termos de domínio de conceitos e de formas de ensino, o professor reflete
sobre a trajetória seguida, percorrendo novamente, no plano abstrato, o caminho que
realizou. Com isso, percebe mais claramente as possibilidades e os obstáculos de seu
processo de aprendizagem e, portanto, a necessidade de estar constantemente revendo
e aperfeiçoando sua forma de aprender. Com isso espera-se que cada professor
busque se tornar efetivamente o sujeito principal de sua formação.



A prática social

Como explica Saviani (1984, p. 76), "(...) a prática social referida no ponto de partida
(primeiro passo) e no ponto de chegada (quinto passo) é e não é a mesma". É a
mesma no sentido de que a transformação das formas de pensar e agir em face dos
conteúdos escolares (a partir de sua apropriação em atividades universalizantes,
conscientes e livres) não significa uma transformação das condições sociais objetivas
da escola e muito menos da sociedade como um todo. Essa transformação precisa se
dar em todas as instâncias da prática social, especialmente no âmbito da produção da
existência material. Ao mesmo tempo, a prática social já não é a mesma uma vez que
professor e alunos transformaram-se nesse processo, o que se reflete nas outras
instâncias da sociedade.



Considerações finais

A reflexão desenvolvida neste artigo baseou-se em estudos e experiências de
formação básica e continuada de professores. Atualmente, essas idéias estão servindo
de base para ações de formação continuada que estão sendo desenvolvidas em
diferentes municípios da região de São Carlos (SP).

Dado o caráter recente da divulgação do pensamento de Vigotski e outros no Brasil e
o caráter incipiente da pesquisa de suas implicações pedagógicas, considerei
importante apresentar o presente texto ainda que este se constitua apenas um esboço
para a formulação de uma proposta mais detalhada de formação de professores. No
entanto, essa proposta precisa resultar de uma articulação com experiências mais
sistemáticas e do intercâmbio com diferentes pesquisadores preocupados com o
mesmo tema.



Bibliografia

DUARTE, Newton. A individualidade para-si. São Paulo, Autores Associados, 1993.
   [ Links ]

LURIA, A.R. Desenvolvimento cognitivo. São Paulo, Ícone, 1990.     [ Links ]

PINTO, Álvaro V. Sete lições sobre educação de adultos. São Paulo, Cortez, 1982.
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_______. Educação: Do senso comum à consciência filosófica. 5ª ed. São Paulo,
Cortez, 1985.   [ Links ]

VÁZQUEZ, A.S. Filosofia da práxis. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1968.
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VYGOTSKI, L. S. Pensamento e linguagem. Lisboa, Antídoto, 1979.       [ Links ]

_______. Obras escogidas. Madri, M.E.C./Visor, 1991, 3 vols., vol.1: Incluye el
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Texto capaciação 1

  • 1. Cad. CEDES vol. 19 n. 44 Campinas Apr. 1998 Uma proposta metodológica para a formação continuada de professores na perspectiva histórico-social Francisco José Carvalho Mazzeu* RESUMO: O texto apresenta uma proposta para a formação de professores, baseada na pedagogia histórico-crítica. São apresentados três eixos básicos para orientar esse trabalho: domínio dos conteúdos escolares e formas de ensinar; estudo da concepção dialética; formação de uma nova atitude ético-política. A metodologia sugerida é similar àquela que os professores poderão usar com seus alunos. Procura seguir os cinco passos propostos por Saviani: a prática social, a problematização, a instrumentalização, a catarse e a prática social. Palavras-chave: Formação de professores, concepção dialética, pedagogia histórico- crítica Apresentação O presente texto é um resultado e um instrumento de trabalho de uma equipe de pesquisadores que foi se constituindo em função de um referencial teórico comum: a perspectiva histórico-social. Com base nesse referencial, a equipe tem desenvolvido pesquisas sobre a formação de professores e sobre diferentes aspectos do processo de ensino na escola, com ênfase especial no ensino do 1º grau. Mais recentemente, a partir do início de 1995, a equipe vem realizando estudos sistemáticos sobre as idéias de Vigotski e seus colaboradores, através da leitura e da discussão de textos, alguns inéditos no Brasil, buscando identificar as implicações pedagógicas dessa corrente teórica. O próximo passo desse grupo de pesquisadores é envolver professores da rede pública, através de um processo de formação continuada, de modo que esses estudos possam ser aprofundados a partir das necessidades e dos desafios do cotidiano da escola e da sala de aula. Esse trabalho de formação continuada, dentro da perspectiva histórico-social, implica a elaboração não só de novos conteúdos a serem explicitados
  • 2. a partir dos textos de autores dessa corrente, mas de uma forma de atuar junto aos professores que esteja coerente com esses pressupostos teóricos. Pretendo que este texto seja uma contribuição nesse sentido e possa, portanto, estimular a reflexão de outros educadores que têm atuado ou pretendem atuar com base nesse referencial teórico. Alguns pressupostos teóricos A compreensão mais profunda do processo de formação de professores na perspectiva aqui adotada implica uma reflexão sobre o próprio significado do processo educativo, na sua relação com o processo mais amplo de constituição e desenvolvimento histórico-social do ser humano. A educação é um processo fundamental para o homem porque, ao contrário dos outros animais, o indivíduo humano não recebe na sua herança genética toda a herança acumulada pelas gerações anteriores no seu processo de ação sobre a realidade. Sendo assim, aquilo que caracteriza, de fato, um indivíduo humano, do ponto de vista histórico e social, é o seu ser genérico, ou seja, a herança cultural da humanidade, da qual esse indivíduo vai se apropriando ao longo de sua existência e que contribui para expandir. Como se constitui essa herança cultural? Através do processo de apropriação e objetivação que caracteriza a atividade humana (cf. Duarte 1993, p. 27 ss.). O homem, ao agir sobre a realidade, apropria-se dos elementos naturais, transformando- os em objetos humanos. Nessa atividade, cria conhecimentos e habilidades que permitem reproduzir esses objetos e produzir novos objetos. A cultura humana acumula-se tanto nos objetos em si quanto na linguagem (em suas várias formas) e nos usos e costumes. A história da humanidade tem se caracterizado por esse processo de apropriação subjetiva da realidade, na forma de idéias, conhecimentos, imagens etc. e na criação de objetivações (produtos gerados a partir dessas idéias ou de sua transformação). Também a história de cada indivíduo humano está marcada por esse processo na medida em que cada um precisa se apropriar da cultura acumulada pelas gerações anteriores, mas ao mesmo tempo precisa criar novas objetivações correspondentes às suas idéias e aos desafios de seu tempo. Cabe à educação propiciar que tal apropriação ocorra, bem como dotar o indivíduo de instrumentos para criar essas novas objetivações.
  • 3. Esse referencial possibilita compreender de modo articulado tanto o processo de aprendizagem do aluno quanto o processo de formação de professores e demais agentes da prática educativa. Freqüentemente, a análise da prática pedagógica tem se baseado em uma dicotomia na qual se separam o processo de aprendizagem do aluno e o processo de formação continuada de professores. Dessa dicotomização resulta a utilização de diferentes paradigmas teórico-metodológicos para analisar esses dois processos. Nesse aspecto, a situação atual da pedagogia parece semelhante à situação da crise apontada por Vygotski (1991, pp.259-450) na psicologia, no que se refere à falta de uma concepção teórica geral que dê conta das questões comuns às áreas específicas de conhecimento, possibilitando perceber, ao mesmo tempo, a unidade e a diversidade dessas áreas. Embora sem ignorar essa especificidade, é fundamental compreender os processos envolvidos na prática educativa de modo integrado, e analisá-los à luz dos mesmos pressupostos teóricos. A perspectiva histórico-social pode dar uma contribuição para essa tarefa, na medida em que possibilita compreender a aprendizagem do aluno como um processo ativo, sem secundarizar a ação mediadora do professor nessa atividade (a importância dessa ação fica clara, por exemplo, no conceito de "zona de desenvolvimento próximo" proposto por Vigotski). A formação continuada do professor, por sua vez, na perspectiva histórico-social toma como base a prática pedagógica e situa como finalidade dessa prática levar os alunos a dominarem os conhecimentos acumulados historicamente pela humanidade. Para conseguir que os alunos se apropriem do saber escolar de modo a se tornarem autônomos e críticos, o professor precisa estar, ele próprio, apropriando-se desse saber e tornando-se cada vez mais autônomo e crítico. Portanto, a formação continuada é analisada neste trabalho com base no conceito de humanização (cf. Duarte 1993, p. 57 ss.). Esse conceito, no meu entender, possibilita uma compreensão mais ampla e profunda dessa formação do que outros conceitos como o de profissionalização, quer essa profissionalização seja entendida sob um enfoque funcionalista (como uma equiparação do professorado a categorias profissionais com mais vantagens no âmbito da sociedade atual, como os médicos, por exemplo) quer essa profissionalização seja compreendida apenas como aquisição de uma postura prático-reflexiva ou crítico-reflexiva, na qual não seja dado o devido peso ao processo de apropriação, pelo professor, do saber acumulado historicamente. A humanização do trabalho docente implica uma ampliação da autonomia do professor e, ao mesmo tempo, uma apropriação, por ele, de conhecimentos, habilidades e valores fundamentais da cultura existente, bem como de conhecimentos necessários para assegurar aos alunos a apropriação ativa e criativa dessa cultura. Essa humanização está limitada por relações e formas de ação no âmbito da prática pedagógica, que refletem a influência de relações mais amplas, em outras instâncias da prática social.
  • 4. A separação entre significado e sentido do trabalho docente, separação essa que faz com que o professor e a escola muitas vezes percam de vista os fins sociais de sua existência, decorre de relações de dominação existentes na própria estrutura da sociedade. Apostar nas possibilidades da escola como instância que pode contribuir para uma transformação da sociedade não significa retomar a crença ingênua na escola como "redentora da humanidade", mas buscar a identificação e a exploração de limites e possibilidades oferecidos pelas condições existentes para promover as transformações possíveis nessas condições. Esse processo requer, por parte dos educadores envolvidos na escola, um processo permanente e sistemático de reflexão. No entanto, tendo em vista esse caráter complexo e contraditório do processo educativo no qual os pólos opostos como as dimensões reprodutora e transformadora da escola, a apropriação e a criação se complementam em lugar de se excluir, entendemos que uma reflexão inspirada no pensamento dialético tem melhores condições de compreender os problemas do aprendizado escolar e da formação continuada de professores, e, conseqüentemente, encontrar soluções viáveis para esses problemas. Em síntese, o processo de formação continuada de professores que se está propondo aqui centra-se em três eixos básicos: • o domínio do saber acumulado no que se refere ao conteúdo escolar e às formas de ensiná-lo; • o domínio da concepção dialética como meio de desenvolver uma ação e reflexão autônomas e críticas; • a formação de uma postura ético-política guiada por sentimentos e valores que possibilitem ao professor utilizar esse saber acumulado como meio para o desenvolvimento pleno do aluno e para seu próprio desenvolvimento como ser humano. Propostas de ação A orientação metodológica a ser sugerida neste texto será baseada na discussão desenvolvida por Saviani (1984, p. 71) a propósito dos métodos de ensino, na qual o autor sugere uma seqüência de trabalho composta de cinco passos que se articulam. Esses "passos", sem serem encarados como fórmula ou orientação rígida, podem fornecer um importante subsídio para uma direção do processo pedagógico na perspectiva do desenvolvimento pleno de alunos e educadores. Essa seqüência tem servido de referência tanto para a elaboração de propostas para o ensino dos conteúdos escolares, quanto para a orientação do trabalho formativo com os
  • 5. professores, de modo que eles vivenciam nesse trabalho um processo análogo ao que poderão realizar com seus alunos. Os passos sugeridos pelo autor são: a prática social, a problematização, a instrumentalização, a catarse e a prática social. A prática social Dentro da perspectiva histórico-social, o conceito de prática social envolve o processo mais amplo através do qual a humanidade vai produzindo e reproduzindo as condições (materiais e ideais) e as relações sociais que possibilitam sua existência. Nessa perspectiva, a prática social do professor não se identifica com a prática cotidiana, nem com a experiência de cada indivíduo. A prática social tem como aspecto central exatamente a relação contraditória entre o cotidiano e o não-cotidiano, bem como a relação entre a experiência de cada um e as experiências acumuladas pelo conjunto da sociedade ao longo de sua história. São essas relações contraditórias que estão no ponto de partida da formação de professores, uma vez que essa formação ocorre nessa prática social e não apenas no momento em que o professor recebe algum tipo de curso. Segundo Vieira Pinto (PInto 1982, p. 109): O educador deve compreender que a fonte de sua aprendizagem, de sua formação, é sempre a sociedade. Mas esta atua de dois modos: um, indiretamente, mas que aparece ao educando (futuro educador) como direto (pois é aquele que sente como ação imediata): é o educador, do qual recebe ordenadamente os conhecimentos. E outro, diretamente, ainda que apareça ao educando (futuro educador) como indireto, pois não o sente como pressão imediatamente perceptível: é a consciência, em geral, com o meio natural e humano no qual se encontra o homem e do qual recebe os estímulos, os desafios, os problemas que o educam em sua consciência de educador. Compreender a formação do educador nessa perspectiva conduz a uma abordagem da questão do saber desenvolvido pelo professor, na qual se busca superar tanto a negação desse saber, quanto uma valorização que não considera seus limites e acaba reificando esse saber. Nessa questão é fundamental a idéia de que a prática cotidiana do professor é movida pelo senso comum pedagógico, o qual é constituído de fragmentos de teorias, assimilados geralmente sob a forma de clichês. O senso comum acaba criando a ilusão de um domínio das "teorias" cujos elementos ele incorpora. O professor que está imerso na sua prática muitas vezes não percebe a necessidade de romper com essa relação imediata entre pensamento e ação, o que leva a uma rejeição da reflexão filosófica e das teorias educacionais mais elaboradas. O professor em formação assume, muitas vezes uma postura semelhante à do homem comum, o qual, segundo Vazquez (1968, p. 14), "vê a si mesmo como ser prático que não precisa de teorias; os problemas encontram sua solução na própria prática, ou nessa forma de reviver uma prática passada que é a experiência".
  • 6. Portanto, partir da prática social na formação de professores implica não só um conhecimento da experiência de cada professor, de sua memória, de seu saber prático, mas uma ruptura com a forma de pensamento e ação próprios do cotidiano. Uma das formas essenciais para promover essa ruptura consiste em levar o professor a se apropriar cada vez mais do saber acumulado historicamente, especialmente dos conceitos científicos e das formas artísticas de apreender a realidade. Vygotski (1979), ao analisar o processo de formação de conceitos, aponta essa função mediadora dos conceitos científicos na superação dos conceitos espontâneos. Luria (1990), a partir de pesquisa com adultos pouco escolarizados, mostra a importância dos conhecimentos elaborados, transmitidos na escola, para a superação da forma prático-utilitária de perceber a realidade. Como promover uma apropriação significativa do saber acumulado, por parte dos professores em formação? Como desencadear um processo de reflexão que supere, sem ignorar, a experiência cotidiana desses professores? A problematização Segundo Saviani (1985, p. 17) a necessidade de refletir filosoficamente evidencia-se quando o ser humano se encontra diante de uma situação problemática: Com efeito, todos e cada um de nós nos descobrimos existindo no mundo (existência que é agir, sentir, pensar). Tal existência transcorre naturalmente, espontaneamente, até que algo interrompe o seu curso, interfere no processo alterando a sua seqüência natural. Aí, então, o homem é levado, é obrigado mesmo, a se deter e examinar, procurar descobrir o que é esse algo. E é a partir desse momento que ele começa a filosofar. O ponto de partida da filosofia é, pois, esse algo a que damos o nome de problema. A problematização, nesse sentido, precisa ser entendida não apenas como identificação das necessidades que a prática cotidiana coloca para o professor, e que são por ele captadas, ou como levantamento dos temas que emergem de sua experiência anterior ou de sua história de vida, mas também (e sobretudo) como criação de necessidades novas e como colocação de novos temas como objeto de sua reflexão, em função de necessidades da prática social. Esses temas e necessidades, para que possam romper com a forma cotidiana de apropriação (que o professor já possui), precisam ser apresentados não como algo natural, como simples "atividade" ou como informações, mas sim como situações a serem superadas, como objeto com o qual é preciso estabelecer uma relação consciente para que se possa apreendê-lo.
  • 7. A problematização implica levar o professor a tomar contato com os conhecimentos acumulados de uma forma tal que: - seja levado a considerá-los como produtos da atividade humana, como respostas encontradas e selecionadas (dentre um elenco de possibilidades) para resolver determinados impasses; - atue perante esses conteúdos movido pela necessidade de promover seu próprio desenvolvimento como ser genérico, isto é, como membro da comunidade humana e não como ser particular, movido apenas por interesses prático-utilitários; - perceba esses conteúdos como instrumentos necessários (tanto individualmente como coletivamente) para a libertação em relação a condições opressoras e para a ampliação das possibilidades de escolha em relação ao seu próprio futuro. Além de condição para a liberdade, é preciso mostrar que a apropriação de novos conhecimentos pode ser um momento de exercício dessa liberdade, na medida em que a apropriação efetiva de determinados conteúdos requer a realização de escolhas e a tomada de decisões. A formação de professores aqui proposta toma como ponto de partida os problemas enfrentados pelos professores na tentativa de assegurar o domínio efetivo do saber escolar pelos alunos. Parte, portanto, das próprias dificuldades de aprendizagem da criança, considerando-as como desafio cuja superação possibilita o crescimento do professor na medida em que revela suas próprias dificuldades, seja em relação ao conteúdo escolar, seja em relação aos procedimentos de ensino. Como explica Vieira Pinto (1982, pp. 21-22), O caminho que o professor escolheu para aprender foi ensinar. No ato do ensino ele se defronta com as verdadeiras dificuldades, obstáculos reais, concretos, que precisa superar. Nessa situação ele aprende. (...) A educação implica uma modificação de personalidade e é por isso que é difícil de se aprender, porque ela modifica a personalidade do educador ao mesmo tempo que vai modificando a do aluno. Desse modo, a educação é eminentemente ameaçadora. Ela consiste em abalar a segurança, a firmeza do professor, sua consciência professoral (que teme perder o estabelecido, que é o seu forte no plano da prática empírica) para se flexionar de acordo com as circunstâncias. A resistência do aluno ao aprendizado é um fator de modificação da consciência do educador, e não uma obstinação, uma incompetência. Provocar nos professores a necessidade de dominar conhecimentos e teorias, a partir do desafio de dar conta das dificuldades de aprendizagem dos alunos, já traz em si alguns pressupostos da maior importância para a perspectiva histórico-social: • que a finalidade principal do processo de ensino é dirigir a aprendizagem para assegurar uma efetiva apropriação do saber escolar;
  • 8. • que as dificuldades de aprendizagem não são uma "incompetência" do aluno, mas o produto de determinadas condições que podem ser alteradas; • que o professor pode ser o principal sujeito de sua própria formação, na medida em que for capaz de tomar sua prática como objeto de reflexão crítica. É importante ressaltar que a problematização aqui proposta não se limita a constatar as dificuldades de aprendizagem que o professor espontaneamente identifica no aluno, mas implica uma análise conjunta com o professor que contribua para alterar a própria visão que possui a respeito das dificuldades do aluno. Na alfabetização, por exemplo, é comum a identificação, pela professora, de dificuldades de aprendizagem em relação ao sistema ortográfico ou ao desenho das letras, deixando de perceber aspectos relacionados ao texto e às orações como um todo, tanto em termos de significado, quanto em termos de estrutura formal. A partir das dificuldades de aprendizagem, pode-se levantar as formas como os professores compreendem esses problemas. Nesse momento, surgem explicações que resultam das "teorias" que de fato estão orientando o trabalho em sala de aula. Pode- se explorar as incoerências desse saber próprio do senso comum, buscando seu núcleo válido e contrapondo esse núcleo válido aos elementos de diferentes ideologias que vão deixando suas marcas no discurso pedagógico, geralmente sob a forma de clichês esvaziados de significado. Esse núcleo válido envolve, por exemplo, a percepção da importância dos conteúdos para a formação do aluno e da ação do professor para a apropriação desse conteúdo. Esse núcleo válido (que precisa ser trabalhado com vistas a superar uma prática verbalista e mecanicista) é, muitas vezes, abafado pelo discurso escolanovista arraigado no senso comum pedagógico. Nessa reflexão sobre as dificuldades dos alunos, os professores podem perceber suas próprias dificuldades em relação a determinados tópicos ou componentes curriculares do ensino básico. Perceber e admitir essas dificuldades é um passo importantíssimo para elaborar uma nova postura perante os alunos e sua prática. Nesse processo de problematização, o debate entre professores é de vital importância, uma vez que no confronto de visões opostas, os interlocutores atuam como mediadores entre cada professor e os problemas sobre os quais se está refletindo, possibilitando a criação do que Vigotski denominou zona de desenvolvimento próximo, ou seja, cada professor no grupo poderá elaborar análises que não elaboraria sozinho e, a partir daí, realizar atividades que promovam e consolidem novos patamares de desenvolvimento intelectual. Note-se que esse resultado não decorre, de modo natural, da interação e do diálogo entre os professores, mas depende do objeto e da forma dessa reflexão e desse diálogo. Se não se toma como ponto de partida da reflexão os problemas essenciais da prática pedagógica, a interação entre professores pode se deteriorar em bate-papo, sem maiores conseqüências para um avanço do trabalho docente. A perspectiva histórico-social concebe a aprendizagem em termos
  • 9. de uma relação complexa de mediação das relações sociais (mais amplas e mais imediatas) na atividade do sujeito sobre objetivações, bem como de mediação dessas objetivações na comunicação e nas atividades coletivas. A concepção de aprendizagem proposta por Vigotski é, por vezes, erroneamente interpretada como um modelo centrado apenas no dialogismo e na interação social (entendida, geralmente no sentido construtivista, sobretudo como interação entre os pares). Entre as principais objetivações que possibilitam compreender e buscar a superação de situações problemáticas estão os instrumentos e os signos. A superação de problemas de aprendizagem exige que o professor se aproprie e crie instrumentos de trabalho (procedimentos, técnicas, materiais didáticos) e, ao mesmo tempo, desenvolva um discurso significativo, fundamentado teoricamente, que possibilite compreender esses problemas e reorientar a prática no sentido da superação deles. A instrumentalização A realização dessas atividades vai requerer a criação de novos procedimentos e, talvez, novos materiais didáticos, o que poderá exigir a busca de novos conhecimentos. A instrumentalização consiste nesse processo de apropriação dos instrumentos e signos produzidos pela humanidade, que fazem parte da herança cultural, e, ao mesmo tempo, de criação de novos instrumentos e signos. Essa herança cultural é constituída pelo saber (conhecimentos, informações, conceitos, idéias, normas etc.). No entanto, o domínio desse saber requer a assimilação de um saber-fazer (habilidades, técnicas, operações etc.). A utilização (ou não) desse saber implica, por sua vez, um envolvimento afetivo com ele e a adesão a valores que orientem sua utilização em benefício do desenvolvimento da humanidade e de cada indivíduo. É preciso assimilar uma postura perante o saber. Vale frisar que esses aspectos (conhecimentos, habilidades e valores) não estão desvinculados. Por exemplo, as habilidades podem ser formadas através da própria assimilação de informações dependendo da maneira como essa assimilação é feita. Nesse mesmo processo, pelas relações que o professor estabelece com os conteúdos escolares e com as teorias educacionais, mediado pela sua relação com os colegas, com a direção e o sistema escolar, bem como com a sociedade como um todo, é que se mudam e se consolidam valores e sentimentos que vão ajudar a orientar suas ações no cotidiano da sala de aula e, até mesmo, em outras situações da prática escolar e da prática social mais ampla.
  • 10. Como esperar que um professor desperte o interesse dos alunos pela busca do conhecimento, se ele apenas receber informações de outros agentes educacionais ou de "especialistas" com a orientação de assimilar e aplicar na sua prática? O desafio da instrumentalização aqui proposta consiste em levar o professor a elaborar seus próprios instrumentos e seu discurso, através da apropriação da produção de outros. O caminho para conseguir isso seria articular essa instrumentalização com a reflexão sobre os problemas e as necessidades de uma prática, que pretende assegurar o sucesso escolar e, ao mesmo tempo, propor procedimentos, materiais didáticos e textos de fundamentação teórica que respondam às necessidades dessa prática e não se baseiem em condições idealizadas de trabalho. Portanto, o discurso pedagógico resultante de uma teoria educacional e os meios de ensino coerentes com essa teoria, para que sejam apropriados pelo professor como instrumentos de superação dos limites da prática cotidiana e do senso comum, precisam estar atuando como mediadores na relação desse professor com sua prática e com seus alunos. Isso só é possível na medida em que forem trabalhados de modo sistemático e constante, a fim de que se incorporem de modo irreversível ao pensamento e à ação do professor, passando a fazer parte, por assim dizer, "de sua natureza". Para designar o momento em que ocorre efetivamente essa internalização, pelo indivíduo, de conhecimentos acumulados socialmente, Saviani (1984, p. 75) utilizou-se do conceito de catarse. A catarse Saviani (1984, p. 75) conceitua a catarse utilizando a definição de Gramsci, para quem a catarse significa a "elaboração superior da estrutura em superestrutura na consciência dos homens". Trata-se da constituição de uma espécie de "segunda natureza", isto é, são formas de pensar e agir produzidas histórica e socialmente, que se incorporam de tal maneira na estrutura psíquica do indivíduo que as utiliza que aparecem como formas naturais, mas que na verdade resultam de um longo processo educativo. Essa internalização do pensamento, do conhecimento e do discurso dos outros não constitui, neste caso, uma socialização na qual o indivíduo tenha que sacrificar seus impulsos e valores para se ajustar à sociedade, mas uma criação, no indivíduo, de impulsos cada vez mais humanos que possibilitam a formação de uma verdadeira autonomia. Para que esse momento da catarse realize-se na formação do professor, é essencial que os conhecimentos, as habilidades e os valores dos quais ele se apropriou, por meio da instrumentalização, sejam trabalhados de modo reiterado a fim de
  • 11. constituírem automatismos. Por essa razão, a formação continuada de professores precisa buscar a irreversibilidade das mudanças provocadas na reflexão e na ação dos sujeitos envolvidos, o que demanda tempo e um esforço contínuo. É importante ressaltar também que a formação de automatismos na perspectiva aqui esboçada ocorre de forma consciente e reflexiva. Um dos procedimentos fundamentais para esse processo é o momento em que, após conquistar um novo patamar em termos de domínio de conceitos e de formas de ensino, o professor reflete sobre a trajetória seguida, percorrendo novamente, no plano abstrato, o caminho que realizou. Com isso, percebe mais claramente as possibilidades e os obstáculos de seu processo de aprendizagem e, portanto, a necessidade de estar constantemente revendo e aperfeiçoando sua forma de aprender. Com isso espera-se que cada professor busque se tornar efetivamente o sujeito principal de sua formação. A prática social Como explica Saviani (1984, p. 76), "(...) a prática social referida no ponto de partida (primeiro passo) e no ponto de chegada (quinto passo) é e não é a mesma". É a mesma no sentido de que a transformação das formas de pensar e agir em face dos conteúdos escolares (a partir de sua apropriação em atividades universalizantes, conscientes e livres) não significa uma transformação das condições sociais objetivas da escola e muito menos da sociedade como um todo. Essa transformação precisa se dar em todas as instâncias da prática social, especialmente no âmbito da produção da existência material. Ao mesmo tempo, a prática social já não é a mesma uma vez que professor e alunos transformaram-se nesse processo, o que se reflete nas outras instâncias da sociedade. Considerações finais A reflexão desenvolvida neste artigo baseou-se em estudos e experiências de formação básica e continuada de professores. Atualmente, essas idéias estão servindo de base para ações de formação continuada que estão sendo desenvolvidas em diferentes municípios da região de São Carlos (SP). Dado o caráter recente da divulgação do pensamento de Vigotski e outros no Brasil e o caráter incipiente da pesquisa de suas implicações pedagógicas, considerei importante apresentar o presente texto ainda que este se constitua apenas um esboço para a formulação de uma proposta mais detalhada de formação de professores. No entanto, essa proposta precisa resultar de uma articulação com experiências mais
  • 12. sistemáticas e do intercâmbio com diferentes pesquisadores preocupados com o mesmo tema. Bibliografia DUARTE, Newton. A individualidade para-si. São Paulo, Autores Associados, 1993. [ Links ] LURIA, A.R. Desenvolvimento cognitivo. São Paulo, Ícone, 1990. [ Links ] PINTO, Álvaro V. Sete lições sobre educação de adultos. São Paulo, Cortez, 1982. [ Links ] SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. São Paulo, Cortez, 1984. [ Links ] _______. Educação: Do senso comum à consciência filosófica. 5ª ed. São Paulo, Cortez, 1985. [ Links ] VÁZQUEZ, A.S. Filosofia da práxis. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1968. [ Links ] VYGOTSKI, L. S. Pensamento e linguagem. Lisboa, Antídoto, 1979. [ Links ] _______. Obras escogidas. Madri, M.E.C./Visor, 1991, 3 vols., vol.1: Incluye el significado histórico de la crisis de la psicologia. [ Links ] Caixa Postal 6022 - Unicamp 13084-971 Campinas SP - Brazil Tel. / Fax: (55 19) 3289 - 1598 / 7539