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ENERGIA
Marcos, de 3 anos, tem leucemia e faz quimioterapia toda semana. Agitado e brincalhão, sai das sessões
correndo pelo hospital
Marcos Gregório Siciliano Maragno é o garoto sapeca das fotos aí de cima. Essas fotos, o registro de
uma infância bem cuidada e cheia de energia, poderiam ilustrar um anúncio de cereal matinal. Poderiam,
mas Marcos está aqui por outra razão. Ele tem câncer. Mais precisamente leucemia linfóide aguda – a
produção descontrolada de células imaturas que deveriam dar origem aos componentes do sangue. É o
tipo de câncer mais comum na infância. Marcos faz quimioterapia toda semana. E sai rindo e correndo
pelas salas do hospital. Só é interrompido pelas enfermeiras, que fazem fila para ganhar beijos. Conheci
Marcos uma hora depois do fim de uma dessas sessões. Na recepção do Hospital do Câncer A.C.
Camargo, em São Paulo, pacientes adultos e familiares cansados tentavam achar a posição menos
incômoda afundados nos sofás. Movendo apenas os olhos, seguiam as demonstrações de disposição do
menino. Ele flexionava e esticava as pernas; dobrava as costas para a frente, enquanto a avó, Cristina,
tentava segurá-lo. Naquele tatibitate dos 3 anos, ele disse:
– Solta, vó. Qué plantá bananera.
Saiba mais
Marcos é um símbolo do otimismo que se pode extrair do primeiro levantamento sobre a situação do
câncer em crianças e adolescentes no Brasil, divulgado na semana passada pelo Instituto Nacional do
Câncer (Inca). A boa condição física do garoto é fruto de uma conjunção de fatores que fizeram toda
diferença.
 O diagnóstico foi muito precoce. No Natal do ano passado, surgiram manchas roxas nas
pernas de Marcos. Na manhã seguinte, ele acordou com febre e a mãe, a administradora de empresas
Rafaela Siciliano, de 29 anos, decidiu procurar o médico.
 O pediatra desconfiou de leucemia. Pediu um exame de sangue completo e o resultado ficou
pronto no mesmo dia. Com os exames nas mãos, Rafaela foi bater na casa do pediatra. Alguns dias
depois, a avaliação da medula óssea (mielograma) confirmou o diagnóstico.
 A família tem um bom plano de saúde. Ele permitiu a internação rápida no A.C. Camargo, um
dos centros com maior experiência em pesquisa e tratamento no país. Marcos passou vários dias na UTI
e, em janeiro, começou a fazer quimioterapia diariamente. No início, as doses eram elevadas e o mal-
estar era inevitável. Sentia tonturas, vômitos, não tinha apetite. Perdeu os cabelos e, com a imunidade
baixa, pegou pneumonia duas vezes.
 A mãe não descuidou do tratamento. Rafaela afastou-se do trabalho durante 50 dias para ficar
com o filho no hospital. O tempo todo teve o apoio da mãe, Cristina. Rafaela é o tipo de mãe que recita
1
cada um dos remédios e dos termos médicos que aparecem no prontuário do filho. Quer saber tudo e
cerca o filho de cuidados por conta de sua baixa imunidade. “Ele ainda não vai a festinhas de criança nem
pode viajar”, diz. Em setembro, Marcos concluiu a etapa mais difícil do tratamento. Agora está na fase de
manutenção. Recebe quimioterapia injetável toda semana no hospital. Diariamente, em casa, toma outro
quimioterápico oral.
DOÇURA
Laura, de 5 anos, já terminou o tratamento de leucemia. Do hospital, ela se lembra dos origamis que a
mãe fazia para passar o tempo
Essa rotina deverá ser seguida rigorosamente até o tratamento completar dois anos. “Isso é fundamental
para aumentar as chances de cura”, diz o oncopediatra Gustavo Ribeiro Neves, do A.C. Camargo. “Muitas
famílias relaxam nessa fase de manutenção porque o filho fica tão bem-disposto que parece já estar
curado. Esquecem de dar os remédios e a doença volta”.
Uma criança é considerada curada se os exames não mostrarem nenhum sinal da doença cinco anos
depois do final do tratamento. Dar essa boa notícia às famílias tornou-se uma das experiências mais
corriqueiras na vida dos médicos. Nenhuma outra área da oncologia acumulou vitórias tão espetaculares
nas últimas décadas quanto a que lida com o câncer infanto-juvenil.
Em 1970, cerca de 75% das crianças com leucemia morriam nos Estados Unidos. O insucesso era a
regra mesmo entre as famílias com condições financeiras de buscar o melhor tratamento possível. Hoje,
73% sobrevivem. Nos centros brasileiros especializados no tratamento do câncer infantil, os números são
semelhantes. Nos serviços especializados em câncer infantil no Recife, o total de pacientes vivos cinco
anos após o diagnóstico cresceu de 32% (1980 a 1989) para 63% (1997 a 2002). No A.C. Camargo, em
São Paulo, a sobrevida também melhorou. Foi de 13% (1975 a 1979) para 55% (1995 a 1999). Nesse
grupo foram incluídos todos os casos admitidos no hospital, inclusive os já tratados que apresentavam
recorrência da doença.
O câncer, a principal causa de morte por doença na população entre 5 e 18 anos, é um evento raro.
Corresponde a menos de 3% de todos os casos da doença registrados no país. Em 2008, o número de
casos novos em crianças e adolescentes deve ficar por volta de 10 mil. É um câncer cheio de
2
peculiaridades. Sob a lente do microscópio, os tumores infantis têm a aparência de tecidos fetais. Um
tumor de rim, por exemplo, é composto de células embrionárias de rim. Antes que elas tivessem tido a
chance de se desenvolver e se transformar numa célula renal com uma função específica, viraram tumor.
LEUCEMIA
Variação das taxas de mortalidade(1) a cada milhão de habitantes até 18 anos. Em
ambos os sexos, houve redução média de cerca de 1% ao ano no Sul, Sudeste e Centro-
Oeste. No Norte e Nordeste, houve aumento de cerca de 2% ao ano – possivelmente pela
melhora na coleta de dados
Isso explica por que bebês e crianças tão pequenas podem ter câncer antes que o estilo de vida
inadequado tenha tido tempo de atuar sobre eles e desencadear a doença. A hipótese é que o desarranjo
celular que leva ao câncer tenha sido provocado por substâncias químicas com as quais a mãe teve
contato durante a gravidez. Várias linhas de pesquisa buscam revelar quais são essas substâncias. Há
muitos suspeitos – entre eles até as pastilhas usadas em repelentes elétricos de mosquito – mas
nenhuma condenação. Seja qual for a causa da mutação que origina o tumor, ele vai crescendo
silenciosamente durante a gestação e os primeiros anos de vida, até surgirem os sintomas.
A compreensão de que os tumores infantis são muito diferentes dos adultos contribuiu para as vitórias
recentes contra a doença. Os anos 90 trouxeram descobertas genéticas que foram rapidamente
incorporadas ao dia-a-dia dos consultórios. “Todo oncopediatra sabe que hoje é obrigatório fazer o estudo
genético de amostras do sangue antes de programar o tratamento da leucemia”, diz Luiz Fernando Lopes,
do Departamento de Pediatria do A.C. Camargo. Algumas mutações genéticas são associadas com um
pior prognóstico. Quando elas revelam que a criança é de alto risco, os médicos optam por uma
quimioterapia mais agressiva e, em raros casos, radioterapia. Se a criança é de baixo risco, recebe uma
quimioterapia mais leve. Há menos sofrimento e menos gastos. É possível também saber quem vai se
beneficiar do transplante de medula. Ele é indicado na minoria dos casos.
Nos melhores centros de tratamento, a leucemia
infantil pode ser curada em 80% dos casos
A evolução das drogas permitiu a criação de combinações mais eficazes e com menos efeitos colaterais.
“Nos anos 80, todas as crianças que faziam quimioterapia passavam 24 horas vomitando”, diz Lopes.
3
“Felizmente, isso é passado”. Surgiram novos medicamentos para abrandar efeitos colaterais do
tratamento, como vômitos e infecções. Outra grande conquista foi o cateter de longa permanência, um
tubo de plástico que é implantado numa veia do peito e facilita a aplicação de medicamentos e a coleta de
sangue para exames. Antes dessa invenção, as crianças sofriam inúmeras picadas, a ponto de as
enfermeiras não encontrarem mais veias para puncionar.
A tecnologia evoluiu, mas a informação da sociedade não avançou com a mesma rapidez. Até
recentemente, Laura Slater Alves, de 5 anos, usava um desses cateteres no peito para tornar menos
doloroso o tratamento da leucemia. Depois de longas temporadas no hospital, ela foi liberada para voltar
a fazer aquilo de que mais gosta: nadar. Na escola de natação, as outras crianças olhavam, curiosas,
para o cateter. A professora perdeu a chance de falar a verdade e ajudar a desmistificar a doença. Pediu
à mãe da menina, a nutricionista Betzabeth, que arranjasse uma forma de cobrir o cateter para que ele
“não assustasse” as outras crianças. Betzabeth não obedeceu.
A marca no peito é o símbolo de uma luta que não precisa ser apagada. É a sociedade que deve se
acostumar com a idéia de que crianças com câncer nem sempre apresentam sinais evidentes como a
cabeça carequinha. Elas podem ter os cabelos Chanel e a vivacidade de Laura e ainda assim estar
enfrentando um período de fragilidade física e emocional. A menina já terminou o tratamento. Agora
precisa apenas fazer hemogramas a cada seis meses. Mas o pai, o jornalista Francisco Alves, decidiu
contar a experiência da família no livro O Dodói da Gigi, da Editora Signus. Ele vem com um CD com a
narração da história e músicas. “A idéia é ajudar as crianças internadas a entender o que está
acontecendo, mesmo que elas não possam ler”, diz Alves. Em casa, Gigi é a doce Lalá.
Nem todas as crianças com câncer têm as mesmas oportunidades que ajudaram Marcos Gregório e
Laura a enfrentar a doença com mais leveza. Para essas, a nova cara do câncer infantil ainda é uma
abstração. A falta de acesso a diagnóstico rápido, tratamento de qualidade e leitos de internação quando
ocorrem complicações impede que todas as crianças tenham a mesma chance de cura. “O maior desafio
do Brasil é reproduzir na maioria dos serviços as boas taxas de cura conquistadas pelos centros
especializados no atendimento do câncer infantil”, diz Silvia Brandalise, presidente do Centro Infantil
Boldrini, em Campinas, São Paulo. Na instituição, uma das mais experientes da América Latina, 80% dos
pacientes são atendidos pelo SUS. Cinco anos depois do tratamento, 70% deles estão vivos,
independentemente do tipo de câncer. No caso da leucemia linfóide aguda, a sobrevida é de 88%.
O mais devastador em termos de saúde pública é a ignorância das autoridades sobre a real extensão do
problema. Qual a incidência do câncer infantil nas várias regiões do país? Qual porcentagem dessas
crianças morre? Onde é preciso melhorar o acesso ao diagnóstico e ao tratamento? Por isso é tão
importante o levantamento divulgado pelo Inca na quinta-feira (leia os principais dados no quadro abaixo).
É a primeira vez que um estudo desse tipo é feito em 20 municípios brasileiros, a partir dos chamados
registros de câncer de base populacional. Isso significa que os pesquisadores não coletaram apenas
informações nos hospitais. Eles também buscaram outras fontes, como dados de exames
anatomopatológicos e certidões de óbito, para certificar-se de que não havia duplicidade de dados. Tudo
isso para chegar a um resultado que é a totalidade de casos de câncer infantil ocorrida na população de
cada município participante num período de quatro anos.
O mapa do câncer infantil no Brasil
4
A leucemia é o
tipo mais comum
nos 20 municípios
onde a pesquisa
do Inca foi
realizada. Esse é
um padrão
mundial
5
“Não pudemos juntar todos os dados para apontar a incidência de câncer infantil no Brasil”, diz a
pesquisadora Beatriz de Camargo, do Instituto Nacional do Câncer (Inca). Isso porque os dados são de
períodos distintos e há grandes diferenças de qualidade entre os 20 registros de câncer. “Mesmo com
possíveis fragilidades, o grande valor desse levantamento é apontar as principais questões e estimular o
surgimento de novos estudos que possam respondê-las”, diz Marise Souto Rebelo, gerente da divisão de
informação do Inca.
Seguindo um padrão mundial, a leucemia apareceu como o tipo de câncer mais comum. O porcentual
médio para o Brasil foi de 29%, variando de 19% em Aracaju a 42% em Manaus. A mais alta incidência
de leucemia foi verificada em Cuiabá (70 casos a cada milhão de habitantes até 18 anos). O resultado
chama a atenção, e os pesquisadores ainda não conseguem explicá-lo. Suspeitam que a abertura recente
de um centro capaz de fazer diagnósticos de leucemia em grande quantidade tenha inflado os números.
Pacientes provenientes de outras cidades da região e tratados em Cuiabá podem ter se identificado como
moradores da cidade, o que teria aumentado a quantidade de casos no município.
Os linfomas, câncer do sistema linfático que costumam ser tratados com sucesso em mais de 70% das
crianças e dos adolescentes, são mais freqüentes em Jaú, no interior paulista. O “efeito Cuiabá” também
pode ter acontecido em Jaú. A cidade dispõe de um centro de referência no tratamento do câncer que
recebe pacientes de vários municípios vizinhos, além de outro Estados. O centro é um dos únicos da
região com capacidade de oferecer, em grande quantidade, exames que confirmam os linfomas.
Como identificar a doença
Os primeiros sintomas dos tipos de câncer mais comuns na infância e na adolescência e como
tratá-los. As chances de cura (cinco anos sem sinal da doença) são animadoras
LEUCEMIA LINFÓIDE AGUDA
6
O QUE É
É o câncer mais comum da infância. Acomete células sanguíneas da medula óssea que dão origem aos
linfócitos, células de defesa do organismo
SINTOMAS
Palidez progressiva, febre inexplicada por mais de cinco dias, hematomas, hemorragias em gengivas,
fraqueza e dores nas pernas, gânglios aumentados no pescoço, na axila e na virilha
TRATAMENTO
Quimioterapia durante dois anos
LEUCEMIA MIELÓIDE AGUDA
O QUE É
É mais grave que a leucemia linfóide aguda. Acomete as células sanguíneas da medula óssea que dão
7
origem a diferentes células do sangue, com exceção dos linfócitos. Corresponde a 20% das leucemias
agudas
SINTOMAS
Palidez, febre inexplicada, hemorragias nas gengivas, no cérebro ou nos pulmões, dores nas pernas e
infecções
TRATAMENTO
Quimioterapia durante oito meses
LINFOMA DE HODGKIN
O QUE É
Câncer no sistema linfático. O Hodgkin é um subtipo de linfoma que tem um comportamento mais lento
em relação aos demais. É mais freqüente em adolescentes
SINTOMAS
Aumento dos gânglios no pescoço, na axila ou na virilha. Em alguns casos, febre prolongada,
emagrecimento e suor excessivo durante a noite
TRATAMENTO
Quimioterapia e radioterapia
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LINFOMA NÃO-HODGKIN
O QUE É
Esse subtipo tem um comportamento mais agressivo. Pode ocorrer em qualquer idade. Os sintomas
aparecem rapidamente
SINTOMAS
Aumento dos gânglios do pescoço. Febre prolongada, massas abdominais de crescimento rápido, com
obstrução intestinal
TRATAMENTO
Quimioterapia de seis a 24 meses dependendo do subtipo de linfoma não-Hodgkin
A DISTRIBUIÇÃO DAS MORTES
Óbitos a cada milhão de habitantes entre 0 e 18 anos. Em todas as faixas etárias, a
mortalidade da Região Centro-Oeste está acima da média nacional. Enquanto isso, os
óbitos no Norte e no Nordeste estão sempre abaixo da média nacional. O próximo passo
dos pesquisadores será tentar explicar essas diferenças
9
O segundo tipo de câncer mais comum nas populações infanto-juvenis é o de cérebro. Vencer esses
tumores ainda é um desafio, embora o prognóstico de crianças e adolescentes costume ser melhor que o
dos adultos. Dependendo do tipo de tumor, a parcela de crianças vivas cinco anos depois do diagnóstico
10
varia de 10% a 60%. Porto Alegre é a cidade com mais casos (33 a cada milhão). O diagnóstico desse
tipo de tumor depende de exames de imagem sofisticados, como a ressonância magnética. Por isso, esse
tipo de câncer costuma ser subnotificado. Nem todas as cidades conseguem oferecê-los em grande
quantidade. Porto Alegre consegue.
Entre os tumores ósseos, um dos mais comuns é o osteossarcoma. Ele ocorre principalmente em
adolescentes. Pode se propagar rapidamente e atingir os pulmões. Mas a evolução do tratamento permite
salvar 70% dos afetados. A maior incidência de tumores ósseos apareceu em São Paulo (48 a cada
milhão). Nenhum dos pesquisadores arrisca uma explicação.
“Está difícil chegar a conclusões a partir desses dados. Esse estudo é apenas o começo”, diz Beatriz. A
realização desse trabalho é um esforço louvável de lançar luzes num campo em que faltam informações
básicas. Mas esse é o tipo de pesquisa que abre espaço para muitas dúvidas e não oferece nenhuma
resposta. A boa notícia do relatório é que a mortalidade por câncer infantil vem caindo no Brasil. No caso
das leucemias, a análise da série histórica revela um pequeno declínio entre 1979 e 2005. Nas regiões
Sudeste, Sul e Centro-Oeste, houve um decréscimo médio de cerca de 1% ao ano (ilustração na pág. 2).
Nas regiões Norte e Nordeste observou-se o fenômeno inverso: a taxa de mortalidade cresceu cerca de
2% ao ano. “Nessas regiões notamos uma redução nas causas de morte não-definidas. Isso é sinal de
que a qualidade dos dados melhorou, e não que as crianças estejam morrendo mais”, diz Beatriz.
A taxa de mortalidade por todos os cânceres infantis no país é de 39 casos a cada milhão de habitantes,
cerca de 40% superior à verificada nos Estados Unidos, onde ocorrem 26 mortes por milhão. Para salvar
mais crianças, o Brasil precisa investir em duas frentes:
 Melhorar o diagnóstico precoce. A demora para conseguir agendar consultas e realizar
exames reduz as chances de vida. Diferentemente do que acontece nos adultos, não existem exames
preventivos para o câncer infantil. A mãe precisa ter informação e desconfiar dos primeiros sinais.
Enfermeiras que dão dicas de aleitamento materno, por exemplo, poderiam ser treinadas para dar noções
sobre os primeiros sinais da doença.
 Oferecer tratamento em centros especializados que contam com equipe multidisciplinar.
Atualmente, muitas crianças atendidas pelo SUS fazem quimioterapia em clínicas prestadoras de serviço,
cirurgia em outro endereço e radioterapia num terceiro. O tratamento não é planejado adequadamente e
não há integração entre as equipes. Se o paciente passa mal depois da quimioterapia, acaba sendo
internado num pronto-socorro qualquer e não é atendido por quem entende de câncer.
Salvar as crianças já não basta. Os médicos
querem garantir que elas vivam bem e sem seqüelas
SOBREVIVENTE
Tatiana fez tratamento de leucemia nos anos 80 . “Saía arrasada. Nunca correndo como Marcos”
11
Outro grande desafio da oncologia pediátrica é reduzir os efeitos tardios do tratamento. Nos anos 70 e
início dos 80, a filosofia de “salvar a criança a qualquer preço” cobrou um preço elevado. Além de
quimioterapia pesada, a maioria das crianças com leucemia enfrentava sessões de radioterapia. Sofriam
inúmeros danos. De alterações odontológicas como falta de raiz nos dentes até graves déficits de
cognição e memória. Muitas das crianças tratadas nos anos 80 e acompanhadas até hoje no A.C.
Camargo não puderam estudar e têm dificuldades que comprometem o dia-a-dia. O crescimento das
meninas era interrompido, e elas ficavam propensas à obesidade. Em alguns casos, ainda hoje, o
tratamento pode provocar infertilidade. Para tentar contornar esse efeito, cientistas israelenses estão
congelando o tecido ovariano de pacientes entre 5 e 20 anos. Eles conseguiram descongelar o material
alguns anos depois e extrair cerca de nove óvulos imaturos das amostras de cada paciente. Quando essa
técnica se tornar corriqueira, meninas pequenas poderão ter a fertilidade preservada e usar os óvulos
para tratamentos de reprodução assistida no futuro. “Nossa habilidade de tratar o câncer infantil melhorou
tanto que agora é preciso garantir que esses pacientes tenham vida plena, inclusive com a capacidade de
ter filhos”, diz David Adamson, presidente da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva.
Tatiana de Jesus Canha, de 29 anos, tentou engravidar algumas vezes e não conseguiu. Ela fez
tratamento de leucemia quando tinha 6 anos. É uma das pacientes cujos efeitos tardios são avaliados no
A.C. Camargo. Ela mede 1,50 metro e nunca esqueceu do dia em que a médica lhe explicou que ela não
cresceria mais. Tinha 9 anos e fez alongamento por mais três na tentativa de ganhar alguns centímetros.
Não adiantou. Assim como muitas das crianças tratadas nos anos 80, Tatiana está 20 quilos acima do
peso ideal. Tem leves dificuldades de memória, que não a impediram de se formar em Pedagogia.
Costuma anotar tudo o que é essencial. Tatiana e Marcos Gregório encontraram-se no hospital. São
representantes de duas gerações de tratamento.
Tatiana enfrentou as piores quimioterapias, sofreu algumas seqüelas, mas saiu vitoriosa num tempo em
que a cura era incerta. Marcos Gregório é o símbolo do vigor e da esperança. Ele também será
acompanhado até os 20 anos, mas os médicos acreditam que não terá as seqüelas da geração anterior.
Em silêncio e com um meio sorriso nos lábios, Tatiana observava as brincadeiras do garoto espoleta no
mesmo cenário em que ela passou tantos anos de sua infância. Seus pensamentos iam longe. “Daquele
tempo, lembro de passar horas no colo das voluntárias”, diz. “Da psicóloga, eu fugia. Até hoje não gosto
muito”. O câncer passou, mas as marcas da experiência nunca saíram dela.
Bibliografia:
-http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI18138-15257,00-
A+NOVA+CARA+DO+CANCER+INFANTIL.html
-indoafundo.com
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Crianças com câncer: histórias de superação e desafios no tratamento

  • 1. ENERGIA Marcos, de 3 anos, tem leucemia e faz quimioterapia toda semana. Agitado e brincalhão, sai das sessões correndo pelo hospital Marcos Gregório Siciliano Maragno é o garoto sapeca das fotos aí de cima. Essas fotos, o registro de uma infância bem cuidada e cheia de energia, poderiam ilustrar um anúncio de cereal matinal. Poderiam, mas Marcos está aqui por outra razão. Ele tem câncer. Mais precisamente leucemia linfóide aguda – a produção descontrolada de células imaturas que deveriam dar origem aos componentes do sangue. É o tipo de câncer mais comum na infância. Marcos faz quimioterapia toda semana. E sai rindo e correndo pelas salas do hospital. Só é interrompido pelas enfermeiras, que fazem fila para ganhar beijos. Conheci Marcos uma hora depois do fim de uma dessas sessões. Na recepção do Hospital do Câncer A.C. Camargo, em São Paulo, pacientes adultos e familiares cansados tentavam achar a posição menos incômoda afundados nos sofás. Movendo apenas os olhos, seguiam as demonstrações de disposição do menino. Ele flexionava e esticava as pernas; dobrava as costas para a frente, enquanto a avó, Cristina, tentava segurá-lo. Naquele tatibitate dos 3 anos, ele disse: – Solta, vó. Qué plantá bananera. Saiba mais Marcos é um símbolo do otimismo que se pode extrair do primeiro levantamento sobre a situação do câncer em crianças e adolescentes no Brasil, divulgado na semana passada pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca). A boa condição física do garoto é fruto de uma conjunção de fatores que fizeram toda diferença.  O diagnóstico foi muito precoce. No Natal do ano passado, surgiram manchas roxas nas pernas de Marcos. Na manhã seguinte, ele acordou com febre e a mãe, a administradora de empresas Rafaela Siciliano, de 29 anos, decidiu procurar o médico.  O pediatra desconfiou de leucemia. Pediu um exame de sangue completo e o resultado ficou pronto no mesmo dia. Com os exames nas mãos, Rafaela foi bater na casa do pediatra. Alguns dias depois, a avaliação da medula óssea (mielograma) confirmou o diagnóstico.  A família tem um bom plano de saúde. Ele permitiu a internação rápida no A.C. Camargo, um dos centros com maior experiência em pesquisa e tratamento no país. Marcos passou vários dias na UTI e, em janeiro, começou a fazer quimioterapia diariamente. No início, as doses eram elevadas e o mal- estar era inevitável. Sentia tonturas, vômitos, não tinha apetite. Perdeu os cabelos e, com a imunidade baixa, pegou pneumonia duas vezes.  A mãe não descuidou do tratamento. Rafaela afastou-se do trabalho durante 50 dias para ficar com o filho no hospital. O tempo todo teve o apoio da mãe, Cristina. Rafaela é o tipo de mãe que recita 1
  • 2. cada um dos remédios e dos termos médicos que aparecem no prontuário do filho. Quer saber tudo e cerca o filho de cuidados por conta de sua baixa imunidade. “Ele ainda não vai a festinhas de criança nem pode viajar”, diz. Em setembro, Marcos concluiu a etapa mais difícil do tratamento. Agora está na fase de manutenção. Recebe quimioterapia injetável toda semana no hospital. Diariamente, em casa, toma outro quimioterápico oral. DOÇURA Laura, de 5 anos, já terminou o tratamento de leucemia. Do hospital, ela se lembra dos origamis que a mãe fazia para passar o tempo Essa rotina deverá ser seguida rigorosamente até o tratamento completar dois anos. “Isso é fundamental para aumentar as chances de cura”, diz o oncopediatra Gustavo Ribeiro Neves, do A.C. Camargo. “Muitas famílias relaxam nessa fase de manutenção porque o filho fica tão bem-disposto que parece já estar curado. Esquecem de dar os remédios e a doença volta”. Uma criança é considerada curada se os exames não mostrarem nenhum sinal da doença cinco anos depois do final do tratamento. Dar essa boa notícia às famílias tornou-se uma das experiências mais corriqueiras na vida dos médicos. Nenhuma outra área da oncologia acumulou vitórias tão espetaculares nas últimas décadas quanto a que lida com o câncer infanto-juvenil. Em 1970, cerca de 75% das crianças com leucemia morriam nos Estados Unidos. O insucesso era a regra mesmo entre as famílias com condições financeiras de buscar o melhor tratamento possível. Hoje, 73% sobrevivem. Nos centros brasileiros especializados no tratamento do câncer infantil, os números são semelhantes. Nos serviços especializados em câncer infantil no Recife, o total de pacientes vivos cinco anos após o diagnóstico cresceu de 32% (1980 a 1989) para 63% (1997 a 2002). No A.C. Camargo, em São Paulo, a sobrevida também melhorou. Foi de 13% (1975 a 1979) para 55% (1995 a 1999). Nesse grupo foram incluídos todos os casos admitidos no hospital, inclusive os já tratados que apresentavam recorrência da doença. O câncer, a principal causa de morte por doença na população entre 5 e 18 anos, é um evento raro. Corresponde a menos de 3% de todos os casos da doença registrados no país. Em 2008, o número de casos novos em crianças e adolescentes deve ficar por volta de 10 mil. É um câncer cheio de 2
  • 3. peculiaridades. Sob a lente do microscópio, os tumores infantis têm a aparência de tecidos fetais. Um tumor de rim, por exemplo, é composto de células embrionárias de rim. Antes que elas tivessem tido a chance de se desenvolver e se transformar numa célula renal com uma função específica, viraram tumor. LEUCEMIA Variação das taxas de mortalidade(1) a cada milhão de habitantes até 18 anos. Em ambos os sexos, houve redução média de cerca de 1% ao ano no Sul, Sudeste e Centro- Oeste. No Norte e Nordeste, houve aumento de cerca de 2% ao ano – possivelmente pela melhora na coleta de dados Isso explica por que bebês e crianças tão pequenas podem ter câncer antes que o estilo de vida inadequado tenha tido tempo de atuar sobre eles e desencadear a doença. A hipótese é que o desarranjo celular que leva ao câncer tenha sido provocado por substâncias químicas com as quais a mãe teve contato durante a gravidez. Várias linhas de pesquisa buscam revelar quais são essas substâncias. Há muitos suspeitos – entre eles até as pastilhas usadas em repelentes elétricos de mosquito – mas nenhuma condenação. Seja qual for a causa da mutação que origina o tumor, ele vai crescendo silenciosamente durante a gestação e os primeiros anos de vida, até surgirem os sintomas. A compreensão de que os tumores infantis são muito diferentes dos adultos contribuiu para as vitórias recentes contra a doença. Os anos 90 trouxeram descobertas genéticas que foram rapidamente incorporadas ao dia-a-dia dos consultórios. “Todo oncopediatra sabe que hoje é obrigatório fazer o estudo genético de amostras do sangue antes de programar o tratamento da leucemia”, diz Luiz Fernando Lopes, do Departamento de Pediatria do A.C. Camargo. Algumas mutações genéticas são associadas com um pior prognóstico. Quando elas revelam que a criança é de alto risco, os médicos optam por uma quimioterapia mais agressiva e, em raros casos, radioterapia. Se a criança é de baixo risco, recebe uma quimioterapia mais leve. Há menos sofrimento e menos gastos. É possível também saber quem vai se beneficiar do transplante de medula. Ele é indicado na minoria dos casos. Nos melhores centros de tratamento, a leucemia infantil pode ser curada em 80% dos casos A evolução das drogas permitiu a criação de combinações mais eficazes e com menos efeitos colaterais. “Nos anos 80, todas as crianças que faziam quimioterapia passavam 24 horas vomitando”, diz Lopes. 3
  • 4. “Felizmente, isso é passado”. Surgiram novos medicamentos para abrandar efeitos colaterais do tratamento, como vômitos e infecções. Outra grande conquista foi o cateter de longa permanência, um tubo de plástico que é implantado numa veia do peito e facilita a aplicação de medicamentos e a coleta de sangue para exames. Antes dessa invenção, as crianças sofriam inúmeras picadas, a ponto de as enfermeiras não encontrarem mais veias para puncionar. A tecnologia evoluiu, mas a informação da sociedade não avançou com a mesma rapidez. Até recentemente, Laura Slater Alves, de 5 anos, usava um desses cateteres no peito para tornar menos doloroso o tratamento da leucemia. Depois de longas temporadas no hospital, ela foi liberada para voltar a fazer aquilo de que mais gosta: nadar. Na escola de natação, as outras crianças olhavam, curiosas, para o cateter. A professora perdeu a chance de falar a verdade e ajudar a desmistificar a doença. Pediu à mãe da menina, a nutricionista Betzabeth, que arranjasse uma forma de cobrir o cateter para que ele “não assustasse” as outras crianças. Betzabeth não obedeceu. A marca no peito é o símbolo de uma luta que não precisa ser apagada. É a sociedade que deve se acostumar com a idéia de que crianças com câncer nem sempre apresentam sinais evidentes como a cabeça carequinha. Elas podem ter os cabelos Chanel e a vivacidade de Laura e ainda assim estar enfrentando um período de fragilidade física e emocional. A menina já terminou o tratamento. Agora precisa apenas fazer hemogramas a cada seis meses. Mas o pai, o jornalista Francisco Alves, decidiu contar a experiência da família no livro O Dodói da Gigi, da Editora Signus. Ele vem com um CD com a narração da história e músicas. “A idéia é ajudar as crianças internadas a entender o que está acontecendo, mesmo que elas não possam ler”, diz Alves. Em casa, Gigi é a doce Lalá. Nem todas as crianças com câncer têm as mesmas oportunidades que ajudaram Marcos Gregório e Laura a enfrentar a doença com mais leveza. Para essas, a nova cara do câncer infantil ainda é uma abstração. A falta de acesso a diagnóstico rápido, tratamento de qualidade e leitos de internação quando ocorrem complicações impede que todas as crianças tenham a mesma chance de cura. “O maior desafio do Brasil é reproduzir na maioria dos serviços as boas taxas de cura conquistadas pelos centros especializados no atendimento do câncer infantil”, diz Silvia Brandalise, presidente do Centro Infantil Boldrini, em Campinas, São Paulo. Na instituição, uma das mais experientes da América Latina, 80% dos pacientes são atendidos pelo SUS. Cinco anos depois do tratamento, 70% deles estão vivos, independentemente do tipo de câncer. No caso da leucemia linfóide aguda, a sobrevida é de 88%. O mais devastador em termos de saúde pública é a ignorância das autoridades sobre a real extensão do problema. Qual a incidência do câncer infantil nas várias regiões do país? Qual porcentagem dessas crianças morre? Onde é preciso melhorar o acesso ao diagnóstico e ao tratamento? Por isso é tão importante o levantamento divulgado pelo Inca na quinta-feira (leia os principais dados no quadro abaixo). É a primeira vez que um estudo desse tipo é feito em 20 municípios brasileiros, a partir dos chamados registros de câncer de base populacional. Isso significa que os pesquisadores não coletaram apenas informações nos hospitais. Eles também buscaram outras fontes, como dados de exames anatomopatológicos e certidões de óbito, para certificar-se de que não havia duplicidade de dados. Tudo isso para chegar a um resultado que é a totalidade de casos de câncer infantil ocorrida na população de cada município participante num período de quatro anos. O mapa do câncer infantil no Brasil 4
  • 5. A leucemia é o tipo mais comum nos 20 municípios onde a pesquisa do Inca foi realizada. Esse é um padrão mundial 5
  • 6. “Não pudemos juntar todos os dados para apontar a incidência de câncer infantil no Brasil”, diz a pesquisadora Beatriz de Camargo, do Instituto Nacional do Câncer (Inca). Isso porque os dados são de períodos distintos e há grandes diferenças de qualidade entre os 20 registros de câncer. “Mesmo com possíveis fragilidades, o grande valor desse levantamento é apontar as principais questões e estimular o surgimento de novos estudos que possam respondê-las”, diz Marise Souto Rebelo, gerente da divisão de informação do Inca. Seguindo um padrão mundial, a leucemia apareceu como o tipo de câncer mais comum. O porcentual médio para o Brasil foi de 29%, variando de 19% em Aracaju a 42% em Manaus. A mais alta incidência de leucemia foi verificada em Cuiabá (70 casos a cada milhão de habitantes até 18 anos). O resultado chama a atenção, e os pesquisadores ainda não conseguem explicá-lo. Suspeitam que a abertura recente de um centro capaz de fazer diagnósticos de leucemia em grande quantidade tenha inflado os números. Pacientes provenientes de outras cidades da região e tratados em Cuiabá podem ter se identificado como moradores da cidade, o que teria aumentado a quantidade de casos no município. Os linfomas, câncer do sistema linfático que costumam ser tratados com sucesso em mais de 70% das crianças e dos adolescentes, são mais freqüentes em Jaú, no interior paulista. O “efeito Cuiabá” também pode ter acontecido em Jaú. A cidade dispõe de um centro de referência no tratamento do câncer que recebe pacientes de vários municípios vizinhos, além de outro Estados. O centro é um dos únicos da região com capacidade de oferecer, em grande quantidade, exames que confirmam os linfomas. Como identificar a doença Os primeiros sintomas dos tipos de câncer mais comuns na infância e na adolescência e como tratá-los. As chances de cura (cinco anos sem sinal da doença) são animadoras LEUCEMIA LINFÓIDE AGUDA 6
  • 7. O QUE É É o câncer mais comum da infância. Acomete células sanguíneas da medula óssea que dão origem aos linfócitos, células de defesa do organismo SINTOMAS Palidez progressiva, febre inexplicada por mais de cinco dias, hematomas, hemorragias em gengivas, fraqueza e dores nas pernas, gânglios aumentados no pescoço, na axila e na virilha TRATAMENTO Quimioterapia durante dois anos LEUCEMIA MIELÓIDE AGUDA O QUE É É mais grave que a leucemia linfóide aguda. Acomete as células sanguíneas da medula óssea que dão 7
  • 8. origem a diferentes células do sangue, com exceção dos linfócitos. Corresponde a 20% das leucemias agudas SINTOMAS Palidez, febre inexplicada, hemorragias nas gengivas, no cérebro ou nos pulmões, dores nas pernas e infecções TRATAMENTO Quimioterapia durante oito meses LINFOMA DE HODGKIN O QUE É Câncer no sistema linfático. O Hodgkin é um subtipo de linfoma que tem um comportamento mais lento em relação aos demais. É mais freqüente em adolescentes SINTOMAS Aumento dos gânglios no pescoço, na axila ou na virilha. Em alguns casos, febre prolongada, emagrecimento e suor excessivo durante a noite TRATAMENTO Quimioterapia e radioterapia 8
  • 9. LINFOMA NÃO-HODGKIN O QUE É Esse subtipo tem um comportamento mais agressivo. Pode ocorrer em qualquer idade. Os sintomas aparecem rapidamente SINTOMAS Aumento dos gânglios do pescoço. Febre prolongada, massas abdominais de crescimento rápido, com obstrução intestinal TRATAMENTO Quimioterapia de seis a 24 meses dependendo do subtipo de linfoma não-Hodgkin A DISTRIBUIÇÃO DAS MORTES Óbitos a cada milhão de habitantes entre 0 e 18 anos. Em todas as faixas etárias, a mortalidade da Região Centro-Oeste está acima da média nacional. Enquanto isso, os óbitos no Norte e no Nordeste estão sempre abaixo da média nacional. O próximo passo dos pesquisadores será tentar explicar essas diferenças 9
  • 10. O segundo tipo de câncer mais comum nas populações infanto-juvenis é o de cérebro. Vencer esses tumores ainda é um desafio, embora o prognóstico de crianças e adolescentes costume ser melhor que o dos adultos. Dependendo do tipo de tumor, a parcela de crianças vivas cinco anos depois do diagnóstico 10
  • 11. varia de 10% a 60%. Porto Alegre é a cidade com mais casos (33 a cada milhão). O diagnóstico desse tipo de tumor depende de exames de imagem sofisticados, como a ressonância magnética. Por isso, esse tipo de câncer costuma ser subnotificado. Nem todas as cidades conseguem oferecê-los em grande quantidade. Porto Alegre consegue. Entre os tumores ósseos, um dos mais comuns é o osteossarcoma. Ele ocorre principalmente em adolescentes. Pode se propagar rapidamente e atingir os pulmões. Mas a evolução do tratamento permite salvar 70% dos afetados. A maior incidência de tumores ósseos apareceu em São Paulo (48 a cada milhão). Nenhum dos pesquisadores arrisca uma explicação. “Está difícil chegar a conclusões a partir desses dados. Esse estudo é apenas o começo”, diz Beatriz. A realização desse trabalho é um esforço louvável de lançar luzes num campo em que faltam informações básicas. Mas esse é o tipo de pesquisa que abre espaço para muitas dúvidas e não oferece nenhuma resposta. A boa notícia do relatório é que a mortalidade por câncer infantil vem caindo no Brasil. No caso das leucemias, a análise da série histórica revela um pequeno declínio entre 1979 e 2005. Nas regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste, houve um decréscimo médio de cerca de 1% ao ano (ilustração na pág. 2). Nas regiões Norte e Nordeste observou-se o fenômeno inverso: a taxa de mortalidade cresceu cerca de 2% ao ano. “Nessas regiões notamos uma redução nas causas de morte não-definidas. Isso é sinal de que a qualidade dos dados melhorou, e não que as crianças estejam morrendo mais”, diz Beatriz. A taxa de mortalidade por todos os cânceres infantis no país é de 39 casos a cada milhão de habitantes, cerca de 40% superior à verificada nos Estados Unidos, onde ocorrem 26 mortes por milhão. Para salvar mais crianças, o Brasil precisa investir em duas frentes:  Melhorar o diagnóstico precoce. A demora para conseguir agendar consultas e realizar exames reduz as chances de vida. Diferentemente do que acontece nos adultos, não existem exames preventivos para o câncer infantil. A mãe precisa ter informação e desconfiar dos primeiros sinais. Enfermeiras que dão dicas de aleitamento materno, por exemplo, poderiam ser treinadas para dar noções sobre os primeiros sinais da doença.  Oferecer tratamento em centros especializados que contam com equipe multidisciplinar. Atualmente, muitas crianças atendidas pelo SUS fazem quimioterapia em clínicas prestadoras de serviço, cirurgia em outro endereço e radioterapia num terceiro. O tratamento não é planejado adequadamente e não há integração entre as equipes. Se o paciente passa mal depois da quimioterapia, acaba sendo internado num pronto-socorro qualquer e não é atendido por quem entende de câncer. Salvar as crianças já não basta. Os médicos querem garantir que elas vivam bem e sem seqüelas SOBREVIVENTE Tatiana fez tratamento de leucemia nos anos 80 . “Saía arrasada. Nunca correndo como Marcos” 11
  • 12. Outro grande desafio da oncologia pediátrica é reduzir os efeitos tardios do tratamento. Nos anos 70 e início dos 80, a filosofia de “salvar a criança a qualquer preço” cobrou um preço elevado. Além de quimioterapia pesada, a maioria das crianças com leucemia enfrentava sessões de radioterapia. Sofriam inúmeros danos. De alterações odontológicas como falta de raiz nos dentes até graves déficits de cognição e memória. Muitas das crianças tratadas nos anos 80 e acompanhadas até hoje no A.C. Camargo não puderam estudar e têm dificuldades que comprometem o dia-a-dia. O crescimento das meninas era interrompido, e elas ficavam propensas à obesidade. Em alguns casos, ainda hoje, o tratamento pode provocar infertilidade. Para tentar contornar esse efeito, cientistas israelenses estão congelando o tecido ovariano de pacientes entre 5 e 20 anos. Eles conseguiram descongelar o material alguns anos depois e extrair cerca de nove óvulos imaturos das amostras de cada paciente. Quando essa técnica se tornar corriqueira, meninas pequenas poderão ter a fertilidade preservada e usar os óvulos para tratamentos de reprodução assistida no futuro. “Nossa habilidade de tratar o câncer infantil melhorou tanto que agora é preciso garantir que esses pacientes tenham vida plena, inclusive com a capacidade de ter filhos”, diz David Adamson, presidente da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva. Tatiana de Jesus Canha, de 29 anos, tentou engravidar algumas vezes e não conseguiu. Ela fez tratamento de leucemia quando tinha 6 anos. É uma das pacientes cujos efeitos tardios são avaliados no A.C. Camargo. Ela mede 1,50 metro e nunca esqueceu do dia em que a médica lhe explicou que ela não cresceria mais. Tinha 9 anos e fez alongamento por mais três na tentativa de ganhar alguns centímetros. Não adiantou. Assim como muitas das crianças tratadas nos anos 80, Tatiana está 20 quilos acima do peso ideal. Tem leves dificuldades de memória, que não a impediram de se formar em Pedagogia. Costuma anotar tudo o que é essencial. Tatiana e Marcos Gregório encontraram-se no hospital. São representantes de duas gerações de tratamento. Tatiana enfrentou as piores quimioterapias, sofreu algumas seqüelas, mas saiu vitoriosa num tempo em que a cura era incerta. Marcos Gregório é o símbolo do vigor e da esperança. Ele também será acompanhado até os 20 anos, mas os médicos acreditam que não terá as seqüelas da geração anterior. Em silêncio e com um meio sorriso nos lábios, Tatiana observava as brincadeiras do garoto espoleta no mesmo cenário em que ela passou tantos anos de sua infância. Seus pensamentos iam longe. “Daquele tempo, lembro de passar horas no colo das voluntárias”, diz. “Da psicóloga, eu fugia. Até hoje não gosto muito”. O câncer passou, mas as marcas da experiência nunca saíram dela. Bibliografia: -http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI18138-15257,00- A+NOVA+CARA+DO+CANCER+INFANTIL.html -indoafundo.com 12