O documento descreve a NATO como uma peça essencial do domínio do capitalismo ocidental no mundo. A evolução da NATO visa controlar mercados e recursos para o capitalismo globalizado, através de uma rede complexa de dependências políticas, militares e econômicas lideradas pelos EUA. A NATO expandiu sua área de atuação para além da Europa após a queda da URSS, intervindo em locais como Afeganistão e Kosovo.
1. Um problema mundial chamado NATO
Sumário
1 - NATO, peça essencial do domínio do capitalismo ocidental no
mundo
2 – Uma abordagem histórica da NATO
Da fundação até 1991
Depois de 1991
3 – Actuais envolvimentos específicos da NATO
Afeganistão
Kosovo
Operação “Active Endeavour”
Somália
Iraque
A proliferação das armas nucleares
GUAM
Israel
Desenvolvimentos recentes
4 - Gastos monstruosos com a defesa e a guerra
Os malefícios da NATO para o caso de um pequeno país – Portugal
5 - As forças armadas e o militarismo
6 - A luta contra a NATO
1 - NATO, peça essencial do domínio do capitalismo ocidental no
mundo
A evolução do dispositivo estratégico militar ocidental - e da NATO em
particular – procura ir ao encontro das necessidades do capitalismo
para o controlo de mercados e recursos, mormente energéticos, nesta
fase de globalização neoliberal, cuja relevância se não compadece
com quadros de actuação limitados geograficamente.
Esse dispositivo é o único com vocação e capacidade para uma
intervenção ao nível planetário. Na sua procura de hegemonia, em
cada acção concreta, procura cooptar, para a sua órbita, países não
integrados na estrutura militar liderada pelo Pentágono. Esse esforço de
domínio exige um paciente trabalho de construção jurídica, de
persuasão ou ameaça política, de compra de influências e de
propaganda, adaptado ao terreno e à conjuntura. Assim se constrói
uma complexa rede de dependências, de esferas que se cruzam,
justapõem ou complementam, para que a maioria das situações reais
esteja abrangida e controlada dentro de, pelo menos, uma dessas
esferas de domínio.
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2. No centro desse dispositivo encontra-se o Pentágono, nome que
popularmente, designa o Departamento de Defesa dos EUA, estrutura
ímpar da administração americana em ligação com outras reputadas
instituições, como a CIA ou a NSA. É o Pentágono que tem o maior
quinhão, entre todos os departamentos, do orçamento americano.
Para o ano fiscal agora iniciado (Setembro), o orçamento do
Pentágono é de $ 663 700 M (incluindo $ 130 000 M para o Afeganistão
e o Iraque) e que corresponde a mais de 40% dos gastos mundiais com
a defesa (1)
No auge da Guerra Fria, os EUA procuraram cercar a então URSS com
alianças político-militares hostis, numa estratégia montada pelo
secretário de estado George Kennan. Surgiram então, para além da
NATO, a CENTO (extinta em 1979 com a revolução iraniana), a SEATO
(extinta em 1977 após a derrota americana no Vietnam), a ANZUS, o
NORAD e ainda, a OEA – Organização dos Estados Americanos para
controlo do quintal latino-americano.
Actualmente, o dispositivo estratégico militar ocidental desenvolve-se
em várias dimensões políticas, jurídicas e militares, com vários graus de
envolvimento dos países enquadrados:
• O seu núcleo duro é constituido pelas próprias forças armadas dos
EUA que, fora das suas fronteiras, detêm 823 bases militares, das quais
287 na Alemanha, 130 no Japão e 106 na Coreia do Sul, de acordo
com Manolis Arkoladis, do ILPS – International League of People’s
Struggle(2), em contexto multilateral ou bilateral;
• A NATO representa o principal órgão militar multilateral ao nível
mundial. A inclusão recente da maioria dos países da Europa central
e oriental, aumentou a sua relevância territorial e política. Sem ter
abandonado a sua característica inicial de oposição à URSS,
(transferida para a Rússia), a NATO alargou a sua área de actuação
à Ásia central e do sul, bem como ao Índico;
• Num outro patamar, surge a ONU, cujas possibilidades de
intervenção apresentam várias vantagens. Não sendo uma
organização militar, a ONU pode ser particularmente útil ao
dispositivo estratégico militar ocidental ao intervir em missões
secundárias, de rescaldo de conflitos ou, que possam configurar-se
como de carácter humanitário, servindo, portanto para ocupar o
terreno e manter ou restabelecer uma certa ordem. Por outro lado,
permite a utilização de soldados não pertencentes a países da
NATO, onde essa presença possa ser objecto de resistências vivas em
áreas de antiga colonização europeia. Ao integrar quase todos os
países do mundo, a ONU pode representar, simbolicamente, uma
neutralidade que as instituições ocidentais não têm, pese embora
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3. todas as decisões para operações militares tenham de passar pela
aprovação de um directório designado Conselho de Segurança e o
não veto dos seus membros permanentes. Em certos casos, a ONU
vem vulgarizando a delegação, no terreno, da sua actuação, na
NATO (Kosovo); até porque as potências ocidentais dificilmente
aceitariam a presença de “capacetes azuis” africanos, asiáticos ou
muçulmanos, na Europa.
• Dentro da lógica de criar elos com outros países não integrados no
dispositivo estratégico militar ocidental, em áreas e situações
específicas, a NATO criou, em 1994, a Parceria para a Paz,
designada como Conselho de Parceria Euro-Atlântico em 1997, com
objectivos no âmbito da cooperação militar e assistência. Abrange
quase todos os países da NATO, a Rússia e os países neutrais da
Europa. Nesse âmbito, foram também construidas instituições de
cooperação entre a NATO e a Ucrânia que tem tropas no Kosovo e
no Afeganistão, sob o comando da NATO; e entre a NATO e a Rússia
que procedeu de igual modo na missão naval ao largo da Somália.
• Em 1995, a NATO criou o Diálogo no Mediterrâneo para contribuir
para a segurança e a estabilidade regionais, abrangendo todos os
países do norte de África, excepto a Líbia mas, incluindo a Jordânia
e Israel. Note-se que este tipo de designações pomposas pretendem,
em regra, disfarçar o desejo de hegemonia e domínio imperialista
efectiva nas regiões a que se aplicam:
• Em 2001, a criação da Operação “Active Endeavour”, para patrulhar
o Mediterrâneo, constituiu um aproveitamento americano dos
atentados de New York, irrecusável para os outros países, quase
obrigados, uns, a tomar atitudes contra uma sempre exagerada
ameaça terrorista global e outros, aproveitando a oportunidade
para tratarem, como lhes convémm os seus problemas específicos
(Rússia – Chechénia).
À semelhança do que se vai passando ao nível interno de cada país,
onde se assiste a uma grande integração entre as atribuições das forças
armadas e das polícias, no quadro do controlo biopolítico dos povos,
também as instituições multilaterais criadas fornecem um quadro de
actuação não exclusivamente militar, cabendo sob a designação de
“luta contra o terrorismo” actividades como o apoio na administração
civil, a organização de eleições, o combate à criminalidade, a
vigilância marítima, o tráfico de drogas ou a imigração clandestina.
2 – Uma abordagem histórica da NATO
Nem sempre é possível ou conveniente, numa abordagem sobre a
NATO, esquecer as outras peças do dispositivo de domínio ocidental no
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4. mundo, uma vez que a utilização de uma ou outra é varíável, articulada
caso a caso.
A NATO, pelos meios militares que pode congregar, pelo poder
económico e tecnológico que o conjunto dos seus membros dispõem,
bem como pela sua abrangência territorial directa e indirecta, é uma
peça central do dispositivo ocidental de domínio geoestratégico no
mundo. Articula-se. de forma flexível, ao nível militar com o Pentágono e
as forças armadas americanas, que constituem a sua trave mestra.
Porém, as forças armadas dos EUA – de per si - detêm capacidade
para intervir militarmente em quase todo o mundo, nomeadamente
onde a NATO não o tem podido fazer.
De facto, todo o dispositivo militar ocidental tem como vértice o
Pentágono. E o poder, a autonomia que este detém, no contexto do
governo americano dota-o, por exemplo, da capacidade de fazer
transitar o secretário de estado da defesa, Robert Gates, da
administração Bush para a de Obama, eventualmente considerado
menos fiável que o seu antecessor e, portanto, de impor Gates, para
garantir uma continuidade sem sobressaltos.
Da fundação até 1991
Desde a sua criação, em 1949 a NATO nunca contribuiu para resolver
qualquer problema aos povos; apenas tem servido para acrescentar
problemas onde eles já são demais.
Durante os seus primeiros anos de vida e até ao desmembramento do
Pacto de Varsóvia (criado posteriormente à NATO, em 1955) a NATO só
se expandiu com a admissão da Espanha em 1977, por iniciativa do
PSOE de Felipe Gonzalez, desejoso de reforçar a sua integração
europeia e no dispositivo imperial liderado pelos EUA. Essa ligação à
NATO vem no seguimento da instalação de bases militares americanas
em Espanha, permitidas por Franco, necessitado de aceitação
internacional para o seu regime, no final da II Guerra, num quadro
bilateral e no espírito do mais primário anti-comunismo, comum às
administrações americanas como ao fascismo espanhol.
Não é que a NATO se incomodasse muito com os regimes políticos dos
seus membros, com a democracia ou falta de democracia reinante
neles e, por extensão, com a sorte dos povos; o importante era a
aceitação da suserania militar americana. Não foi, portanto, a NATO
que excluiu a Espanha, numa paciente espera de que Franco
desaparecesse mas antes, a ditadura de Franco que se colocou fora,
uma vez que o ditador espanhol queria manter algumas distâncias face
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5. aos EUA, desconfiado como era face ao “american way of life”, pouco
adequado ao seu conservadorismo católico. Tal como, aliás, o
português Salazar, embora este tenha sido obrigado a aderir ao
dispositivo americano por causa da importância dos Açores durante a II
Guerra e posteriormente, como escala de reabastecimento nas
ligações entre os dois lados do Atlântico, em caso de conflito leste-
oeste. Refira-se ainda que a NATO também ajudou e veio a coexistir
muito bem com os coronéis gregos ou com os regimes militares turcos,
igualmente de pendor autoritário e fascista.
Até ao fim da chamada Guerra Fria, a NATO foi o principal manto que
cobriu vários objectivos estratégicos dos países ocidentais no seu
conjunto e dos EUA, particularmente, no que respeitava à URSS e aos
países do Pacto de Varsóvia:
• Politicamente, promover um clima de insegurança e de ameaça
permanente quanto ao poder militar soviético e às reais
capacidades e intenções da URSS para com a Europa Ocidental.
• Internamente, desse clima internacional de crispação sairam
atitudes de repressão, descrédito e discriminação relativamente a
partidos e movimentos de esquerda e de trabalhadores, sofrendo
todos o anátema de estarem ao serviço do “comunismo
internacional”. Na Itália, nas décadas de 70-80, tendo em conta a
dimensão da reivindicação sindical e política, os militares da NATO
congregaram-se com a direita italiana, a Mafia e o Vaticano, na
preparação de um golpe de estado (Operação Gládio), para
fomentarem uma saída autoritária para o país, dado o esgotamento
do regime, baseado no continuado domínio do Partido da
Democracia Cristã (PDC), no poder desde 1946.
• Forçar a URSS a um esforço armamentista para além das suas
capacidades que, como se veio a verificar, contribuiu para o
desmoronamento do sistema político-económico existente, de
capitalismo de Estado;
• Subsequentemente, após esse desmoronamento, alargar o território
de aplicação do modelo de capitalismo assente no “mercado livre”
e no domínio irrestrito do capital financeiro e das multinacionais;
• Criar condições para a manutenção de um elevado volume de
encomendas militares, viabilizando assim um complexo político-
militar-industrial, com o vértice no Pentágono financiado pelo
dinheiro dos impostos e complementado por enormes exportações
de armamento sofisticado;
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6. • Justificar, com o pretexto das necessidades militares de “contenção”
do “império do mal”, o foco do investimento público na
investigação, a inovação e a tecnologia dependentes das
prioridades materializadas em projectos de desenvolvimento de
material bélico, de segurança e de comunicações (casos da
internet, dos computadores, da exploração espacial);
• Garantir um mercado vasto e garantido para a colocação do
armamento, com dois níveis de integração. Uma a nível produtivo,
entre a indústria americana e as dos países europeus ocidentais; e
outra a nível dos clientes, destinando-se aos principais Estados as
armas mais modernas e aos outros, menores, o armamento usado ou
tecnologicamente ultrapassado;
Em todo este período, de 1949 a 1991, a NATO, formalmente, não
participou em operações militares, deixando aos seus membros toda a
liberdade de actuação em territórios não abrangidos pela organização.
Nesse quadro unilateral ou multilateral desenvolveram-se conflitos vários,
na Coreia, no Vietnam, no Suez, em Chipre, no âmbito da
descolonização, com ou sem guerras de libertação, na maioria dos
casos fora do contexto da rivalidade Leste-Oeste mas, a esta
redireccionados e sempre sem confronto directo entre tropas da NATO
e do Pacto de Varsóvia.
Depois de 1991
Tendo em conta que o objectivo central da NATO era declaradamente
a defesa do “mundo livre” contra o “totalitarismo soviético”, ou o
“comunismo”, o desmembramento do pacto de Varsóvia, em 1991,
após a implosão da URSS deixou, momentaneamente, a NATO órfã de
objectivos que lhe justificassem a existência.
Ainda em 1991, na Declaração de Roma, a NATO proclamou que era
preciso estar atento aos riscos resultantes das dificuldades económicas,
políticas e sociais na Europa Central e Oriental. Essas dificuldades foram
deliberada e metodicamente agravadas pelo apoio ocidental ao
desmantelamento descontrolado das suas estruturas económicas, pela
selvagem intervenção do capital financeiro, pela reciclagem de
antigos e corruptos “aparatchiks” em corruptos neoliberais e ferverosos
defensores da democracia de mercado, pelo corte brutal de direitos
sociais e sujeição dos trabalhadores a um desemprego maciço.
Assim, em 1992, navios da NATO intervieram para impor um embargo de
armas à Sérvia-Montenegro, na sua primeira actuação fora do território
dos seus membros. Em 1995, a organização bombardeou os territórios
da Republica Srpska, na Bósnia-Herzegovina, no prosseguimento da
política de desmembramento e divisão étnica da Jugoslávia. Em 1996,
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7. 60 000 soldados da NATO ocuparam a Bósnia sob a cobertura de um
mandato da ONU (3).
Em 1999, a NATO bombardeou a Sérvia-Montenegro para forçar à
retirada dos sérvios duma parte do seu próprio território - Kosovo – a sua
separação com base numa divisão étnica e que veio a culminar na
independência do território em 2008. Nesses bombardeamentos, os EUA
aproveitaram para incorporar resíduos nucleares (urânio empobrecido,
proveniente do lixo atómico das centrais nucleares) em projécteis
enviados para o território sérvio, o que constitui, claramente, um crime,
pois virá a contaminar os seus habitantes durante décadas,
Entretanto, a NATO cresciam acentuadamente de 16 membros em 1991
para os actuais 28, integrando todos os ex-membros do Pacto de
Varsóvia (6), as antigas repúblicas soviéticas do Báltico (3), duas
repúblicas da ex-Jugoslávia e a Albânia, já em 2009. A pequena
Macedónia mantém-se à porta devido ao veto grego enquanto os EUA
tentam incluir a Ucrânia e a Geórgia apesar da oposição da França e
da Alemanha.
Os objectivos insertos nesta pressão para o alargamento da NATO, é
protagonizada pelos EUA, que traçam, no essencial, os seus contornos
e, desenvolvem-se em vários sentidos:
• Aproveitar a dissolução do antigo espaço de influência da URSS para
ganhar dimensão territorial e acentuar o seu papel de gendarme
mundial;
• Proceder, sob pretexto do 11 de Setembro, à passagem de uma fase
de intervenção armada em conflitos pré-existentes para outra, mais
agressiva, de proceder a guerras preventivas, declaradas por sua
exclusiva iniciativa;
• Procurar compensar a fraqueza económica dos EUA e do dólar, bem
como a perda de relevância política da Europa, com a utilização da
força militar ou a sua exibição de forma intimidatória para com as
novas potências emergentes, com realce para a China, a Rússia e a
Índia;
• Envolver a maioria dos países da Europa Central e Oriental num anel
de cerco à Rússia, separando esta da Europa Ocidental, reduzindo a
sua presença no Báltico, no Mar Negro e a sua tradicional influência
nos Balcãs. Para o efeito intentaram (o projecto foi cancelado por
Obama em Setembro de 2009) colocar na República Checa e na
Polónia um Escudo Anti-Mísseis (Missile Defense Shield) armas
orientados contra a Rússia, numa ostensiva atitude de desafio e
ameaça, susceptível de gerar represálias, por exemplo, com o
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8. abastecimento de energia à Europa. No seguimento da guerra-
relâmpago da Ossétia do Sul em 2008, os EUA chegaram, dentro
desse objectivo, a assinar um acordo com a Polónia;
• Reduzir a esfera de influência russa na Europa oriental, gerando
tensões na Ucrânia, na Geórgia e na Moldávia;
• Disputar com a Rússia o controlo das vias de abastecimento
energético da Europa, provenientes daquele país, do Cáucaso e da
Ásia Central, aproximando-se - tanto quanto possível - das suas
origens;
• Arrastar nas suas aventuras, Estados neutrais pertencentes à UE
(Suécia, Áustria, Irlanda…) como parceiros integrantes de uma
mesma civilização e modelo político e económico, numa lógica de
ocupação de todo o mapa europeu;
• Dificultar ligações directas de abastecimento energético da Europa
a partir do Irão mas, também cercando este país, com as
ocupações do Iraque e do Afeganistão ou o controlo aero-naval do
Golfo Pérsico, dominar estrategicamente, o vital abastecimento de
petróleo da China (60% das necessidades provêm do Golfo) e da
Índia, os grandes rivais do século XXI, e do Japão; ou ainda,
agitando a “comunidade internacional” com uma eventual ameaça
nuclear iraniana;
• Pressionar e condicionar o mundo islâmico, com ocupações,
ameaças, divisões e assim sustentar o seu aliado estratégico – Israel -
aplicando as bizarras e racistas teses do “choque das civilizações”
proposto por Huntington;
• Manter o conjunto dos países europeus numa situação de
menoridade e subalternidade estratégica, eternizando para o efeito
a ideia de uma ameaça russa, que teria sobrevivido, como herdeira
de uma ameaça soviética, francamente exagerada;
• Alargar o número de compradores de armamento, substituindo nos
novos aderentes, o antigo fornecedor russo ou soviético, por
equipamento militar americano (os EUA em 2008 foram o principal
vendedor de armamento ao nível mundial, com 68% do total, a
grande distância da concorrência, pois o segundo lugar coube à
Itália, com dez vezes menos) (4) ;
• Alargar a área fornecedora de militares e civis para doutrinamento
em acções de formação. Essa doutrinação repousa, em regra, na
presunção da eterna superioridade do capitalismo, da economia de
mercado, da propriedade privada, tendo subjacente um
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9. preconceito racista e neocolonial face aos outros povos e às nações
do Sul e respectivas formas de organização politica e social. A título
de exemplo refere-se esta frase, presente no “Código de Honra” dos
alunos da Academia Militar (onde são formados os oficiais do
exército português: “O aluno da Academia Militar ama
devotadamente a sua Pátria e forja os seus ideais no culto dos
grandes valores humanos e cristãos que a encheram de glória no
passado” (citado por Mário Tomé, in “Novo Paradigma para a
Defesa Nacional”, Set/2009;
Ideologicamente, a NATO definiu, em 2007(5), num documento de
estratégia global que inclui o que se designa aqui como a sua “carta
de riscos” onde cada um desses “riscos”, de per si ou pela sua
conjugação, pode merecer, de acordo com a organização, uma
primeira opção pelo uso de armas nucleares, tácticas ou estratégicas.
Essas ameaças são:
• O fundamentalismo religioso, implicitamente islâmico, uma vez que o
fundamentalismo cristão, tão influente nos tempos de G. W. Bush…
fica de fora pois faz parte da “luta contra o Mal”, como aliás o
wahabismo da Arábia Saudita ou os integristas judeus;
• O fundamentalismo político, isto é, todas as formas de organização
social que se não enquadrem na democracia representativa de
modelo ocidental e o liberalismo económico, fórmula de
pensamento definitivo e único, onde cabem elementos tão diversos
como a Venezuela de Chavez, Cuba, o Irão, a Coreia do Norte, o
Hamas, a al-Qaeda, os talibans, etc e ainda os movimentos políticos
de esquerda, pacifistas, ecologistas ou de luta pelos direitos
humanos. Nesta concepção de fundamentalismo político não se
englobam países parceiros, como a China ou Israel;
• O terrorismo internacional, designação sempre difusa, onde cabem
essencialmente organizações de âmbito local ou regional, longe de
constituirem ameaças internacionais. A manutenção desses
contornos indefinidos é particularmente útil para dotar a NATO de
interpretações convenientes, numa lógica de geometria variável
que lhe permita agir como, quando e onde lhe possa interessar;
• O crime organizado, retórica que esquece o sistema financeiro onde
os seus lucros são transformados em respeitáveis investimentos
imobiliários, hoteleiros e financeiros, bastas vezes utilizados para
corromper governos, partidos políticos e poderes locais; que exclui a
fraude financeira que, pela sua dimensão é geradora última de
recessão e desemprego, como se vem assistindo; que é um utilizador
activo de ”offshores” e da evasão ou fraude fiscal; e que se interliga
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10. amistosamente com o dispositivo militar ocidental na Colômbia, no
Afeganistão, no Kosovo ou na Albânia;
• A proliferação de armas de destruição maciça, se estiverem
localizadas em países onde manda “O Mal” (Coreia do Norte) ou,
mesmo onde não existam (Irão e Iraque de Saddam, em 2003) mas,
desde que os acusados estejam ao serviço do “Mal”, definido pelos
EUA. Naturalmente que as cerca de 150 armas nucleares não
assumidamente possuidas por Israel estão ao serviço da paz (6) e do
“Bem”, assim como as das outras potências nucleares (12000 dos EUA
ou da Rússia, centenas da Inglaterra e da França). Em 2008, o
Congresso americano ratificou um acordo com a Índia em que esta
(que tem cerca de 150 ogivas nucleares) é definida como potência
nuclear militar responsável, segundo o critério americano de
responsabilidade. Também no que respeita ao Tratado de Ottawa,
que contempla a não produção e uso das mortíferas minas anti-
pessoais, os EUA, a Rússia e a China, mantêm-se de fora.
• As alterações climáticas também preocupam a NATO e os seus
estrategas, não porque põem em causa a sobrevivência da vida na
Terra mas, porque geram conflitos, por exemplo, pelo controlo da
água. Porém, se Israel envenena ou atulha poços palestinianos, ou se
a Coca-Cola, na Índia, deixa milhares de camponeses sem água
para a agricultura, aqueles merecem toda a indulgência pois estão
do lado do “Bem”. Por outro lado, movimentos ecologistas e de
camponeses, podem ser classificados como ameaças globais se se
constituirem em obstáculos para investimentos privados (nucleares,
no represamento de águas, na destruição da floresta tropical, etc)…
cuja prossecução seja fundamental para gerar riqueza e emprego;
• A segurança energética, como adiante mais desenvolvidamente se
explicitará, motiva uma luta acerba nomeadamente pelo controlo
das energias fósseis, cujas reservas ainda que imprecisas ou objecto
de manipulações comerciais, caminham inexoravelmente para o
esgotamento.
• O mesmo documento deixa claro que um dispositivo militar que
admite utilizar armas nucleares por razões tão diversas e tão
desligadas de um cenário de guerra real, como as acima
enunciadas, naturalmente, não se contém no capítulo dos direitos
humanos aplicados ao inimigo, seja este um fragilizado prisioneiro
(Abu Ghraib, Guantanamo), ou uma população civil pobre e
indefesa (Iraque, Afeganistão), numa negação dos princípios mais
nobres criados pela Humanidade e de que os governos dos países
da NATO tanto gostam de se apropriar, em exclusividade. Pelo
contrário, a NATO vem incorporando na sua actuação, os princípios
e as derivas mais execráveis aplicados durante a História, tais como o
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11. genocídio (Palestina), violência sobre populações civis, detenções
indefinidas ou internamentos sem acusação formal, nem julgamento,
inserindo-se assim na tradição de práticas históricas recentes ou de
má memória;
• O referido documento, para agilizar a aplicação da agenda atrás
referida, pretende, em termos do processo de tomada de decisão;
o A actuação expedita da NATO, em casos onde seja necessário
proteger um grande número de vidas humanas, deve efectuar-se
mesmo sem a autorização do Conselho de Segurança da ONU.
Como se sabe, quando necessário, a máquina de propaganda
dos EUA e da NATO pode arquitectar a existência de perigosos
arsenais de armas de destruição maciça (Iraque); um genocídio
sérvio sobre os kosovares; uma aliança com a al-Qaeda (na
Somália ou no Iraque), para intervir unilateralmente; ou perigosos
terroristas nas pobres aldeias bombardeadas do Afeganistão e do
Paquistão;
o Acabar com o consenso na tomada de decisões na NATO, com a
abolição do direito de veto, a favor de decisões por maioria, para
favorecer uma maior rapidez na sua intervenção no terreno;
o Terminar com o direito nacional à não participação em
operações da NATO, por parte dos seus membros. Como o
contingente actual da NATO no Afeganistão se concentra nas
forças armadas dos EUA, com contribuições relativamente
simbólicas dos outros países, pretende-se aumentar o esforço de
guerra dos restantes membros da organização;
o Paralelamente, os países da NATO que não estejam no terreno, no
âmbito de uma particular operação, não poderão participar nas
decisões da organização sobre o assunto;
o Na prática, trata-se de tornar os Estados-membros em vassalos
ainda mais obedientes a uma voz de comando proveniente do
governo dos EUA e do Pentágono, em particular; de arrastar os
povos e os governos recalcitrantes nas aventuras militares da
NATO, à sua revelia e envolvendo-os todos nos perigos inerentes
às situações, para satisfação dos interesses de grandes empresas
multinacionais, veiculados pelo Pentágono e pela NATO; e de
diminuir a importância das decisões do Conselho de Segurança
da ONU, acentuando a hegemonia americana.
3 – Actuais envolvimentos específicos da NATO
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12. Actualmente, a NATO está envolvida em várias operações militares,
directamente ou através dos outros vectores do dispositivo estratégico
militar ocidental - as forças armadas americanas ou a ONU.
Afeganistão
A invasão americana em 2001, efectuou-se tendo como objectivos a
luta contra o terrorismo e a captura do Mullah Omar e de Bin Laden. O
realismo, porém, exige que se refira que essas capturas nem seriam
convenientes pois iriam reduzir a validade da luta anti-terrorista como
argumento para a futura actuação da NATO ou do Pentágono. A
NATO, por seu turno, instalou-se no Afeganistão em Agosto de 2003, a
pedido do governo afegão (previamente instalado pelos EUA) e da
ONU, que outorgou, de imediato a possibilidade de actuação fora de
Cabul, quadro inicial das operações. Recentemente, o Afeganistão foi
promovido, ao lugar cimeiro das intervenções americanas, após o início
do consulado de Obama.
Em Junho de 2009 estavam no Afeganistão 58000 soldados americanos
para além dos 74000 contratados para “serviços” (7) , num total de cerca
de 100000 militares ocidentais(8)
A intervenção da NATO, uma vez terminadas as operações da invasão,
visa (9):
• Ajudar o governo afegão e o seu povo;
• Lutar contra o terrorismo
• Materializar “os esforços de segurança internacional mais vastos,
para além da área euro-atlântica”
Na prática e para além da propaganda, o que tem sido conseguido é:
• A continuidade indefinida de um estado de guerra, que no
Afeganistão vem desde 1979, com a invasão soviética, bem como as
humilhações e massacres da população civil, demasiadas vezes
confundida com os rebeldes;
• A manutenção da partilha territorial entre senhores da guerra e os
guerrilheiros taliban, com a autoridade do governo a restringir-se às
cidades onde a protecção dos soldados da NATO é mais efectiva; e
isso, num contexto de variada e volúvel combinatória local de
apoios e inimizades, alianças e rivalidades;
• O volume dos refugiados afegãos no Irão e no Paquistão são,
respectivamente, 1.1 M e 1.8 M (10), com todo o cortejo de
sofrimentos e violências que daí resultam;
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13. • O recrudescimento da cultura da papoila (ópio), quase extinta no
tempo dos talibans e que, embora mais reduzida nos dois últimos
anos, não impede que o Afeganistão forneça 90% da produção
mundial(11). Depois de decisão de Outubro de 2008, tendo como
consequência as grandes ofensivas recentes no sul do Afeganistão
(Helmand), a NATO pretende incluir o combate ao tráfego de droga
nos objectivos da ocupação, alargando assim o número de
justificações para se manter no terreno e justificar reforços (12).
Recorde-se que décadas de intervenção militar para combater a
droga na Colômbia se têm revelado evidentes fracassos, não
evitando a prosperidade dos cartéis da droga e da segunda praça
financeira americana, Miami;
• À corrupção generalizada acresce a cobrança forçada pelos
talibans que abranje 20% das receitas das empresas locais,
ironicamente, em grande parte, resultante da ajuda estrangeira (13).
• A ligação do presidente Karzai aos americanos é antiga, (trabalhou
na Unocal, empresa petrolífera que está a construir um gasoduto no
Cáspio)(14), o que, a somar à sua dependência dos invasores, o
transforma num títere. Por outro lado, a forma fraudulenta como,
comprovadamente, ocorreram as eleições recentes, para beneficiar
Karzai, desacredita, tanto este como os ocupantes;
• O alargamento do conflito ao Paquistão, em virtude da proximidade
étnica e cultural de parcela importante da sua população
(pashtuns) pertencer à tribo maioritária no Afeganistão e, cuja
separação através de uma fronteira artificial, foi imposta pelos
britânicos no século XIX, depois de derrotados pelos afegãos em
tentativas de alargamento do seu império na região;
• O aumento das tensões políticas e da violência no Paquistão, muito
dividido entre apoiantes e adversários dos EUA e também vítima dos
“danos colaterais” causados pelos bombardeamentos americanos.
Tem sido apoiada pelos EUA, uma classe política corrupta, isolada do
povo, em ligação com os militares, que constituem um verdadeiro
bunker autónomo, cheio de regalias e poder, no seio do aparelho de
Estado paquistanês;
• Subjacente ao alargamento da intervenção americana no
Paquistão, estão vários objectivos. Um, é o controlo do armamento
nuclear paquistanês, para que não seja tomado por grupos islâmicos
anti-americanos; outro, é a pressão sobre a Índia, manejando o
antagonismo com o Paquistão, a propósito de Caxemira; finalmente,
introduzir uma cunha na tradicional proximidade estratégica entre o
Paquistão e a China, quando esta já goza de facilidades num porto
de águas profundas (Gwadar), com terminal petrolífero e ligação
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14. por estrada para a China (estrada de Karakorum), criando
dificuldades de acesso da China ao Índico;
• A desestabilização no Paquistão estimula o reforço da capacidade
militar da Índia que se irá colocar na posição de principal importador
de armamento ($ 6000 M por ano, aumento correspondente a mais
de 21% do seu orçamento militar)(15).
Kosovo
Na sequência dos bombardeamentos da Jugoslávia em 1999, foi
imposta pela NATO a separação de uma das suas províncias, o Kosovo,
situação nunca aceite pela Sérvia, eleita como “bête noire” da NATO,
nos Balcãs. O Kosovo é um país dominado pelo crime organizado, que
depende da ajuda financeira externa que representa 34% do seu PIB,
das remessas dos emigrantes (13% do PIB) e onde o desemprego é de
40/50% (16).
A segurança interna é, há 10 anos, assegurada pela NATO e outros
países europeus (14000 soldados actualmente) (17) e tende a eternizar-
se por várias razões:
• A divisão étnica imposta pelos EUA e pela UE nos Balcãs acentua o
antagonismo e a desconfiança entre as comunidades sérvia e
albanesa, sendo difícil a sua proximidade, sem uma mediação
externa;
• O objectivo da constituição de uma Grande Albânia, unificando a
Albânia com o Kosovo, parte da Macedónia e pequenas faixas da
Sérvia, do Montenegro e da Grécia está muito presente entre os
políticos albaneses e a sua concretização levaria, certamente, a
uma outra guerra na região;
• Por outro lado, sendo o Kosovo pobre e com poucos recursos, a
presença das tropas da NATO é um factor importante de
manutenção de algum alento económico;
• Finalmente, a instalação da enorme base de Boldsteel, conhecida
como a Pequena Guantanamo, na fronteira com a Macedónia, é
essencial para o dispositivo ocidental e visa o controlo da segurança
do AMBO, o gasoduto e que ligará o Mar Negro (Burgas) ao
Adriático (Vlore).
Nesse contexto, a presença da NATO irá manter-se como o elemento
dissuassor de conflitos e de garantia de uma formal adopção da lógica
do mercado livre e da democracia representativa mesmo que na
realidade o que esteja presente na região seja a pobreza, uma larga
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15. corrupção e o florescimento de uma economia mafiosa. Uma situação
com algumas semelhanças, pouco auspiciosas, com a da Colômbia.
Operação “Active Endeavour” (18)
Esta operação naval de vigilância e intercepção de navios no
Mediterrâneo, sobretudo oriental, começou em Outubro de 2001, um
mês depois dos atentados em New York, interpretados como um
ataque contra um Estado-membro, os EUA (artigo 5º do Tratado de
Washington, fundador da NATO). Através desta Operação, o dispositivo
estratégico militar ocidental constrói uma das suas esferas de influência
e envolvimento de outros países e territórios, fora do seu núcleo íntimo.
Assim, qualquer navio suspeito de transportar drogas, explosivos ou…
imigrantes clandestinos pode ser interceptado e inspeccionado, no
âmbito da luta contra o terrorismo. Para o efeito foi montado um
sistema de informações – Maritime Safety and Security Information
Service que envolve mais de 50 países, da NATO e da orla
mediterrânica, entre outros.
A liderança da NATO nestas operações, que tendem a perpetuar o
patrulhamento do Mediterrâneo e a vigilância do mundo islâmico, é
aceite por outros países como a Rússia (por causa da Chetchénia ou do
Daguestão), Israel (entusiasmadamente), a Ucrânia e a Geórgia (para
recolherem os favores ocidentais e entrar na NATO) e Marrocos (muito
ligado aos EUA e com forte oposição interna ao actual regime). Estão ali
envolvidos cerca de 2000 soldados (19).
Somália
Os EUA disputaram o domínio do Corno de África com a URSS, até aos
anos 80, para consolidarem o seu papel de suserania no Índico. Depois
da primeira guerra no Iraque, em 1991, decidiram intervir na Somália em
1992, com a cobertura da ONU a partir do ano seguinte, tentando
mascarar através de preocupações humanitárias o seu principal
objectivo de controlo das rotas do petróleo.
Foram lançados 38000 soldados nessa operação (28000 dos EUA) mas, a
operação foi desastrosa e em poucos meses veio uma traumática
retirada. Depois de uma década em que ninguém parecia interessar-se
pela Somália, a ascensão ali, do movimento radical dos Tribunais
Islâmicos, segundo a lógica americana, um ramo da Al-Qaeda, os EUA
voltaram a falhar quando financiaram contra aqueles alguns senhores
da guerra(20).
Quando o país ficou controlado pelos Tribunais Islâmicos, os EUA,
alarmados, fizeram avançar, com o seu apoio logístico, o exército
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16. etiope que tomou o poder, durante pouco mais de dois anos. Como se
esqueceram do tradicional antagonismo entre os dois povos - somalis e
etíopes – estes últimos sairam e tudo indica que o poder cairá nas mãos
dos sucessores dos Tribunais Islâmicos, a al-Shabaab.
Entretanto, os países ocidentais foram retirando proveitos do caos
somali:
• A enorme costa somali, desprovida de qualquer vigilância nacional
desde os anos 90, tornou-se um local onde facilmente se vem
despejando lixo nuclear e com metais pesados, de indústrias e
hospitais europeus, função assegurada pela Mafia, por encomenda.
Daí resultaram doenças, malformações em recém-nascidos e mortes
na população do litoral que viu, com a turbulência provocada pelo
tsunami de 2005, a chegada às suas praias, de bidões com roturas,
antes submersos. Que importa isso para os grandes media?
• Face ao esgotamento dos pesqueiros em geral, bem como o
controlo ao esforço de pesca existente nas zonas económicas
exclusivas da UE, a costa somali vem sendo objecto de uma
predatória pesca de atum, camarão e lagosta, sem qualquer
pagamento de direitos de pesca, limitando as capacidades dos
somalis, sem navios modernos de pesca e … fornecendo aos
consumidores europeus peixe eventualmente incorporante de
produtos tóxicos, ali despejados por empresas europeias!
Perante estes crimes ambientais e da devastação económica, os
pescadores somalis, para subsistir, procuraram escorraçar os grandes
navios da pesca industrial, obter rendimento do saque das suas
riquezas, sem prejuizo da existência de verdadeiros salteadores e,
recolhendo, por esse motivo, o apoio de 70% da população somali
(21).
Como esta situação desestabiliza o desenvolvimento de negócios e as
rotas do comércio internacional de petróleo, entram en cena os navios
de guerra ocidentais, chineses, russos, indianos e japoneses, contra os
“piratas” somalis. Em Outubro de 2008 a NATO decidiu mandar sete
navios de guerra para os mares da Somália e, em Dezembro a missão,
competentemente validada pela ONU, transitou para a órbita da UE
(operação Atalanta) que tem destacados para a região 15 navios de
guerra.
Decerto que não é por acaso que a Somália é bordejada pelo Golfo de
Aden e às portas do Bab el Mandeb, a porta sul do mar Vermelho. E
será difícil de compreender como é que as pequenas lanchas dos
“piratas somalis” podem justificar que esteja previsto um périplo de
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17. navios da NATO com escalas em Karachi, Singapura e Perth, na
Austrália (22).
Iraque
Os EUA de George W Bush, como é sabido, em conluio com Blair e
Aznar, com Durão Barroso a servir o chá, decidiram invadir o Iraque, em
2003, para encontrar as armas de destruição maciça de Saddam… que
nunca existiram. Essa operação foi desencadeada sem aprovação da
ONU, tal como posteriormente, foram os EUA que desenharam a
reorganização do país, designaram os seus dirigentes e conduziram as
acções militares que se sequiram à ocupação. A intervenção da ONU,
depois da ocupação, extinguiu-se bem depressa, com a morte de
Sérgio Vieira de Melo.
A guerra e a ocupação do Iraque nunca assumiram o carácter de
operação NATO, até porque alguns dos seus principais membros -
Alemanha, França, Canadá - condenaram a invasão, enquanto a
Turquia recusava a passagem de tropas pelo seu território.
Ainda que a guerra e a ocupação do Iraque sejam essencialmente da
responsabilidade dos EUA e da Inglaterra, sem o selo da NATO, elas
inserem-se totalmente nos mesmos objectivos estratégicos que regem a
organização, quanto mais não seja porque a NATO é, tal como o
Pentágono, uma das principais peças do dispositivo estratégico militar
ocidental. A questão da utilização de uma ou outra das siglas nas
operações de afirmação imperial é uma questão de conveniência
política e diplomática, uma vez que do ponto de vista restrito das
operações militares, da capacidade de destruição, o Pentágono não
precisa dos seus aliados, tem meios para actuar sozinho. No Iraque, a
NATO mantém, desde 2004, apenas um grupo de instrutores, constituido
por 140 militares, como símbolo da sua inserção no dispositivo global (23).
Para além de uma ruidosa opinião pública global contra a invasão do
Iraque, os atentados de Londres e de Madrid, ao acrescentarem novos
elementos para a medida do risco da operação, foram decisivos para a
quebra do entusiasmo dos aliados dos EUA no compromisso militar na
ocupação.
A transferência da responsabilidade da vigilância interna, ou contra os
grupos opositores à ocupação americana, das tropas dos EUA e seus
aliados, para o exército iraquiano (iraquização da guerra), faz lembrar a
vietnamização da guerra no Vietnam e, inevitavelmente, o seu
desfecho.
Os objectivos do dispositivo estratégico militar ocidental no Iraque são
vários mas, neles predomina o controlo das principais reservas de
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18. combustíveis fósseis (na área do Golfo Pérsico situam-se 60% do petróleo
mundial e 41% do gás natural) (24):
• A ocupação territorial e o controlo militar na área do Golfo permitem
aos EUA exercer uma pressão/chantagem que se estende aos seus
próprios aliados ocidentais, grandemente dependentes do petróleo
desta região, para os transportes e a indústria e, cuja substituição
ainda está distante;
• A crescente procura por países rivais que não possuem reservas
adequadas de hidrocarbonetos (Índia e China e Japão) torna-os
reféns do poder ocidental instalado na área do Golfo Pérsico;
• A emergência de novos jazidas, nem sempre acontece em áreas
dominadas pelos EUA (Venezuela, Brasil ou Turquemenistão) e, em
regra, apresentam condições de exploração bem mais caras que no
Médio Oriente;
• A perda do controlo do Irão em 1979 e as humilhações que se
seguiram sofridas pelos EUA, não estão esquecidas pelos governos
americanos, que vêm mantendo uma permanente ameaça sobre o
país, vítima de um golpe militar orquestrado pela CIA nos anos 50, da
agressão iraquiana de Saddam durante oito sangrentos anos,
apoiada a todos os níveis pelos países ocidentais. Por outro lado, o
Irão tem uma população numerosa (66 M), 10.9% das reservas
mundiais de petróleo e 16% das de gás (24); uma posição geográfica
que o torna próximo do Afeganistão e do Paquistão (os pashtun têm
língua e escrita próximas do farsi), das ex-repúblicas soviéticas da
Ásia Central (que têm petróleo e gás) ou do Cáucaso; e constitui a
fronteira leste do mundo árabe além de possuir uma longa linha
costeira que passa pelo estratégico estreito de Ormuz.
• A presença militar americana na região é um apoio seguro às
monarquias árabes, na contenção de aberturas democráticas e no
desenvolvimento económico e constitui um suporte próximo de
Israel, à sua agressão genocida aos palestinianos e à progressiva
ocupação do território destes;
• A aliança americana com as monarquias árabes visa também a
utilização, por estas, do dólar como moeda para as transações
petrolíferas, evitando assim a sua maior desvalorização. Recorde-se
que pouco antes da invasão do Iraque, Saddam tinha substituido,
nas transações externas o dólar pelo euro (2000) e trocou as suas
reservas monetárias da mesma forma (2001) (25) . No final de 2006, o
Irão trocou também o dólar pelo euro como moeda de transação
externa (26);
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19. • Acentua uma divisão territorial e religiosa no Iraque, em benefício
dos curdos e dos xiitas, para cultivar inimizades e encontrar aliados
que melhor ajudem os EUA a dominar o país.
A proliferação das armas nucleares
Para agilizar os seus planos agressivos dirigidos “urbi et orbi”, a NATO
procede a um aprofundamento das relações nas diversas áreas
geográficas do planeta, agilizando as suas redes de bases,
equipamentos, comunicações, informações, e ainda de interferências
na configuração dos regimes políticos.
Embora somente três dos membros da NATO detenham armas
nucleares – EUA, França e Inglaterra – foi decidido, em 1999, que é
urgente a participação de todos os membros da NATO na colocação
de armamento nuclear no seu território, mesmo em tempos de paz (23).
Sucede que esse alastramento da presença de armas nucleares a
países signatários do tratado de não proliferação nuclear (TNP) é
expressamente vedado aos países detentores dessas armas (artigo I)
enquanto os não detentores dessas armas se comprometem em as não
receber (artigo II) (27), pelo que aquele objectivo é um incumprimento
primário e um passo para que haja reacções em cadeia na sua
proliferação. Pior ainda, aumenta a possibilidade de um primeiro uso de
armas nucleares, fora do quadro, portanto, de uma legítima defesa
face a uma agressão.
A NATO, na Europa, detém armas nucleares em Buckel (Alemanha),
Kleine Brogel (Bélgica), Volkel (Holanda), Aviano e Ghedi-Torre (Itália)
(23), localizações essencialmente entendidas num quadro de aliança
atlântica e de antagonismo com a Rússia. As bases italianas, para além
de se inserirem na lógica da confrontação global com a Rússia e de
ligação com o arsenal nuclear israelita, desempenham também um
elemento dissuassor e de ameaça para os países da margem sul do
Mediterrâneo, uma vez que os países dos Balcãs, quase todos, se
encontram já absorvidos pela NATO.
Em separado, refere-se a base de Incirlik, na Turquia, onde também
estão armazenadas armas nucleares. Esta base situa-se muito próxima
do porto turco e petrolífero de Ceyhan no Golfo de
Iskenderun/Alexandretta, terminal de oleodutos vindos do Cáucaso e
do mar Cáspio, nomeadamente o BTC cujo principal accionista (30.1%)
é a BP-British Petroleum mas, onde estão também presentes, a
americana Chevron (8.9%), a norueguesa Statoil (8.71%), a francesa
Total e a italiana ENI (5% cada), entre outras (dados divulgados pela
BP). Pretende-se ainda que seja parte de uma futura ligação ao Mar
Negro e a Kirkuk, no Curdistão iraquiano (28).
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20. Todas estas ligações têm como objectivo fazer chegar a energia ao
Mediterrâneo e à Europa, através de percursos “seguros”, fora da
interferência russa e sem atravessamento da Síria ou dependendo dos
seus portos. Incirlik serve também de vigia do Mediterrâneo oriental
onde, não por acaso, está incrustrado o aliado israelita.
A Assembleia Geral da ONU em 24 de Setembro aprovou, por proposta
dos EUA, a Resolução nº 1887 que visa a criação de um mundo sem
armas nucleares. Tendo em consideração que os EUA são um dos
principais detentores das mesmas; que, juntamente com as outras
potências nucleares, não aprovaram nada que conduza à redução dos
seus arsenais, nem têm procedido a passos significativos nesse sentido;
que Israel, a Índia ou o Paquistão, não tendo assinado o TNP, não são
referidos na Resolução, esta não passa de um instrumento de pressão
sobre a Coreia do Norte e o Irão, por parte dos EUA. E também para se
passe a incluir na revisão do TNP, prevista para 2010, temas como o
desarmamento e o uso pacífico da energia nuclear.
Nesse sentido, Obama, assessorado por Sarkozy e Gordon Brown,
passaram de imediato à formulação de ameaças de intervenção militar
no Irão, enquanto a Rússia, aliviada pelo abandono pelos EUA dos
mísseis na Europa de Leste retribui, com um formal azedume para com o
Irão e denunciando, a construção por este país, há dois anos de uma
fábrica de urânio enriquecido. Estranhamente, toda a gente parecia
desconhecer este facto, numa manifestação de que a CIA e os satélites
espiões não servirão para nada.
GUAM
A Organização para a Democracia e Desenvolvimento Económico –
GUAM foi constituido em 1997 e engloba a Geórgia, a Ucrânia, o
Azerbaijão e a Moldávia mas, contrariamente ao que o nome indica
tem sido utilizada pelos EUA para pressionar e cercar a Rússia pelo sul,
alargar a intervenção ocidental no Mar Negro e controlar os oleodutos
que se dirigem à Europa, através da Ucrânia e provenientes do
Cáucaso e do Turquemenistão. De facto, o GUAM é o protagonista
fundamental para o CTG, oleoduto que visa ligar o Cáspio (Baku) à
costa georgiana e daqui até Odessa, evitando a travessia da Rússia,
para abastecer a Europa. A partir de Odessa já existe um oleoduto
ucraniano até Brody, onde actualmente, o petróleo russo entra na UE
através da Eslováquia e da Hungria. A NATO projecta prolongá-lo até
Plotsk na Polónia, onde hoje chega também o abastecimento russo
através da Bielorússia, sem passar por território ucraniano. Este projecto
de Odessa a Plotsk será o oleoduto OBP. Esta questão estratégica que
envolve os oleodutos tem diversas consequências:
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21. • Origina que o GUAM seja uma óbvia fase intermédia para a
integração formal dos seus membros na NATO, configurando-se
assim, como mais uma das preliminares esferas de alargamento da
influência e da intervenção da NATO;
• Inclui o GUAM, mais a subserviente Polónia de Kackzinsky e Tusk, num
caro dispositivo logístico (com transporte por oleoduto e por mar),
que visa reduzir a dependência energética da Rússia, numa lógica
concorrencial agressiva do interesse das multinacionais do petróleo
ocidentais;
• A construção do oleoduto CTG, seguido do transporte marítimo para
Odessa e do oleoduto OBP transportará petróleo do Cáspio para a
Europa através de países “seguros”, quer da NATO (Polónia), quer de
candidatos, como a membros (Ucrânia e Geórgia), em detrimento
da Rússia e da Bielorússia, esta, muito ligada a Moscovo;
• É sob este prisma que se manifestou a ameaça militar da NATO (o
projecto Escudo Anti-Mísseis - Missile Defense Shield, entretanto
abandonado por Obama em Setembro de 2009) e a guerra (Ossétia
do Sul, Chetchénia, ou Daguestão) que, decerto não beneficiaram
os seus povos, submetidos a estas disputas petrolíferas;
A acção mais expedita do GUAM naquela estratégia desenvolveu-se
em princípios de Julho de 2008, quando os presidentes desses países
(excepto a Moldávia) com os seus homólogos da Polónia e da Lituânia
se encontraram para discutir precisamente as questões dos oleodutos e
dos corredores de transporte, com a paralela e discreta supervisão de
um responsável americano (David Merkel). Duas semanas depois e até
ao final do mesmo mês, realizaram-se manobras militares com soldados
americanos, georgianos, ucranianos, azeris e até arménios (operação
“Resposta Imediata”). Decerto e não por coincidência, em 5 de Julho,
8000 soldados russos exercitavam-se perto da fronteira georgiana.
Em 7 de Agosto, o presidente georgiano, confiando no apoio dos seus
aliados tenta invadir a Ossétia do Sul, parcela secessionista da Geórgia,
apoiada pela Rússia. Na sua imprudência, não contou com a reacção
russa que rapidamente travou essa invasão e promoveu a declaração
de independência da Ossétia do Sul e da Abekásia, com muito escasso
reconhecimento da “comunidade internacional”. Embora com menos
sucesso que a declaração de independência do Kosovo, patrocinada
pelos EUA(29) esta estratégia visa exactamente o mesmo fim: a
afirmação de que esses territórios são protectorados seus.
Os EUA de Bush mostraram-se discretos nos seus protestos formais mas,
passados poucos dias do fracasso georgiano na Ossétia, a 14 de Agosto
assinava um acordo com a Polónia para a instalação ali de “mísseis
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22. interceptores”, projecto há muito combatido pelo seu alvo - a Rússia - e
entretanto abandonado.
Israel
Israel não pertence à NATO mas, insere-se profunda e claramente no
dispositivo estratégico militar ocidental:
• É objecto de continuada ajuda e assistência militar dos EUA, desde a
sua criação. Tem sido mesmo o principal beneficiário nas ajudas
militares concedidas pelos americanos desde 1976 até 2003, quando
foi… compreensivelmente. ultrapassado pelo Iraque. Desde 1985,
Israel recebeu subsídios dos EUA numa média de $ 3000 M por ano,
de acordo com Jeremy M. Sharp (30);
• Israel participa, com os EUA, no desenvolvimento de tecnologia
militar, bem como em exercícios militares e estabelece acordos de
cooperação militar com países que vão sendo objecto de particular
atenção por parte dos EUA, como a Geórgia ou o Azerbaijão, numa
clara posição de complementaridade estratégica (31);
• Beneficia de todo o apoio diplomático dos EUA e da infinita
tolerância da UE em todas as suas atitudes racistas e genocidas face
aos palestinianos e agressivas relativamente ao mundo islâmico em
geral;
• Israel cumpre escrupulosamente a estratégia do “choque de
civilizações” e, a sua persistente ocupação de território alheio é
inspirada na versão mais extremista do sionismo que nada deve ao
Lebensraum hitleriano. E a Europa que tanto sofreu sob a barbárie
nazi parece infinitamente tolerante para com Israel, concedendo-lhe
o perdão irrestrito pelas suas acções só porque os judeus europeus
sofreram duramente com essa mesma barbárie;
• Políticamente, Israel fundamenta a suas atitudes e a sua própria
existência na procura de uma emenda de factos históricos milenares,
baseada numa tese delirante de se considerar como povo eleito por
uma divindade. Na verdade, nos EUA ainda é vulgar encontrar quem
sinta que a nação tem uma missão civilizadora do mundo, sobre
povos inferiores, moralmente decadentes, aos quais compete a
subordinação à nação eleita;
• Israel constitui uma ilegítima fortaleza ocidental em terras árabes,
numa região petrolífera e, por isso os EUA e a Europa dispõem-se a
acarretar com todo o antagonismo do mundo islâmico e com os
frequentes conflitos e guerras com nações islâmicas, em vez de
procurar criar relações de paz, amizade e de cooperação pacífica;
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23. • O dispositivo militar da NATO interliga-se com Israel na operação
“Active Endeavour” para o policiamento do Mediterrâneo oriental,
oferecendo, portanto a Israel um apoio importante, numa zona
fulcral para o país;
• Os países ocidentais são capazes de verberar a posse de armas
nucleares pela Índia, por exemplo e gerar campanhas mediáticas,
ameaças e sanções contra o Irão, sem apresentar quaisquer provas
de que o país esteja a construir armas nucleares. Porém, ignoram
que Israel tem mais de 150 e contou com o decisivo apoio da França
para o desenvolvimento da sua capacidade nuclear;
• A chegada do petróleo e do gás natural proveniente do Cáspio e
da Ásia Central a Ceyhan (desde 2006) visa disponibilizar no
Mediterrâneo oriental (já vigiado por navios da NATO no âmbito da
operação “Active Endeavour” e pelo aparelho militar israelita) sem a
interferência da Rússia. Outras vias de assegurar o escoamento
daqueles produtores de combustíveis fósseis dependeriam da
travessia de estados árabes (Síria ou Iraque) ou do Irão, uma vez que
a utilização do Afeganistão e a costa paquistanesa parecem
bastante problemáticas. Ceyhan tenderá não apenas a constituir
uma via de abastecimento da Europa (objectivo essencial para a
NATO) como também a disponibilizar hidrocarbonetos a Israel e,
através deste, fazê-lo chegar a Eilat, no mar Vermelho, onde ficaria
disponível aos consumidores asiáticos, tornados portanto,
dependentes dos humores do Ocidente e da NATO-Israel para o seu
abastecimento (32);
• Note-se também que a Turquia é detentora da principal fonte de um
recurso estratégico essencial que é a água, particularmente escassa
no Médio Oriente. Situam-se na Turquia as nascentes do Tigre e do
Eufrates e já existiram tensões com a Síria e o Iraque a propósito da
água. Israel tem graves carências de água que, por exemplo,
justificam parcialmente, a irredutibilidade em devolver os montes
Golan à Síria, porque se encontra ali um importante aquífero. Em
2002 Israel e a Turquia celebraram um acordo para o fornecimento
de água turca durante 20 anos, num total de 50000 M de litros (cerca
de 3% do consumo israelita) (33);
• A entrada em funcionamento do BTC abre caminho ao
desenvolvimento de outras fases do projecto global e no qual Israel é
parte essencial. Projecta-se a construção de várias ligações
subterrâneas, por mar, entre Ceyhan e Ashkelon para o transporte de
petróleo, gás natural, água e electricidade, cuja viabilidade
depende da travessia de águas territoriais sírias e libanesas. Talvez
por essas razões, Israel vem tentado esmagar o Hezbollah, os EUA
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24. afastaram as tropas sírias do Líbano e mantêm uma relação crispada
com Damasco. Esperam-se, provavelmente, novos conflitos, para os
quais a aliança estratégica entre a NATO e Israel será uma peça
chave (28);.
Desenvolvimentos recentes
O dispositivo militar estratégico ocidental está particularmente atento às
alterações na distribuição dos poderes à escala mundial e vai
procedendo à adequação e reposicionamento dos seus recursos, de
acordo com as hierarquias que estabelece para as suas prioridades e
para o que considera ameaças à sua suserania. As recentes posições
dos EUA e da NATO revelam elementos de relativa continuidade como
o empenhamento no Afeganistão, o prosseguimento da tolerância
para com Israel ou a animosidade para com a Venezuela, o Irão ou a
Coreia do Norte; e evidenciam mudanças, com o abandono
anunciado por Obama (17 de Setembro de 2009), do projecto Escudo
Anti-Mísseis - Missile Defense Shield ou a redacção da Resolução nº 1887
da ONU, sobre a proliferação de armas nucleares, já atrás referida.
Considera-se, porém, que as mudanças evidenciam alterações tácticas
e não alteram a estratégia que vem sendo desenhada, laboriosamente,
desde 1991, por parte dos EUA.
• No corte orçamental global para 2010 ($17000 M), o governo
americano só retirou ao Pentágono cerca de metade daquele valor,
o que corresponde a uma ínfima parcela dos seus gastos com a
defesa ($ 663 700 M). Nessa redução cosmética pesa sobretudo o
abandono da aposta em aviões F-22 Raptor ($ 2900 M em 2009).
Porém, não deixou de ser referido que pode haver um reforço
orçamental se as coisas se agravarem no Afeganistão ou no Iraque
(34);
• O abandono do F-22 não é uma conquista dos amantes da paz e do
desarmamento. Para a alegria do complexo militar-industrial dos EUA
ou… para animar a economia, foi adoptada a construção de 2456
aviões F-35, num programa de 12 anos. Segundo um órgão do
congresso americano, o “Congressional Research Service”, custará $
246 000 M ($100,1 M por aparelho) (35). Em contrapartida, para
desespero dos milhões de pessoas que têm fome e a indignação de
todos os cidadãos decentes, os países do G-8 dizem ter contribuido
com $ 13400 M (pouco mais de 5% do custo total dos F-35) para a
segurança alimentar mundial de Janeiro de 2008 a Julho de 2009 (36);
• São conhecidas as pressões americanas para um maior
envolvimento dos seus aliados (5) nas despesas militares e no
fornecimento de soldados seus para as guerras imperiais. A
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25. Alemanha, por exemplo, que durante décadas, se auto-excluiu do
envio de tropas para o exterior, está presente no Afeganistão (4000
soldados) onde foi protagonista recente em massacres de
população civil;
• O grande reforço da presença americana na Colômbia revela uma
maior atenção ao que se passa na América Latina onde vários
países (com grandes reservas de combustíveis) vêm mostrando
crescente autonomia e irreverência para com a tradicional suserania
americana. São os casos da Venezuela, da Bolívia, do Equador e, em
menor grau do Brasil e da própria Colômbia, podendo este país, ser
uma vai mais acessível de acesso à baxia amazónica. Por outro lado,
se Obama fez os golpistas hondurenhos sairem da OEA e vai
permitindo a deposição de Zelaya, a poderosa Hillary Clinton, a
propósito das Honduras, nada encontrou de melhor do que
ameaçar Chavez (37);
• O abandono do projecto da instalação dos mísseis na Europa de
Leste terá sido um negócio diplomático cumprindo a Rússia, a sua
parte, com a imediata renúncia à colocação de engenhos
semelhantes em Kaliningrado. Ao que se julga, haverá propostas
menos públicas que poderão conduzir à permissão americana para
que a Rússia, a Bielorússia e o Casaquistão entrem na OMC (a
reactivação do comércio mundial é prioridade para Obama), em
contrapartida de uma pressão russa sobre o Irão. Este tema foi
mencionado nas conversações com a Rússia, como aliás referido por
Rasmussen, secretário-geral da NATO. A “questão iraniana” está a
revelar-se uma peça de primeiro plano na hierarquia das
preocupações americanas;
• O mesmo Rasmussen não deixou de cortejar a Rússia para a inserção
na NATO, para lutar contra o terrorismo (num momento em que no
Cáucaso russo há atentados suicidas) e a proliferação de armas de
destruição maciça; para ajudar na estabilização do Afeganistão;
para integrar o dispositivo ocidental de mísseis com o fim de
contrariar as ameaças nucleares na Ásia e no Médio Oriente… e
esquecer os tempos da Guerra Fria. Rasmussen terá decerto querido
preparar o isolamento da Coreia do Norte e do Irão, ou mesmo
lançar perturbação na OCX – Organização de Cooperação de
Xangai que, desde 2001, agrupa a Rússia, a China e países da Ásia
Central e que tem como observadores, entre outros, o Irão e a Índia;
• Ao anunciar o fim do projecto da instalação dos mísseis na Europa,
Obama não deixou de referir que o mesmo será transferido para
“outra localização” e que «a nossa nova arquitectura de defesa na
Europa vai permitir uma defesa mais forte, mais eficaz e mais rápida
das forças norte-americanas e dos aliados dos Estados Unidos». Foi
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26. ainda referido que o programa balístico iraniano, o pretexto para o
projecto, continua a ser uma «ameaça importante» e que ex-
presidente Bush, «tinha razão» nesse ponto, deixando antever uma
maior confrontação no Médio Oriente.
4 - Gastos monstruosos com a defesa e a guerra
Para o desempenho da sua função de braço armado da hegemonia
ocidental no mundo e, de momento, com uma abrangência crescente,
de contornos variáveis e imprevisíveis, a NATO tem vindo a ser objecto
de um constante rearmamento e a absorver uma fatia não dispicienda
da riqueza dos seus membros.
Esse volume de recursos é francamente exagerado face às ameaças
efectivas e é socialmente inútil… se é que os gastos militares têm
alguma utilidade social.
Em quase todos os países da NATO, em graus distintos e, apesar dos
níveis elevados de riqueza (muito desigual) entre os seus membros,
existem debilidades estruturais no desempenho económico, agravadas
pela actual crise. Assim sendo,
• É um luxo a preferência por “canhões em vez de manteiga”, como
se costuma dizer, em termos de política económica e social ou de
afectação dos seus recursos das nações;
• O elevado desemprego, com o desinteresse pelos jovens, ou
mantendo trabalhadores mais velhos até à inanição; a precariedade
do trabalho e a estagnação ou redução do poder de compra; a
compressão dos gastos com a saúde e a educação; o desprezo
pela reabilitação urbana ou o crescimento das periferias urbanas
abandonadas pelos governos; a compressão das pensões de
reforma ou a sua tomada de apropriação pelo capital financeiro,
tornam claro para todos que há formas de aplicação do dinheiro
público bem mais úteis do que com com a “defesa”;
• Os gastos militares, o reforço do papel do sector privado, os apoios
aos bancos, às seguradoras, à especulação financeira, são, no
entanto as grandes prioridades do gasto público por parte dos
governos. Discute-se arduamente nos EUA, como forma de cobrir os
riscos de 46 milhões de cidadãos, não a criação de um serviço
público e universal de saúde mas, um limitado seguro único que
permita economias públicas sem marginalizar a indústria seguradora;
porém, a discussão é menos viva no que respeita aos aviões F-35
com um custo unitário de $100 M;
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27. • Na UE, a harmonização dos equipamentos militares no seio da NATO
é dada como essencial. Ao seu nível de importância, somente o
temporariamente adormecido PEC (Pacto de Estabilidade e
Crescimento) que pretende aplicar-se a todos os Estados, de forma
mecânica e igual, como se todos tivessem a mesma configuração
económica; ou os preceitos do BCE, verdadeiro cristal de estupidez,
em termos de política monetária; ou o totalitário Tratado de Lisboa. A
criação de um regime fiscal único, a tributação da especulação, a
criação de um sistema europeu de saúde ou um salário mínimo
comum, alinhados pelas melhores práticas europeias, não são
prioritárias.
O alargamento geográfico da área de actuação da NATO, a
frequência e a profundidade das suas intervenções têm também
impactos desastrosos nos países menos desenvolvidos em vários
sentidos;
• Geram corridas ao armamento, em detrimento do seu
desenvolvimento ou na melhoria das condições de vida dos povos,
muitas vezes, beneficiando militares e regimes corruptos. Essas
aquisições de equipamentos militares, usados ou tornados obsoletos
pela produção de armas mais modernas, permitem o seu
escoamento pelos países desenvolvidos e a rendabilidade nestes, da
indústria militar;
• Estabelecem uma segmentação artificial e perigosa entre países
“bons”, os aliados ou subservientes da NATO e os “maus”, se
procurarem traçar caminhos próprios e pacíficos de coexistência
com os outros países e povos;
• Dessa segmentação surgem mesmo conflitos armados, entre países
pobres, inspirados, em representação ou por encomenda da NATO
ou, autonomamente dos EUA e que alimentam tráfegos mafiosos de
armas;
• Como não existem povos geneticamente vocacionados para a
guerra e, pelo contrário, todos os seres humanos aspiram a viver em
paz e bem estar, com segurança, saúde, habitação, trabalho,
alimentação e educação, toda a Humanidade é prejudicada pelas
manipulações do poder imperial dos seus dirigentes nacionais;
• A influência da NATO e das indústrias militares mundiais gera castas
militares, com interesses próprios, antagónicos aos dos seus
concidadãos, prontos as golpes de estado e atitudes repressivas
contra movimentos populares, sindicais, pacifistas e de luta pelos
direitos. Essas castas militares, muitas vezes, verdadeiros estados
dentro do Estado estão sempre prontas a ser objecto do “lobbying”
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28. dos vendedores de armamento, com o enriquecimento corrupto de
generais;
• A manutenção da influência em dado país, da NATO ou dos seus
principais membros, tende a fomentar uma lógica conservadora de
estagnação das suas estruturas económicas e sociais, em prejuizo da
população, com elevadas carências em termos de nutrição, saúde,
educação e onde a falta de trabalho obriga ao estabelecimento de
dolorosos fluxos migratórios;
• Demasiadas vezes essa lógica conservadora subentende também a
manutenção ou o exacerbar da preponderância de uns grupos
étnicos ou religiosos, em relação a outros bem como a perpetuação
de elites incompetentes e corruptas, baseadas no poder militar ou
em sufrágios falsificados ou manipulados, pobres e desastradas
réplicas dos modelos ocidentais.
O papel da NATO no que respeita aos gastos militares mundiais tem a
seguinte e desmesurada representatividade:
2007 Milhões de US$
Mundo 1 339 000 100%
NATO 849 875 63.5%
EUA 583 283 43.6%
UE 311 920 23.3%
Fonte: (38) e (5)
A comparação dos gastos militares em 2008 e a sua evolução desde
1991 (extinção da URSS) relativamente aos principais países da NATO e
seus aliados, ou inimigos preferenciais, revela aspectos gritantes do
carácter agressivo da organização:
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29. 1991 2008 % do
Crescimento PIB Capitação
(a) (a) (%) (2007 2008 (b)
Alemanha 55,1 37,2 -32,5 1,3 451
Arábia
Saudita 17,3 33,1 91,3 9,3 1178
Canadá 13,9 15,9 14,4 1,2 479
China 13,7 63,6 364,2 2 48
Coreia (Sul) 12,9 23,8 84,5 2,6 492
Espanha 11,5 14,7 27,8 1,2 363
EUA 401,9 548,5 36,5 4 1803
França 57,7 52,6 -8,8 2,3 821
Holanda 10,7 9,9 -7,5 1,5 596
Índia 11,2 24,7 120,5 2,5 22
Inglaterra 62,3 57,4 -7,9 2,4 943
Irão 1,3 6,1 369,2 2,9 93
Israel 10,6 12,1 14,2 8,6 1704
Itália 29,6 32,1 8,4 1,7 552
Japão 40,4 42,8 5,9 0,9 336
Paquistão 3,3 4,2 27,3 3,1 24
Portugal 3,2 3,8 18,8 2 355
Russia (c) 42,5 38,2 -10,1 3,5 271
Turquia 10,4 11,7 12,5 2,1 154
Ucrânia 0,34 3,2 841,2 2,9 70
(a) Valores em 1000 M dólares de 2005 (constantes)
(b) Valores em dólares de 2005
Rússia, valores de 1992
Fonte: SIPRI - Stockolm International Peace Research Institute
• O elevado crescimento dos gastos militares de países como a
China, o Irão, a Ucrânia ou a Índia tem um significado muito
relativo e não constitui qualquer ameaça global, uma vez que se
insere numa lógica regional. Os EUA e a NATO são as únicas
potências com capacidade de intervenção, em termos políticos
e militares, em qualquer parte do mundo;
• Os gastos militares da China somados aos da Rússia, representam,
em 2008, apenas 18.6% do total dispendido pelos EUA;
relativamente ao “perigoso” Irão que tanta preocupação causa
a Obama, a percentagem correspondente é de 1.1%;
• As antigas potências coloniais, Inglaterra e França apresentam-se
nos 3º e 4º lugares no “ranking” mundial dos gastos militares, uma
posição nitidamente exagerada face às ameaças que incidem
sobre esses países mas, que revelam a importância das suas
indústrias militares e pretensões de retorno a um passado imperial;
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30. • Entre os países europeus da NATO seleccionados regista-se um
decrescimento real dos gastos militares, tendência essa que não
abrange os pertencentes à orla Mediterrânica (Espanha, Turquia,
Itália e Portugal). Poderá parecer estranho que a Turquia tenha
um crescimento modesto dos seus gastos militares – tendo em
conta a conflitualidade existente na sua região – mas, se isso for
relacionado com a forte implantação de bases da NATO no país,
poderá dizer-se que a defesa da Turquia foi assumida pela NATO.
Inversamente, que ameaça incidirá sobre a Espanha ou sobre a
Itália para gastos tão elevados na defesa? Será para deter os
fluxos de pobres imigrantes vindos de África?
• Tendo em conta que os equipamentos militares são caros, os
gastos militares dos países menos desenvolvidos não podem
concorrer com os dos países mais ricos da NATO e, em muitos
casos, apresentam uma elevada proporção de salários pagos a
exércitos volumosos e castas militares parasitárias. E, portanto,
tende a eternizar-se a preponderância das sofisticadas máquinas
militares da NATO e dos EUA, como potência dominante;
• Todos conhecem “os preparativos iranianos para atacar Israel”
mas, os factos revelam que os gastos totais israelitas em defesa
são o dobro dos iranianos, que cada iraniano gasta, em média $
93, contra $ 1704 de Israel e que este último país com gastos
militares correspondentes a 8.6% do seu PIB, só é ultrapassado
pela Arábia Saudita (9.3%).
Os malefícios da NATO para o caso de um país pequeno – Portugal
Portugal é um país com 10.7 M de habitantes, o mais pobre da Europa
Ocidental, com graves problemas estruturais que o dotam de elevados
deficits no âmbito da saúde ou das finanças públicas, de elevados
níveis de endividamento externo, de um mau sistema educativo, além
de ser o único da região com volumes significativos de emigração.
Sobre tudo isso paira um domínio absoluto de governos corruptos que
controlam toda a sociedade, que esbanjam os fundos comunitários e
domesticam o próprio aparelho judiciário. Todos estes problemas
acentuam o carácter periférico do país e a dependência perante os
mais poderosos países da NATO.
No tempo da Guerra Fria, o território português dos Açores era
importante no dispositivo da NATO mas, ficou desvalorizado com a
redução de perspectivas de um conflito generalizado. Não existem
conflitos regionais que ameacem ou mesmo envolvam Portugal,
situando-se o mais próximo, na RASD (Sahara Ocidental), para além da
instabilidade interna em Marrocos ou na Argélia. Recentemente,
Portugal desempenhou bem o seu papel de vassalo dos EUA dando
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31. facilidades aos voos da CIA de/para Guantanamo com prisioneiros,
depois da hospedagem dos decisores da invasão do Iraque, em 2003.
É um país com estas características que gasta 2% do PIB em defesa - ao
nível da Turquia e da China - só ultrapassado, entre os países ricos, pela
França e pela Inglaterrsa e muito acima da Alemanha, do Canadá, da
Espanha, da Holanda e da Itália.
Estes enormes gastos militares, em termos relativos, devem-se a três
factores:
• Presença militar em todos os lugares onde se acha presente o
dispositivo militar ocidental – Kosovo, Iraque, Afeganistão e
Somália;
• Manutenção de um elevado número de militares, tributo prestado
à sua actuação no derrube do regime fascista, em 1974, embora
os protagonistas dessa acção tenham sido rapidamente
afastados posteriormente e substituidos por quadros militaristas e
ultra-conservadores;
• Gastos militares desajustados, por exemplo em submarinos,
quando a costa portuguesa é uma das vias de entrada de drogas
na Europa e que tem o sistema de radares parcialmente inactivo
há dois anos; ou quando, recentemente, um envio de tropas para
o Afeganistão foi retardado, pois dos dois aviões de transporte
(Hercules) existentes, um estava em manutenção e o outro
avariou, deixando os militares em terra.
Portugal oferece, em suma, um exemplo claro, dos malefícios da
existência da NATO. Primeiro, porque inclui um pequeno povo, pobre e
pacífico, numa aliança agressiva, em cujas acções participa,
subservientemente, sem qualquer possibilidade de exercer influência
nas decisões tomadas; e, em segundo lugar, porque os gastos públicos
com a defesa contrastam com as imensas carências no âmbito da
saúde, da educação, da habitação, etc.
5 - As forças armadas e o militarismo
A incapacidade de encarar a resolução de conflitos que não pela via
militar, pela ocupação militar do terreno, enuncia as dificuldades de se
gerar desenvolvimento económico e criar riqueza, de combater a
pobreza e a doença em grande parte do mundo. E, passo a passo vão-
se estabelecendo cordões de segurança, alargando zonas de
intervenção, criação de zonas de conflito para o domínio de recursos
ou gerando conflitos resultantes do saque de desses mesmos recursos.
Em resumo, a importância dada às opções militares ou militarizadas
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32. resulta da pequenez e da escassez do próprio planeta Terra para
satisfazer a cupidez e a cobiça das elites económicas e políticas.
Como instrumento de domínio global, as forças armadas têm vindo a
alterar profunda e rapidamente o seu modo de funcionamento e as
formas de ligação com as sociedades em que se inserem:
• O grande reforço tecnológico nos equipamentos militares, exige
maiores qualificações aos soldados e, dispensa a presença de
milhares de homens pouco qualificados. As forças armadas,
nomeadamente as terrestres, passaram, à semelhança dos ramos
navais e aeronáuticos, a constituir actividades de capital intensivo;
• Essa incorporação tecnológica tem como objectivo a criação de
vantagens decisivas de detecção, neutralização e destruição do
“inimigo”, para efeitos de dissuassão ou de destruição efectiva mas,
também para reduzir ao mínimo as baixas em combate. Porém,
porque que se trata de uma actividade de capital intensivo exige
que as operações de desenvolvam rapidamente para que os custos
da guerra não assumam montantes brutais de reposição de
equipamentos destruidos e de manutenção de complicadas
cadeias logísticas, incompatíveis com os orçamentos estatais;
• A redução das baixas em combate não resulta de qualquer
preocupação humanitária, de uma elevada sensibilidade das altas
esferas militares à perda de vidas ou ao sofrimento humano. Resulta,
bem diferentemente, da procura de uma elevada assimetria nas
baixas da guerra, que minimize o tempo da guerra;
o As baixas próprias devem ser reduzidas, tendo em conta os
investimentos na formação dos soldados, ou a perda de
equipamentos pessoais mas, sobretudo para que a opinião
pública se mantenha relativamente alheia e desinteressada da
guerra;
o As baixas entre os militares do “inimigo” para além de constituirem
um factor de redução da sua capacidade de defesa, como
sempre foi objectivo da guerra, pretendem-se francamente
desproporcionadas para promover o terror, a aceitação da
superioridade política e da suserania do “Bem”;
o Está subjacente, neste contexto, um desprezo implícito para com
a vida humana, sacrificada. muito para além das necessárias
para o ganho de vantagens estritamente militares;
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33. o Está implícito, nesta filosofia, um conteúdo racista, desde que
entre as vítimas predominem árabes, muçulmanos, negros,
asiáticos.
• Dentro da mesma filosofia anti-humanista, inscreve-se o que é
definido nos comunicados militares por “danos colaterais”, isto é as
vítimas civis, nem sempre provocadas por enganos mas, sobretudo,
de modo deliberado, levados a cabo para atingir a população civil,
apoiante de movimentos populares, de guerrilha e, perante esses
danos e ameaças, levá-la ao abandono desse apoio, à delação, à
rendição aos elevados desígnios da suserania do invasor ou
ocupante;
• O já referido reforço tecnológico acentua a cobiça da industria
militar para a angariação de encomendas e a produção de
equipamentos cada vez mais sofisticados; e, como o crescimento
económico nos países ocidentais tem sido anémico, os governos não
regateiam apoios financeiros para a modernização das forças
armadas e o apoio às indústrias da guerra, para dinamizar a
economia;
• A “luta contra o terrorismo” constitui um argumento vago, obscuro,
permanente brandido em todas as direcções, uma das quais para
justificar o reforço da defesa e da segurança. Com essa “luta”
interligam-se, propositadamente, o combate ao narcotráfego e a
outros tráfegos ilegais ou criminosos e a contenção da imigração
clandestina, que em conjunto permitem uma integração das
funções militares com as funções policiais;
• A utilização de empresas privadas como fornecedoras de mão de
obra e adjudicatárias de funções e missões militares, efectuadas em
regime de “outsourcing” constituem uma verdadeira parceria
público-privada que representam uma real privatização de parte
significativa da execução da guerra. Na avaliação de Dario Azzelini
estas adjudicações são avaliadas em $ 150000/200000 M por ano (39).
• O abandono do serviço militar obrigatório transforma as forças
armadas, baseadas em elementos voluntários, seleccionados e
contratados, em verdadeira tropa mercenária, guardas pretorianas
disciplinadas, doutrinadas e bem pagas, capazes das barbaridades
mais dementes, junto de prisioneiros e da população em geral, da
qual se acham separados, por um espírito de casta que lhes é
incutido. Uma das vantagens para os poderes da profissionalização
das forças armadas é que reduz a pressão para o fim dos conflitos,
habitual em soldados obrigados à guerra e permite um pacífico
arrastamento dos conflitos, conduzido por pretorianos contratados;
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34. • A ausência de conscritos no serviço militar afasta os feitos militares da
população, que assim vê menos ameaçados os seus jovens e
portanto, menos preocupada com o que se passa na guerra,
transformada em palco de verdadeiros senhores da guerra; e, por
esse motivo, mais neutros face a uma profissional utilização de
comportamentos desumanos ou proibidos por convenções
humanitárias, como as bombas de fósforo, os projécteis de urânio
empobrecido, as minas anti-pessoais, as cobardes acções sobre civis
indefesos;
• O crescente divórcio entre, por um lado, os políticos profissionais e os
partidos políticos, sobretudo dos inseridos na lógica do rotativismo e,
por outro, a população, num contexto de dificuldades causadas
pela globalização neoliberal e pela crise financeira que dela
emanou, leva a uma elevada conivência e aliança entre a classe
politica e as castas militares, no que respeita à utilização das receitas
públicas;
• Contudo, se a guerra visa a apropriação de riqueza alheia por parte
dos agressores, esse objectivo pode constituir um fracasso total
quando se trata da ocupação efectiva e, sobretudo económica do
território. Se a ocupação se tornar mais prolongada, geradora de
resistências passivas ou armadas, de não colaboração com o
ocupante, tem-se visto que a enorme capacidade de destruição
dos exércitos modernos e a dos seus meios sofisticados de
comunicação, informação, vigilância e de poupança de baixas se
revela bastante frágil. E essa fragilidade, pode estar na origem de
uma clara derrota estratégica.
6 - A luta contra a NATO
A NATO tem muitas fragilidades que o seu potencial militar tende a
obscurecer. A sua capacidade de desencadear a guerra é enorme
mas, não é capaz de resolver os problemas que se deparam aos povos.
Enumeram-se, de seguida os factores que potenciam a luta dos povos
dos seus países-membros contra a organização:
• A NATO tem uma debilidade estratégica evidente, uma vez que, na
falta de um inimigo global credível, centra a sua existência numa
difusa luta anti-terrorista aliada a objectivos menores (para uma
instituição militar) como a criminalidade ou a imigração clandestina;
• Essa debilidade manifesta-se na dificuldade em captar a adesão dos
povos dos países-membros, incapazes de compreender a
necessidade de gerar conflitos e guerra por parte da NATO; e essa
adesão não só está ausente, como é substituida por atitudes de
dissidência e oposição por parte de segmentos sociais importantes;
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35. • A NATO goza, em regra, de impopularidade local ou regional nas
áreas das suas principais actuações, cujas populações estão longe
de receber os soldados ocidentais como agentes portadores de
liberdade, paz e bem-estar;
• Dessa impopularidade resultam as dificuldades de ocupação eficaz
dos territórios de intervenção, sendo cada vez mais evidente o não
cumprimento dos seus objectivos iniciais no Iraque ou no
Afeganistão, o que terá de ser encarado como derrota estratégica.
Essa impopularidade e esse descrédito irão, sem dúvida aumentar.
Em qualquer momento, a NATO poderá desencadear uma acção
espectacular, que tenha efeitos demolidores no campo militar,
impactos desastrosos sobre a população civil, elevando a já forte
desmoralização dos seus soldados e, com os benéficos efeitos no
aumento da consciência anti-NATO nos cidadãos dos países-
membros, como aconteceu recentemente, depois do massacre de
Kunduz;
• Uma derrota estratégica no Afeganistão ou no Iraque virá relançar a
discussão sobre a utilidade da NATO e da via militar para a resolução
dos problemas do mundo – pobreza, fome, saúde, etc; e,
provavelmente, aumentar as divergências no seio da aliança, para
além das que já se verificam;
• Uma derrota estratégica da NATO, com o abalar do domínio euro-
americano, reduz a sua influência em solo árabe e fragiliza a
fortaleza israelita; pode obrigar Israel a cedências efectivas, muito
para além das pretensões iniciais do governo sionista e, até conduzir
a uma Palestina, democrática e multiconfessional;
• O dispositivo militar da NATO é eficaz na destruição de exércitos
convencionais mas, tem falhado na ocupação do terreno, na
cooptação de políticos locais credíveis e, nem sequer pode dispor
dos meios para proceder a uma mobilização obrigatória de
soldados, como aconteceu na Indochina. Por seu turno, a
contratação do fornecimento de serviços militares a empresas
privadas tem evidentes limitações orçamentais;
• Paralelamente, as economias ocidentais vêm registando um baixo
crescimento e, a adopção da política económica neoliberal, a
desregulamentação da actividade económica e a financiarização
têm aumentado as desigualdades e desgastado a imagem dos
partidos do poder. Mais especificamente, os EUA, com os seus
crónicos deficits, a debilidade do seu sistema financeiro e uma
próxima redução drástica da relevância do dólar, dificilmente
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36. poderão sustentar mais operações militares, sobretudo se
prolongadas com ocupações;
• A própria subalternização da ONU aos interesses da NATO ou do
Pentágono, descredibilizam a instituição e podem conduzir a
reformas importantes na sua estrutura, nomeadamente, a extinção
do Conselho de Segurança, se se assistir ao fracasso da NATO ou do
Pentágono, isto é, do dispositivo estratégico militar ocidental;
• O alargamento do número de membros da NATO tem no bojo as
dificuldades próprias do crescimento da sua diversidade, que se
podem manifestar em faltas de coesão e no acentuar de conflitos e
antagonismos internos;
• A derrota da NATO tornará menos atraente o papel de joguete dos
países da Europa de leste não integrados na UE, pressionados para
integrar a NATO e com isso alimentarem tensões com a Rússia. E
retira o apoio de rectaguarda ao nacionalismo fascizante presente a
Leste da UE, nomeadamente na Polónia. Em geral, a existência de
políticos e militares corrompidos e alheados das suas obrigações
para com os respectivos povos - porque subservientes perante a
estratégia agressiva do Pentágono - resultará fragilizada no seu
conservadorismo oficial relativamente à NATO;
• Tem-se vindo a assistir a um aumento do peso e influência dos países
do Sul na cena mundial, no quadro do comércio, dos investimentos,
no crescimento económico, nas instituições internacionais, que
dificultam a actuação ou mesmo a afirmação da única potência
global, os EUA e dos seus braços armados, onde se inclui a NATO.
A substituição do serviço militar obrigatório pelo voluntariado, que
transforma os exércitos em organizações de mercenários, tende a
dificultar os movimentos populares de luta pela paz, baseados nas
crescentes baixas dos “nossos soldados”. As baixas entre mercenários
não provocam grandes mágoas e não motivam tanto os movimentos
populares de luta contra a guerra ou, ainda, os movimentos de mães e
familiares de soldados mortos ou estropiados na guerra. Se este factor
de ordem emocional não estiver presente ou for marginal, a luta contra
o militarismo e a guerra tem de se alicerçar em factores de ordem
económica, política, ética e humanitária.
A luta contra a NATO e o militarismo, protagonizada pelos povos dos
seus países membros, pode envolver várias frentes:
• Uma componente económica, insistindo na inutilidade e
inconveniência social dos gastos militares, em contraponto com os
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37. necessários investimentos na saúde, na educação, no alojamento,
etc;
• Uma componente ecológica, que consiste em apontar os perigos
inerentes à presença de bases militares, de território subtraído à
população para utilizações militares, sobretudo quando nelas
estejam armazenadas armas nucleares;
• Uma componente ética, que incide sobre o carácter anti-
democrático das soluções militares e pela intransigente defesa das
formas pacíficas de resolução dos conflitos;
• Uma componente humanitária, que se baseia na expressão de
solidariedade humana para com as vítimas da guerra, fomentando
um espírito de universalista e anti-militarista, de afirmação e
consolidação dos direitos humanos, fulcral para a criação de um
mundo melhor:
• Uma componente de denúncia política, a incidir sobre o parasitismo
de castas militares e das suas funções policiais, levadas a cabo pelos
partidos dominantes, como elemento central do controlo biopolítico
das populações.
Com frequência se assiste à existência de partidos e movimentos de
âmbito nacional que propõem a saída do seu país da NATO o que se
considera ser ingénuo quando não mera atitude populista com
objectivos eleitorais.
Países como a Inglaterra, a França ou a Alemanha poderão sair da
NATO ou recusarem-se a participar numa dada intervenção da
organização, se o entenderem, dado o seu poder político e económico
e isso poderá mesmo abalar a coesão de que a NATO precisa. O
mesmo não sucede para os países mais pequenos, que são a grande
maioria dos membros da NATO. E, por dois motivos:
• Um, de natureza política, que é o de os EUA não admitirem
facilmente e sem retaliações, deserções dentro da sua esfera mais
íntima de suserania, mesmo que a contribuição dessas saídas, a
serem protagonizadas por países pequenos, seja irrelevante em
termos da actual capacidade de intervenção militar da NATO;
• Em alguns casos, o posicionamento estratégico de um país
candidato à saída debilitaria claramente o dispositivo militar da
NATO que poderia provocar dificuldades não dispiciendas,
provocadas pelos EUA e pelos seus aliados. Seria, por exemplo, o
caso da Turquia, à semelhança do que aconteceu em 1979, com a
saída do Irão da esfera de influência dos EUA, que nunca
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38. esqueceram as humilhações nem a perda estratégica, então
sofridas.
Neste contexto, tendem a ser superficiais e ineficazes atitudes levadas a
cabo, isoladamente, a nível nacional para que um qualquer país saia
unilateralmente da NATO (a França de de Gaulle, saiu da estrutura
militar da NATO mas, regressou recentemente).
A movimentação contra a NATO, para ser eficaz e genuina, terá de ter
duas metas:
• Deve incidir sobre o encerramento da NATO, única forma de resolver
o problema e criar um ambiente global de paz;
• Deverá unir todos os povos ameaçados pela sua existência, quer
integrantes dos países-membros, quer das nações actualmente
vítimas das suas intervenções, quer daqueles que se poderão situar
na sua linha de mira para actuações próximas;
Notas e fontes
(1) http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u562129.shtml
(2) http://www.cebraspo.com/boletim-86-13-de-agosto-de-2008/29-
antagonismos-imperialistas-bases-militares-norte-americanas-e-o-
movimento-contra-elas.html
(3) http://en.wikipedia.org/wiki/NATO_intervention_in_Bosnia
(4) http://www.democracynow.org/es/2009/9/8/titulares#11
(5) http://www.wri-irg.org/node/6573
(6) http://oglobo.globo.com/mundo/mat/2008/05/26/israel_tem_pelo_m
enos_150_armas_nucleares_diz_jimmy_carter-546507073.asp
(7) http://www.democracynow.org/es/2009/8/24/titulares#7
(8)
http://www.google.com/hostednews/afp/article/ALeqM5iHBo8Es8WQf_
5TjH25T5vQ9RyaJQ
(9) http://www.nato.int/cps/fr/SID-FE182CC1-
6818B95A/natolive/topics_8189.htm#evolution
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