Este relatório apresenta os resultados de um estudo etnográfico sobre a adoção da televisão digital em Portugal, realizado em três zonas-piloto. O estudo visou compreender as atitudes e conhecimento dos participantes em relação à TV digital, como adotam novas tecnologias e suas preferências para a TV no futuro. As entrevistas e observações revelaram os principais fatores que influenciam a adoção da TV digital e as expectativas dos portugueses para a televisão.
1.
“ADOPT_DTV: Barreiras à adopção da televisão digital no contexto da
transição da televisão analógica para o digital em Portugal”
( PTDC/CCI‐COM/102576/2008)
Relatório do Estudo Etnográfico
Setembro de 2011
1
3.
Índice
1. Introdução...................................................................................................................... 4
Trabalho de campo e amostra .................................................................................................. 8
2. Principais resultados do estudo etnográfico ................................................................. 14
Conhecimento sobre a TV Digital ........................................................................................... 16
Vantagens e desvantagens da TV Digital ................................................................................ 20
Motivos para ter ou não ter TV digital.................................................................................... 23
Conhecimento do “switch‐off” ............................................................................................... 26
A TV nos próximos 5 e 10 anos ............................................................................................... 31
3. Bibliografia ...................................................................................................................... 38
3
4. 1. Introdução
O estudo etnográfico nas três zonas‐piloto de transição para a Televisão Digital
Terrestre (TDT) em Portugal, inserido no projecto de investigação “ADOPT – DTV: Barreiras à
adopção da televisão digital no contexto da transição da televisão analógica para o digital
(PTDC/CCI‐COM/102576/2008)”, teve por principal objectivo compreender em contexto
natural quais são as suas atitudes, grau de conhecimento, usos ou expectativa de uso em
relação à TV digital. Ainda, houve a intenção de compreender como estas famílias adoptam
novas tecnologias de informação e comunicação ou novos equipamentos de entretenimento
doméstico e pessoal e quais são os seus estilos de aprendizagem.
A realização de entrevistas semi‐estruturadas e a observação presencial da rotina das
famílias teve também o objectivo de avaliar as atitudes e preferências em relação à televisão,
abordando‐se, por exemplo, os géneros televisivos favoritos dos indivíduos, a frequência com
que estão em frente ao ecrã e a forma como interagem com este através, por exemplo, de
serviços como o teletexto. Finalmente, aos participantes foi pedido que projectassem no
futuro as suas preferências relativamente à televisão: o que gostariam de ver ou obter através
da televisão e como seria sua televisão ideal no futuro próximo.
A Etnografia (do Grego ‘ethnos’ = nação e ‘graphein’ = escrita) é uma abordagem
teórica e prática herdada da Antropologia que procura obter uma descrição holística detalhada
e proceder à análise de culturas através de trabalho de campo intensivo (Barker, 2000‐2003).
Para Clifford Geertz (1973) o que define a Etnografia é ser uma demanda arriscada e complexa
para obter uma descrição densa ou ‘thick description’, tomando de empréstimo uma noção do
filósofo Gilbert Ryle.
No campo dos Estudos Culturais, a Etnografia está centrada na exploração qualitativa
dos valores e significados no contexto de um modo de vida total (Barker, 2003). Ganhar acesso
aos domínios naturalizados, na expressão de David Morley (1992: 186), e às suas actividades
características é o objectivo principal da Etnografia e de outras estratégias de investigação
qualitativas usadas nos Estudos dos Media. Morley defende que uma acção como a de ver
televisão deve ser compreendida na dinâmica e na estrutura do contexto doméstico de
consumo do qual é parte (1992). As limitações dos inquéritos quantitativos baseados em
dados estatísticos estão bem estabelecidas, afirma Morley, para quem as técnicas estatísticas
são desagregadoras, já que inevitavelmente isolam unidades de acção dos contextos que lhes
dão significado. De notar que, com frequência a Etnografia tem vindo a ser invocada de forma
4
5. polémica contra a tradição da investigação quantitativa em comunicação, já que trata da
compreensão qualitativa da actividade cultural em contexto (Barker, 2003: 26). O argumento
apresentado por Morley (1992) é que, em primeiro lugar, o requisito essencial é o de fornecer
uma descrição densa adequada à complexidade da actividade de ver televisão, seguindo
Geertz, e que as perspectivas antropológicas e etnográficas são utilidade para se atingir este
objectivo. Este sociólogo integrou o Centre for Contemporary Cultural Studies (CCCS) da
University of Birmingham, onde de 1975 a 1979 liderou o importante estudo Nationwide
Audience, baseado no noticiário de assuntos correntes transmitido todos os dias úteis pela
BBC1 das 18 às 19 horas. Na sequência deste estudo, Morley viria a adoptar a Etnografia como
metodologia no projecto de investigação Family Television (1985‐86), no qual se procedeu a
entrevistas de famílias nas suas próprias casas, de forma a se averiguar como percepcionam o
papel da televisão no conjunto das actividades de tempos livres.
Antes de Morley, já o antropólogo cultural norte‐americano James Lull havia recorrido
à Etnografia como método, ao realizar um estudo com a duração de 3 anos no qual os
investigadores viveram com 200 famílias dos estados da Califórnia e Wisconsin, integrados
durante 2 a 7 dias no seu dia‐a‐dia. Neste estudo, que decorreu na década de 70, optou‐se por
considerar os usos sociais da televisão, com recurso à Antropologia e à Etnometodologia
(observação dos comportamentos rotineiros). Deste trabalho de investigação, Lull concluiu
que os usos sociais da televisão são primordialmente de dois tipos: estruturais e relacionais
(Gauntlett & Hill, 1999).
No entanto, a aplicação de métodos de investigação de matriz etnográfica no campo
dos Estudos de Audiências coloca novas questões e desafios. Ien Ang, autora de livros
fundamentais neste campo como Watching Dallas (1986) e Desperately Seeking the Audience
(1991), pergunta que tipo de conhecimento pode ser produzido pela investigação empírica das
audiências, melhor dizendo, qual é a política da etnografia das audiências (cit. Morley, 1992).
De um momento para outro, todos eram etnógrafos, refere ainda Morley (1992: 186), que
pergunta se o etnógrafo não se tornou uma ‘fashion victim’, seguindo de perto a observação
de Lull, que considerava já no final da década de 80 que a palavra Etnografia se tornou numa
‘buzz‐word’ utilizada abusivamente nos Estudos de Audiências.
A utilização abusiva do termo Etnografia também foi notada por David Gauntlett e
Annette Hill, autores de outra obra de referência nos estudos de audiências TV Living:
Television, Culture and Everyday Life (1999), com base num estudo longitudinal com a duração
de cinco anos promovido pelo British Film Institute, com recurso a diários de utilização de
media por parte de 500 de participantes, tendo por objectivos explorar questões de género,
5
6. identidade, impacto das novas tecnologias e o impacto das próprias ideias e experiências dos
espectadores. Gauntlett e Hill consideram que, apesar de tudo, o termo Etnografia não será
inapropriado (1999: 8), já que reflecte um compromisso com o quotidiano e com a
investigação qualitativa, porém o seu significado no campo dos estudos de audiências é
diferente do atribuído tradicionalmente na Sociologia ou Antropologia, cujos investigadores
observam durante meses ou mesmo anos os seus sujeitos de investigação. Ainda assim, o
contributo da Etnografia para o desenvolvimento dos estudos de audiências tem vindo a ser
extremamente importante ao introduzir os contextos quotidianos nos quais os media são
usados e ao permitir que os consumidores exprimam ou demonstrem nos seus próprios
termos o que fazem com os media (Gauntlett & Hill, 1999: 8), sendo bem evidente nos
seguintes estudos de autoria de David Morley (1985‐86) Family Television, de Patricia Palmer
(1986) The Lively Audience e de David Morley & Roger Silverstone (1990) – Household Uses
ofInformation and Communication Technology project.
Metodologia e procedimento
Em relação à metodologia seguida para o presente estudo etnográfico, optou‐se por
recorrer ao tipo de etnografia ‘quick & dirty’ por esta possibilitar de forma rápida e eficaz uma
compreensão rica e detalhada de diferentes contextos domésticos de uso dos media e TIC por
parte de famílias portuguesas. Os estudos etnográficos ‘quick & dirty’ são distintos dos estudos
etnográficos convencionais por terem uma duração temporal mais limitada e por não serem
exaustivos em relação aos contextos que se propõem investigar, ou seja, são breves e
fornecem uma ideia geral mas informada dos contextos (Hughes, King, Rodden & Andersen,
1994: 432).
A etnografia ‘quick & dirty’ tem vindo a ser utilizada na área do design de sistemas
para informar designers e programadores sobre os modos como os utilizadores‐finais actuam
em contextos concretos, sobretudo em locais de trabalho. Dos diferentes usos e aplicações da
etnografia no design, John Hughes e sua equipa do Computer Supported Cooperative Work
(CSCW) Research Centre da University of Lancaster identificaram (1994) para além da
etnografia ‘quick & dirty’, a etnografia concorrente, a etnografia avaliativa e o reexame de
estudos prévios. Transpondo o que Hugues e sua equipa afirmaram (1995) sobre a utilidade
dos estudos etnográficos ‘quick & dirty’ no desenvolvimento de sistemas e software para a
6
7. investigação das audiências, ao optar por esta via há o entendimento de que será capaz de
fornecer conhecimento válido e valioso sobre um dado contexto num período curto de tempo.
O procedimento geral para estas sessões de observação etnográfica consistiu na
observação presencial da família, com duração aproximada de 30 a 60 minutos e registo em
vídeo, à qual se seguiu a condução de uma entrevista semi‐estruturada a toda a família, com
duração aproximada de 30 a 60 minutos, também com registo em vídeo e com anotações no
guião da entrevista.
Procedimento
1. Introdução
- descrever objectivo do estudo etnográfico e o seu enquadramento no trabalho de
investigação;
- assegurar a confidencialidade dos dados.
2. Observação etnográfica (cerca de 30 a 60 minutos)
‐ instalação de câmara de filmar num local central da sala de estar: registo vídeo da
dinâmica familiar na sala de estar + tomada de notas;
- duração da observação: limite 60 minutos.
3. Entrevista semi‐estruturada (cerca de 30 a 60 minutos)
- pedir a cada membro da família para descrever um dia típico de semana e um dia
típico de fim‐de‐semana.
- questões sobre padrões de uso de televisão, e respectivas atitudes e preferências:
I – Ocupação de tempo no dia‐a‐dia e actividades nos tempos livres
II – Televisão: posse, usos, preferências e atitudes
III – TV digital: conhecimento, atitudes e expectativas
4. Conclusão (5 minutos)
- pedir a todos os membros da família para assinar um compromisso de
7
8. confidencialidade para utilizar dados e que no qual fique assegurada a
confidencialidade da informação prestada,
- agradecer.
Trabalho de campo e amostra
O trabalho de campo decorreu entre Setembro de 2010 e Março de 2011, e o
recrutamento da amostra foi feito através do contacto com as câmaras municipais de Alenquer
e da Nazaré, bem como com as juntas de freguesia de Agualva, Cacém, Mira‐Sintra e São
Marcos, na tentativa de encontrar famílias com os perfis adequados aos objectivos do
projecto. A juntar à colaboração das câmaras de Alenquer e da Nazaré, e da junta de freguesia
de Agualva, houve a necessidade de se recorrer a algumas pessoas conhecidas, para que
sugerissem famílias nas três zonas‐piloto potencialmente disponíveis para participar no estudo
etnográfico.
Deve ser notado que houve a preocupação de incluir nesta amostra famílias com pelo
menos um elemento com mais de 65 anos de idade e com pelo menos um elemento com
necessidades especiais, de modo a obter uma melhor percepção das características específicas
destas populações em relação à TV digital. Desta forma, entre a amostra de 30 famílias, 13 são
constituídas por um ou mais elementos com mais de 65 anos, como era objectivo inicial do
projecto. Da mesma maneira, duas das famílias visitadas incluem um elemento com
necessidades especiais. Num dos casos, visitou‐se a família de uma adolescente que sofre de
deficiência mental, e no outro, entrevistou‐se um indivíduo invisual, de 64 anos.
No conjunto, foram contabilizadas 117 pessoas, das quais 63 estiveram presentes e
participaram activamente nas entrevistas. Apesar de não ter sido possível entrevistar todos os
elementos das famílias, não raras vezes os indivíduos entrevistados descreveram as rotinas dos
familiares que não falaram ou não estiveram presentes.
No universo da amostra, apenas duas pessoas afirmaram não ver televisão todos os
dias, tendo‐se apurado que, em 14 famílias, em média assiste‐se entre 3 a 5 horas de televisão
por dia. Em contrapartida, a amostra inclui também famílias onde se vê menos de uma hora de
televisão diária (3 famílias), até famílias cujos os elementos em média passam mais de 7 horas
em frente ao ecrã (6 famílias). Finalmente, é de salientar que se atribuíram nomes fictícios aos
participantes no estudo, de forma a preservar o anonimato dos participantes.
8
9. Tabela 1 Estudo etnográfico “ADOPT‐DTV” ‐ Participantes
ID: Data e local: Participantes: Parentesco:
Adelaide (33 anos) Mãe
Carlos (37 anos) Pai
Pedro (8 anos) Filho
Família 1 ‐ Rosário 17‐09‐2010
Martim (4 anos) Filho
(7 elementos) Nazaré
Filipe (2 anos) Filho
João (59 anos) Avô
Marta (53 anos) Avó
17‐09‐2010
José (68 anos) Pai
Família 2 Nazaré
Sobral Beatriz (60 anos) Mãe
(3 elementos) Laura (70 anos) Irmã
Patrícia (22 anos) Filha
Margarida (35 anos) Mãe
Jacinto (40 anos) Pai
Célia (20 anos) Filha
Sandra (18 anos) Filha
Família 3 ‐ Roda 11‐10‐2010
Fátima (15 anos) Filha
(8 elementos) Nazaré
Inês (19 meses) Filha
Henrique (14 anos) Filho
Neto (filho de
Júlio (recém‐nascido)
Célia)
Família 4 ‐ Pereira 15‐10‐2010 Isabel (73 anos)
Casal
(2 elementos) Nazaré João (77 anos)
Família 5 ‐ Santos 19‐10‐2010
Catarina (73 anos)
(1 elemento) Alenquer
Marília (43 anos) Mãe
Vasco (51 anos) Pai
Luísa (32 anos) Filha
João (25 anos) Filho
Família 6 ‐ Alves 21‐10‐2010 Mário (15 anos) Filho
(10 elementos) Nazaré
Raquel (13 anos) Filha
Joana (9 anos) Neta
Sofia: (8 anos) Filha
Miguel (1 ano) Neto
Família 7 ‐ Pinto
23‐10‐2010 Margarida (69 anos) Casal
(2 elementos)
9
10. Nazaré António
Família 8 – Lopes 29‐10‐2010 Joana (71 anos)
(1 elemento) Alenquer
Adelaide (37 anos) Mãe
Família 9
29‐10‐2010 Teresa (6 anos) Filha
Gaudêncio
Alenquer
(3 pessoas)
Rita (11 anos) Filha
05‐11‐2010 Celeste (74 anos)
Família 10 ‐ Graça Casal
(2 elementos) Alenquer
Américo (77 anos)
05‐11‐2010 Rosa (76 anos)
Família 11 ‐ Assis Casal
(2 elementos) Alenquer
António (76 anos)
Carla (50 anos) Mãe
Lara (18 anos) Filha
Família 12 08‐11‐2010
Marques Cristiano (23 anos) Filho
Nazaré
(5 elementos)
Rodrigo (71 anos) Avô
Amélia (76 anos) Avó
Júlia (26 anos) Mãe
Família 13 15‐11‐2010 Manuel (48 anos) Pai
Andrade Nazaré
Rui (6 anos) Filho
(4 elementos)
Ivo (9 anos) Filho
Família 13 Paula (59 anos)
22‐11‐2010
Freitas (2 Casal
Nazaré Jorge (64 anos)
elementos)
Família 15 ‐ Matos 25‐11‐2010 Celeste (72 anos)
Casal
(2 elementos) Nazaré
Manuel (71 anos)
Família 16 25‐11‐2010 Rita (70 anos)
Mendonça Casal
Nazaré
Ricardo (71 anos)
(2 elementos)
Família 17 ‐ Sousa 26‐11‐2010 Maria (65 anos) Avó
(4 elementos) Nazaré
Sara (46 anos) Filha
Joana (6 anos) Neta
10
11. Matilde (9 anos) Neta
Sandra (34 anos) Mãe
Jacinto (32 anos) Padrasto
Família 18 29‐11‐2010
Filipe (14 anos) Filho
Fragoso Alenquer
(5 elementos)
João (12 anos) Filho
Miguel (8 anos) Filho
Sofia (37 anos) Mãe
Família 19 Rui (40 anos) Pai
Baptista 28‐12‐2010 Cacém
Filipa (10 anos) Filha
(4 elementos)
Ana (18 anos) Filha
Sónia (35 anos) Mãe
Família 20 Ricardo (35 anos) Pai
10‐01‐2011
Mendes Alenquer
Marta (7 anos) Filha
(4 elementos)
João (5 anos) Filho
10‐01‐2011 Carla (65 anos)
Família 21 ‐ Costa Casal
(2 elementos) Alenquer
Rogério (64 anos)
Josefa (47 anos) Mãe
Família 22 António (46 anos) Pai
10‐01‐2011
Guerreiro Alenquer
Verónica (22 anos) Filha
(4 elementos)
Guilherme (18 anos) Filho
Ana (33 anos) Mãe
Alberto (38 anos) Pai
Família 23 10‐01‐2011
Carlos (8 anos) Filho
Simões Alenquer
(5 elementos)
Clarisse (4 anos) Filha
Sofia (4 anos) Filha
10‐01‐2011 Isabel (39 anos) Mãe
Família 24
11
12. Isabel (39 anos) Mãe
Filipa (48 anos) Tia
Matilde (32 anos) Tia (Irmã de Isabel)
Fonseca Cacém
(6 elementos) Pedro (21 anos) Filho
Mário (19 anos) Filho
Rui (14 anos) Filho
Cristina (24 anos) Filha
Antónia (48 anos) Mãe
Fámilia 25 ‐ Neves 11‐01‐2011 Cacém
(4 elementos) Pedro (14 anos) Primo
Miguel (17 anos) Primo
Joana (83 anos) Avó
Família 26 José (50 anos) Tio
Gomes (4 12‐01‐2011 Cacém
Maria (50 anos) Tia
elementos)
Carla (28 anos) Neta
Rita (47 anos) Mãe
Família 27 ‐ Brito 17‐01‐2011 Cacém Jorge (35 anos) Irmão
(3 elementos)
Inês (20 anos) Filha
Clara (67 anos) Mãe
Jorge (70 anos) Pai
Família 28 Pedro (29 anos) Filho
21‐01‐2011
Cardoso Alenquer
Carlos (35 anos) Filho
(7 elementos)
Sofia (37 anos) Filha
Jacinta (89 anos) Avó
Família 29 10‐02‐2011 Cacém Carlos (43 anos) Pai
Justino (5
elementos) Amanda (42 anos) Mãe
Margarida (12 anos) Filha
12
13. Maria (10 anos) Filha
Fátima (5 anos) Filha
Ana (34 anos) Mãe
Família 30
17‐03‐2011 Cacém Luís (54 anos) Pai
Ribeiro
(3 elementos)
Francisco (11 meses) Filho
As sessões de observação e as entrevistas em profundidade foram registadas em vídeo e
procedeu‐se a uma análise das transcrições e das imagens recolhidas, através da utilização do
software de análise qualitativa NVivo. Este software permitiu a codificação das entrevistas em
33 categorias de análise, que foram derivadas das respostas dadas pelos participantes, bem
como das perguntas colocadas no decorrer as entrevistas semi‐estruturadas.
13
14. 2. Principais resultados do estudo etnográfico
O estudo etnográfico com 30 famílias das três zonas‐piloto de transição para a
Televisão Digital Terrestre possibilitou a análise de algumas tendências por parte das famílias
no que toca à televisão, presença tão importante na maior parte dos lares, e sobretudo tendo
em conta o novo contexto digital. As entrevistas permitiram registar algumas preferências dos
indivíduos em relação aos conteúdos ‐ como os géneros televisivos de eleição ou os mais
detestados – e a observação das rotinas ajudou ainda a avaliar o peso que a televisão ocupa no
dia‐a‐dia das famílias, em comparação com outras actividades e mesmo com a utilização de
outros media.
Porém, este capítulo debruça‐se especialmente sobre os aspectos relacionados com o
conhecimento sobre a televisão digital, o “switch‐off” e as expectativas dos indivíduos perante
o novo panorama digital. É de salientar que, neste estudo, a amostra é pequena para se
extraírem conclusões que possam ser extrapoladas para o universo, valorizando‐se antes a
possibilidade de ouvir abertamente os entrevistados, retirando daí uma perspectiva geral dos
contextos concretos que são estas três zonas‐piloto, num período temporal ainda mais
delimitado, como é o que antecede o “switch‐off”.
Em síntese, eis algumas das principais conclusões deste estudo etnográfico com 30 famílias,
relativamente aos usos, atitudes e expectativas em relação à televisão:
‐ verifica‐se um desconhecimento ‐ independentemente da idade ou do género ‐ sobre as
características da televisão digital. Entre as 30 famílias, pelo menos um elemento de 26
famílias afirmou já ter ouvido falar no tema, mas apenas três pessoas souberam explicar no
que consiste este tipo de transmissão;
‐ É perceptível a hesitação dos indivíduos ao falar das vantagens e desvantagens da televisão
digital, acabando por nenhum elemento de 15 das famílias por responder não conhecer
nenhum dos seus pontos fortes ou fracos. Ainda assim, a vantagem mais mencionada foi a
melhor qualidade de imagem e som, seguida da alta definição e do 3D. A desvantagem mais
apontada foi o custo que a TV digital implica;
14
15. ‐ É de salientar que as vantagens da TV digital mais mencionadas pelos entrevistados não
coincidem com as principais razões que estes dizem poder levar a aderir à TV digital. Neste
caso, o aumento da grelha de canais e a existência de pacotes vantajosos são as razões mais
mencionadas, em vez da melhoria da qualidade de imagem, da alta definição e do 3D;
‐ Verifica‐se que os indivíduos que já ouviram falar no “switch‐off” têm dificuldades em
explicar o processo e em apontar uma data‐limite para o apagão. Alguns até sabem que as
famílias terão que investir num “aparelho”, apesar de desconhecerem os custos e se serão
afectados;
‐ Verifica‐se que as fontes mais citadas pelos entrevistados quando lhes perguntam como
souberam do “switch‐off” são o “boca‐a‐boca”, os media nacionais e locais, bem como as
operadoras de telecomunicações, via telefone;
‐ É perceptível que, quando as famílias não sabem como resolver um problema com um dado
equipamento tecnológico, recorrem maioritariamente a amigos ou familiares. As pessoas
com mais de 50 anos tendem a pedir “aos mais novos” ajuda para lidar com os aparelhos,
sejam telemóveis, computadores ou uma televisão. Porém, regra geral, os assuntos ligados à
televisão são resolvidos por técnicos especializados;
‐ Nota‐se que as pessoas mais idosas julgam que, daqui a cinco anos, verão ainda mais
televisão, porque estarão cada vez mais desocupadas. Por outro lado, a crise e as dificuldades
em manter um emprego actualmente, levam as pessoas mais jovens a antecipar que cada vez
menos verão televisão. Por último, alguns indivíduos julgam que vão ver menos televisão no
futuro, pois vão substituir a TV por outro media;
‐ As famílias prevêem que a televisão daqui a dez anos seja muito diferente. As características
mais mencionadas pelos entrevistados apontam para televisores cada vez maiores, mais finos
e com tecnologia “táctil”;
‐ É perceptível que as pessoas estão interessadas numa televisão que lhes permita novos
serviços e funcionalidades, como a gravação de programas (em 11 famílias houve sugestões
neste sentido). Por outro lado, o acesso a serviços de saúde e bem‐estar, através da televisão,
15
16. é encarado como um ganho, mais do que a existência de canais locais ou regionais, ou o
aparecimento de um novo canal gratuito generalista, como o 5º canal;
Conhecimento sobre a TV Digital
A televisão digital não é um conceito estranho para 26 das 30 famílias entrevistadas
em Alenquer, no Cacém e na Nazaré. Com o intuito de compreender até que ponto os
indivíduos conheciam esta tecnologia, foi colocada a questão “Já ouviu falar de televisão
digital”, a que os entrevistados responderam maioritariamente “sim”. Em 26 famílias, pelo
menos um elemento do agregado afirmou ter ouvido falar em televisão digital através dos
media nacionais ou locais, de familiares ou de amigos, de técnicos especializados, ou das
empresas operadoras de televisão, via telefone. «Eu ouvi na televisão, até parece que ia ser a
partir de Janeiro ou qualquer coisa, mas não sei bem...», aponta Sofia, alenquerense de 37
anos. «Já ouvi falar, através do senhor das televisões, o nosso técnico. Ele já tinha dito que
qualquer dia… E disse que Alenquer era uma das zonas de experiência‐piloto», conta Carla, de
65 anos, depois de explicar que, quando comprou a sua última televisão, lhe disseram que esta
já estava equipada com «não sei o quê para a era digital». «Fui abordado pelo telefone, por
mais de uma vez (…) Falaram em televisão digital, diziam que iam aplicar um equipamento
para poder fazer a transformação no caso dos televisores que já existem, porque os futuros
vêm já preparados», refere Manuel, de 71 anos, sublinhando que é pelo telefone, através das
empresas, que normalmente lhe chegam as primeiras informações sobre equipamentos
tecnológicos.
Figura 1 Família “Pinto” – Margarida diz que o seu técnico de televisões a avisou de que as antenas tradicionais
iriam deixar de funcionar
16
17.
Daqui podemos retirar que, em 9 das 26 famílias em que pelo menos um dos seus respectivos
elementos disseram conhecer o novo meio de transmissão, falar em televisão digital envolve
falar do “switch‐off”. Isto é, em 9 agregados familiares, ouviu‐se falar pela primeira vez em
televisão digital quando lhes chegou informação sobre a transição para a TDT.
É o caso de Margarida, doméstica, de 69 anos: «acho que é uma televisão dessas que
agora vão pôr, não é? O Jaime (técnico de televisões) quando veio aqui uma vez arranjar a
antena disse‐me: “isto depois já não presta. Daqui a dois anos isto vai‐se embora tudo”».
Também Joana, de 71 anos, reporta para o anúncio do apagão da televisão analógica quando
questionada sobre se “já ouviu falar em TV Digital”: «li no jornal de Alenquer. Li que ia ser a
primeira a fazer a experiência da televisão digital. Ora, a partir daí nem sei do que é que isso é
feito nem como é que funciona». Já Ricardo, de 71 anos, identifica a televisão digital com a sua
mais recente aquisição tecnológica. Antes de ter sido avisado de que a televisão analógica
terrestre iria deixar de existir, este reformado não sabia o que era televisão digital. «A
televisão digital foi agora posta há pouco tempo, há uns meses. Diz que daqui por algum
tempo é só digital que vai funcionar e então eles lá me convenceram e lá pus a digital».
Posteriormente, Ricardo apercebeu‐se de que não precisava de ter actualizado a sua televisão
para continuar a receber sinal, visto que já tinha televisão paga, por cabo analógico.
Figura 2: Família “Alves” – Nesta família da Nazaré, ninguém sabia ao certo o que é a TV digital. Luísa, uma das
filhas, sugeriu que é a televisão que já não necessita de comando
17
18. Apesar de, aparentemente, as pessoas se demonstrarem familiarizadas com o termo,
as ideias sobre televisão digital parecem ser vagas em 21 das 26 famílias que afirmaram já ter
ouvido falar no tema, chegando alguns indivíduos a relacionar televisão digital com aspectos
ainda distantes da realidade. «O que eu entendi como TV Digital é que são aquelas televisões
em que a gente não precisa de ter, por exemplo, um comando para ligar e desligar», sugere
Adelaide, de 37 anos. «Agora já não há comandos, já não há nada. É tudo pelo ecrã, muito
fininho», explica Luísa, apostando na mesma ideia, de que digital é sinónimo de ”touch”. Na
verdade, apesar de mais de 40 indivíduos, de 26 famílias, terem assumido conhecer o termo
“televisão digital”, muito poucos souberam defini‐la, sendo as expressões mais recorrentes:
«já ouvi falar na televisão digital, mas muito sinceramente não tenho bem uma ideia do que
é…» (Sónia, 35 anos); «Ouvir falar já ouvi, mas não estou assim muito por dentro…» (Isabel, 73
anos); «Já ouvi falar. Mas, no fundo, não sei mesmo o que é que se passa» (Adelaide, 37 anos);
«Eu ouvi falar, mas não liguei nenhuma» (Américo, 77 anos).
Por outro lado, quase não se ouviram definições precisas de televisão digital,
destacando‐se apenas três respostas mais concretas: «A ideia que eu tenho é que é um
formato diferente, que tem a capacidade de transportar muito mais informação. O que
permite uma série de funcionalidades. No imediato, uma melhor qualidade de imagem e de
som. E depois uma série de funcionalidades que a TV normal não permite», explicou Carlos, de
37 anos; «É diferente, vai ser uma televisão com mais qualidade… É o que dizem… Mais
qualidade de emissão», definiu Jorge, de 64 anos; «Fala‐se muito na televisão digital. Que é
um sistema de transmissão de televisão diferente daquele actualmente está em uso. Os
pormenores técnicos, não sei. A ideia que eu tenho é que é uma coisa nova, que vai ser
aplicada em Portugal, mas não só na televisão. Noutros sistemas de comunicação também»,
considerou Manuel, de 71 anos.
Figura 3 Manuel e Celeste esperam que a TV digital seja sinónimo de melhores conteúdos. Os programas de
teatro e variedades, são os preferidos do casal
18
19. De facto, em todas as famílias foi necessário explicar no que consiste a televisão
digital, havendo até casos em que a família já possuía um serviço de televisão digital e não
sabia. O tema da televisão parece interessar aos indivíduos, mas o facto de ser digital ou
analógica, é‐lhes indiferente. Como em casa de Rosa e Carlos, reformados de 76 anos. Para
este casal, o que importa são os conteúdos e só uma avaria que os deixe sem TV poderá levar a
pensar nas questões técnicas. Consumidores assíduos de televisão confiam no filho para tratar
dessas questões, não pensando sequer nelas. Também Celeste e Manuel, de 71 e 72 anos,
consideram que antes da qualidade de imagem e do som, deve haver uma preocupação com a
qualidade dos conteúdos. É essa que verdadeiramente lhes importa, ou não ligarão sequer o
televisor.
No que toca às pessoas que desconheciam completamente o termo “televisão digital”,
podemos referir, por exemplo, o caso de Célia e Sandra, de 20 e 18 anos respectivamente,
pertencentes a uma família numerosa, da Nazaré. As duas jovens já não estudam e estão
desempregadas, passando a maior parte do tempo em frente ao ecrã. Ainda assim,
desconheciam a nova forma de transmissão que lhes poderia trazer melhor qualidade de
imagem e som, ou mesmo funcionalidades que lhes poderiam ser úteis, e demonstraram‐se
desinteressadas no tema. É de sublinhar que estas jovens não têm por hábito assistir aos
noticiários ou a programas de informação, baseando a sua experiência televisiva no consumo
de telenovelas. Ao contrário da mãe, Margarida, de 35 anos, que obteve informação sobre a
televisão digital no telejornal, sabendo até que vai haver uma mudança que obrigará os
portugueses a pagar para continuar a ver televisão, desta vez no formato digital. Este é um dos
casos em que alguns elementos da família já tinham conhecimento sobre a televisão digital e
outros não.
Figura 4: Família “Santos” ‐ Catarina passa os dias sozinha e espera que os noticiários a coloquem a par do
que se passa no mundo
19
20. No caso de Catarina, de 73 anos, seria muito difícil ouvir falar em televisão digital
através de outros meios que não a televisão. Por passar quase todo o tempo isolada, em casa,
Catarina obtém informações sobre o que se passa no mundo quase exclusivamente através do
seu televisor. Deitada na cama, em frente ao ecrã com interferências, a idosa explica que já lá
vai o tempo em que se entretinha a fazer bordados e os dias em que saía. De vez em quando,
para se distrair, ainda vai ao baile, mas não como antigamente. Por isso, o seu principal
passatempo é a televisão e é esta que lhe proporciona, muitas vezes, a sensação de estar
acompanhada, bem como as notícias sobre o que se passa lá fora.
Aliás, depois de lhe ter sido brevemente explicado o processo de “switch‐off”, que lhe
era completamente estranho, a idosa questionou: «porque é que eu ainda não ouvi falar nisso
na televisão?». O facto de ter apenas os quatro canais, pela “reforma muito pequena” que
recebe, deixou Catarina muito alarmada perante a possibilidade de ficar sem televisão. «Oh
meu Deus… Isto é a minha companhia!», desabafava, já prevendo os problemas que poderão
surgir, por ser uma pessoa sozinha, sem possibilidades de recorrer à família para resolver a
situação.
Na mesma localidade, Guilherme, de 18 anos, dá resposta idêntica à de Catarina:
“nunca ouvi falar”. O jovem, que divide o seu tempo de lazer entre a televisão, o computador,
o novo iPad e a Playstation, diz conhecer a “televisão 3D, com óculos”, não a “digital”. No
entanto, parece tudo uma questão de desconhecimento da terminologia, uma vez que
Guilherme tem televisão digital em casa e até está habituado a usufruir de serviços como a
gravação de programas ou o “vídeo‐on‐demand”.
Vantagens e desvantagens da TV Digital
Tendo em conta que a maior parte dos entrevistados não soube explicar no que
consistia a televisão digital, reconhecendo apenas o termo, as famílias tiveram algumas
dificuldades em apontar as vantagens e desvantagens deste sistema.
Entre as 26 famílias que admitiram já ter ouvido falar em TV digital, um ou mais dos
respectivos elementos de 15 famílias afirmaram não saber quais são os seus benefícios e em
11 famílias pelo menos um dos seus membros disseram não conhecer quais as desvantagens.
Depois do maioritário “não sei” (por 15 famílias), a vantagem mais mencionada foi a melhoria
da qualidade de imagem e do som (por 6 famílias). Seguidamente, em 2 famílias, a
possibilidade de trazer a alta definição ou o 3D para as salas de estar são vantagens
reconhecidas, tal como a possibilidade de haver mais canais (2 famílias), mais serviços e
funcionalidades (2 famílias).
20
21. Há, por outro lado, quem não encontre qualquer vantagem na televisão digital. Em casa dos
Baptista, por exemplo, a mãe, Sofia, de 37 anos, admite que não vê nenhuma vantagem na TV
digital, ao que a filha mais nova, Filipa, de 10 anos, responde: «Oh mãe, eu vejo vantagens.
Imagine que decide dar o jantar numa altura que está a dar um programa importante, eu
posso meter na pausa e assim não perco o programa...».
A diversificação dos conteúdos, a redução das falhas técnicas e a evolução tecnológica foram
outras das vantagens mencionadas pelos entrevistados. No Cacém, Ana, de 34 anos, considera
que as vantagens da televisão digital são «coisas que mulheres não reparam».
Figura 5: Família “Ribeiro” – Ana está familiarizada com as novas tecnologias. A jovem mãe teme que os seus pais
e avós tenham dificuldades em adaptar‐se à TV digital, mais difícil de manusear
A jovem funcionária pública explica que a televisão digital permite uma melhor qualidade de
imagem e de som, evitando também as falhas técnicas habituais da televisão analógica.
«Nunca falha a televisão porque há um temporal e ficámos sem antena...». No entanto, na sua
opinião, isso são questões pouco relevantes para as mulheres. «Desde que se veja bem e se
consiga ler as legendas, tudo bem», considera. Não ser necessária antena para haver imagem,
ou comando de televisão para o manuseamento do aparelho são outras das vantagens
mencionadas. E, por último, a poupança de energia, mencionada como possível vantagem
numa das famílias.
Quanto às desvantagens, as famílias demonstraram novamente desconhecimento sobre o
tema, prevalecendo a resposta “não sei”. Para Jorge, invisual de 64 anos, é uma perda de
tempo pensar nisso, já que a sua família se sente bem servida com a Cabovisão. Apesar de
conhecer a principal e, na sua opinião, única vantagem da televisão digital – melhor qualidade
21
23. não é? Ninguém acha bem, toda a gente refila, mas depois acaba por aceitar». Já Ana, de 34
anos, vê a geração dos seus pais e avós a confrontarem‐se com mais uma evolução tecnológica
que lhes trará, em vez de vantagens, complicações nas tarefas mais simples do manuseamento
da televisão: «Para a geração dos nossos pais, que não estão habituados a lidar com novas
tecnologias, a desvantagem é que o comando é muito complexo. Porque há o comando da
televisão e o comando da box... São dois comandos... Qual é o comando de onde? E do quê?».
Motivos para ter ou não ter TV digital
No universo das 30 famílias entrevistadas, 14 já possuíam um serviço de televisão
digital em pelo menos uma televisão da casa (11 famílias através do cabo digital, 2 famílias por
IPTV e 1 família por satélite). Questionadas sobre as razões que as motivaram a ter televisão
digital, 8 destas famílias apontaram o aumento da grelha de canais como um dos principais
incentivos. Os canais de desporto, sobretudo a Sport TV e o Benfica TV, são importantes
alavancas para aderir a um serviço de televisão paga e, consequentemente, de televisão
digital. Jacinto, de 32 anos, trabalhador de uma fábrica de sabonetes, admite que «a vida está
difícil», mas conta que aderiu à MEO para «poder saber tudo sobre o seu clube», o Benfica,
através do canal Benfica TV. A esposa, Sandra, de 34 anos, modera um pouco o entusiasmo do
marido, explicando que a família tem passado por dificuldades e que só tem televisão, porque
esta lhes foi oferecida. Sandra lembra que, mais do que o Benfica TV, o serviço de IPTV a que
aderiram inclui internet e telefone, o que lhe permite comunicar com os familiares que estão
longe.
Figura 7: Família “Fragoso” – A única televisão dos Fragoso passou a ter outras funcionalidades com a passagem
para o digital, mas foi o pacote económico de TV, telefone e internet que levou a que aderissem ao serviço
23
24.
A existência de pacotes vantajosos foi, aliás, a segunda motivação mais citada pelos
entrevistados quando falavam nas razões para aderir à TV digital. No caso de Sandra, o pacote
que englobava telefone fixo, televisão e internet ficava mais em conta e proporcionava‐lhe
mais comodidade para falar com a filha, que vive com o pai biológico: «A gente teve que pôr
MEO porque eu assim falo mais vezes com a minha filha. Porque se eu não tivesse telefone em
casa, tinha que ir a uma cabine telefonar até às 20h30. E assim com telefone em casa, até às
dez da noite eu posso telefonar‐lhe. É uma coisa boa que eu tenho». Na verdade, este pacote
acaba por responder às diferentes necessidades da família Fragoso, uma vez que Sandra utiliza
muito o telefone e a internet, e Jacinto consome ainda mais televisão. Para este último, o
digital representa muito mais do que a televisão tradicional: «Que serviços utiliza na MEO?
Jacinto: Tudo. Gravação, vídeo‐clube, jogos, música, tudo…». Durante a entrevista, o
trabalhador fabril demonstrou um pouco da sua experiência televisiva, mostrando, por
exemplo, como se joga xadrez ou “4 em linha” com o televisor, e acedendo a algumas das suas
gravações, sublinhando que agora já pode dormir e deixar o wrestling ou o Dragon Ball a
gravar de madrugada. Efectivamente, a existência de novos serviços e funcionalidades é
apontada por alguns entrevistados como outra das razões que levam à escolha da TV digital.
Ainda assim, este último factor não parece ter um peso decisivo para a maioria das famílias.
Figura 8: Família “Pereira” – Isabel liga mais a televisão do que João. A lojista aproveita a hora do almoço para
espreitar o ecrã, mas ainda não teve tempo de explorar os novos serviços da TV digital
24
25. Por vezes, os indivíduos reconhecem que a TV digital lhes traz estes novos serviços, vêem isso
como uma vantagem, mas depois acabam por não os utilizar, como é o caso de Isabel, de 73
anos: «Isto (TV digital) traz coisas que ainda não aprendi, mas sei que tem, que é gravar um
programa enquanto estamos a ver outro. Mas ainda não aprendi, ainda não tive tempo».
Acompanhar a evolução tecnológica e ter uma melhor qualidade de imagem e de som foram
também razões mencionadas pelos entrevistados. A juntar a estas razões, o anúncio do
“switch‐off” pode ser decisivo no momento de passar para o digital, como no caso dos
Mendonça, da Nazaré, que optaram por aderir à televisão digital, com receio de ficar sem sinal
de televisão. Rita e Ricardo, de 70 e 71 anos, já possuíam televisão paga há alguns anos, mas
ainda assim julgaram necessário fazer uma mudança, para não deixarem de ver televisão.
Depois de vários telefonemas por parte da empresa que lhes fornece televisão por cabo, a
juntar ao gosto de Ricardo pelos canais de desporto, os Mendonça foram finalmente
convencidos a mudar. «A maior razão foi, de facto, o canal do Benfica ‐ metido no canal digital
‐ e ver mais programas. E essa informação que o senhor me deu, de que daqui por algum
tempo era só o digital a funcionar», conta Ricardo.
Por outro lado, não houve qualquer referência à alta definição ou ao 3D como possíveis iscos
para uma transição para o digital.
No que respeita às razões que desmotivam as famílias a terem televisão digital, a questão dos
custos aparece em primeiro lugar. O caso de Joana, de 71 anos, é semelhante ao de Catarina,
Figura 9: Família “Lopes” – Joana mostra uma TV avariada que tem pena de deitar fora. A costureira gostava de
ver televisão com mais qualidade, mas há outras prioridades no orçamento
25
26. dois anos mais velha. Em comum, estas reformadas têm o facto de viverem no concelho de
Alenquer, sozinhas, e da televisão lhes servir de companhia todos os dias. Da mesma maneira,
Joana e Catarina gostariam de ter mais canais para preencher as várias horas em frente ao
ecrã, mas deparam‐se sempre com as mesmas quatro estações. Na verdade, Joana lembra que
nem os quatro canais consegue apanhar, e Catarina sublinha as constantes interferências a
roubarem‐lhe a imagem. Ainda assim, estas idosas ‐ que nem se conhecem ‐ rejeitam
completamente a hipótese de virem a ter um serviço de televisão paga, mais uma vez, por
uma mesma razão: a baixa reforma. Por outro lado, também há jovens famílias a descartar a
opção “televisão digital”. A família “Simões”, por exemplo, é servida pelo sinal analógico
terrestre de televisão. Ana explica que não pode juntar mais uma mensalidade às despesas de
uma família numerosa como a sua. «Como estou pouco tempo em casa, não se justifica eu
Figura 10: Família “Mendes” – Em casa dos Mendes, há televisão paga. No entanto, a mãe, Sónia, considera que
há falta de informação sobre os procedimentos a ter face ao switch‐off
pagar um valor acrescido para ver mais televisão. Porque esse valor também conta no
orçamento da família e é um grande abalo no agregado familiar. Num agregado familiar
grande como o meu, tudo conta, e não se justifica. Às vezes os miúdos chateiam‐me porque
gostavam de ver o Panda. E eu digo “quando lá fores abaixo ao café, vês”. Têm que ter
paciência (…) Não se justifica porque os preços também são elevadíssimos».
Conhecimento do “switch‐off”
Analisar o conhecimento e as expectativas de algumas famílias portuguesas acerca do
desligamento do sinal analógico terrestre de televisão era um dos objectivos maiores deste
26
27. estudo etnográfico. Entre as 30 famílias entrevistadas, 15 disseram saber que o sinal analógico
de televisão ia ser desligado, e outras 15 afirmaram desconhecer o acontecimento. Na
verdade, entre as 15 famílias a par do apagão, houve 3 lares em que alguns elementos sabiam
do “switch‐off” e outros não. Em casa dos Rosário, por exemplo, podia notar‐se que Carlos, o
pai, de 37 anos, estava muito mais a par das novidades tecnológicas do que qualquer outro
membro da família. Apesar de a esposa e os sogros também terem afirmado conhecer o
“switch‐off”, foi Carlos o único que imediatamente utilizou a palavra “apagão” para responder
e demonstrou estar mais ou menos a par da data‐limite para o “switch‐off”. Da mesma forma,
na família Matos, Manuel, de 70 anos, já sabia que o apagão ia acontecer, enquanto a esposa
disse que a situação lhe «passou ao lado». Para além do “boca‐a‐boca”, estas informações
chegaram a Manuel através dos media. No entanto, nunca deu muita atenção ao assunto,
explicando que o mais provável é que, daqui a algum tempo, se preocupe mais em saber
Figura 11: Família "Fragoso" – Jacinto sabe que a Televisão Digital Terrestre já existe desde 2009, mas julga que o
“switch‐off” obrigará todos os portugueses a comprar um aparelho descodificador
pormenores «para não ser apanhado de surpresa»1. «Já ouvimos dizer que, a partir de certa
altura do próximo ano, esse sinal desaparece e passa a haver só o sinal digital. Isso está nos
jornais, em revistas e vamos ouvindo. E também já se sabe que a Nazaré é uma das localidades
escolhidas como projecto‐piloto (…) Os jornais locais de vez em quando falam nisso e há agora
aí uma revista que saiu, que também traz um trabalho sobre isso. Já se vai sabendo», conta.
No caso de Sónia, de 35 anos, o tema do apagão também não lhe era estranho. A trabalhadora
de uma empresa de Seguros afirmou já ter ouvido falar no assunto, mas não saber o suficiente
1
Note‐se que a entrevista com os “Matos” foi realizada a 25 de Novembro de 2010.
27
28. para falar dele. Sónia afirmou que «sabia que isso ia acontecer», mas precisava que alguém lhe
explicasse o processo. «Passa a ser uma única via, não é? Tinha ouvido falar, mas não estou
muito esclarecida acerca do assunto», diz, assumindo que não faz ideia da data‐limite para o
“switch‐off”. Mãe de duas crianças, de 5 e 7 anos, Sónia afirmou que a sua família não saberá
como proceder caso se veja confrontada com a necessidade de adaptar as duas televisões à
era digital. Já Verónica, professora de dança, de 22 anos, conta que soube do apagão numa
conversa com a cunhada, que vive em Espanha, e que lhe explicou que o país vizinho já tinha
feito a transição. Apesar de Verónica não ter ficado muito esclarecida sobre o tema, percebeu
que iria haver uma mudança: «Na conversa com a minha cunhada apercebi‐me, mas
sinceramente eu não liguei muito. Achei estranho… Pensei “Ai agora TV digital, também agora
fazem tudo. Não me digam que me vão tirar o comando”. Foi a primeira coisa que eu disse
(risos)». A resposta de Verónica não foi a única deste género, a reflectir um pouco a
persistência de dúvidas nas famílias em relação aos pormenores da transição. Por exemplo,
Margarida, mulher‐a‐dias de 69 anos, recorda que há dois anos, quando comprou a sua mais
recente televisão, o técnico que a auxiliou falou‐lhe no “switch‐off”, de que teria de adquirir
um aparelho para continuar a ter televisão ou de investir numa televisão moderna. Porém, as
ideias sobre o apagão permaneceram confusas para a nazarena. «Eu perguntei‐lhe: “Então,
mas se vai‐se embora tudo e o que é que a gente faz às nossas televisões?”. E ele disse‐me que
eu tinha que comprar um aparelho não sei o quê. Ele até me disse que a gente depois tinha
que ter plasmas e mais não sei o quê», recorda. No caso de Jacinto, o trabalhador fabril já
atrás mencionado, que se tenta manter sempre actualizado acerca das novas tecnologias,
também disse estar a par do apagão.
No entanto, as confusões surgem novamente. Jacinto, que já tem televisão digital, julgava que
também ele teria de comprar um descodificador. «Jacinto: É a TDT (…) Vai entrar em vigor em
2013. Já deu nas notícias e tudo. Eles já avisaram. Ou compra‐se o aparelho para estas
televisões ou a pessoa é obrigada a comprar uma televisão LCD que suporte esse sistema.
Senão… Entrevistadora: Esta televisão que tem, com MEO? Jacinto: Sim. Se não comprar o
aparelho. Mas o aparelho custa 50 euros».
Para Ana, de 34 anos, o “switch‐off” também não é uma novidade. A jovem mãe foi, aliás, uma
das entrevistadas que demonstrou ter mais conhecimentos sobre o “switch‐off”, já que o seu
emprego implica estar ao corrente das notícias sobre televisão. «Já sabia. Dia 12 de Abril...
Não, em Abril de 2012. O dia acho que ainda não está decidido (…) Ou compram uma caixa,
que faz a conversão, para a televisão antiga, ou têm que comprar uma televisão nova. Até sei o
preço dessa caixa: varia entre os 50 e os 250 euros», conta. No café da família Simões, em
28
29. Alenquer, outra Ana, de 33 anos, também afirmou conhecer vagamente o processo da
transição da televisão analógica para o digital, explicando que, através das conversas no café,
percebeu que uma mudança se avizinhava. «Ouvi dizer que estava‐se a pensar retirar todo o
tipo de ecrãs do mercado… Aliás, não é todo o tipo de ecrãs, mas sim os ecrãs mais antigos,
para fazer uma instalação de TV digital. Mas só ouvi assim isto muito vagamente. Também, na
altura, não me despertou interesse porque estava ocupada e passou. Não falei sobre o assunto
com ninguém. Não sei como é que esse processo poderá ser feito, não sei que custos é que
poderá ter, não sei se posso tirar alguma vantagem ou não daí». À questão «Acha que vai ser
afectada por esse processo?», Ana respondeu não saber, acrescentando que «depende da
obrigatoriedade das coisas» e admitindo que não faz ideia da data limite para o processo.
Depois de saber o preço médio de um descodificador, a empregada de balcão sugeriu que esse
é «um investimento que se pode justificar». «Se o investimento for só um descodificador…
Não é por aí… Mesmo que o descodificador custasse o dobro do dinheiro que me disse, 100
euros. Não é uma coisa que vou comprar todos os meses. Não é? É um investimento a longo
prazo», disse. Ainda assim, Ana afirmou não saber a quem se poderá dirigir de forma a obter
apoio ou ajuda para continuar a ter os quatro canais gratuitos em casa. Normalmente, quando
não sabe como utilizar um equipamento electrónico, recorre «a um familiar habilidoso» que
costuma resolver os problemas. Se a transição para o digital trouxesse um acréscimo de canais,
«seria o ideal» para Ana, uma vez que, nestas condições, não se sente motivada para fazer a
transição. «Não há oferta. A melhoria da qualidade de imagem não é suficiente para motivar,
mas nós os portugueses também não nos chateamos com nada, somos muito permissivos. E se
foi uma decisão da União Europeia, nós vamos ter que acatar com ela. Claro que, se puderem
melhorar alguma coisa… Se, ao facto de sermos obrigados a mudar para continuar a ter
televisão, conseguissem juntar uma mais‐valia ao cliente, só caía bem (risos)», considera. No
ponto e vista da empregada de balcão, a sua família beneficiaria ainda mais caso a Televisão
Digital Terrestre lhe trouxesse, para além do aumento do número de canais, mais serviços,
como o da gravação de programas ou de Pausa TV. «Podiam ser uma mais‐valia por causa da
situação dos horários». Gravar os filmes permitiria a Ana não ter de perder algumas horas de
descanso para poder ver um filme que lhe interesse. Quanto aos serviços de informação útil,
estes também parecem positivos aos olhos de Ana. «As farmácias de serviço então… Muito
importante… Acho que facilitava a vida a muita gente (…) É uma informação que toca a todos.
Na Internet é verdade que já temos tudo, mas esquecemo‐nos que Portugal tem uma
população muito envelhecida e o nosso concelho aqui de Alenquer também. Ou seja, nem
todas as pessoas têm capacidades nem sabedoria para trabalhar com a inovação que é um
29
30. computador».
Na verdade, tudo isto são possibilidades que as famílias não sabem quando vão aparecer.
Apesar de alguns entrevistados já terem ouvido, de facto, falar no “apagão” analógico, 14
famílias não fazem ideia da data‐limite para se concretizar o processo. Assim, na altura de
perguntar a data em que as emissões analógicas iriam deixar de funcionar, ouviram‐se
respostas como: «não»; «não faço a mínima ideia»; «não sei nada do que nos espera». Quanto
aos procedimentos a ter nessa altura, como já foi mencionado, algumas famílias afirmaram
Figura 12: Família “Andrade” – Família recebe a visita dos técnicos de uma empresa que faz a instalação da
internet
saber da necessidade de se comprar «um aparelho» (6 famílias). Algumas até sabiam o preço
médio deste equipamento (2 famílias), mas na maioria dos lares (18 famílias), as dúvidas sobre
quem será afectado e como deverá proceder subsistem.
De forma a compreender quais são normalmente os primeiros recursos para os indivíduos
quando têm alguma dúvida ou problema com equipamentos tecnológicos, foi colocada a
questão: «Quando não sabe como funciona um dado equipamento electrónico, como resolve a
situação?». A resposta mais ouvida foi «a familiares ou amigos», com 11 famílias a eleger a
rede de conhecimentos mais próxima como o primeiro recurso em caso de problemas.
«Quando há qualquer coisa é com os meus filhos», conta Joana, de 71 anos. «Recorremos aos
mais novos (risos)», diz Celeste, de 74 anos, referindo‐se à família e aos empregados do seu
restaurante. «Tenho um familiar muito habilidoso», garante Ana, de 33 anos. «Em relação ao
computador, tenho pessoas conhecidas que percebem, que me vão explicando algumas
coisas», afirma Júlia, de 26 anos, depois de mencionar que começou a fazer um curso de
30
31. informática recentemente. «Ligo a um familiar ou a um amigo meu que é técnico», explica
Jacinto, de 32 anos, que, na maioria das vezes, consegue resolver os problemas sozinho. Nota‐
se que, muitas vezes, as pessoas com mais de 50 anos recorrem aos mais novos quando se
trata de resolver um problema no computador, no telemóvel ou mesmo na televisão. No
entanto, no que respeita a esta última, normalmente os indivíduos recorrem a técnicos
especializados. «Chamamos um técnico. Por exemplo, a gente tem a ZON, se temos algum
problema, ligamos para lá», assegura Sofia, de 37 anos, já habituada a recorrer aos call
centers, tal como Amanda, de 42 anos, que afirma que se a televisão se desligar, liga para a
operadora. «Recorremos a quem nos vendeu o equipamento e que nos possa dar assistência»,
descreve também Sónia, de 35 anos. «Falamos com os técnicos. Normalmente nós estamos
sempre em contacto com eles se for preciso alguma coisa», explica Carla, de 65 anos. Por
outro lado, houve famílias 5 que afirmaram que, antes de pedirem ajuda a outros, consultam o
manual de instruções do equipamento, havendo ainda casos em que, se o manual não ajudar,
se recorre à internet. «Também nos suportamos na net. No outro dia eu não sabia do manual
de instruções da consola para sintonizar um comando e fui ver na net», descreve Adelaide, de
33 anos. «Se as instruções não me esclarecerem, vou à net procurar a marca e tento encontrar
instruções com bonecos, que sejam de percepção mais fácil», responde Ana, de 34 anos,
habituada a lidar com tecnologia. Há ainda quem prefira resolver os problemas através da
“experimentação”, ou “aventurando‐se”. Cinco famílias referiram este método.
A TV nos próximos 5 e 10 anos
Pedimos aos entrevistados que se imaginassem daqui a cinco anos, e nos dissessem se
estariam a ver mais, menos ou o mesmo tempo de televisão do que actualmente. As respostas
foram variadas. Começando pelos que se projectam a ver mais tempo de televisão (12
famílias), podemos destacar aqueles que, com o avanço da idade e a entrada na reforma, se
imaginam a ter menos actividades fora de casa e, consequentemente, a passar mais tempo em
frente ao ecrã. «Acho que vou ver mais ainda. Já posso sair menos… Cada vez vou podendo
sair menos e acho que poderei ver mais ainda. E, na medida em que estou sozinha, não vejo
outras alternativas», antecipa Joana, de 71 anos, explicando que só quando vai a casa dos
filhos, ao fim‐de‐semana, se sente mais acompanhada e, ainda assim, acaba sempre por ver
televisão. «Se for vivo, de certeza absoluta que vou ver mais televisão. Porque daqui a cinco
anos já tenho 65 anos, já vou para a reforma e vou ter, portanto, mais tempo livre (risos)», diz
João, de 59 anos. «Começo a ter dificuldades em mexer no computador e deixo‐me adormecer
a olhar para a televisão (risos). Digo eu, mas isso é no caso de perder a mobilidade, etc.»,
31
32. prevê João, de 77 anos, que actualmente passa a maior parte do tempo no computador, com a
gestão de dois blogues, colocando a TV num segundo plano. «Daqui a cinco anos os meus
netos já são maiores, já não estão aqui com a gente e já temos que ter qualquer coisa que nos
entretenha (risos). A televisão é uma companhia», desabafa Paula, de 59 anos. Há também
quem se projecte a ver mais televisão por ser sinal de melhor qualidade de vida, e quem
coloque a melhor qualidade de imagem – que a TDT poderá trazer ‐ e a melhor programação,
como factores que decidirão o maior ou menor consumo de televisão. «Se for assim (com a
TDT) acho que vou ver mais, porque assim já não há interferências e uma pessoa pode
escolher o canal que quiser ver», reflecte Catarina, de 73 anos. «Provavelmente mais… Se
tivermos mais tempo disponível e se a programação agradar… Agora, se a programação não
agradar, aquilo tem ali um botão e a gente desliga. Até porque gostamos de ouvir música e
isso é uma grande vantagem», promete Manuel, de 71 anos, mais adepto da rádio do que da
televisão.
No que respeita aos elementos de 14 famílias que planeiam ver menos televisão do que
actualmente, verificamos que são indivíduos mais jovens que, com o maior peso do trabalho e
a diminuição dos períodos de lazer, contam ver menos televisão. «Menos. Isto cada vez temos
Figura 13: Família “Graça” – Celeste acha que ver cinco horas por dia de televisão já é suficiente, e confessa que
gostaria de ter um cinema em casa
que trabalhar mais para ter alguma coisa (risos), sublinha Margarida, de 35 anos. «Da maneira
que o país está acho que não. Porque acho que nós cada vez trabalhamos mais e cada vez
temos menos tempo para o lazer, defende Ana, de 33 anos, acrescentando que valoriza muito
32