Justiça julga improcedente queixa de Kim Kataguiri contra Altamiro Borges
1. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
COMARCA DE SÃO PAULO
FORO CENTRAL JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS
2ª VARA DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL - VERGUEIRO
RUA VERGUEIRO, 835, São Paulo-SP - CEP 01504-001
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SENTENÇA
Processo Digital nº: 1002021-54.2018.8.26.0016
Classe – Assunto: Procedimento do Juizado Especial Cível - Obrigação de Fazer / Não Fazer
Requerente: Kim Patroca Kataguiri
Requerido: Altamiro Borges e outros
Juiz(a) de Direito: Dr(a). Marcela Dias De Abreu Pinto Coelho
Vistos.
Dispensado o relatório, nos termos do artigo 38 da Lei 9.099/95.
Fundamento e decido.
Entendo ser desnecessária a produção de outras provas, razão pela qual se
mostra possível o julgamento antecipado do pedido.
Como é cediço, o destinatário da prova é o juiz. Desta forma, sendo o
conjunto probatório amealhado aos autos suficientes para a formação de seu
convencimento, não há que se falar em realização obrigatória de provas, ainda que
postuladas pelas partes.
Nesse sentido: “A decisão judicial que considera desnecessária a realização
de determinada diligência probatória, desde que apoiada em outras provas e fundada em
elementos de convicção resultantes do processo, não ofende a cláusula constitucional que
assegura a plenitude de defesa. Precedentes.” (AgR-AI 153.467/MG, Rel. Min Celso de
Mello, DJ 18/05/2001).
É o caso dos autos, uma vez que os elementos nele constantes são
suficientes para a elucidação da controvérsia.
Trata-se de ação de reparação de danos morais cumulada com obrigação de
fazer na qual o autor, em síntese, alega ter sofrido danos à sua imagem e honra devido a
publicações dos réus. Pleiteia, então, indenização por danos morais, bem como a retirada
dos termos ofensivos das publicações em referência.
Em sede de defesa a corré Central Única dos Trabalhadores CUT requer a
extinção do processo pela inépcia da inicial. No mérito, requer a improcedência dos
pedidos. Subsidiariamente, questiona os valores reivindicados a título de danos morais.
Por sua vez, a corré Editora 247 Ltda. também questiona os valores
apresentados em pedido de indenização e requer a improcedência do feito.
O réu Altamiro Borges, apesar de devidamente citado (fls 53), permaneceu
inerte, deixando de apresentar defesa, bem como não comparecendo à audiência de
conciliação designada (fls. 187). Portanto, incide, na espécie, o disposto no art. 20 da Lei
9.099/95.
Contudo, em que pese a ausência do requerido na audiência de conciliação
designada e o disposto no art. 20 da Lei 9.099/95, observo que no presente caso não se
deve simplesmente aplicar os efeitos da revelia e reputar os fatos alegados na exordial
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como verdadeiros. Isso porque o efeito da revelia não induz necessariamente à
procedência da ação, nem afasta a necessidade de análise da prova existente nos autos.
Não há imposição ao julgador do acolhimento total da pretensão deduzida na inicial.
Com efeito, a presunção de veracidade advinda da revelia é relativa e pode
ceder diante de outras circunstâncias apuradas no curso do processo, não vinculando o
julgador.
Neste sentido a jurisprudência:
"a falta de contestação conduz a que se tenham como verdadeiros os fatos
alegados pelo autor. Não, entretanto, a que necessariamente deva ser julgada procedente
a ação. Isso pode não ocorrer, seja em virtude de os fatos não conduzirem às
conseqüências jurídicas pretendidas, seja por evidenciar-se existir algum, não cogitado
na inicial, a obstar que aquelas se verifiquem" (cf. STJ - 3 a Turma, Resp 14.987-CE, Rei.
Ministro Eduardo Ribeiro, j. 10.12.91, deram provimento, v.u., DJU 17.2.92, p. 1.377).
Passo à análise da preliminar suscitada pela corré CUT.
Afasto a inépcia da inicial, vez que a exordial preenche os requisitos
previstos no artigo 319 e seguintes do Código de Processo Civil, estando apta a produzir
seus regulares efeitos. Ademais, a discussão acerca de eventual dano moral é matéria de
mérito e com ele será examinada.
Passo ao exame do mérito.
O pedido é improcedente.
Em que pese o alegado pelo autor, as publicações dos requeridos não
chegam a lhe impingir danos morais.
De proêmio, anoto não haver primazia entre o direito à honra, intimidade
ou privacidade em detrimento da liberdade de expressão e de imprensa.
Isso implica dizer que o conflito entre direitos fundamentais pressupõe uma
análise acerca da ponderação de bens no caso concreto. Para solução de eventual
antinomia, devem ser ponderadas as circunstâncias, de modo a estabelecer limites de
ambos os direitos e alcançar o saldo mais favorável ao caso que se apresenta. Essa
ponderação de direitos não é abstrata, pois depende da situação concreta, de circunstâncias
fáticas, objetivas e subjetivas, juridicamente relevantes. Entre os comportamentos
relevantes, está a conduta ético-jurídica censurável de uma parte (Rabindranath V A
Capello de Souza, O Direito Geral de Personalidade, Coimbra Editora, 1.995, ps.
533/535).
Com efeito, a liberdade de expressão é um dos direitos fundamentais
insertos em cláusula pétrea e é da essência do Estado de Direito, conforme previsão
contida nos artigos 220, caput e 5º, inciso IX, da Constituição Federal.
A Carta Magna não admite, assim, qualquer tipo de censura aos órgãos de
comunicação, punindo-se apenas os excessos. No presente caso, a ponderação desses
princípios impede cogitar ato ilícito gerador de dano moral, pois não restou configurado
qualquer abuso ou excesso no direito de informação ou da liberdade de imprensa
ensejando ato ilícito indenizável. Houve apenas, nas notícias em tratativa, exposição de
fatos e críticas de forma jornalística.
Isso porque os artigos publicados pelos requeridos direcionam-se a criticar
determinados posicionamentos do movimento a que se filia o requerente, bem como as
ideologias políticas que este apresenta por sua vinculação a determinados partidos. Note-
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se que as notícias impugnadas criticam de forma veemente o posicionamento político do
autor e as ideias que ele propaga.
Nesse contexto, o tom das críticas dos requeridos apresenta uma visão
negativa quanto aos posicionamentos sociais e políticos do requerente. Entretanto, essas
manifestações se limitam a atingir uma determinada orientação, sem afetar seus
simpatizantes individualmente considerados.
Nesse aspecto, consigno que a informação prestada no meio jornalístico
pode ter tom de notícia e/ou de crítica, de modo que em ambos os casos encontra-se
constitucionalmente tutelada.
Neste sentido:
MEDIDA CAUTELAR EM AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE. INCISOS II E III DO ART. 45 DA LEI
9.504/1997 [...] 5. Programas humorísticos, charges e modo caricatural de
pôr em circulação ideias, opiniões, frases e quadros espirituosos compõem
as atividades de “imprensa”, sinônimo perfeito de “informação jornalística”
(§ 1º do art. 220). Nessa medida, gozam da plenitude de liberdade que é
assegurada pela Constituição à imprensa. Dando-se que o exercício
concreto dessa liberdade em plenitude assegura ao jornalista o direito de
expender críticas a qualquer pessoa, ainda que em tom áspero, contundente,
sarcástico, irônico ou irreverente, especialmente contra as autoridades e
aparelhos de Estado. Respondendo, penal e civilmente, pelos abusos que
cometer, e sujeitando-se ao direito de resposta a que se refere a
Constituição em seu art. 5º, inciso V. A crítica jornalística em geral, pela
sua relação de inerência com o interesse público, não é aprioristicamente
suscetível de censura. Isso porque é da essência das atividades de imprensa
operar como formadora de opinião pública, lócus do pensamento crítico e
necessário contraponto à versão oficial das coisas, conforme decisão
majoritária do Supremo Tribunal Federal na ADPF 130. Decisão a que se
pode agregar a ideia de que a locução “humor jornalístico” enlaça
pensamento crítico, informação e criação artística.” ADI 4451 MC-REF,
Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 02/09/2010
É inquestionável a pluralidade de posicionamentos ideológicos, sobretudo
em período eleitoral, no qual os meios eletrônicos e mídias sociais contribuem para a
propagação das ideias. Contudo, a punição de determinados posicionamentos representaria
inequívoca censura.
Imperioso destacar, ainda, que a utilização do termo “fascista”, destaca, de
forma extrema e em teor de veemente crítica à sua conjuntura, o posicionamento político
do autor, sob a ótica dos requeridos. É o que se extrai das publicações de 20 e 23 de julho
(fls. 32 e 34): “(...) explicitando semanalmente suas posições fascitoides contra as
esquerdas, os direitos humanos e qualquer avanço civilizatório.” Nesse sentido, entendo
que é inerente ao jornalismo a utilização de certa dose de sensacionalismo na linguagem, o
que é aceitável pelo seu propósito de atrair o interesse dos ouvintes.
Não se pode desconsiderar, ainda, que conforme demonstrado em
contestação da ré Editora 247 Ltda., o próprio autor utiliza a mesma expressão para
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criticar a sua oposição. Contudo, não há elementos que sinalizem o propósito do autor em
ofender pessoal e diretamente seus opositores, mas tão somente atrelar um indivíduo às
ideias por ele criticadas.
Assim, por serem as notícias acostadas aos autos, objeto da presente lide,
textos dissertativos-argumentativos, onde seu redator apresenta um determinado tema
somado ao seu ponto de vista, entendo que tal comportamento está inserido dentro dos
limites da livre liberdade de expressão, concorde-se ou não com seu teor.
Deve-se convir também que, ao participar ativamente da política, tornando-
se uma figura pública, à frente de atos geradores de discussões, bem como ao se beneficiar
da divulgação proporcionada pelas mídias, o autor está sujeito a ser criticado pelo mesmo
meio, - seja com a utilização das expressões das quais ele próprio se vale, seja por meio de
trocadilhos humorísticos -, mas sem que se possa cogitar de dano moral.
O que não se admite é a transposição do limite das críticas para o campo da
ofensa, com ataques abertos diretos, o que não se verifica no caso.
Assim, entendo que todo o conteúdo das matérias acostadas na inicial,
publicadas e de autoria dos réus, não representa senão o exercício de direitos
constitucionalmente garantidos, sendo estes o da livre manifestação do pensamento e
liberdade de expressão e imprensa, cujo abuso não restou evidenciado.
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos e extingo o
processo, com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de
Processo Civil.
Deixo de arbitrar verba honorária, na medida em que incabível na espécie
(artigo 55, da Lei n. 9.099/95).
P.R.I.C.
São Paulo, 19 de dezembro de 2018.
DOCUMENTO ASSINADO DIGITALMENTE NOS TERMOS DA LEI 11.419/2006,
CONFORME IMPRESSÃO À MARGEM DIREITA
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