Compartilhamos filosofia com crianças uma possibilidade para o pensamento transformador na escola
1. FILOSOFIA COM CRIANÇAS: UMA POSSIBILIDADE PARA O PENSAMENTO
TRANSFORMADOR NA ESCOLA?
Bárbara Oliveira dos Santos- IC/FAPERJ- UERJ
Barbara Fernandes Bersot- PIBIC/CNPq- UERJ
Resumo
O presente trabalho tem como objetivo apresentar atividades que conduzem crianças para
novas possibilidades de se pensar através da filosofia, na Escola Municipal Joaquim da
Silva Peçanha em Duque de Caxias. O trabalho se baseia no projeto “Em Caxias, a filosofia
en-caixa?” descrito no livro “A escola pública aposta no pensamento”, organizado por
Walter Omar Kohan e Beatriz Fabiana Olarieta. O projeto se desenvolve através de
experiências filosóficas, em que o (a) coordenador (a) do projeto na Escola coordena as
discussões sobre determinado assunto escolhido por ele com ajuda do Núcleo de Estudos
Filosóficos da Infância(NEFI) da UERJ. Apesar de o coordenador estar a frente da
discussão, o professor(a) da turma e os(as) pesquisadores(as) podem fazer intervenções,
toda participação é bem-vinda. A atividade ocorre em um um círculo onde não existem
limites para as possibilidades do pensamento, não existe o certo e o errado. Os participantes
descobrem um novo caminho para o pensar durante as experiências mas os efeitos desse
trabalho filosófico na escola não tem fronteiras, cada um que se envolve leva algo dessa
experência. A participação de professores e/ou da equipe pedagógica, assim como a de
alunos promove a reavaliação de ideias e conceitos das mais simples aos mais complexos,
estimulando um pensamento crítico. Dessa maneira as crinças e todos que se envolvem
podem passar a pensar sobre as situações da vida a partir de suas próprias concepções de
mundo.
Palavras-chave: Educação; filosofia; infância.
2. Introdução
O trabalho relata a experiência dos pesquisadores, professores e alunos, na pesquisa
em andamento que fundou o projeto “Em Caxias, a filosofia en-caixa?” , no município de
Duque de Caxias. O projeto, que é desenvolvido em duas escola municipais: Joaquim da
Silva Peçanha e Pedro Rodrigues da Silva, buscou criar um momento com as crianças que
instigassem-nas a pensar, que as tirassem de suas áreas de conforto. Com uma proposta
diferente comparada as outras escolas municipais o projeto vem construindo uma história
de evolução que ao decorrer dos anos vem se aperfeiçoando e modificando a prática
cotidiana da sala de aula.
Com o objetivo de demarcar a importância de uma prática baseada numa relação
simples e direta entre professor e aluno, focada no respeito mútuo que atingiu inclusive a
relação entre as crianças em si. Dessa maneira, serão tratados alguns pontos que foram
importantes para o desenolvimento do projeto e para o resultados que vêm sendo obtidos.
Logo, apartir de uma análise empírica baseada nas experiências filosóficas com as crianças
na sala de aula serão desenlvolvidas as questões da relação espaço/tempo criada pelo
projeto, da relação professor/aluno e aluno/aluno estabelecida e o processo dos professores
da escola e dos próprios pesquisadores na construção do projeto.
“Para quê trabalhar filosofia da escola?”
Para o projeto acontecer algumas questões foram trabalhadas entre os profissionais,
dentre essas algumas foram debatidas a fundo. Como a proposta do projeto é de se pensar
uma prática pedagógica filosófica com crianças, é possível pensar primeiramente se há um
momento certo de se apresentar a filosofia e trabalhar com ela na sala de aula.
Posteriormente, foi pensado em como tornar essa prática possível num ambiente tão
comumente subestimado como a rede pública educacional. E consequentemente quais
forams os efeitos sobre aqueles que se envolveram no projeto, tanto os docentes quanto os
dicentes. Para isso, nos basearemos no livro “A escola pública aposta no pensamento” que é
sobre o projeto e foi escito pelos própios organizadores do projeto Walter Omar Kohan e
3. Beatriz Fabiana Olarieta com participação de outros pesquisadores e professores da própria
escola que também atuam no projeto e de alguns alunos que vivenciaram as experiências
filosóficas.
Para compreender um pouco o motivo pelo qual pode surgir o questionamento sobre
haver uma “idade certa” para a prática da filosofia deve-se pensar, primeiramente, naqueles
que possuem uma capacidade de raciocínio considerada tanto socialmente quanto no
âmbito da sala de aula. Primeiramente remetemo-nos a realação de idade, quem é mais
velho detém maior poder de compreensão e capacidade de reflexão nessa lógica os adultos
seriam mais inteligentes que as crianças. Dessa maneira, pode-se perceber como esses
valores interferem na posição do adulto e da criança socialmente. A opinião do adulto, por
exemplo, seria mais importante e interessante que a de uma criança. Sob essa perséctiva
pode-se perceber o quanto a infãncia é desvalorizada, e o quão as crianças são
subestimadas e descartadas quando a ideia é trabalhar filosofia, ou outra proposta que
valorize suas opinões.
O livro “A escola pública aposta no pensamento”, traz bastante a questão da relação
hieráquica e autoritária na sala de aula que ainda é tão comum. Não é possível afimar ao
certo se essa relação ocorre em consequência da ideia de desvalorização da capacidade
mental da criança já concebida socialmente ou se é justamente o contrário, visto que a
escola é ao mesmo tempo reprodutora e formadora de valores e opinião. Mas voltando a
questão, a partir da constatação dessa verticalização na relação aluno/professor pode-se
reavaliar a posição em que o aluno se encontra. Qual a expectativa do professor em relação
a ele? O que se observa é a ideia de que o aluno é passivo na relação ensino/aprendizagem,
em que o professor transferirá seus conhecimentos ao aluno, e só. O que se nota é a
construção dessa hierarquia a medida que calam seus alunos quando há a exposição de uma
ideia diferente do previsto. A medida que não dão a devida atenção as falas que podem
surgir e ser às vezes mais enriquecedoras do que aquelas costumeiras, o que será
considerado válido é aquilo que se espera do aluno o resto será abafado e assim pouco a
pouco cada um vai ocupando seu espaço no processo educacional tanto professor, quanto
aluno. Mas quem se debruça no exercício de olhar um pouco mais de perto para a real
situação dessa relação vai desconstruindo essa ideia de passivididade e descobrindo uma
relação mais produtiva que surge da cooperação, do trabalho em conjunto. Acreditando que
4. o aluno não absorverá os conhecimentos mas sim irá costruí-los apartir de suas próprias
experiências e das interações sociais. E sem um momento específico, a aprendizagem e o
desenvolvimento ocorrem o tempo todo.
Com uma proposta diferente e enriquecedora o projeto “Em Caxias, a filosofia en-
caixa?” criado por memboros NEFI (Núcleo de Estudos Filosóficos da Infância) da UERJ
repensa essa relação sob essa perpectiva da parceria, considerando primeiramente que
filosofia pode e deve ser praticada por todos tanto professor como aluno. Com uma visão
diferenciada sobre a capacidade do aluno, principalmente da criança e seu poder de
reflexão, o projeto se instalou em duas escolas públicas municipais de Duque de Caxias:
Escola Municipal Pedro Rodrigues do Carmo e Escola Municipal Joaquim da Silva
Peçanha , com muitas incertezas e muita coragem também.
O mais interessante dessa proposta é que surte efeitos tanto parar os alunos, quanto
para os professores. Mesmo a filosofia podendo ser vista superficialmente apenas como um
exercício de pensar sem propósito, foi preciso haver uma preparação dos professores, os
cursos de formação, para desconstruir alguns preconceitos deles mesmos com a disciplina e
preparando-os teoricamente para exercerem um trabalho fundamentado e consciente para
então discutirem sobre como será a prática. Um relato interessante trazido pela Vanise
Dutra, no segundo capítulo do livro “A escola pública aposta no pensamento”, é justamente
como esse processo influenciou os professores envolvidos na vida profissional e inclusive
na vida pessoal, a medida que levavam a o exercício da reflexão para além do projeto. Isso
permite discutir a ideia também do quanto é necessário haver uma reflexão sobre o seu
próprio trabalho e como a escola pode levar esse momento a sua equipe pedagógica, pois
não somente o professor tem responsabilidade na educação a ser desenvolvida na
instituição. E aos poucos a filosofia foi ganhando espaço e verdadeira importância para o
trabalho dos professores, e não só num momento específico a filosofia então estaria aos
poucos se tornando cotidiana na escola.
A proposta de promover um momento de igualdade em que todos possam se
expressar e deliberar sobre um texto é no mínimo curiosa. Pois, como fica claro no discurso
da Vanise Dutra, o texto válido é aquele que desperta algo em nós para então podermos
trabalhar verdadeiramente com nossas inquietações e despertar assim a inquietação no
outro. Então, os debates, o “fazer filosofia” não seria uma conversa monitorada pelos
5. professores como se testassem os alunos, mas sim uma possibilidade de um diálogo em que
juntos vão pensar e discutir sobre algo que não necessariamente haja uma resposta. Outra
ideia interessante que foi discutida no decorrer das experiências filosóficas foi o material
com que trabalhariam, que tipos de textos, qual seria melhor para trabalhar a filosofia.
Como já foi dito o texto que seria realmente fértil para esse tipo de proposta é aquele que
despertar algo em quem irá trabalhar com ele, primeiramente nas professoras que irão
trabalhar com os alunos e consequentemente instiguem aos alunos, mas qual formato teria
esse texto? Foi através de algumas pesquisas e mais reflexões que perceberam a riqueza na
variedade de textos e que realmente não importava a forma seja poético ou dramático e já
não importava mais se era escrito podendo ser uma música ou uma imagem, o principal era
provocar inquietudes. Mas não inquietudes em busca de respostas já pré concebidas, mas
sim levar a pensar em situações e possibilidades que talvez nunca tinham sido pensadas
antes, é o deliberar pelo próprio prazer e sentido da deliberação. É nessa capacidade criativa
e problematizadora que o projeto confia e se propõe a explorar tanto a si mesmos quanto
aos alunos.
Um relato bem interessante é que a própria forma do alunos se tratarem mudou.
Quando os alunos estão vivenciando a experiência filosófica pela primeira vez fica claro o
medo da aeceitação e do erro. Acostumados com o tipo de avaliação das matérias regulares
quando se deparam com a questões desconcertantes trazidas pelo coordenador do projeto na
escola, ou pelo próprio professor da turma ficam ainda mais com medo de errar.Nesse
primeiro momento aquele que se arrisca a falar, muitas vezes é zombado por alguns colegas
que se julgam mais espertos, mas aos poucos com a mediação dos professores eles vão
entendo que toda resposta é válida e que a troca de experiências é fundamental para nossa
aprendizagem tanto para escola quanto para vida.E, aos poucos, eles vão perdendo a
vergonha de falar e o medo de errar, e passam a entender que naquele momento o que vale
é a discussão, são as perguntas, são as respostas intrigantes, muito mais do que aquelas
taxativas.Nessa dinâmica, a própria relação enter eles muda, passam a ser mais respeitosos
uns com os outros e vão sentindo cada vez mais a liberdade de falar o que pensa sem
vergonha ou receio.
Depois de tanto pensar e desmembrar algumas questões relevantes sobre a
viabilização da prática da filosofia na escola e com alunos de qualquer idade, deve haver
6. uma pergunta-chave que é “ para quê se trabalhar filosofia na escola?” Como é discutido
no texto “A prática filosófica e a reforma educaiconal”, do livro “A filosofia vai à escola”
de Matthew Lipman, a filosofia foi relatada por Sócrates como uma modo de vida. Sob essa
perspectiva a filosofia então pode ser considerada como um fim em si mesma, não podendo
então ser associda a determinada função ou ser um meio para atingir um objetivo final que
não seja a própria exercício da filosofia, do pensar, avaliar e quem sabe construir seus
próprios conceitos e ideias. Com o estudo do projeto de filosofia em Caxias, percebe-se que
as experiências filosóficas não são e não devem estar associadas ao desempenho escolar do
aluno nas matérias regulares, pois sua função não é essa. A filosofia é trabalhada para cada
um desenvolver sua própria capacidade de reflexão, e seus efeitos não são da
responsabilidade de quem conduziu o trabalho, visto que o aluno não é meramente levado e
ele mesmo interfere na própria aprendizagem, sendo assim para cada um a filosofia se
apresentou e tocou de um forma difernte. E essas várias faces da filosofia ficam bem nítidas
no depoimento dos alunos ao longo do livro e na própria procura deles na escola pelo o que
eles chamam de “aula de filosofia”, cada um enxergou e aproveitou as experiências do seu
modo, à sua maneira e é isso que torna as experiências filosóficas tão ricas.
Para proporcionar um momento de máximo estímulo e liberdade para o pensamento
o grupo investiu nas salas de filosofia, que inicialmente tinha apenas na escola Joaquim da
Silva Peçanhae agora foi recentemente inaugurada na escola Pedro Rodrigues do Carmo.
Porém atualmente não existe mais essa sala da Joaquim da Silva Peçanha mas tanto o
projeto como a escola estão engajados a construir e recuperar seu espaço. Essas salas foram
planejadas para demarcar ainda mais a diferença de “fazer filosofia” com a outras aulas
ditas “normais”.Foram pensadas também para a criança se sentir um pouco dona daquele
espaço, e se sentir de alguma forma representada ali, se ssentindo não somente bem na sala,
mas como parte fundamental dela.Não é que seja melhor, mas precisava de um lugar mais
inspirador, que proporcionasse elementos de reflexão e até de maior concentração das
crianças na hora de pensar, escrever, falar.Com materiais de artes e livros infantis trazem
um pouco a maneira lúdica de lidar com a infância e trabalhar a imaginação tentando trazer
um sentido real para o que não é real, como os próprios questionamentos sobre o que é real,
podendo levar a uma reavaliação de conceitos. Dessa maneira, com um espaço voltado para
as possibilidades, e não para o já convencionado, as crianças começam a sentir como seres
7. capazes, não só como alguém que deve obedecer e aceitar, mas que também pode criar,
ensinar, compartilhar experiências significativas. Quando há esse tipo de relação entre a
criança e o adulto e a criança e o espaço, ela passa a se enxergar com um poder sobre si e
sobre o mundo, bem diferente do que se apenas ficasse sentada numa cadeira ouvindo o
outro falar como se ela não soubesse nada.A criança aos poucos sai do estágio do passivo
para o ativo e com toda sua curiosidade pode conquistar muito mais do que pensava.
Dessa maneira, não esgotando as questões levantadas nem esse trabalho foi pensado
para a resolvâ-las abrimos uma discussão para que continue se pensando no que é melhor
para trabalhar filosofia na sala de aula e quais os benefícios reais que ela pode trazer. O
livro “A escola pública aposta no pensamento” traz algumas dicas que foram desenvolvidas
ao longo do processo de adaptação do projeto “Em Caxias filosofia en-caixa?”, ou seja, é o
relato daquilo que foi se ajustando entre erros e acertos para cumprir cada vez melhor a
proposta do projeto. E se apostar sugere arriscar, que seja. Pois é quando nos propomos a
repensar sobre nós mesmos, nossa prática e ideias que abrimos espaço para o novo, e como
é relato também na fala dos professores envolvidos: o novo desperta o medo, a insegurança,
estremece. Mas é assumindo riscos com coragem e comprometimento que pode se fazer a
filosofia acontecer dentro da escola e, por que não, dentro das pessoas.
Bibliografia
Kohan, Walter O. OLARIETA, Beatriz F.(2012) A escola pública aposta no
apostamento. Belo Horizonte, Autêntica.
LIPMAN, Mattew.(1990.)A prática filosófica e a reforma educacional.In:A filosofia vai à
escola.São Paulo, Summus, p.27-62