Este documento apresenta um resumo biográfico do escritor romântico português Almeida Garrett e descreve brevemente sua obra Viagens na minha terra, considerada um marco da prosa portuguesa. A narrativa desenvolve-se a partir de uma viagem do narrador de Lisboa a Santarém e aborda temas como a história e sociedade portuguesas do século XIX.
1. Almeida Garrett
“Formou Deus o homem, e
o pôs num paraíso de
delícias; tornou a formá-lo a
sociedade, e o pôs num
inferno de tolices.”
Viagens na minha terra
2. Almeida Garrett
Considerado o primeiro autor romântico
em Portugal,
João Batista da Silva Leitão de Almeida Garrett
(1799- 1854)
passou a infância nas propriedades
do pai, ao sul do Porto.
Aos 10 anos de idade foi obrigado a sair
de sua cidade (invadida pelas tropas de Napoleão
Bonaparte).
Mudou-se para Lisboa com a família e mais tarde
para a ilha Terceira (Açores).
3. Teatro
• Frei Luís de Souza
• 1843
Prosa
• Viagens na minha terra
• 1846
Poesia
• Folhas Caídas
• 1853
Garrett
dinâmico
4. Garrett sedutor
“A vida de Garrett foi tão apaixonante
quanto sua obra.
Destacou-se socialmente como
“o tipo perfeito do dandy”.
Foi um homem de muitos amores,
uma espécie de homem fatal.
Separou-se da esposa, para viver com
sua amante D. Adelaide Pastor até à
morte desta em 1841. A partir de
1846, a sua musa é a viscondessa da
Luz, Rosa Montufar Infante,
inspiradora dos arroubos românticos
das Folhas Caídas.”
5. Olhos negros
Por teus olhos negros, negros,
Trago eu negro o coração,
De tanto pedir-lhe amores...
E eles a dizer que não.
E mais não quero outros olhos,
Negros, negros como são;
Que os azuis dão muita esp'rança
Mas fiar-me eu neles, não.
Só negros, negros os quero;
Que, em lhes chegando a paixão,
Se um dia disserem sim...
Nunca mais dizem que não.
(in «Folhas Caídas e Outros Poemas»)
6. " Há três espécies de mulheres
neste mundo:
a mulher que se admira,
a mulher que se deseja e a
mulher que se ama.
A beleza, o espírito, a graça,
os dotes da alma e do corpo
geram a admiração. Certas
formas, certo ar voluptuoso,
criam o desejo. O que produz
o amor não se sabe; é tudo
isto às vezes; é mais do que
isto, não é nada disto. Não sei
o que é; mas sei que se pode
admirar uma mulher sem a
desejar, que se pode desejar
sem a amar.”
Cap. 44, Viagens na minha terra
7. Este inferno de amar – como eu amo!
Quem mo pôs aqui n’alma… quem foi?
Esta chama que alenta e consome,
Que é vida – e que a vida destrói.
Como é que se veio atear,
Quando – ai se há-de ela apagar?
Eu não sei, não me lembra: o passado,
A outra vida que dantes vivi
Era um sonho talvez… foi um sonho.
Em que a paz tão serena a dormi!
Oh! Que doce era aquele olhar…
Quem me veio, ai de mim! Despertar?
Só me lembra que um dia formoso
Eu passei… Dava o Sol tanta luz!
E os meus olhos que vagos giravam,
Em seus olhos ardentes os pus.
Que fez ela? Eu que fiz? Não o sei;
Mas nessa hora a viver comecei…
Por instinto se revela,
Eu no teu seio divino
Vim cumprir o meu destino...
Vim, que em ti só sei viver,
Só por ti posso morrer.
8. “Viagens na minha terra” é
considerado um ápice da prosa de
Almeida Garret, mas é difícil
determinar sua classificação (quanto
ao gênero) porque reúne em si: relatos
de viagens, ensaio e ficção - e aindanovela. (universia.com.br-adaptado)
Considerando que a obra surge durante do
movimento romântico, resgatando e preservando
a história nacional, o livro enquadra-se em
romance histórico ao lado de
Eurico, o presbítero ( Alexandre Herculano).
9. Estrutura da obra
Organização
em 49 capítulos
Narrador/autor
1a/ pessoa
A menina
dos
rouxinóis
em 3a pessoa
Narrativa
linear e uso do
flashback
Linguagem
híbrida
(formal + informal)
Antes de ser publicada como volume único em 1846, a obra foi um folhetim
publicado entre 1845 e 1846 na Revista Universal Lisbonense .
10. O estilo de Garret nesta obra
“o romance vai se desenvolvendo em torno de várias
digressões muitas delas literárias. Em muitos momentos ele
conversa com o leitor, ou leitora, que ele trata sempre de
forma educada e carinhosa. Utiliza termos como: benévolo
leitor, amável leitora, leitor amigo, entre outros.”
(Paulo Roberto Borges Berlim, em O tempo no romance: um recorte da Joaninha dos olhos verdes em Viagens na minha terra)
11. O enredo
A história se desenvolve a
partir de uma viagem
(que durou 6 dias)
entre Lisboa e Santarém.
O narrador/autor parte para
uns dias de descanso na casa
de seu amigo Passos Manuel.
Essa viagem tem
descrições esplendorosas.
*Note-se a direção da viagem: da
capital para o interior (vide mapa a
seguir).
12. Verossimilhança
A viagem que serve de pretexto para a
narrativa é real. Garrett fez o trajeto de
Lisboa a Santarém e observou a paisagem e
as pessoas em seus costumes.
Quando, em 1846, Almeida Garrett
escreveu Viagens na Minha Terra falavase do trem como promessa ( o primeiro
trecho de trem só seria inaugurado 10
anos depois da publicação da obra).
Garrett, embora fosse um progressista,
desconfiava do novo meio de transporte,
e preferia as estradas, tidas como mais
eficazes: ele descreve a viagem em
barcos, mulas e charretes.
13. Santarém
“No século XIX Santarém foi palco
de importantes acontecimentos
históricos, como a ocupação dos
exércitos franceses (1807/8); dois
anos depois foi também escolhida
como posição estratégico-militar e
quartel-general (...). Este último facto
levou à migração maciça da sua
população, incluindo frades e freiras,
para Lisboa e outras paragens.”
*Podemos interpretar que o autor
pretende fazer o caminho de volta;
voltar ao interior.
14. Tempo
O narrador utiliza a técnica do flashback, partindo de um
tempo presente, resgatando um tempo passado ( e histórico)
e projetando suas expectativas para o futuro.
O narrador marca o tempo cronologicamente ( determina os dias, os meses, e o ano
daquilo que conta) . No entanto, como a viagem física é intercalada por digressões,
só no final do livro é que sabemos que durou 6 dias.
15. O contexto do enredo
Guerra civil portuguesa entre
constitucionalistas
(representados por D. Pedro I)
e absolutistas
(representados por D.Miguel I).
Quando D. Pedro I volta a Portugal e
assume o trono cria-se um período
progressista de liberdade, e Garrett
escreve o livro para defender o governo.
O tempo das Viagens é um tempo
histórico de aguda crise de valores,
de recuo de conquistas políticas e
sociais. O narrador se interessa
pelo presente que o rodeia e pelo
passado próximo que a ele deu
origem.
16. “Nesse momento Joaninha, que passeava
a alguma distância da casa na direção de
Lisboa, acudiu sobressaltada brandando:
- Avó, avó!... tanta gente que aí vem!
soldados e povo... homens e mulheres...
tanta gente!
Era a retirada de 11 de outubro.
- Deus tenha compaixão de nós! - disse a
velha. - O que será, padre?
- O que há de ser! - respondeu Frei
Dinis. - O meu pressentimento que se
verifica; o combate foi decisivo, os
constitucionais vencem.
Com efeito foram aparecendo as tropas
que se retiravam, as gentes que fugiam, e
todo aquele confuso e doloroso
espetáculo de uma retirada em guerra
civil...”
(capítulo XIX)
17. Romance
Como já foi dito, Garret
vai defender o governo e
insere no livro uma
noveleta
“A menina dos
rouxinóis”.
O Romantismo “exigia”
uma história de amor
desafortunada para ilustrar
o relato...
Desse modo, temos o
romance entre Carlos e
Joaninha.
18. Viagens…no plural!!
Enquanto viaja, também a sua
mente vagueia pelo passado, pelo
presente e pelo futuro. São estas as
outras “Viagens” que o título
aponta: um olhar sobre o Portugal
de oitocentos, sobre a sociedade
nacional, sobre a política corrupta,
sobre o desencanto final do
liberalismo
(http://ww1.rtp.pt/icmblogs/rtp/grandeslivros)
19. O pluralismo do substantivo "Viagens“ dá pistas da coexistência de múltiplas viagens:
Viagem Geográfica
(de Lisboa a Santarém)
Viagem ao passado das
personagens
(segredos )
Viagem à
Consciência
(reflexões e críticas)
Viagem Sentimental
(Carlos e Joaninha)
Viagem ao passado
(história de Portugal)
21. Personagens
Carlos
representa o
espírito
renovador e
liberal
Georgina
Joaninha
representa o
ideal moral da
sociedade
representa a
pureza da vida
campestre,
limpa da
corrupção
citadina,
impoluta e de
mente ingênua
D.Francisca
representa
Portugal e a
prudência
Frei Dinis
representa o
absolutismo,
conservadorismo,
a tradição, os
velhos e
inquebráveis
costumes.
22. “Espelhos inversos”
Carlos (o filho), ao contrário,
luta pelos ideais do liberalismo
e, depois de descobrir que é
filho do frade, foge e se torna
barão (materialista).
Frei Dinis (o pai) é, inicialmente,
materialista. Somente diante do
remorso pelo pecado cometido
espiritualiza-se,
tornando-se um frade austero.
Helder Macedo afirma que estes personagens são “espelhos, imagens inversas um do outro”.
23. “Joaninha (...) é uma criança, e tem mais
juízo, mais energia d'alma, mais saúde e
mais força do que (...) a maior parte dos
homens.” (capítulo XIX )
“os olhos de Joaninha eram verdes... não daquele
verde descorado e traidor dos felinos, não não,
eram verde-verde, puros e brilhantes como
esmeraldas do mais subido quilate.” (capítulo XII)
Personifica a graça, a fragilidade, o espírito
de sacrifício e o encanto feminino na
concepção do autor.
Sua função é mostrar a destruição do caráter
de Carlos. Sentimental, enlouquece diante
das injustiças e crueldades sociais e morre.
(http://martarib.tripod.com/personagens.htm)
24. Joaninha e a janela
“Joaninha era certa em sua janela(...)
ambos os exércitos, ali se acostumaram
a vê-la com o nascer e o pôr do sol: ali,
muda e quedas horas esquecidas,
escutava ela o vago cantar dos seus
rouxinóis, talvez absorta em mais vagos
pensamentos ainda...
E dali lhe puseram o nome de "menina
dos rouxinóis", pelo qual era
conhecida em ambos os campos;
significante e poético apelido com que a
saudavam os soldados de ambas as
bandeiras.”
(capítulo XIX)
25. "Leitor amigo e benévolo, caro leitor meu
indulgente, não acuses, não julgues à pressa o
meu pobre Carlos." (Cap.XXII)
O típico exemplo dos homens fatais, que
espalham à sua volta a destruição e o sofrimento;
caráter inconstante, não consegue encontrar-se
a si próprio nem identificar-se com o seu
verdadeiro eu, simbolizado por Joaninha.
É um puro coração que a sociedade transformou
num céptico, um sentimental arrastado por um
coração demasiado grande e sensível que não
sabia obedecer à razão ou à vontade.
(http://martarib.tripod.com/personagens.htm)
26. "Uma bela mulher de estatura não acima da
ordinária", "a cabeça com uns laços de preto e cor
de granada (…) um rosto oval, clássico, perfeito,
sem grande mobilidade de expressão mas belo"
(Cap. XXXII)
Mulher madura no pensar, de personalidade forte,
enérgica e firme.
Simboliza o espírito de abnegação, sacrifício e de
renúncia.Tanto ela como Joaninha são personagens
individuais, que não representam qualquer grupo
social.
(http://martarib.tripod.com/personagens.htm)
27. "católico sincero e frade no coração“
(cap. XV)
"o frade mais austero e pregador mais
eloquente daquele tempo“
(cap. XVI)
"homem de princípios austeros, de crenças
rígidas e de uma lógica inflexível e teimosa".
(cap. XV)
Simboliza as ideias absolutistas, encarna a
ideia cristã da penitência.
É uma personagem que tem como função na
obra criar uma atmosfera de terror,
atormentado pelo remorso.
(http://martarib.tripod.com/personagens.htm)
Antes de ser frade, Dinis foi o culpado pela
morte da mãe de Carlos (de quem era
amante) e do marido dela, e também pela
morte do pai de Joaninha.
28. Avó paciente, terna, carinhosa e amante dos netos.
O seu comportamento quase não sofre alterações do
princípio ao fim da novela.
Está mais ligada ao passado do que ao presente; só
ela conhece o mistério da família e os crimes de
Frei Dinis.
Desempenha um papel decisivo na cena do
reconhecimento. É ela que impede Carlos de
assassinar Frei Dinis, revelando-lhe que ele é seu
pai. "Filho, meu filho! - arrancou a velha com
estertor do peito: - É teu pai, meu filho. Este homem
é teu pai, Carlos". (Cap.35)
Com a morte da neta (Joaninha) deixará de existir
como ser humano, aguardando apenas a morte
física.A estagnação das perspectivas da sua vida
poderá simbolicamente ser associada com a
situação de Portugal ("pátria moribunda").
(http://martarib.tripod.com/personagens.htm)
29. Desfecho
Carlos não aceita o fato de ser filho de Frei Dinis e foge; torna-se barão e deixa
Georgina, enquanto Joaninha enlouquece e morre.
abandona os ideais para assumir um comportamento
adequado aos apelos do mundo: ser barão. Desta
perspectiva, é o símbolo do Portugal contemporâneo.
(Massaud Moisés)
Paralelamente, a viagem até Santarém também termina.
30. “Mortes simbólicas”
“[Carlos]foge, desencadeando um processo que se pode
denominar de mortes simbólicas na obra: Carlos morre ao
tornar-se barão — morte de ideais, da alma, do amor.”
(Abigail dos Santos Fonsêca)
“Além da morte de Carlos há também a de Joaninha que morre para a razão ao
enlouquecer; Georgina morre para a vida ao converter-se ao Catolicismo pois
não aceitava ser de outro homem que não fosse Carlos; D. Francisca (que já estava
semimorta), também louca, morre para o mundo, está apenas à espera da
“dissolução do corpo”, assim como Frei Dinis que aguarda o momento em que
Deus o leve.”
(Abigail dos Santos Fonsêca)
31. Assista no
Análise da obra em estudo.
Disponível em:
http://www.youtube.com/watch?v=YFLeRzsKSok
32. Assista no
Série Grandes Livros
RTP Viagens da minha terra
(apresentação) 50 minutos
Episódio 10
2009.
http://www.youtube.com/watch?v=ho2ZqiVUCss&feature=related
33. Relevância no movimento literário
“Instrumento para reflexão do seu autor, Viagens na minha terra, não só moderniza a
prosa portuguesa, extirpando-lhe os vícios retóricos de grandiloqüência, como também
traz em seu bojo a marca de uma lúcida consciência dos problemas que afligem seu país.”
(Massaud Moisés,p.40)
“As Viagens(...) são o ponto de arranque da moderna prosa literária portuguesa: pela
mistura de estilos e de géneros, pelo cruzamento de uma linguagem ora clássica ora
popular, ora jornalística ora dramática, ressaltando a vivacidade de expressões e
imagens, pelo tom oralizante do narrador, Garrett libertou o discurso da pesada tradição
clássica, antecipando o melhor que a este nível havia de realizar Eça de Queirós.”
A obra gera a referência
histórica para o início
de “A cidade e as serras”,
de Eça de Queirós
34. “Ficam-nos estas “Viagens” que,
fisicamente, foi breve (Lisboa – Santarém;
Santarém – Lisboa), mas que atravessou
toda a alma de um país que ainda se
descobre entrelinhas.”
(– Episódio X– Série Grandes Livros, Viagens na
minha terra – Almeida Garrett)
35. Fontes
GARRETT, Almeida. Viagens na minha terra. 3° edição. Lisboa: Sá da Costa, 1974.
MOISÉS, Massaud (dir.). A literatura portuguesa em perspectiva: Romantismo e Realismo. vol. 3. São Paulo: Atlas, 1994, p. 39.
FONTES, Isabel. Disponível em http://www.mundovestibular.com.br/articles/4367/1/VIAGENS-NA-MINHA-TERRA---Almeida
Garret-Resumo/Paacutegina1.html
BERLIM, Paulo Roberto Borges. O tempo no romance: um recorte da Joaninha dos olhos verde
disponível em: www.letras.ufpr.br/documentos/graduacao/monografias/ss_2008/paulo_roberto_borges_berlim.pdf
•
http://pt.shvoong.com/books/1942732-an%C3%A1lise-livro-viagens-na-minha/#ixzz1oegoWT4k
•
http://noticias.universia.com.br/destaque/noticia/2012/02/24/913540/estude-os-livros-obrigatorios-da-fuvest-e-unicamp2013-viagens-na-minha-terra-almeida-garret.html
•
http://alpendredalua.blogspot.com/2011/12/notacoes-os-pobres-i-de-almeida-garrett.html
•
http://martarib.tripod.com/biografia.htm
•
http://ww1.rtp.pt/icmblogs/rtp/grandeslivros/?k=Viagens-na-Minha-Terra.rtp&post=11408 http://www.lithis.net/25
•
http://nelsonsouzza.blogspot.com/2010/08/este-inferno-de-amar-almeida-garrett.html
•
http://www.notapositiva.com/trab_estudantes/trab_estudantes/portugues/portugues_trabalhos/fichaleituraalmeidagarrett.htm
•
http://martarib.tripod.com/personagens.htm
•
http://www.artigos.com/artigos/humanas/artes-e-literatura/simbolos-e-imagens-em-viagens-na-minha-terra-2473/artigo/
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