ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. INVESTIDURA. CANDIDATA APROVADA FORA DAS VAGAS DO EDITAL. DESISTÊNCIA DE CANDIDATO CLASSIFICADO. INSERÇÃO DA
IMPETRANTE/RECORRIDA ENTRE OS CLASSIFICADOS. DIREITO SUBJETIVO À POSSE. RECURSO DESPROVIDO.
Conforme hodierna orientação do STJ, o aprovado em concurso público tem direito subjetivo à posse, dentro do número
de vagas prescrito pelo edital. Nesse contexto, é indiferente que o
candidato não logre de início classificação; se dentro do prazo de
validade um dos classificados abdicar da posse, mantendo aberto o cargo, é imperativo a reclassificação dos candidatos, em homenagem à boa-fé e a eficiência administrativa (RMS
21.323/SP. Sexta Turma. Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura. Decisão de 01.06.10). Pressupõe-se, em dado contexto, a previsão orçamentária dos cargos e, sobretudo, a necessidade da
Administração Pública, que inicialmente anima a realização do concurso. Ausente prova da desnecessidade, tem direito a
impetrante à nomeação, porque inserida entre os classificados com a desistência de candidata antecessora.
1. Agravo (§ 1º art. 557 do CPC) em Apelação Cível em Mandado de Segurança n.
2010.069831-8/0001.00, de Criciúma
Relator: Des. Substituto Ricardo Roesler
AGRAVO (ART. 557, § 1.º, DO CPC). ADMINISTRATIVO.
CONCURSO PÚBLICO. INVESTIDURA. CANDIDATA
APROVADA FORA DAS VAGAS DO EDITAL. DESISTÊNCIA DE
CANDIDATO CLASSIFICADO. INSERÇÃO DA
IMPETRANTE/RECORRIDA ENTRE OS CLASSIFICADOS.
DIREITO SUBJETIVO À POSSE. RECURSO DESPROVIDO.
Conforme hodierna orientação do STJ, o aprovado em
concurso público tem direito subjetivo à posse, dentro do número
de vagas prescrito pelo edital. Nesse contexto, é indiferente que o
candidato não logre de início classificação; se dentro do prazo de
validade um dos classificados abdicar da posse, mantendo aberto
o cargo, é imperativo a reclassificação dos candidatos, em
homenagem à boa-fé e a eficiência administrativa (RMS
21.323/SP. Sexta Turma. Rel. Min. Maria Thereza de Assis
Moura. Decisão de 01.06.10). Pressupõe-se, em dado contexto, a
previsão orçamentária dos cargos e, sobretudo, a necessidade da
Administração Pública, que inicialmente anima a realização do
concurso. Ausente prova da desnecessidade, tem direito a
impetrante à nomeação, porque inserida entre os classificados
com a desistência de candidata antecessora.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo (§ 1º art. 557 do
CPC) em Apelação Cível em Mandado de Segurança n. 2010.069831-8/0001.00, da
comarca de Criciúma (2ª Vara da Fazenda), em que é agravante Município de
Criciúma, e agravada Elisangela Pizzoni Benedet Sarott:
ACORDAM, em Segunda Câmara de Direito Público, por votação
unânime, negar provimento ao recurso. Custas na forma da lei.
1. RELATÓRIO
Contra decisão monocrática que proveu recurso e concedeu a ordem
postulada pela impetrante, o Município de Criciúma interpôs agravo. À época daquela
decisão, relatei que:
2. "Em síntese, a impetrante logrou êxito em certame realizado no ano de 2008,
tendo se classificada em 8.º lugar ao cargo de fisioterapeuta. Afirmou que o concurso
lançado pelo edital n.º 002/08 previa oito vagas para o cargo, havendo reserva de
uma vaga a deficiente e outras duas a afro-descendentes. Ressaltou que, ao final do
concurso, apenas um afro-descendente havia se classificado, e que uma das
aprovadas não chegou a tomar posse, contexto em que lhe sobejaria a oitava e
derradeira vaga.
Aduziu que teria protocolado requerimento administrativo, para que lhe fosse
esclarecidas as razões pelas quais até então não havia sido chamada, e na ausência
do manifestação impetrou o mandado, já às vésperas do encerramento do prazo de
validade do concurso (segundo consta, o resultado fora homologado em 30.06.08, e
a impetração data de 30.04.10 - fl. 02, verso). Deduziu, também, que as vagas do
concurso estariam sendo supridas por funcionários contratados, em detrimento
daqueles aprovados no concurso.
Destacou que, uma vez aprovada, tem direito subjetivo à posse entre as vagas
prescritas pelo edital, em face do que postulou a concessão liminar de sua
nomeação e posse no cargo de fisioterapeuta, com a manutenção daquele
provimento por ocasião do julgamento de mérito.
Instado, o coator prestou informações, deduzindo a ausência de direito líquido e
certo, afirmando a ausência de contratações temporárias para suprir os cargos em
questão. Destacou, ainda, com certo grau de generalidade, a desnecessidade de
nomear-se outros aprovados além dos já convocados (a necessidade residiria na
contratação de outros profissionais; a demanda de fisioterapeutas estaria suprida).
Negou-se a liminar (fl. 86).
O Ministério Público opinou pela denegação da ordem (fl. 94-96).
Denegou-se a ordem (fls. 97-100)
Sobreveio apelo, onde a impetrante revisita as teses iniciais.
Houve contrarrazões (fls. 122-128).
Nesta instância, o Ministério Público, em parecer de fls. 148-154, opinou pelo
conhecimento e provimento do apelo. Lançou parecer, pela douta Procuradoria-Geral
de Justiça, o Exmo. Sr. Dr. Narcísio G. Rodrigues" (fls. 156-157, como no original).
Provi então o recurso, fundado sobretudo na jurisprudência do STJ, que
afirma o direito subjetivo à vaga, dentro daquelas disposta pelo edital. No caso,
conquanto a recorrida não lograsse inicialmente classificação entre as vagas abertas,
dever-se-ia autorizar sua posse em face da superveniente abertura de cargo,
decorrente da desistência de uma das aprovadas. O agravo, a seu turno, e fundado
nos termos da sentença, afirma que mesmo a desistência não assegura o direito de
posse; afirma ainda que não há campo para discutir-se a reserva de vagas destinadas
aos afrodescendentes, tendo em consideração que a matéria não foi objeto de
impugnação. Destacou, por fim, que não se fez prova de que os cargos em questão
(fisioterapeuta) estivessem sendo ocupados por contratados, em prejuízo dos
concursados.
Vieram-me conclusos.
2. VOTO
Cuida-se de agravo contra decisão proveu recurso interposto pela
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3. impetrante recorrida. Na origem, postulou-se a concessão de ordem, para determinar
que a recorrida fosse empossada em cargo público, em virtude da desistência de uma
das aprovadas - fato que, consequentemente, permitiria sua reclassificação entre as
vagas abertas.
Resolvi a demanda monocraticamente, provendo o recurso e permitindo
a posse então almejada. Da decisão fiz constar:
"Trato de recurso em mandado de segurança, contra decisão que denegou a
ordem postulada, com a qual a impetrante pretendia ver-se investida em cargo
público. A matéria não é complexa e tem, atualmente, aconchego na jurisprudência,
permitindo o julgamento monocrático, na forma do art. 557 do CPC.
Até o descortino de um passado bastante recente, a jurisprudência, de um
modo geral, considerava a aprovação em concurso mera expectativa de direito. Na
prática, em tradução bem simples, significava dizer que o chamamento e a
nomeação do aprovado ficava ao estrito alvedrio da Administração Pública, que
poderia, por exemplo, realizar um concurso de considerável magnitude, sem,
contudo, convocar um único aprovado.
A autoridade até então conferida ao Administrador permitia toda sorte de
desmandos, sobretudo a realização de concursos com o fim único de captar receita
extra; afinal, a busca por cargos públicos é, há muito, um negócio bastante rentável a
alguns setores da Administração Pública, em face da receita gerada pela procura dos
candidatos. Nesse passo, nada impedia a renovação em curto espaço de tempo do
mesmo concurso, pois não havia a obrigação, senão moral, de convocar-se os
aprovados. Desconsiderava-se, além do preparo do candidato, todo o investimento -
material e emocional - empreendido pelos interessados.
Diante desse cenário, a jurisprudência mais recente ordenou guinada de fôlego
na disciplina da matéria: conforme tem orientado o Superior Tribunal, o candidato
aprovado em concurso público tem o direito subjetivo à posse, desde que logre
aprovação dentro do número de vagas prescrito pelo edital. Cito, por oportuno:
'ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO.
FISCAL AGROPECUÁRIO FEDERAL. PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE
INTERESSE DE AGIR. REJEIÇÃO. CONTRATAÇÃO PRECÁRIA DENTRO DO
PRAZO DE VALIDADE DO CERTAME. PRETERIÇÃO. NÃO-OCORRÊNCIA.
SEGURANÇA DENEGADA.
1. O fato de ter-se encerrado o prazo de validade antes da impetração do
mandamus não enseja falta de interesse processual quando o impetrante, dentro
do prazo decadencial de 120 (cento e vinte) dias, não questiona as provas do
concurso público, mas atos diretamente relacionados à nomeação de aprovados,
ocorridos enquanto válido o certame.
2. Não é a simples contratação temporária de terceiros no prazo de validade do
certame que gera direito subjetivo do candidato aprovado à nomeação. Impõe-se
que se comprove que essas contratações ocorreram, não obstante existissem
cargos de provimento efetivo desocupados.
3. Se a Administração preencheu as vagas existentes de cargos de provimento
efetivo de acordo com a ordem classificatória do concurso público e, além disso,
contratou terceiros de forma temporária, presume-se que há excepcional interesse
público a demandar essa conduta, razão por que não se pode entender tenha
atuado de forma ilegal ou mediante abuso de poder.
4. Segurança denegada' (MS 13.823/DF. Terceira Seção. Rel. Min. Arnaldo
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4. Esteves de Lima. Decisão de 28.04.10).
Hoje, portanto, o Administrador fica de fato vinculado ao edital, inclusive no que
se refere à ocupação dos cargos: lançado o concurso e havendo aprovados em
número suficiente, o gestor vê-se obrigado ao preenchimento. O raciocínio, que tem
sido criticado por parte dos estudiosos, parte de premissa bastante elementar: se são
licitados cargos, é porque há a necessidade real de mão-de-obra na Administração
Pública.
Embora o juízo de origem não tenha se distanciado dessa premissa num
primeiro momento, valeu-se de curiosa engenharia para afastar a reserva de vaga da
impetrante: no caso, negou-se a ordem ao argumento de que incialmente a
recorrente apenas obtivera aprovação, sem se classificar entre as vagas abertas, e
por tal razão não poderia invocar eventual direito à nomeação.
De fato a apelante não figurou inicialmente entre os classificados. Conforme foi
relatado na inicial, havia oito vagas ao cargo de fisioterapeuta, e a recorrente logrou
a oitava posição. Sucede que havia candidato preferencial - aprovado com reserva
de cargo por disputar vaga destinada a afro-descendentes - o que automaticamente
excluiria a apelante da disputa.
Adiante, todavia, uma das aprovadas (Vanessa de Souza Dario) abdicou de
sua vaga. Classificada em segundo lugar, foi nomeada (fl. 73), mas não chegou a
investir-se do cargo. Com a vaga em aberto (pois sequer chegou a ser preenchida),
alterou-se a ordem classificatória, e a recorrente, em princípio fora da disputa,
retoma o certame, para ocupar a última vaga.
Aos olhos do sentenciante, todavia, a vaga que seria então ocupada pela
candidata Vanessa não poderia ser sucedida por um dos concorrentes. Aliás, foi dito
textualmente na decisão que 'se por um lado é certo que o candidato aprovado
dentro do número de vagas previsto no Edital tem o direito subjetivo à nomeação
para o cargo que concorreu, in casu, o fato de a 2ª colocada (Vanessa de Oliveira
Dario) ter sido nomeada e empossada para exercer o cargo de fisioterapeuta no
Município de Criciúma, mas, posteriormente, não ter entrado em exercício (fl. 73) –
conforme o próprio impetrado informou – não transfere para a impetrante o direito
subjetivo, líquido e certo, à nomeação' (fl. 99, como no original).
Com o devido perdão, não vislumbro que lógica orienta essa afirmação. Afinal,
a tônica das decisões que contemplam o candidato aprovado considera a efetiva
necessidade de contratação do Poder Público - e não o particular interesse do
candidato. É indiferente que se cuide de João ou José; a vaga haverá de ser
preenchida, desde que haja, para além dos aprovados, candidatos classificados.
Afinal, se todos os aprovados desistissem, deixaria a Administração Pública de ter
interesse no preenchimento dos cargos, pelo só-fato de que os melhores
classificados abdicassem da oportunidade-
Em tal hipótese, não tenho dúvidas, há que se primar pelo interesse público,
que em linha de princípio vem representado pelo dever de eficiência e da boa-fé
administrativa. É o que tem repetido sincronicamente a jurisprudência do STJ:
'RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. INTERESSE
PROCESSUAL. EXISTÊNCIA. CONCURSO PÚBLICO. APROVAÇÃO DENTRO
DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTO NO EDITAL, CONSIDERADAS AS
DESISTÊNCIAS. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. PRECEDENTES.
1. De acordo com entendimento consolidado deste Superior Tribunal de
Justiça, mesmo após expirado o prazo de validade do concurso público, há
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5. interesse processual do candidato na impetração de mandado de segurança
contra ato omissivo consubstanciado na ausência de sua nomeação.
2. Tendo em vista os princípios da lealdade, da boa-fé administrativa e da
segurança jurídica, bem como o fato de que a criação de cargos depende de
prévia dotação orçamentária, o candidato aprovado dentro do número de
vagas previsto no edital do certame, consideradas as desistências dos
candidatos melhor classificados, não tem mera expectativa de direito, mas
verdadeiro direito subjetivo à nomeação. Precedentes.
3. Recurso ordinário provido' (RMS 21.323/SP. Sexta Turma. Rel. Min. Maria
Thereza de Assis Moura. Decisão de 01.06.10 - grifei).
No mais, lembro que se chegou a cogitar de que tais cargos já não eram mais
necessários, ou, dito de outro modo, que não haveria necessidade de efetivar-se a
contratação. Mas aqui valeu-se argumentação genérica, sem demonstração objetiva,
e por isso mesmo sem brilho ou ressonância; apenas se disse que determinada
associação passara a administrar em 2008 o hospital materno infantil Santa Catarina
(curiosamente o mesmo ano em que lançou-se o edital do concurso em questão).
Considerando que os cargos somente são instituídos mediante dotação
orçamentária - na prática, portanto, o edital não gera por si mesmo impacto
inesperado - haverá de se apontar justificativa bastante para abdicar-se da
convocação. Afinal, "a recusa da Administração Pública em prover cargos vagos
quando existentes candidatos aprovados em concurso público deve ser motivada, e
esta motivação é suscetível de apreciação pelo Poder Judiciário" (RE 227.480/RJ.
Primeira Turma. Rel. p/ AC Min. Cármen Lúcia. Decisão de 16.09.08 ).
Observo, ademais, que o Município afirma ter apenas três profissionais então
contratados - um deles, inclusive, admitido em 1987 pelo regime celetista - pelo que
bem se justifica a demanda inicial proposta pelo edital n.º 002/08, carecendo de
objetividade a alegada desnecessidade.
Desfilando a justificativa como mera figuração, sem qualquer demonstração
palmar, mantém-se a obrigatoriedade de contratação da recorrente, tal qual
postulado.
Isso posto, dou provimento ao recurso, com fundamento no art. 557, § 1.º-A, do
CPC" (fls. 157-161, como no original)
Não vejo, obviamente, razão para mudar tal orientação; afinal, a decisão
que tomei tem por norte o que se tem decidido recentemente, e de modo ordinário, no
STJ: o direito subjetivo do aprovado, a partir da vacância de cargo lançado no
concurso em que julgou aprovação.
No mais, os temas periféricos, a exemplo da reserva de vagas aos
afrodescendentes, de fato não servem à solução do litígio - e bem por isso não são
pinçados como fundamento - e bem por isso sua invocação, nesse momento, é
impertinente. O mesmo se diga sobre a ausência de prova de contratações paralelas
para preencher as vagas do edital. O fato é indiferente à causa de pedir primeira da
ação mandamental (que trata particularmente da reinserção da impetrante recorrida
entre os classificados).
Por fim, assevero uma vez mais, o contexto em que se articulam os
fatos revelam, por si só, a necessidade de implementação das vagas - quer porque
há muito prevista no edital, quer porque não se fez prova da desnecessidade de
tais contratações.
Gabinete Des. Ricardo Roesler
6. São por estas razões que voto pelo desprovimento do agravo, mantendo
firme os termos da decisão monocrática.
3. DECISÃO
Ante o exposto, a Câmara decidiu, por votação unânime, negar
provimento ao recurso.
O julgamento, realizado no dia 15 de março de 2011, foi presidido pelo
Exmo. Sr. Desembargador Newton Janke, com voto, e dele participou o Exmo. Sr.
Desembargador Cid Goulart.
Florianópolis, 15 de março de 2011.
Ricardo Roesler
RELATOR
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