4. A Arqueologia do Saber (Foucault)
“Chamada de fase arqueológica, os primeiros trabalhos de Michel
Foucault (1926-1984) se pautaram por uma pesquisa histórica que
percorresse de alguma maneira o nascimento de determinadas “ciências”
modernas. A arqueologia do saber, livro de 1969, explica a
metodologia empregada em suas pesquisas.
A arqueologia encontra o ponto de equilíbrio de sua análise no saber –
em um domínio em que o sujeito é necessariamente situado e
dependente, sem que jamais possa ser considerado titular (p. 205).
Distinguindo os domínios científicos dos territórios arqueológicos, vemos
que os últimos podem atravessar textos ‘literários’ ou ‘filosóficos’, bem
como científicos. O saber não está contido somente em demonstrações,
mas pode estar em ficções, reflexões, narrativas, regulamentos
institucionais, decisões políticas. Por exemplo, ‘o território arqueológico
da gramática geral compreende tanto os devaneios de Fabre d’Olivet
(que jamais receberam status científico e se inscreveram antes no
pensamento místico) quanto à análise das proposições atribuitivas (que
era então aceita à luz da evidência e na qual a gramática gerativa pode
reconhecer, hoje, sua verdade prefigurada)’ (p. 206)”.
Fonte
5. Embora a arqueologia da mídia não possua
métodos definidos de pesquisa, é justamente
a sua indefinição que permite flexibilidade e
abrangência (FELINTO, 2011, p. 5).
O que importa, na arqueologia da mídia, é
compreender melhor a composição histórica dos
fenômenos, em especial nos estudos em
cibercultura.
A arqueologia da mídia surge como uma forma de
revisitar as culturas de mídia em uma
perspectiva histórica.
6. Triangularizando história, tempo e arquivo, o
passado pode ser redescoberto e certas
tecnologias, consideradas obsoletas e
descontinuadas, podem ser retomadas e
aprimoradas.
A arqueologia da mídia não olha apenas para
âmbito micro, mas para o contexto macro
(contexto científico, histórico, social e cultural) de
uma época.
8. Siegfried Zielinski
“A arqueologia da mídia, de acordo com minha
compreensão, significa ao menos duas coisas:
não aceitamos a ideia de que a mídia tenha sido
inventada no século XIX com o advento da
fotografia, telefonia e cinematografia, ou seja,
que a mídia seja resultado da industrialização.
Os meios de comunicação têm uma história
muito mais longa, que remonta às chamadas altas
culturas dos períodos bizantino, chinês, indiano,
sul-americano ou helenístico. Para investigar isso,
adaptei o termo “tempo profundo” da paleontologia.
Além disso, se usamos a variedade/diversidade como
o critério decisivo para o que chamamos de progresso
na civilização humana, períodos anteriores poderiam
ter sido mais progressistas do que nossas culturas
atuais. Estas últimas são altamente estandardizadas,
seguem padrões e gramáticas, protocolos e regras
cujo efeito é mundial” (ZIELINSKI, 2001, p. 8).
9. Fabrício Lopes da Silveira
“É uma vertente de trabalho, um nicho de estudos,
digamos assim, no campo da comunicação, que vem
procurando discutir a técnica por um viés histórico,
da história da cultura. Não dá para dizer ainda que
seja uma teoria acabada, já bem construída.
Creio que seja um tipo de abordagem nova para a
questão da técnica, que tenta pensar um
desenvolvimento tecnológico que não aconteceu. A
arqueologia da mídia indaga: onde poderíamos
estar hoje caso os desdobramentos da mídia e
suas linguagens tivessem adotado outro rumo?”
(SILVEIRA, 2011, p. 17).
10. Francisco Rüdiger
“Método de estudo da história, em que as
técnicas de comunicação são iluminadas pela
cultura e o imaginário social de cada época, em
que se pesquisam as conexões, mas também as
rupturas, as continuidades e esquecimentos do
processo em que os fenômenos de comunicação, seus
meios sobretudo, se vão formando e entrelaçando
com outros processos e estruturas coletivas”
(RÜDIGER, 2011, p. 12).
11. Erkki Huhtamo
“É uma forma de estudar fenômenos cíclicos que (re)
aparecem, desaparecem e reaparecem uma e outra
vez na história da mídia e, de alguma forma, parecem
transcender contextos históricos específicos. De certa
forma, o objetivo da arqueologia da mídia é
explicar a sensação de déjà vu (...) sobre as
maneiras em que as pessoas têm
experimentado a tecnologia em períodos
anteriores” (HUHTAMO, 1997, online).
12. Jussi Parikka
“Para mim, a arqueologia da mídia é exatamente
uma metodologia que presta atenção na
especificidade de mídia (...) Atua, pelo menos,
de duas formas (...) como uma forma de
investigar passados de mídia - a fim de
compreender a ontologia do presente – e como
métodos arqueológicos de investigar como as
tecnologias condicionam nossas formas de ver e
pensar, de agir e lembrar[1]”.
[1] Fragmento extraído de entrevista de Parikka a Soderman e
Starosielski. Disponível em http://goo.gl/9sDmrK
13. Wolfgang Ernst
“A questão crucial para a arqueologia da mídia
reside em saber se, nesta interação entre
tecnologia e cultura, o novo tipo de imaginação
histórica que emergiu foi um efeito de novos
meios de comunicação, ou se tais meios foram
inventados pela demanda da condição
epistemológica da época” (ERNST, 2013, p. 42).
14. Erick Felinto
“A arqueologia da mídia é algo bastante novo
(ainda que o termo em si já possua alguma
história), e apenas agora começa a
popularizar-se e conquistar um estatuto mais
definido. Ela dialoga com certos aspectos
importantes de abordagens características da
teoria pós-moderna, como o materialismo
cultural, as teorias de gênero, a análise do
discurso, os estudos pós-coloniais, noções de
temporalidade não linear etc. O que ela faz
essencialmente é vasculhar os arquivos
textuais, visuais e auditivos das mídias (de
todas as mídias, analógicas ou digitais),
enfatizando as manifestações discursivas e
materiais da cultura” (FELINTO, 2011, p. 5).
15. “ O que é remixado hoje não é apenas o
conteúdo de diferentes mídias mas
também suas técnicas fundamentais,
métodos de trabalho e formas de
representação e expressão. Unidas
através de um meio-ambiente comum
do software (common software
enviroment) a cinematografia,
animação, animação computacional,
efeitos especiais, design gráfico e
tipografia vieram a criar um novo
metameio. Podemos pensar nesse novo
metameio como uma vasta biblioteca de
técnicas conhecidas de mídias
anteriores” (MANOVICH).
Remixabilidade
16. "Processo que atravessaria todas as mídias, a partir de uma
apropriação de técnicas, formas e significado social umas
das outras e com isso repropondo-se, remodelando-se (do
inglês refashion) na busca por construir novas formas de
representação” (BOLTER; GRUSIN, 1999).
Remediação é um processo que ocorre quando um meio passa a incorporar ou
imitar elementos de outros meios, a fim de melhorar seu próprio meio, criando
assim um dinamismo entre diferentes instrumentos de comunicação.
“As telenovelas, com o passar do tempo, se modificaram e passaram a remediar
as mídias digitais e o cinema. A novela mudou sua linguagem e a sua dinâmica,
pois eram feitas com histórias fictícias e agora se aproximam cada vez mais do
real, se apropriando da linguagem das mídias digitais e do cinema, atingindo
também esses meios que foram remediados. A novela virou um meio de maior
velocidade, de mais informações e mais real, onde sua narrativa mudou e
incorporou características do cinema e das mídias digitais, desenvolvendo assim
uma linguagem própria, incorporando elementos de outros meios de
comunicação”.
Remediação
19. * Viktor Mayer-Schonberger provoca acerca da memória digital:
nossa sociedade perdeu a capacidade de esquecer, graças a
memória digital;
* Nós disponibilizamos dados: BIG DATA - vigilância X privacidade;
21. As datas de vencimento das informações
As datas de vencimento ou expiração das
informações seriam praticadas com a
possibilidade do usuário ajustá-las mesmo
no salvamento de um arquivo para que a
máquina faça o trabalho de exclusão dos
dados automaticamente conforme prazo
escolhido.
METADADOS
22. Se desconsiderarmos o uso metafórico
da palavra arquivo para todas as
formas possíveis da memória e da
memória cultural e usá-lo para
especificar uma tecnologia de memória,
a Internet não é um arquivo.
No entanto, a Internet constitui um
novo tipo de “transarquivo’”, já
presente na concepção de Ted Nelson
de hipertexto e hipermídia: um arquivo
dinâmico e a essência do que é
atualização permanente.
A internet é um arquivo?
23. Arquivo na internet é sempre temporário;
Reescrito permanente. Ex.: Wikipédia;
Datas de validade (ref. ao livro DELETE);
Internet = coleção ou montagem;
“The archive becomes a memory only at the moment of its
standardization.
The codes involved can be stored according to the rules of the
archive. But the things actually realized on this basis can be only
documented, not archived”.
25. Internet Archive é uma organização sem fins lucrativos dedicada a manter um arquivo de
recursos multimídia. Ela foi fundada por Brewster Kahle em 1996 e se localiza em São
Francisco, Califórnia. Tal arquivo inclui "retratos" da Web: cópias arquivadas de páginas da
World Wide Web, com múltiplas cópias (tomadas em instantes diferentes) de cada página,
mostrando assim a evolução da Web. O arquivo inclui também software, filmes, livros, e
gravações de áudio (inclusive gravações de shows/concertos ao vivo de bandas que o
permitem). O acervo pretende manter uma cópia digital desses materiais para consulta histórica
Devido ao seu objetivo de preservar o conhecimento humano e disponibilizá-lo a todos, o
Internet Archive já foi comparado à Biblioteca de Alexandria.
Wikipédia
Arqueologia da internet?
26. “In the age of digitalizability, that is, when we have the
option of storing all kind of information, a paradoxical
phenomenon appears: cyberspace has no memory.
Cyberspace is not even a space but rather a topological
configuration”.
Em um arquivo, ex.: museu, nem tudo se
arquiva. Como selecionar o que deve(ria)
ser arquivado na internet? Quem faria
isso? O que fazer com o “lixo’’
27. Não exigem infra-estrutura técnica abrangente;
não requer longas batalhas judiciais; são
modestas na combinação de direitos que
regulam o comportamento humano (tais como
direito e software); é politicamente mais
palatável que a abordagem abrangente de
regulamentação.
Alguns usuários podem não gostar da ideia;
podem impedir o trabalho, por exemplo, de
bibliotecas e arquivos; tensões entre o desejo
das pessoas de esquecer e o da sociedade de
lembrar (vice-versa); não é uma saída que
atinge a perfeição; não há imunidade sobre o
poder da informação (resolve o “tempo”, mas
não o “poder”); só serão aceitas se não forem
vistas como incômodos; inacessibilidade após
prazo de expiração.
O autor defende que as datas de vencimento são o primeiro passo para um mundo mais
esquecido e que deveríamos teorizar e experimentar este sistema, mesmo com as suas
fraquezas.
Vantagens X desvantagens
29. ● Como digitalizar arte não digital?
● Sobre a arte digital:
“The digitization of mono–media art forms (analog video, for
instance,
or classical electronic music or tape) for archival purposes is one
thing.
Born-digital media art is another”.
How does dynamic art archive itself?
30. A Europeana é uma biblioteca virtual desenvolvida pelos países da União Europeia. O protótipo
contém em volta de dois milhões de itens digitais, todos eles em domínio público. Mais de 50%
do conteúdo inicial foi fornecido pela França, 10% do Reino Unido, 1.4% da Espanha, e 1% da
Alemanha.
A plataforma da Europeana permite pesquisas por nome (atores, arquitetos, artistas,
coreógrafos, compositores, maestros, bailarinos, cineastas, músicos, fotógrafos), por tipo de
documento (títulos de livros, poemas, jornais, pinturas, fotografias, filmes ou programa de
televisão), por localização dos registros (nomes de cidades ou países da Europa ou de outras
partes do mundo), por datas e por frases. As pesquisas podem ser refinadas por tipo de mídia,
língua, data, documentos com direitos autorais e por origem dos documentos. Cada documento
é identificado por um ícone que representa imagem, texto, som e 3D. Uma ferramenta
disponível é denominada Minha Europeana, um espaço para conservar as pesquisas pessoais
para uso posterior e para marcar registros favoritos.
Wikipédia
Europeana
31. O original é real, digitalização é apenas uma “imagem’’;
Alteração do objeto original;
Materialidade/imaterialidade;
Mesmo valor?
Nam June Paik. Watchdog II, 1997.
33. Qual a necessidade de arquivar?
O que é relevante para arquivar?
Obsolência da obra?
Em qual formato?
Hardware X software;
Facilmente deletável;
Artemídia, por sua natureza, é transitória e não arquivável.
TESE:
O efêmero tecnológico e a ausência da arte computacional nos acervos brasileiros.
BOONE, Silvana (2013).
Arquivando arte digital
34. “Although the traditional function of the archive is to document an
event that took place at one time and in one place, the emphasis in
the digital archive shifts to regeneration, (co-)produced by online
users for their own needs”.
Arqueologia da mídia;
Memória está em permanente transição;
Memória permanente X memória dinâmica;
Arquivos digitais = feedback instantâneo. Ex.: streaming;
Arquivos self-learning, adaptativos, metadating, flexíveis, Net-base
information, transformação permanente e updating.
35. Numa sociedade em que a informação
e o consumo são tão rápidos, qual é o
significado desse tipo de arqueologia?
Qual é a relevância dessa arqueologia
para a comunicação, especificamente?
Provocações
36. Bibliografia
FOUCAULT, Michel. A arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1987.
http://jussiparikka.net/2012/05/08/what-is-media-archaeology-out-now/
http://monoskop.org/Media_archaeology
ERNST, Wolfgang. Digital memory and the archieve. Minneapolis: University of Minnessta Press, 2013.
FELINTO, E. Um futuro complexo, híbrido, incerto e heterogêneo. Revista do Instituto Humanitas Unisinos. UNISINOS.
Número 375, Outubro 2011.
HUHTAMO, Erkki. From Kaleidoscomaniac to Cybernerd: notes toward na archaeology of the media. Leonardo, v. 30,
3/1997. Disponível em
<http://goo.gl/KjtQqz> Acesso em: 1 abr. 2015.
RÜDIGER, F. O passado pode nos ensinar a seu próprio respeito. Revista do Instituto Humanitas Unisinos. UNISINOS.
Número 375, Outubro 2011.
SILVEIRA, F. L. Arqueologia da mídia: preocupação com os estudos da técnica. Revista do Instituto Humanitas
Unisinos. UNISINOS. Número 375, Outubro 2011.
ZIELINSKI, S. Ser offline e existir online. Revista do Instituto Humanitas Unisinos. UNISINOS. Número 375, Outubro
2011.