O documento discute a estratégia de implantação do carro elétrico no Brasil. Apresenta como prioritária a adoção do carro elétrico devido aos benefícios ambientais e de eficiência energética. Discorre sobre a necessidade de uma estratégia que envolva incentivos fiscais, apoio ao desenvolvimento tecnológico e adaptação da infraestrutura energética. Aponta desafios como o aprimoramento das baterias e a construção de uma rede de recarga.
O BRASIL DO FUTURO – CARRO ELÉTRICO - III - Projeto de Lei de Incentivos Fiscais
Estratégia para implantação do carro elétrico no Brasil
1.
2.
3. Cadernos Fórum Nacional 10
ESTRATÉGIA DE IMPLANTAÇÃO
DO CARRO ELÉTRICO NO BRASIL
Coordenador
João Paulo dos Reis Velloso
Colaboradores
Sergio Rezende, Ronaldo Mota e Adriano Duarte
Luciano Galvão Coutinho, Bernardo Hauch Ribeiro de
Castro e Tiago Toledo Ferreira
José Antonio Muniz Lopes ● Nelson Barbosa
Dyogo Oliveira e Jose Antonio P. Souza
Jackson Schneider ● Pietro Erber ● Denise Menchen
Fabiano Mezadre Pompermayer
Carlos Ghosn ● Shai Agassi ● Roberto M. Torresi
Nerilso Bocchi, Romeu C. Rocha-Filho e Sonia R.
Biaggio ● Ana Maria Rocco
Instituto Nacional de Altos Estudos, INAE
Rio de Janeiro, 2010
5. Sumário
Introdução: estratégia de implantação
do carro elétrico no Brasil
João Paulo dos Reis Velloso
Os veículos elétricos e as ações do
Ministério da Ciência e Tecnologia
Sergio Rezende, Ronaldo Mota e Adriano Duarte
Veículo elétrico, políticas públicas e o BNDES:
oportunidades e desafios
Luciano Galvão Coutinho, Bernardo Hauch Ribeiro de Castro
e Tiago Toledo Ferreira
Mobilidade elétrica no Brasil, uma opção de futuro
José Antonio Muniz Lopes
Carro elétrico: desafio e oportunidade para o Brasil
Nelson Barbosa, Dyogo Oliveira e Jose Antonio P. Souza
As duas estruturas de incentivo
Nelson Barbosa, Dyogo Oliveira e Jose Antonio P. Souza
Carro elétrico: em busca da viabilidade
Jackson Schneider
Automóveis elétricos a bateria:
uma política para sua utilização no Brasil
Pietro Erber
Carta de Campinas
Documento final do 6º. Seminário de Veículos Elétricos,
organizado pela Associação Brasileira do Veículo Elétrico, ABVE
e o Instituto Nacional de Eficiência Energética, INEE
Governo culpa carro e moto por poluição
Denise Menchen (reportagem na “Folha de São Paulo”)
6. 1º. Inventário nacional de emissões atmosféricas
por veículos automotores rodoviários
(excerto do Sumário Executivo)
Ministério do Meio Ambiente
Etanol: veículos elétricos: via de mão única dupla?
Fabiano Mezadre Pompermayer (Ipea)
O carro elétrico é presente, não futuro
Entrevista de “Época” com Carlos Ghosn, presidente
mundial da Renault-Nissan
Ferrari verde e Citröen elétrico na onda ecológica de Genebra
Reportagem de “O Globo”
Renault-Nissan e Prefeitura fazem acordo para uso de elétricos
em São Paulo
Divulgação da “UOL Carros”
Switched-on highways: electric cars are cheaper and faster than
any hybrid on the market
Shai Agassi
(entrevista a Fareed Zakaria, Tim Wagner–Zuma Press)
Projeto de carro elétrico à base de baterias de íon-lítio
Roberto M. Torresi
Veículos elétricos: perspectivas de uso de baterias de íon-lítio
Nerilso Bocchi, Romeu C. Rocha-Filho e Sonia R. Biaggio
Carros elétricos e as baterias de íon-lítio: estado atual de
desenvolvimento e perspectivas tecnológicas
Ana Maria Rocco
6
7. Introdução: Estratégia de Implantação do
Carro Elétrico no Brasil
João Paulo dos Reis Velloso*
É chegado o momento de o Brasil acordar para o fato
de que está atrasado na corrida para o Carro Elétrico, quando
deveria estar na vanguarda – como fez em relação ao Carro a
Etanol.
ALTA PRIORIDADE DA IMPLANTAÇÃO DO CARRO
ELÉTRICO NO PAÍS
Em primeiro lugar, consideremos o que mostra estudo
recente do Ministério do Meio Ambiente: o carro e a motocicleta
são os grandes responsáveis pela poluição nas cidades
brasileiras. “A frota de carros e motocicletas emite 40 vezes
mais CO (Monóxido de Carbono) do que a frota de ônibus
urbano”.
Tomando os números: “Em 2009, as emissões de CO
por parte de carros e motos corresponderam a 83% do total
desse gás... Os ônibus responderam por 2%”. “E o número de
usuários foi equivalente.”
Segundo, em termos de eficiência energética, o Carro
Elétrico está à frente, “no tráfego urbano, em especial quando
em baixas velocidades e constantes acelerações e frenagens”.
Ao lado disso, os Carros Elétricos são também
vantajosos em termos de poluição sonora, pois os motores
*
Coordenador-geral do Fórum Nacional, Presidente do
Ibmec-Mercado de Capitais e professor da EPGE (FGV). Ex-ministro
do Planejamento.
8. elétricos são silenciosos, diferentemente dos motores a
combustão.
Vantagem financeira: “O custo do quilômetro rodado é
mais baixo e o custo de manutenção igualmente”.
Em terceiro lugar, devido a esse conjunto de razões,
existe um Ciclo de Transformação na Indústria Automobilística
Mundial, impulsionado pelo Carro Elétrico. Se, nesse cenário
de “Inovação Radical”, o Brasil ficar de fora, poderá ter grandes
perdas, em termos de produção e exportações de carros,
assim como de autopeças (setor importante para o País).
Note-se que o mercado mundial se volta para o Carro
Elétrico tendo uma Matriz de Energia desfavorável. Já a Matriz
do Brasil é favorável, principalmente considerando o nosso
enorme potencial hidroelétrico.
Importante assinalar: o que se visualiza é um cenário
em que, num certo período, as três Tecnologias coexistam.
Mas há uma tendência a um grande impulso na área do Carro
Elétrico.
Que se estabeleça, digamos, a meta de ter algo como
10% de produção (não de estoque) de Carro Elétrico em cerca
de cinco anos. É como se a montadora passasse a ter mais um
modelo de automóvel.
Para isso, necessidade de uma “ESTRATÉGIA DE
IMPLANTAÇÃO DE CARRO ELÉTRICO NO BRASIL”, fazendo
o sistema de incentivos convergir para o engajamento das
montadoras e o interesse de compradores.
LINHAS MESTRAS DA ESTRATÉGIA E PAPEL DAS
DIFERENTES ENTIDADES
8
9. A primeira linha mestra deve referir-se aos Incentivos
Fiscais. E, nisso, o papel do Ministério da Fazenda é crucial: de
um lado, definir a alíquota de IPI específica para veículos
elétricos e seus componentes. O caso do Imposto de
Importação é, também, relevante, assim como o PIS-COFINS.
A segunda linha mestra refere-se aos incentivos ao
Desenvolvimento Tecnológico, dentro da orientação de
Creative Catching-Up, no caso das empresas estrangeiras. Ou
seja, Importação de Tecnologia, com criatividade.
Isso permitirá tornar o Brasil plataforma de
desenvolvimento de produtos para a América Latina, África e,
em geral, países emergentes.
Nessa área, deve-se destacar o papel do Ministério da
Ciência e Tecnologia (MCT), com seus dois principais órgãos:
FINEP e CNPq. Os instrumentos, claro, deverão ser o
SIBRATEC (Sistema Brasileiro de Tecnologia), com ênfase,
agora, na Inovação aplicada ao Carro Elétrico e a seus
componentes; e a Subvenção Econômica, com o mesmo
objetivo.
O BNDES, como “principal provedor de crédito de longo
prazo” e agente relevante do Mercado de Capitais, tem papel
essencial a desempenhar na ESTRATÉGIA DE
IMPLANTAÇÃO DO CARRO ELÉTRICO.
Além disso, a abrangência do tema requer a adoção de
políticas transversais, com o envolvimento de diversos agentes
na construção deste projeto. Nesse sentido, cabe ao BNDES
ser um dos principais articuladores de um projeto estruturante,
que viabilize a produção de veículos elétricos no Brasil.
Papéis essenciais devem, também, desempenhar a
ELETROBRAS, a PETROBRAS (estrutura de recarga) e as
Distribuidoras de Energia. É a “Opção de Futuro” a que se
9
10. refere o Presidente da ELETROBRAS, em seu artigo, neste
livro.
Nesse campo (estímulo ao Desenvolvimento
Tecnológico), cabe referência à comparação entre duas
estruturas propostas para o incentivo ao Carro Elétrico: o
SIBRATEC (e outros mecanismos), na área do MCT, e o
Centro de Inovação em Veículos Elétricos, proposto pela área
da Secretaria de Política Econômica do MF.
A conclusão é: “As duas propostas não são conflitantes
nem superpostas, são complementares. Vejamos. Esse Centro,
se criado, será um cliente para os programas de formação de
pessoal, um membro das Redes Tecnológicas, e um parceiro
das Empresas nos projetos contemplados no programa de
Subvenção Econômica”.
A terceira linha mestra implica “dar continuidade ao
processo de restrição de emissões, gerando, assim, incentivo
para novos padrões tecnológicos. Em particular, faz-se
necessária uma nova geração de padrões que leve em
consideração não apenas a emissão durante o uso do veículo,
mas também ao logo de toda a cadeia produtiva do
combustível e do veículo”.
DESAFIOS A SUPERAR
O grande desafio tecnológico a superar é a bateria, que
hoje – e durante bastante tempo – é à base de íons de lítio. A
bateria determina a autonomia do veículo, o preço e o tempo
de recarga.
A questão é saber se esses problemas se resolvem
com a produção em larga escala. E se é possível, em prazo
razoável, ter maior disponibilidade de lítio, hoje um material
escasso.
10
11. Ainda um problema: hoje não se produzem baterias de
íon de lítio no Brasil, cuja fabricação é dominada por empresas
asiáticas. E desvincular o início de produção do Carro Elétrico
da fabricação de baterias adequadas no País não parece
indicado.
Daí a necessidade de esforço especial no sentido de
contornar a dificuldade de reduzir o hiato ao menor prazo
possível.
Dois outros elementos críticos são o Sistema de
Controle Eletrônico e os Motores Elétricos. Entretanto, nesses
casos, o problema parece ser de fácil superação.
Destacar, igualmente, o desafio da construção da
Infraestrutura de Recarga (a geração de Energia não parece
constituir obstáculo).
Estamos falando, essencialmente, de um sistema de
Eletropostos, o que pode acontecer até conjugado ao já
existente sistema de postos de gasolina (a PETROBRAS já
tem Eletropostos).
É importante também que o país promova “a adequação
do seu planejamento energético à previsão do uso crescente
de veículos elétricos para os próximos dez anos”. Tal
adequação significa não apenas o aumento da geração de
Energia Elétrica (essencialmente, Hidroelétrica), mas também
“pesquisas sobre administração de redes e fornecimento de
fontes de carregamento em voltagem adequada às
necessidades do sistema de transporte.”
CONCLUSÕES: DOIS TIPOS DE COMPLEMENTAÇÃO
O primeiro tipo de complementação é com o sistema
econômico relativo ao Carro de Etanol. Isso poderia ser feito
através do uso do etanol no transporte de cargas (caminhões)
11
12. e nos ônibus. E até mesmo em automóveis de grande porte
(grandes sedans, vans). Tudo isso, possivelmente, em veículos
híbridos.
A outra complementação é com o transporte público,
que deve ser realizado, essencialmente, através de metrô, trem
e VLT (veículo leve sobre trilho). Com isso se evitariam
declarações como a do (então) Ministro Minc: o resultado do
estudo sobre emissões em transporte (já mencionado) “revela
a falência do modelo de transporte público no Brasil”.
O Brasil está diante de uma nova e importante
oportunidade, que justifica a nossa mobilização para
desenvolvê-la.
Nas palavras do Presidente da ANFAVEA: “...O fato é
que o Brasil, por suas autoridades governamentais, entidades
de ensino e pesquisa, Indústria Automotiva, deve acompanhar
a tendência mundial em torno desses veículos (elétricos)...”
E mais: no Brasil, governo, ciência e iniciativa privada
haverão de construir soluções para o Veículo Elétrico brasileiro,
com o mesmo empenho que demonstramos no Pro-álcool e no
veículo flex, como também no recém iniciado programa do
BIODIESEL.
12
13. OS VEÍCULOS ELÉTRICOS E AS AÇÕES DO
MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA
Sergio Rezende*, Ronaldo Mota** e Adriano Duarte***
INTRODUÇÃO
O expressivo desenvolvimento da indústria
automobilística no século passado veio acompanhado de
preocupações crescentes com a poluição gerada pelos
veículos que utilizam motores a combustão. Ao longo das
últimas décadas, liderados pelos países desenvolvidos, foram
estabelecidos limites cada vez mais restritivos para as
emissões veiculares como um todo, levando à necessidade de
importantes desenvolvimentos tecnológicos nos motores e
veículos. Já nos últimos anos, com a ocorrência das
preocupações com o aquecimento global causado pelas
emissões de gases efeito estufa, a demanda por redução das
emissões veiculares aumentou, estimulando ainda mais a
investigação de tecnologias inovadoras para a propulsão
veicular.
Em termos globais, os biocombustíveis, área onde o
Brasil é pioneiro com a utilização do etanol em larga escala,
apresentaram-se como uma resposta parcial ao problema. Os
programas de desenvolvimento da tecnologia do hidrogênio e
célula a combustível para geração de energia e propulsão de
veículos são exemplos.
Recentemente os veículos ecológicos têm ocupado
posições de destaque nos salões do automóvel de Nova York,
Genebra e Detroit, incluindo modelos acionados apenas por
baterias, híbridos que combinam gasolina, diesel e eletricidade,
veículos “flex”, que utilizam biocombustíveis e carros
*
Ministro da Ciência e Tecnologia, MCT.
**
Secretário de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação do
MCT
***
Coordenador geral de Tecnologias Setoriais do MCT
14. convencionais pequenos mais econômicos. Na feira de Xangai,
este ano, serão demonstrados cerca de 100 veículos a
hidrogênio e o maior posto de abastecimento desse
combustível1 do mundo. Grande atenção vem sendo
despertada pelos veículos elétricos, entendidos como os que
possuem pelo menos um motor elétrico envolvido com a sua
tração.
Os veículos elétricos têm como vantagens a eficiência
do motor elétrico e as emissões de poluentes e gases de efeito
estufa desprezíveis no local de uso. Sua adoção em larga
escala contribuiria, por exemplo, para a redução das emissões
nas grandes metrópoles2. Eles também têm operação
silenciosa, alto torque em velocidade baixa, tecnologia bem
conhecida e mais simples e eficiente que a do motor a
explosão. As desvantagens estão relacionadas ao custo
desses veículos, da ordem de duas vezes o dos veículos atuais
equivalentes e às baterias que armazenam a energia para a
sua tração, envolvendo o seu peso, volume e custo, o tempo
de recarga e o tempo de vida (New York Times, 2009). Isso
sem falar nas questões ambientais – a maioria das baterias
contém ácidos e metais-pesados o que torna imperativo o
desenvolvimento das tecnologias para a indústria da
reciclagem.
O CARRO ELÉTRICO E O CONTEXTO GEOPOLÍTICO DOS
COMBUSTÍVEIS FÓSSEIS
O setor de transporte é responsável pela alta demanda
de combustíveis líquidos no mundo em sua maioria derivados
de petróleo. Segundo o “World Energy Outlook 2009”, estudo
publicado pela Agencia Internacional de Energia - AIE, que
aborda as perspectivas energéticas mundiais até 2030, a
demanda por mobilidade e serviços relacionados à eletricidade
1
Na realidade o hidrogênio pode ser mais apropriadamente
entendido como uma fonte energética.
2
Entretanto ainda não estão disponíveis avaliações do ciclo
de vida para identificação de suas reais emissões.
14
15. vai continuar a crescer de forma ampla em linha com o PIB dos
países, mas espera-se uma taxa de crescimento menor que no
passado, devido às políticas e subsídios aos ganhos em
eficiência energética.
O estudo apresenta dois cenários para 2030: o Cenário
de Referência, que representa a evolução do quadro
energético mundial seguindo as práticas atuais, no qual a
concentração de gases de efeito estufa alcançaria mais de
1000 ppm de CO2 equivalente; e o Cenário 450, que estima
como esse quadro deveria evoluir para que a concentração de
CO2 fique limitada a 450 ppm.
No Cenário de Referência a demanda de energia
primária aumentaria à taxa de 1,5% ao ano, de 2007 a 2030,
envolvendo investimentos de US$ 26 trilhões nesse período. Já
no Cenário 450 a taxa média de crescimento da demanda seria
reduzida para 0,8% ao ano, sendo que os investimentos
necessários alcançariam US$ 36,5 trilhões, até 2030, sendo
que 45% desse total seriam destinados à modificação dos
sistemas de transportes, inclusive a modificação das frotas de
veículos, com a difusão do emprego de veículos acionados
eletricamente.
O cenário 450 representa um formidável desafio para a
humanidade, pois implica na implantação de políticas rígidas
em nível global, principalmente considerando-se que cerca de
90% do crescimento da demanda mundial de energia até 2030
virão dos países não pertencentes à OECD3, justamente os
menos desenvolvidos e mais necessitados de levar energia (a
baixo custo) para proporcionar o bem estar e desenvolvimento
social e econômico às suas populações.
3
“Organization for Economic Cooperation and Development”
(OECD). Membros: Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá, República
Tcheca, Dinamarca, Finlândia, França, Alemanha, Grécia, Hungria,
Islândia, Irlanda, Itália, Japão, Coréia, Luxemburgo, México, Holanda,
Zelândia, Noruega, Polônia, Portugal, República Eslovaca, Espanha,
Suécia, Suíça, Turquia, Reino Unido e Estados Unidos.
15
16. As projeções da AIE indicam, para o Cenário de
Referência, que em 2030, o setor de transportes será o maior
consumidor de energia, ultrapassando inclusive o setor
industrial (Fig. 1), sendo previsto um incremento do uso global
de energia para o setor de transportes de 1,4% ao ano até
2030. Observa-se ainda que o setor de transportes é movido
majoritariamente por derivados de petróleo, sendo previsto que
em 2030 haverá pequeno incremento relativo no uso da
biomassa (biocombustíveis) e eletricidade, sendo que para o
Cenário 450 haveria redução de 18% no consumo de derivados
de petróleo e aumento de mais de 100% da utilização de
combustíveis renováveis e eletricidade.
Fig. 1 – Consumo final de energia por fonte e setor
no cenário de referência
Fonte: World Energy Outlook 2009
Entre as formas finais de energia o consumo de energia
elétrica continuará a crescer rapidamente no período como
resultado do incremento de demanda por eletrodomésticos,
equipamentos industriais e comerciais elétricos em linha com o
aumento de prosperidade dos países.
No Cenário de Referência, o uso mundial de energia
elétrica crescerá, em media, a uma taxa de 2,5% por ano e a
sua parcela no consumo final de energia crescerá de 17% em
2007 para 22% em 2030. A geração de energia elétrica deverá
crescer de 24.350 TWh em 2007 para 34.290 TWh em 2030,
16
17. sendo produzida principalmente através de combustíveis
fósseis: carvão e gás natural.
A parcela da energia gerada através de fontes de
energias renováveis (excetuando-se hidroelétrica de grande
porte) - biomassa, eólica, solar, geotérmica, ondas e mares,
continuará a crescer em sua participação no mercado,
passando de 2,5% em 2007 para 9% em 2030. A geração
hidroelétrica deverá sofrer pequena redução na sua
participação em termos globais. A geração térmica a carvão
dobrará nesse período, com o carvão permanecendo como o
principal combustível para geração de energia elétrica, seguido
pelo gás natural.
Cabe comentar que nesse cenário é previsto que a
eficiência energética da geração térmica a carvão está
projetada para crescer de 35% em 2007 para 40% em 2030, a
medida que novas plantas de geração forem construídas
utilizando tecnologias mais avançadas (Fig. 2).
Fig. 2 – Geração global de energia elétrica por combustível no
Cenário de Referência
Fonte: World Energy Outlook 2009
Do cenário prospectivo mundial, conclui-se que o setor
de transporte pode se constituir em um claro exemplo da
17
18. complementaridade entre as políticas de mudanças climáticas
e de segurança do abastecimento energético. O aumento de
eficiência e da diversificação das fontes energéticas atende os
abrangentes desafios de simultaneamente cortar as emissões
de CO2 do setor de transporte e reduzir as importações de
petróleo, melhorando portanto a segurança energética.
Nesse aspecto o Brasil com seu programa de etanol, o
Proálcool, iniciado há mais de 30 anos, é pioneiro e líder na
utilização dos biocombustíveis em sua frota automotiva, sendo
que hoje cerca de metade do combustível utilizado nos
veículos de passeio é renovável, situação extremamente
confortável tanto pela redução de emissões quanto por estar
contribuindo de forma efetiva para a segurança energética do
país. Com relação geração de energia elétrica a situação do
Brasil também é bem mais confortável que a projeção global
apresentada pelo estudo da AIE.
Como comparação, o gráfico a seguir (Fig. 3) apresenta
a estrutura de oferta de eletricidade no Brasil, em 2008. Pode-
se observar que o Brasil apresenta uma matriz de geração
elétrica de origem predominantemente renovável, sendo que a
geração interna hidráulica responde por montante superior a
70% da oferta. Somando-se às importações, que
essencialmente também são de origem renovável, pode-se
afirmar que aproximadamente 80% da eletricidade no Brasil é
originada de fontes renováveis – sem considerar que parte da
geração térmica é proveniente de biomassa. Na média
mundial, fontes renováveis correspondem a apenas 15,6% da
geração de eletricidade (BEN 2009).
Portanto observa-se uma grande diferença entre as
motivações que encaminham à discussão da introdução do
carro elétrico no mercado mundial e no Brasil. Mesmo
considerando as vantagens de maior eficiência energética e
menores emissões, na agenda mundial essa tecnologia tem
como apelo importante a redução da dependência em relação
ao petróleo importado e a maior autonomia energética. Já no
caso brasileiro, a situação é mais confortável, quer pela auto-
18
19. suficiência em petróleo quer pela disponibilidade do etanol e
biodiesel.
Fig. 3 – Energia elétrica – Estrutura da oferta interna segundo a
fonte primária de geração
Fonte: Balanço Energético Nacional – 2009
Sobre esse aspecto o “World Energy Outlook 2009”
comenta que, para o Cenário 450, a redução da utilização de
derivados de petróleo no setor de transporte e a penetração
dos veículos elétricos no mercado variam de acordo com as
circunstancias regionais, citando como exemplo o Brasil, onde
a frota utilizando biocombustíveis já atende, a um custo
competitivo, as metas que as outras economias deverão
atender em 2030. Por outro lado regiões que têm limitada
condição de crescimento sustentável e barato de biomassa,
tendem a favorecer a introdução de veículos elétricos híbridos
e elétricos ao invés de biocombustíveis. Adicionalmente
regiões urbanas densamente populosas incluindo aquelas nos
EUA, China e União Européia podem favorecer a introdução de
carros elétricos para reduzir a poluição local (World Energy
Outlook 2009, pag. 244).
Cabe destacar, no entanto, que a introdução de uma
nova tecnologia no mercado automobilístico pode se
19
20. apresentar como uma oportunidade interessante para a
indústria brasileira.
OS ESFORÇOS PARA A INTRODUÇÃO DOS VEÍCULOS
ELÉTRICOS NO MERCADO
Com a crescente conscientização da possibilidade de
efeitos climáticos adversos devido às emissões de gases de
efeito estufa, em especial pela queima de combustíveis fósseis,
vários países vem adotando políticas de restrição dessas
emissões e investimento em tecnologias “limpas” ou de baixo
carbono. Em particular, no setor de transportes, vislumbra-se a
oportunidade de um grande desenvolvimento tecnológico em
“veículos verdes”, o que está levando a uma corrida por esse
novo mercado.
De acordo com as potencialidades e capacidades
regionais, os países e empresas apostam em diversas
possibilidades complementares para o desenvolvimento de
veículos “ambientalmente amigáveis”, entre eles:
biocombustíveis, motores e veículos mais eficientes, veículos
híbridos, elétricos e a célula a combustível e desenvolvimento
de novos acumuladores de energia.
Os desafios para a introdução dos veículos elétricos,
nas suas mais diversas modalidades, no mercado mundial são
imensos. Uma nova normalização terá que ser desenvolvida,
novos componentes deverão ser projetados, um novo conceito
de “postos de abastecimento” deverá ser implantado, e a infra-
estrutura de energia elétrica devera ser adaptada e expandida.
Adicionalmente, como em toda tecnologia inovadora,
mecanismos de incentivos e de fomento necessariamente
deverão ser implementados.
O maior obstáculo para a introdução dos veículos
elétricos no mercado é o seu elevado custo. Segundo estudo
do “National Research Council” as baterias são o elemento
20
21. determinante no custo e autonomia desses veículos, sendo que
existe grande esforço no desenvolvimento de baterias
avançadas (incluindo as de Lítio), mas ainda não foram
atingidos os objetivos essenciais de custo, vida útil e peso.
Espera-se que rupturas tecnológicas possam contribuir
para a redução do custo e peso das baterias, porém ainda não
está claro que tipo de ruptura pode se tornar comercialmente
viável. Por outro lado, mesmo que elas ocorram dentro da
próxima década, não terão muito impacto nas emissões de
gases de efeito estufa antes de 2030, pois serão necessários
alguns anos para que um número significativo de veículos
incorpore as novas tecnologias na estrada.
Segundo as estimativas apresentadas no estudo norte
americano, os custos de adicionais de fabricação para os
veículos híbridos, similares ao “Prius” da Toyota (PHEV-10) e
ao Volt da GM (PHEV-40), em comparação aos veículos
tradicionais, podem variar de US$ 7.000 a US$ 18.000, sendo
esperado que esses valores estejam na faixa de US$ 4.000 a
U$ 11.000 em 2030. O ponto de equilíbrio econômico
considerando o desenvolvimento tecnológico e a comparação
com os custos do petróleo poderá ser atingido em 2047
(Tabela 1).
Tabela 1 – Custos incrementais estimados para veículos
híbridos
Fonte: National Academy of Sciences, Transitions to Alternative
Transportation Technologies--Plug-in – Hybrid Electric Vehicles – 2009
21
22. Conscientes das dificuldades para a introdução da nova
tecnologia envolvendo veículos mais “ambientalmente
amigáveis” e também da ameaça à sua indústria
automobilística caso não estejam aptos a concorrer nesse novo
mercado global4, os países estão implementando diversas
políticas de incentivos a veículos limpos e em especial aos
veículos elétricos.
Estados Unidos, China, Países da União Europeia,
Inglaterra e Japão entre outros, movimentam-se no apoio à
pesquisa, implantação de infra-estrutura e incentivos à indústria
e aos adotantes iniciais desses veículos.
Pode-se citar, por exemplo, o recente anúncio do
governo norte americano que concedeu US$ 2,4 bilhões em
recursos federais para empresas e universidades para o
desenvolvimento de energias renováveis, em particular de
baterias e veículos híbridos e elétricos, além de um subsídio de
US$ 7.500 por veículo para a aquisição de veículos elétricos e
a China, que estabeleceu um programa de US$ 1.5 bilhão para
a inovação na sua indústria automobilística, além de um
subsídio de US$ 8.800 para o comprador do veículo elétrico.
O BRASIL E SEU MERCADO AUTOMOBILÍSTICO
A evolução da indústria automotiva nacional, ao longo
dos últimos anos, contribuiu para que o Brasil viesse a ocupar
4
Sobre esse aspecto em 9 de fevereiro último, por ocasião da
reunião do Conselho informal dos ministros europeus da indústria e
da pesquisa, foi discutido relatório examinando os desafios para a
Europa fazer emergir uma indústria competitiva para os veículos
elétricos. O objetivo da reunião foi a promoção de uma estratégia
que, dentro dos próximos meses, permitirá às indústrias européias
competirem com seus concorrentes japoneses, americanos e
chineses.
Fonte:ABVE,05/03/2010
http://www.abve.org.br/destaques/2010/destaque10006.asp
22
23. posição de destaque na indústria automobilística mundial: a
produção nacional ocupa a sexta colocação na escala
internacional, o consumo interno (licenciamentos de veículos
nacionais e importados) nos classifica como o 5º maior
mercado consumidor de auto-veículos, e somos o 12º maior
exportador e o 13º maior importador.
O Brasil é líder na produção de veículos que utilizam
combustível de origem renovável e ostenta ampla vantagem
competitiva nesse segmento. O licenciamento de veículos
leves em janeiro de 2010 teve um crescimento de 6% em
relação a janeiro de 2009, atingindo a marca de 201 mil
unidades. Desse total, os carros flex-fuel representaram 85,3%.
Entre 2003 e 2009, foram comercializados mais de 9,8 milhões
de veículos flex-fuel e sua participação estimada na frota total
de veículos leves é de 34%.
Atualmente, a indústria automobilística nacional
compreende 19 montadoras com 40 fábricas distribuídas em 8
estados e 36 municípios e capacidade para produzir 4,0
milhões de auto-veículos por ano. A indústria automotiva
brasileira também é responsável pela existência de mais de
500 fabricantes de autopeças, aproximadamente 4,3 mil
concessionários e a geração de 1,5 milhão de postos de
trabalho diretos e indiretos, destacando-se, em 2009, 124,4 mil
empregos diretos nas montadoras.
Desde 1957 até dezembro de 2009, foram produzidos
no Brasil 45,7 milhões de automóveis, 8,6 milhões de veículos
comerciais leves, 3,4 milhões de caminhões e 765 mil ônibus,
totalizando 58,5 milhões de unidades (Fig. 4). Neste mesmo
período (1957/2009), as vendas/licenciamento de automóveis
novos alcançaram 50,0 milhões de veículos, sendo 39,0
milhões de automóveis, 7,5 milhões de comerciais leves, 2,9
milhões de caminhões e 549 mil ônibus.
23
24. Produção Brasileira de Autoveículos 1957-2009
em milhões de unidades - montados e desmontados
50,0
45,7
45,0
40,0
35,0
30,0
25,0
20,0
15,0
8,6
10,0
3,4
5,0
0,8
0,0
Automóveis Comerciais Leves Caminhões Ônibus
Fonte: ANFAVEA Elaboração: MF/SPE
Fig. 4 – Produção brasileira de autoveículos 1957 – 2009
em milhões de unidades
Fonte ANFAVEA / MF-SPE
A partir de 2000, o setor experimentou forte crescimento
no número de unidades produzidas, que saltou de 1,7 milhão
em 2000 para 3,2 milhões de unidades, em 2009. Desde 2003
foram apurados recordes sucessivos de unidades produzidas
anualmente.
Em decorrência do desaquecimento econômico global,
que teve início a partir do último trimestre de 2008, houve uma
desaceleração nas taxas de crescimento da produção e
vendas. A produção de dezembro daquele ano foi 47% inferior
à quantidade produzida no mês anterior, novembro, e 54,1%
menor que os números de dezembro de 2007 (Fig. 5).
24
25. Fig. 5 – Produção da indústria automobilística
Fonte ANFAVEA / MF-SPE
Produção indústria automobilística
3.500 600
Automóveis (E)
3.000 Comerciais leves (D)
500
Caminhões (D)
2.500 Õnibus (D)
400
2.000
300
1.500
200
1.000
100
500
0 0
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009
Fonte: ANFAVEA Elaboração: MF/SPE
No setor automotivo cabe destacar o de autopeças.
Com faturamento previsto de US$ 40 bilhões para 2010 esse
setor é responsável por exportações de US$ 6,8 bilhões em
2010, já tendo atingido a marca de US$ 10 bilhões em 2008,
antes da crise. O setor exporta para mais de 20 países,
principalmente Argentina, Estados unidos, Alemanha e México.
Dentro do cenário de inovação tecnológica radical no
setor automobilístico que está ocorrendo no mundo, o Brasil
pode facilmente perder a sua posição significativa na produção
26. de veículos e autopeças e passar a ser importador das novas
tecnologias.
Devem ser adotados mecanismos que permitam à
indústria nacional realizar a transição para ser fornecedora de
componentes e sistemas para os novos veículos verdes, nas
suas diversas configurações possíveis, focando para além do
mercado nacional, pois apesar do Brasil, com os
biocombustíveis, já atender os requisitos de emissões de
carbono que muitos países pretendem alcançar em 2030,
haverá a necessidade e a oportunidade da adaptação da
indústria nacional para esse novo mercado.
AÇÕES DO MCT NO APOIO AOS VEÍCULOS ELÉTRICOS
De modo geral a tecnologia inovadora tem custos
maiores que as convencionais e já disponíveis no mercado. É
somente através do aprendizado proporcionado pela pesquisa,
demonstração e introdução inicial no mercado é que essas
tecnologias tornar-se-ão econômicas e levarão à inovação.
Novas tecnologias requerem, em certo estágio de seu
desenvolvimento, o estímulo à pesquisa e à demanda inicial
para introdução futura no mercado. Em casos nos quais se
pretende rápido desenvolvimento, tanto o estímulo quanto a
demanda inicial necessitam ser organizados e apoiados pelos
governos. Como exemplo pode-se citar a recente implantação
do programa de biodiesel brasileiro, no qual ações de estímulo
ao mercado, regulação e incentivos tributários, foram
complementadas por ações de pesquisa, capacitação
laboratorial e formação de recursos humanos especializados.
Dentro desse contexto, o Ministério da Ciência e
Tecnologia (MCT), com relação às tecnologias inovadoras no
setor automotivo, atua no desenvolvimento da pesquisa,
formação de recursos humanos e apoio às empresas
inovadoras.
Para exercer as suas atividades o Ministério dispõe de
duas agências de fomento para a implementação das ações: o
CNPq voltado ao fomento da formação de recursos humanos e
26
27. pesquisa acadêmica e a FINEP voltada a projetos fomento
público à Ciência, Tecnologia e Inovação em empresas,
universidades, institutos tecnológicos e outras instituições
públicas ou privadas. Entre os mecanismos de apoio das
inovações direcionados às empresas, destacam-se dois
recentes instrumentos operados pela FINEP: a Subvenção
Econômica e o Sibratec.
A Subvenção Econômica apoia o desenvolvimento de
produtos, serviços e processos inovadores em empresas
brasileiras, sendo que os projetos tecnológicos são apoiados
mediante edital público anual. O aporte de recursos aos
projetos é a fundo perdido mediante contrapartida das
empresas.
O Sistema Brasileiro de Tecnologia - Sibratec (Decreto
nº 6.259, de 21 de novembro de 2007) é um instrumento de
articulação e aproximação da comunidade científica e
tecnológica com as empresas brasileiras. O Sibratec tem por
objetivo apoiar o desenvolvimento tecnológico do setor
empresarial nacional, por meio da promoção de atividades de
pesquisa e desenvolvimento de processos ou produtos
inovadores, seja essa inovação radical ou incremental, de
prestação de serviços tecnológicos e de extensão tecnológica.
Assim, no SIBRATEC são estruturadas redes temáticas de
Centros de Inovação com disponibilidade de recursos
humanos, materiais e financeiros para apoiar o
desenvolvimento de inovações em produtos e processos
demandados por empresas brasileiras.
Em especial, quanto às ações do MCT em veículos
elétricos, está em desenvolvimento a estruturação de um
programa para apoio ao desenvolvimento tecnológico, as
pesquisas e a cadeia produtiva voltada a veículos elétricos.
Durante 2009 foram realizados seminários e reuniões setoriais
para prospecção no meio acadêmico e em empresas
fabricantes de veículos e baterias, dos temas estratégicos para
pesquisa e desenvolvimento na área.
Para 2010 estão propostos editais para formação de RH
e desenvolvimento de P,D&I em tecnologia veicular e baterias
27
28. no CNPq e linhas de apoio para pesquisa em empresas
(possivelmente através do edital de subvenção da FINEP) nas
áreas de “Desenvolvimento de acumuladores de energia
(baterias, super-capacitores) e seus processos de reciclagem”
e “Desenvolvimento de partes, peças e sistemas completos
aplicados a veículos elétricos, híbridos e hidrogênio”.
Destaque-se também que ao longo deste primeiro
semestre de 2010 está em implantação a Rede SIBRATEC de
Inovação voltada ao apoio às empresas do segmento de
veículos elétricos e baterias. A Rede tem como objetivo de
desenvolver, aperfeiçoar e identificar: matérias primas e
materiais aplicáveis à cadeia produtiva de veículos elétricos;
sistemas de abastecimento de energia a veículos provenientes
de fontes de energia externa; sistemas embarcados de
conversão de energia, excetuando-se a reforma de
combustível; motores elétricos e seus componentes, sistemas
mecânicos como chassis, suspensão, engrenagens, sistemas
de freios, transmissão aplicáveis aos veículos elétricos;
sistemas eletroeletrônicos, inversores, controladores,
supervisores, acumuladores de energia elétrica, medidores,
softwares, protocolos e interfaces de diagnóstico de
componentes e demais sistemas eletroeletrônicos aplicáveis à
cadeia produtiva de veículos elétricos.
Em conclusão, entende o MCT que há um próspero
caminho a ser percorrido até o estabelecimento definitivo da
opção dos veículos elétricos em escala comercial e que o
Ministério é parte essencial, juntamente com os demais
importantes atores da área, no estímulo e na consolidação das
iniciativas em curso no País. O MCT tem pautado sua atuação
pelo suporte aos projetos em implantação a partir da
concepção de que é necessário apoiar tecnologias veiculares
mais eficientes e com menos emissões, sem privilegiar apenas
uma em particular, tendo em vista que várias alternativas estão
em estágio de desenvolvimento e apresentam futuros
promissores.
28
29. Referências Bibliográficas
1. International Energy Agency – IEA, World Energy
Outlook 2009.
2. Ministério de Minas e Energia – MME / Empresa de
Pesquisa Energética – EPE, Balanço Energético Nacional – 2009.
Disponível em (https://ben.epe.gov.br)
3. National Academy of Sciences, Transitions to
Alternative Transportation Technologies--Plug-in Hybrid Electric
Vehicles – 2009 (pré-publicação). Disponível em
(http://www.nap.edu/catalog/12826.html)
4. The New York Times, White House Awards $2.3
Billion in Tax Credits for Clean Energy Developers, Green Inc,
January 8, 2010. Disponível em
(http://greeninc.blogs.nytimes.com/2010/01/08/white-house-awards-
23-billion-in-tax-credits-for-clean-energy-developers/)
5. The New York Times, China Vies to Be World’s
Leader in Electric Cars, Keith Bradsher, Published: April 1, 2009.
Disponível em
(http://www.nytimes.com/2009/04/02/business/global/02electric.html)
6. Anfavea - Associação Nacional dos Fabricantes de
Veículos Automotores em (http://www.anfavea.com.br)
7. Sindipeças - Sindicato Nacional da Indústria de
Componentes para Veículos Automotores, Perspectivas Econômicas
Indústria Brasileira de Autopeças. Disponível em
(www.sindipecas.org.br)
8. Ministério da Fazenda, Relatório do Grupo de
Trabalho da Indústria Automotiva – 2010.
9. Ministério de Minas e Energia, Boletim Mensal dos
Combustíveis Renováveis, nº 25, jan de 2010.
10. Associação Brasileira do Veículo Elétrico – ABVE.
Disponível em (www.abve.org.br/)
30. VEÍCULO ELÉTRICO, POLÍTICAS
PÚBLICAS E O BNDES: OPORTUNIDADES
E DESAFIOS5
Luciano Galvão Coutinho*,
Bernardo Hauch Ribeiro de Castro** eTiago Toledo
Ferreira***
INTRODUÇÃO
Nesse começo do século XXI, a eletrificação veicular
emerge como uma tendência tecnológica inexorável. Essa
nova tendência representa uma mudança substantiva no setor
automotivo, implicando na substituição dos motores a
combustão interna por motores elétricos como fonte de força
motriz veicular. Espera-se, em um futuro próximo, que os
veículos elétricos disputem mercado com os tradicionais.
Mudanças tecnológicas reabilitaram os veículos
elétricos, muito difundidos no começo do século XX. Naquela
época, além de modelos propulsionados por motores elétricos
ou a combustão, existiam veículos movidos por motores a
vapor. Basicamente, a crescente disponibilidade e o baixo
custo de derivados do petróleo, associado à ausência de
pressões ambientais, favoreceram a adoção do motor a
combustão interna. Apesar do maior conforto, propiciado pelo
menor ruído e emissão de gases, o veículo elétrico enfrentava
problemas relacionados à autonomia e ao carregamento da
bateria. Entretanto, novos fatores promoveram o renascimento
5
Os autores agradecem os comentários de João Carlos
Ferraz, Felipe Marques, Haroldo Prates e Patrícia Zendron.
Naturalmente, eventuais imperfeições remanescentes são de inteira
responsabilidade dos autores.
*
Presidente do BNDES.
**
Engenheiro do BNDES.
***
Economista do BNDES.
31. dos veículos elétricos, em especial, o desenvolvimento
tecnológico das baterias, a questão da segurança energética e
a redução de impactos ambientais.
Neste artigo, enfatizaremos os aspectos industriais
relacionados aos veículos elétricos, visando a constituição de
um panorama geral, a partir do qual a atuação do BNDES será
discutida. A seção seguinte aborda os principais fatores
indutores do ressurgimento dos veículos elétricos. A terceira
seção apresenta os principais modelos disponíveis e em
desenvolvimento para discutir, em seção posterior, os
principais desafios e entraves à difusão dos veículos elétricos.
As eventuais transformações na estrutura industrial são
tratadas na quinta seção, enquanto, a sexta seção discute o
apoio do BNDES a eventuais mudanças na indústria
automotiva. Uma breve conclusão consolida os principais
tópicos discutidos ao longo do texto.
INDUTORES DO RENASCIMENTO DOS VEÍCULOS ELÉTRICOS
A redução dos impactos ambientais é tema de
crescente importância na agenda pública. O combate ao
aquecimento global torna-se, cada vez mais, um imperativo
político na maioria das nações. O setor de transportes, que
responde por parcela significativa do consumo de derivados de
petróleo e das emissões de CO2, é um dos principais focos de
atenção.
A questão energética é outro fator que reforça a
necessidade de redução do consumo de petróleo. O IEA6
(2009) projeta um crescimento médio anual da demanda
mundial de energia de 1,5% entre 2007 e 2030, ao passo que,
no mesmo período, a oferta de petróleo deve ter expansão
média anual de 1%. Em termos acumulados, o aumento da
demanda energética será da ordem de 40,7% contra 25,7% da
oferta de petróleo. Esses números apontam a
insustentabilidade da matriz energética atual e, em especial, a
6
International Energy Agency ou Agência Internacional de
Energia.
31
32. necessidade da redução da participação do petróleo. O setor
de transporte, por consumir cerca de 61,3% do petróleo7, é o
alvo natural para medidas que visem o rebalanceamento da
matriz energética. E não faltam sinais que o desequilíbrio
gerado pelo excesso de demanda já é um problema no curto
prazo, tendo em vista a elevada volatilidade do preço do
petróleo no período recente. O preço do barril de petróleo8, na
casa dos US$ 72 em 2007, alcançou a marca de US$ 144 em
julho de 2008, pouco antes do momento mais agudo da crise
financeira internacional. Este caiu a cerca de US$ 40 em fins
de 2008 e, desde então, vem se recuperando, chegando
próximo a US$ 85 no início de abril de 2010.
Adicionalmente, desde o Choque do Petróleo de 1973,
os governos dos países centrais perceberam o risco derivado
da elevada concentração da produção em um número pequeno
de países. Nesse caso, eles procuram aumentar sua
segurança energética, entendida como o acesso, a um preço
razoável, à fonte energética demandada, provida por
produtores confiáveis. A dependência em relação a poucos
produtores, organizados em cartel, e a grande volatilidade dos
preços do barril de petróleo fundamentam questionamentos
acerca da segurança energética dos países dependentes da
importação de petróleo.
O choque motivou os governos a restringirem o
consumo de derivados do petróleo pelos veículos –
usualmente, através de regulamentações que limitam as
emissões ou exijam maior eficiência no consumo energético –
e a financiarem tecnologias alternativas, dentre as quais se
encontra o veículo elétrico. A recente alta do petróleo e as
pressões por medidas que preservem o meio ambiente
redundaram em um aprofundamento desses programas.
Atualmente, vários governos oferecem incentivos para a
compra de veículos elétricos. Usualmente, esses incentivos
7
Ver IEA (2009).
8
Fonte: Ipeadata. Preço por barril do pétroleo bruto Brent
(FOB). No original: Europe Brent Spot Price FOB.
32
33. assumem a forma de isenções fiscais ou bônus monetários.
Dentre os países que oferecem esse incentivo, estão os
Estados Unidos, o Japão, a China e a Alemanha.
No Brasil, os veículos elétricos não recebem tratamento
diferenciado. No caso do Imposto sobre Produtos
Industrializados – IPI, os veículos elétricos são enquadrados na
categoria “outros”, sobre a qual incide a alíquota mais elevada.
Um automóvel elétrico, por exemplo, tem alíquota de 25%.
Nesse momento de transição, os incentivos são
essenciais para acelerar a penetração desses veículos. Além
de não gozarem de economias de escala, os veículos elétricos
enfrentam elevados custos de baterias, desconfiança dos
consumidores e carência de infraestrutura. O preço9 médio de
um Ford Fusion, um dos sedans mais vendidos nos Estados
Unidos, é inferior a US$ 20 mil, enquanto o preço esperado do
GM Volt, o veículo híbrido, está na casa do US$ 40 mil. O
Nissan Leaf, outro veículo elétrico que será lançado em breve,
deverá custar cerca de US$ 34 mil.
Vale ressalvar que a eletrificação veicular não substitui
a agenda de busca por combustíveis alternativos ao petróleo.
No caso dos modelos híbridos, por exemplo, eles alimentariam
motores a combustão dos próprios veículos. Já em veículos
puramente elétricos, esses podem ser usados na geração de
energia elétrica.
Sem o avanço das baterias, o renascimento dos
veículos elétricos não seria possível. Ele foi iniciado nos
setores de informática e telecomunicações, impulsionado pelas
vendas de laptops e telefones celulares. Por isso, a maior parte
dos modelos que vem sendo lançados são equipados com
baterias de íon-lítio, similares às usadas em eletrônicos
portáteis. Conforme será discutido, o desenvolvimento de
baterias é o principal desafio tecnológico enfrentado
atualmente.
9
Cotações obtidas no sítio http://www.edmunds.com, em
8/4/2010, que desconsideram os benefícios concedidos pelo governo.
33
34. MODELOS DE VEÍCULOS ELÉTRICOS
De modo simplificado, podemos classificar os veículos
elétricos em duas categorias: os veículos elétricos puros e os
híbridos.
Os veículos híbridos
Os veículos híbridos são assim chamados por
combinarem um motor de combustão interna com um gerador,
uma bateria e um ou mais motores elétricos. Sua função é
reduzir o gasto de energia associado à ineficiência dos
processos mecânicos se comparados aos sistemas
eletrônicos10.
Boa parte da ineficiência energética vem da geração de
calor causada principalmente pelo atrito entre as partes móveis
do motor de combustão interna. Estima-se que apenas 15% da
energia potencial de um combustível em um automóvel é
efetivamente utilizada para movimentá-lo.
Em um veículo híbrido, há quatro fatores que ajudam a
aumentar sua eficiência:
• Assistência do Motor Elétrico ao de Combustão
Interna: a menor variação em sua operação permite atingir um
nível de eficiência muito mais elevado pela adoção de motores
com menor perda, como os do ciclo Atkinson-Miller ao invés do
difundido ciclo Otto.
• Desligamento Automático: sistema híbrido pode
desligar automaticamente o motor em caso de parada,
enquanto no veículo convencional o motor a combustão
continua funcionando.
• Tecnologias de Recarga da Bateria, como
frenagem regenerativa: no caso dos motores a combustão,
embora a aplicação seja possível, a armazenagem da energia
gerada para fins de movimentação não é, ficando restrita ao
consumo de periféricos (como o ar condicionado, luzes etc.).
10
Raskin & Shah (2006).
34
35. • Otimização da Transmissão: o paradigma
mecânico permite apenas um número limitado de combinações
de rotação e potência, que limitam a eficiência do conjunto. Já,
com sistemas eletrônicos, as possibilidades de combinações
são muito maiores. A Toyota, por exemplo, desenvolveu um
sistema de transmissão eletrônica, que permite um número
infinito de combinações. Seu sistema é extensivamente
patenteado, o que leva os competidores a licenciar essa
tecnologia ou a utilizar sistemas menos eficientes, baseados
em combinações amplas, mas não infinitas.
Há duas formas básicas de arranjo dos componentes de
um sistema híbrido, que resultam em arquiteturas diferentes
dos automóveis. Nos sistemas em série, o motor a combustão
interna é ligado a um gerador e não diretamente ao trem de
acionamento. O motor elétrico é que movimenta as rodas. Já
no sistema em paralelo, tanto o motor elétrico quanto o motor a
combustão podem movimentar as rodas, conjunta ou
independentemente.
Motor a
Motor a Motor
Figura 1 – Motor a Figura 2 – Sistema Híbrido
Combustão Interna Paralelo
35
36.
Motor a Motor Motor a Motor
Figura 3 – Sistema Híbrido Figura 4 – Sistema Híbrido
em Série Combinado Série‐Paralelo
Há ainda um terceiro sistema que conjuga os dois
anteriores, incorporando a possibilidade de recarga da bateria
pelo motor a combustão mesmo quando ele estiver tracionando
o veículo.
As Figuras 1 a 4 trazem, de forma simplificada, um
desenho esquemático da arquitetura dos sistemas
apresentados, bem como do sistema tradicional.
Um exemplo de veículo com sistema híbrido é o Toyota
Prius, lançado em 1997 no Japão e em 2000 em outros
mercados como os EUA e a Europa. Atualmente em sua quarta
geração, é considerado o primeiro veículo híbrido produzido em
massa e lançado mundialmente. Foi lançado com um sistema
híbrido paralelo, tendo evoluído para o combinado. Em 2009,
atingiu um acumulado de dois milhões de veículos vendidos
desde o seu lançamento11.
11
Toyota (2010).
36
37. Um outro exemplo, o GM Volt, funciona com um sistema
híbrido em série, com recarga feita por sistema plug-in12 e
baterias de íon lítio. Com o conceito apresentado em 2007, tem
previsão de lançamento comercial em 2011.
Os veículos elétricos puros
Já os veículos puramente elétricos não possuem um
motor a combustão. São integralmente movidos por energia
elétrica, seja provida por baterias, por células combustível13,
por placas fotovoltaicas (energia solar) ou ligados à rede
elétrica, como os trolebus. A maioria dos lançamentos das
grandes montadoras tem se concentrado em veículos movidos
a bateria.
Para ilustração, são veículos elétricos puros o Nissan
Leaf, com lançamento previsto para 2010, e o Mitsubishi iMiEV,
já lançado. Ambos utilizam baterias de íon lítio, sendo que o
iMiEV possui três motores elétricos ao invés de um, sendo um
para cada roda dianteira e um para o conjunto traseiro.
No Brasil, há alguns projetos em desenvolvimento,
dentre os quais podemos citar o Projeto VE, iniciado em 2006,
da Itaipu Binacional, em cooperação com a empresa suíça
Kraftwerke Oberhasli (KWO), controladora de hidrelétricas
suíças, e a montadora Fiat, além de outras empresas e
instituições de pesquisa. São dois veículos em
desenvolvimento, o Palio Weekend Elétrico e o caminhão leve
Iveco Daily Elétrico. Ambos são veículos elétricos puros, sendo
12
A denominação plug-in indica que a bateria do veículo pode
ser recarregada por um plug conectado a uma fonte externa de
energia elétrica.
13
Células combustível (fuel cells) são células eletroquímicas
(como as pilhas) que convertem combustível em eletricidade. Apesar
da possibilidade de se utilizar diferentes combustíveis, há um forte
apelo pelo uso do hidrogênio, que resultaria em veículos praticamente
não-poluentes..
37
38. que o Palio utiliza uma bateria de níquel e o Daily, três baterias,
de sódio, níquel e cádmio. Do Palio, são produzidos, em
caráter experimental, quatro unidades por mês atualmente.
Há também projetos em fase mais embrionária, como o
do Triciclo Pompéo, em desenvolvimento por uma empresa na
incubadora tecnológica da Itaipu Binacional, que utiliza baterias
de íon lítio e motor elétrico fornecido pela empresa Weg. Tem
lançamento previsto para 2011.
Já em escala comercial, encontra-se no Brasil as
motocicletas do tipo scooter elétricas, produzidas pelas
empresas Motor Z (em São Bernardo do Campo/SP), Bramont
(em Manaus/AM) e GPS Electric Movement (em Natal/RN)14, e
ônibus urbanos com tração elétrica fornecida pelas empresas
Eletra e a célula de hidrogênio fabricados pela Tutto Transporti.
A Eletra afirma ter 300 trolebus e 45 ônibus híbridos em
operação na Grande São Paulo15. Além disso, há veículos
elétricos fabricados no Brasil para transporte em áreas
particulares (ambientes fabris, centros de distribuição, campos
de golfe etc.) por algumas empresas como Jacto e Agix.
A Tabela 1 traz um breve comparativo de alguns
modelos citados.
Percebe-se uma clara distinção entre os veículos
elétricos puros e os híbridos em relação a dois aspectos: a
autonomia, que é maior nos híbridos justamente pela utilização
acessória de um motor a combustão, e o peso do conjunto de
baterias. Os demais parâmetros são similares para os modelos
estudados.
14
Scooters (2009).
15
Eletra (2010).
38
39. Tabela 1 – Comparativo de alguns modelos de veículos elétricos.
Híbridos Puros
Toyota Prius
(Itaipu/Fiat)
Nissan Leaf
Mitsubishi
GM Volt
Elétrico
iMiEV
Palio
Geração Geração Geração
Geração I
II III IV
1997‐ 2000‐ 2003‐
Lançamento 2009 2011 2010 2010 n.d.
1999 2003 2009
Potência do motor a combustão Não Não Não
58 70 76 98 n.d.
(HP) possui possui possui
Potência do motor elétrico (HP) 40 44 67 80 71 63 107 20
Aceleração 0‐96 km/h (s) 14,1 12,5 10,1 9,8 n.d. n.d. 9 28***
Peso das baterias (kg) 57 52 45 44 180 165 200 165
Peso do veículo (kg) n.d. 1254 1317 1380 1580 1080 n.d. 1029
64* /
Autonomia (km) n.d. 579** 547** n.d. 160 160 120
483**
Velocidade máxima (km/h) n.d. 159 178 n.d. 160 130 140 110
Fontes: Zapata & Nieuwenhuis (2007), GM (2010), Mitsubishi (2010), Nissan (2010), Toyota (2010). Elaboração própria.
Obs.: * Usando exclusivamente a bateria. / ** Utilizando também o motor a combustão. / *** 0-100 km/h.
n.d. = não disponível
40. DESAFIOS E GARGALOS
A adoção em massa dos veículos elétricos enfrenta
diversos desafios. Dentre os principais entraves, pode-se listar
o preço elevado, a autonomia da bateria e a necessidade de
constituição de uma infraestrutura específica.
A bateria é o componente crucial, sendo seu
desenvolvimento responsável tanto pela elevação da
autonomia, quanto pela redução do preço do veículo.
Atualmente, o padrão adotado é o de íon lítio. No entanto, essa
tecnologia não necessariamente será dominante por conta de
seu elevado custo e de questões relacionadas à oferta de
matéria-prima. Outros padrões despontam como potenciais
concorrentes como níquel hidreto metálico e zebra (à base de
sódio, níquel e cádmio). O desenvolvimento da bateria é mais
premente em um cenário de transição, em que fatores culturais
– como a tradição dos veículos a combustão, por exemplo – e
a ausência de infraestrutura reduzem a predisposição dos
consumidores em adquirirem veículos elétricos.
Os veículos elétricos demandam modificações na
infraestrutura existente, estando o ponto chave relacionado à
nova forma de alimentação energética, que será realizada
através da rede elétrica. Essas modificações abrangem da
necessidade de tomadas de força nas garagens das
residências à existência de estações de carregamento rápido
ao longo das vias de transporte. Apenas para exemplificar a
complexidade envolvida, a simples colocação de tomadas nas
garagens de edifícios precisa atender alguns requisitos, como
voltagem adequada e mecanismo de tarifação individual do
proprietário do veículo. A grande energia acumulada na bateria
abre novas possibilidades ao automóvel. Ele pode exercer a
função de um no-break residencial ou devolver energia à rede,
arbitrando seu fluxo com a concessionária de energia elétrica
de acordo com o preço das tarifas.
As expectativas otimistas apontam para o domínio de
mercado pelos veículos híbridos ou puramente elétricos em
2030. Após um período de pelo menos 10 anos de penetração
mais lenta, essa velocidade deverá sofrer uma aceleração
41. robusta, conforme os principais entraves (sobrepreço,
autonomia da bateria e infraestrutura) forem sendo superados.
Nesse período, também deverá ser definido o padrão
vencedor.
A inexistência de resistência técnica à produção de um
híbrido que utiliza etanol e energia elétrica pode ser
aproveitada para consolidar a posição de vanguarda do Brasil
na utilização de energia limpa para o transporte.
Tabela 2 – Projeção de Penetração de Veículos Híbridos/Elétricos
Híbridos / Elétricos como % das Vendas Totais 2010 2015 2020 2030
EUA 4,2% 10,2% 26,7% 75,8%
China 0,4% 7,7% 25,8% 78,3%
Global 1,7% 6,2% 19,9% 66,0%
Híbridos / Elétricos como % da Frota 2010 2015 2020 2030
EUA 0,9% 3,0% 8,8% 39,8%
China 0,1% 3,5% 15,4% 63,1%
Global 0,3% 1,8% 6,6% 35,6%
Fonte: Deutsche Bank (2009).
IMPACTO NA CADEIA DE FORNECEDORES
A introdução de veículos elétricos promoverá uma
profunda reestruturação na indústria automotiva. As
modificações não atingem somente o powertrain, principal
sistema veicular, que abarca o motor e a transmissão. Novos
componentes, como regeneradores de energia dispersada na
frenagem, serão incorporados aos veículos. A energia
acumulada na bateria, tradicionalmente utilizada para partida
do automóvel e para os itens de eletrônica embarcada (injeção
eletrônica, ABS, airbag, trio elétrico, ar condicionado, alarme
etc.), terá que alimentar o motor de tração, exercendo função
realizada pelo tanque de combustível nos modelos
convencionais. Fabricantes de bateria, portanto, precisarão se
transformar em fabricantes de sistemas, aproximando-se dos
41
42. sistemistas16. Poderá haver também desdobramentos
relacionados ao mercado de minério, tendo em vista que o lítio
está presente na maior parte das baterias veiculares já
desenvolvidas. Estima-se que, até 2020, o consumo subirá de
24 mil toneladas em 2010 para 54 mil17. Sendo o lítio um
minério não abundante e com reservas concentradas em
poucos países (65% estão na Bolívia e no Chile), é possível
vislumbrar um incentivo para a pesquisa de alternativas. Por
ser reciclável, pode-se esperar também o crescimento da
indústria de reciclagem.
Naturalmente, o principal sistema atingido pela
eletrificação veicular será o powertrain. Mesmo nos modelos
em que o motor a combustão não é eliminado, as mudanças
são diversas. De responsável pela tração, o motor a combustão
assume papel de gerador de energia para alimentação da
bateria nos modelos híbridos, representando uma alternativa à
rede elétrica. Nessa configuração, a necessidade de potência e
o modo de funcionamento são diferentes. A transmissão
também sofre profundas modificações, tornando-se um
componente eletrônico. Assim, espera-se uma aceleração da
mudança de paradigma da indústria de autopeças, com a
utilização cada vez maior de sistemas eletrônicos em
substituição aos mecânicos.
Os mercados de reposição também podem sofrer
mudanças, tendo em vista que, por serem mais simples e com
menos partes móveis, os motores elétricos provavelmente
necessitarão de menor manutenção. Sistemas de diagnóstico à
distância podem se tornar mais presentes no mercado
automobilístico.
16
Book et al. (2009).
17
Gonçalves (2010).
42
43. Uma alteração dessa ordem gera naturalmente espaço
para novos entrantes. Os exemplos citados neste artigo, sobre
as experiências brasileiras de desenvolvimento de veículos
elétricos, dão uma amostra disso. Empresas geradoras de
energia elétrica têm se interessado pelo tema, assim como
empresas fornecedoras de equipamentos elétricos.
Segundo Vian (2009), “o sistema elétrico brasileiro não
deverá ter maiores problemas para atender à demanda dos
carros elétricos”. No entanto, embora haja energia disponível,
há dois fatores a considerar. O primeiro diz respeito à
infraestrutura para recarga dos veículos elétricos. O argumento
mais frequente é que as distâncias médias percorridas pelos
automóveis nas cidades é menor que a autonomia do carro, o
que permitiria que a recarga fosse feita apenas na residência
do motorista. Porém, é um ponto que causa uma restrição a
seu uso e, portanto, dificulta sua difusão. É possível vislumbrar
uma proliferação de pontos de recarga em estacionamentos,
por exemplo, e outros locais.
Figura 5 – Triciclo Pompéo (Fonte:
Pompéo, 2010)
43
44. O segundo fator refere-se ao tempo de recarga, que
pode ser considerado elevado em alguns casos. Algumas
empresas estão pesquisando formas de fazer uma recarga
rápida, com a disponibilização de tensões mais elevadas e
consequente redução do tempo.
Outra solução é a possibilidade de implantação de
postos para troca das baterias18, como tem sido testado em
países de menor extensão territorial, como Israel e Dinamarca.
É importante notar que esses problemas afetam mais os
veículos elétricos puros que os híbridos, que normalmente
possuem autonomia estendida pelo uso do motor a combustão.
Outra solução é a possibilidade de implantação de
postos para troca das baterias19, como tem sido testado em
países de menor extensão territorial, como Israel e Dinamarca.
É importante notar que esses problemas afetam mais os
veículos elétricos puros que os híbridos, que normalmente
possuem autonomia estendida pelo uso do motor a combustão.
Por fim, é possível que tanto o design quanto os
materiais utilizados na fabricação do carro sofram alguma
alteração, já que o peso do veículo influencia sua autonomia, a
bateria é um conjunto relativamente pesado e a motorização do
veículo elétrico difere substancialmente do veículo a gasolina.
Veículos como o Pompéo, citado anteriormente neste artigo,
tem um design que foge do padrão atual dos veículos. Na
questão dos materiais, a título de ilustração, em abril de 2010,
uma joint venture entre a montadora BMW e o SGL Group
divulgou a intenção de construir duas plantas para fabricação
de materiais compósitos de fibra de carbono, que são mais
18
Better Place (2010).
19
Better Place (2010).
44
45. leves e mais resistentes que o aço, para utilização nos veículos
elétricos a serem lançados20.
O que se pode concluir é que a proliferação de veículos
elétricos parece ser uma interessante oportunidade para a
entrada de outros players na indústria automotiva mundial.
O BNDES
Principal provedor de crédito de longo prazo e agente
relevante no mercado de capitais brasileiro, o BNDES deverá
desempenhar papel de destaque na introdução dos veículos
elétricos no Brasil.
Um paralelo pode ser traçado com a atuação do Banco
no apoio aos combustíveis alternativos. No campo industrial,
ele financiou do desenvolvimento do sistema flex fuel à
implantação de linhas de montagem dos modelos que
incorporaram esta tecnologia. O BNDES também tem
financiado toda a cadeia sucroalcooleira, atuando junto às
usinas e aos fornecedores de equipamentos.
Mais do que um provedor de crédito ou investidor em
ativos, o BNDES atua como um interlocutor presente,
empreendendo ações de fomento. A longa relação com o setor
automotivo, com vários financiamentos concedidos, coloca o
Banco em posição privilegiada para identificar as necessidades
e potencialidades relacionadas a essa mudança paradigmática.
Além disso, a abrangência do tema requer a adoção de
políticas transversais com o envolvimento de diversos agentes
na construção deste projeto. Nesse sentido, cabe ao BNDES
ser um dos principais articuladores de um apoio estruturante,
que viabilize a produção de veículos elétricos no Brasil.
A divulgação dessa solução tecnológica constitui um
dos principais focos de ação do BNDES nesse estágio inicial.
Um exemplo foi o apoio institucional ao VE 2009, o maior
evento de veículos elétricos do País, realizado em Campinas.
No primeiro semestre de 2010, o Banco organizou Oficina de
20
Shields (2010).
45
46. Trabalho, que procurou ampliar a integração dos agentes
relevantes. Ainda na esfera não financeira, o BNDES está
presente nos principais debates, participando de grupos de
trabalho no setor público e de reuniões com organizações que
congregam as empresas do setor automotivo. Em decorrência
dessas ações, procura-se identificar oportunidades para o
desenvolvimento da indústria nacional.
Em termos mais tradicionais, para apoiar a introdução
dos veículos elétricos no País, o Banco dispõe de diversos
instrumentos, disponíveis para pronta aplicação.
Os esforços iniciais de desenvolvimento de tecnologia
não existente no Brasil são elegíveis para a Linha de Inovação
Tecnológica do BNDES, que com o Programa de Sustentação
do Investimento (PSI), está, até dezembro de 2010, com o
custo financeiro de taxa fixa de 3,5% aa. Os produtores de
bateria são potenciais usuários dessa linha, que visa ampliar o
conteúdo tecnológico da produção local. Novos componentes,
como regeneradores de energia de frenagem, também
merecem especial atenção. Uma alternativa é a Linha de
Capital Inovador, que apoia empresas no desenvolvimento de
capacidade para empreender atividades inovativas em caráter
sistemático, por meio de investimentos tanto nos capitais
intangíveis quanto nos tangíveis, incluindo a implementação de
centros de pesquisa e desenvolvimento.
Depois, quando a tecnologia atingir certo estágio de
maturidade, as pesquisas passam a envolver adaptações à
realidade regional, melhorias marginais nos sistemas ou
modernização da capacidade produtiva necessária à absorção
dos resultados do processo de pesquisa e desenvolvimento ou
inovação. Complementarmente, as montadoras iniciarão a
concepção de modelos. Nessa etapa, o apoio do Banco pode
ocorrer através de linhas e programas, como o Programa
BNDES Proengenharia e a Linha de Inovação Produção.
O auxílio à implantação ou modernização de unidades
produtivas, a forma mais tradicional de atuação do BNDES, é
realizado através do Produto BNDES Finem. Idealmente, a
etapa de produção leva ao mercado produtos que incorporam
46
47. tecnologias desenvolvidas localmente. O produto permite o
apoio à entrada de novos players, o que, em alguns casos,
pode assegurar a produção de certos componentes localmente.
Naturalmente, os veículos elétricos comerciais –
comerciais leves, caminhões e ônibus – contarão com o apoio
à comercialização através do BNDES Finame e do Cartão
BNDES, desde que atingido o índice de nacionalização mínimo
de 60%. Adicionalmente, as linhas do BNDES Exim podem ser
utilizadas para financiar exportação de veículos e
componentes.
Além dos pesados investimentos em desenvolvimento
tecnológico e implantação de unidades produtivas, são
esperadas operações de consolidação de empresas e entrada
de novos players, que podem contar com a participação do
Banco, através da BNDESPar, subsidiária do BNDES
responsável pelas operações da instituição no mercado de
capitais.
CONCLUSÕES
O sucesso do veículo elétrico exige a superação de
obstáculos, como logística, infraestrutura e resistência dos
consumidores. A superação desses entraves na difusão de
veículos movidos a etanol no Brasil fundamenta a assunção de
perspectivas otimistas sobre o futuro da indústria automotiva
local.
Perpassando todo o processo, conforme apontado nas
seções anteriores, a introdução de veículos elétricos será
responsável por um profundo rearranjo na indústria automotiva,
promovendo transformações na indústria. O setor precisará
acompanhar esse movimento, a fim de manter sua posição
como um dos principais produtores mundiais de veículos. Na
presença de diversas oportunidades para ampliar o conteúdo
tecnológico da produção local, as montadoras de veículos têm
função decisiva na inserção do Brasil neste novo paradigma.
O ritmo de difusão do veículo elétrico, acelerado
recentemente por preocupações com segurança energética e
47
48. meio ambiente, dependerá, além de fatores técnicos, como o
desenvolvimento tecnológico das baterias, de políticas públicas
de incentivo, já adotadas em diversos países. O BNDES
assume, portanto, papel central na articulação dos diversos
atores e no fomento a iniciativas visando à geração e a difusão
das novas tecnologias. A identificação de novas possibilidades,
com consequentes ações de fomento, será essencial.
Os esforços governamentais devem almejar que o
Brasil, mais do que um simples produtor, consolide-se como
um polo desenvolvedor e exportador de tecnologia, como foi
alcançado no caso dos veículos a etanol. O leque de
instrumentos do BNDES está disponível para este objetivo.
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UNIP, 2007.
49
50. MOBILIDADE ELÉTRICA NO BRASIL,
UMA OPÇÃO DE FUTURO
Eletrobras investe em pesquisa e parcerias estratégicas
para apoio ao desenvolvimento do tema
José Antonio Muniz Lopes*
Orientada pela visão de ser referência mundial no
negócio de energia elétrica limpa e renovável, com eficiência,
rentabilidade e responsabilidade socioambiental, a Eletrobras
vem participando ativamente do projeto de desenvolvimento de
veículos elétricos (VEs), com apoio a pesquisas e ao
desenvolvimento do tema. A concretização do veículo elétrico
como uma opção para o transporte urbano nas grandes
cidades brasileiras é uma idéia totalmente em sintonia com a
missão e os objetivos das empresas Eletrobras. Devido à alta
eficiência dos motores elétricos, eles propiciam o uso racional
dos recursos naturais, além de não emitirem gás carbônico. A
utilização desses veículos representará, ainda, a uma maior
eficiência no uso da infraestrutura construída para atendimento
ao mercado de energia elétrica.
Além dessas vantagens mais evidentes, uma análise
um pouco mais cuidadosa traz à tona outros aspectos que
justificam plenamente os investimentos no projeto do veículo
elétrico. Os benefícios ao meio ambiente e ao desenvolvimento
são indiscutíveis, assim como a necessidade da criação de
políticas adequadas e de tarifas diferenciadas. No que diz
respeito aos interesses do setor de energia, o fato de os
veículos serem utilizados essencialmente durante o dia
constitui-se uma importante vantagem. Dessa forma, o período
noturno poderá ser usualmente utilizado para a recarga das
*
Presidente da Eletrobras.
51. baterias, incentivando o deslocamento da carga para este
horário, fora do período de pico de consumo.
Outra perspectiva vislumbrada é a futura integração dos
veículos elétricos com o setor de energia, no âmbito do
conceito conhecido mundialmente como smart grid. Esse
conceito considera a possibilidade de utilização da energia
armazenada nas baterias dos veículos conectados à rede, que
podem atuar, então, como fonte de energia distribuída. A
energia armazenada nas baterias pode ser devolvida à rede
nos horários de maior demanda, aliviando o sistema elétrico.
Imaginando-se um cenário futuro em que a quantidade de
veículos elétricos seja significativa, tal perspectiva torna-se
bastante interessante para o setor elétrico.
Da mesma forma que a utilização do veículo elétrico
como opção em nossas grandes cidades ainda exigirá a
criação de políticas públicas adequadas, também a
concretização plena desse conceito depende de inúmeros
aprimoramentos tecnológicos. Atenta a essas perspectivas e
consciente da importância do desenvolvimento dos veículos
elétricos para a sociedade brasileira, a Eletrobras vem
incentivando os estudos dessas tecnologias em seu conjunto
de empresas. Além disso, convidou outras companhias de
energia da iniciativa publica e privada interessadas no assunto,
unindo forças e criando a massa crítica necessária ao
desenvolvimento do projeto, com ações sinérgicas e
aproveitamento do que cada instituição possui de melhor.
Nesse sentido, a Itaipu Binacional vem tendo um papel
fundamental. Por intermédio de acordos de cooperação
tecnológica com a empresa KWO (Kraftwerke Oberhasli AG),
do ramo de hidrelétricas, a empresa viabilizou um projeto de
pesquisa para o desenvolvimento de veículos elétricos.
Denominado “Veículo Elétrico”, o projeto visa à transferência
51
52. de know-how e à nacionalização dos componentes necessários
à produção de veículos elétricos no Brasil.
O projeto teve início em 2005, durante visita do
presidente do conselho da KWO, Peter Schmid, a Itaipu,
decorrente do acordo de cooperação tecnológica previamente
existente. O objetivo inicial foi reunir esforços para o
desenvolvimento de um veículo elétrico, viável técnica e
economicamente, a partir de tecnologia existente e em uso em
caráter experimental nas instalações da empresa na Suíça.
Considerando a conformidade da proposta com as premissas
de preservação do meio ambiente e os benefícios da
transferência de tecnologia, a Eletrobras, em conjunto com a
Itaipu Binacional, firmou o convênio 8226/2006.
Em função da abrangência e da complexidade
tecnológica exigidas pelo projeto, o convênio previu a inclusão
de entidades parceiras, ligadas tanto à Eletrobras e à Itaipu
quanto à KWO. Diversos ramos de atividades foram
identificados como essenciais ao projeto, tais como baterias,
acessórios eletrônicos, montadoras automotivas, motores
elétricos e sistemas de controle, concessionárias de energia
elétrica, institutos de pesquisa e universidades. Atualmente, o
grupo de empresas envolvidas no projeto inclui: Eletrobras,
Itaipu Binacional, Fiat, Iveco, Eletrobras Cepel, Copel, Lactec,
Ande, Cemig, CPFL, Ampla, Light, WEG, Correios, Eletrobras
Furnas, FPTE e Petrobras, além das empresas associadas à
KWO.
Por meio de pesquisas, realizadas de forma coordenada
e sinérgica e com a parceria entre estas empresas e
instituições de ensino envolvidos, o grupo pretende
desenvolver tecnologia nacional para veículos movidos a
eletricidade, com vistas a uma série de benefícios diretos e
indiretos, dentre os quais se pode destacar: a preservação do
meio ambiente; a pesquisa e o desenvolvimento de tecnologia
52
53. nacional; a capacitação de profissionais; a aquisição de know-
how; a geração de emprego e renda; a utilização do veículo
elétrico em frotas próprias, reduzindo custos de combustível; a
otimização da curva de carga, ampliando o consumo fora do
horário de ponta para recarga das baterias (smart grid); a
indução à produção de componentes nacionais; e o fomento à
produção de veículos elétricos pelas indústrias brasileiras.
Para condução do projeto, foram criados dois comitês,
com a participação de representantes de todas as empresas
envolvidas. Ao Comitê Gestor cabem as definições globais
sobre o projeto, as deliberações sobre propostas do Comitê
Técnico, o apoio à produção de componentes em território
nacional, e ações governamentais visando à obtenção de
recursos para P&D e de benefícios fiscais, com incentivo pela
preservação do meio ambiente. Já o Comitê Técnico tem como
atribuições o acompanhamento e a execução das pesquisas, a
avaliação e análise dos resultados, a proposição de novas
linhas de pesquisa e o subsídio ao Comitê Gestor nos aspectos
técnicos.
A parceria com a Fiat e a Iveco foram fundamentais
para a montagem dos primeiros protótipos produzidos no
Brasil. Utilizando sua engenharia e conhecimentos na área
automotiva, as empresas integraram os componentes
eletrônicos da MES-DEA, parceira da KWO no projeto “Veículo
Elétrico”. Os protótipos, montados no Centro de Pesquisas e
Desenvolvimento de Veículos Elétricos (localizado nas
instalações da Itaipu Binacional), destinam-se à realização de
ensaios reais, com utilização, na prática, das inovações
desenvolvidas pelo projeto.
Após uma série de ações, que incluíram a
transformação do Fiat Palio Weekend em protótipo de veículo
elétrico, a homologação do protótipo junto ao Denatran, a
criação de infraestrutura básica para recarga dos veículos
53
54. elétricos, o treinamento básico para as empresas parceiras,
ações junto ao governo para propiciar a redução de impostos
para veículos não-poluentes e o desenvolvimento de protótipos
de veículos elétricos para pequenas cargas e miniônibus
elétricos, o projeto pode ser considerado um sucesso.
Atualmente, mais de 30 unidades do protótipo, tendo
como base o Fiat Palio Weekend, já estão nas ruas, integrando
a frota das empresas parceiras (Eletrobras, Itaipu Binacional,
Fiat, Copel, CPFL, Ampla e Light). Os protótipos do caminhão
para pequenas cargas (tendo por base o Daily, da Iveco) e do
miniônibus (com chassi do Daily e carroçaria da Mascarello) já
foram desenvolvidos e estão em fase de avaliação.
Foram desenvolvidos, ainda, sistemas de
condicionamento de ar para utilização em veículos elétricos –
nos quais os compressores tradicionais, acionados por motores
a explosão, não são aplicáveis – e protótipos nacionais de
power trains (sistemas de tração formados por conjuntos motor
e inversor) para uso nos veículos em desenvolvimento. Estão
em versão preliminar eletropostos que já permitem o
reabastecimento e, futuramente, permitirão a tarifação da
energia utilizada. E foram iniciados os estudos para verificar a
adequação do uso dos veículos elétricos no conceito smart
grid, com a integração à rede elétrica e a fontes alternativas.
Ao mesmo tempo em que os avanços já alcançados
apontam o sucesso da iniciativa, colocam no horizonte novos
desafios, exigindo novas pesquisas e orientando, assim, os
próximos passos da fecunda parceria criada. Ao longo do
desenvolvimento do projeto, a Eletrobras identificou, por
exemplo, que o ponto crucial do veículo elétrico está no
acumulador de energia, o que requer o uso de baterias com
tecnologia avançada. O desenvolvimento dessas baterias será
extremamente benéfico, já que elas se prestam não apenas
aos veículos elétricos, mas também à armazenagem de
54
55. energia de qualquer fonte, beneficiando, particularmente, a
geração eólica e a fotovoltaica, além de outras fontes de
energia alternativa.
O projeto desenvolvido constitui, por outro lado, uma
significativa análise de contexto sobre os desafios tecnológicos
a serem vencidos para transformar o Brasil num importante
player no segmento de veículos elétricos. O que se constatou é
que a indústria nacional encontra-se alinhada a boa parte das
modernas soluções utilizadas nos Estados Unidos e na Europa,
requerendo esforços complexos, porém compatíveis com o
cronograma projetado para este segmento.
No que tange às baterias modernas, aplicadas à tração
elétrica, existe uma grande lacuna na indústria nacional,
consequência sobretudo dos altos investimentos requeridos,
das incertezas relativas à produção e da inexistência de
mercado. Para fazer frente a esta fraqueza, a Eletrobras e a
Itaipu Binacional realizaram gestões junto ao Ministério de
Ciência e Tecnologia e à Finep para o desenvolvimento de
baterias modernas, utilizando o know how das parcerias
internacionais e criando infraestrutura e recursos humanos
necessários para o desenvolvimento e a produção, no Brasil,
de baterias de sódio.
Embora tenham sido pesquisadas outras baterias, as de
sódio, similares à Zebra, do fabricante MES-DEA, apresentam
vantagens insuperáveis frente a outros modelos: são
recicláveis, os materiais são facilmente utilizados na indústria,
apresentam peso reduzido quando comparadas às baterias de
chumbo ácido de mesma capacidade de armazenamento (um
terço do peso), não possuem efeito memória e usam matéria-
prima abundante.
Utilizando-se de mecanismos de transferência de
tecnologia, o projeto está em fase inicial de desenvolvimento e
é mais uma prova dos benefícios que podem advir da
55
56. importante parceria entre empresas públicas e privadas e
instituições de ensino. As empresas Eletrobras têm absoluta
crença na validade do projeto dos veículos elétricos e
continuarão investindo em pesquisa e desenvolvimento de
tecnologias, incentivando a formação de parcerias em benefício
do futuro de nosso país e do planeta.
Além das iniciativas com projetos desta natureza, tem
se verificado em outras partes do mundo para a fabricação de
carros elétricos, que dependem de investimentos no seu
desenvolvimento, mercado consumidor que viabilize a
fabricação e outros tipos de incentivos.
Estudos iniciais indicam que no Brasil um programa que
tenha uma abrangência para o desenvolvimento e a utilização
do carro elétrico, contribuiria com uma redução de cerca de 20
Mt de gás carbônico em veículos de passageiros e comerciais,
considerando-se uma frota de cerca de 10% utilizando esta
tecnologia. O tamanho do mercado automobilístico brasileiro,
as metas de redução previstas, a infraestrutura do sistema
elétrico nacional já disponível e a possibilidade da
competitividade das tarifas a serem praticadas seriam fatores
motivadores para que grandes montadoras instalassem seu
parque fabril no país.
A participação de entidades do governo e da iniciativa
privada na elaboração do plano, nas diversas vertentes do
conhecimento, é fator critico de sucesso, e uma empresa no
setor elétrico junto de outros catalisadores para o setor
automobilístico pode levar ao sucesso do programa. As
empresas Eletrobras têm absoluta crença na validade do
projeto dos veículos elétricos e continuarão investindo em
pesquisa e desenvolvimento de tecnologias, incentivando a
formação de parcerias em benefício do futuro de nosso país e
do planeta.
56