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Conflitos Sociais e a Violência Institucional: a Criminalização dos Movimentos
Sociais

Alessandra Lucena Wolff
Talitha Selvati Nobre Mendonça
Graduandas em Direito na Universidade de Brasília –
UnB.
Contato:
ale_wolff@yahoo.com.br
e
talitha_selvati@hotmail.com

RESUMO: O presente artigo tem a pretensão de analisar a criminalização dos movimentos
sociais e a conseqüente violência institucional das agências do sistema de segurança pública.
Em primeiro plano, a criminalização se entende como um processo permeado por interesses
de grupos que detêm poder junto ao Estado, que acabam por transferir aspectos de conflitos
sociais do plano político reivindicatório para o âmbito da criminalidade. Esta criminalização é
gerada como conseqüência do afastamento político do Estado frente aos ideais sociais,
gerando um descompasso entre a ordem jurídica ideal de Estado Democrático de Direito e a
realidade política. Neste contexto, há que se considerar a importância dos movimentos sociais
na externalização das necessidades negligenciadas pelo Estado. Em nosso país, ganha
destaque o MST, movimento execrado pela opinião pública e considerado criminoso pelo
cidadão médio. Esta posição se reflete no sistema penal, que vai além do conjunto de normas,
abrangendo a atividade jurisdicional oficial e as diversas formas de reação social. Assim, a
ação violenta das agências do sistema de segurança pública demonstra nada mais que a
criminalização simulada de um movimento precipuamente político como o MST. Deste
modo, o sistema penal se reduz ao papel de controle social, ao transformar conflitos que
evidenciam problemas não supridos pela deficiência estatal em crimes como forma de
contenção tanto do debate público da questão quanto da própria ação do movimento.
PALAVRAS-CHAVE: criminalização, movimentos sociais, violência institucional e MST.
“E foi assim que o operário
Do edifício em construção
Que dizia sempre sim
Começou a dizer não (...)
Razão porém que fizera
Em operário construído
O operário em construção.”
Vinícius de Moraes
INTRODUÇÃO

Os acontecimentos recentes no Rio Grande do Sul impõem uma discussão
acerca do papel do MST como movimento social, inserido no processo de efetivação e
reconhecimento de direitos negligenciados, como pauta dos Direitos Humanos. Afastando-se
do objetivo de legitimar todas as ações do MST, este trabalho se presta à discussão da
criminalização de um movimento social de extrema relevância, que se compara a uma
mordaça para impedir a expressão de desigualdades e constantes violações de garantias
fundamentais previstas na própria Constituição da República.
Nesse sentido, faz-se necessário um estudo dos Direitos Humanos, e de seu
caráter histórico para a compreensão de que os direitos nasceram da luta e da reivindicação de
grupos sociais marginalizados pelos detentores do poder, que somente com a persistência
dessas lutas os direitos foram finalmente consolidados.
A função da jurisdição em cada diferente Estado de Direito, deste modo,
reflete as tendências políticas dominantes de cada período, cuja transformação exige atuação e
organização social. No atual paradigma do Estado Democrático de Direito, ganha especial
relevância a utilização do espaço público para a expressão de necessidades ainda não
reconhecidas e providas pelo Estado. Essa área livre para a comunicação deve ser
possibilitada pela atuação estatal, pois só assim a democracia pode ser efetivada com a
participação de variados grupos.
Desse modo, percebe-se o papel catalisador para a geração de mudanças
desempenhado pelos movimentos sociais, pois têm o condão de agregar pessoas em torno de
objetivos que somente ganham relevância a partir de uma expressão forte em conjunto. O
MST leva o título de maior movimento social da América Latina, é reconhecido
internacionalmente inclusive por entidades como a UNICEF, mas antagonicamente dentro de
seu país de origem é renegado e marginalizado à condição de criminalidade.
Esse processo de criminalização é desempenhado principalmente pelos
órgãos de controle social formais e informais, sistema penal e mídia, respectivamente,
conforme interesses das classes latifundiárias que atuam pela manutenção da desigualdade de
distribuição de terras, fenômeno cuja consolidação se dá a mais de 500 anos.
A compreensão desse quadro exige o estudo de teorias criminológicas
contemporâneas, desvendando a criminalização do MST e de tantos outros movimentos
sociais como um processo social, político e jurídico que resulta no não reconhecimento das
necessidades do outro, o que leva à negação de que os nossos direitos também são deveres em
relação ao outro - perspectiva de alteridade. Dessa feita, urge a utilização do espaço público
como espaço efetivamente democrático, no qual situações conflituosas possam ser discutidas
e reconhecidas, e não serem relegadas ao limbo da criminalidade. A criminalização se trata,
finalmente, de um subterfúgio para bloquear o acesso de grupos minoritários, muitas vezes
representados por movimentos sociais, à interação que caracteriza a democracia real e efetiva.
TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS SOB UMA PERSPECTIVA DOS DIREITOS
HUMANOS
Os Direitos Humanos devem ser compreendidos primeiramente sob uma
perspectiva de desigualdade, seja ela econômica, social ou política, para que entendamos
como os mecanismos reivindicatórios se transformam em instrumentos transformadores e
garantidores de direitos, mesmo que mínimos, aos grupos majoritariamente rechaçados.
Como proposto por Carbonari, o núcleo dos Direitos Humanos tem sua raiz
na construção do reconhecimento. Assim, busca-se identificar as disparidades e as
dissonâncias a fim de provocar uma harmonização dos interesses contrários. Há ainda que se
considerar, nesse processo de reconhecimento, a identificação de necessidades anteriormente
inexistentes ou tão reprimidas que não se deixam identificar pela maioria da população, uma
vez que esta, geralmente, se encontra a mercê das manipulações da mídia.
Surge, desta maneira, a questão da alteridade como conseqüência da
necessidade de interação decorrente dessa construção do reconhecimento. Considerando o
paradigma de Estado Democrático de Direito no qual vivemos, se pretende efetivamente ser
democrático, não pode ser visto apenas sob um enforque individual, mas, necessariamente,
sob uma perspectiva interacionista em que um indivíduo reconhece e legitima os interesses do
outro como seu próprio direito e dever.
A compreensão plena da diversidade e da garantia dos direitos abrange a
apreensão de que estes também são deveres com relação ao outro e que nossos direitos e
deveres nascem juntos. A importância dos movimentos de reivindicação social se dá na
percepção de que somos iguais não só formalmente, mas também materialmente. Desta forma,
compreender e estudar os direitos humanos perpassa necessariamente por uma re-significação
interna, por um processo de auto-conhecimento e de ruptura de pré-conceitos.
O conteúdo e o processo histórico dos Direitos Humanos é outra
característica que não pode ser esquecida. Os Direitos Humanos foram e são constantemente
construídos pela luta incessante contra o descaso, a exploração e a espoliação de determinados
grupos por outros, os quais detêm o poder junto ao Estado e exercem grande influência
perante a mídia.
Nesse contexto, cabe fazer uma breve referência ao aspecto político dos
Direitos Humanos, o qual engloba tanto a perspectiva do Estado como garantidor da
efetividade desses direitos quanto a perspectiva das escolhas dos núcleos das relações
jurídicas e sociais que devem predominar - sujeito ou propriedade.
Com relação ao primeiro enfoque, o Estado possui a responsabilidade de
garantir, promover e proteger os direitos dos cidadãos e reparar os danos sofridos por eles.
Assim, o Estado possui obrigações em relação aos cidadãos, além de limitações no seu poder.
Deste modo, ao espaço público é conferida extrema relevância como palco de reivindicações
e de exercício da cidadania. É nele que podemos exigir o devido cumprimento das obrigações
do Estado e mostrar as novas carências sociais. Portanto, junto ao grande valor dado ao
espaço público, reconhece-se a importância do exercício da cidadania. Os Direitos Humanos
assim entendidos são um convite à ação e à participação social.
Quanto ao segundo aspecto, ocorre uma tentativa de inversão da lógica
capitalista, conferindo às relações sociais, econômicas, jurídicas ou políticas um núcleo
centrado nos sujeitos de direito e não mais na propriedade1. Outro viés deste aspecto é o
próprio reconhecimento de que há violação de direitos e, por conseguinte, há pessoas em
estado de violação de garantias fundamentais.
A importância desse reconhecimento se reflete na aceitação e na
compreensão de que os conflitos são reflexo natural da existência de dissensões e
desigualdades, pois, caso não se reconheça a importância da externalização das necessidades
negligenciadas pelo Estado, criminalizam-se condutas, como a de movimentos sociais, além
de reforçar o estado de opressão e a idéia de eliminação desses grupos.
Há também, conforme Carbonari, um aspecto normativo dos Direitos
Humanos. A positivação desses direitos historicamente confere um mínimo de garantia para a
possibilidade do seu exercício e o eixo dessa garantia é uma “exigência basilar referenciada
na dignidade humana dos sujeitos de direito”2. No entanto, quem são hoje, no Brasil, os
titulares desses direitos?
Em cada época sabemos que há diferentes titulares dos direitos humanos.
Na medida em que vamos convivendo em sociedade nos damos conta das nossas necessidades
1
2

Entenda propriedade como toda e qualquer relação patrimonial ou mercadológica.
CARBONARI (2001; p. 2)
e das necessidades do outro. Com as diversas convenções e tratados internacionais surgiram
novos sujeitos de direito, novos titulares de direitos e, principalmente, e talvez primeiramente,
novos atores e autores sociais.
Assim, paulatinamente os negros foram considerados cidadãos; as mulheres
passaram a ser titulares do exercício de direitos como o voto; os índios passaram a existir
como sujeitos com sua cultura própria (afirmação que ainda é um pouco questionável e difícil
de ser generalizada devido a alguns acontecimentos recentes); etc.
A idéia de que os direitos humanos e seus titulares são uma construção que
se dá por meio de conquistas é fundamental para garantir a fluidez do espaço público. Seus
atores/autores sociais são aqueles que querem fazer ouvir suas vozes, que gritam socorro, que
gritam “eu existo”, até que sejam ouvidos, até que sejam vistos...
Dessarte, os direitos humanos são uma busca pela compreensão do outro,
pela compreensão da diversidade e pela compreensão de si próprio como um ser também
dotado de necessidades e de preconceitos, mas que é capaz de perceber que existe em
sociedade porque existe com o outro e que os direitos e deveres de ambos estão interligados e
não são, e nem podem ser, maiores ou melhores que os direitos dos demais.
Dentro disto, sem considerar a historicidade dos direitos humanos e sem o
esforço pela busca da compreensão do outro, da alteridade, cai-se no senso comum de que
“direitos humanos é coisa de bandido”3, afirmação que, segundo Carbonari, está na base da
criminalização da luta social.

O ESTADO E A FUNÇÃO JURISDICIONAL

A historicidade dos Direitos Humanos é simultânea à transformação e
consolidação dos paradigmas dos diferentes Estados de Direito a partir da adoção e aplicação
do princípio da legalidade como fundamento de organização do Estado, que se tornou
submisso às normas jurídicas. Todavia, o conteúdo das regras variou de acordo com a
ideologia preponderante em dado modelo histórico, o que originou os diferentes tipos de
Estado de Direito, denominados como Estado Liberal, Social, Democrático ou Neoliberal.
O primeiro modelo de Estado de Direito tem em seu conteúdo inicial traços
do liberalismo, característica justificada em sua origem nos movimentos sociais burgueses. Os
elementos essenciais na formação da concepção do Estado Liberal são a doutrina da separação
3

CARBONARI (2001; p. 8)
entre Estado e Sociedade, a garantia das liberdades individuais, a intervenção mínima do
estado na sociedade, o primado da lei e a adoção do princípio da igualdade formal, ou seja, a
igualdade perante a lei. Estes aspectos identificam no liberalismo uma reação à forma de
atuação do Estado Absolutista, que tinha poderes ilimitados.
Neste momento, buscou-se a previsibilidade do direito, com o objetivo de
impedir o arbítrio dos juízes, o que originou as grandes codificações. A forma de atuação dos
juízes era caracterizada por uma postura de inércia frente à condução do processo, de acordo
com o ideal do Estado não intervencionista. Deste modo, o juiz mantinha-se eqüidistante do
processo e das partes, deixando que as mesmas conduzissem o processo de acordo com sua
capacidade e possibilidade técnica, econômica e social. Nesta concepção liberal, o direito se
identificava com a lei e o ideal de justiça não precisava ser buscado, pois já estava fixado na
ordem posta. A função jurisdicional se caracterizava como a simples administração da lei por
um operador neutro e imparcial.
Todavia, as graves crises sociais, econômicas e políticas ocorridas a partir
da década de 20 fortaleceram a idéia do Estado Social, caracterizado pela defesa dos
interesses sociais em detrimento dos interesses individuais. Buscou-se a efetivação das
garantias fundamentais obtidas no Estado Liberal, que até então eram meramente formais.
Foram mantidas as conquistas anteriores, mas com um enfoque social no qual o Estado
assumiu um papel de regulador das regras sociais e econômicas, necessidade decorrente do
desequilíbrio e do distanciamento das classes sociais que ocorreu com o liberalismo.
O bem-estar social somente ocorre com a efetivação das garantias mediante
mecanismo de implantação, buscando instrumentos de proteção para as classes
economicamente desfavorecidas. O Estado passou a ter uma atuação positiva de defesa dos
interesses sociais.
O Estado Democrático de Direito surge do novo enfoque surgido com o
papel protagonista do Estado como agente transformador da sociedade, perseguindo os
objetivos de construção de uma sociedade livre, justa e solidária. O traço essencial na busca
desta transformação é a participação popular nos centros de poder como fator legitimador da
ordem política, econômica, social e jurídica. No Brasil, a Constituição Federal de 1988 adotou
o Estado Democrático de Direito, como se pode inferir da leitura do art. 1 o, que expõe os
objetivos fundamentais.
No entanto, apesar da adoção legal e formal do Estado Democrático de
Direito, a sociedade brasileira encontra-se repleta de valores do Estado Neoliberal,
caracterizado por uma relativização da soberania popular ante as pressões externas no campo
político, econômico e social. Deste modo, este enfraquecimento do Estado Democrático,
como centro de poder, influencia a jurisdição, que é a expressão do poder estatal na imposição
de suas decisões, que entra numa crise de efetividade.
A mudança ideológica da aplicação do Direito decorre das mudanças
históricas de orientação da função da jurisdição nos diversos Estados de Direito. Segundo
Luciana Camponêz P. Moralles:

“A função jurisdicional é expressão do poder estatal e utiliza-se do processo como
instrumento para a consecução dos valores consagrados pelo modelo de Estado
adotado por uma nação, bem como é o espaço legítimo para efetivá-los.”4

Neste contexto, a jurisdição tem objetivos políticos, sociais e jurídicos
dependendo do conteúdo do Estado pelo qual ela se manifesta. Portanto, um dos desafios da
modernidade seria a harmonização das regras jurídicas com as normas constitucionais de um
Estado Democrático de Direito, que tem ênfase nos valores sociais e na participação
democrática, sem todavia olvidar as implicações advindas dos valores neoliberais que
permeiam a sociedade. Um grande óbice a transpor é aplicar os preceitos jurídicos e
constitucionais que defendem a criação de uma sociedade livre, justa e solidária, no contexto
de uma realidade social e economicamente injusta.
O modelo de Estado Democrático de Direito beneficiou sobretudo as classes
populares, com o reconhecimento de diversos direitos individuais e sociais. Todavia, sem
instrumentos aptos a concretizar os novos direitos sociais e econômicos, estes se tornam
meras declarações políticas.
Esta perspectiva se torna importante devido à incompatibilidade destes dois
modelos de Estados, pois as acentuadas desigualdades econômicas, sociais e culturais,
impedem o efetivo acesso à justiça. No aspecto tocante à conscientização dos usuários sobre
os seus direitos, esta é difícil no contexto em que grande parte da população vive em
condições de pobreza.
Os movimentos sociais são grandes catalisadores de mudanças nesse
ambiente, tendo em vista o decisivo papel de conscientização e agrupamento das pessoas em
4

MORALLES (2006; p.30)
torno de um objetivo comum. As exigências dos grupos ganham força, e na medida em que
passam a contrariar interesses de classes dominantes, exigem o desenvolvimento de uma
estratégia de combate, materializada na criminalização destes movimentos e de seus
participantes. A conseqüência é a repressão institucional, justificada pela conduta ter se
tornado um crime, realizada, contraditoriamente, pelo mesmo Estado que deveria abrigar as
pretensões populares democráticas.

MOVIMENTOS SOCIAIS E A IMPORTÂNCIA DO RECONHECIMENTO DO
CONFLITO

Primeiramente, temos que ressaltar a atuação dos movimentos sociais na
transformação dos contextos político, social e jurídico. Historicamente, os direitos nasceram
da luta contra o modelo vigente que não considerava determinadas pessoas como cidadãos,
como sujeitos de direito.
O conflito e seu reconhecimento e legitimação pelos detentores do poder
foram o motor de fundamentais transformações políticas (por exemplo, o impeachment do
presidente Collor), sociais (ações afirmativas) e jurídicas (lei Maria da Penha), dentre tantas
outras conquistas, fruto primeiro da organização popular e atuação de inúmeros movimentos
sociais ao longo da história.
Contudo, como ressalta Faleiros, o não reconhecimento do conflito gera a
violência. Esta, emerge como a “substituição da aceitação do conflito pela negação do outro” 5
.
“Quando se levantam para exigir lugar na sociedade, o fazem de forma equivocada –
usam a força, ocupam a propriedade privada, querem ficar em lugares que
atrapalham grandes e necessários projetos de desenvolvimento, querem cotas,
reparação, cadeia para maridos e companheiros – daí ser legítima a repressão, a
criminalização... a eliminação. É incrível como se arranjam motivos para que a
sociedade os mantenha (ou os elimine) de forma legítima fora da sociedade como
um problema social”6

Outra perspectiva é trazida por Sousa Junior7 ao tratar da idéia do conflito
como necessário à mudança social. Fortalecer a organização popular e alargar o acesso dos
5

FALEIROS (2004; p. 90)
CARBONARI (2001; p. 6)
7
SOUSA JUNIOR (2008; p. 20)
6
movimentos sociais aos instrumentos hábeis para a resolução dos conflitos significa garantir a
efetividade dos Direitos Humanos.
Fortalecer as manifestações sociais, as quais evidenciam as contradições e
as desigualdades ocasionadas pelo déficit gerado pelo não provimento estatal, é reconhecer
também que os problemas possuem um caráter positivo na medida em que refletem
necessidades de mudança.
Entretanto, não podemos olvidar que essas mudanças têm de possuir um
caráter emancipatório a fim de que não se engessem as conquistas e estas se transformem em
nova violação de direitos. Sabe-se que a positivação garante em certa medida a efetivação dos
Direitos Humanos, mas não se pode perder de vista que juntamente com seu viés
assecuratório, há também sua face repressiva e protelatória das transformações.
Portanto, essas conquistas sociais, que se dão por meio do reconhecimento
dos conflitos, devem ser impregnadas da idéia de um movimento de contínua transformação
do status quo, o que tem de acarretar um câmbio na maneira de pensar e agir daqueles que
lidam direta e indiretamente com esses movimentos sociais e da sociedade como um todo,
para que realmente sejam assegurados seus direitos e a constante alteração destes, necessidade
provocada pela dinamicidade que é própria das relações sociais.
Assim, percebe-se a importância das lutas e movimentos sociais, tanto no
seu valor histórico como atual, além da necessidade do reconhecimento das pequenas
conquistas e da constante necessidade de modificação das mesmas, para que o processo de
garantia dos direitos humanos seja um processo cotidiano, justo e ajustável.

O MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA (MST)
Acompanhando os pressupostos apresentados, o MST consolidou-se
como o movimento social de maior relevância na luta não só pela reforma agrária, mas
também pela “construção de um projeto popular para o Brasil, baseado na justiça social e na
dignidade humana”8.
Falar sobre o MST e seu papel na luta pela reforma agrária é reconhecer
a concentração fundiária como um processo que se consolidou no Brasil ao longo de mais de
mil e quinhentos anos. Por conseqüência desse processo, ocorreram diversos movimentos de
resistência como os quilombos, a guerrilha do Araguaia, Canudos, entre tantos outros que
8

Quem somos. 1984-2004: MST 20 anos de lutas, conquistas e dignidade! Disponível na internet, no site:
http://www.mst.org.br/mst/pagina.php?cd=4151
marcaram a história do nosso país como reflexo da opressão e criminalização dos seus
participantes e dos motivos pelos quais lutavam.
O MST surgiu em 1984, em Cascavel/PR. Houve uma reunião com
vários representantes de organizações camponesas na qual “reafirmaram a necessidade de
ocupação como ferramenta legítima dos trabalhadores e trabalhadoras rurais”9. A partir deste
momento as lutas sociais no campo passaram a ter uma sistemática unificada com objetivos e
linha de ação definidos.
Como já mencionado, a luta do MST não envolve apenas a reforma
agrária. Essa característica é fundamental para a compreensão da atuação do movimento. Eles
provocam um questionamento sobre a construção individual e individualista de diversas
esferas do espaço público e privado, como a violência de gênero, a cultura, a saúde, a terra.
Deste modo, exercem papel fundamental como motor de transformações sociais no Brasil.
Porém, como é sabido, a luta do MST não é fácil. Suas vitórias foram
conquistadas com um grande esforço no sentido de movimento contrário aos interesses da
classe dominante, principalmente, a ruralista. Obviamente sem considerar o importante papel
reacionário do judiciário e manipulador da mídia como freios para a concretização dos
objetivos do movimento - tentativa de garantia da dignidade da pessoa humana e efetivação
de direitos humanos garantidos pela própria Constituição.
Contudo, essa grande repressão interna não condiz com o reconhecimento
internacional dado ao movimento que já ganhou prêmios da UNICEF de comissões
internacionais de Direitos Humanos10, além de apoio internacional a sua atuação.
“(...) o MST não apenas tornou visível socialmente a sua identidade de sujeito
coletivo capaz de criar direitos, como logrou angariar o reconhecimento de
sua capacidade instituinte para o estabelecimento de novas práticas sociais e
políticas”11.

Apesar de sua grande relevância perante a comunidade internacional e
alguns setores da sociedade brasileira, o movimento contrário a sua atuação ainda é muito
grande. O cerceamento a sua atuação no Brasil ultrapassa o âmbito político. Ele também está
institucionalizado nos órgãos de controle social e resolução de conflitos, ou seja, o sistema
penal como um todo e o judiciário. Ambos contribuem para sua criminalização e repressão.

9

Idem.
MARTINS (2007; p.7)
11
SOUSA JUNIOR (2008; p. 21)
10
Como cita Sousa Santos, “os setores ligados à defesa da reforma agrária
apontam como um dos seus principais obstáculos a intervenção do judiciário a favor dos
fazendeiros, por vezes ignorando processos de assentamento já finalizados”12.
Entretanto, há tentativas, ainda pequenas, de alguns tribunais no sentido de
reconhecimento do significado jurídico da ação do MST. O próprio Superior Tribunal de
Justiça já proferiu decisões descriminalizadoras ao afirmar que “não pode ser considerado
esbulhador aquele que ocupa uma terra para fazer cumprir a promessa constitucional de
reforma agrária”13.
Conforme Sousa Santos, ocorre o chamado isolamento institucional do
Judiciário, que muitas vezes não faz cumprir as leis em favor de interesses políticos e passa,
em sua maioria, por uma grande insensibilização frente aos problemas apresentados pelos
movimentos sociais.
Como exemplo, temos alguns eventos recentes que chocaram a todos que
estão ligados de alguma forma ao MST. Um deles14, foi a declaração de um promotor gaúcho
ao classificar o MST como uma organização criminosa e considerá-lo como braço de
guerrilha da Via Campesina. Houve inclusive um relatório do Ministério Público em que uma
das propostas era a dissolução do Movimento dos Sem Terra. Apesar de esse pedido ter sido
retirado da ata em decisão proferida posteriormente, mantiveram-se os pedidos de proibição
de marchas e outras espécies de protestos em algumas cidades da região sul onde há
acampamentos do MST.
Essas declarações levaram o MST e mais onze organizações brasileiras de
direitos humanos a denunciarem à ONU e à Comissão Interamericana de Direitos Humanos
da Organização dos Estados Americanos (OEA) “a tentativa de criminalização dos
movimentos sociais e a parcialidade do Ministério Público gaúcho, as ações judiciais
impetradas contra os sem-terra e a violência de policiais contra trabalhadores”15.
Outra arbitrariedade ocorre em um processo contra oito integrantes do MST,
acusados pelo Ministério Público Federal de crimes contra a Lei de Segurança Nacional, o
qual corre em segredo de Justiça – é a revivificação de práticas típicas do período da Ditadura
Militar. Em contraponto, é necessário observar a declaração feita pelo próprio advogado do
12

SOUSA SANTOS (2007; p. 80-81)
SOUSA JUNIOR (2008; p. 44)
14
Terra magazine. MST é braço de guerrilha – acusa promotor gaúcho. 24 de junho de 2008. Disponível na
internet, no site: http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI2969059-EI6578,00.html
13

15

Notícias Uol. MST denuncia na OEA e na ONU tentativa de "criminalização" dos sem-terra. 24 de
julho de 2008. Disponível na internet, no site:
http://noticias.uol.com.br/ultnot/2008/07/24/ult23u2558.jhtm
MST ele afirma: "Não temos nada contra o MP processar e condenar aqueles que cometem
crimes durante ação [do MST]. Lutamos contra a criminalização do movimento e de oito
pessoas por elas integrarem o movimento"16.
Percebe-se,

portanto,

uma

convergência

de

diversos

atores

políticos/jurídicos para a criminalização e despolitização dos conflitos evidenciados pela ação
do MST. Mas, como esclarece Sousa Junior, não cabe julgar as opções de ação adotadas pelo
movimento uma vez que essa escolha integra sua esfera de autonomia.
O fundamental é “não perder-se de vista o sentido político dessa ação,
incompreendida pela incapacidade de quem governa de agir politicamente no espaço público,
único âmbito em que se pode avaliar a legitimidade das ações”17.
O espaço público é, deste modo, o lugar de exercício da autonomia dos
indivíduos. É também, e talvez acima de tudo, um espaço de interação, de vivência “que ao
ser reivindicado para a vida humana transforma a multidão de solitários urbanos em povo”18.
É nesse espaço de exercício da alteridade que se projetam as relações
dialógicas típicas das sociedades que se constituem efetivamente democráticas. É nele que se
concebem situações de conflito e reconhecimento de desigualdades que não são
criminalizáveis pelo simples fato de existirem como movimento fluido de exposição da
diferença e das mazelas da sociedade.

MÍDIA, SISTEMA PENAL E CRIMINALIZAÇÃO

No contexto fático explorado acima, percebe-se que quanto mais próximo
do conflito, maior a tendência da esfera de controle social formal (o Sistema Penal)
criminalizar as condutas, provavelmente por seu possível envolvimento, no mínimo
ideológico, com a negação da causa do MST. São realizados procedimentos pouco técnicos e
parciais, com caráter de perseguição política e ideológica. Todavia, quanto mais distante do
conflito, mais isenta e objetiva é a decisão dos Tribunais, que, inclusive, em várias decisões,
assim como o exemplo do STJ, declaram explicitamente o caráter parcial das prisões e
processos contra os integrantes e dirigentes do movimento.

16

Idem
SOUSA JUNIOR (2008; p. 22)
18
SOUSA JUNIOR (2008; p. 96)
17
No tocante ao controle social informal, realizado pela mídia, nota-se que se
baseia nos dados do Sistema Penal local (prisões e processos), ainda que ilegais, e sua
divulgação contribui para produzir aversão ao movimento e manter a lógica de
criminalização. Este fato corrobora-se pelo fato de que o MST recusa-se a cortejar a imprensa,
tanto pequena (local), quanto grande, por considerá-la parcial. Dessa forma, percebe-se que a

instância de controle social informal mídia/imprensa, cujo papel é central na formação do
imaginário social e do ambiente comunicativo, em muitos casos, tem expressado o interesse
da classe dominante latifundiária, reproduzindo e ampliando o processo de criminalização.

TEORIAS CRIMINOLÓGICAS E O PROCESSO DE CRIMINALIZAÇÃO

Esse processo de criminalização pode ser analisado pela conciliação de
aspectos de teorias criminológicas mais liberais, como a Teoria estrutural-funcionalista, de
Emile Durkheim, ou a Teoria do labeling approach, com a Criminologia Crítica,
considerando a aproximação entre elas no que se refere à fundamentação desse processo.
Durkheim foi responsável pela virada na direção sociológica efetuada pela
criminologia contemporânea, que deixou de buscar as causas das infrações das normas sociais
em fatores naturais e bioantropológicos como raça e clima. Segundo a Teoria estruturalfuncionalista do desvio, esse é um fenômeno normal de toda estrutura social. Somente quando
são ultrapassados determinados limites o desvio se torna negativo para a estrutura social,
seguindo-se um estado de desorganização no qual as regras de conduta perdem valor –
anomia.
Deste modo, o comportamento inovador dos movimentos sociais e,
especificamente, do MST, surge a partir da sua não-conformidade com o que está imposto
enquanto realidade sócio-econômica do país. O grupo desviante é preocupante para aqueles
que detêm o controle social, ou seja, que determinam ou influenciam as normas sociais, e que
querem regular o desvio. Quanto mais acentuado o desvio, mais perturba o controle social, o
que leva à uma atuação mais intensa das agências de controle institucionalizado ou difuso, ou
seja, Sistema Penal e mídia respectivamente. A criminalização do desvio ocorre, então, para
delimitar “o inimigo”.
Enquanto crime, a conduta de não-conformidade se torna um alvo mais
fácil. O controle social passa a exercer funções sociais mais bem delimitadas: ativa a “reação
social”, trazendo “coesão” à sociedade, que assume o criminoso como um potencial
desestruturador do grupo social e define claramente o que não pode passar de fato social
normal para norma social (se todos aqueles nas mesmas condições às dos integrantes do MST
resolvessem aderir ao movimento, o que aconteceria?), sob pena de termos uma situação
“anômica”. Como função indireta, antecipa conceitos futuros e impede o processo de
mudança social.
Portanto, para o controle social, criminalizar a conduta desviante do MST
implica em sustar o andamento do “caos social da anomia”. Por sua vez, os sujeitos que
exercem esse controle identificam-se com os latifundiários e a elite conservadora a eles
vinculada, o que justifica a compreensão do questionamento do caráter absoluto da
propriedade privada como o “caos social”.
A Teoria de Emile Durkheim pode ser complementada pela Teoria do
labeling approach. Nesta vertente, afirma-se a existência de um duplo processo de
criminalização realizado pelas instâncias de controle social formal e informal, do qual decorre
o “etiquetamento”, criando-se para os indivíduos o status de criminosos sempre que
submetidos a este duplo processo.
A primeira etapa é da criminalização primária, que se dá no âmbito
legislativo. Trata-se do exercício do controle social na definição do objeto tutelado pelo
Sistema Penal, através das leis. Cumpre ressaltar que a maioria dos crimes praticados (cerca
de 80 a 90%) não são descobertos, compondo a chamada “Cifra Oculta da Criminalidade”.
Como exemplo, o uso de atestado médico falso para não realizar uma justificar ausência no
trabalho, é crime tipificado no Código Penal, tanto para o médico, quanto para aquele que se
vale do atestado (art. 302 e 304, CP), mas a grande maioria dos casos nunca foram punidos ou
sequer indiciados pelo Sistema Penal. Isso ocorre devido ao segundo momento do processo de
criminalização, que é o da seleção pelo perfil social dos transgressores, sempre pobres,
negros, loucos, vadios, violentos e irracionais, ou seja, aqueles marginalizados pela sociedade.
Nesse contexto, a conduta de reivindicação por novos direitos, como o
direito à terra, é interpretada valorativamente pela reação social como contrária ao
comportamento normal, ou seja, aquele predeterminado pelas estruturas sociais/controle
social, passando a ser considerada criminosa se os indivíduos que as praticarem preencherem
o “perfil” social transgressor. Verifica-se claramente que o controle social feito pela polícia e
Justiça de primeira instância atua exatamente deste modo, principalmente por reagirem ao
suposto “desvio moral” e à “ousadia” de um grupo social com perfil transgressor. O fato de os
sujeitos serem pobres, miseráveis, por si só já cria a carga estigmatizadora para o processo de
criminalização secundária. Assim, é imediata sua adequação ao duplo processo.
A explicação do fenômeno da criminalização do MST é realizada por essas
duas teorias criminológicas, mas de maneira parcial. Sua insuficiência decorre da
incapacidade de demonstrar que o processo de criminalização gera a despolitização do
conflito, sem evidenciar seu lugar epistemológico (o de controle social), já que são teorias da
reação social e não salientam o enfoque materialista do fenômeno criminoso.
Neste ponto, faz-se mister ressaltar o papel da Criminologia Crítica ao
romper com esse pressuposto teórico das teorias liberais, buscando compreender o fenômeno
sob o enfoque econômico-político dos comportamentos socialmente negativos. A
criminalidade, no enfoque da Criminologia Crítica, é entendida como um status atribuído a
indivíduos através da mesma dupla seleção da Teoria do labeling approach, mas desvenda o
pressuposto não evidenciado anteriormente, o elemento norteador e fundante do duplo
processo de criminalização na sociedade capitalista. Na lição de Andrade:

“A criminologia crítica recupera, portanto, a análise das condições objetivas,
estruturais e funcionais que originam, na sociedade capitalista, os fenômenos de
desvio, interpretando-os separadamente conforme se tratem de condutas das classes
subalternas ou condutas das classes dominantes (a chamada criminalidade de
colarinho branco, dos detentores do poder econômico e político, a criminalidade
organizada, etc).”19

A primeira etapa da criminalização ocorre através da seleção do bem
jurídico protegido como o de maior relevância: a propriedade, pilar fundamental de um
Estado capitalista. Deste modo, sua ofensa, com a luta pela reforma agrária e o fim do
latifúndio improdutivo, repercute na necessidade de criminalizar qualquer ato deste caráter. O
segundo aspecto da seleção criminalizante se dá com a estigmatização daqueles indivíduos
que, por pertencerem a determinadas classes sociais, tendem a ser clientes do sistema penal,
principalmente se eles não se adequarem aos vários mecanismos de disciplina que moldam o
indivíduo à sociedade, como escola, família, igreja e trabalho. Sendo o indivíduo despossuído
de propriedade, pobre, sem emprego, só pode ser definido como “vadio”, “baderneiro”,
“vagabundo”, conseqüentemente, criminoso.

19

ANDRADE (2003, p. 217)
Evidentemente que neste processo de criminalização não são cogitadas os
obstáculos de socialização numa estrutura em que as instituições disciplinares se fragmentam
pelas contradições do capitalismo e as desigualdades sociais crescem em escala exponencial.
Ao contrário, o controle social aciona o processo de criminalização tanto pelo ato do
questionamento do modelo de dominação e de marginalização, quanto pelo status dos
questionadores, os trabalhadores rurais sem-terra, pois transgrediram ao máximo a disciplina.
Deste modo, a multiplicidade teórica se completa para a explicação da
criminalização dos integrantes do MST.

CONCLUSÃO

Com a exposição acima pretendemos contribuir para a discussão e
conscientização acerca do evidente processo de criminalização instaurado contra o
Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra e tantos outros movimentos sociais que
possuem suas atuações represadas quando incorrem em movimento contrário às normas e
interesses prevalentes.
Com isso, busca-se o reconhecimento dos conflitos como algo positivo e
transformador, no sentido de evidenciar o déficit de provimento do Estado. É de suma
importância o reconhecimento do espetáculo envolvido por trás da atuação de movimentos
como o MST. A criminalização dos conflitos reforçada pela mídia e pelo sistema penal como
um todo, gera a formação de uma opinião publica negativa, uma vez que esses agentes, muitas
vezes, mantém propositalmente obscuros os reais interesses das ações de organizações
populares.
Uma vez revelados o evidente processo de criminalização e os reais motivos
que levam ao surgimento dos conflitos sociais, buscamos evidenciar a necessidade de
questionamento acerca dos posicionamentos de grupos contrários e a favor dessas ações, além
da necessidade de auto-questionamento acerca dos nossos pré-conceitos e de sua conseqüente
influência na ratificação do não cumprimento de garantias fundamentais previstas na
Constituição.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDRADE, Vera Regina Pereira de. A Ilusão de Segurança Jurídica: do controle da violência à violência
do controle penal. 2º edição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.
BARATTA, Alessandro. Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal. 3º edição. Rio de Janeiro: Editora
Revan, 2002.
CARBONARI, Paulo César. Direitos Humanos no Brasil: uma leitura enfoca e em perspectiva da situação.
O texto originalmente foi elaborado para o Seminário Pensando uma Agenda para o Brasil: Desafios e
Perspectivas, promovido pelo Instituto de Estudos Sócio-Econômicos (INESC), realizado em junho de 2007.
FALEIROS, Vicente de Paula. A Questão da Violência In: Educando para os Direitos Humanos: pautas
pedagógicas para a cidadania na Universidade. Brasília: Síntese, 2004.
MARTINS, Daniele Comin. A Criminalização dos Movimentos Sociais e a Luta por Terras do MST no
Interior do Paraná – o caso de Quedas do Iguaçu. Revista Ciências Sociais Aplicadas em Revista. ISSN
1679-348X V. 07, n. 11 Jan./Jun. 2007.
MORALLES, Luciana Camponez Pereira. Acesso à justiça e Princípio da Igualdade. Porto Alegre: Sergio
Antonio Fabris Editor, 2006.
Notícias Uol. MST denuncia na OEA e na ONU tentativa de "criminalização" dos sem-terra. 24 de julho de
2008. Disponível na internet, no site:
http://noticias.uol.com.br/ultnot/2008/07/24/ult23u2558.jhtm. Acesso

em 02 de agosto de 2008.

Quem somos. 1984-2004: MST 20 anos de lutas, conquistas e dignidade! Disponível na internet, no site:
http://www.mst.org.br/mst/pagina.php?cd=4151. Acesso em 02 de agosto de 2008.
SOUSA JUNIOR, José Geraldo. Idéias para a cidadania e para a justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris,
2008.
SOUSA SANTOS, Boaventura. Para uma Revolução Democrática da Justiça. São Paulo: Cortez, 2007.
Terra magazine. MST é braço de guerrilha – acusa promotor gaúcho. 24 de junho de 2008. Disponível na
internet, no site: http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI2969059-EI6578,00.html. Acesso em 02 de
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Politica institucional e o conflito social no Brasil

  • 1. Conflitos Sociais e a Violência Institucional: a Criminalização dos Movimentos Sociais Alessandra Lucena Wolff Talitha Selvati Nobre Mendonça Graduandas em Direito na Universidade de Brasília – UnB. Contato: ale_wolff@yahoo.com.br e talitha_selvati@hotmail.com RESUMO: O presente artigo tem a pretensão de analisar a criminalização dos movimentos sociais e a conseqüente violência institucional das agências do sistema de segurança pública. Em primeiro plano, a criminalização se entende como um processo permeado por interesses de grupos que detêm poder junto ao Estado, que acabam por transferir aspectos de conflitos sociais do plano político reivindicatório para o âmbito da criminalidade. Esta criminalização é gerada como conseqüência do afastamento político do Estado frente aos ideais sociais, gerando um descompasso entre a ordem jurídica ideal de Estado Democrático de Direito e a realidade política. Neste contexto, há que se considerar a importância dos movimentos sociais na externalização das necessidades negligenciadas pelo Estado. Em nosso país, ganha destaque o MST, movimento execrado pela opinião pública e considerado criminoso pelo cidadão médio. Esta posição se reflete no sistema penal, que vai além do conjunto de normas, abrangendo a atividade jurisdicional oficial e as diversas formas de reação social. Assim, a ação violenta das agências do sistema de segurança pública demonstra nada mais que a criminalização simulada de um movimento precipuamente político como o MST. Deste modo, o sistema penal se reduz ao papel de controle social, ao transformar conflitos que evidenciam problemas não supridos pela deficiência estatal em crimes como forma de contenção tanto do debate público da questão quanto da própria ação do movimento. PALAVRAS-CHAVE: criminalização, movimentos sociais, violência institucional e MST.
  • 2. “E foi assim que o operário Do edifício em construção Que dizia sempre sim Começou a dizer não (...) Razão porém que fizera Em operário construído O operário em construção.” Vinícius de Moraes
  • 3. INTRODUÇÃO Os acontecimentos recentes no Rio Grande do Sul impõem uma discussão acerca do papel do MST como movimento social, inserido no processo de efetivação e reconhecimento de direitos negligenciados, como pauta dos Direitos Humanos. Afastando-se do objetivo de legitimar todas as ações do MST, este trabalho se presta à discussão da criminalização de um movimento social de extrema relevância, que se compara a uma mordaça para impedir a expressão de desigualdades e constantes violações de garantias fundamentais previstas na própria Constituição da República. Nesse sentido, faz-se necessário um estudo dos Direitos Humanos, e de seu caráter histórico para a compreensão de que os direitos nasceram da luta e da reivindicação de grupos sociais marginalizados pelos detentores do poder, que somente com a persistência dessas lutas os direitos foram finalmente consolidados. A função da jurisdição em cada diferente Estado de Direito, deste modo, reflete as tendências políticas dominantes de cada período, cuja transformação exige atuação e organização social. No atual paradigma do Estado Democrático de Direito, ganha especial relevância a utilização do espaço público para a expressão de necessidades ainda não reconhecidas e providas pelo Estado. Essa área livre para a comunicação deve ser possibilitada pela atuação estatal, pois só assim a democracia pode ser efetivada com a participação de variados grupos. Desse modo, percebe-se o papel catalisador para a geração de mudanças desempenhado pelos movimentos sociais, pois têm o condão de agregar pessoas em torno de objetivos que somente ganham relevância a partir de uma expressão forte em conjunto. O MST leva o título de maior movimento social da América Latina, é reconhecido internacionalmente inclusive por entidades como a UNICEF, mas antagonicamente dentro de seu país de origem é renegado e marginalizado à condição de criminalidade. Esse processo de criminalização é desempenhado principalmente pelos órgãos de controle social formais e informais, sistema penal e mídia, respectivamente, conforme interesses das classes latifundiárias que atuam pela manutenção da desigualdade de distribuição de terras, fenômeno cuja consolidação se dá a mais de 500 anos. A compreensão desse quadro exige o estudo de teorias criminológicas contemporâneas, desvendando a criminalização do MST e de tantos outros movimentos sociais como um processo social, político e jurídico que resulta no não reconhecimento das
  • 4. necessidades do outro, o que leva à negação de que os nossos direitos também são deveres em relação ao outro - perspectiva de alteridade. Dessa feita, urge a utilização do espaço público como espaço efetivamente democrático, no qual situações conflituosas possam ser discutidas e reconhecidas, e não serem relegadas ao limbo da criminalidade. A criminalização se trata, finalmente, de um subterfúgio para bloquear o acesso de grupos minoritários, muitas vezes representados por movimentos sociais, à interação que caracteriza a democracia real e efetiva. TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS SOB UMA PERSPECTIVA DOS DIREITOS HUMANOS Os Direitos Humanos devem ser compreendidos primeiramente sob uma perspectiva de desigualdade, seja ela econômica, social ou política, para que entendamos como os mecanismos reivindicatórios se transformam em instrumentos transformadores e garantidores de direitos, mesmo que mínimos, aos grupos majoritariamente rechaçados. Como proposto por Carbonari, o núcleo dos Direitos Humanos tem sua raiz na construção do reconhecimento. Assim, busca-se identificar as disparidades e as dissonâncias a fim de provocar uma harmonização dos interesses contrários. Há ainda que se considerar, nesse processo de reconhecimento, a identificação de necessidades anteriormente inexistentes ou tão reprimidas que não se deixam identificar pela maioria da população, uma vez que esta, geralmente, se encontra a mercê das manipulações da mídia. Surge, desta maneira, a questão da alteridade como conseqüência da necessidade de interação decorrente dessa construção do reconhecimento. Considerando o paradigma de Estado Democrático de Direito no qual vivemos, se pretende efetivamente ser democrático, não pode ser visto apenas sob um enforque individual, mas, necessariamente, sob uma perspectiva interacionista em que um indivíduo reconhece e legitima os interesses do outro como seu próprio direito e dever. A compreensão plena da diversidade e da garantia dos direitos abrange a apreensão de que estes também são deveres com relação ao outro e que nossos direitos e deveres nascem juntos. A importância dos movimentos de reivindicação social se dá na percepção de que somos iguais não só formalmente, mas também materialmente. Desta forma, compreender e estudar os direitos humanos perpassa necessariamente por uma re-significação interna, por um processo de auto-conhecimento e de ruptura de pré-conceitos. O conteúdo e o processo histórico dos Direitos Humanos é outra característica que não pode ser esquecida. Os Direitos Humanos foram e são constantemente
  • 5. construídos pela luta incessante contra o descaso, a exploração e a espoliação de determinados grupos por outros, os quais detêm o poder junto ao Estado e exercem grande influência perante a mídia. Nesse contexto, cabe fazer uma breve referência ao aspecto político dos Direitos Humanos, o qual engloba tanto a perspectiva do Estado como garantidor da efetividade desses direitos quanto a perspectiva das escolhas dos núcleos das relações jurídicas e sociais que devem predominar - sujeito ou propriedade. Com relação ao primeiro enfoque, o Estado possui a responsabilidade de garantir, promover e proteger os direitos dos cidadãos e reparar os danos sofridos por eles. Assim, o Estado possui obrigações em relação aos cidadãos, além de limitações no seu poder. Deste modo, ao espaço público é conferida extrema relevância como palco de reivindicações e de exercício da cidadania. É nele que podemos exigir o devido cumprimento das obrigações do Estado e mostrar as novas carências sociais. Portanto, junto ao grande valor dado ao espaço público, reconhece-se a importância do exercício da cidadania. Os Direitos Humanos assim entendidos são um convite à ação e à participação social. Quanto ao segundo aspecto, ocorre uma tentativa de inversão da lógica capitalista, conferindo às relações sociais, econômicas, jurídicas ou políticas um núcleo centrado nos sujeitos de direito e não mais na propriedade1. Outro viés deste aspecto é o próprio reconhecimento de que há violação de direitos e, por conseguinte, há pessoas em estado de violação de garantias fundamentais. A importância desse reconhecimento se reflete na aceitação e na compreensão de que os conflitos são reflexo natural da existência de dissensões e desigualdades, pois, caso não se reconheça a importância da externalização das necessidades negligenciadas pelo Estado, criminalizam-se condutas, como a de movimentos sociais, além de reforçar o estado de opressão e a idéia de eliminação desses grupos. Há também, conforme Carbonari, um aspecto normativo dos Direitos Humanos. A positivação desses direitos historicamente confere um mínimo de garantia para a possibilidade do seu exercício e o eixo dessa garantia é uma “exigência basilar referenciada na dignidade humana dos sujeitos de direito”2. No entanto, quem são hoje, no Brasil, os titulares desses direitos? Em cada época sabemos que há diferentes titulares dos direitos humanos. Na medida em que vamos convivendo em sociedade nos damos conta das nossas necessidades 1 2 Entenda propriedade como toda e qualquer relação patrimonial ou mercadológica. CARBONARI (2001; p. 2)
  • 6. e das necessidades do outro. Com as diversas convenções e tratados internacionais surgiram novos sujeitos de direito, novos titulares de direitos e, principalmente, e talvez primeiramente, novos atores e autores sociais. Assim, paulatinamente os negros foram considerados cidadãos; as mulheres passaram a ser titulares do exercício de direitos como o voto; os índios passaram a existir como sujeitos com sua cultura própria (afirmação que ainda é um pouco questionável e difícil de ser generalizada devido a alguns acontecimentos recentes); etc. A idéia de que os direitos humanos e seus titulares são uma construção que se dá por meio de conquistas é fundamental para garantir a fluidez do espaço público. Seus atores/autores sociais são aqueles que querem fazer ouvir suas vozes, que gritam socorro, que gritam “eu existo”, até que sejam ouvidos, até que sejam vistos... Dessarte, os direitos humanos são uma busca pela compreensão do outro, pela compreensão da diversidade e pela compreensão de si próprio como um ser também dotado de necessidades e de preconceitos, mas que é capaz de perceber que existe em sociedade porque existe com o outro e que os direitos e deveres de ambos estão interligados e não são, e nem podem ser, maiores ou melhores que os direitos dos demais. Dentro disto, sem considerar a historicidade dos direitos humanos e sem o esforço pela busca da compreensão do outro, da alteridade, cai-se no senso comum de que “direitos humanos é coisa de bandido”3, afirmação que, segundo Carbonari, está na base da criminalização da luta social. O ESTADO E A FUNÇÃO JURISDICIONAL A historicidade dos Direitos Humanos é simultânea à transformação e consolidação dos paradigmas dos diferentes Estados de Direito a partir da adoção e aplicação do princípio da legalidade como fundamento de organização do Estado, que se tornou submisso às normas jurídicas. Todavia, o conteúdo das regras variou de acordo com a ideologia preponderante em dado modelo histórico, o que originou os diferentes tipos de Estado de Direito, denominados como Estado Liberal, Social, Democrático ou Neoliberal. O primeiro modelo de Estado de Direito tem em seu conteúdo inicial traços do liberalismo, característica justificada em sua origem nos movimentos sociais burgueses. Os elementos essenciais na formação da concepção do Estado Liberal são a doutrina da separação 3 CARBONARI (2001; p. 8)
  • 7. entre Estado e Sociedade, a garantia das liberdades individuais, a intervenção mínima do estado na sociedade, o primado da lei e a adoção do princípio da igualdade formal, ou seja, a igualdade perante a lei. Estes aspectos identificam no liberalismo uma reação à forma de atuação do Estado Absolutista, que tinha poderes ilimitados. Neste momento, buscou-se a previsibilidade do direito, com o objetivo de impedir o arbítrio dos juízes, o que originou as grandes codificações. A forma de atuação dos juízes era caracterizada por uma postura de inércia frente à condução do processo, de acordo com o ideal do Estado não intervencionista. Deste modo, o juiz mantinha-se eqüidistante do processo e das partes, deixando que as mesmas conduzissem o processo de acordo com sua capacidade e possibilidade técnica, econômica e social. Nesta concepção liberal, o direito se identificava com a lei e o ideal de justiça não precisava ser buscado, pois já estava fixado na ordem posta. A função jurisdicional se caracterizava como a simples administração da lei por um operador neutro e imparcial. Todavia, as graves crises sociais, econômicas e políticas ocorridas a partir da década de 20 fortaleceram a idéia do Estado Social, caracterizado pela defesa dos interesses sociais em detrimento dos interesses individuais. Buscou-se a efetivação das garantias fundamentais obtidas no Estado Liberal, que até então eram meramente formais. Foram mantidas as conquistas anteriores, mas com um enfoque social no qual o Estado assumiu um papel de regulador das regras sociais e econômicas, necessidade decorrente do desequilíbrio e do distanciamento das classes sociais que ocorreu com o liberalismo. O bem-estar social somente ocorre com a efetivação das garantias mediante mecanismo de implantação, buscando instrumentos de proteção para as classes economicamente desfavorecidas. O Estado passou a ter uma atuação positiva de defesa dos interesses sociais. O Estado Democrático de Direito surge do novo enfoque surgido com o papel protagonista do Estado como agente transformador da sociedade, perseguindo os objetivos de construção de uma sociedade livre, justa e solidária. O traço essencial na busca desta transformação é a participação popular nos centros de poder como fator legitimador da ordem política, econômica, social e jurídica. No Brasil, a Constituição Federal de 1988 adotou o Estado Democrático de Direito, como se pode inferir da leitura do art. 1 o, que expõe os objetivos fundamentais.
  • 8. No entanto, apesar da adoção legal e formal do Estado Democrático de Direito, a sociedade brasileira encontra-se repleta de valores do Estado Neoliberal, caracterizado por uma relativização da soberania popular ante as pressões externas no campo político, econômico e social. Deste modo, este enfraquecimento do Estado Democrático, como centro de poder, influencia a jurisdição, que é a expressão do poder estatal na imposição de suas decisões, que entra numa crise de efetividade. A mudança ideológica da aplicação do Direito decorre das mudanças históricas de orientação da função da jurisdição nos diversos Estados de Direito. Segundo Luciana Camponêz P. Moralles: “A função jurisdicional é expressão do poder estatal e utiliza-se do processo como instrumento para a consecução dos valores consagrados pelo modelo de Estado adotado por uma nação, bem como é o espaço legítimo para efetivá-los.”4 Neste contexto, a jurisdição tem objetivos políticos, sociais e jurídicos dependendo do conteúdo do Estado pelo qual ela se manifesta. Portanto, um dos desafios da modernidade seria a harmonização das regras jurídicas com as normas constitucionais de um Estado Democrático de Direito, que tem ênfase nos valores sociais e na participação democrática, sem todavia olvidar as implicações advindas dos valores neoliberais que permeiam a sociedade. Um grande óbice a transpor é aplicar os preceitos jurídicos e constitucionais que defendem a criação de uma sociedade livre, justa e solidária, no contexto de uma realidade social e economicamente injusta. O modelo de Estado Democrático de Direito beneficiou sobretudo as classes populares, com o reconhecimento de diversos direitos individuais e sociais. Todavia, sem instrumentos aptos a concretizar os novos direitos sociais e econômicos, estes se tornam meras declarações políticas. Esta perspectiva se torna importante devido à incompatibilidade destes dois modelos de Estados, pois as acentuadas desigualdades econômicas, sociais e culturais, impedem o efetivo acesso à justiça. No aspecto tocante à conscientização dos usuários sobre os seus direitos, esta é difícil no contexto em que grande parte da população vive em condições de pobreza. Os movimentos sociais são grandes catalisadores de mudanças nesse ambiente, tendo em vista o decisivo papel de conscientização e agrupamento das pessoas em 4 MORALLES (2006; p.30)
  • 9. torno de um objetivo comum. As exigências dos grupos ganham força, e na medida em que passam a contrariar interesses de classes dominantes, exigem o desenvolvimento de uma estratégia de combate, materializada na criminalização destes movimentos e de seus participantes. A conseqüência é a repressão institucional, justificada pela conduta ter se tornado um crime, realizada, contraditoriamente, pelo mesmo Estado que deveria abrigar as pretensões populares democráticas. MOVIMENTOS SOCIAIS E A IMPORTÂNCIA DO RECONHECIMENTO DO CONFLITO Primeiramente, temos que ressaltar a atuação dos movimentos sociais na transformação dos contextos político, social e jurídico. Historicamente, os direitos nasceram da luta contra o modelo vigente que não considerava determinadas pessoas como cidadãos, como sujeitos de direito. O conflito e seu reconhecimento e legitimação pelos detentores do poder foram o motor de fundamentais transformações políticas (por exemplo, o impeachment do presidente Collor), sociais (ações afirmativas) e jurídicas (lei Maria da Penha), dentre tantas outras conquistas, fruto primeiro da organização popular e atuação de inúmeros movimentos sociais ao longo da história. Contudo, como ressalta Faleiros, o não reconhecimento do conflito gera a violência. Esta, emerge como a “substituição da aceitação do conflito pela negação do outro” 5 . “Quando se levantam para exigir lugar na sociedade, o fazem de forma equivocada – usam a força, ocupam a propriedade privada, querem ficar em lugares que atrapalham grandes e necessários projetos de desenvolvimento, querem cotas, reparação, cadeia para maridos e companheiros – daí ser legítima a repressão, a criminalização... a eliminação. É incrível como se arranjam motivos para que a sociedade os mantenha (ou os elimine) de forma legítima fora da sociedade como um problema social”6 Outra perspectiva é trazida por Sousa Junior7 ao tratar da idéia do conflito como necessário à mudança social. Fortalecer a organização popular e alargar o acesso dos 5 FALEIROS (2004; p. 90) CARBONARI (2001; p. 6) 7 SOUSA JUNIOR (2008; p. 20) 6
  • 10. movimentos sociais aos instrumentos hábeis para a resolução dos conflitos significa garantir a efetividade dos Direitos Humanos. Fortalecer as manifestações sociais, as quais evidenciam as contradições e as desigualdades ocasionadas pelo déficit gerado pelo não provimento estatal, é reconhecer também que os problemas possuem um caráter positivo na medida em que refletem necessidades de mudança. Entretanto, não podemos olvidar que essas mudanças têm de possuir um caráter emancipatório a fim de que não se engessem as conquistas e estas se transformem em nova violação de direitos. Sabe-se que a positivação garante em certa medida a efetivação dos Direitos Humanos, mas não se pode perder de vista que juntamente com seu viés assecuratório, há também sua face repressiva e protelatória das transformações. Portanto, essas conquistas sociais, que se dão por meio do reconhecimento dos conflitos, devem ser impregnadas da idéia de um movimento de contínua transformação do status quo, o que tem de acarretar um câmbio na maneira de pensar e agir daqueles que lidam direta e indiretamente com esses movimentos sociais e da sociedade como um todo, para que realmente sejam assegurados seus direitos e a constante alteração destes, necessidade provocada pela dinamicidade que é própria das relações sociais. Assim, percebe-se a importância das lutas e movimentos sociais, tanto no seu valor histórico como atual, além da necessidade do reconhecimento das pequenas conquistas e da constante necessidade de modificação das mesmas, para que o processo de garantia dos direitos humanos seja um processo cotidiano, justo e ajustável. O MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA (MST) Acompanhando os pressupostos apresentados, o MST consolidou-se como o movimento social de maior relevância na luta não só pela reforma agrária, mas também pela “construção de um projeto popular para o Brasil, baseado na justiça social e na dignidade humana”8. Falar sobre o MST e seu papel na luta pela reforma agrária é reconhecer a concentração fundiária como um processo que se consolidou no Brasil ao longo de mais de mil e quinhentos anos. Por conseqüência desse processo, ocorreram diversos movimentos de resistência como os quilombos, a guerrilha do Araguaia, Canudos, entre tantos outros que 8 Quem somos. 1984-2004: MST 20 anos de lutas, conquistas e dignidade! Disponível na internet, no site: http://www.mst.org.br/mst/pagina.php?cd=4151
  • 11. marcaram a história do nosso país como reflexo da opressão e criminalização dos seus participantes e dos motivos pelos quais lutavam. O MST surgiu em 1984, em Cascavel/PR. Houve uma reunião com vários representantes de organizações camponesas na qual “reafirmaram a necessidade de ocupação como ferramenta legítima dos trabalhadores e trabalhadoras rurais”9. A partir deste momento as lutas sociais no campo passaram a ter uma sistemática unificada com objetivos e linha de ação definidos. Como já mencionado, a luta do MST não envolve apenas a reforma agrária. Essa característica é fundamental para a compreensão da atuação do movimento. Eles provocam um questionamento sobre a construção individual e individualista de diversas esferas do espaço público e privado, como a violência de gênero, a cultura, a saúde, a terra. Deste modo, exercem papel fundamental como motor de transformações sociais no Brasil. Porém, como é sabido, a luta do MST não é fácil. Suas vitórias foram conquistadas com um grande esforço no sentido de movimento contrário aos interesses da classe dominante, principalmente, a ruralista. Obviamente sem considerar o importante papel reacionário do judiciário e manipulador da mídia como freios para a concretização dos objetivos do movimento - tentativa de garantia da dignidade da pessoa humana e efetivação de direitos humanos garantidos pela própria Constituição. Contudo, essa grande repressão interna não condiz com o reconhecimento internacional dado ao movimento que já ganhou prêmios da UNICEF de comissões internacionais de Direitos Humanos10, além de apoio internacional a sua atuação. “(...) o MST não apenas tornou visível socialmente a sua identidade de sujeito coletivo capaz de criar direitos, como logrou angariar o reconhecimento de sua capacidade instituinte para o estabelecimento de novas práticas sociais e políticas”11. Apesar de sua grande relevância perante a comunidade internacional e alguns setores da sociedade brasileira, o movimento contrário a sua atuação ainda é muito grande. O cerceamento a sua atuação no Brasil ultrapassa o âmbito político. Ele também está institucionalizado nos órgãos de controle social e resolução de conflitos, ou seja, o sistema penal como um todo e o judiciário. Ambos contribuem para sua criminalização e repressão. 9 Idem. MARTINS (2007; p.7) 11 SOUSA JUNIOR (2008; p. 21) 10
  • 12. Como cita Sousa Santos, “os setores ligados à defesa da reforma agrária apontam como um dos seus principais obstáculos a intervenção do judiciário a favor dos fazendeiros, por vezes ignorando processos de assentamento já finalizados”12. Entretanto, há tentativas, ainda pequenas, de alguns tribunais no sentido de reconhecimento do significado jurídico da ação do MST. O próprio Superior Tribunal de Justiça já proferiu decisões descriminalizadoras ao afirmar que “não pode ser considerado esbulhador aquele que ocupa uma terra para fazer cumprir a promessa constitucional de reforma agrária”13. Conforme Sousa Santos, ocorre o chamado isolamento institucional do Judiciário, que muitas vezes não faz cumprir as leis em favor de interesses políticos e passa, em sua maioria, por uma grande insensibilização frente aos problemas apresentados pelos movimentos sociais. Como exemplo, temos alguns eventos recentes que chocaram a todos que estão ligados de alguma forma ao MST. Um deles14, foi a declaração de um promotor gaúcho ao classificar o MST como uma organização criminosa e considerá-lo como braço de guerrilha da Via Campesina. Houve inclusive um relatório do Ministério Público em que uma das propostas era a dissolução do Movimento dos Sem Terra. Apesar de esse pedido ter sido retirado da ata em decisão proferida posteriormente, mantiveram-se os pedidos de proibição de marchas e outras espécies de protestos em algumas cidades da região sul onde há acampamentos do MST. Essas declarações levaram o MST e mais onze organizações brasileiras de direitos humanos a denunciarem à ONU e à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) “a tentativa de criminalização dos movimentos sociais e a parcialidade do Ministério Público gaúcho, as ações judiciais impetradas contra os sem-terra e a violência de policiais contra trabalhadores”15. Outra arbitrariedade ocorre em um processo contra oito integrantes do MST, acusados pelo Ministério Público Federal de crimes contra a Lei de Segurança Nacional, o qual corre em segredo de Justiça – é a revivificação de práticas típicas do período da Ditadura Militar. Em contraponto, é necessário observar a declaração feita pelo próprio advogado do 12 SOUSA SANTOS (2007; p. 80-81) SOUSA JUNIOR (2008; p. 44) 14 Terra magazine. MST é braço de guerrilha – acusa promotor gaúcho. 24 de junho de 2008. Disponível na internet, no site: http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI2969059-EI6578,00.html 13 15 Notícias Uol. MST denuncia na OEA e na ONU tentativa de "criminalização" dos sem-terra. 24 de julho de 2008. Disponível na internet, no site: http://noticias.uol.com.br/ultnot/2008/07/24/ult23u2558.jhtm
  • 13. MST ele afirma: "Não temos nada contra o MP processar e condenar aqueles que cometem crimes durante ação [do MST]. Lutamos contra a criminalização do movimento e de oito pessoas por elas integrarem o movimento"16. Percebe-se, portanto, uma convergência de diversos atores políticos/jurídicos para a criminalização e despolitização dos conflitos evidenciados pela ação do MST. Mas, como esclarece Sousa Junior, não cabe julgar as opções de ação adotadas pelo movimento uma vez que essa escolha integra sua esfera de autonomia. O fundamental é “não perder-se de vista o sentido político dessa ação, incompreendida pela incapacidade de quem governa de agir politicamente no espaço público, único âmbito em que se pode avaliar a legitimidade das ações”17. O espaço público é, deste modo, o lugar de exercício da autonomia dos indivíduos. É também, e talvez acima de tudo, um espaço de interação, de vivência “que ao ser reivindicado para a vida humana transforma a multidão de solitários urbanos em povo”18. É nesse espaço de exercício da alteridade que se projetam as relações dialógicas típicas das sociedades que se constituem efetivamente democráticas. É nele que se concebem situações de conflito e reconhecimento de desigualdades que não são criminalizáveis pelo simples fato de existirem como movimento fluido de exposição da diferença e das mazelas da sociedade. MÍDIA, SISTEMA PENAL E CRIMINALIZAÇÃO No contexto fático explorado acima, percebe-se que quanto mais próximo do conflito, maior a tendência da esfera de controle social formal (o Sistema Penal) criminalizar as condutas, provavelmente por seu possível envolvimento, no mínimo ideológico, com a negação da causa do MST. São realizados procedimentos pouco técnicos e parciais, com caráter de perseguição política e ideológica. Todavia, quanto mais distante do conflito, mais isenta e objetiva é a decisão dos Tribunais, que, inclusive, em várias decisões, assim como o exemplo do STJ, declaram explicitamente o caráter parcial das prisões e processos contra os integrantes e dirigentes do movimento. 16 Idem SOUSA JUNIOR (2008; p. 22) 18 SOUSA JUNIOR (2008; p. 96) 17
  • 14. No tocante ao controle social informal, realizado pela mídia, nota-se que se baseia nos dados do Sistema Penal local (prisões e processos), ainda que ilegais, e sua divulgação contribui para produzir aversão ao movimento e manter a lógica de criminalização. Este fato corrobora-se pelo fato de que o MST recusa-se a cortejar a imprensa, tanto pequena (local), quanto grande, por considerá-la parcial. Dessa forma, percebe-se que a instância de controle social informal mídia/imprensa, cujo papel é central na formação do imaginário social e do ambiente comunicativo, em muitos casos, tem expressado o interesse da classe dominante latifundiária, reproduzindo e ampliando o processo de criminalização. TEORIAS CRIMINOLÓGICAS E O PROCESSO DE CRIMINALIZAÇÃO Esse processo de criminalização pode ser analisado pela conciliação de aspectos de teorias criminológicas mais liberais, como a Teoria estrutural-funcionalista, de Emile Durkheim, ou a Teoria do labeling approach, com a Criminologia Crítica, considerando a aproximação entre elas no que se refere à fundamentação desse processo. Durkheim foi responsável pela virada na direção sociológica efetuada pela criminologia contemporânea, que deixou de buscar as causas das infrações das normas sociais em fatores naturais e bioantropológicos como raça e clima. Segundo a Teoria estruturalfuncionalista do desvio, esse é um fenômeno normal de toda estrutura social. Somente quando são ultrapassados determinados limites o desvio se torna negativo para a estrutura social, seguindo-se um estado de desorganização no qual as regras de conduta perdem valor – anomia. Deste modo, o comportamento inovador dos movimentos sociais e, especificamente, do MST, surge a partir da sua não-conformidade com o que está imposto enquanto realidade sócio-econômica do país. O grupo desviante é preocupante para aqueles que detêm o controle social, ou seja, que determinam ou influenciam as normas sociais, e que querem regular o desvio. Quanto mais acentuado o desvio, mais perturba o controle social, o que leva à uma atuação mais intensa das agências de controle institucionalizado ou difuso, ou seja, Sistema Penal e mídia respectivamente. A criminalização do desvio ocorre, então, para delimitar “o inimigo”. Enquanto crime, a conduta de não-conformidade se torna um alvo mais fácil. O controle social passa a exercer funções sociais mais bem delimitadas: ativa a “reação
  • 15. social”, trazendo “coesão” à sociedade, que assume o criminoso como um potencial desestruturador do grupo social e define claramente o que não pode passar de fato social normal para norma social (se todos aqueles nas mesmas condições às dos integrantes do MST resolvessem aderir ao movimento, o que aconteceria?), sob pena de termos uma situação “anômica”. Como função indireta, antecipa conceitos futuros e impede o processo de mudança social. Portanto, para o controle social, criminalizar a conduta desviante do MST implica em sustar o andamento do “caos social da anomia”. Por sua vez, os sujeitos que exercem esse controle identificam-se com os latifundiários e a elite conservadora a eles vinculada, o que justifica a compreensão do questionamento do caráter absoluto da propriedade privada como o “caos social”. A Teoria de Emile Durkheim pode ser complementada pela Teoria do labeling approach. Nesta vertente, afirma-se a existência de um duplo processo de criminalização realizado pelas instâncias de controle social formal e informal, do qual decorre o “etiquetamento”, criando-se para os indivíduos o status de criminosos sempre que submetidos a este duplo processo. A primeira etapa é da criminalização primária, que se dá no âmbito legislativo. Trata-se do exercício do controle social na definição do objeto tutelado pelo Sistema Penal, através das leis. Cumpre ressaltar que a maioria dos crimes praticados (cerca de 80 a 90%) não são descobertos, compondo a chamada “Cifra Oculta da Criminalidade”. Como exemplo, o uso de atestado médico falso para não realizar uma justificar ausência no trabalho, é crime tipificado no Código Penal, tanto para o médico, quanto para aquele que se vale do atestado (art. 302 e 304, CP), mas a grande maioria dos casos nunca foram punidos ou sequer indiciados pelo Sistema Penal. Isso ocorre devido ao segundo momento do processo de criminalização, que é o da seleção pelo perfil social dos transgressores, sempre pobres, negros, loucos, vadios, violentos e irracionais, ou seja, aqueles marginalizados pela sociedade. Nesse contexto, a conduta de reivindicação por novos direitos, como o direito à terra, é interpretada valorativamente pela reação social como contrária ao comportamento normal, ou seja, aquele predeterminado pelas estruturas sociais/controle social, passando a ser considerada criminosa se os indivíduos que as praticarem preencherem o “perfil” social transgressor. Verifica-se claramente que o controle social feito pela polícia e Justiça de primeira instância atua exatamente deste modo, principalmente por reagirem ao
  • 16. suposto “desvio moral” e à “ousadia” de um grupo social com perfil transgressor. O fato de os sujeitos serem pobres, miseráveis, por si só já cria a carga estigmatizadora para o processo de criminalização secundária. Assim, é imediata sua adequação ao duplo processo. A explicação do fenômeno da criminalização do MST é realizada por essas duas teorias criminológicas, mas de maneira parcial. Sua insuficiência decorre da incapacidade de demonstrar que o processo de criminalização gera a despolitização do conflito, sem evidenciar seu lugar epistemológico (o de controle social), já que são teorias da reação social e não salientam o enfoque materialista do fenômeno criminoso. Neste ponto, faz-se mister ressaltar o papel da Criminologia Crítica ao romper com esse pressuposto teórico das teorias liberais, buscando compreender o fenômeno sob o enfoque econômico-político dos comportamentos socialmente negativos. A criminalidade, no enfoque da Criminologia Crítica, é entendida como um status atribuído a indivíduos através da mesma dupla seleção da Teoria do labeling approach, mas desvenda o pressuposto não evidenciado anteriormente, o elemento norteador e fundante do duplo processo de criminalização na sociedade capitalista. Na lição de Andrade: “A criminologia crítica recupera, portanto, a análise das condições objetivas, estruturais e funcionais que originam, na sociedade capitalista, os fenômenos de desvio, interpretando-os separadamente conforme se tratem de condutas das classes subalternas ou condutas das classes dominantes (a chamada criminalidade de colarinho branco, dos detentores do poder econômico e político, a criminalidade organizada, etc).”19 A primeira etapa da criminalização ocorre através da seleção do bem jurídico protegido como o de maior relevância: a propriedade, pilar fundamental de um Estado capitalista. Deste modo, sua ofensa, com a luta pela reforma agrária e o fim do latifúndio improdutivo, repercute na necessidade de criminalizar qualquer ato deste caráter. O segundo aspecto da seleção criminalizante se dá com a estigmatização daqueles indivíduos que, por pertencerem a determinadas classes sociais, tendem a ser clientes do sistema penal, principalmente se eles não se adequarem aos vários mecanismos de disciplina que moldam o indivíduo à sociedade, como escola, família, igreja e trabalho. Sendo o indivíduo despossuído de propriedade, pobre, sem emprego, só pode ser definido como “vadio”, “baderneiro”, “vagabundo”, conseqüentemente, criminoso. 19 ANDRADE (2003, p. 217)
  • 17. Evidentemente que neste processo de criminalização não são cogitadas os obstáculos de socialização numa estrutura em que as instituições disciplinares se fragmentam pelas contradições do capitalismo e as desigualdades sociais crescem em escala exponencial. Ao contrário, o controle social aciona o processo de criminalização tanto pelo ato do questionamento do modelo de dominação e de marginalização, quanto pelo status dos questionadores, os trabalhadores rurais sem-terra, pois transgrediram ao máximo a disciplina. Deste modo, a multiplicidade teórica se completa para a explicação da criminalização dos integrantes do MST. CONCLUSÃO Com a exposição acima pretendemos contribuir para a discussão e conscientização acerca do evidente processo de criminalização instaurado contra o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra e tantos outros movimentos sociais que possuem suas atuações represadas quando incorrem em movimento contrário às normas e interesses prevalentes. Com isso, busca-se o reconhecimento dos conflitos como algo positivo e transformador, no sentido de evidenciar o déficit de provimento do Estado. É de suma importância o reconhecimento do espetáculo envolvido por trás da atuação de movimentos como o MST. A criminalização dos conflitos reforçada pela mídia e pelo sistema penal como um todo, gera a formação de uma opinião publica negativa, uma vez que esses agentes, muitas vezes, mantém propositalmente obscuros os reais interesses das ações de organizações populares. Uma vez revelados o evidente processo de criminalização e os reais motivos que levam ao surgimento dos conflitos sociais, buscamos evidenciar a necessidade de questionamento acerca dos posicionamentos de grupos contrários e a favor dessas ações, além da necessidade de auto-questionamento acerca dos nossos pré-conceitos e de sua conseqüente influência na ratificação do não cumprimento de garantias fundamentais previstas na Constituição. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
  • 18. ANDRADE, Vera Regina Pereira de. A Ilusão de Segurança Jurídica: do controle da violência à violência do controle penal. 2º edição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. BARATTA, Alessandro. Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal. 3º edição. Rio de Janeiro: Editora Revan, 2002. CARBONARI, Paulo César. Direitos Humanos no Brasil: uma leitura enfoca e em perspectiva da situação. O texto originalmente foi elaborado para o Seminário Pensando uma Agenda para o Brasil: Desafios e Perspectivas, promovido pelo Instituto de Estudos Sócio-Econômicos (INESC), realizado em junho de 2007. FALEIROS, Vicente de Paula. A Questão da Violência In: Educando para os Direitos Humanos: pautas pedagógicas para a cidadania na Universidade. Brasília: Síntese, 2004. MARTINS, Daniele Comin. A Criminalização dos Movimentos Sociais e a Luta por Terras do MST no Interior do Paraná – o caso de Quedas do Iguaçu. Revista Ciências Sociais Aplicadas em Revista. ISSN 1679-348X V. 07, n. 11 Jan./Jun. 2007. MORALLES, Luciana Camponez Pereira. Acesso à justiça e Princípio da Igualdade. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2006. Notícias Uol. MST denuncia na OEA e na ONU tentativa de "criminalização" dos sem-terra. 24 de julho de 2008. Disponível na internet, no site: http://noticias.uol.com.br/ultnot/2008/07/24/ult23u2558.jhtm. Acesso em 02 de agosto de 2008. Quem somos. 1984-2004: MST 20 anos de lutas, conquistas e dignidade! Disponível na internet, no site: http://www.mst.org.br/mst/pagina.php?cd=4151. Acesso em 02 de agosto de 2008. SOUSA JUNIOR, José Geraldo. Idéias para a cidadania e para a justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2008. SOUSA SANTOS, Boaventura. Para uma Revolução Democrática da Justiça. São Paulo: Cortez, 2007. Terra magazine. MST é braço de guerrilha – acusa promotor gaúcho. 24 de junho de 2008. Disponível na internet, no site: http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI2969059-EI6578,00.html. Acesso em 02 de agosto de 2008.