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DIREITOS HUMANOS
Conceito e Evolução Histórica
1. A PESSOA HUMANA E SUA DIGNIDADE
A dignidade humana, na linguagem filosófica, “é o princípio moral de que o ser humano
deve ser tratado como um fim e nunca como um meio” . É, portanto, um direito essencial.
É longa a caminhada empreendida pela humanidade para o reconhecimento e
estabelecimento da dignidade da pessoa humana. De acordo com o Prof. Fábio Konder
Comparato, “todos os seres humanos, apesar das inúmeras diferenças biológicas e culturais
que os distinguem entre si, merecem igual respeito, como únicos entes no mundo capazes de
amar, descobrir a verdade e criar a beleza”. Em razão desse reconhecimento universal,
conclui: “ninguém – nenhum indivíduo, gênero, etnia, classe social, grupo religioso ou nação –
pode afirmar-se superior aos demais”.
Atualmente, não se discute, há o reconhecimento de que toda pessoa tem direitos
fundamentais, decorrendo daí a imprescindibilidade da sua proteção para preservação da
dignidade humana.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada em resolução da III Seção
Ordinária da Assembléia Geral das Nações Unidas proclama: “A presente Declaração
Universal dos Direitos Humanos como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas
as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade, tendo sempre em
mente esta Declaração, se esforcem, através do ensino e da educação, em promover o
respeito a esses direitos e liberdades e, pela adoção de medidas progressivas de caráter
nacional e internacional, em assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universais e
efetivos, tanto entre os povos dos próprios Estados-membros quanto entre os povos dos
territórios sob a sua jurisdição”.
Esta Declaração avalia vários aspectos dos relacionamentos humanos.
O tema dos direitos humanos é de crescente relevância na caracterização da
mentalidade jurídica do século XXI. Possui, ao mesmo tempo, um toque de passado e uma
projeção de futuro. Mas o que são esses direitos? Quais seus fundamentos? Como surgiram?
Para onde se dirigem? Perguntas como estas não são facilmente respondidas, necessitam de
uma ampla análise histórico-filosófica, além de um profundo conhecimento jurídico. A doutrina
apresenta distintos posicionamentos e ideologias que devem ser observados, visando ao mais
completo entendimento da matéria.
Inicialmente, pergunta-se qual o fundamento desses direitos e qual a sua fonte
justificativa? Os teóricos se dividem em duas posições antagônicas, já muito trabalhadas pela
Teoria Geral do Direito: o Positivismo e o Jusnaturalismo.
A primeira, apresentada por Norberto Bobbio, afirma a inexistência de um direito
absoluto para esses “direitos”, já que a dogmática jurídica se caracteriza pela historicidade,
sendo o Direito passível de constantes modificações, advindas da sociedade, cultura, moral,
economia, que se alteram dia após dia. Não se pode dar, assim, um fundamento eterno para
algo que necessariamente sofrerá modificações.
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Um preceito só pode ser considerado jurídico quando nele estiver presente o caráter
repressivo, que lhe concede eficácia, como bem ressaltava Hans Kelsen. Se a Ordem Jurídica
nada pode fazer para assegurar o cumprimento desses preceitos, eles não podem ser
denominados “direito”, pois são meras expectativas de conduta, meras expressões de boas
intenções que orientam a ação para um futuro indeterminado, incerto.
Atualmente, porém, há uma tendência à “positivação” dos direitos humanos, de forma a
inseri-los nas Constituições Estatais, através da criação de novos mecanismos para garanti-los,
além da difusão de sua regulação por meio de mecanismos internacionais, como os Tratados e
Convenções Internacionais de Direitos Humanos.
Com isso, já se pode falar num conceito positivo de “direitos humanos, que seriam os
“direitos fundamentais”, assegurados ao indivíduo através da regulamentação e aplicação
desses direitos, tanto no campo estatal como no campo supra-estatal.
O Jusnaturalismo, amparado por doutrinadores como Dalmo de Abreu Dallari e Fábio
Konder Comparato, ressalta a Pessoa Humana como o fundamento absoluto, atemporal e
global desses direitos. A pessoa é a mesma em todos os lugares e, considerando as
diversidades culturais, deve ser tratada igualmente, de forma justa e solidária. Ressalta-se a
dignidade inerente a todo e qualquer ser humano como a razão máxima do Direito e da
Sociedade, devendo ser resguardada e cultivada por estes.
Os direitos humanos seriam, assim, o conjunto de condições, garantias e
comportamentos, capazes de assegurar a característica essencial do homem, a sua dignidade,
de forma a conceder a todos, sempre, o cumprimento das necessidades inseridas em sua
condição de pessoa humana.
Dessa forma, esses direitos não são criados pelos homens ou pelos Estados, eles são
preexistentes ao Direito, restando a este apenas “declará-lo”, nunca constituí-los. O direito
não existe sem o homem e é nele que se fundamenta todo e qualquer direito, é na pessoa
humana que o Direito encontra o seu valor.
Há, pois, uma união dessas duas teorias na caracterização moderna dos direitos
humanos. Ressalta-se o artigo 1.º, inciso III, CF/88, que afirma ser fundamento da República
Federativa do Brasil a “dignidade humana”.
Diz, em seu artigo 1.º, a Declaração Universal dos Direitos do Homem:
“Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão
e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade”.
“A Declaração afirma que todos os homens nascem livres e iguais em dignidade (art. 1.º)
e garante a todos eles os mesmos direitos, sem distinção de raça, cor, sexo, língua, religião,
opinião política ou de outra natureza, nascimento ou qualquer outra condição (art. 2.º, I)”1 .
A boa doutrina ressalta algumas características próprias desses direitos, sendo:
• Universalidade: todo e qualquer ser humano é sujeito ativo desses direitos,
independente de credo, raça, sexo, cor, nacionalidade, convicções;
• Inviolabilidade: esses direitos não podem ser descumpridos por nenhuma pessoa ou
autoridade;
1 LIMONGI, Ruben (Coordenador). op. cit. p.472
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• Indisponibilidade: esses direitos não podem ser renunciados. Não cabe ao particular
dispor dos direitos conforme a própria vontade, devem ser sempre seguidos;
• Imprescribilidade: eles não sofrem alterações com o decurso do tempo, pois têm
caráter eterno;
• Complementaridade: os direitos humanos devem ser interpretados em conjunto, não
havendo hierarquia entre eles.
Diz o Prof. Sorondo: “Os Direitos Humanos julgam a ordem vigente, são um formador
de opinião pública nos mais diversos confins do planeta, e põem a descoberto os
condicionamentos econômicos, sociais e políticos que impedem sua completa realização”2.
2. A EVOLUÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS
Apesar da falta de historicidade inerente a esses direitos, é com a história e seus
grandes pensadores que se observa a “evolução” da humanidade, no sentido de ampliar o
conhecimento da essência humana, a fim de assegurar a cada pessoa seus direitos
fundamentais.
Podemos destacar que a noção de direitos humanos foi cunhada ao longo dos
últimos três milênios da civilização.
O Prof. Fábio Konder Comparato, fazendo uma análise histórica dessa evolução,
aponta que foi no período axial que os grandes princípios, os enunciados e as diretrizes
fundamentais da vida, até hoje considerados em vigor, foram estabelecidos. Informa que nesse
período, especialmente entre 600 e 480 a.C., coexistiram, sem se comunicarem entre si,
alguns dos maiores doutrinadores de todos os tempos (entre eles, Buda, na Índia; Confúcio, na
China; Pitágoras, na Grécia e o profeta Isaías, em Israel) e, a partir daí, o curso da História
passou a constituir o desdobramento das idéias e princípios estabelecidos nesse período.
Inclusive, foi nesse período que surgiu a filosofia, tanto na Ásia como na Grécia, quando
então substituiu-se, “pela primeira vez na História, o saber mitológico da tradição pelo saber
lógico da razão”3 .
Em resumo, assinala que foi nesse período que nasceu a idéia de igualdade entre os
seres humanos: “é a partir do período axial que o ser humano passa a ser considerado, pela
primeira vez na História, em sua igualdade essencial, como ser dotado de liberdade e razão,
não obstante as múltiplas diferenças de sexo, raça, religião ou costumes sociais. Lançavam-se,
assim, os fundamentos intelectuais para a compreensão da pessoa humana e para a
afirmação de direitos universais, porque a ela inerentes”4.
Na seqüência, podemos destacar o Cristianismo, que em muito contribuiu para o
estabelecimento da igualdade entre os homens. O Cristianismo, sem dúvida, no plano divino,
pregava a igualdade de todos os seres humanos, considerando-os filhos de Deus, apesar de,
2 SORONDO, Fernando. op. cit.
3 COMPARATO, Fábio Konder. op. cit. p.8
4 Ib. op. cit. p.1
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na prática, admitir desigualdades em contradição com a mensagem evangélica (admitiu a
legitimidade da escravidão, a inferioridade da mulher em relação ao homem)5.
Na Idade Média havia a noção de que os homens estavam submetidos a uma ordem
superior, divina, e deviam obediência às suas regras. Era incipiente, todavia, o reconhecimento
da dualidade Estado-indivíduo. Como disse Enrico Eduardo Lewandovski: “...na ordem política
medieval, jamais se aceitou, de fato ou de direito, a idéia de que o indivíduo possuísse uma
esfera de atuação própria, desvinculada da polis. Desconhecia-se completamente a noção de
direitos subjetivos individuais oponíveis ao Estado”6.
Aponta, contudo, que nesse período houve um avanço, à medida em que se passou a
reconhecer que o indivíduo estava submetido a duas autoridades (secular e espiritual) e, com
esse reconhecimento, o homem passou a ser considerado “como um ser moral, e não apenas
como um ser social”, derivando daí que “enquanto seres morais, ou seja, enquanto membros
da civitas Dei, todos os homens eram iguais, sem embargo das distinções de status
circunstancialmente registradas na cidade terrena”7.
A partir do século XIV, as transformações que ocorreram abalaram toda a estrutura
concebida e que dava sustentação à organização social e política da época, culminando, tais
mudanças, com o Iluminismo (período entre a Revolução Inglesa de 1688 e a Revolução
Francesa de 1789). Foi durante o Iluminismo e o Jusnaturalismo desenvolvidos na Europa,
entre os séculos XVII e XVIII, que a idéia de direitos humanos se inscreveu, inclusive
estendendo-se aos ordenamentos jurídicos dos países.
A constatação ética da imperiosa necessidade de se resguardar certos direitos advém
da fusão da doutrina Judaico-cristã com o Contratualismo. Para a primeira, o homem foi criado
“à imagem e semelhança de Deus”, sendo a igualdade e liberdade características divinas
presentes em toda as pessoas.
No Iluminismo, o princípio da igualdade essencial dos seres humanos foi estabelecido
sob o prisma de que todo homem tem direitos resultantes de sua própria natureza, ou seja,
“firmou-se a noção de que o homem possui certos direitos inalienáveis e imprescritíveis,
decorrentes da própria natureza humana e existentes independentemente do Estado”8.
A concepção, que espalhou-se pelos ordenamentos de vários países, era a de que os
direitos individuais eram preexistentes, portanto, não eram criações do Estado e, assim sendo,
deveriam ser respeitados, cabendo ao Estado zelar pela sua observância.
A evolução da doutrina estóica, que alegava a supremacia da “natureza”, culminou no
Contratualismo, que teve como seus maiores representantes Hobbes, Locke e Rousseau.
Hobbes cria que o homem em seu estado de natureza sofria com a “guerra de todos
contra todos”, sendo imperiosa a necessidade de um órgão que lhes garantisse a segurança.
Assim, eles alienaram sua liberdade ao estado, detentor de todo o poder. Esse poder só seria
retirado do governante se ele não assegurasse aos cidadãos a segurança desejada.
Locke afirmava a existência de certos direitos fundamentais do homem, como a vida, a
liberdade e a propriedade. No estado natural, o homem era bom. A liberdade individual só foi
5 Ib. op. cit. p.17-18
6 LEWANDOWSKI, Enrique Ricardo. Proteção dos Direitos Humanos na Ordem Interna e Internacional. São Paulo:
Forense, 1984. p.8
7 LEWANDOWSKI, Enrique Ricardo. op. cit. p.8
8 Ib. op. cit. p.20
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transferida ao Estado para que este melhor garantisse os direitos do indivíduo, podendo os
cidadãos retirar o poder concedido ao governante, caso ele não atendesse aos anseios da
comunidade, isto é, eles têm o direito de retomar a liberdade originária.
Rousseau assevera que o homem natural seria instintivo.O Contrato Social foi criado,
assim, como forma de garantir ao mesmo tempo a igualdade e a liberdadepor meio da
soberania popular, pela qual os homens cediam parte de sua liberdade para a realização do
bem comum.
Pode-se inserir no contexto, ainda, a posição de Montesquieu que apresentava sua
teoria da tripartição do poder como forma de garantir o bom governo e controlar os arbítrios.
Essa união teológica e racionalista originou o conceito de direito natural, que culminou
com a doutrina de Kant, para quem o Estado era um instrumento fixador de leis, criadas pelos
cidadãos, e a liberdade era um imperativo categórico fundamental para se conceber a figura
humana.
A contribuição de Kant foi muito valiosa para a construção do princípio dos direitos
universais da pessoa humana. Kant observa “que só o ser racional possui a faculdade de agir
segundo a representação de leis ou princípios; só um ser racional tem vontade, que é uma
espécie de razão denominada razão prática9, também observa “que as regras jurídicas, às
quais os homens passam a sujeitar-se, devem ser elaboradas pelos membros da
associação”10. Sua visão, complementando, é de que o ser humano não existe como meio
para uma finalidade, mas existe como um fim em si mesmo, ou seja, todo homem tem como fim
natural a realização de sua própria felicidade, daí resultando que todo homem tem dignidade.
Isso implica, na sua concepção, que não basta ao homem o dever negativo de não prejudicar
alguém, mas, também, e essencialmente, o dever positivo de trabalhar para a felicidade alheia.
Essa concepção foi fundamental para o reconhecimento dos direitos necessários à
formulação de políticas públicas de conteúdo econômico e social11.
Pode-se falar em três ápices da evolução dos direitos humanos: o Iluminismo, a
Revolução Francesa e o término da Segunda Guerra Mundial.
Com o primeiro foi ressaltada a razão, o espírito crítico e a fé na ciência. Esse
movimento procurou chegar às origens da humanidade, compreender a essência das coisas e
das pessoas, observar o homem natural.
A Revolução Francesa deu origem aos ideais representativos dos direitos humanos, a
liberdade, a igualdade e a fraternidade. Estes inspiraram os teóricos e transformaram todo o
modo de pensar ocidental. Os homens tinham plena liberdade (apesar de empecilhos de ordem
econômica, destacados, posteriormente, pelo Socialismo), eram iguais, ao menos em relação à
lei, e deveriam ser fraternos, auxiliando uns aos outros.
Por fim, com a barbárie da Segunda Grande Guerra, os homens se conscientizaram da
necessidade de não se permitir que aquelas monstruosidades ocorressem novamente, de se
prevenir os arbítrios dos Estados. Isto culminou na criação da Organização das Nações Unidas
e na declaração de inúmeros Tratados Internacionais de Direitos Humanos, como “A
Declaração Universal dos Direitos do Homem”, como ideal comum de todos os povos.
9 COMPARATO, Fábio Konder. op. cit. p.20
10 LEWANDOWSKI, Enrique Ricardo. op. cit. p.41
11 COMPARATO, Fábio Konder. op. cit. p.20-24
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Os documentos de proteção aos direitos humanos foram surgindo progressivamente. O
antecedente mais remoto pode ser a Magna Carta, que submetia o governante a um corpo
escrito de normas, que ressaltava a inexistência de arbitrariedades na cobrança de impostos. A
execução de uma multa ou um aprisionamento ficavam submetidos à imperiosa necessidade
de um julgamento justo.
A Petition of Rights tentou incorporar novamente os direitos estabelecidos pela Magna
Carta, por meio da necessidade de consentimento do Parlamento para a realização de
inúmeros atos.
O Habeas Corpus Act instituiu um dos mais importantes instrumentos de garantia de
direitos criados. Bastante utilizado até os nossos dias, destaca o direito à liberdade de
locomoção a todos os indivíduos.
A Bill of Rights veio para assegurar a supremacia do Parlamento sobre a vontade do rei.
A Declaração de Direitos do estado da Virgínia declara que “todos os homens são por
natureza igualmente livres e independentes e têm certos direitos inatos de que, quando entram
no estado de sociedade, não podem, por nenhuma forma, privar ou despojar de sua
posteridade, nomeadamente o gozo da vida e da liberdade, com os meios de adquirir e possuir
propriedade e procurar e obter felicidade e segurança”. Assegura, também, todo poder ao
povo e o devido processo legal (julgamento justo para todos).
A Declaração de Independência dos Estados Unidos da América, assim como a
Constituição Federal de 1787, consolidam barreiras contra o Estado, como tripartição do poder
e a alegação que todo poder vem do povo; asseguram, ainda, alguns direitos fundamentais,
como a igualdade entre os homens, a vida, a liberdade, a propriedade. As dez Emendas
Constitucionais americanas permanecem em vigor até hoje, demonstrando o caráter atemporal
desses direitos fundamentais. Essas Emendas têm caráter apenas exemplificativo, já que,
constantemente, novos direitos fundamentais podem ser declarados e incorporados à Lei
Fundamental Americana.
Com a Revolução Francesa, foi aprovada a “Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão”, que garante os direitos referentes à liberdade, propriedade, segurança e resistência
à opressão. Destaca os princípio da legalidade e da igualdade de todos perante a lei, e da
soberania popular. Aqui, o pressuposto é o valor absoluto da dignidade humana, a elaboração
do conceito de pessoa abarcou a descoberta do mundo dos valores, sob o prisma de que a
pessoa dá preferência, em sua vida, a valores que elege, que passam a ser fundamentais, daí
porque os direitos humanos hão de ser identificados como os valores mais importantes eleitos
pelos homens.
A partir do século XX, a regulação dos direitos econômicos e sociais passaram a
incorporar as Constituições Nacionais. A primeira Carta Magna, a revolucionar a positivação de
tais direitos, foi a Constituição Mexicana de 1917, que versava, inclusive, sobre a função social
da propriedade.
A Constituição de Weimar de 1919, pelo seu capítulo sobre os direitos econômicos e
sociais, foi o grande modelo seguido pelas novas Constituições Ocidentais.
A partir da segunda metade do século XX, iniciou-se a real positivação dos direitos
humanos, que cresceram em importância e em número, devido, principalmente, aos inúmeros
acordos internacionais. O pensamento formulado nesse período acentua o caráter único e
singular da personalidade de cada indivíduo, derivando daí que todo homem tem dignidade
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individual e, com isto, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seu art. 6.º, afirma:
“Todo homem tem direito de ser, em todos os lugares, reconhecido como pessoa perante a lei”.
Atualmente não se pode discutir a existência desses direitos, já que, além de
amplamente consagrados pela doutrina, estão presentes também na lei fundamental brasileira:
A Constituição Federal.
Mesmo os mais pessimistas, que alegam a falta de eficácia dos direitos fundamentais,
não podem negar a rápida evolução, tanto no sentido normativo, como no sentido executivo,
desses direitos, que já adquiriram um papel essencial na doutrina jurídica, apesar de apenas
serem realmente reconhecidos por meio da Declaração Universal dos Direitos do Homem de
1948.
Pode-se constatar, por estes apontamentos, que a evolução dos direitos humanos foi
gradual; todavia, o pensamento moderno “é a convicção generalizada de que o verdadeiro
fundamento da validade – do Direito em geral e dos direitos humanos em particular – já não
deve ser procurado na esfera sobrenatural da revelação religiosa, nem tampouco numa
abstração metafísica – a natureza como essência imutável de todos os entes do mundo. Se o
direito é uma criação humana, o seu valor deriva, justamente, daquele que o criou. O que
significa que esse fundamento não é outro, senão o próprio homem, considerado em sua
dignidade substancial de pessoa...”12
1. INSTRUMENTOS INTERNACIONAIS DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS
1.1. Sistema Global
A Prof. Flávia Piovesan declara que “sempre se mostrou intensa a polêmica sobre o
fundamento e a natureza dos direitos humanos – se são direitos naturais e inatos, ou direitos
positivos e históricos ou, ainda, direitos que derivam de determinado sistema moral”.
Para Norberto Bobbio, o problema no que tange aos direitos humanos “não é mais o de
fundamentá-los, e sim o de protegê-los”.
Com o fim da Segunda Guerra Mundial começaram os grandes questionamentos sobre
o Direito Humanitário, “foi a primeira expressão de que, no plano internacional, há limites à
liberdade e à autonomia dos Estados, ainda que na hipótese de conflito armado”. Reforçando
este ponto de vista, foi criada a Liga das Nações, que apontava “a necessidade de relativização
da soberania dos Estados”. A seguir, foi introduzida a Organização Internacional do Trabalho
que colaborou, profundamente, a fim de tornar internacional os direitos humanos13.
Quer em conjunto, quer em separado, esses institutos foram a base para a
internacionalização dos direitos humanos.
O sistema internacional de proteção dos direitos humanos é formado por documentos
internacionais voltados à garantia dos direitos humanos, tanto no âmbito global quanto no
âmbito regional.
12 COMPARATO, Fábio Konder. Cultura dos Direitos Humanos. São Paulo: Ed. LTR. p.60
13 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 3.ª ed. Ed. Max Lemonad, 1997.
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O sistema global de proteção é composto de instrumentos de alcance geral
(pactos) e instrumentos de alcance especial (convenções específicas), e sua incidência
não se limita a uma determinada região, podendo alcançar qualquer Estado integrante da
ordem internacional. Os Estados se aderem aos documentos internacionais no exercício
de sua soberania. Eles têm total liberdade para aceitar ou não o documento, mas se
aderirem ao regramento internacional, ficam obrigados a cumprir o seu conteúdo, o que
equivaleria dizer “terem aberto mão de parte de sua soberania”.
Há, no entanto, a real consolidação do Direito Internacional dos Direitos Humanos após
a Segunda Guerra Mundial. Diz o Prof. Buergenthal: “O moderno Direito Internacional dos
Direitos Humanos é um fenômeno do pós-guerra. Seu desenvolvimento pode ser atribuído às
monstruosas violações de direitos humanos da era Hitler e à crença de que parte destas
violações poderiam ser prevenidas se um efetivo sistema de proteção internacional de direitos
humanos existisse”.
Acrescenta a Prof. Flávia Piovesan: “A necessidade de uma ação internacional mais
eficaz para a proteção dos direitos humanos impulsionou o processo de internacionalização
desses direitos, culminando na criação da sistemática normativa de proteção internacional, que
faz possível a responsabilização do Estado no domínio internacional, quando as instituições
nacionais se mostram falhas ou omissas na tarefa de proteção dos direitos humanos”14.
As teses de que os Estados deveriam ter uma soberania absoluta e sem limites e
cederam lugar a que os doutrinadores afirmassem que “a soberania estatal não é um princípio
absoluto, mas deve estar sujeita a certas limitações em prol dos direitos humanos. Os direitos
humanos tornam-se uma legítima preocupação internacional com o fim da Segunda Guerra
Mundial, com a criação das Nações Unidas, com a adoção da Declaração Universal dos
Direitos Humanos pela Assembléia Geral da ONU, em 1948 e, como conseqüência, passam a
ocupar um espaço central na agenda das instituições internacionais. No período do pós-guerra,
os indivíduos tornam-se foco de atenção internacional. A estrutura do contemporâneo Direito
Internacional dos Direitos Humanos começa a se consolidar. Não mais poder-se-ia afirmar, no
fim do século XX, que o Estado pode tratar de seus cidadãos da forma que quiser, não
sofrendo qualquer responsabilização na arena internacional. Não mais poder-se-ia afirmar no
plano internacional that king can do no wrong”15.
E, sem dúvida, como declara a Prof. Flávia Piovesan: “Neste contexto, o Tribunal de
Nuremberg, em 1945-1946, significou um poderoso impulso ao movimento de
internacionalização dos direitos humanos. Ao final da Segunda Guerra e após intensos debates
sobre o modo pelo qual poder-se-ia responsabilizar os alemães pela guerra e pelos bárbaros
excessos do período, os aliados chegaram a um consenso, com o Acordo de Londres de 1945,
pelo qual ficava convocado um Tribunal Militar Internacional para julgar os criminosos de
guerra”.
“O Tribunal de Nuremberg aplicou fundamentalmente o costume internacional para a
condenação criminal de indivíduos envolvidos na prática de crime contra a paz, crime de guerra
e crime contra a humanidade, previstos pelo Acordo de Londres”16.
Ao lado do sistema global, surge o sistema regional de proteção, que busca
internacionalizar os direitos humanos no plano regional, particularmente na Europa, América e
África, e também é formado por instrumentos de alcance geral e de alcance especial.
14 PIOVESAN, Flávia. op. cit.
15 PIOVESAN, Flávia. op. cit.
16 Ib. op. cit.
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Compõem o sistema global de proteção os seguintes documentos internacionais,
ratificados pelo Brasil:
1. Carta das Nações Unidas, adotada e aberta à assinatura pela Conferência de São
Francisco em 26.6.1945 e assinada pelo Brasil em 21.9.1945;
2. Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada pela
Resolução n. 217 A (III) da Assembléia Geral das Nações Unidas em 10.12.1948 e assinada
pelo Brasil nesta mesma data;
3. Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, adotado pela Resolução n.
2.200 A (XXI) da Assembléia Geral das Nações Unidas em 16.12.1966, assinada pelo Brasil
em 24.1.1992;
4. Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, adotado pela
Resolução n. 2.200-A (XXI) da Assembléia Geral das Nações Unidas em 16.12.1966, assinada
pelo Brasil em 24.1.1992;
5. Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos
ou Degradantes, adotada pela Resolução n. 39/46, da Assembléia Geral das Nações Unidas
em 10.12.1984, assinada pelo Brasil em 28.9.1989;
6. Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a
Mulher, adotada pela Resolução n. 34/180 da Assembléia Geral das Nações Unidas em
18.12.1979, assinada pelo Brasil em 1.2.1984;
7. Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial,
adotada pela Resolução n. 2.106 A (XX) da Assembléia Geral das Nações Unidas em
21.12.1965, assinada pelo Brasil em 27.3.1968;
8. Convenção sobre ao Direitos da Criança, adotada pela Resolução L.44 (XLIV) da
Assembléia Geral das Nações Unidas em 20.11.1989, assinada pelo Brasil em 24.9.1990.
Compõem o sistema regional interamericano:
1. Convenção Americana de Direitos Humanos, adotada e aberta à assinatura na
Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos, em San José da Costa
Rica, em 22.11.1969, assinada pelo Brasil em 25.9.1992;
2. Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura, adotada pela
Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos, em 9.12.1985, assinada pelo
Brasil em 20.7.1989;
3. Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a
Mulher.
Com todas estas disposições legais internacionais “testemunha-se uma mudança
significativa nas relações interestatais, o que vem a sinalizar transformações na compreensão
dos Direitos Humanos que, a partir daí, não mais poderiam ficar confinados à exclusiva
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jurisdição doméstica. São lançados, assim, os mais decisivos passos para a
internacionalização dos direitos humanos”17.
2. PRECEITOS DA CARTA DAS NAÇÕES UNIDAS (1945)
O Prof. Fabio K. Comparato declara que: “A Guerra Mundial de 1939 a 1945 costuma
ser apresentada como a conseqüência da falta de solução, na Conferência Internacional de
Versalhes, às questões suscitadas pela Primeira Guerra Mundial e, portanto, de certa forma,
como as retomadas das hostilidades, interrompidas em 1918. Essa interpretação é plausível,
mas deixa na sombra o fato de que o conflito bélico deflagrado na madrugada de 1.º de
setembro de 1939, com a invasão da Polônia pelas forças armadas da Alemanha nazista,
diferiu profundamente da guerra de 1914 a 1918”.
“Diferiu não tanto pelo maior número de países envolvidos e a duração mais prolongada
do conflito – seis anos, a partir das primeiras declarações oficiais de guerra, sem contar,
portanto, a ocupação da Manchúria pelo Japão, em 1932, e a da Etiópia pela Itália, em 1935 –,
quanto pela descomunal cifra de vítimas. Calcula-se que 60 milhões de pessoas foram mortas
durante a Segunda Guerra Mundial, a maior parte delas civis, ou seja, seis vezes mais do que
no conflito do começo do século, em que as vítimas, em sua quase totalidade, eram militares.
Além disso, enquanto a guerra do início do século provocou o surgimento de cerca de 4
milhões de refugiados, com a cessação das hostilidades na Europa, em maio de 1945,
contavam-se mais de 40 milhões de pessoas deslocadas, de modo forçado ou voluntário, dos
países onde viviam em meados de 1939”.
Continua: “Mas, sobretudo, a qualidade ou índole das duas guerras mundiais foi bem
distinta. A de 1914-1918 desenrolou-se, apesar da maior capacidade de destruição dos meios
empregados (sobretudo com a introdução dos tanques e aviões de combate), na linha clássica
das conflagrações anteriores, pelas quais os Estados procuravam alcançar conquistas
territoriais, sem escravizar ou aniquilar os povos inimigos. A Segunda Guerra Mundial,
diferentemente, foi deflagrada com base em proclamados projetos de subjugação de povos
considerados inferiores, lembrando os episódios de conquista das Américas a partir dos
descobrimentos. Ademais, o ato final da tragédia – o lançamento da bomba atômica em
Hiroshima e Nagasaki, em 6 e 9 de agosto de 1945, respectivamente – soou como um
prenúncio de apocalipse: o homem acabara de adquirir o poder de destruir toda a vida na face
da Terra”.
Conclui dizendo: “As consciências se abriram, enfim, para o fato de que a sobrevivência
da humanidade exigia a colaboração de todos os povos na reorganização das relações
internacionais, com base no respeito incondicional à dignidade humana”.
A proteção dos direitos humanos surgiu como decorrência do processo de
internacionalização e universalização desses direitos, e teve como principais precedentes o
Direito Humanitário, a Liga das Nações e a Organização Internacional do Trabalho.
“Estes institutos rompem, assim, o conceito tradicional que concebia o Direito
Internacional apenas como a lei da comunidade internacional dos Estados e que sustentava
ser o Estado o único sujeito de Direito Internacional. Rompem ainda com a noção de soberania
17 PIOVESAN, Flávia. op. cit.
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nacional absoluta, na medida em que admitem intervenções no plano nacional, em prol da
proteção dos direitos humanos.
Prenunciava-se o fim da era em que a forma pela qual o Estado tratava seus nacionais
era concebida como um problema de jurisdição doméstica, restrito ao domínio reservado do
Estado, decorrência de sua soberania, autonomia e liberdade. Aos poucos, emerge a idéia de
que o indivíduo é não apenas objeto, mas também sujeito de direito internacional. A partir desta
perspectiva, começa a se consolidar a capacidade processual internacional dos indivíduos,
bem como a concepção de que os direitos humanos não mais se limitam à exclusiva jurisdição
doméstica, mas constituem interesse internacional”.
Pouco a pouco, compreendeu-se que a proteção dos Direitos Humanos não se encerra
na atuação do Estado, nem é questão meramente nacional.
Diante desse panorama, após a Segunda Guerra Mundial, as consciências se abriram
para o fato de que a sobrevivência da humanidade exigia a colaboração de todos os Estados
na reorganização das relações internacionais.
Desse modo, as nações se aperceberam que era urgente a criação de um órgão
internacional para a contenção das guerras. Na realidade, pode-se tomar como termo inicial
efetivo da manifestação dessa vocação a Primeira Guerra Mundial, ocorrida entre 1914 e 1918.
Com a derrota da Alemanha e de seus aliados, as nações vencedoras houveram por bem criar
uma organização internacional, que se denominou “Liga das Nações”, que não prosperou e
dissolveu-se em 1946, com a criação das Nações Unidas – ONU.
A eclosão da Segunda Guerra Mundial trouxe à tona a necessidade de criação de um
órgão internacional de controle efetivo da paz mundial. Então, representantes de 50 países,
entre os dias 25.4 e 26.6.1945, na cidade de São Francisco, Califórnia, redigiram a Carta das
Nações Unidas e, aos 24.10.1945, a Organização das Nações Unidas (ONU) estava
oficialmente criada.
“A ONU difere da Liga das Nações, na mesma medida em que a Segunda Guerra
Mundial se distingue da Primeira Enquanto em 1919 a preocupação única era a criação de uma
instância de arbitragem e regulação dos conflitos bélicos, em 1945 objetivou-se colocar a
guerra definitivamente fora da lei. Por outro lado, o horror engendrado pelo surgimento dos
Estados totalitários, verdadeiras máquinas de destruição de povos inteiros, suscitou em toda
parte a consciência de que, sem o respeito aos direitos humanos, a convivência pacífica das
nações tornava-se impossível.
Por isso, enquanto a Liga das Nações não passava de um clube de Estados, com
liberdade de ingresso e retirada conforme suas conveniências próprias, as Nações Unidas
nasceram com a vocação de se tornarem a organização da sociedade política mundial, à qual
deveriam pertencer, portanto, necessariamente, todas as nações do globo empenhadas na
defesa da dignidade humana”18.
Os objetivos principais da ONU são:
• a manutenção da paz e segurança internacionais;
• incremento de relações amistosas entre nações;
18 COMPARATO, Fábio Konder. op. cit.
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• cooperação internacional para a solução de problemas mundiais de ordem social,
econômica e cultural, incentivando o respeito pelos direitos e liberdades individuais.
A ONU se compõe de seis órgãos especiais, que são (Carta das Nações Unidas,
art. 7.º):
• Assembléia Geral;
• Conselho de Segurança;
• Conselho Econômico e Social;
• Conselho de Tutela;
• Corte Internacional de Justiça;
• Secretaria.
“Ao lado da preocupação de evitar a guerra e manter a paz e a segurança internacional,
a agenda internacional passa a conjugar novas e emergentes preocupações. A coexistência
pacífica entre os Estados, combinada com a busca de inéditas formas de cooperação
econômica e social, caracterizam a nova configuração da agenda da comunidade
internacional”.
A Carta das Nações Unidas de 1945 consolida o movimento de internacionalização dos
direitos humanos, a partir do consenso de Estados que elevam a promoção desses direitos ao
propósito e finalidade das Nações Unidas. Definitivamente, a relação de um Estado com seus
nacionais passa a ser uma problemática internacional, objeto de instituições internacionais e do
Direito Internacional, bastando, para tanto, examinar os arts. 1.º (3), 13, 55, 56, 62 (2 e 3) da
Carta das Nações Unidas.
Nos termos do art.1.º (3), fica estabelecido que um dos propósitos das Nações Unidas é
alcançar a cooperação internacional para a solução de problemas econômicos, sociais,
culturais ou de caráter humanitário e encorajar o respeito aos direitos humanos e liberdades
fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião.
Neste sentido, cabe à Assembléia Geral iniciar estudos e fazer recomendações, com o
propósito de promover a cooperação internacional para a solução de problemas econômicos,
sociais, culturais ou de caráter humanitário e encorajar o respeito aos direitos humanos e às
liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião, em
conformidade com o art. 13 da Carta. Também ao Conselho Econômico e Social cabe fazer
recomendações, com o propósito de promover o respeito e a observância dos Direitos
Humanos e das liberdades fundamentais, bem como preparar projetos de Convenções
Internacionais para este fim, nos termos do art. 62 da Carta da ONU.
O art. 55 reforça o objetivo de promoção dos Direitos Humanos, quando determina:
“Com vistas à criação de condições de estabilidade e bem estar, necessárias para a pacífica e
amistosa relação entre as Nações, e baseada nos princípios da igualdade dos direitos e da
autodeterminação dos povos, as Nações Unidas promoverão o respeito universal e a
observância dos Direitos Humanos e liberdades fundamentais para todos, sem distinção de
raça, sexo, língua ou religião”. O art. 56 reafirma o dever de todos os membros das Nações
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Unidas em exercer ações conjugadas ou separadas, em cooperação com a própria
organização, para o alcance dos propósitos lançados no art. 55.
O Prof. Comparato diz que: “No texto da Carta, como se vê, da leitura dos artigos 13 e
55, os direitos humanos foram concebidos como sendo, unicamente, as liberdades individuais”.
É verdade que o tratado instituidor da ONU atribui às Nações Unidas a incumbência de
favorecer entre os povos “níveis mais altos de vida, trabalho efetivo e condições de progresso e
desenvolvimento econômico e social”. Mas o efetivo direito ao desenvolvimento só veio a ser
reconhecido mais tarde.
Em contrapartida, a Carta das Nações Unidas afirma, inequivocamente, a existência de
um direito de autodeterminação dos povos.
O Texto
(Excertos)
“NÓS, OS POVOS DAS NAÇÕES UNIDAS, RESOLVIDOS a preservar as gerações
vindouras do flagelo da guerra, que por duas vezes, no espaço de nossa vida, trouxe
sofrimentos indizíveis à humanidade, e a reafirmar a fé nos direitos fundamentais do homem,
na dignidade e no valor do ser humano, na igualdade de direitos dos homens e das mulheres,
assim como das nações grandes e pequenas, e a estabelecer condições sob as quais a justiça
e o respeito às obrigações decorrentes de tratados e de outras fontes do direito internacional
possam ser mantidos, e a promover o progresso social e melhores condições de vida dentro de
uma liberdade mais ampla,
E PARA TAIS FINS, praticar a tolerância e viver em paz, uns com outros, como bons
vizinhos, e unir nossas forças para manter a paz e a segurança internacionais, e a garantir,
apela aceitação de princípios e a instituição de métodos, que a força armada não será usada a
não ser no interesse comum, a empregar um mecanismo internacional para promover o
progresso econômico e social de todos os povos,
RESOLVEMOS CONJUGAR NOSSOS ESFORÇOS PARA A CONSECUÇÃO DESSES
OBJETIVOS.
Em vista disso, nossos respectivos Governos, por intermédio de representantes
reunidos na cidade de São Francisco, depois de exibirem seus plenos poderes, que
foram achados em boa e devida forma, concordaram com a presente Carta das Nações
Unidas e estabelecem, por meio dela, uma organização internacional que será conhecida
pelo nome de Nações Unidas”.
Embora a Carta das Nações Unidas seja enfática em determinar a importância de se
defender, promover e respeitar os direitos humanos e as liberdades fundamentais – como
demonstram os dispositivos destacados – ela não define o conteúdo dessas expressões,
deixando-as em aberto. Daí o desafio em se desvendar o alcance e significado da expressão
“direitos humanos e liberdades fundamentais”, não definida pela Carta. Três anos após o
advento da Carta das Nações Unidas, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948,
veio a definir com precisão o elenco dos “direitos humanos e liberdades fundamentais a que
fazia menção os arts. 1.º (3), 13, 55, 56 e 62 da Carta”19.
19 PIOVESAN, Flávia. op. cit.
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Instrumentos Internacionais de Proteção dos Direitos Humanos
1. OS DIREITOS HUMANOS COMO TEMA GLOBAL
Como se sabe, existe uma polêmica muito grande sobre o fundamento e a natureza dos
direitos humanos, alguns reconhecendo-os como direitos naturais, portanto, inatos, outros
entendendo-os como direitos positivos, alguns ainda os vendo como direitos históricos. Certo é
que os direitos humanos, hoje, são universais, cabendo, antes de mais nada, efetivá-los e
protegê-los.
A universalidade dos direitos humanos é uma realidade. Como diz J. A. Lindgren Alves,
“(...) todas as Constituições nacionais redigidas após a adoção da Declaração pela Assembléia
Geral da ONU nela se inspiram ao tratar dos direitos e liberdades fundamentais, pondo em
evidência, assim, o caráter hoje universal de seus valores”20.
A consolidação dos direitos humanos, porém, ocorreu a partir de 1945, com o final da II
Guerra Mundial. Nesse período do pós-guerra, quando começou a tarefa de reconstrução da
dignidade humana, extremamente violada e aviltada num dos períodos mais negros da
História, os direitos humanos passaram a ser considerados numa ótica mundial, daí derivando
a sua internacionalização.
2. A DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS (1948)
A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi adotada em 10.12.1948. O seu
preâmbulo dá conta do sentimento que dominava aquele momento histórico na medida em que
reconhece a dignidade inerente a todas as pessoas, titulares de direitos iguais e inalienáveis.
Assim, o resgate da dignidade humana é o sentido maior dessa Declaração, uma vez
que assinala que basta ser um humano para ter dignidade e ser titular dos direitos que
enumera.
Essa Declaração, portanto, é uma reação, uma manifestação histórica contra as
atrocidades cometidas na II Guerra Mundial, apontando o devido e necessário respeito aos
direitos humanos, entendidos como universais.
A princípio, é interessante destacar, a Declaração revive os princípios da Revolução
Francesa, uma vez que, no seu artigo 1.º, destaca que “todas as pessoas nascem livres e
iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação
umas às outras com espírito de fraternidade”.
Esse dispositivo, pois, coloca em relevo os ideais da Revolução Francesa (igualdade,
liberdade e fraternidade), reconhecendo-os como valores universais de toda pessoa.
Ainda é interessante notar que, colocando esses ideais como valores supremos,
20 ALVES, J. A. Lindgren. Os Direitos Humanos como tema global. Perspectiva, 1994. p. 4.
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universais, indissociáveis, enfim, de igual valia para todas as pessoas, a Declaração instaura
uma ótica singular dos direitos.
Com efeito, a Declaração relaciona em seu texto direitos civis e políticos (que são os
chamados direitos de primeira geração, que traduzem o valor da liberdade), como direitos
sociais, econômicos e culturais (que são denominados direitos de segunda geração, que
traduzem o valor da igualdade), e contempla, ainda, a fraternidade como valor universal
(contempla, pois, os chamados direitos de terceira geração, que compreendem o direito à paz,
ao meio ambiente, ao desenvolvimento, à comunicação etc.).
Como ressalta Flávia Piovesan, “ao conjugar o valor da liberdade com o valor da
igualdade, a Declaração demarca a concepção contemporânea de direitos humanos, pela qual
esses direitos passam a ser concebidos como uma unidade interdependente e indivisível”21.
A idéia partilhada pela Declaração, pois, é a idéia de união, cumulação e interação dos
direitos humanos, e não, como ocorria anteriormente, de dicotomia entre os direitos
representativos da igualdade e os direitos representativos da liberdade.
Flávia Piovesan lembra que essa diretriz refletiu na Resolução n. 32/130 da Assembléia
Geral da Organização das Nações Unidas, na qual encontramos que “todos os direitos
humanos, qualquer que seja o tipo a que pertencem, se inter-relacionam necessariamente
entre si, e são indivisíveis e interdependentes”. Também refletiu na Declaração de Direitos
Humanos de Viena, de 1993, especificamente no artigo 5.º: “Todos os direitos humanos são
universais, indivisíveis, interdependentes e inter-relacionados (...)”.
Alguma discussão há sobre a natureza jurídica da Declaração, assim como sobre seu
valor jurídico.
Carlos Weis, escrevendo a respeito, afirma que a Declaração não decorre do surgimento
de direitos subjetivos aos cidadãos, nem obrigações internacionais aos Estados, uma vez
tratar-se de recomendação. Assinala, todavia, sua contribuição, pelo fato de ter influenciado
vários textos constitucionais, sustentando que refletiu e deu origem a vários tratados
internacionais, os quais, sim, com força vinculante22.
Flávia Piovesan, sobre o tema, diz que “a Declaração Universal não é um tratado. Foi
adotada pela Assembléia Geral das Nações Unidas sob a forma de resolução, que, por sua
vez, não apresenta força de lei”23.
Fábio Konder Comparato, por seu turno, professa que “tecnicamente, a Declaração
Universal do Homem é uma recomendação, que a Assembléia Geral das Nações Unidas faz
aos seus membros (Carta das Nações Unidas), artigo 10”24.
Embora a Declaração Universal de 1948 não configure um tratado internacional, Flávia
Piovesan e Fábio Konder Comparato, entre outros, entendem que a Declaração tem força
jurídica obrigatória e vinculante, pelo qual os Estados, à luz desse documento, têm o
compromisso de assegurar tais direitos às pessoas. Assim, entendem que a Declaração integra
o Direito Internacional, que, a par dos tratados e convenções, também recebe o influxo dos
costumes e princípios gerais de direito.
21 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. Max Limonad, 2000. p. 146.
22 WEIS, Carlos. Direitos Humanos comtemporâneos. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 69.
23 PIOVESAN, Flávia. op. cit. p. 48.
24 COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos Direitos Humanos. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 226-227
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Arrematando o tema, J. A. Lindgren Alves elucida que as declarações, em contraposição
aos tratados, convenções, pactos e acordos, não têm força jurídica compulsória. Assinala,
todavia, o caráter especial e peculiar da Declaração Universal.
Nesse sentido, e tendo em conta que a Declaração Universal é encarada como uma
interpretação autorizada da Carta das Nações Unidas, “a Declaração teria, para alguns
intérpretes, os efeitos legais de um tratado internacional”. Para outros, porém, “a força da
Declaração Universal dos Direitos Humanos, como a de qualquer outro documento congênere,
advém de sua conversão gradativa em norma consuetudinária”25.
Embora os dois posicionamentos, o valor desse documento (Declaração Universal) é
inegável, irrefutável, residindo no fato de que, de forma definitiva, a Declaração resgatou,
declarou e estabeleceu a universalidade dos direitos humanos, além de transformar-se em
fonte vinculante para todos os Estados, tanto que tais direitos vêm sendo incorporados às
constituições das nações. Nesse sentido, J. A. Lindgren Alves: “independentemente da
doutrina esposada, o que se verifica na prática é a invocação generalizada da Declaração
Universal como regra dotada de jus cogens, invocação que não tem sido contestada sequer
pelos Estados mais acusados de violação de seus dispositivos”26.
Apreciando o conteúdo da Declaração Universal, Carlos Weis ilustra que esse
documento inovou ao introduzir elementos humanos, como a universalidade, a indivisibilidade e
a interdependência27.
Dalmo de Abreu Dallari acentua esse conteúdo, referindo que a Declaração Universal
exibe características muito próprias: “o exame dos artigos da Declaração revela que ela
consagrou três objetivos fundamentais: A certeza dos direitos, exigindo que haja uma fixação
prévia e clara dos direitos e deveres, para que os indivíduos possam gozar dos direitos ou
sofrer imposições; a segurança dos direitos, impondo uma série de normas tendentes a
garantir que, em qualquer circunstância, os direitos fundamentais serão respeitados; a
possibilidade dos direitos, exigindo que se procure assegurar a todos os indivíduos os meios
necessários à fruição dos direitos, não se permanecendo no formalismo cínico e mentiroso da
afirmação de igualdade de direitos onde grande parte do povo vive em condições
subumanas”28.
A Declaração, já enfatizamos, proclama, no artigo 1.º, os ideais cunhados na Revolução
Francesa (a liberdade, a igualdade e a fraternidade), afirmando, tanto nesse artigo quanto no
seguinte (artigo 2.º), a universalidade dos direitos humanos (considerando que os direitos
humanos são inerentes a toda pessoa) e, na seqüência, entre os artigos 3.º e 21, declara os
direitos liberais clássicos, também chamados “liberdades públicas”, ou seja, enumera os
direitos civis e políticos.
Antonio Cassesse, citado por Flávia Piovesan, traz os ensinamentos de René Cassin,
que examinou de forma aprofundada o conteúdo da Declaração Universal dos Direitos do
Homem.
René Cassin assinala que a Declaração:
• relacionou os direitos pessoais (direitos à igualdade, à vida, à liberdade e à
segurança, entre outros) nos artigos 3.º a 11;
25 ALVES, J. A. Lindgren. op. cit. p.48.
26 Idem. loc. cit.
27 WEISS, Carlos. op. cit. p. 69.
28 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 16.ª ed. São Paulo: Saraiva, 1991. p. 179.
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• dispôs, nos artigos 12 a 17, os direitos que dizem respeito ao indivíduo em sua
relação com os grupos sociais dos quais participa (direitos à privacidade da vida
familiar e o direito ao casamento; o direito à liberdade de movimento no âmbito
nacional ou fora dele; o direito à nacionalidade; o direito ao asilo, na hipótese de
perseguição; direitos de propriedade e de praticar a religião);
• estabeleceu, nos artigos 18 a 21, as liberdades civis e os direitos políticos (liberdade
de consciência, pensamento e expressão; liberdade de associação e assembléia;
direito de votar e ser eleito; direito ao acesso ao governo e à administração pública);
• finalmente estabeleceu, nos artigos 22 a 27, os direitos exercidos nos campos
econômico e social (direitos nas esferas de trabalho e relações de produção; direito à
educação; direito ao trabalho, à assistência social e à livre escolha de emprego;
direito a justas condições de trabalho e ao igual pagamento para igual trabalho;
direito de fundar sindicados e participar; direito ao descanso e ao lazer; direito à
saúde, à educação e o direito de participar livremente na vida cultural da
comunidade)29.
Evidencia J. A. Lindgren Alves, todavia, que a melhor classificação é feita por Jack
Donnelly. Diz Donnelly que os direitos foram definidos na Declaração Universal em sete
categorias:
• direitos pessoais: incluindo os direitos à vida, à nacionalidade, ao reconhecimento
perante a lei, à proteção contra tratamentos ou punições cruéis, degradantes ou
desumanas, e à proteção contra a discriminação racial, étnica, sexual ou religiosa
(artigos 2.º a 7.º e 15);
• direitos judiciais: incluindo o acesso aos remédios por violações dos direitos básicos,
a presunção de inocência, a garantia de processo público justo e imparcial, a
irretroatividade das leis penais, a proteção contra prisão, detenção ou exílio
arbitrários, e contra a interferência na família, no lar e na reputação (artigos 8.º a 12);
• liberdades civis: especialmente as liberdades de pensamento, consciência e religião,
de opinião e expressão, de movimento e residência, e de reunião e de associação
pacífica (artigos 13 e 18 a 20);
• direitos de subsistência: particularmente os direitos à alimentação e a um padrão de
vida adequado, à saúde e ao bem-estar próprio e da família (artigo 25);
• direitos econômicos: incluindo principalmente os direitos ao trabalho, ao repouso e ao
lazer, e à segurança social (artigos 22 a 26 – proposital ou acidentalmente, Donnely
omite o artigo 27, sobre o direito à propriedade, que acabaria excluído dos Pactos
Internacionais de Direitos Humanos, conforme se verá adiante);
• direitos sociais e culturais: especialmente os direitos à instrução e à participação na
vida cultural da comunidade (artigos 26 e 28);
• direitos políticos: principalmente os direitos a tomar parte no governo e a eleições
legítimas com sufrágio universal e igual (artigo 21), mais os aspectos políticos de
29 CASSESSE, Antonio. Human Rights in a changing world. Philadelphia: Temple University, 1990. p.38-39 (cit. por Flávia
Piovesan, op. cit. p. 145 – rodapé).
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muitas liberdades civis30.
Interessante destacar, afinal, as considerações de Fábio Konder Comparato, que
vislumbra, na Declaração, um traço de suma importância, qual seja, “a afirmação da
democracia como único regime político compatível com o pleno respeito aos direitos humanos
(artigos 21 e 29, alínea 2)”, com o que considera que “o regime democrático já não é, pois, uma
opção política entre muitas outras, mas a única solução legítima para a organização do
Estado”.
A essência máxima da Declaração, aquela que é a pedra de toque desse documento,
reside em seu preâmbulo e no artigo 1.º, portanto, no seu pórtico, que é a afirmação solene de
que todas as pessoas têm dignidade e que essa dignidade acarreta, para todos, direitos
universais, indivisíveis, interdependentes, inalienáveis, imprescritíveis, ou seja, direitos que
permitam ao gênero humano a sua plena realização.
3. O PACTO INTERNACIONAL DOS DIREITOS CIVIS E POLÍTICOS
3.1. Histórico
Enquanto a Declaração Universal foi preparada e adotada em menos de dois anos, a
elaboração e a aprovação dos pactos internacionais, que a complementariam, levaram vinte
anos, e mais dez transcorreram para sua entrada em vigor. Assinala J. A. Lindgren Alves que
“a razão de tal demora se encontra fundamentalmente em seu caráter obrigatório para os
Estados-partes. E todos os tipos de controvérsias se fizeram presentes, primeiro no sentido
Leste-Oeste, depois no sentido Norte-Sul”.
Com efeito, a formulação do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, bem
assim o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, foi cercada de
intenso debate. A discussão se prendia à questão da conveniência de serem editados dois
pactos ou um único, contemplando todos esses direitos.
Consoante expõe Fábio Konder Comparato, “as potências ocidentais insistiam no
reconhecimento, tão-só, das liberdades individuais clássicas, protetoras da pessoa humana
contra os abusos e interferências dos órgãos estatais na vida privada. Já os países do bloco
comunista e os jovens países africanos preferiam pôr em destaque os direitos sociais e
econômicos, que têm por objeto políticas públicas de apoio aos grupos ou classes
desfavorecidas, deixando na sombra as liberdades individuais”.
Os países ocidentais, sobre o tema, defendiam a adoção de dois pactos distintos,
sustentando tal posicionamento no fato de que “enquanto os direitos civis e políticos eram auto-aplicáveis
e passíveis de cobrança imediata, os direitos sociais, econômicos e culturais eram
programáticos e demandavam realização progressiva”. A contraposição dos países socialistas
era no sentido de que “não era em todos os países que os direitos civis e políticos faziam-se
auto-aplicáveis e os direitos sociais, econômicos e culturais não auto-aplicáveis. A depender do
regime, os direitos civis e políticos poderiam ser programáticos e os direitos sociais,
30 DONNELLY, Jack. International Human Rights: a regime analysis. MIT, Summer, 1986. (cit. por J. A. Lindgren Alves.
op. cit. p.46-47).
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econômicos e culturais auto-aplicáveis”.
Os países ocidentais, que se opunham a uma formulação única, viam nessa situação
uma ameaça à noção individualista dos direitos humanos, para o que arrolavam três
argumentos substanciais, relacionados por J. A. Lindgren Alves: “O primeiro era o de que os
direitos correspondiam a espécies distintas: os civis e políticos seriam jurisdicionados,
passíveis de cobrança, o que não se aplicaria aos direitos econômicos e sociais. O segundo
era o de que os direitos civis e políticos seriam de aplicação imediata, enquanto os
econômicos, sociais e culturais somente poderiam ter realização progressiva. O terceiro dizia
respeito ao acompanhamento: para os direitos civis e políticos, o melhor mecanismo seria um
comitê que atendesse petições e queixas através de investigações e bons-ofícios, instrumento
inadequado para os direitos econômicos e sociais”. Para aqueles que defendiam uma
formulação única, a preocupação era no sentido de que “a separação poderia significar uma
diminuição da importância relativa dos chamados direitos de segunda geração”31.
Predominou, nessa discussão, a orientação no sentido da edição de dois pactos
internacionais, que desenvolveram o conteúdo da Declaração Universal dos Direitos do
Homem de 1948, todavia essa divisão foi artificial, pelo fato de que os documentos contemplam
direito humanos indissociáveis, indivisíveis, que formam um todo harmônico.
Em relação, especificamente, ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, objeto
de nosso estudo, este reconheceu, em relação à Declaração Universal, uma lista muito maior
de direitos civis e políticos. Esse tratado internacional, expõe Carlos Weis, cuida “dos direitos
humanos relacionados à liberdade individual, à proteção da pessoa contra a ingerência estatal
em sua órbita privada, bem como à participação popular na gestão da sociedade”, ou seja,
cuida dos denominados direitos humanos liberais ou liberdades públicas.
Verificando esse Pacto, podemos assinalar seis partes, compreendendo dispositivos que
dizem respeito:
a) à autodeterminação dos povos e à livre disposição de seus recursos naturais e
riquezas (artigo 1.º);
b) ao compromisso dos Estados de garantir os direitos previstos e as hipóteses de
derrogação de certos direitos (artigos 2.º ao 5.º);
c) aos direitos efetivamente reconhecidos (artigos 6.º ao 27);
d) aos mecanismos de supervisão e controle desses direitos (artigos 35 ao 39);
e) à integração e interação com a Organização das Nações Unidas (artigos 35 ao 39);
f) à ratificação e entrada em vigor (artigos 40 ao 47).
O Pacto, no artigo 1.º, assinala o direito à autodeterminação dos povos, reconhecendo
que os Estados têm o direito de determinar livremente seu estatuto político e estabelecer
livremente seu desenvolvimento econômico, social e cultural. Assegura, ainda, que os Estados
podem dispor livremente de suas riquezas e recursos naturais, em nenhum caso podendo os
povos serem privados de seus meios de subsistência.
31 ALVES, J. A. Lindgren. op. cit. p. 49
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Nos artigos 2.º e 3.º, na seqüência, o Pacto acentua o princípio da igualdade essencial
de todos os seres humanos, e que todas as pessoas têm direito aos direitos nele reconhecidos,
proclamando que é dever dos Estados-partes assegurar a homens e mulheres igualdade no
gozo dos direitos civis e políticos enunciados. Esse dever, assinale-se, inclui a obrigação de os
Estados-partes garantirem, a todas as pessoas, cujos direitos forem violados, recursos efetivos
e oponíveis contra as violações de direitos civis e políticos, portanto, o estabelecimento de um
sistema legal que possa enfrentá-las.
No artigo 4.º, o Pacto dispôs sobre a possibilidade de suspensão temporária do exercício
dos direitos humanos, mas tão-somente diante de situações que ameacem a existência da
nação e sejam proclamadas oficialmente. Convém destacar, todavia, que esse dispositivo
determina que a suspensão temporária não poderá atingir os direitos previstos nos artigos 6.º,
7.º, 8.º (§§ 1.º e 2.º), 11, 15, 16 e 18, isso por entender que tais direitos são intangíveis, não
podendo ser afastados por serem fundamentais para o atendimento da dignidade de toda
pessoa.
Na seqüência, o Pacto enuncia os direitos e liberdades que contempla, e que são os
seguintes:
• direito à vida;
• direito de não ser submetido à tortura ou a tratamentos cruéis, desumanos ou
degradantes;
• direito de não ser escravizado, nem submetido à servidão;
• direitos à liberdade e à segurança pessoal e de não ser sujeito à prisão ou detenção
arbitrárias;
• direito a julgamento justo;
• direito à igualdade perante a lei;
• direito à proteção contra interferência arbitrária na vida privada;
• direito à liberdade de movimento;
• direito a uma nacionalidade;
• direito de casar e de formar família;
• direito às liberdades de pensamento, consciência e religião;
• direito às liberdades de opinião e de expressão;
• direito à reunião pacífica;
• direito à liberdade de associação e direito de aderir a sindicatos;
• direito de votar e de tomar parte no Governo32.
32 ALVES, J. A. Lindgren. op. cit. p. 52.
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É importante destacar que o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos reitera e
pormenoriza direitos encontráveis na Declaração Universal, todavia avança em certos pontos,
inclusive abrigando novos direitos e garantias não previstos na Declaração.
Flávia Piovesan escreve nesse sentido: “Constata-se que o Pacto abriga novos direitos e
garantias não incluídos na Declaração Universal, tais como o direito de não ser preso em razão
de descumprimento de obrigação contratual (artigo 11); o direito da criança ao nome e à
nacionalidade (artigo 24); a proteção dos direitos de minorias à identidade cultural, religiosa e
lingüística (artigo 27); a proibição da propaganda de guerra ou de incitamento da intolerância
étnica ou racial (artigo 20); o direito à autodeterminação (artigo 1.º), dentre outros. Esta gama
de direitos, insiste-se, não se vê incluída na Declaração Universal”33.
Dois direitos, todavia, previstos na Declaração, não tiveram previsão no Pacto: o direito
de propriedade e o direito de procurar ou gozar asilo em outros países em razão de
perseguição.
Em relação ao direito de propriedade, que, previsto no artigo 17 da Declaração, não teve
qualquer referência no Pacto. J. A. Lindgren Alves assinala que os Estados Unidos propuseram
a sua inclusão, todavia cederam, pois o texto proposto remetia a regulamentação do direito à
legislação de cada país e, tendo em conta o receio de que isso pudesse legitimar
expropriações sem compensação financeira, a delegação norte-americana concordou com a
supressão daquele direito do texto final34.
Quanto ao direito de procurar ou gozar asilo em outros países, em razão de
perseguição, direito esse reproduzido no artigo 14 da Declaração Universal, ele não constou,
de forma específica, no Pacto.
A última questão que merece atenção, ao analisarmos o Pacto, é a que diz respeito ao
mecanismo de sua implementação. O Pacto, para tal, instituiu um Comitê de Direitos Humanos,
composto por dezoito membros eleitos a título pessoal, e os Estados-partes se obrigavam “a
apresentar relatórios sobre as medidas adotadas para dar efeito aos direitos reconhecidos” e
“sobre os progressos realizados no gozo desses direitos” (previsão no artigo 40, § 1.º), sendo
que esses relatórios, encaminhados ao Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas,
são depois encaminhados a esse Comitê, que os analisa e se reporta aos Estados-partes.
O artigo 41 autoriza que, na seqüência, um Estado-parte informe ao Comitê sobre o não
cumprimento, por outro Estado-parte, das disposições do Pacto, desde que o Estado
denunciante reconheça expressamente tal direito em relação a ele próprio.
Finalmente, vale lembrar, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos é
acompanhado de um Protocolo Facultativo, por meio do qual os Estados-partes, que o
ratificam, reconhecem a competência desse Comitê dos Direitos Humanos para receber e
considerar comunicações individuais quanto aos descumprimentos do Pacto.
Flávia Piovesan diz que “a importância do Protocolo está em habilitar o Comitê de
Direitos Humanos a receber e examinar petições encaminhadas por indivíduos, que aleguem
serem vítimas de violação de direitos enunciados pelo Pacto dos Direitos Civis e Políticos”.
Acrescenta que essa denúncia individual só pode ser admitida se o Estado denunciado tiver
retificado o Pacto e o Protocolo, e que “o Comitê de Direitos Humanos recentemente concluiu
33 PIOVESAN, Flávia. op. cit. p. 167.
34 Nesse sentido: ALVES, J. A. Lindgren. op. cit. p. 49-50; WEIS, Carlos. op. cit. p. 77-78.
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que as comunicações podem ser encaminhadas por organizações ou terceiras pessoas, que
representem o indivíduo que sofreu a violação”35.
Importante considerar que, após o procedimento previsto, essa comunicação merece
uma decisão por parte do Comitê, pelo voto da maioria dos membros presentes, e, por essa
decisão, o Comitê de Direitos Humanos, além de declarar a violação de direitos, poderá
determinar que o Estado-parte repare a violação, adotando as providências necessárias para
impedi-la.
Diz Flávia Piovesan que não há sanção prevista para o não atendimento a essa decisão,
que não tem força obrigatória, vinculante, porém esse não atendimento acarreta ao Estado
violador conseqüências no plano político, redundando em constrangimento político e moral a
ele36.
J. A. Lindgren Alves, finalizando suas considerações sobre o tema, diz que o Pacto e o
Protocolo Facultativo respeitam as soberanias nacionais, mas o fato de sua aprovação pela
Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas e o fato de os Estados-partes aderirem
a seus termos, portanto, admitirem que violações sejam trazidas ao conhecimento do Comitê
de Direitos Humanos, traduzem “a primeira afirmação, por foro que se propõe universal, de que
assuntos qualificados como de competência interna podem ser objeto de acompanhamento
internacional”37.
Instrumentos Internacionais de Proteção dos Direitos Humanos
1. SISTEMA GLOBAL
Os instrumentos internacionais dos direitos humanos começaram a ser aplicados
após a II Guerra Mundial. O conceito de direitos humanos foi introduzido a partir da
Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948.
Na realidade, o Direito Internacional surge como conseqüência das violações dos
direitos humanos, da era Hitler, e, também, para evitar que essas violações viessem
novamente a ocorrer no futuro. Declara Richard B. Bilder: “O Direito Internacional dos Direitos
Humanos consiste em um sistema de normas internacionais, procedimentos e instituições
desenvolvidas para implementar esta concepção e promover o respeito dos direitos humanos
em todos os países, no âmbito mundial. Embora a idéia de que os seres humanos têm direitos
e liberdades fundamentais que lhe são inerentes tenha há muito tempo surgido no pensamento
humano, a concepção de que os direitos humanos são objeto próprio de uma regulação
internacional, por sua vez, é bastante recente (...). Muitos dos direitos que hoje constam do
‘Direito Internacional dos Direitos Humanos’ surgiram apenas em 1945, quando, com as
implicações do holocausto e de outras violações dos direitos humanos cometidas pelo
nazismo, as nações decidiram que a promoção de direitos humanos e liberdades fundamentais
deve ser um dos principais propósitos da Organização das Nações Unidas”.
Entende-se, portanto, que a proteção dos direitos humanos não deve ficar adstrita ao
Estado, “não deve se restringir à competência nacional exclusiva ou à jurisdição doméstica
35 PIOVESAN, Flávia. op. cit. p. 169-171.
36 PIOVESAN, Flávia. op. cit. p. 172-173.
37 ALVES, J. A. Lindgren. op. cit. p. 53.
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exclusiva, porque revela tema de legítimo interesse internacional. Por sua vez, esta concepção
inovadora aponta para duas importantes conseqüências:
• a revisão da noção tradicional de soberania absoluta do Estado, que passa a sofrer
um processo de relativização, na medida em que são admitidas intervenções no
plano nacional em prol dos direitos humanos, isto é, permitem-se formas de
monitoramento e responsabilização internacional, quando os direitos humanos
forem violados;
• a cristalização da idéia de que o indivíduo deve ter direitos protegidos na esfera
internacional na condição de sujeito de Direito”.
Além do caráter universal dos direitos humanos, a Declaração de 1948 estabelece o
conceito contemporâneo desses direitos, declarando que eles compõem uma unidade
indivisível, interdependente e inter-relacionada.
Diz a Prof. Flávia Piovesan: “Ao consagrar direitos civis e políticos e direitos
econômicos, sociais e culturais, a Declaração ineditamente combina o discurso liberal e o
discurso social da cidadania, conjugando o valor da liberdade ao valor da igualdade”.
“A Declaração Universal de Direitos Humanos se distingue das tradicionais Cartas de
Direitos Humanos que constam de diversas normas fundamentais e constitucionais dos séculos
XVIII e XIX e começo do século XX, na medida em que ela consagra não apenas direitos civis
e políticos, mas também direitos econômicos, sociais e culturais, como o direito ao trabalho e à
educação”.
Sem o acesso aos direitos econômicos, sociais e culturais, os direitos civis terão um
aspecto meramente formal e, sem a aplicabilidade dos direitos civis e políticos, os direitos
econômicos e sociais perderão seu significado. “Não há mais como cogitar a liberdade
divorciada da justiça social, como também infrutífero pensar na justiça social divorciada da
liberdade. Em suma, todos os direitos humanos constituem um complexo integral, único e
indivisível, em que os diferentes direitos estão necessariamente inter-relacionados e
interdependentes entre si”.
Como estabeleceu a Resolução n. 21/130 da Assembléia Geral da Organização das
Nações Unidas: “Todos os direitos humanos, qualquer que seja o tipo a que pertencem, se
inter-relacionam necessariamente entre si, e são indivisíveis e interdependentes”. Essa
concepção foi reiterada na Declaração de Viena, de 1993, que afirma, em seu § 5.º, que os
direitos humanos são universais, indivisíveis, interdependentes e inter-relacionados.
Essa Declaração serve de fundamento para a atuação de todos os Estados que
compõem a comunidade internacional, determinando uma só forma de atuação internacional
na aplicação desses direitos. A partir da aprovação da Declaração Universal de 1948 e da
concepção contemporânea de direitos humanos por ela introduzida, começa a desenvolver-se
o Direito Internacional dos Direitos Humanos, mediante a adoção de inúmeros tratados
internacionais voltados à proteção de direitos fundamentais.
“Forma-se o sistema normativo global de proteção dos direitos humanos, no âmbito das
Nações Unidas. Esse sistema normativo, por sua vez, é integrado por instrumentos de alcance
geral (como os Pactos Internacionais de Direitos Civis e Políticos e de Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais de 1966) e por instrumentos de alcance específico, como as Convenções
Internacionais”.
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Temos, então, o sistema geral e o sistema especial dos direitos humanos, que se
interligam. O sistema especial de proteção apoia-se no sujeito de direito que é estudado em
sua individualidade e particularidade, como no caso de proteção à criança, às mulheres etc. Já
o sistema geral de proteção (Pactos da Organização das Nações Unidas de 1996) tem como
objeto a pessoa, genérica e abstratamente considerada.
Conforme declara a Profa. Flávia Piovesan, “... ao lado do sistema normativo global
surge o sistema normativo regional de proteção, que busca internacionalizar os direitos
humanos no plano regional, particularmente na Europa, América e África. Consolida-se, assim,
a convivência do sistema global – integrado pelos instrumentos das Nações Unidas, como a
Declaração Universal de Direitos Humanos, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos,
o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais, Culturais e as demais Convenções
Internacionais – com instrumentos do sistema americano, europeu e africano de proteção aos
direitos humanos.
Os sistemas global e regional não são dicotômicos, mas complementares. (...) Em face
desse complexo universo de instrumentos internacionais, cabe ao indivíduo que sofreu violação
de direito a escolha do aparato mais favorável, tendo em vista que, eventualmente, direitos
idênticos são tutelados por dois ou mais instrumentos de alcance global ou regional, ou ainda
de alcance geral ou especial. Nesta ótica, os diversos sistemas de proteção de direitos
humanos interagem em benefício dos indivíduos protegidos”.
Qual é a posição brasileira em face da aplicação das normas concernentes aos direitos
humanos?
A Constituição Federal de 1988, nos termos do artigo 1.º, inciso III, impõe o valor da
dignidade humana. “A dignidade humana e os direitos fundamentais vêm a constituir os
princípios constitucionais que incorporam as exigências de justiça e dos valores éticos,
conferindo suporte axiológico a todo o sistema jurídico brasileiro. Na ordem de 1988, esses
valores passam a ser dotados de uma especial força expansiva, projetando-se por todo
universo constitucional e servindo como critério interpretativo de todas as normas do
ordenamento jurídico nacional”.
O artigo 5.º da Constituição Federal de 1988 afirma que os direitos e garantias nela
expressos “não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou
dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. Incluiu, pois,
entre os direitos protegidos pela Constituição Federal, os direitos determinados nos tratados
internacionais dos quais o Brasil seja signatário. De acordo com a Prof. Flávia Piovesan, “ao
efetuar tal incorporação, a Carta está a atribuir aos direitos internacionais uma hierarquia
especial e diferenciada, qual seja, a de norma constitucional. Esse tratamento jurídico se
justifica, na medida em que os tratados internacionais de direitos humanos apresentam um
caráter especial, distinguindo-se dos tratados internacionais comuns”.
Ao considerarem-se, portanto, os tratados internacionais, ratificados pelo Estado
brasileiro, podemos listar inúmeros direitos neles enunciados, que passam a fazer parte do
Direito brasileiro. Esses direitos são declinados não de maneira taxativa, mas de forma
exemplificativa. Logo, o Direito Internacional dos Direitos Humanos torna abrangente o
universo dos direitos constitucionais assegurados.
Conclui-se, pois, que os tratados internacionais de direitos humanos garantem sua
“imperatividade jurídica, ora adicionando novos direitos, ora suspendendo preceitos que sejam
menos favoráveis à proteção dos direitos humanos. Em todas essas hipóteses, os direitos
internacionais constantes dos tratados de direitos humanos apenas vêm a aprimorar e
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fortalecer, nunca restringir ou debilitar, o grau de proteção dos direitos consagrados no plano
normativo constitucional”.
2. PACTO INTERNACIONAL DOS DIREITOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS
(1966)
A Carta da Organização das Nações Unidas de 1945, em seu artigo 55, declara: “Com o
fim de criar condições de estabilidade e bem-estar, necessárias às relações pacíficas e
amistosas entre as Nações, baseadas no respeito ao princípio da igualdade de direitos e da
autodeterminação dos povos, as Nações Unidas favorecerão:
• níveis mais altos de vida, trabalho efetivo e condições de progresso e
desenvolvimento econômico e social;
• a solução dos problemas internacionais econômicos, sociais, sanitários e conexos;
a cooperação internacional, de caráter cultural e educacional; e
• o respeito universal e efetivo dos direitos humanos e das liberdades fundamentais
para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião”.
Em 1948, a Declaração Universal define e fixa os direitos e liberdades
fundamentais a serem garantidos.
Para a Profa. Flávia Piovesan, “... sob um enfoque estritamente legalista (não
compartilhado por este trabalho) a Declaração Universal, em si mesma, não apresenta força
jurídica obrigatória e vinculante. Nessa visão, assumindo a forma de declaração (e não de
tratado), vem a atestar o conhecimento universal de direitos humanos fundamentais,
consagrando um código comum a ser seguido por todos os Estados”.
À luz desse raciocínio e considerando a ausência de força jurídica vinculante da
Declaração, após a sua adoção em 1948, instaurou-se uma larga discussão sobre qual seria a
maneira mais eficaz de assegurar o reconhecimento e a observância universal dos direitos nela
previstos. Prevaleceu, então, o entendimento de que a Declaração deveria ser “juridicizada”
sob a forma de tratado internacional, que fosse juridicamente obrigatório e vinculante no âmbito
do Direito Internacional.
Esse processo de “juridicização” da Declaração começou em 1949 e foi concluído em
1966 com a elaboração de dois tratados internacionais distintos – o Pacto Internacional dos
Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais –,
que passavam a incorporar os direitos constantes da Declaração Universal. Ao transformar os
dispositivos da Declaração em previsões juridicamente vinculantes e obrigatórias, esses dois
Pactos Internacionais constituem referências necessárias para o exame do regime normativo
de proteção internacional dos direitos humanos.
A partir da elaboração desses Pactos forma-se a Carta Internacional dos Direitos
Humanos (International Bill of Rights), integrada pela Declaração Universal de 1948 e pelos
dois Pactos Internacionais de 1966.
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Ambos os Pactos criaram um sistema próprio para a implementação dos direitos
humanos neles contidos.
O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais foi criado para dar
força jurídica aos preceitos relacionados aos Direitos Econômicos, Culturais e Sociais
estabelecidos na Declaração da Organização das Nações Unidas de 1948, que não passava
de uma mera recomendação, e foi adotado pela Organização das Nações Unidas , em 1966,
com o objetivo maior de incorporar os dispositivos da Declaração Universal de Direitos
Humanos de 1948 sob a forma de preceitos juridicamente obrigatórios e vinculantes. Assim,
para proteger tais direitos, foram estabelecidas obrigações dos Estados-membros, cuja
violação importa em responsabilidade internacional.
Esse Pacto expandiu o rol dos direitos econômicos, sociais e culturais determinados
pela Declaração Universal de 1948. A finalidade desse Pacto foi a de adotar uma linguagem de
direitos que implicasse obrigações no plano internacional. Criou, assim, obrigações legais para
os Estados-membros, permitindo a sua responsabilização internacional em caso de violação
dos direitos ali enunciados.
Segundo bem afirma Carlos Weis38, o Pacto se divide em cinco partes, quais sejam:
1) a autodeterminação dos povos e a livre disposição de recursos naturais e riquezas;
2) o compromisso dos Estados de implementarem os direitos previstos;
3) os direitos propriamente ditos;
4) o exercício de supervisão por meio de apresentação de relatórios ao ECOSOC;
5) as normas referentes à sua ratificação e entrada em vigor.
Quanto aos direitos protegidos, esse Pacto visa a proteção das condições sociais,
econômicas e culturais, destacando-se: o direito ao trabalho, o direito a condições justas e
favoráveis de trabalho; o direito a formar sindicatos e participar deles; o direito de greve,
exercido em conformidade com as leis de cada país; o direito à segurança social, inclusive aos
seguros sociais; o direito à proteção e assistência familiar, especialmente às mães e às
crianças; o direito à educação e o direito a participar da vida cultural e dos benefícios da
ciência39.
A distinção mais importante entre os direitos econômicos, sociais e culturais e os direitos
civis e políticos está na sua aplicabilidade. Para se compreender melhor essa distinção é
necessária a caracterização das normas quanto à eficácia e aplicabilidade. De acordo com
esses parâmetros, elas são divididas, segundo José Afonso da Silva40, em:
• normas de eficácia plena e aplicabilidade direta, imediata, integral;
• normas de eficácia contida e aplicabilidade direta e imediata, mas provavelmente não
integral;
38 O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. In Direitos Humanos: Construção da Liberdade e
Igualdade. Série Estudos, n. 11. Out. 1998.
39 LEWANDOWSKI, Enrique Ricardo. Proteção dos Direitos Humanos na Ordem Interna e Internacional. São Paulo:
Forense, 1984.
40 Aplicabilidade das Normas Constitucionais. Título II, Capítulo 1,
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• normas de eficácia limitada:
- declaratórias de princípios institutivos ou organizativos;
- declaratórias de princípio programático.
Assim, enquanto os direitos políticos individuais se caracterizam pelo exercício
imediato e a efetividade de instrumentos que assegurem a sua plena realização, os direitos
sociais, econômicos e culturais se caracterizam pela não auto-aplicabilidade, enquadrando-se
nas normas de eficácia limitada, declaratórias, de princípio programático. Sendo assim,
para se tornarem efetivos, dependem de uma ação progressiva, não sendo exigíveis de
imediato. Estão condicionados à atuação do Estado, “... que deve adotar medidas
econômicas e técnicas, isoladamente ou através de assistência e cooperação
internacional, até o máximo de seus recursos disponíveis, com vista a alcançar
progressivamente a completa realização dos direitos previstos pelo pacto” (artigo 12, § 1.º,
do Pacto).
Nesse sentido, é importante a observação feita por Thomas Buergental: “Ao ratificar este
Pacto, os Estados não se comprometeram a atribuir efeitos imediatos aos direitos nele
enumerados. Os Estados se obrigam meramente a adotar medidas, até o máximo dos recursos
disponíveis, a fim de alcançar progressivamente a plena realização destes direitos”41.
Para monitorar e implementar tais direitos, o tratado prevê o mecanismo de relatórios a
serem encaminhados pelo Estado-Membro. Nestes, estarão medidas utilizadas para a
concretização de tais dispositivos. Além disso, devem constar os obstáculos encontrados para
isso. Tais relatórios serão analisados pelo Conselho Econômico e Social. Cabe ressaltar que,
se a implementação de tais direitos é um processo progressivo, a edição de três medidas
nesse sentido deve ser feita em um curto espaço de tempo, o que demonstra o empenho em
cumprir aquilo que foi acordado.
Da ausência de eficácia plena decorre a discussão doutrinária a respeito da
caracterização desses direitos como direitos positivos reais ou apenas como sugestões
políticas. Para a Teoria Clássica do Direito, encabeçada por Hans Kelsen, o direito só existe
quando há uma sanção referente ao seu não cumprimento, não existindo direito positivo sem
esse mecanismo garantidor do seu mínimo de eficácia. Assim, faltaria a esses direitos sociais
características mínimas de todo e qualquer direito, como a praticabilidade, a punibilidade, a
clareza.
Norberto Bobbio ressalta: “As exigências que se concretizam na demanda de uma
intervenção pública e de uma prestação de serviços sociais por parte do Estado só podem ser
satisfeitas num determinado nível de desenvolvimento econômico e tecnológico; e que, com
relação à própria teoria, são precisamente certas transformações sociais e certas inovações
técnicas que fazem surgir novas exigências, imprevisíveis e inexeqüíveis, antes que essas
transformações e inovações tivessem ocorrido. Isso nos traz uma ulterior confirmação da
sociabilidade e da não naturalidade, desses direitos”42.
Contra essa teoria se opõem inúmeros teóricos, que afirmam a obrigatoriedade e
naturalidade desses direitos que, apesar da necessidade de apoio estatal, têm sua eficácia
garantida pela democracia social e pela própria estruturação de muitos Estados, como o
41 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. São Paulo: Max Limonad, 1996).
42 A Era dos Direitos. Rio de Janeiro: Campos, 1992.
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Estado brasileiro, que se propõe na Constituição Federal a “erradicar a pobreza e a
marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais” (artigo 3.º, inciso III).
Vários autores, ao constatarem a falta de eficácia e aplicabilidade imediata desses
direitos, preferem utilizar-se do termo “normas programáticas”, que seriam programas a serem
realizados no futuro. Assim, caracterizariam-se como ideais a serem concretizados pelos
Estados, a depender das condições sócio-políticas.
Essa posição não pode gerar uma posição de indolência do Estado e de ausência de
proteção às pessoas humanas. Esses direitos, considerados como um ideal, acabam por
enquadrar-se mais no campo da política do que no campo do Direito. E, nesse sentido,
necessitariam de uma reforma, tendo em vista uma ação concreta do Estado visando à
ampliação das formas de exigência, pelos particulares, desses direitos. Assim, vêm sendo
criados mecanismos de cidadania como a ação civil pública, a iniciativa popular e o mandado
de injunção.
Segundo David M. Trubek, os direitos sociais invocam o que é mais básico e universal
acerca dessa dimensão do Direito Internacional. Por trás dos direitos específicos consagrados
nos documentos internacionais e acolhidos pela comunidade internacional, repousa uma visão
social do bem-estar individual. Isto é, a idéia de proteção a esses direitos envolve a crença de
que o bem-estar individual resulta, em parte, de condições econômicas, sociais e culturais, nas
quais todos nós vivemos, bem como envolve a visão de que o governo tem a obrigação de
garantir adequadamente tais condições para todos os indivíduos43.
Analisando o que ocorre na prática, a comunidade internacional ainda tolera violações
de tais direitos, o que não ocorre com os direitos civis e políticos, demonstrando que, ainda
hoje, estes são considerados mais importantes que os econômicos, sociais e culturais.
Os direitos econômicos e sociais possuem apenas um sistema de relatórios, uma vez
que sua implementação somente poderá ser apreciada se forem observados o grau de
desenvolvimento específico de cada Estado e a atuação da Organização das Nações Unidas
por meio de suas agências especializadas. Embora o Pacto dos Direitos Econômicos e Sociais
tenha influenciado algumas Convenções Internacionais, como a Carta Social Européia, este
ainda se apresenta com alto grau de dificuldade para implementação, uma vez que suas
prescrições são tomadas como standards não obrigatórios, ficando sob à égide das
autoridades nacionais o poder de transformá-las em deveres coercitivos a serem respeitados
pelo próprio Estado, pela sociedade ou pelos indivíduos em relação a outros indivíduos.
Enquanto o Pacto dos Direitos Civis e Políticos estabelece os direitos dos indivíduos, o
Pacto dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais determina os deveres dos Estados. Assim,
os direitos civis e políticos, garantidos pelo Estado, são aplicados imediatamente; os direitos
sociais, econômicos e culturais, de acordo com o Pacto, têm uma realização progressiva,
significando que “são direitos que estão condicionados à atuação do Estado, que deve adotar
medidas econômicas e técnicas, isoladamente e através da assistência e cooperação
internacionais, até o máximo de seus recursos disponíveis com vistas a alcançar
progressivamente a completa realização dos direitos previstos pelo Pacto” (artigo 2.º, § 1.º, do
Pacto).
O Pacto admite ser muito difícil a sua aplicação imediata quando se tratar de direitos
econômicos, sociais e culturais, e, portanto, a sua aplicação será paulatina.
43 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Internacional. São Paulo: Max Limonad, 1996.
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No sistema interamericano, o fato de os direitos econômicos, sociais e culturais estarem
previstos no corpo do mesmo documento dos direitos civis e políticos, o que a princípio poderia
ter proporcionado igualdade de tratamento entre tais direitos, na realidade acentuou ainda mais
essa dicotomia ao conferir, dos 82 artigos da Convenção Interamericana de Direitos Humanos,
apenas 1 artigo aos direitos econômicos, sociais e culturais.
Tal visão sofreu, porém, alteração graças à I Conferência Mundial dos Direitos
Humanos, realizada em Teerã, em 1968, na qual foi estabelecida a indivisibilidade dos direitos
humanos.
No plano regional interamericano, o Protocolo de San Salvador, de 1988, introduziu um
sistema de petições e relatórios dentro da idéia de progressividade.
A principal transformação ocorreu na Convenção de Viena, de 1993, por meio da qual se
“conclama a necessidade de se eliminar a pobreza e a exclusão social que constituem uma alta
violação aos direitos econômicos e sociais. Confere ainda grande relevância ao direito de
desenvolvimento como direito humano e reconhece a necessidade de modificação do sistema
de proteção internacional dos direitos econômicos e sociais à realidade atual, bem como
preocupa-se com a incorporação do direito internacional no plano interno como meio de
dificultar a violação desses direitos, já que os sistemas internacionais e internos devem ser
vistos de uma forma integrada”.
A sistemática de aplicação dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais é específica,
pois será realizada por meio de relatórios encaminhados pelos Estados-membros. Apesar
dessa sistemática, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais prevê
importantes dispositivos que apresentam aplicação imediata: “Enquanto o Pacto estabelece a
progressiva realização destes direitos, a depender da limitação de recursos disponíveis, ele
também impõe diversas obrigações de aplicação imediata. Uma delas se atém à obrigação de
que os direitos devem ser exercidos de forma não discriminatória”.
O Pacto dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais não possui um comitê
próprio e não estabelece o mecanismo de comunicação interestadual, tampouco permite
a sistemática das comunicações individuais. A maneira de proteção dos direitos sociais,
econômicos e culturais fica, portanto, adstrita ao sistema de relatórios, muito embora
esses direitos sejam autênticos e verdadeiros direitos fundamentais.
O mecanismo dos relatórios, única sistemática de monitoramento prevista no Pacto
Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, mostra-se insuficiente e inoperante
para proteger os direitos nele enunciados.
A Declaração de Programa de Ação de Viena, de 1993, recomendou o direito de petição
a este Pacto, projeto este que está em fase de elaboração na Organização das Nações Unidas
.
Por sua vez, a Convenção Americana de Direitos Humanos, assinada em São José da
Costa Roca (ou Pacto de São José, como é conhecida), é, atualmente, o documento de maior
importância dentro do sistema interamericano de proteção dos direitos humanos.
Chega-se à conclusão então de que: “sob o ângulo pragmático, no entanto, a
comunidade internacional continua a tolerar freqüentes violações aos direitos sociais,
econômicos e culturais que, se perpetradas em relação aos direitos civis e políticos,
provocariam imediato repúdio internacional. Em geral, a violação aos direitos sociais,
econômicos e culturais é resultado tanto da ausência de forte suporte e intervenção
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governamental, como da ausência de pressão internacional a favor dessa intervenção. É,
portanto, um problema de ação e de prioridade governamental e implementação de políticas
públicas, que sejam capazes de responder a graves problemas sociais”.
E, nos dizeres do Statement to the World Conference on Human Rights on Behalf of the
Committee on Economic, Social and Cultural Rights: “Com efeito, democracia, estabilidade e
paz não podem conviver com condições de pobreza crônica, miséria e negligência. Além disso,
essa insatisfação criará grandes e renovadas escalas de movimentos de pessoas, incluindo
fluxos adicionais de refugiados e migrantes, denominados ‘refugiados econômicos’, com todas
as suas tragédias e problemas. (...) Direitos sociais, econômicos e culturais devem ser
reivindicados como direitos e não como caridade ou generosidade”.
Assim, ainda que o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais
(Organização das Nações Unidas ) e a Convenção Interamericana sobre os Direitos Humanos
(Organização dos Estados Americanos) determinem a implementação progressiva dos direitos
econômicos, sociais e culturais, há exigibilidade imediata de que o Estado tome algumas
medidas, entre elas, por exemplo, o planejamento da ação estatal e da mobilização de
recursos que fiquem vinculados à realização daqueles direitos.
Convenção sobre a Eliminação de Todas as
Formas de Discriminação Racial (1968)
1. INTRODUÇÃO
Em primeiro lugar, verificando o tema em comento, que é o estudo da Convenção sobre
a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, necessária se faz uma ponderação
sobre o pano de fundo, uma ponderação quanto à viga-mestra que orienta e que é a razão pela
qual a Convenção foi erigida.
Não há dúvida que o pano de fundo desse documento é o direito à igualdade, valor
supremo cristalizado como direito fundamental.
Realmente, e já sabemos disso, a Declaração Universal dos Direitos Humanos retomou
os ideais da Revolução Francesa, reconhecendo os valores supremos da igualdade, da
liberdade e da fraternidade, e a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação Racial é mais um instrumento no caminho para atingirmos a igualdade
substantiva e real entre as pessoas, não uma igualdade meramente formal entre elas.
É esse, portanto, o patamar de dignidade a ser atingido, ou seja, apenas quando
estabelecermos e realizarmos a igualdade real entre as pessoas é que poderemos falar em
vida com dignidade.
Bem a propósito, o artigo 1.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos dispõe que
“todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos”; complementando, o artigo
2.º reza que “toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos
nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião,