1. O documento trata de uma ação direta de inconstitucionalidade proposta contra um dispositivo de uma resolução do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que trata da elegibilidade para cargos de direção.
2. O dispositivo em questão diverge da Lei Orgânica da Magistratura Nacional no que se refere às condições de elegibilidade.
3. O pedido é para que o dispositivo seja declarado inconstitucional por ofender a competência legislativa reservada à matéria do Estatuto da Magistratura.
PGR questiona regra do TJRJ sobre reeleição para cargos diretivos
1. No
110.720/2015-AsJConst/SAJ/PGR
Ação direta de inconstitucionalidade 5.310/RJ
Relatora: Ministra Cármen Lúcia
Requerente: Procurador-Geral da República
Interessado: Presidente do Tribunal de Justiça do Estado
do Rio de Janeiro
CONSTITUCIONAL. MAGISTRATURA JUDICIAL. ART.
3º DA RESOLUÇÃO 1/2014, DO PLENÁRIO DO TRIBU-
NAL DE JUSTIÇA DO RIO DE JANEIRO. VÍCIO NO
PROCESSO DE FORMAÇÃO. EFICÁCIA POTENCIAL
DA NORMA. ELEGIBILIDADE E CAUSAS DE INELEGI-
BILIDADE PARA CARGOS DE DIREÇÃO DE TRIBU-
NAIS. MATÉRIAS DO ESTATUTO DA MAGISTRATURA.
INVALIDADE DE TRATAMENTO DIVERSO DO PRE-
VISTO NA LEI ORGÂNICA DA MAGISTRATURA NACI-
ONAL.
1. Não se deve reputar inexistente, por vícios no processo de
formação, dispositivo de resolução de tribunal de justiça pu-
blicada no órgão oficial de imprensa, em plena vigência e
com potencial produção de efeitos jurídicos.
2. O regramento relativo à elegibilidade e às causas de inele-
gibilidade para ocupação de cargos de direção em tribunais,
por constituir tema eminentemente institucional, é matéria
própria do Estatuto da Magistratura, a qual, enquanto não
seja este editado na forma do art. 93, caput, da Constituição
da República, é regulada pela Lei Orgânica da Magistratura
Nacional (LOMAN).
3. É inconstitucional dispositivo de resolução de tribunal de
justiça que disponha sobre elegibilidade e causas de inelegi-
bilidade de forma diversa do disposto no art. 102 da LO-
MAN.
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2. PGR Ação direta de inconstitucionalidade 5.310/RJ
4. Parecer pela procedência do pedido, com ratificação dos
termos da petição inicial.
I RELATÓRIO
Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade, com pedido
de medida cautelar, proposta por esta Procuradoria-Geral da Re-
pública, em face do art. 3º da Resolução 1, de 9 de setembro de
2014, do Plenário do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Ja-
neiro, que “aprova novas regras para o processo eleitoral no âm-
bito do Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro”. A
resolução, ao dispor sobre eleição para cargos diretivos no Judiciá-
rio estadual, adotou a seguinte regra de ocupação:
Art. 3º. Poderá o Desembargador ser novamente eleito para
o mesmo cargo, desde que observado o intervalo de dois
mandatos.
Sustenta, inicialmente, cabimento da ação direta tanto pelo
caráter normativo primário da resolução quanto pela afronta di-
reta à Constituição da República. Aponta inconstitucionalidade
formal de resolução de tribunal que disponha em sentido di-
verso da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Lei Comple-
mentar 35, de 14 de março de 1979 – LOMAN) sobre
elegibilidade e causas de inelegibilidade para cargos diretivos, por
ofensa direta ao art. 93, caput, da Constituição. Ressalta que o art.
3º da resolução diverge do art. 102 da LOMAN, no que este pre-
ceitua ser indispensável esgotamento de todos os nomes, na ordem
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3. PGR Ação direta de inconstitucionalidade 5.310/RJ
de antiguidade, para novo preenchimento de cargos de direção
exercidos por quatro anos ou do cargo de presidente do tribunal.
Em 22 de abril de 2015, a relatora, Ministra CÁRMEN LÚCIA,
adotou o rito do art. 12 da Lei 9.868, de 10 de novembro de 1999,
solicitou informações à autoridade requerida e determinou aber-
tura de vista sucessiva à Advocacia-Geral da União e à Procura-
doria-Geral da República, para manifestação (peça 7 do processo
eletrônico).
A Presidência do TJRJ aponta inexistência da Resolução
1/2014, do Plenário do Tribunal, pois sua redação final não foi
aprovada por quórum qualificado, pois o quesito referente à norma
não obteve voto favorável da maioria absoluta dos desembargado-
res. No mérito, sustenta inconstitucionalidade da norma, nos ter-
mos deduzidos na petição inicial (peças 9 a 15).
A Advocacia-Geral da União manifestou-se pela procedên-
cia do pedido (peça 17).
É o relatório.
II PRELIMINAR
Não procede a preliminar de inexistência do dispositivo im-
pugnado, levantada pela Presidência do Tribunal de Justiça do Es-
tado do Rio de Janeiro (TJRJ) em suas informações.
O art. 3º da Resolução 1, de 9 de setembro de 2014, do Ple-
nário do TJRJ, além de constar com idêntico teor no próprio sítio
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4. PGR Ação direta de inconstitucionalidade 5.310/RJ
eletrônico do TJRJ,1
foi publicada no Diário da Justiça Eletrônico do
Estado do Rio de Janeiro, conforme cópia do ato normativo que
instrui a ação (peça 3).
Por se tratar de norma vigente e hábil a produzir efeitos ju-
rídicos, o Conselho Nacional de Justiça decidiu, em procedimentos
administrativos individuais (procedimentos de controle adminis-
trativo [PCAs] 0006190-18.2014.2.00.0000 e 0006166-
87.2014.2.00.0000), pela suspensão dos efeitos do art. 3º da resolu-
ção, por afronta ao regramento do art. 102 da LOMAN, decisões
essas que estão sob crivo do Supremo Tribunal Federal no man-
dado de segurança 33.288/DF, relatoria do Ministro LUIZ FUX.
É, portanto, norma apta a produzir efeitos jurídicos, que pode
ser expurgada pela via da ação direta de inconstitucionalidade.
III MÉRITO
Segundo o art. 102 da Lei Orgânica da Magistratura Nacio-
nal, ao dispor sobre o procedimento de eleição dos órgãos direti-
vos de tribunais, o desembargador que ocupar por dois mandatos
cargos da direção superior do tribunal, incluindo o de presidente,
não poderá figurar na lista dos elegíveis para os mesmos cargos
até que se esgotem os nomes na ordem de antiguidade:
Art. 102. Os Tribunais, pela maioria dos seus membros efe-
tivos, por votação secreta, elegerão dentre seus Juízes mais
1 Disponível em: < http://zip.net/bjrqjF > ou
< http://webfarm.tjrj.jus.br/biblioteca/index.asp?
codigo_sophia=182211&integra=1>. Acesso em: 12 jun. 2015.
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5. PGR Ação direta de inconstitucionalidade 5.310/RJ
antigos, em número correspondente ao dos cargos de dire-
ção, os titulares destes, com mandato por dois anos, proibida
a reeleição. Quem tiver exercido quaisquer cargos de dire-
ção por quatro anos, ou o de Presidente, não figurará mais
entre os elegíveis, até que se esgotem todos os nomes, na
ordem de antiguidade. É obrigatória a aceitação do cargo,
salvo recusa manifestada e aceita antes da eleição.
O art. 3º da Resolução TJ/TP/RJ 1/2014, ao admitir que os
desembargadores do Tribunal de Justiça fluminense possam nova-
mente ser eleitos para os mesmos cargos de direção, após intervalo
de dois mandatos, dispôs em sentido diametralmente oposto ao
da LOMAN, no que se refere aos membros elegíveis para tais car-
gos.
O Supremo Tribunal Federal possui firme orientação no
sentido da inconstitucionalidade de resoluções e normas regi-
mentais de tribunais que disciplinem critérios de eleição de seus
órgãos diretivos de forma diversa do art. 102 da LOMAN – sobre-
tudo no que concerne às condições de elegibilidade e às causas de
inelegibilidade –, por violação direta ao art. 93, caput, da Constitui-
ção da República, pois se trata de matéria própria do Estatuto da
Magistratura. Sujeita-se, portanto, à reserva de lei complementar
de iniciativa do SupremoTribunal Federal.
Os seguintes julgados espelham esse posicionamento:
MAGISTRATURA. Tribunal. Membros dos órgãos direti-
vos. Presidente,Vice-Presidente e Corregedor-Geral. Eleição.
Universo dos magistrados elegíveis. Previsão regimental de
elegibilidade de todos os integrantes do Órgão Especial.
Inadmissibilidade. Temática institucional. Matéria de compe-
tência legislativa reservada à Lei Orgânica da Magistratura e ao
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6. PGR Ação direta de inconstitucionalidade 5.310/RJ
Estatuto da Magistratura. Ofensa ao art. 93, caput, da Constitui-
ção Federal. Inteligência do art. 96, inc. I, letra a, da Constitui-
ção Federal. Recepção e vigência do art. 102 da Lei
Complementar federal nº 35, de 14 de março de 1979 –
LOMAN. Ação direta de inconstitucionalidade julgada, por
unanimidade, prejudicada quanto ao § 1º, e, improcedente
quanto ao caput, ambos do art. 4º da Lei 7.727/89. Ação
julgada procedente, contra o voto do Regimento Interno do
Tribunal Regional Federal da 3ª Região. São inconstitucio-
nais as normas de Regimento Interno de tribunal que dis-
ponham sobre o universo dos magistrados elegíveis para
seus órgãos de direção.2
REGIMENTO INTERNO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. ESCOLHA DE
CARGOS DE DIREÇÃO. MATÉRIA RESERVADA À
LEI COMPLEMENTAR. COMPETÊNCIA DOS TRI-
BUNAIS DE JUSTIÇA. LIMITES.
1. A eleição para o preenchimento dos cargos de direção
dos Tribunais de Justiça dos Estados é disciplinada pelo
art. 102 da Lei Complementar nº 35/79 (LOMAN), re-
cebida pela atual ordem constitucional (CF, artigo 93).
2. Os Regimentos Internos dos Tribunais podem explicitar
os meios para a sua realização desde que obedecidos os limi-
tes e parâmetros estabelecidos na lei.
3. Neles é vedada, contudo, a inclusão de instruções sobre o
processo eleitoral interno que ultrapassem as regras básicas
da lei complementar.
4. Inconstitucionalidade do segundo período do § 4º do
artigo 11 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça
do Estado do Rio de Janeiro.
Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente,
em parte.3
RECLAMAÇÃO. IMPUGNAÇÃO. ATO DO TRIBU-
NAL REGIONAL FEDERAL DA 3a
REGIÃO. ELEIÇÃO
2 Supremo Tribunal Federal. Plenário. Ação direta de inconstitucionalidade
3.566/DF. Relator: Ministro JOAQUIM BARBOSA. Redator para acórdão: Min.
CEZAR PELUSO. 15/2/2007, unânime. Diário da Justiça, 15 jun. 2007.
3 STF. Plenário. ADI 1.503/RJ. Rel.: Min. MAURÍCIO CORRÊA. 29/3/2001,
un. DJ, 18 maio 2001.
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7. PGR Ação direta de inconstitucionalidade 5.310/RJ
PARA O CARGO DE PRESIDENTE. ALEGAÇÃO DE
NULIDADE DECORRENTE DA NÃO OBSERVÂNCIA
DO UNIVERSO DE ELEGÍVEIS.ALEGAÇÃO DE DES-
CUMPRIMENTO DA DECISÃO DA ADI N. 3.566.
FRAUDE À LEI. FRAUDE À CONSTITUIÇÃO. NOR-
MAS DEFINIDORAS DO UNIVERSO DE MAGIS-
TRADOS ELEGÍVEIS PARA OS CARGOS DIRETIVOS
DOS TRIBUNAIS. DETERMINAÇÃO CONTIDA NA
SEGUNDA PARTE DO ARTIGO 102 DA LOMAN.
CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE E CAUSA DE INE-
LEGIBILIDADE. RECLAMAÇÃO JULGADA PROCE-
DENTE.
1. Impugnação de ato do Tribunal Regional Federal da 3a
Região concernente à eleição para o cargo de Presidente
daquele Tribunal.
2. Discussão a propósito da possibilidade de desembarga-
dor que anteriormente ocupou cargo diretivo por dois bi-
ênios no TRF da 3a
Região ser eleito Presidente.
3. Afronta à decisão proferida na ADI n. 3.566 – recepção
e vigência do artigo 102 da Lei Complementar federal n.
35 – LOMAN.
4. Desembargador que exerceu cargo de Corregedor-Geral
no biênio 2003-2005 e eleito Vice-Presidente para o biê-
nio 2005-2007. Situação de inelegibilidade decorrente da
vedação do art. 102, da LOMAN, segunda parte.
5. A incidência do preceito da LOMAN resulta frustrada.
A fraude à lei importa, fundamentalmente, frustração da lei.
Mais grave se é à Constituição, frustração da Constituição.
Consubstanciada a autêntica fraus legis.
6. A fraude é consumada mediante renúncia, de modo a ilidir-
se a incidência do preceito.
7. A renovação dos quadros administrativos de Tribunais,
mediante a inelegibilidade decorrente do exercício, por
quatro anos, de cargo de direção, há de ser acatada.
8. À hipótese aplica-se a proibição prevista na segunda parte
do artigo 102, da LOMAN.
9. O artigo 102 da LOMAN traça o universo de magistrados
elegíveis para esses cargos, fixando condição de elegibilidade
(critério de antiguidade) e causa de inelegibilidade (quem ti-
ver exercido quaisquer cargos de direção por quatro anos, ou
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8. PGR Ação direta de inconstitucionalidade 5.310/RJ
o de Presidente). O universo de elegíveis é delimitado pela
presença da condição de elegibilidade e, concomitantemente,
pela ausência da causa de inelegibilidade. Normas regimentais
de Tribunais que, de alguma forma, alterem esses critérios vi-
olam o comando veiculado pelo art. 102 da LOMAN.
Pedido julgado procedente.4
É, portanto, inconstitucional o art. 3º da Resolução 1/2014,
do Plenário do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, o
qual, ao dispor em sentido diverso da LOMAN sobre elegibilidade
e causas de inelegibilidade para seus órgãos diretivos, ofendeu direta-
mente o art. 93, caput, da Constituição da República. Reitera in-
tegralmente os fundamentos da petição inicial.
III CONCLUSÃO
Ante o exposto, opina o Procurador-Geral da República pelo
conhecimento da ação e procedência do pedido, com ratificação
dos termos da petição inicial.
Brasília (DF), 15 de junho de 2015.
Rodrigo Janot Monteiro de Barros
Procurador-Geral da República
RJMB/WS/PC-Par.PGR/WS/2.020/2015
4 STF. Plenário. Reclamação 8.025/SP. Rel.: Min. EROS GRAU. 9/12/2010, un.
DJe 145, 6 ago. 2010.
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