No fim da tarde de hoje (23) a promotora Andrea Gevaerd, da Promotoria de Justiça de Blumenau, emitiu um parecer afirmando que “por ora, deve ser indeferido o pedido liminar formulado na inicial, não havendo, porém, impedimento de revisão após o oferecimento de contestação pelos réus”. Ainda de acordo com a promotora, “...também não há impedimento para que seja determinada, desde já, a realização de perícia visando avaliar os imóveis...”
Confira na íntegra o parecer do MP:
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Ação Popular nº 5012809-64.2023.8.24.0008
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6ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE BLUMENAU
Ação Popular nº 5012809-64.2023.8.24.0008
SIG nº 08.2023.00188971-1
Meritíssimo Juiz,
Trata-se de Ação Popular ajuizada por Ivan Naatz contra Mário
Hildebrandt, Egídio da Rosa Beckhauser, Município de Blumenau, Ibiza Administradora de
Bens e Participações, Eduardo José Hillesheim, Jandir Soares, Julian Plautz, Elio Fuck,
Leonardo Vasselai Araújo e Roberto Sérgio Cunha.
Segundo consta, pretende-se comprovar que a aquisição relativa ao Decreto
nº 13.544/21 de Blumenau foi lesiva aos cofres públicos e afrontou os princípios
constitucionais relacionados à Administração Pública. Além do mais, pretende-se a
responsabilização administrativa dos réus e a recuperação do prejuízo causado ao erário.
Aduz o autor que o legislativo municipal demonstrou interesse em construir
sua sede no imóvel sob matrícula nº 26.929, situado na Alameda Duque de Caxias, Município
de Blumenau, que pertencia à Ferco Administradora de Bens Ltda. e estava penhorado nos
Autos nº 0031506-83.2007.8.24.0008 (transferida aos Autos nº 0904519-43.2011.8.24.0008,
com acordo em 2021, a extinção do débito e o levantamento das penhoras).
Ocorre que, até então, a empresa Ibiza Administradora de Bens e
Participações locava o referido imóvel para o Poder Legislativo de Blumenau, sendo que, em
28/04/21, ela adquiriu o imóvel da empresa Ferco Administradora de Bens Ltda. pelo valor de
R$ 2.018.000,04 (dois milhões, dezoito mil reais e quatro centavos).
Em 30/11/21, houve a publicação do Decreto nº 13.544/21, que dispôs no
art. 1º : Fica declarado de utilidade pública para fins de desapropriação e destinado à
construção da sede da Câmara Municipal de Vereadores o terreno pertencente a Ibiza
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Administradora de Bens e Participações Ltda., situado nesta cidade, no bairro Ribeirão
Fresco, no lado par da Alameda Duque de Caxias, contendo a área de 9.518,69m², fazendo
frente em sete linhas: a primeira, a partir do lado esquerdo, de 76,70m com o lado par da
Alameda Duque de Caxias; a segunda, em direção aos fundos, de 17,69m; a terceira
alargando o terreno em 13,00m; a quarta, em direção a frente, de 17,69m, todas com terras
de Ernesto Vetsch; a quinta alarga o terreno em 66,32m, a sexta, curva, de 24,53m e a
sétima, reta, de 18,92m, todas com o lado par da Alameda Duque de Caxias; fundos com a
margem direita do Ribeirão Fresco e pelo lado esquerdo em 76,64m com o condomínio
Edifício Duque de Caxias, edificado com dois depósitos de tijolos, respectivamente sob os
números 166 e 184 da Alameda Duque de Caxias, ficando no referido terreno, gravado com
preservação permanente de vegetação, a área de 5.567,99m², localizada nos fundos e lado
direito, paralela à margem direita do Ribeirão Garcia e do Ribeirão Fresco, matriculado no
1º Ofício de Registro de Imóveis da Comarca de Blumenau sob o nº 26.929 e inscrito no
cadastro técnico municipal sob nº 4.4.01.0008.0004.
Em 09/12/21, os réus Município de Blumenau e Ibiza Administradora de
Bens e Participações realizaram ajuste sobre a aquisição do imóvel no valor de R$
8.353.777,30 (oito milhões, trezentos e cinquenta e três mil, setecentos e setenta e sete reais e
trinta centavos). Concluiu o autor, pela sequência de eventos e valor negociado, que a ré Ibiza
Administradora de Bens e Participações recebeu informações privilegiadas sobre o interesse
do Município de Blumenau no imóvel, razão pela qual procedeu à sua aquisição e posterior
venda por preço que gerou lucro superior a seis milhões de reais.
O autor afirmou, ainda, que parte do imóvel corresponde a uma área de
preservação permanente e que [...] a Comissão avaliou a área de APP do imóvel ao preço de
R$ 501,90 o m2 (indenizando-a) e R$ 5.824,10 o m2 da área aproveitada, um absurdo para o
local que, como o próprio relatório indica é inundável e cujo local não tem valor comercial.
Por fim, acrescentou que, mesmo sem lei autorizando, [...] o Município
ainda transferiu para o vendedor, por dação em pagamento, 8.171,36 m2 de área
aproveitável e de grande valor comercial pelo preço irrisório de R$ 878.716,60 relativo a
matrícula 30.303 do 2º Oficio de Registo de Imóveis de Blumenau.
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Em caráter liminar, o autor requereu a suspensão do item "b" do contrato,
bem como a suspensão da transferência do imóvel.
Após, o autor emendou a inicial para acrescentar informações acerca dos
imóveis e juntou documentos - Eventos 1 e 4.
Vieram os autos para manifestação.
A Ação Popular é um instrumento de democracia participativa, por meio do
qual o cidadão pode participar do controle dos atos da Administração Pública, principalmente
fiscalizando a sua idoneidade. Ela tem por objeto anular ato lesivo ao patrimônio público ou
de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao
patrimônio histórico e cultural, sendo passível a qualquer cidadão figurar no polo ativo.
Como parte passiva, a legitimidade para acionamento recai sobre o ente
público, os agentes públicos envolvidos, bem como os beneficiários do negócio realizado em
detrimento do patrimônio público. Em princípio, os réus listados preenchem tais requisitos.
No mais, como em outros procedimentos, é possível a antecipação dos
efeitos da tutela. Todavia, sabe-se que esta é medida excepcional, pois antecede os efeitos da
pretensão antes mesmo do contraditório, relativizando tal direito constitucional.
Deste modo, é necessária a existência de evidências da probabilidade do
direito e do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.
No caso concreto, analisando os fatos e a documentação acostada aos autos,
não se verificam, ao menos até o presente momento, tais condições.
Isto porque, embora seja realmente questionável a diferença do valor pago
pela ré Ibiza Administradora de Bens e Participações por ocasião da aquisição do imóvel sob
matrícula nº 26.929, a avaliação constante na escritura de compra e venda realizada com a
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Ferco Administradora de Bens Ltda. para fins de ITBI, foi de R$ 7.080.175,50 (sete milhões,
oitenta mil, cento e setenta e cinco reais e cinquenta centavos), não destoando dos valores
apurados no processo administrativo instaurado para apurar as propostas dos imóveis a serem
adquiridos pelo Município de Blumenau e nem da avaliação final do imóvel questionado.
O referido processo administrativo evidencia que foram analisadas
propostas de imóveis avaliados entre sete a vinte milhões de reais e foram realizadas análises
técnicas para a avaliação final do imóvel vencedor.
Outrossim, no que tange à questão da área de preservação permanente, ela
não fica excluída da indenização, não podendo tal fato ser usado como indício de
probabilidade do direito invocado.
Neste sentido, cita-se:
Processual Civil. Agravo regimental. Parque da Serra do Mar. Direito à
indenização. “A circunstância de os expropriados haverem adquirido as terras
após a constituição do parque não exclui o direito à indenização, nem limita a
sua quantificação, porquanto os adquirentes se sub-rogaram, ao adquirir o
imóvel, no domínio, posse, direito e ações (vinculados ao imóvel).” (REsp n.
82.177/Demócrito). Agravo Regimental improvido (fl. 1.235) Processual Civil.
Embargos de declaração. Parque da Serra do Mar. Área de preservação
permanente. Indenização. Possibilidade. Precedentes. “I - No ressarcimento por
desapropriação, a floresta de preservação permanente que recobre o terreno
deve ser indenizada pelo valor econômico que sua exploração poderia gerar,
não fosse a vedação administrativa que a impede. II - Deixar de indenizar as
florestas seria punir quem as preservou, homenageando aqueles que as
destruíram. (REsp nº 77.359/Humberto).
Ademais, o documento apresentado pelo autor no Evento 4 - doc14,
confirma que, ao menos o imóvel sob matrícula nº 26.929, pode efetivamente possuir o valor
definido para indenização do desapropriado.
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Evidentemente tais impressões não fulminam os argumentos do autor,
sobretudo no que diz respeito à cessão de eventuais informações privilegiadas, apenas
devendo ficar esclarecida a necessidade de se apurar mais adequadamente a questão, ainda
que de imediato não seja possível conceder o pedido de liminar.
Assim, entende o Ministério Público que, ao menos por ora, deve ser
indeferido o pedido liminar formulado na inicial, não havendo, porém, impedimento de
revisão após o oferecimento de contestação pelos réus.
Ademais, também não há impedimento para que seja determinada, desde já,
a realização de perícia visando avaliar os imóveis sob matrículas 26.929 e 30.323, sendo este
referente aos dois imóveis que foram concedidos como parte do pagamento, nos termos do
contrato acostado no Evento 4 - documento 16 - fl. 22 do feito.
Blumenau, 18 de maio de 2023.
[assinado digitalmente]
Andrea Gevaerd
Promotora de Justiça