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Pesquisas em aquisição da linguagem
1. PESQUISAS EM AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM
Gabriela Castro Menezes de Freitas14
PUCRS
As pesquisas em aquisição da linguagem constituem uma área multidisciplinar,
no caminho entre teorias lingüísticas e psicológicas. Os pesquisadores que
investigam essa área têm como questão central descobrir como se dá a aquisição
de uma língua. Muitas pesquisas têm sido desenvolvidas no sentido de desvendar
essa questão, porém ainda há muito a ser pesquisado, configurando um campo
produtivo para a realização de estudos teóricos e empíricos.
1. Dos primeiros passos até os dias de hoje: o caminho das pesquisas
As primeiras pesquisas sobre aquisição da linguagem foram realizadas entre
1876 e 1926 e preocupavam-se em observar o surgimento e o desenvolvimento da
linguagem nas crianças. Esses estudos iniciais eram baseados em diários
elaborados por lingüistas e filólogos a partir do registro da fala espontânea dos
próprios filhos. Esses diários tinham como objetivo registrar o que as crianças faziam
com relação à linguagem, a partir de uma observação constante, configurando,
assim, pesquisas longitudinais (1). Eram trabalhos descritivos e relativamente
intuitivos, pois os pesquisadores não sabiam ainda ao certo o que estavam
procurando.
Entre 1926 - 1957 se deu o período dos estudos de grandes amostras, quando
cresceu significativamente o número de pesquisas sobre aquisição da linguagem.
Esses estudos eram baseados na observação sistemática de vários sujeitos,
objetivando descrever o que é o comportamento normal em aquisição da linguagem.
Essas observações de grandes grupos perdiam, no entanto, desenvolvimentos
individuais
importantes.
Através das pesquisas de Chomsky (2), os estudos longitudinais passaram a ser
considerados, baseando-se na observação do desenvolvimento da linguagem de um
determinado número de indivíduos, em geral três crianças. A partir da década de 80,
vários bancos de dados foram formados, buscando-se um volume representativo da
fala de crianças em fase de aquisição da linguagem. Os registros da fala das
crianças começaram a ser gravados em áudio ou vídeo, por um tempo determinado,
2. periodicamente, para depois serem transcritos (Scarpa, 2003). Com isso, objetiva-se
construir uma amostra representativa para estudar como o conhecimento é
adquirido. Desde então, são realizadas pesquisas transversais (3) e longitudinais,
com variado número de sujeitos e desde a mais tenra idade.
2. As abordagens teóricas em aquisição da linguagem
Os primeiros estudos sobre a aquisição da linguagem estavam baseados em
uma visão teórica behaviorista (Skinner), que assumia que a aprendizagem de uma
língua se dava pela exposição ao meio e em decorrência da imitação e do reforço. O
ponto de vista teórico behaviorista defendia que o ser humano aprende por
condicionamento, assim como qualquer outro animal. Porém, como pondera
Matzenauer (2004), se uma criança adquire uma língua por imitação, como se
explicaria
o
fato
de formar
frases
ou
palavras
que
nunca
ouviu? (4)
A partir do final da década de 50, os estudos de Noam Chomsky impulsionam os
trabalhos em aquisição da linguagem, com base na posição assumida de que a
linguagem é inata. Para o pesquisador, a linguagem é uma dotação genética do ser
humano. Segundo a teoria inatista, o ser humano vem "equipado" com uma
Gramática Universal (GU). Há um dispositivo inato de aquisição que permite que a
criança, exposta ao INPUT (5), construa hipóteses sobre a língua, escolhendo os
parâmetros que deverão ser marcados ou fixados, gerando a gramática de sua
língua nativa (Scarpa, 2003). A criança nasce pré-programada para adquirir a
linguagem e é capaz de, a partir da exposição à fala, construir suas hipóteses sobre
a
língua
a
que
está
imersa.
A visão cognitivista construtivista (Piaget) entende a aquisição da linguagem
como dependente do desenvolvimento da inteligência da criança. Sob esse ponto de
vista, a linguagem surge quando a criança desenvolve a função simbólica. É
necessária a mediação do outro entre a criança e o mundo (Scarpa, 2003), porém a
criança não espera passivamente o conhecimento, mas constrói tal conhecimento a
partir
A
das
relações
visão interacionista
estabelecidas
social (Vygotsky)
através
dessa
considera
os
mediação.
fatores
sociais,
comunicativos e culturais para a aquisição da linguagem, estudando as
características da fala dos adultos. Segundo esse ponto de vista teórico, a interação
social e a troca comunicativa são pré-requisitos básicos para a aquisição da
linguagem. Nessa perspectiva, a linguagem é atividade constitutiva do conhecimento
3. de
mundo
e
a
criança
se
constrói
como
sujeito.
Nos últimos anos, surgiram muitas investigações que pretendem descobrir como
se dá, no cérebro/mente, a aquisição da linguagem. Desde então, as pesquisas na
área conexionista (McClelland e Rumelhart, 1986) investigam a aprendizagem da
língua materna ou de segunda língua. O conexionismo propõe que a aquisição tem
como base a formação de unidades neuroniais de pensamento. Essas unidades
neuroniais formam redes de associação. Dessa forma, adquirir conhecimento ou
adquirir uma língua implica o estabelecimento de novas conexões neuroniais.
3. Os estágios de desenvolvimento em aquisição da linguagem
A trajetória do desenvolvimento da linguagem parece ser universal e contínua,
passando pelos seguintes estágios:
balbucio - produção de sons: vogais (3-4 meses); consoantes e vogais (em torno
dos 6 meses);
primeiras palavras - entre os 10 e 12 meses;
enunciados de uma palavra - em torno dos 12 meses;
crescimento vocabular grande - entre os 16 e 20 meses;
fase telegráfica - primeiras combinações de palavras, entre os 18 e 20 meses;
explosão vocabular - entre os 24 e 30 meses;
domínio das estruturas sintáticas e morfológicas - entre os 3 anos e 3 anos e
meio;
4. Pesquisas realizadas, pesquisas por realizar...
No Brasil, muitas pesquisas sobre aquisição da linguagem têm sido realizadas
nos últimos anos, porém ainda há muito a pesquisar sobre a aquisição e o
desenvolvimento
da
fala.
Dentre os temas abordados em pesquisas, podem-se citar os estudos prélingüísticos, que investigam o balbucio de crianças com desenvolvimento normal e
de crianças surdas, a percepção e a produção do bebê, e a interação entre os pais e
o bebê. Ainda existem as pesquisas que observam dados de fala das crianças e
buscam estabelecer um perfil de aquisição e/ou considerações sobre as diferenças
individuais.
A PUCRS já consolidou uma tradição no desenvolvimento de pesquisas sobre
aquisição da linguagem, que são principalmente realizadas noCentro de Pesquisa
4. sobre Aquisição e Aprendizagem da Linguagem (CEAAL) (6), sob a coordenação da
professora Regina Ritter Lamprecht. Esse centro organiza o ENAL - Encontro
Nacional sobre Aquisição da Linguagem, que promove trocas e debates sobre os
principais direcionamentos dos estudos em aquisição da linguagem realizados no
Brasil.
O Programa de Pós-Graduação em Letras da PUCRS conta com um expressivo
número de pesquisas de mestrado e doutorado (7) sobre fonologia, desvios
fonológicos, bilingüismo, língua de sinais, metáforas, semântica, consciência
fonológica (8), aquisição da escrita (Lamprecht, 2003). No entanto, muito ainda está
por ser desvendado com relação à aquisição da linguagem.
REFERÊNCIAS
LAMPRECHT, Regina Ritter. Memórias do passado, repercussões no presente: vinte
anos de pesquisa em Aquisição da Linguagem na PUCRS.Letras de Hoje. N. 132,
v. 38, p.11-16, jun. 2003.
LAMPRECHT, Regina Ritter Lamprecht et alli. Aquisição fonológica do português
- perfil de desenvolvimento e subsídios para terapia.Porto Alegre: Artmed, 2004.
MATZENAUER, Carmen Lúcia Barreto. Bases para o entendimento da aquisição
fonológica. In.: Scarpa, Ester Mirian. Aquisição da linguagem. In.: MUSSALIM,
Fernanda; BENTES, Anna Christina (orgs.) Introdução à lingüística - domínios e
fronteiras. Vol. 2. São Paulo: Cortez, 2003.
MCCLELLAND, J. D. & RUMELHART, D. E. Parallel distributed
processing: explorations in the microstructure of cognition: psychological and
biological models. V.2. Cambridge: MIT, 1986.