Suspensão de Tutela Antecipada sobre contrato de concessão de serviços de água e esgoto em Petrolina
1. Nº 136522/2016 – ASJCIV/SAJ/PGR
Suspensão de Tutela Antecipada 831 – DF
Relator: Ministro Presidente
Requerente: Município de Petrolina
Requerido: Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco
SUSPENSÃO DE TUTELA ANTECIPADA. SERVIÇO PÚBLICO
DE ÁGUA E ESGOTO. CONTRATO DE CONCESSÃO.
EXTINÇÃO DO CONTRATO E RETOMADA DOS
SERVIÇOS PELO ENTE MUNICIPAL. AFRONTA À
CAPACIDADE ADMINISTRATIVA DO MUNICÍPIO.
DEFERIMENTO DA SUSPENSÃO.
1 – Pedido de contracautela ajuizado em face de decisão
que sustou os efeitos de decretos municipais que declaravam
a caducidade de contrato de concessão dos serviços públicos
de água e esgoto em Petrolina/PE.
2 – Evidencia-se a competência da Presidência do Supremo
Tribunal Federal para julgar este incidente, uma vez que em
exame possível usurpação da titularidade do serviço público
outorgado constitucionalmente aos Municípios.
3 – A decisão que se pretende suspender causa risco de le-
são à ordem pública, na acepção jurídico-constitucional,
uma vez que impede o ente municipal de reassumir a titula-
ridade de serviço público de sua competência, impondo a
perpetuação de contrato de concessão firmado em 1975
para vigorar por 50 anos.Tal situação revela indevida inge-
rência na capacidade administrativa do ente municipal, não
se mostrando consentânea com o interesse público, além de
causar inegável prejuízo à população local.
4 – Parecer pelo deferimento do pedido de suspensão.
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Trata-se de pedido de suspensão formulado pelo Município
de Petrolina/PE, ajuizado com o objetivo de sustar os efeitos de
decisão proferida pelo Juízo da 2ªVara da Fazenda Pública de Re-
cife, mantida pelo Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco,
nos autos da Ação Ordinária 0074797-42.2013.8.17.0001.
A decisão que se pretende suspender concedeu a antecipação
de tutela para sustar a vigência de Decretos Municipais que, após
processo administrativo, declaravam a caducidade de contrato de
concessão de serviço público de abastecimento de água e trata-
mento de esgoto1
.
Após a edição dos mencionados Decretos, a Prefeitura Muni-
cipal de Petrolina publicou Edital de Concorrência Nacional para
promover a contratação de nova concessão dos serviços públicos
mediante licitação.
Na ação principal, a então concessionária, Companhia Per-
nambucana de Saneamento – COMPESA, insurge-se contra o
processo administrativo que culminou com a decretação de cadu-
cidade do contrato, apontando como fundamentos uma série de
1 Conforme consta da inicial, os dois Decretos cujos os efeitos foram susta-
dos são o Decreto Municipal 137/2012 e 160/2012. Diz o requerente:“O
Decreto Municipal nº 137/2012 dispõe sobre a declaração de caducidade
na execução do contrato de concessão, tendo em vista as deficiências am-
plamente demonstradas no âmbito do processo administrativo. O Decreto
Municipal nº 160/2012, por sua vez, anulou o “Termo Aditivo” que “dis-
tratou o distrato”, sem prévia licitação, mesmo depois de já distratada con-
sensualmente a concessão, determinou a recontratação dos serviços de água
e esgoto em favor da COMPESA, pelo prazo de 30 (trinta) anos, tendo
em vista a violação ao disposto nos arts. 175 e 37, inciso XXI, da Consti-
tuição Federal, que são absolutamente claros quanto à necessidade de lici-
tação para contratação de tais serviços.”
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nulidades no procedimento, bem como a motivação política da
instauração.
A antecipação de tutela foi concedida com base nas seguintes
razões:
Na espécie, com fulcro no manancial probatório acostado à
proemial, tenho que se encontram presentes tais requisitos.
Explico. Sabe-se que serviço público é "toda atividade mate-
rial que a lei atribui ao Estado para que a exerça diretamente
ou por meio de seus delegados, com o objetivo de satisfazer
concretamente às necessidade coletivas, sob regime jurídico
total ou parcialmente público", conforme aduz Maria Sylvia
Di Pietro. A partir desse conceito, infere-se que o Estado
pode executar diretamente os serviços públicos ou indireta-
mente por meio dos seus delegados. Assim, ao optar pela
execução indireta, nasce a figura dos delegatários, que não se
confunde com entidade que titulariza o serviço público. O
art. 175 da Constituição Federal traz a possibilidade material
da execução indireta dos serviços públicos mediante os insti-
tutos da concessão ou permissão, que, por sua vez, são regu-
lados, em sede infraconstitucional, pela Lei Federal nº
8.987/1995. In casu, o cerne da questão envolve o instituto
da Concessão de Serviço Público, que, consoante a melhor
doutrina, se trata de "contrato administrativo pelo qual a Ad-
ministração Pública transfere à pessoa jurídica ou a consór-
cio de empresas a execução de certa atividade de interesse
coletivo, remunerada através do sistema de tarifas pagas pelos
usuários." Ao compulsar os autos, percebe-se a existência de
Contrato Administrativo de Concessão de Serviço Público
firmado entre a demandante e a municipalidade demandada
(fls. 91/97), cujo objeto cinge-se ao serviço de abasteci-
mento de água e esgoto sanitários. O contrato estipula que a
referida concessão terá seu termo após 50 (cinquenta) anos
da sua assinatura, ou seja, 06/11/2025. Ocorre, porém, que
foi levado a efeito processo administrativo com o escopo de
decretar a caducidade da concessão, gerando a retomada do
serviço público pelo ente concedente, o que não agradou a
concessionária do serviço público, ora demandante. Insurge-
se a COMPESA contra o processo administrativo que cul-
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minou na decretação da caducidade, alegando uma série de
nulidades, bem como o esteio político que motivou a sua
instauração. O acervo probatório demonstra que não é de
hoje que o Município de Petrolina busca a "extinção" da
concessão firmada no ano de 1975 e a consequente reto-
mada da execução direta do serviço público em tela. A do-
cumentação acostada aos autos nos permite concluir pela
existência de um interesse político subjacente neste tocante,
já que a entidade concedente, antes do processo que decre-
tou a caducidade, buscou por dois meios distintos dar cabo
ao referido contrato administrativo. A priori, a Municipali-
dade se valeu da ação judicial nº 001.2004.022228-5, que
tramitou perante este juízo, buscando a imediata transferên-
cia dos serviços públicos de esgotamento sanitário e abaste-
cimento de água, mas, em razão de acordo judicial
homologado, esta chegou ao seu fim. Em seguida, por inter-
médio do instituto da encampação, buscou mais uma vez a
retomada dos serviços públicos mencionados, todavia o po-
der legislativo da entidade concedente rejeitou o projeto de
lei que buscava a encampação. Não existindo outro meio a
sua disposição, um processo administrativo foi instaurado,
agora visando à decretação da caducidade. Independente das
razões que ensejaram à caducidade da concessão, várias são as
reportagens jornalísticas (fls. 204/286) que indicam a inten-
ção do ente concedente de - a qualquer custo - retomar a
execução dos serviços públicos concedidos à COMPESA, o
que compromete significativamente a credibilidade da ativi-
dade da agência reguladora municipal (ARMUP), também
demandada. Isso é mais que suficiente para, em sede de cog-
nição sumária, afastar os efeitos danosos da caducidade le-
vada a efeito. O Estado, como gestor da coletividade, não
pode visar outro interesse senão o de seus súditos. Frise-se
que a coletividade envolvida - os residentes do Município
de Petrolina - é a mais afetada com esse imbróglio político,
porquanto desde o ano de 2012 a demandante executa o
serviço público de forma precária, pois, com a decretação da
caducidade, já não há vínculo jurídico entre concessionária e
concedente. Não se pode olvidar que a ausência de vínculo
contratual impede a consecução de obras a longo prazo que
tenham por finalidade a melhoria do serviço prestado, posto
que não há garantia que o dispêndio financeiro aplicado será
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objeto de ressarcimento. Nesse contexto, vislumbro um pre-
juízo ao princípio do interesse público e da continuidade do
serviço público de fornecimento de água e esgotamento sa-
nitário de sorte a possibilitar a suspensão dos efeitos da ca-
ducidade, bem como da atuação da ARMUP perante a
concessionária. Ademais, sabe-se que a caducidade é decre-
tada diante do descumprimento de obrigações fundamentais
à exploração do serviço público, desde que a concessionária
seja notificada de forma prévia das irregularidades apontadas
como forma de possibilitar uma adequação no serviço exe-
cutado pela concessionária.Todavia, ao compulsar parte dos
autos do processo administrativo, percebe-se que o Estado de
Pernambuco, maior investidor da sociedade de economia
mista demandante, não participou do processo administra-
tivo em questão como interessado, fato que, a prima facie, nos
permite inferir pela nulidade do processo administrativo
neste tocante, já que, ex vi do art. 9, II da Lei 9.787/99, claro
é o interesse do Estado de Pernambuco em acompanhar o
feito. Impende ressaltar que o interesse do Estado de Per-
nambuco já ficou evidenciado pelo Município de Petrolina
quando este intentou a ação judicial nº 001.2004.022228-5,
pois incluiu a entidade estatal no polo passivo. Em sede de
cognição sumária, identifico, ainda, uma afronta a vertente
material do princípio do devido processo legal, que guarda
relação com o dever de razoabilidade e proporcionalidade,
haja vista que não se revela razoável que em 172 municípios
do Estado de Pernambuco a COMPESA execute o serviço
de abastecimento de água e esgotamento sanitário de forma
satisfatória e apenas no Município de Petrolina tais serviços
não atendam aos anseios da coletividade. Ora, ou os outros
municípios recebem uma prestação de serviço público supe-
rior ao município demandado; ou há uma perseguição polí-
tica à concessionária demandante. Neste caso, fico com a
segunda opção diante do escorço fático demonstrado pelas
provas acostadas aos autos. Com efeito, a verossimilhança das
alegações restou sobejamente demonstrada. Passo ao exame
do periculum in mora. O arcabouço de provas não deixa dú-
vida quanto ao prejuízo que pode advir tanto para concessi-
onária do serviço público demandante como para a
população do Município de Petrolina. Isso porque, a uma, o
município demandado já deixou claro que não pretende in-
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denizar os investimentos realizados pela COMPESA ao
longo dos anos (fls. 405/411); e, a duas, porque a coletivi-
dade do município envolvido é a mais afetada. Destaque-se
que caso a concessionária pare de prestar o serviço público
essencial de forma abrupta - circunstância possível já que
não há vinculo jurídico entre as partes - o Município de Pe-
trolina entraria em colapso, afetando vários segmentos da
unidade federada. Destarte, tenho que deve prevalecer o in-
teresse público e a continuidade do serviço público. Ante o
exposto, DEFIRO o pedido liminar no sentido de suspender
a vigência dos Decretos Municipais nº 137 e 160/2012, até
ulterior decisão judicial, devendo, ainda, o Município Réu
de se abster de dar continuidade a qualquer processo de
contratação de entidade para exploração dos serviços de sa-
neamento em Petrolina, até ulterior deliberação desse MM
Juízo e enquanto não julgada a lide em definitivo, bem
como determinar a submissão da COMPESA somente à re-
gulação pela ARPE, de sorte a suspender sua regulação pela
ARMUP. Desde já, fixo multa diária no valor de R$
50.000,00 (cinquenta mil reais) em caso de descumpri-
mento.
Tal decisão foi confirmada pelo Tribunal de Justiça do Estado
de Pernambuco em julgamento de agravo de instrumento.
Daí o presente pedido de contracautela.
Aduz o requerente que a decisão concessiva causa lesão aos
bens jurídicos tutelados pelas medidas de contracautela, pois, se-
gundo alega, a suspensão da eficácia dos referidos Decretos Municipais e
do processo licitatório em curso prejudica a saúde da coletividade, afeta a
economia pública inibindo vultosos investimentos, e impede que o Municí-
pio exerça regularmente seus poderes/deveres, tais como o de promover pro-
cesso licitatório.
No que se refere à suscitada lesão à saúde pública, assevera
que os serviços prestados pela concessionária mostram-se deficien-
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tes, sobretudo quanto ao esgoto que, diz, é lançado, sem trata-
mento adequado, diretamente no Rio São Francisco.
Ressalta que, como o Rio São Francisco é fonte de captação
da água consumida na cidade, a concessionária estaria prestando
um desserviço à saúde da população local, pois estaria promo-
vendo a captação de água para consumo humano no mesmo rio
em que despeja, sem tratamento, o esgotamento sanitário de Petro-
lina.
Neste aspecto, informa a existência de ação civil pública ma-
nejada pelos Ministérios Públicos Federal e Estadual contra a
COMPESA, bem como em face do Município de Petrolina, na
condição de poder concedente. Aponta que as decisões proferidas
na referida ação civil pública deixam claro o lançamento de esgoto
sem tratamento adequado no Rio São Francisco.
Registra, ainda, demanda movida pelo IBAMA em face da
concessionária ora requerida, onde seriam apontados os sérios da-
nos ambientais causados pela COMPESA na prestação dos servi-
ços de esgoto em Petrolina.
Segue dizendo haver risco de lesão à economia pública, uma
vez que a suspensão do processo licitatório privaria o Município e
a população de Petrolina de receberem vultosos investimentos de
infraestrutura nos sistemas de abastecimento de água e esgota-
mento sanitário.
Invoca algumas disposições constantes do edital de licitação
suspenso pelo provimento impugnado para argumentar que a mu-
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nicipalidade estaria deixando de receber consideráveis valores refe-
rentes à concessão em questão. Deduz, no ponto, por exemplo, que
o Município ficou impedido de, com o novo processo licitatório, receber in-
vestimentos da ordem de R$ 428.284.869,00 (quatrocentos e vinte e
oito milhões, duzentos e oitenta e quatro mil, oitocentos e sessenta e nove
reais), conforme previsto no Plano Municipal de Saneamento Básico (parte
integrante da licitação), investimento este que deveria ser integralmente
cumprido nos 5 (cinco) primeiros anos da concessão, conforme item 5.4 do
Edital de Concorrência.
Consigna, ainda, lesão à ordem público-administrativa, tendo
em vista que, conforme entende, a decisão concessiva de antecipa-
ção de tutela obriga o Município a agir na contramão das disposi-
ções constitucionais regentes da matéria, em especial contra o
disposto nos arts. 175 e 37, XXI, da Constituição Federal.
Salienta, também nesta perspectiva, que o pronunciamento
impugnado terminou por determinar uma restrição ao regular
exercício das funções administrativas do ente federado, uma vez
que o procedimento licitatório é meio legítimo de materialização
das contratações públicas.
Acrescenta, outrossim, violação ao art. 30,V, do texto consti-
tucional, na medida em que qualquer obstrução à retomada dos
serviços de água e esgoto implicaria em não reconhecimento da
própria titularidade dos serviços. Conclui, neste item, que a deci-
são concessiva estaria privilegiando o lucro e a continuidade da
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exploração dos serviços pela COMPESA em detrimento de toda a
coletividade e dos benefícios que a licitação pública representa.
Faz, ao final, algumas considerações quanto ao mérito da de-
manda principal, defendendo a legitimidade do processo adminis-
trativo de caducidade do contrato de concessão, bem como
apontando o desacerto da decisão concessiva de antecipação de tu-
tela.
Instados, apresentaram manifestação a COMPESA, o Estado
de Pernambuco e a Agência Reguladora do Município de Petro-
lina – ARMUT.
A concessionária aborda alguns aspectos da ação principal,
afirmando a existência de inúmeras irregularidades na condução
do processo de caducidade instaurado pelo Município de Petro-
lina, além de alegar motivação político-partidária para a cessação
do contrato de concessão.
Defende ser bem executado o serviço de saneamento reali-
zado em Petrolina, aduzindo existirem investimentos em melhorias
e ampliação dos serviços nos últimos anos, com a tomada de varia-
das ações para a ampliação da cobertura do Sistema de Abasteci-
mento de Água e Esgotamento Sanitário, bem como para
atendimento dos padrões de qualidade da água ofertada à popula-
ção da cidade e dos efluentes coletados e tratados.
Além disso, afirma ausentes os requisitos para o cabimento
desta contracautela, alegando não haver matéria constitucional de
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fundo nem urgência na medida pretendida. Neste ponto, faz as se-
guintes considerações:
De antemão deve ser ressaltado que a pretensão de suspensão
dos efeitos da tutela volta-se contra decisão de antecipação
de tutela deferida em 24 de setembro de 2013, pelo Juízo da
2ª Vara da Fazenda Pública de Recife nos autos do Processo
nº 0074797-42.2013.8.17.0001 (ainda em tramitação), e que
não foi cassada pelo Tribunal de Justiça em virtude dos di-
versos recursos interpostos tanto pelo Município de Petro-
lina quanto pela agência de regulação de serviços municipal,
todos improvidos.
Ou seja, a tutela que se pretende suspender vigora há mais
de dois anos e meio, o que afasta por completo a urgência
do pedido!
Ademais, a questão não possui natureza constitucional, mas
de mero direito local e se ampara nos fatos e provas deduzi-
dos na lide de origem, a qual trata da ilegalidade de Decretos
Municipais da lavra do Prefeito de Petrolina e que visavam a
decretação da caducidade de contrato de concessão de servi-
ços de saneamento e nulidade de Termo Aditivo ao Contrato
de Concessão, tendo sido suspensa a vigência dos referidos
atos normativos municipais em virtude dos fortes indícios de
irregularidades.
Entende, por fim, não haver lesão à saúde, à economia e à or-
dem públicas, requerendo o não conhecimento do pedido de sus-
pensão e, caso conhecido, o seu indeferimento.
O Estado de Pernambuco também apresentou manifestação,
dizendo inadmissível o pedido de suspensão, uma vez que não te-
ria havido interposição de recurso extraordinário da decisão con-
cessiva de antecipação de tutela, e, diante disso, diz, transitou em
julgado a discussão constitucional, restando inviável o pedido de
contracautela.
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Explicita, por outro lado, não cabível a medida porque utili-
zada como sucedâneo de recurso e por envolver matéria de direito
local, evidenciando-se ausente controvérsia constitucional, além de
invocar a incidência das Súmulas/STF 279, 280, 282 e 356.
Defende a higidez da decisão que se pretende suspender,
pleiteando seja negado seguimento à suspensão e, alternativamente,
seja indeferido o pedido.
A Agência Reguladora do Município de Petrolina – AR-
MUT, por sua vez, respalda as razões da inicial, manifestando-se fa-
voravelmente à pretensão do requerente.
Na sequência, vieram os autos à Procuradoria-Geral da Re-
pública para emissão de parecer.
Esses, em síntese, os fatos de interesse.
Preliminarmente, necessário verificar a competência da Presi-
dência desse Supremo Tribunal Federal para análise do feito.
Neste aspecto, ao revés do alegado pelos ora interessados, a
matéria discutida na ação evidencia a competência dessa Suprema
Corte para examinar este pedido de suspensão, uma vez que, não
obstante envolva a interpretação de normas infraconstitucionais, o
seu fundamento nuclear é de índole constitucional, envolvendo a
interpretação e aplicação dos arts. 30,V, 37, XXI, e 175, da Consti-
tuição Federal.
Diga-se, neste ponto que, embora em análise contrato de
concessão de serviço público, discutido sob à égide da Lei
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8.987/95, está em debate, na verdade, a própria titularidade do ser-
viço público de água e esgoto. Isso porque, somente o fato de o
Município vir tentando assumir a prestação do dito serviço desde
2001, é demonstração eloquente da possibilidade da existência de
verdadeira usurpação da titularidade constitucionalmente outor-
gada ao ente municipal.
Ainda em preliminar, tem-se que a ausência de interposição
de recurso extraordinário da decisão concessiva de antecipação de
tutela não é óbice para o conhecimento da suspensão. É que, na
verdade, haverá trânsito em julgado do tema constitucional na
oportunidade de utilização do apelo extremo face ao julgamento
de mérito da ação originária e não face ao pronunciamento precá-
rio de antecipação da tutela.
Passando-se ao exame da suspensão em si, nota-se que, sob
outro prisma, a possível afronta à titularidade do serviço público é
também fundamento para o deferimento do pedido.
Sabe-se que o deferimento dos pedidos de contracautela tem
caráter excepcional, sendo imprescindível perquirir a potenciali-
dade de a decisão concessiva ocasionar lesão à ordem, segurança,
saúde e economia públicas, não cabendo nesta sede, em princípio,
a análise do mérito.
Essa Suprema Corte, entretanto, fixou orientação no sentido
de ser possível um juízo mínimo acerca da matéria de fundo
analisada na origem para concluir-se pela viabilidade ou
inviabilidade da suspensão da decisão concessiva.
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Na espécie, conforme consta dos autos, o Município de
Petrolina e a COMPESA firmaram contrato para a concessão dos
serviços de abastecimento de água e gestão de esgotos sanitários
pelo prazo de 50 anos, entre 1975 e 2025.
Em 2003, houve uma primeira tentativa de cessação do
contrato, tendo, à época, os contratantes, além do Estado de
Pernambuco, firmado Termo de Rescisão Amigável do Contrato
de Concessão dos referidos serviços.
A rescisão não se efetivou e, tentando dar cumprimento ao
termo acordado, ajuizou o Município ora requerente, em 2004,
ação de obrigação de fazer e acertamento de contas (Processo
001.2004.022228-5). O pedido cautelar neste processo foi
deferido pela Corte estadual, determinando-se, na oportunidade,
que a COMPESA transferisse ao ente municipal os serviços de
água e esgoto, além de determinar ao ente público que pagasse a
primeira parcela da indenização ajustada.
Em face da mencionada decisão concessiva de liminar, houve
por parte da concessionária e do Estado de Pernambuco pedido
de suspensão perante esse Supremo Tribunal Federal, incidente
autuado à época como STA 26. O pedido foi indeferido pelo
Colegiado em acórdão assim ementado:
AGRAVO REGIMENTAL NA SUSPENSÃO DE TUTELA ANTECIPADA.
DISCUSSÃO MERAMENTE REFLEXA OU ARGUMENTATIVA.
INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS DE TERMO DE RESCISÃO AMIGÁVEL.
SÚMULA 454. INCOMPETÊNCIA DO STF PARA CONHECER DO
PEDIDO DE SUSPENSÃO. AUSÊNCIA DE GRAVE LESÃO À ORDEM E À
SAÚDE PÚBLICAS. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA
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279. EMPRESA QUE ATUA COMO AGENTE ECONÔMICO PRIVADO,
EMBORA CONTROLADA POR ESTADO MEMBRO. INAPLICABILIDADE DO
DISPOSTO NO ART. 1º, § 3º, DA LEI N. 8.437/92 E NO ART. 1º DA
LEI N. 9.494/97.
1. A discussão em torno de mera interpretação de cláusulas
contratuais, não induz a competência do Supremo Tribunal
Federal para apreciar pedido de suspensão de tutela anteci-
pada [Súmula n. 454].
2. O exame das alegações de grave lesão à ordem ou à saúde
públicas seria possível somente se o Tribunal fosse compe-
tente para julgamento da suspensão de segurança e não po-
deria ultrapassar os elementos constantes dos autos, com o
reexame das provas produzidas, ante a vedação contida na
Súmula n. 279.
3. Os arts. 1º, § 3º, da Lei n. 8.437/92, e 1º da Lei n.
9.494/97 não se aplicam quando a pessoa jurídica de direito
privado, ainda que controlada por Estado-membro, atua não
como expressão de poder público, mas como agente econô-
mico privado interessado em preservar o privilégio que vi-
nha explorando.
4. O serviço público não pode ser retido pelo concessioná-
rio em benefício da satisfação do interesse privado.
5. Agravo conhecido e provido para anular a decisão que
suspendeu os efeitos da tutela antecipada.
Posteriormente, em julgamento de embargos de declaração
opostos da transcrita decisão, reconheceu-se a perda superveniente
da suspensão, em razão de composição extrajudicial feita entre as
partes na ação principal2
.
Realizada a composição entre o Município e a empresa
concessionária, sobreveio distrato do termo de rescisão firmado
2 Eis a ementa do decisum: SUSPENSÃO DE TUTELA ANTECIPADA. EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO EM AGRAVO REGIMENTAL. EXISTÊNCIA DE COMPOSIÇÃO
EXTRAJUDICIAL ENTRE AS PARTES NA AÇÃO PRINCIPAL. DESISTÊNCIA HOMOLOGADA.
PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO DESTA SUSPENSÃO. AÇÃO QUE RESTA
PREJUDICADA.
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anteriormente, além de termo aditivo, voltando a prestação dos
serviços à COMPESA.
Em 2009, ao mudar a chefia da municipalidade, instaurou-se
o procedimento administrativo que redundaria na decretação de
caducidade do contrato de concessão e na edição dos decretos
municipais objeto da ação principal referente a este feito.
A delineada ordem de acontecimentos bem evidencia que a
pretensão municipal de retomada da titularidade do serviço
público de abastecimento de água e tratamento de esgoto arrasta-
se há anos, havendo nítido risco de verdadeira usurpação da
capacidade administrativa do Município de organizar e prestar o
serviço público em questão.
Já nos autos da citada STA 26, em 2005, a Procuradoria-
Geral da República3
apontava o fato de que a operação de
transferência dos serviços foi precedida de extenso, complexo e
exauriente procedimento. Na oportunidade, asseverou o Parquet
que o Município de Petrolina se mostrava empenhado em assumir
a execução dos serviços e havia procurado, por anos, montar uma
estrutura jurídica, econômica e material para tal tarefa. Possuía,
ainda, um plano elaborado e estaria habilitado a assumir tal tarefa.
Além disso, dizia, na oportunidade, o Ministério Público
Federal ser patente a negligência da COMPESA na prestação dos
serviços e não se justificar a manutenção do contrato com base na
alegada preocupação com a continuidade dos serviços públicos.
3 Parecer 4.568/CF, de 25 fev. 2005.
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Afirmou-se, ainda, que manter a concessão até o desfecho de
extenso procedimento judicial prestigiaria a perpetuação de um
estado de coisas que vinha denegrindo os interesses da população
interessada, como também bens de envergadura maior, como o
meio ambiente.
Se esta conclusão ficava clara em 2005, sobreleva-se na atual
conjuntura quando se verifica que, passados onze anos daquela
tentativa, permanece o ente municipal impedido de assumir a
titularidade do serviço público em questão.
A própria decisão que se pretende suspender reconhece que
não é de hoje que o Município de Petrolina busca a "extinção" da conces-
são firmada no ano de 1975 e a consequente retomada da execução direta
do serviço público em tela.
Assim, num exame perfunctório, próprio das medidas de
contracautela, verifica-se ir de encontro aos ditames constitucio-
nais provimento jurisdicional que impeça o ente municipal de re-
assumir a titularidade do serviço público de sua competência,
executando-o diretamente ou por meio de procedimento licitató-
rio para novo contrato de concessão, tendo a COMPESA, aliás, a
possibilidade de participar, em igualdade de condições, da referida
licitação.
A imposta perpetuação do contrato de concessão firmado,
inicialmente, em 1975, para vigorar por 50 anos, impedindo-se o
Poder Público, mesmo após regular procedimento administrativo
de caducidade, de retomar a titularidade dos serviços públicos em
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discussão revela-se indevida ingerência na capacidade administra-
tiva do ente municipal, não se mostrando consentânea com o inte-
resse público, além de causar inegável prejuízo à população local.
Fica claro, assim, o risco de lesão à ordem pública, sobretudo
à ordem jurídico-constitucional, tendo em vista que, ao impedir
mais uma vez a retomada, por parte do Município de Petrolina, da
titularidade dos serviços públicos de água e esgoto, a decisão ob-
jeto deste incidente afronta os dispositivos constitucionais regentes
da matéria, não se mostrando razoável, como dito, que, com funda-
mento na necessária continuidade do serviço público, permaneça
situação de verdadeira usurpação da competência municipal de or-
ganizar e prestar o serviço público em questão.
Ante o exposto, opina a Procuradoria-Geral da República
pelo deferimento do pedido de suspensão.
Brasília (DF), 15 de junho de 2016.
Rodrigo Janot Monteiro de Barros
Procurador-Geral da República
JCCR/VCM
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