1. PLANO DE MARKETINGEspaço social e classes sociais na teoria de
Pierre Bourdieu
Prof. MSc Felipe Correa de Mello
2012
2. O objetivo deste curso é apresentar os principais aspectos concernentes à teoria de
espaço social e espaço simbólico apresentados na obra do sociólogo Pierre Bourdieu, bem
como sua concepção de classes sociais, esta diretamente relacionada às reflexões acerca dos
espaços sociais e simbólicos.
Englobando pesquisas em diversos e diferentes campos da atividade social (alta costura,
literatura, sistema escolar, campo acadêmico, burocracia estatal, frequência a museus,
trabalhadores na Argélia entre vários outros) e colocando em prática e resignificando uma série
de conceitos de diversas tradições teóricas, a obra de Bourdieu é bastante vasta e complexa.
Muitas vezes hermética, sua obra apresenta obstáculos para a leitura e compreensão
para aqueles que não estão familiarizados com ela.
Neste sentido, com objetivo em facilitar a melhor compreensão das noções de espaço
social e simbólicos é proposto neste curso uma apresentação inicial que indique os diversos
caminhos e perspectivas teóricas presentes na tradição das ciências humanas contra e com as
quais Bourdieu construiu sua teoria.
Tem-se, assim, como objetivo específico deste curso fazer um apanhado geral de
conceitos caros a Bourdieu, como habitus, estratégia, senso prático, poder simbólico,
reprodução, entre outros. Conceitos, estes, que fazem parte de um mesmo conjunto conceitual
e que podem ser integradas logicamente.
3. O curso é dividido em três módulos:
I. Perspectivas sobre o mundo social e a ação
humana;
II. Bourdieu: para além do objetivismo e do
subjetivismo;
III. Espaço social e simbólico: a questão das
classes sociais.
4. I. Perspectivas sobre o mundo social e a ação humana
O que é objetivismo?
Quais seus méritos?
Quais suas lacunas?
Quais suas implicações na concepção da ação humana?
O que é subjetivismo?
Quais seus méritos?
Quais suas lacunas ?
Quais suas implicações na concepção da ação humana?
II. Bourdieu: para além do objetivismo e do subjetivismo
Agentes situados e determinados: a influência de Durkheim;
Quais são os cruzamentos teóricos que ajudaram na construção das teorias
bourdesianas ?
A dupla dimensão do mundo social;
Quais os procedimentos metodológicos adotados por Bourdieu?
O poder simbólico na estruturação do mundo social: dimensão ativa do sujeito.
Quais são os conceitos mediadores que permitem a superação da falsa oposição
sujeito/objeto?
5. III. Espaço social e simbólico: a questão das classes sociais
1. Os dois modos tradicionais de se pensar as classes sociais
2. Observações preliminares de caráter teórico-metodológico
3. O enfoque relacional proposto por Bourdieu
3.1 Relação entre as práticas e a origem e pertencimento de
classe
3.2 Visão sistêmica contra interpretações “substancialistas”
3.3 Propriedades de posição e propriedades de condição: a
dialética da distinção
4. Estruturação do espaço social: princípios de diferenciação e a
noção de capital em Bourdieu
5. Classificações e re-classificações: dominação e lutas; habitus
diferenciados e diferenciadores
6. Eliminando equívocos: o efeito da teoria
7. Grosso modo, podemos dizer que existem duas perspectivas teóricas
opostas acerca do mundo social, e, por conseguinte, da ação humana:
a) Física social (objetivismo)
b) Fenomenologia social (subjetivismo)
I. Perspectivas sobre o mundo social e a ação humana
8. Física social
Sociedade concebida como uma estrutura objetiva, “captada a partir de fora,
cujas articulações podem ser materialmente observadas, mensuradas e
cartografiadas independentemente das representações que façam aqueles em
que ela vivem” (WACQUANT, 2005:31);
O ponto de vista da física social é também chamado de ponto de vista
objetivista;
Este ponto de vista encontra sua primeira forma teórica na figura de Durkheim
(LOPES: 2009) e seu epítome em sua obra “O suicídio” de 1897
(WACQUANT:2005).
9. Ponto de vista expressado também em:
Linguística saussureana;
Estruturalismo de Levi- Strauss;
Marxismo althusseriano (de forma secundaria).
Segundo Burrel & Morgan (1979) esta perspectiva objetivista encerra
dois paradigmas: o estruturalismo e o funcionalismo radical
Física social/objetivismo
10. Ponto de vista objetivista/ física social
Este ponto de vista implica uma perspectiva substancialista. Ou seja, privilegia
as substâncias --"neste caso, os grupos reais, cujo número, cujos limites, cujos
membros etc. se pretende definir" -- em detrimento das relações” (BOURDIEU, 2010:
133).
Esta visão é também correlata de um ponto de vista intelectualista, pois
considera a classe construída pelo cientista como uma classe real, efetivamente
mobilizada.
11. Implicações desta perspectiva sobre a concepção da
ação humana (praxeologia):
Tende a deslizar do modelo à realidade; a reificar as estruturas
construídas pelos teóricos as tratando como entidades autônomas
dotadas da habilidade de “atuar “ a maneira de agentes históricos;
Agentes são reificados: estruturados, não estruturantes. Meros
epifenômenos da sociedade;
A prática individual é interpretada como a execução do modelo
construído (executantes de regras ou papéis);
Agentes são meros suportes das estruturas objetivas;
Encerra uma perspectiva mecanicista da ação humana.
12. Segundo Bourdieu, o mérito da sociologia de Durkheim é o de introduzir
na explicação sociológica a questão básica acerca das condições
particulares que tornam possível o mundo social (LOPES, 2009).
Ao investir contra a fé iluminista no ser humano auto-suficiente, Durkheim
desenvolve uma teoria voltada para a explicação das práticas individuais
a partir das relações objetivas que a estruturam - "recusando quaisquer
explicação psicologizantes destas práticas" (idem: 309).
Mérito da perspectiva objetivista:
13. O ponto de vista da fenomenologia social pode ser considerado
como um ponto de vista subjetivista ( ou “construtivista” )
É expressado de forma hiperbólica por Sartre em “O ser e o nada”
Expressado em:
Etnometodologia em sua variante cultural;
Interacionismo simbólico apresentado em Garfinkel, Schutz, Berger
& Luckmann;
Algumas variantes da Rational Action Theory.
Fenomenologia social
14. “Sociedade aparece como produto emergente das decisões,
ações e cognições de indivíduos conscientes e alertas, a quem o
mundo se apresenta como imediatamente familiar e significativo”
(WACQUANT, 2005: 33);
A estrutura social é definido por Berger & Luckmann em seu clássico
livro A construção social da realidade como “a soma total de
tipificações[socialmente aprovadas] e dos padrões recorrentes de
interação estabelecida através delas” (apud Wacquant, 2005: 33).
Fenomenologia social
15. Ponto de vista subjetivista/ fenomenológico
Limite máximo desta perspectiva é considerar que a realidade é
uma ficção construída pelos indivíduos;
Concepção esta, que ignora que exista um mundo social exterior à
vontades e ideias individuais e coletivas;
A este enfoque podemos chamar de nominalismo.
16. Valor deste ponto de vista reside em reconhecer o papel que o
“conhecimento mundano, a significação subjetiva e a competência prática
desempenham na produção contínua da sociedade” (WACQUANT,
2005:33).
Segundo Bourdieu, o mérito do "construcionismo" (interacionismo e
etnometodologia) é recordar contra visões mecanicistas da ação, "que os
agentes sociais constroem realidade social, individualmente e também
coletivamente" (apud WACQUANT, idem: 34).
Praxeologia e méritos do ponto de vista da fenomenologia social
17. Bourdieu aponta pelo menos dois erros neste ponto de vista:
I. Concebem as estruturas sociais como a mera agregação de estratégias e atos de
classificação individual;
II. Não dá conta em explicar o porquê e de acordo com que princípios é produzido o
trabalho de produção social da realidade em si.
O ponto de vista fenomenológico esquece que os agentes não construíram as categorias
que põem em funcionamento este trabalho de construção.
Ignora que o princípio de construção é socialmente construído e é comum a todos os
agentes socializados de certa maneira.
Esquece, enfim, a relação entre determinações externas, a incorporação destas
determinações e, finalmente, as ações.
No
Equívocos da perspectiva da fenomenologia social/subjetivismo
18. A perspectiva fenomenológica (subjetivista)
lança tanta luz à dimensão estruturante dos
agentes sociais que ignora a dimensão
estruturada em que estão situados os agentes.
20. “[...]é porque os sujeitos não possuem a significação de seus
comportamentos como dado imediato da consciência e porque
seus comportamentos encerram sempre mais sentido do que sabem
e querem, que a sociologia não pode ser um ciência puramente
reflexiva [...]” .
Segundo Bourdieu, a sociologia é possível porque “existem relações
exteriores, necessárias, independentes das vontades individuais e
inconscientes (no sentido que elas não se dão a simples reflexão)
que não podem se compreendidas senão pelo desvio da
observação e da experimentação objetiva” (apud SAPIRO, 2007: 53)
Como Durkheim, Bourdieu concebe a sociologia como a
ciência das restrições que pesam sobre os indivíduos:
21. “O mundo compreende-me, mas eu o compreendo”
(Blaise Pascal, parafraseado por Pierre Bourdieu)
Polissemia da palavra “compreender”:
O mundo compreende-me e aniquila-me como um ponto; “sou uma coisa do
mundo; existo enquanto corpo; estou situado, datado, determinado; estou
submetido a forças; se eu pular pela janela, fico à mercê da lei da gravidade
etc.” (BOURDIEU, 2011: 48).
E eu o compreendo: tenho representação dele e não sou redutível à posição que
ocupo neste mundo.
“Cada um de nós tem um ponto de vista, ele está situado em um espaço social
e, partir desse ponto do espaço social, ele vê o espaço social” (idem: 49)
Dupla realidade do ser humano: objetivo ( como uma coisa no muno) e subjetivo ( ser
que interpreta e tem representações sobre o mundo que o engloba).
22. Objetivismo e subjetivismo, mecanicismo e finalismo, necessidade estrutural ou
finalismo individual são falsas antinomias. Cada termo da oposição reforça o outro
e obscurece a verdade objetiva dos universos sociais e da prática humana. Uma
ciência social deve desembaraçar estes termos rumo à uma compreensão e
explicação total da sociedade (Wacquant, 2005)
Para Bourdieu, o maior obstáculo para uma ciência social é a falsa oposição
entre indivíduo e sociedade.
Podemos dizer que seu projeto de sociologia é voltado para a superação da
oposição entre subjetivismo e objetivismo.
Como recordava Bourdieu falsos problemas sociológicos e científicos estão muitas
vezes apoiados em verdadeiros problemas sociais ou em verdadeiros problemas
políticos:
“é o caso, por exemplo, da oposição entre indivíduos e sociedade, individualismo
e socialismo, individualismo e coletivismo, individualismo e holismo (...) (Bourdieu &
Chartier: 47)
23. Para transcender estas dualidades Bourdieu converte
paradigmas aparentemente antagônicos em momentos de
“uma forma de análise destinada a recapturar a realidade
intrinsecamente dupla do mundo social” (WACQUANT, 2005:
35)
25. Contra as “grandes teorias” que constroem abstrações teóricas sem
nunca verificá-las na realidade social objetiva, Bourdieu coloca no
centro de sua obra a pesquisa empírica;
Seus conceitos nunca são examinados em si mesmos e por si mesmos;
são utilizados e postos à prova num trabalho inseparavelmente teórico e
empírico;
Para Bourdieu (2011:15), não é possível captar a lógica mais profunda
do mundo social “ a não ser submergindo na particularidade de uma
realidade empírica, historicamente situada e datada, para construí-la,
porém como “caso particular do possível” [...] isto é, como figura em um
universo de configurações possíveis”;
“Apanhar o invariante, a estrutura, na variante observada. Apreender
estruturas e mecanismos” (idem: 15).
Prevalência da pesquisa empírica
26. Procedimentos metodológicos
O processo sociológico bourdesiano passa necessariamente por dois movimentos
distintos, porém vinculados entre si:
Primeiro movimento: Objetivação do objeto de pesquisa.
Processo amparado pela observação empírica (a partir da coleta de dados
estatísticos , observação etc.), que corresponde ao que Durkheim chamava de
“estabelecimento dos fatos” (Lenoir: 2007).
Segundo movimento: Análise das “representações” e pontos de vista dos agentes
sociais.
27. Cabe dizer que a oposição construída por Dilthey, nada mais é
que a sistematização no campo teórico-metodológico da
oposição sujeito (procedimentos compreensivos) x
objeto(procedimentos explicativos) e que a união dos dois
procedimentos em Bourdieu é o resultado lógico de seu
empreendimento voltado a superar a falsa oposição entre sujeito
e objeto.
Contra a tradicional oposição entre compreender (concernentes
às ciências humanas) e explicar (concernentes às ciências
naturais), definida por Dilthey, Bourdieu defende um trabalho de
pesquisa que ao mesmo temo explique e compreenda seu objeto
de pesquisa.
Explicar e compreender
Procedimentos metodológicos
29. Seguindo Durkheim, Bourdieu compreendia que a conduta humana é
devedora da sistematicidade imanente do mundo social, independente das
vontades e consciências individuais;
Esta sistematicidade das relações objetivas é, assim, inacessível à simples
reflexão ou intuição não mediada;
O meio de trazer à luz estas relações objetivas é o trabalho teórico e
empírico (fundamentalmente, estatístico);
Este trabalho é concebido como um procedimento de objetivação;
Bourdieu concebe, assim, que existem relações objetivas entre as posições
ocupadas pelos agentes sociais na estrutura social;
O conhecimento destas relações permite reintegrar a experiência e as
representações dos agentes, concebidos como “pontos de vista” na análise
sociológica;
Primado dado às estruturas objetivas, porém sem recair no estruturalismo
mecanicista (objetivismo).
30. Visível que é imediatamente percebido esconde o invisível que o
determina. Assim, a verdade de uma interação nunca está nela
mesma tal qual ela se oferece à observação (BOURDIEU, 2004)
Objetivar é, assim, transformar visíveis mecanismos inconscientes.
Ruptura objetivista com as pré-noções da sociologia espontânea e
com a visão e percepção imediata da realidade social.
Movimento inevitável do trabalho científico que, diga-se de passagem,
é dispensada pela etnometodologia, o interacionismo e algumas
formas de psicologia social que se apegam a uma visão
fenomenológica do mundo social.
31. A partir de cálculos estatísticos, modelos e tipos ideais o
procedimento teórico-metodológico desenvolvido por Bourdieu
permitia atualizar as estruturas das possibilidades de acesso, a
distribuição de diferentes espécies de capitais e os meios de
apropriação destes segundo os agrupamentos sociais.
Trabalho essencialmente científico que ilumina e explica para além
da evidência do senso comum. Para além da aparência
fenomênica das coisas cotidianas. Procedimentos que ajudam a
romper com pre-noções, ilusões de transparência, pressupostos da
evidência cotidiana.
32. Alcances:
O mérito do método estatístico é que ele anota, descreve; traz à luz “repartições”,
“distribuições”, “classes” e “agrupamentos”. No primeiro momento sua função é a de
medir. Não está ocupado em explicar e compreender.
Limites:
Porém, em se tratando de um objeto que fala e compreende, o procedimento estatístico,
por mais preciso que seja o peso numérico conferido à coleta e estruturação estatística,
continua sendo um dado puro. “Incompreensível”; uma vez que se trata de anotar e
buscar explicar e compreender comportamentos e opiniões subjetivas (BOURDIEU, 2011:14).
Método estatístico: alcances e limites
34. Contra o mecanicismo estruturalista, Bourdieu “reintroduz, em sua teoria da
prática, a concepção finalista, cara à fenomenologia e a Max Weber, que
descreve as condutas como orientadas em relação a seus fins” (SAPIRO: 54);
Bourdieu põe, assim, em sua análise sociológica um acento sobre a
significação que os agentes sociais possuem acerca de suas práticas (podemos
chamar esta etapa de “sociologia da percepção”;
Bourdieu recorda que este ponto de vista, embora não seja o princípio das
condutas humanas (o que seria recair na perspectiva subjetivista), contribui para
orientá-las” (SAPIRO:54-55);
“Ponto de vista” (“representações”) dos agentes como parte da realidade
social observada;
Pontos de vista situados: recusa do sujeito transcendental da fenomenologia
retomada pelos etnometodologistas.
35. A representação que os agentes têm do mundo (social e natural) são produto da
incorporação das estruturas objetivas do mundo social em que eles estão inseridos. Em outras
palavras, as representações, valorações, classificações que os agentes sociais têm acerca
da realidade são efeitos, em parte, do mundo social em que estão inseridos.
Síntese dos dois movimentos: confrontação dos pontos de vistas com as estruturas
objetivas:
“compreender a experiência vivida melhor que ela se compreende a si
mesma, dar conta das representações e das racionalizações explicativas contra
as quais a teoria foi construída”. (Bourdieu apud Lenoir, 2007:97)
36. De um lado, "as estruturas objetivas que o sociólogo constrói no momento objetivista,
descartando as representações subjetivistas dos agentes, são o fundamento das
representações subjetivas e constituem as coações estruturais que pesam nas interações"
(BOURDIEU, 2004:152). De outro, "estas representações devem também ser retidas, sobretudo
se quisermos explicar as lutas cotidianas, individuais ou coletivas que visam a conservar ou
transformar essas estruturas".
Bourdieu diz em seu livro “Coisas Ditas” ( 2004: 149) que se tivesse que categorizar sua
obra em duas palavras a definiria como estruturalismo construtivista ou construtivismo
estruturalistas.
O esforço de Bourdieu é o de unificar o método estruturalista ao estudo fenomenológico.
Bourdieu toma o termo “estruturalismo” segundo a conceituação dada pela tradição
inaugurada por Levi-Strauss e Saussere que concebe que existem no mundo social e não
apenas nos sistemas simbólicos estruturas objetivas exteriores e independente das vontades
individuais e coletivas.
Relação dialética entre os dois pontos de vista.
Resumindo....
Para além do subjetivismo e do objetivismo
37. Construção do mundo social operada sob coações
estruturais. Não é operada num vazio social;
Estruturas cognitivas são socialmente estruturadas;
Construção da realidade não é um empreendimento
individual, mas sim coletivo;
Há assim, na sociologia de Bourdieu um primado das
condições objetivas (estruturais) em relação às condutas,
percepções e valorações individuais e coletivas;
Este primado da dimensão objetiva é devido ao fato de que
equilíbrios estruturais são irredutíveis às interações simbólicas e as
práticas nas quais elas se manifestam.
Lembrar!
39. Como observa Lenoir, noções como habitus, sentido prático,
estratégia estão ligadas a um esforço teórico por sair do
objetivismo sem, no entanto, recair em seu duplo invertido, o
subjetivismo.
40. Antes de tudo é preciso lembrar que a praxeologia bourdesiana foi
construída com e contra as perspectivas subjetivistas e objetivistas, no intuito
de superar as falsas oposições concernentes, e derivadas, destas duas
perspectivas.
Sendo assim a teoria da ação em Bourdieu se situa contra o finalismo
subjetivista (liberdade absoluta, sem determinações quaisquer; transparência
da consciência perante si mesmo: sujeito que age com conhecimento de
causa e com vista a fins colocados por si mesmo)
Porém, a concepção de “anterioridade do social em relação ao
indivíduo” (influência de Durkheim e que marca o distanciamento em
relação ao subjetivismo) não implicam uma concepção mecanicista/
determinista da ação.
41. Neste caminho teórico podemos destacar três conceitos
interligados caros para Bourdieu:
Habitus;
Estratégia;
Sentido prático.
42. Ao falar de ação em Bourdieu (ou de habitus) devemos ter em mente que se está
falando de uma ação que deve sua lógica à uma história incorporada e a
incorporação das estruturas do espaço social.
Notar que esta concepção da ação não encerra uma perspectiva determinista
desta ação. Isto é muito importante. Não é por dizer que as condições materiais e
sociais de existência determinam o comportamento e a percepção que estamos
dizendo que as ações são necessariamente determinadas por estas condições.
Com o dito anteriormente, o conceito de habitus é construído em relação à duas
tradições (objetivista e finalista) e ilumina a dimensão de indeterminação e improviso
(plasticidade) da ação ao mesmo tempo que ilumina o fato dos agentes nunca serem
por inteiro sujeito de suas práticas(BOURDIEU, 2007:169)
Método estatístico, procedimentos teóricos e metodológico voltados para uma
ciência probabilística: buscar o que os agentes estão inclinados a fazer dadas
determinadas condições particulares de existência e de atualização das disposições
incorporadas.
43. Caráter disposicional e corporal do habitus
Habitus relacionado à noção de hexis corporal aristotélica;
O “social” se instituí de modo multiforme, em objetos materiais ou
imateriais, em mecanismos e dispositivos, em regulamentações e
disposições;
Inércia do passado através das estruturas incorporadas sob a
forma de disposições;
Corpo como centro da lógica da prática.
44. “Agentes sociais são dotados de habitus, inscritos nos
corpos pelas experiências passadas: tais sistemas de esquema
de percepção, apreciação e ação permitem tanto operar
atos de conhecimento prático, fundados no mapeamento e
no reconhecimento de estímulos condicionais e convencionais
a que os agentes estão dispostos a reagir, como tanto
engendrar, sem posição explícita de finalidade nem cálculo
racional de meios, estratégias adaptadas e incessantemente
renovadas, situadas porém nos limites das constrições
estruturais de que são produto e que as definem” (BOURDIEU,
2007:169)
45. “A noção de estratégia é o instrumento de uma ruptura com o ponto de vista
objetivista e com a ação sem agente que o estruturalismo supõe (recorrendo, por
exemplo, à noção de inconsciente). Mas pode-se recusar a ver a estratégia como o
produto de um programa inconsciente, sem fazer dela o produto de um cálculo
consciente e racional. Ela é produto do senso prático como sentido do jogo, de um jogo
social particular, historicamente definido, que se adquire desde a infância [...] O bom
jogador, que é de algum modo o jogo feito homem, faz a todo instante o que deve ser
feito, o que o jogo demanda e exige. Isso supõe uma invenção permanente,
indispensável para se adaptar às situações indefinidamente variadas, nunca
perfeitamente idênticas. O que não garante a obediência mecânica à regra
explícita,codificada (quando ela existe)” (BOURDIEU, 2004: 81).
46. Das regras à estratégia
Segundo Bourdieu, na lingüística e antropologia estrutural os agentes
aparecem como simples suportes de estruturas ou executantes de regras ou
papéis (2004);
Bourdieu critica (este suposto) mecanicismo estruturalista;
Neste caminho, o modelo chomskiano de competencia gerativa de
condutas permite superar a oposição entre mecanicismo e liberdade absoluta
da ação (Idem: 54);
Estratégia: conceito criado a partir da teoria dos jogos e da linguística que
restitui aos agentes margem de inovação e de improviso;
Noção de estratégia é o meio de romper com o que Bourdieu denominava
o ponto de vista do modelo que as diferentes disciplinas (lingüística, etnologia,
economia e direito) utilizam, e ao mesmo tempo, com a ação sem agente que
implica o estruturalismo.
47. Sentido prático
Lógica da lógica x lógica das práticas.
Senso prático:
Condutas vinculadas com a percepção das factibilidades como
prováveis e com suas esperanças subjetivas mais ou menos ajustadas a
possibilidades objetivas.
Sentido prático é o que tende a ajustar as esperanças subjetivas às
possibilidades objetivas, e pois, o possível ao provável.
49. 1. Os dois modos tradicionais de se pensar as classes sociais
2. Observações preliminares de caráter teórico-metodológico
3. O enfoque relacional proposto por Bourdieu
3.1 Relação entre as práticas e a origem e pertencimento de classe
3.2 Visão sistêmica contra interpretações “substancialistas”
3.3 Propriedades de posição e propriedades de condição: a dialética da
distinção.
4. Estruturação do espaço social: princípios de diferenciação e a noção de
capital em Bourdieu
5. Classificações e re-classificações: dominação e lutas; habitus diferenciados e
diferenciadores.
6. Eliminando equívocos: o efeito da teoria.
50. 1. Os dois modos tradicionais de se pensar as classes sociais
51. Espaço social e classes sociais
Duas maneiras como os sociólogos encaram o problema das classes sociais.
Cada uma delas implicando, de modo bastante concreto, práticas e métodos de
pesquisas diametralmente opostos.
1. Modelo analítico
Caracterizado por procedimentos de coleta e estruturação de dados estatísticos;
Tratamento analítico dos dados coletados;
Tendem a não contribuir com uma abordagem de tipo relacional.
2. Modelo teórico-abstrato
Permite compreender as classes em termos estruturais;
Implica a noção de espaço social, “no sentido de uma configuração construída
de relações regulares e hierarquizadas” (LENOIR, 2007:95).
Tradições teóricas
52. O projeto sociológico de Bourdieu objetiva conciliar estas duas
posturas;
Segundo ele, a sociologia não pode ser reduzida a uma axiomática
das interações sociais, tampouco uma ciência das estruturas objetivas do
mundo social (LENOIR, 2007:95);
Neste caminho, Bourdieu privilegia o enfoque relacional (estrutural);
O conceito de espaço social, devido a sua relativa indeterminação e
plasticidade, é uma das ferramentas conceituais que permitem escapar
a alternativa entre nominalismo ou realismo.
54. As tomadas de posição não se deduzem de um corpo de preposições, mas sim
da trajetória social e da posição ocupada pelo agente. O objeto da ciência social
não é o “indivíduo”, mas o campo ou espaço social;
Não obstante, a análise estatística está vinculada geralmente a indivíduos ou
instituições singulares (só da para construir um campo ou um espaço social a partir de
indivíduos: informação necessária para a análise estatística);
Campo (ou espaço social) está no centro das operações que constituem a
pesquisa. Isto não significa dizer que os indivíduos não existam, que são meras ilusões.
Porém a ciência constrói estes indivíduos como agentes e não como indivíduos
biológicos, atores ou sujeitos;
São agentes: atuantes e ativos no campo (espaço social) dado que possuem as
propriedades necessárias para ser eficientes nele, para ali produzir efeitos.
Observações preliminares
Procedimentos para a análise dos espaços sociais
55. “O indivíduo concreto sincreticamente apreendido” (ao
preço de um trabalho de construção do objeto da pesquisa)
“não existe como tal a não ser no espaço teórico das relações
de identidade e de diferença entre o conjunto explicitamente
definido de suas propriedades e dos conjuntos singulares de
propriedades definidas segundo os mesmos princípios, que
caracterizam a outros indivíduos” (BOURDIEU apud LENOIR,
2007: 100).
56. De acordo com Bourdieu, a sociologia deve construir espaços sociais e não
classes;
No interior dos espaços sociais devem ser recortadas as classes. Ou melhor, isolar
configurações de propriedades que formam unidades sociais relativamente
homogêneas;
Estas configurações não possuem existência a não ser no “papel” (mesmo que
estas divisões operadas na cabeça do sociólogo correspondam a divisões reais.);
Espaço social não possui existência em si mesmo. É um universo de posições
dependentes uma das outras e hierarquizadas através de várias dimensões. O
universo social é um conjunto de limites mais ou menos instituídos. A tarefa do
sociólogo é construir os princípios geradores que estão no fundamento destas
diferenças na objetividade e que podem variar conforme os lugares e momentos;
Ponto chave: quais são os critérios de estratificação? Quais os critérios para se
medir a posição social de um indivíduo?
Observações preliminares
Procedimentos para a análise dos espaços sociais
58. As análises de Bourdieu conduzem a destacar a divisão social em
classes:
Como observa Clóvis de Barros Filho(2002:46-7), obras como “Os herdeiros”,
“Amor à arte”, “Nobreza de Estado” “A distinção”, colocam “em evidência
uma repartição das práticas fortemente diferenciadas segundo a origem e
o pertencimento de classe.
Se nos fixarmos neste critério, observamos uma continuidade entre estas
análises e uma longa tradição anterior (Eugéne, Buret, Proudhon, Marx,
Sorel..) que nunca parou de repensar as práticas sociais a partir da
repartição dos agentes em classes sociais”.
3.1 Relação entre as práticas e a origem e pertencimento de classe
59. As representações dos agentes variam segundo sua posição (e os interesses que
estão associados a ela) e segundo seu habitus como sistema de esquemas de
percepção e apreciação, como estruturas cognitivas e avaliatórias que eles adquirem
através da experiência durável de uma posição do mundo social;
O habitus é ao mesmo tempo um sistema de esquemas de produção de práticas e
um sistema de esquemas de percepção e apreciação das práticas. E, nos dois casos,
suas operações exprimem a posição social em que foi construído.
(BOURDIEU,“Coisas Ditas”: 2004, 158-9)
3.1 Relação entre as práticas e a origem e pertencimento de classe
60. “Munidos da noção de espaço social, podemos recortar
classes no sentido lógico do termo. Ou seja, recortar
conjuntos de agentes que ocupam posições semelhantes no
espaço social e que, “colocados em condições semelhantes
e sujeitos a condicionamento semelhantes, têm com toda a
probabilidade, atitude e interesses semelhantes, logo,
práticas e ações semelhantes (Bourdieu, 2010: 136)”.
61. O modo de pensamento estrutural ou relacional (não se confunde com o
estruturalismo) ataca diretamente o modo de pensar substancialista (realista), cuja
forma mais freqüente é o “sujeito”, e também a “estrutura” que tende a ser reificada
sobre a forma, por exemplo, de grupos (como a família, entidade que existe na
natureza das coisas; ou as classes sociais que estão inscritas na lógica das coisas
econômicas)
“O modo de pensar substancialista, que é o do senso comum –e do racismo-- e que
leva a tratar as atividades ou preferências próprias a certos indivíduos ou a certos
grupos de uma certa sociedade, em um determinado momento, como
propriedades substanciais, inscritas de uma vez por todas em uma espécie de
essência biológica ou –o que não é melhor – cultural[...]” (BOURDIEU, 2011: 17)
Olhar relacional sobre as organizações sociais
3.2 Visão sistêmica contra interpretações “substancialistas”
62. O modo de pensamento estrutural ou relacional (não se confunde com o
estruturalismo) ataca diretamente o modo de pensar substancialista (realista), cuja
forma mais freqüente é o “sujeito”, e também a “estrutura” que tende a ser reificada
sobre a forma, por exemplo, de grupos (como a família, entidade que existe na
natureza das coisas; ou as classes sociais que estão inscritas na lógica das coisas
econômicas)
“O modo de pensar substancialista, que é o do senso comum –e do racismo-- e que
leva a tratar as atividades ou preferências próprias a certos indivíduos ou a certos
grupos de uma certa sociedade, em um determinado momento, como
propriedades substanciais, inscritas de uma vez por todas em uma espécie de
essência biológica ou –o que não é melhor – cultural[...]” (BOURDIEU, 2011: 17)
Olhar relacional sobre as organizações sociais
3.2 Visão sistêmica contra interpretações “substancialistas”
63. Leitura substancialista considera cada prática (por exemplo, a
prática do golfe) ou consumo (por exemplo, a cozinha chinesa) em si
mesmas e por si mesmas, independente do universo das práticas
intercambiáveis;
Leitura substancialista concebe a correspondência entre as
posições sociais (ou as classes) e os gostos ou as práticas numa
relação mecânica.
Análise relacional ilumina o caráter flexível e dinâmico das
relações entre posições sociais e as práticas.
Evita transformar uma prática (ou um conjunto de práticas)em
propriedades necessárias e intrínsecas de um grupo qualquer.
3.2 Visão sistêmica contra interpretações “substancialistas”
(BOURDIEU, “Razões Práticas”, 2011: 16)
64. 3.3 Propriedades de posição e propriedades de condição: a dialética da
distinção.
O problema para os sociólogos é o de classificar um objeto (sujeito) que
classifica. Donde a indagação fundamental: de onde vêm as classificações?;
A classe, segundo Bourdieu, existe na objetividade e em estado subjetivo,
porém em estado incorporado, em estado de esquemas práticos, de esquemas
inconscientes de classificação;
Corpos são instrumentos de classificação (ou melhor, de classes
incorporadas). Neste sentido, o habitus é um modo de existência da classe
social;
Desde o princípio de seus trabalhos Bourdieu criticou a compreensão
“realista” das classes sociais. Segundo o sociólogo, toda classe social deve
grande parte de suas propriedades à posição que ela ocupa na estrutura social.
Como uma parte no todo, cada classe recebe do sistema de relações com
outras classes uma parte de suas propriedades.
65. A força das proposições de tipo estrutural varia segundo a posição
das classes sociais. Esta define a margem deixada à propriedade de
posição.
Classe média: propriedades estão menos determinadas pela situação e
mais por sua posição entre classes dominantes e classes dominadas
(ocorre o inverso nos sub proletários)
A posição de um grupo na estrutura social não pode ser definido
somente a partir de um ponto de vista estritamente estático, pois o ponto
da trajetória, que toma um corte sincrônico, não contempla a questão
da trajetória social do grupo.
3.3 Propriedades de posição e propriedades de condição: a dialética da
distinção.
66. 3.3 Propriedades de posição e propriedades de condição: a dialética
da distinção.
Dinâmica das classes
O que comumente chamamos de distinção, uma certa qualidade,
“mais frequentemente considerada como inata (fala-se de “distinção
natural”) de porte e de maneiras, é de fato diferença, separação, traço
distintivo, resumindo, propriedade relacional que só existe em relação a
outras propriedades” (BOURDIEU, 2011: 18)
Ideia de diferença está fundamento da noção de espaço:
“conjunto de posições distintas e coexistentes, exteriores umas às outras,
definidas em relação às outras” (idem:18)
Por exemplo: “várias características dos membros da pequena
burguesia podem ser deduzidas do fato de que eles ocupam uma
posição intermediária entre duas posições extremas” (idem:19)
67. 4. Estruturação do espaço social: princípios de diferenciação e
a noção de capital em Bourdieu
68. Segundo Bourdieu, o que permite estruturar o
universo social é a posse de diferentes tipos de
capital. A posição dos agentes no espaço das
classes depende do volume e da estrutura de seu
capital
69. No espaço social as distâncias se medem em quantidade de capital. Define
proximidades e afinidades, distanciamentos e incompatibilidades. Em suma,
probabilidades de pertencer a grupos realmente unificados: famílias, clubes, ou
classes mobilizadas.
O espaço social se apresenta nas sociedades estratificadas como um
conjunto fortemente estruturado: os agentes estão provistos de propriedades
comuns e diferentes sistematicamente vinculadas entre elas. Para compreender seu
sentido, essas propriedades devem ser “classificadas” (no sentido de Durkheim),
reagrupadas segundo suas similaridades e suas diferenças em relação ao objeto
estudado.
Em a Distinção, cujo objeto é a contribuição dos efeitos da dominação
cultural nas relações sociais, a descrição se realiza aparentemente sobre os estilos
de vida, a práticas religiosas, as opiniões políticas, único meio empírico de marcar
as posições no espaço das posições de poder.
Topografia duplamente construída: eleição de variáveis e a maneira de tratá-
las. Análise das correspondências múltiplas calcula as “distâncias” entre os valores
das variáveis estabelecidas segundo os critérios definidos pelo sociólogo em função
de seu objeto.
Nas sociedades mais desenvolvidas dois princípios repartem os grupos em
função de sua posição na distribuição estatística. Os dois princípios entre os mais
eficientes são (embora não os únicos) o capital econômico e o capital cultural.
(“Coisas Ditas”, 2004:158-9)
70. Segundo os resultados da análise de correspondência, o espaço das classes sociais está
construído segundo três dimensões:
i. Volume global do capital
ii. Estrutura do capital: peso relativo das diferentes espécies de capital no volume
total de seu capital.
iii.Trajetória social: evolução no tempo do volume e da estrutura das espécies de
capital.
A estas posições no espaço social correspondem práticas que a análise dos dados permite
estabelecer, de modo que o espaço das posições se retraduz sob a forma de um espaço de
disposições incorporadas (de gostos, desejos, de afinidades, de bens possuídos).
A cada classe de propriedades está vinculado uma classe de habitus produzida pelas
condições e os signos sociais associados à condição correspondente.
4. Estruturação do espaço social: princípios de diferenciação e a noção de capital
em Bourdieu
71. Segundo Bourdieu, o habitus é o
princípio que dá conta da unidade de
estilo que une as práticas e os bens de
uma classe de agentes.
De modo que todos os agentes que se
encontram no interior desta classe
compartilham um conjunto de
propriedades que são preditivas de
numerosos comportamentos e opiniões.
72. .
À primeira análise, a noção de capital está ligada àa abordagem econômica. A
analogia se explica pelas propriedades reconhecidas do capital: ele se acumula por meio de
operações de investimento, transmite-se pela herança, permite extrair lucros segundo a
oportunidade que o seu detentor tiver de operar as aplicações mais rentáveis.
Estas características fazem dele um conceito heurístico e, como faz Bourdieu, seu uso não
é limitado apenas à área econômica. Bourdieu (2000).
O capital econômico é constituído “pelos diferentes fatores de produção (terras, fábricas,
trabalho) e pelo conjunto de bens econômicos: renda, patrimônio, bens materiais”
(BONNEWITZ, 2005: 53).
O capital cultural corresponde ao “conjunto das qualificações intelectuais produzidas
pelo sistema escolar ou transmitidas pela família”. Pode existir sobre três formas: “em estado
incorporado, como disposição duradoura do corpo (p. ex, a facilidade de expressão em
público); em estado objetivo, como bem cultural (a posse de quadros, de obras); em estado
institucionalizado, isto é, socialmente sancionado por instituições (como títulos acadêmicos)”
(idem: 54).
O capital simbólico “é uma propriedade qualquer (de qualquer tipo de capital, físico,
econômico, cultural, social), percebida pelos agentes sociais, cujas categorias de percepção
são tais que eles podem entendê-las (percebê-las) e reconhecê-las, atribuindo-lhes valor.
(BOURDIEU, 2011: 107)
A noção de capital
74. Uma das dimensões fundamentais da luta de classes é a luta de
classificações e re-classificações;
Habitus são diferenciados, mas enquanto poder estruturante são também
diferenciadores;
Agentes que lutam por se apropriar do mundo social buscando impor a
representação do mundo social mais conforme a seus interesses;
Objeto do livro “A distinção”: as classificações sociais como instrumentos
simbólicos das lutas sociais;
Diferenças entre posição e situação se transmutam em signos distintivos
(em distinções simbólicas). Lógica da estrutura social é a da distinção e das
lutas de classe a que estão associadas;
Cabe observar, porém, que as condições sociais de possibilidade de
transmutação simbólica das diferenças de posição e de situação de classe
variam segundo a posição que as classes mesmas ocupam no conjunto do
espaço social.
75. Estilos de vida
Representações do mundo social (de si mesmos e dos outros) se
traduzem em estilos de vida.
Práticas de consumo das diversas classes, dos diversos grupos,
manifestam as representações que eles tem do mundo social.
(representações que não se organizam de maneira
necessariamente conscientes)
Sistema adquirido de preferências, de princípios de visão e de
divisão: o que comumente chamamos de gosto.
76. “Em conseqüência, o babitus produz práticas e representações que estão disponíveis
para a classificação, que são objetivamente diferenciadas; mas elas só são
imediatamente percebidas enquanto tal por agentes que possuam o código, os
esquemas classificatórios necessários para compreender-Ihes o sentido social. Assim, o
babitus implica não apenas um sense of one´s place, mas também um sense of other's
place. Por exemplo, a propósito de uma roupa, de um móvel ou de um livro, nós
dizemos: "Isso é coisa de pequeno burguês", ou: "Isso é coisa de intelectual". [....] os
agentes se autoclassificam, eles mesmos se expõem à classificação ao escolherem, em
conformidade com seus gostos, diferentes atributos,roupas, alimentos, bebidas,
esportes, amigos, que combinam entre si e combinam com eles, ou, mais exatamente,
que convêm à sua posição. Mais exatamente: ao escolherem, no espaço dos bens e
serviços disponíveis, bens que ocupam nesse espaço uma posição homóloga à
posição que eles ocupam no espaço social. Isso faz com que nada classifique mais
uma pessoa do que suas classificações”
(Coisas Ditas, 2004: 158)
78. Munidos da noção de espaço social, podemos recortar classes no sentido lógico do
termo. Ou seja, recortar conjuntos de agentes que ocupam posições semelhantes no espaço
social e que, “colocados em condições semelhantes e sujeitos a condicionamento
semelhantes, têm com toda a probabilidade, atitude e interesses semelhantes”, logo, práticas
e ações semelhantes (Bourdieu, 2010: 136)
É preciso ressaltar que esta classe está situada no papel; na cabeça do pesquisador. É
uma classe que possui existência teórica.
Não é uma classe que possui estatuto de existência “em si”, independente do trabalho
teórico.
A existência desta classe teórica é a existência das teorias “enquanto produto de uma
classificação explicativa, perfeitamente semelhante à dos zoólogos ou dos botânicos”: ela
permite que o pesquisador explique e previna as práticas e as propriedades das coisas
classificadas – “e, entre outras, as das condutas de reunião em grupo”.
Sendo assim, a classe teórica não é realmente uma classe, no sentido de ser uma classe
atual e mobilizada. No sentido de um grupo mobilizado para a luta. Pode –se dizer que é uma
classe provável, “enquanto conjunto de agentes que oporá menos obstáculos objetivos às
ações de mobilização do que qualquer outro conjunto de agentes”
O efeito da teoria
79. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Betrand, 2010.
Razões Práticas. São Paulo: Papirus, 2011.
Coisas Ditas. São Paulo: Brasiliense, 2004
Meditações Pascalianas. Rio de janeiro: Bertrand, 2008.
A distinção. Crítica social do julgamento. Porto Alegre: Zouk,
20006.
O sociólogo e o historiador. (BOURDIEU, P & CHARTIER, R)
Belo Horizonte: Autêntica, 2011.
Obras de Bourdieu
Referências bibliográficas
80. BONNEWITZ, P. Primeiras lições sobre a sociologia de Pierre Bourdieu. Petrópolis: Vozes, 2005
BURREL, G., & MORGAN, G. Sociological Paradigms and Organizational Analysis Heinemann, 1979
FILHO, Clóvis de Barros. “A sociologia de Pierre Bourdieu e o campo da comunicação”: Uma proposta de
investigação teórica sobre a obra de Pierre Bourdieu e suas ligações conceituais e metodológicas com o
campo da comunicação. Tese de doutorado, Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São
Paulo, 2003. Tomo 1, Capítulo1.
LENOIR. Remi. “Espacio social y classes sociales” In. In CHAMPAGNE, P; PINTO, L ; SAPIRO, G . (dir.) Pierre
Bourdieu. Sociólogo. Buenos Aires: Nueva Visión, 2007
LOPES, Felipe Tavares Paes. “Bourdieu e Goffman: um ensaio sobre pontos comuns e as fissuras que unem e
separam ambos autores sob a perspectiva do primeiro”. in Estudos e pesquisas em psicologia UERJ, RJ, ano
9, n.2,p. 389-407. Segundo semestre de 2009.
SAPIRO, G. “Una libertad restringida. La formación de la teoría del habitus”. In CHAMPAGNE, P; PINTO, L ;
SAPIRO, G . (dir.) Pierre Bourdieu. Sociólogo. Buenos Aires: Nueva Visión, 2007.
WACQUANT, Loic. “Hacia una praxeologia social: la estructura y la lógica de la sociología de Bourdieu”. In
BOURDIEU, P & WACQUANT, L . Una invitación a la sociología reflexiva Buenos Aires: Siglo XXI, 2005.