Discurso de abertura do diretor-titular do Departamento de Infraestrutura (Deinfra) da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) no 7º Encontro Logística de Transportes, evento realizado pela Fiesp em parceria com a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), nos dias 21/05 e 22/05/2012.
Discurso Carlos Cavalcanti - Diretor do Deinfra da Fiesp - 7º Encontro Logística de Transportes
1. Discurso da sessão de abertura do
7o Encontro de Logística e
Transportes da Fiesp
21 05 2012
Carlos Cavalcanti, diretor-titular do Departamento de
Infraestrutura da Fiesp (Deinfra)
Senhoras e Senhores, bom dia. Agradeço a todos os presentes por
terem aceito o nosso convite para este Sétimo Encontro de Logística e
Transportes. Este encontro é uma iniciativa conjunta das federações de
indústria de São Paulo, a Fiesp e do Rio de Janeiro, a Firjan.
Nossos presidentes, Paulo Skaf e Eduardo Eugênio Gouvêa Vieira,
expressões maiores da liderança empresarial brasileira, lançaram uma
agenda comum, de grande importância, centrada nas áreas
de educação e infraestrutura. A Fiesp e a Firjan, em conjunto com
a Fundação Roberto Marinho e a Prefeitura do Rio de Janeiro, está
trabalhando em projeto de grande dimensão, intitulado “Humanidade
2012” para mostrar ao mundo durante a Rio+20, em um pavilhão
de arquitetura revolucionária no Forte de Copacabana, a
sustentabilidade do Brasil e da sua indústria.
Agradeço aos nossos presidentes, líderes das diretorias da Fiesp e da
Firjan, pelo empenho na organização deste encontro voltado para a
logística e os transportes, no Brasil e na América do Sul.
Agradeço especialmente, aos palestrantes e debatedores, mais de
noventa especialistas, que nos permitem tratar esse encontro
como uma referência para a infraestrutura no Brasil.
Agradeço aos nossos patrocinadores. Seu apoio é fundamental
para que essa oportunidade de debate, reflexão e troca de experiências
aconteça. Ao nosso corpo técnico, em especial aos meus colaboradores
no Departamento de Infraestrutura da Fiesp, agradeço o empenho com
que trabalharam, para oferecer a todos nós, um encontro de altíssima
1
2. qualidade técnica.
Cerca de um ano atrás, estávamos aqui reunidos, neste mesmo
espaço, nutrindo esperanças inerentes ao início de um novo governo do
Brasil. Gostaria de estar hoje, com todos vocês, celebrando avanços
concretos e conquistas importantes sobre questões apontadas no
Encontro passado. Gostaria, também, de ver os entes públicos
trabalhando de forma integrada, regidas por um planejamento
estratégico, reduzindo o custo logístico, e estimulando a
competitividade. No entanto, questões cruciais levantadas, aqui um ano
atrás, e soluções apresentadas, seguem pousadas em berço
esplêndido. Continuamos, senhoras e senhores, em uma espécie de
voo cego, encarando problemas complexos, sem estratégia e sem o
planejamento adequado.
O arranjo institucional do setor de transportes e logística no Brasil
precisa ser reformulado. Não podemos continuar com o processo
decisório pulverizado em três ministérios, várias secretarias,
e três agências reguladoras atuando dispersamente. É fundamental que
as instituições trabalhem de forma integrada e que ocorra a
implantação efetiva de um Sistema de Planejamento Estratégico
de longo prazo, estruturado de forma a proporcionar racionalidade nos
investimentos e na operação integrada dos diversos modais.
A FIESP apurou que os custos para o setor produtivo, decorrentes das
deficiências na infraestrutura logística do Brasil, correspondem a um
desperdício de 17 bilhões de reais por ano. Tamanha deficiência,
agravada ainda mais pela baixa integração dos modais,
fundamenta a pergunta, que pauta nosso evento:
?BRASIL: UM PAÍS SEM LOGÍSTICA?
Sem apresentar alternativas eficazes, o país sofre com a falta de uma
visão racional em relação ao sistema logístico integrado. ?Quando as
decisões sobre cada modal de transporte deixarão de ser tomadas
isoladamente? A multimodalidade está presente no Brasil de forma
intensa... nos discursos, e também em imensa quantidade de estudos e
2
3. diagnósticos.
Enquanto no Brasil se fala, em outros países do mundo se faz. Somos a
sexta maior economia mundial, a quinta maior extensão territorial,
a quinta maior população e temos o grande desafio de ocupar o papel
de celeiro do mundo na produção de alimentos nas próximas décadas.
Não dá mais para esperar, é hora de fazer. O nível de investimentos
em transportes, ainda corresponde a apenas 0,5% do PIB. Precisamos
multiplicar este número dez vezes, para pelo menos 5%, se quisermos
atingir os padrões dos países asiáticos. Contudo, não é razoável que a
ampliação dos investimentos neste segmento da economia ocorra com
predominância de recursos públicos. O Governo não deve ser gestor de
negócios ou de empreendimentos. Esse não é o melhor caminho para o
Brasil e tampouco o setor público tem capacidade financeira e de
gestão para bancar tal nível de investimentos. Cabe à iniciativa
privada, através de concessões, cumprir esse papel, alocando os
recursos necessários, trazendo inovações tecnológicas e modelos de
gestão eficiente.
A carga tributária no Brasil é imensa. Comprovadamente ela sabota
a competitividade de nossa economia. Assim, precisamos alertar
governos, e os políticos, que eles não podem pretender arrecadar
sempre mais. O Estado, dessa maneira, deveria focar sua atenção e
seu esforço onde não pode ser substituído. O estado deve atuar
como formulador de políticas públicas, planejador, regulador e
fiscalizador. Para que a atuação do Estado seja eficiente, o usuário não
pode deixar de estar inserido no processo de decisão e no
planejamento de todas essas instâncias. O usuário não pode ser
preterido, porque atendê-lo é a finalidade primordial na prestação
desses serviços. Para que o setor privado cumpra seu papel na
dimensão que o país precisa, são necessários aperfeiçoamentos
no marco regulatório do setor.
É imperativo que o Brasil simplifique o processo de licenciamento dos
empreendimentos, reduzindo a burocracia nas instâncias públicas. O
3
4. processo de decisão do licenciamento ambiental, por exemplo, apesar
de necessário, envolve uma quantidade muito grande de entidades,
que apresentam competências superpostas e atribuições pouco claras.
Por vezes, ações compensatórias e mitigadoras exigidas em
importantes projetos de infraestrutura pouco têm a ver com o meio
ambiente e atrasam ou mesmo inviabilizam os empreendimentos,
privando a sociedade de seus benefícios. O custo de não fazer
é o preço mais caro pago pela sociedade. O exemplo dos grandes
empreendimentos hidroelétricos da região amazônica, com projetos
aprovados após mais de uma década de sua previsão original,
podem nos servir de lição. Esse atraso obrigou o setor elétrico
a implantar mais de 10 mil Megawatts de termoelétricas a combustível
fóssil, quase a capacidade de uma Itaipu, para atender o crescimento
da demanda por energia. Certamente, o impacto ambiental e as
emissões de gases de efeito estufa decorrentes dos atrasos nesses
empreendimentos não foram considerados. Precisamos imprimir
maior qualidade aos nossos modelos de concessão de serviços públicos.
Os leilões que adotam a escolha do vencedor por maior pagamento de
outorga se transformam, na verdade, em instrumentos de arrecadação,
que oneram os custos dos serviços para o usuário.
A sociedade brasileira não suporta mais o ímpeto arrecadatório
compulsivo dos Governos. Este peso recai nas costas do cidadão
e inibe a competitividade do setor produtivo. Por isso, a FIESP tem se
posicionado firmemente a favor dos leilões por menor tarifa, e contra
os leilões por maior valor de outorga. Estudo elaborado pelo IPEA
demonstra que o critério de menor tarifa nas concessões de rodovias
é melhor para o usuário e para o país. As tarifas dos pedágios
cobrados em estradas federais concedidas entre 1995 e 1997,
tiveram o valor médio de R$ 9,86 por 100 quilômetros.
Já a tarifa média cobrada nas vias federais concedidas na segunda
etapa, de 2008 a 2009, quando o governo optou pelo modelo por
menor tarifa, foi de R$ 2,96 por 100 quilômetros, uma queda de 70%.
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5. O setor rodoviário é fundamental para a economia brasileira.
Mais de 60% das cargas brasileiras são transportadas por esse modal.
Entretanto, da malha total, apenas 14% são pavimentados e a maioria
do percurso apresenta condições insatisfatórias.
Ainda segundo o IPEA, o volume de investimentos necessário para a
expansão e adequação da malha rodoviária é da ordem de R$ 180
bilhões nos próximos cinco anos, ou seja, R$ 36 bilhões por ano.
O orçamento federal prevê um investimento de apenas R$ 11,8 bilhões
no exercício de 2012. Frente a tamanha necessidade de investimentos,
não se compreende por que as licitações de concessões de rodovias
não avançaram a partir de 2009. O governo federal, acertou ao definir
o modelo por menor tarifa nessas rodovias, mas erra ao sinalizar a
possibilidade de prorrogar o prazo das antigas concessões, com a
justificativa que as concessionárias assumirão investimentos em obras .
São cerca de 1.500 quilômetros de estradas concedidas na década de
90 com contratos que vencem nos próximos anos.
Salientamos que a tentativa de prorrogação situa-se, exatamente, nos
casos em que se verificam as tarifas mais altas.
Isto não é do interesse do Brasil. Isto é do interesse de autoridades
públicas a serviço de lobbies empresariais. A mesma tese equivocada
da prorrogação de concessões rodoviárias seduziu também o Governo
do Estado de São Paulo, que procura justificar esse vício arrecadatório
com a necessidade de novos investimentos e com uma possível
mudança do índice de reajustes. Os pedágios de São Paulo estão entre
os mais altos do mundo. Não é verdadeira a tese de que por esta razão
nossas rodovias tem padrão internacional. Dos 5500 km de rodovias
concessionadas em São Paulo, apenas 120 km foram construídos pelos
concessionários. Em São Paulo nos limitamos a fazer concessões de
obras prontas, cedendo a cobrança dos pedágios em troca da
manutenção de rodovias, que já eram excepcionais porque assim foram
construídas. A FIESP entende que qualquer prorrogação de contratos
de concessão é a pior solução para o país.
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6. Vencido seu prazo, a concessão deve ser novamente submetida aos
critérios de competição. Na verdade, não há justificativa digna para
qualquer prorrogação. Ela é custosa ao usuário, porque a tarifa é
definida exclusivamente entre autoridades do governo e
concessionários, sem nenhuma transparência, fugindo do processo de
livre concorrência. Mais que isso, esses contratos de concessão
refletem condições existentes em conjuntura econômica do passado,
quando, por exemplo, o risco país era muito mais elevado, o custo de
capital era maior, e a atratividade do Brasil era menor.
Um novo leilão, certamente, capturaria condições mais favoráveis
e mais atuais, que levariam a um contrato de concessão mais justo,
equilibrado e vantajoso para o usuário.
Senhor Ministro Wagner Bittencourt,
No setor aeroportuário, demos início à transferência da gestão de três
dos maiores aeroportos do Brasil à iniciativa privada, medida tardia,
porém acertada. O Brasil assistiu a enorme polêmica sobre como
chamar este processo, marcada por imensa desinformação e ideologia.
Não houve nenhuma privatização de aeroportos, e nem da Infraero.
A Constituição determina que os ativos aeroportuários são bens
inalienáveis do patrimônio público. Quem desejasse vender aeroportos
teria antes que reformar a Carta Magna. A cessão da gestão de bens da
União é temporária. É bobagem chamar de privatização a gestão
privada de bem público inalienável. Não houve venda de propriedade,
mas transferência precária da posse. Na Constituição e nas Leis
a distinção está estabelecida. Houve também grande confusão
quanto ao valor mínimo de outorga. Primeiro a ANAC divulgou seus
números. Eles foram fortemente corrigidos pelo TCU. O governo
teimou, reduziu os montantes do TCU, e publicou o edital.
No leilão o senhor mercado veio a público e deu seu veredito.
Guarulhos foi arrematado por R$ 16 bilhões, valor quase cinco vezes
maior que o edital. Comparado ao primeiro valor estabelecido pela
ANAC, o resultado foi sete vezes maior. Viracopos foi arrematado por
6
7. quase 4 bilhões, ou duas vezes e meia o valor final do Governo. Quanto
à primeira conta da ANAC, o valor foi sete vezes maior. Por Brasília
foram ofertados R$ 4,5 bilhões, oito vezes maior que o edital.
Comparado com o valor inicial da ANAC, R$ 75 milhões, o ágio foi
5.901%, valor quase 60 vezes maior. Para altas autoridades da
República, era necessário examinar a sanidade dos responsáveis pelos
lances. ?Teriam feito as contas direitinho? ?Eles têm capacidade
para desembolsar os altos valores das parcelas de outorga?
Gestores privados logo começaram revelar seus segredos.
O investimento previsto, calculado por parâmetro estatal, será
realizado por valor muito menor, de mercado. Há possibilidades
não consideradas pelos técnicos do governo de aumentar receitas
ampliando serviços, o número de passageiros e o volume de carga;
e ainda, margem para estressar custos operacionais.
Racionalidade do setor privado, não insanidade, garantiu tanto
entusiasmo ao leilão. O que está ratificado pelos lances dos demais
participantes, também superiores aos valores do edital.
É preciso apontar no caso dos aeroportos uma infeliz e grave mudança
na posição do Governo, ao adotar o critério do leilão oneroso. Ágio em
leilão faz a alegria apenas de governos, que deixam a conta para a
população pagar. Este erro deveria ser corrigido nos próximos leilões
de Confins e Galeão e também deveria ser adotado em concessões de
novos aeroportos, a serem construídos e operados pelo setor privado.
O Brasil assistiria, certamente, a exuberância do ágio ser substituída
pela racionalidade da modicidade tarifária. A tese de que é preciso
arrecadar nos aeroportos mais movimentados para investir nos de
menor tráfego, criando um novo fundo, mais outro, não comove nem
convence mais ninguém. Os gatos escaldados já pagam a maior carga
tributária do planeta, com encargos que, depois de criados, são
destinados a objetivos diferentes dos inicialmente estabelecidos.
O critério de menor tarifa nos leilões de concessão no Brasil, foi
introduzido em 2004 por Dilma Rousseff no setor elétrico, e
7
8. mais tarde nas rodovias. O Brasil ganhou com a introdução do regime
de menor tarifa, que reduz os preços dos serviços públicos, beneficia
toda a sociedade, e aumenta a competitividade da economia.
Ao contrário, o leilão oneroso repassa ágio às tarifas, privilegia apenas
a arrecadação do Estado, e aumenta o custo da produção no País.
Esta modelagem se faz necessária nos portos. O setor portuário
aguarda ansiosamente novo pacote de medidas que promova a
modernização e ampliação dos investimentos. Essas medidas irão
comtemplar: a renegociação dos contratos dos 16 portos delegados
pela União a Estados e municípios; a licitação de 98 terminais
existentes; e leilões de novos portos públicos.
A FIESP defende que o Governo Federal não ceda à tentação de
transformar os leilões do setor portuário em instrumento de
arrecadação. Isto seria mais um retrocesso lamentável, que não traria
nenhum benefício ao país. A necessidade de aumento da capacidade
dos portos coloca em evidência o grave problema da acessibilidade,
que compromete seu bom funcionamento. Sobretudo o porto de
Santos, para o qual grande parte das cargas é transportada por meio
do modal rodoviário, que atravessa a região metropolitana de São
Paulo e a Serra do Mar.
Outra questão relevante, é o regime de funcionamento ininterrupto dos
portos. Aqui estamos diante de absurdo gritante, que como a deliciosa
jabuticaba, só existe no berço esplêndido do Brasil. Depois do advento
da luz elétrica, nada justifica que comprometamos o funcionamento
da nossa infraestrutura ao por do Sol. Essa teimosia equivale a
restringirmos a utilização de rodovias, aeroportos e ferrovias apenas
aos dias ensolarados. Para que as instalações estejam disponíveis
24 horas, é necessário que os órgãos públicos como ANVISA,
Polícia Federal, Receita Federal, Ministério da Agricultura e todos os
demais agentes atuem em todos os turnos. Essa é a única forma de
atendermos ao crescimento da demanda sem a necessidade de
grandes investimentos em infraestrutura.
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9. O Brasil possui um grande potencial hidroviário. Há muito tempo se fala
na necessidade e na importância deste tipo de transporte no país;
entretanto, pouco se vê em relação ao seu desenvolvimento.
É preciso deixar de lado o discurso e promover ações efetivas para
ampliação dentro de um modelo de integração modal.
?Por que o sistema hidroviário não deslancha? ?O que fazer para que
isso ocorra? ?Quando as hidroelétricas serão projetadas com previsão
de eclusas?
Recentemente o DNIT anunciou que está trabalhando na formatação de
modelo para transferir à iniciativa privada a gestão de boa parte das
hidrovias. O setor privado será o responsável pelos investimentos
necessários para adequar os rios à navegação e pela operação e
manutenção. Esperamos que aqui não venham, os mesmos, atacar ou
celebrar a privatização dos rios. O DNIT tem uma excelente
oportunidade de surpreender positivamente criando um modelo de
concessão que promova racionalidade na integração das hidrovias
com outros modais, buscando modicidade tarifária. Com uma extensa
costa de 8 mil quilômetros, grande quantidade de portos, e a
movimentação de contêineres crescendo três a quatro vezes mais
rápido que o PIB nacional, seria lógico que a cabotagem figurasse
como um dos principais meios de transporte de carga no país.
O fato é que essa modalidade permanece em crescimento discreto,
o que não é aceitável. Com tais condições favoráveis, resta a pergunta:
?Cabotagem no Brasil: Quando? Já no modal ferroviário, a concessão
da operação, iniciada em 1996, cumpriu importante papel. Possibilitou
o restabelecimento dos investimentos, a recuperação da infraestrutura
e do material rodante, ambos em estado de completo abandono e
obsolescência.
Desde então o sistema aumentou a eficiência, e o volume de cargas
transportadas, que cresceu cerca de 60% nos últimos 15 anos.
Novas resoluções publicadas pela ANTT no ano passado abrem caminho
de maior clareza em relação aos direitos e deveres dos concessionários.
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10. Estas normas autorizam os investimentos de usuários investidores, por
meio da aquisição de trens próprios, expansão e modernização da
malha.
Além disso, as operações de direito de passagem e tráfego mútuo
foram regulamentadas, promovendo a competição, o que trará maior
competitividade. Apesar dessas modificações, o modal ferroviário segue
representando apenas 19,5% da carga movimentada no país. Em
países com dimensões continentais, esta participação situa-se entre 40
e 70%, demonstrando o quanto ainda precisa ser feito no Brasil.
Com a baixa participação dos modais hidroviário e ferroviário, a matriz
de transportes brasileira continua extremamente desequilibrada.
Quando olhamos o futuro, fica claro que este quadro precisa ser
alterado. O Brasil convive com um preço oculto no desenvolvimento de
sua infraestrutura: a corrupção.
Ela é tema constante do noticiário e razão do desprezo da população
pelos políticos e por parte do funcionalismo público, envolvidos em
escândalos. Há pouco mais de um mês, Paulo Skaf, presidente da Fiesp
e Eduardo Eugênio Gouvêa Vieira, presidente da Firjan, publicaram no
jornal O Globo, em 19 de abril, o artigo “Punição a corruptores”.
As duas lideranças empresariais do Brasil lancetaram a pústula da
corrupção. E os citamos: “a figura do corruptor é muitas vezes
encarada com indulgência.... o corrupto é alvo de pouca tolerância
e execração pública.... mas não é parte da cultura brasileira
o raciocínio óbvio de que não há corrupto sem corruptor.”
Como inicial e necessário ato de contrição vamos todos admitir aqui e
agora: o corruptor do funcionário público é sempre um empresário,
ou alguém em seu nome. Não somos corruptores, mas eles estão no
meio de nós. A banalidade da corrupção arrefeceu nossa fé nos
princípios da necessária moralidade dos atos da administração pública.
Assim, parece corriqueiro aceitar a corrupção nos negócios de governo
e nos negócios com os governos. Voltemos a Paulo Skaf e a Eduardo
Eugênio: “é inaceitável que um empresário.... não hesite em firmar
10
11. vínculos com agentes públicos para obter favores em concorrências
públicas. O argumento de que o achaque precedeu o ato da corrupção
não encontra mais eco numa sociedade que amadurece e consolida
o viés de estímulo à ética e à transparência no trato da coisa pública”.
Inexiste informação sistematizada, clara e transparente, dada a público
nos órgãos da administração direta, sobre malversação de recursos
públicos, apesar do expresso no caput do artigo 37 da Constituição
Federal que obriga os governos observar o princípio da publicidade dos
seus atos.
Saudamos, com muita esperança, a vigência em 16 de maio de 2012,
da Lei de Acesso à Informação. É possível que esta Lei, se suportada
por ampla mobilização cívica, transforme a qualidade do gasto do
dinheiro dos impostos pagos pela população ao setor público.
É possível que esta Lei acue corruptores e corrompidos e a liberdade
com que realizam seus negócios em prejuízo do Brasil e das gerações
futuras de brasileiros.
Em março de 2010, a Fiesp publicou o “Relatório Corrupção: custos
econômicos e propostas de combate”. Este estudo concluiu que o custo
médio da corrupção no Brasil situa-se entre 1,38% e 2,3% do PIB,
ou 41 bilhões de reais a 69 bilhões de reais. A atualização deste
estudo, com os números do PIB de 2010 resulta em custo estimado
de 51 bilhões de reais a 84 bilhões de reais. Comparando os valores de
2010 com as metas do PAC, para período 2007-2010, ao invés de
investirmos em corrupção, poderíamos aumentar em 24 milhões
as pessoas atendidas pelo programa Luz para Todos; ou prover
saneamento básico a mais 23 milhões de domicílios; ou construir 3
milhões de residências; ou construir mais 56 mil km de rodovias;
ou 13 mil quilômetros de ferrovias; ou 184 portos; ou, ainda, 277
aeroportos.
O Tribunal de Contas da União realiza importante trabalho de
prevenção à corrupção, ao analisar e reformar os editais de licitação
para compras, serviços, ou obras do governo federal. Analisando os
11
12. relatórios do TCU no período 2008 a 2011, o Tribunal foi responsável
por reduzir o preço máximo de contratação, nos editais de licitação
preparados por diversos órgãos da administração pública federal em
7,6 bilhões de reais. Além disso, o TCU fiscaliza os contratos celebrados
pelo Governo Federal. No mesmo período 2008 a 2011, o TCU reduziu
compulsoriamente 3,3 bilhões de reais destes contratos já em
andamento ou finalizados. O TCU aponta como principais
irregularidades detectadas nos editais ou contratos:
• Restrição ao caráter competitivo da licitação;
• Orçamento do Edital, Contrato ou Aditivo incompleto ou
inadequado;
• Projetos básicos deficientes;
• Impropriedades na execução orçamentária;
• Liquidação irregular da despesa;
• Pagamentos de serviços sem cobertura contratual;
• Sobre preço e superfaturamento de materiais e produtos.
Infelizmente, estas são práticas corriqueiras nas compras
governamentais no Brasil.
O Congresso Nacional instalou Comissão Parlamentar Mista de
Inquérito, baseada em investigações da Polícia Federal, para apurar a
relação entre deputados, senadores, governadores, e outros políticos,
com notório empreendedor, do ramo da contravenção, por meio de
conluios que fraudavam licitações para o favorecimento de uma
empreiteira de obras públicas.
É importante salientar que os ilícitos cometidos por esta empreiteira
já eram do conhecimento da administração federal. Especula-se sobre a
iminente declaração de inidoneidade da Delta Construções, nos
próximos dias. Estamos atrasados. Perdemos tempo e dinheiro da
sociedade, já que as irregularidades descritas pela CGU, em 2011,
ultrapassam as condições para que a autoridade pública agisse com
maior presteza e responsabilidade, inclusive, na suspensão da
execução dos contratos. Na divulgação de análise de 60 contratos
12
13. considerados irregulares, no montante total de 632 milhões de reais,
estabelecidos entre a Delta e o Governo Federal, a CGU elenca
irregularidades que moldam a imagem colhida pelos órgãos de
fiscalização sobre a qualidade dos serviços da Delta e suas práticas.
Nas palavras destes relatórios foram apontadas as seguintes situações:
Superfaturamento, sobreposição de objeto contratual,
execução de obra com baixa qualidade e em desacordo com as
especificações,
pagamentos por serviços não executados,
pagamentos por serviços mal executados,
trincas, afundamentos laterais, remendos mal feitos ao longo da
rodovia,
falta de aferição dos quantitativos medidos,
pagamento de serventes para realização de trabalhos sob a
responsabilidade de outra empresa,
desníveis entre a pista e o acostamento,
divergência entre o quantitativo informado na medição e o
verificado em loco,
pagamento de serviços sem a respectiva discriminação em
planilhas de medição,
trilhas de roda e escorregamento da camada asfáltica,
pagamentos de serviços inexistentes, em duplicidade, em
quantitativos maiores que o executado,
pagamentos de serviços com qualidade insatisfatória e em
desacordo com especificações e normas técnicas,
inclusão de serviços semelhantes com alteração de preços
unitários.
Uma pergunta que não quer calar: ?quem, em sã consciência,
contrataria para obras em sua casa um empreiteiro que tivesse tido
este tipo de comportamento, reiterado ao longo de anos?
Ainda assim, o volume de contratos com esta empreiteira cresceu de
forma constante e vertiginosa no período analisado pela CGU.
13
14. Os sucessivos escândalos envolvendo o Ministério dos Transportes,
o DNIT, outras empresas estatais, apontam para o seguinte: alguns
dos órgãos responsáveis pelo desenvolvimento da infraestrutura de
transportes do Brasil foram usados como máquinas promotoras e
indutoras de corrupção. É preciso que o Brasil dê um basta a esta
situação. Por isso, a Fiesp e a Firjan estão trabalhando pela aprovação
do PL 6.826, que responsabiliza pessoas jurídicas por atos praticados
contra a administração pública. Para separar o joio do trigo e para que
o justo não pague pelo malfeitor, voltando às palavras dos presidentes
Paulo Skaf e Eduardo Eugênio: “o empresário deve celebrar o projeto
que banirá... os que não reúnem atributos morais para figurar entre
seus pares e que....provocam, em sua ação nefasta, uma concorrência
desleal ao empresário que respeita a Lei e a Constituição de seu país.
Não se trata de moralismo, e sim de levantar a bandeira de uma
sociedade transparente na política e na esfera privada”.
Nós empresários temos que transformar em mandamento as palavras
de Paulo Skaf e Gouvêa Vieira: “a punição severa e exemplar à figura
do corruptor... é passo essencial para mostrar que é possível
compatibilizar política e moral no Brasil”.
A corrupção que nos atinge está concentrada nas compras
governamentais. Dos serviços e dos produtos. E nas obras públicas.
No setor de infraestrutura, podemos eliminar a oportunidade da
corrupção, se optarmos menos pela obra executada pelo setor público.
Aqui, voltamos ao tema das concessões à iniciativa privada.
Quando o modelo é o da menor tarifa do serviço, aí sim se coloca a
oportunidade do combate à corrupção. Nos setores onde este sistema é
aplicado, como bem sabemos, o concessionário disputa a oportunidade
comercial com seus pares de leilão baseado no menor preço.
O Brasil tem observado deságios da ordem de 60%, no setor elétrico,
no trecho leste do rodoanel em São Paulo e no pedágio de rodovias
federais. Amarrado a uma expectativa de fluxo de caixa menor em
função do preço vencedor, o novo concessionário assume também
14
15. a gestão dos investimentos elencados no edital e no contrato de
concessão.
Esta é a oportunidade para que o preço de realização de obras e o
custo de gestão na prestação de serviços seja submetido à lógica
vigente no setor privado. O concessionário passa a administrar
a construção da obra e a gestão de sua empresa concessionária
buscando eficiência, reduzindo gastos.
Neste modelo, não há espaço para o acerto de sobre preço, não há
espaço para obras mal executadas, não há espaço para o descaso com
o dinheiro, entre funcionário público corrompido e empreiteiro
corruptor, ambos mediados por políticos sem ética.
Temos assistido a greves de trabalhadores em empreendimentos
concessionados por menor tarifa. Podemos creditar a elas a ação de
empresários no limite da gestão de gastos. Nestes casos, a greve
é ação oportuna e democrática dos sindicatos de trabalhadores
contrapondo-se a condições de trabalho desfavoráveis.
Para o Brasil, é melhor assistir o exagero da gestão empresarial,
limitada e afrontada pela ação dos sindicatos de trabalhadores,
que a ação nefasta de corruptores e corrompidos.
Desejo dois dias de trabalhos profícuos e que este Encontro
seja proveitoso para todos.
Obrigado
15