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Elísio Estanque*
Jornal PÚBLICO, 20.03.2013
Elites, líderes e revoluções
Elites e líderes são sem dúvida os protagonistas centrais das modernas
sociedades democráticas. Mas a perspetiva com que são concebidos depende sempre
do modo como nos posicionamos em relação à vida política, à sociedade e à mudança.
Ultimamente, a propósito da contestação que a classe política e as instituições vêm
sofrendo, com o divórcio e a desconfiança crescente por parte dos cidadãos, têm-se
repetido as críticas aos partidos e os apelos para uma mudança radical do sistema
político. Serão esses protestos, movimentos, manifestos e críticas realmente
excessivos e populistas como alguns afirmam? O que se pode dizer, a este propósito,
da atual situação das elites e lideranças políticas em Portugal?
Para responder a tais perguntas é necessário clarificar o papel das elites, das
lideranças e da mudança sociopolítica em democracia (sobretudo quando ela está em
perigo). As elites são decisivas para qualquer sistema social, pelo que, defender a sua
função não é ser “elitista”, principalmente se soubermos distinguir entre as elites
instaladas e as elites renovadoras. Enquanto as primeiras contestam o que chamam
populismo para justificarem a sua cultura partidária, as segundas são empreendedoras
e trabalham para prevenir os perigos que o sistema enfrenta, mostrando ao povo qual é
o rumo a seguir, estando assim legitimadas para se preservarem no poder (inclusive
através do voto). Já os profissionais do aparelhismo (que seguem a lógica dos
instalados) jamais saem dos horizontes do “partidismo” e não entendem que as
reformas de que falam hoje deveriam ter sido feitas há vinte anos atrás, quando
estavam ocupados e iniciar a sua carreira.
Numa democracia madura, onde funcionem os metabolismos entre
representantes e representados, entre instituições, partidos e cidadãos o sistema
democrático tende a regenerar-se periodicamente e consegue apetrechar-se de
autodefesas e capacidade homeostática para se defender dos vírus mortíferos que hoje
atacam as democracias (corrupção, submissão do poder político e dos recursos
públicos aos interesses privados, tráfico de influências, populismo e eleitoralismo,
manipulação, demagogia, etc, etc). Num tal cenário, a elite consegue prevenir males
maiores porque as lideranças cumprem o seu papel de motores da transformação e do
progresso, velando pelo futuro e bem-estar dos seus concidadãos. Esse é o papel da
elite democrática não-elitista que prepara a sua própria renovação intergeracional. Ora,
em Portugal estamos no extremo oposto, com uma democracia exausta e uma classe
política incapaz de a resgatar do abismo para onde foi empurrada (aliás, pelos mesmos
que vociferam contra quem critica as perversões da democracia).
No processo de renovação das elites, os líderes de hoje serão a elite de amanhã,
mas só as grandes ruturas podem produzir grandes líderes. O líder é aquele que
personifica a vontade popular, mas que a orienta na direção certa e que tem na sua
mente um horizonte de médio ou longo prazo. Enquanto o líder da mudança é popular
sem ser populista, o dirigente populista usa apenas o taticismo com o único fito de
alcançar o poder, isto é, pensa mais no próximo ato eleitoral do que na próxima
geração. Quem hoje ocupa os lugares de topo da política nacional não teve de arriscar
praticamente nada no seu passado, não precisou de romper com nada de substancial,
de adquirir a experiência e o endurance necessários ou mostrar dotes de especial
coragem e audácia. As suas trajetórias de ascensão foram desenhadas a régua e
esquadro nos aparelhos, onde aprenderam a fazer política e a gerir lealdades e redes
de influência. A maioria, até mesmo a doutrina política convencional desconhece. É
provável que os líderes de amanhã estejam hoje entre aqueles ativistas anónimos dos
movimentos que contestam o poder e querem refundar o sistema democrático para
construir uma sociedade melhor. São eles que podem obrigar a ruturas estruturais de
novo tipo.
Na situação de bloqueio e encurralados como estamos, ou há uma rendição geral,
ou alguma faísca pode atear o fogo da revolução. Isto não é um apelo, mas uma
advertência. A reforma ou mudança incremental seria a resposta adequada, mas para
isso teríamos de ter elites e líderes que imprimissem eficácia e poder reformista às
instituições. O historiador americano Charles Tilly dizia que há três condições em que
se pode falar de revolução: (1) quando existem fortes discrepâncias entre o que o
poder exige dos seus cidadãos e o que é capaz de os fazer cumprir; (2) quando os
governos confrontam os seus cidadãos com exigências que ameaçam a sua identidade
coletiva; e (3) quando o poder dos governos claramente diminui face à força crescente
dos seus adversários. Pergunta-se: qual delas é que não se verifica hoje em Portugal?
__
* Investigador do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra;
Professor visitante da UNICAMP – Campinas, Brasil.

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Elites, lideres e revoluções

  • 1. Elísio Estanque* Jornal PÚBLICO, 20.03.2013 Elites, líderes e revoluções Elites e líderes são sem dúvida os protagonistas centrais das modernas sociedades democráticas. Mas a perspetiva com que são concebidos depende sempre do modo como nos posicionamos em relação à vida política, à sociedade e à mudança. Ultimamente, a propósito da contestação que a classe política e as instituições vêm sofrendo, com o divórcio e a desconfiança crescente por parte dos cidadãos, têm-se repetido as críticas aos partidos e os apelos para uma mudança radical do sistema político. Serão esses protestos, movimentos, manifestos e críticas realmente excessivos e populistas como alguns afirmam? O que se pode dizer, a este propósito, da atual situação das elites e lideranças políticas em Portugal? Para responder a tais perguntas é necessário clarificar o papel das elites, das lideranças e da mudança sociopolítica em democracia (sobretudo quando ela está em perigo). As elites são decisivas para qualquer sistema social, pelo que, defender a sua função não é ser “elitista”, principalmente se soubermos distinguir entre as elites instaladas e as elites renovadoras. Enquanto as primeiras contestam o que chamam populismo para justificarem a sua cultura partidária, as segundas são empreendedoras e trabalham para prevenir os perigos que o sistema enfrenta, mostrando ao povo qual é o rumo a seguir, estando assim legitimadas para se preservarem no poder (inclusive através do voto). Já os profissionais do aparelhismo (que seguem a lógica dos instalados) jamais saem dos horizontes do “partidismo” e não entendem que as reformas de que falam hoje deveriam ter sido feitas há vinte anos atrás, quando estavam ocupados e iniciar a sua carreira. Numa democracia madura, onde funcionem os metabolismos entre representantes e representados, entre instituições, partidos e cidadãos o sistema democrático tende a regenerar-se periodicamente e consegue apetrechar-se de autodefesas e capacidade homeostática para se defender dos vírus mortíferos que hoje atacam as democracias (corrupção, submissão do poder político e dos recursos públicos aos interesses privados, tráfico de influências, populismo e eleitoralismo, manipulação, demagogia, etc, etc). Num tal cenário, a elite consegue prevenir males maiores porque as lideranças cumprem o seu papel de motores da transformação e do
  • 2. progresso, velando pelo futuro e bem-estar dos seus concidadãos. Esse é o papel da elite democrática não-elitista que prepara a sua própria renovação intergeracional. Ora, em Portugal estamos no extremo oposto, com uma democracia exausta e uma classe política incapaz de a resgatar do abismo para onde foi empurrada (aliás, pelos mesmos que vociferam contra quem critica as perversões da democracia). No processo de renovação das elites, os líderes de hoje serão a elite de amanhã, mas só as grandes ruturas podem produzir grandes líderes. O líder é aquele que personifica a vontade popular, mas que a orienta na direção certa e que tem na sua mente um horizonte de médio ou longo prazo. Enquanto o líder da mudança é popular sem ser populista, o dirigente populista usa apenas o taticismo com o único fito de alcançar o poder, isto é, pensa mais no próximo ato eleitoral do que na próxima geração. Quem hoje ocupa os lugares de topo da política nacional não teve de arriscar praticamente nada no seu passado, não precisou de romper com nada de substancial, de adquirir a experiência e o endurance necessários ou mostrar dotes de especial coragem e audácia. As suas trajetórias de ascensão foram desenhadas a régua e esquadro nos aparelhos, onde aprenderam a fazer política e a gerir lealdades e redes de influência. A maioria, até mesmo a doutrina política convencional desconhece. É provável que os líderes de amanhã estejam hoje entre aqueles ativistas anónimos dos movimentos que contestam o poder e querem refundar o sistema democrático para construir uma sociedade melhor. São eles que podem obrigar a ruturas estruturais de novo tipo. Na situação de bloqueio e encurralados como estamos, ou há uma rendição geral, ou alguma faísca pode atear o fogo da revolução. Isto não é um apelo, mas uma advertência. A reforma ou mudança incremental seria a resposta adequada, mas para isso teríamos de ter elites e líderes que imprimissem eficácia e poder reformista às instituições. O historiador americano Charles Tilly dizia que há três condições em que se pode falar de revolução: (1) quando existem fortes discrepâncias entre o que o poder exige dos seus cidadãos e o que é capaz de os fazer cumprir; (2) quando os governos confrontam os seus cidadãos com exigências que ameaçam a sua identidade coletiva; e (3) quando o poder dos governos claramente diminui face à força crescente dos seus adversários. Pergunta-se: qual delas é que não se verifica hoje em Portugal? __ * Investigador do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra; Professor visitante da UNICAMP – Campinas, Brasil.