O Ministério Público moveu uma ação civil pública contra o presidente da Câmara Municipal de Passos Maia e outros por transferirem a sede da Câmara para um imóvel de propriedade do candidato derrotado na eleição, sem licitação. A juíza concedeu liminar suspendendo o contrato e decretando a indisponibilidade de bens do presidente da Câmara até R$ 24.219,30.
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Liminar - Ação civil pública e de improbidade - Passos Maia - Câmara
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Conforme consulta realizada ao sítio eletrônico:
<http://www.passosmaia.sc.gov.br/uploads/580/arquivos/21096_Lei_Organica_do_Municipio_de_Passos_Maia.Pdf>
Autos n° 051.14.000830-7
Ação: Ação Civil Pública/Lei Especial
Autor: Ministério Público Estadual
Réu: Ademir Pasquali e outros
DECISÃO
O Ministério Público propôs a presente ação civil pública cumulada com
improbidade administrativa em face de ADEMIR PASQUALI, CÂMARA DE VEREADORES DO
MUNICÍPIO DE PASSOS MAIA e VANDERLEI DALBOSCO, todos qualificados.
Narra na inicial em 2012 a sede da Câmara Municipal de Passos Maia
localizava-se em imóvel pertencente a João Listoni e que Vanderlei Dalbosco, Presidente da
Câmara, transferiu a sede para imóvel pertencente a Ademir Pasquali, realizando gastos
desnecessários para os cofres públicos no importe de R$ 24.219,30 (vinte e quatro mil e duzentos
e dezenove mil e trinta reais). Refere que isso se deu por razões políticas, pois o primeiro imóvel
pertence ao pai do vice-prefeito, adversário político, enquanto o segundo é de propriedade do
candidato derrotado na eleição para prefeito municipal e que integra a mesma agremiação
partidária do Presidente da Câmara. Afirma que a dispensa de licitação foi ilegal, pois não se
aplica a vedação contida no art. 92 da Lei Orgânica Municipal e havia ao menos dois imóveis
aptos a participar do certame. Conclui aduzindo que houve ofensa aos princípios da
Administração Pública, causando prejuízo ao Erário, que encontra tipificação na Lei de
Improbidade Administrativa. Requerer liminarmente: (i) a suspensão do contrato administrativo de
aluguel para o ano de 2013 e do termo aditivo para o ano de 2014, bem como dos respectivos
pagamentos; (iii) a decretação da indisponibilidade de bens do requerido Vanderlei Dalbosco, por
meio do sistema BACENJUD, no limite do prejuízo até o momento apurado.
Juntados documentos.
É o breve relato.
DECIDO.
Da leitura da inicial e documentos que a instruem fica claro que a Câmara
Municipal de Passos Maia esteve instalada nos anos de 2011 e 2012 no prédio pertencente a
João Listoni (contratos das fls. 71-78), os quais também foram realizados com dispensa de
licitação. Conforme prevê o último instrumento contratual (art. 1º, § único, fl. 76), o prazo da
locação, em 02 de janeiro de 2012, era de doze meses.
Com a assunção no cargo de Presidente da Câmara de Vanderlei Dalbosco
foi determinada a dispensa de licitação (fls. 50-55) e firmado em 10 de janeiro de 2013 contrato
com Ademir Pasqualli para locação de uma sala comercial (fls. 56-58) pelo prazo de um ano,
período que foi renovado, sem reajuste do locativo, para o ano em curso (fl. 97).
Da justificativa da fl. 53 extrai-se que o administrador amparou seu ato no
art. 24, inc. X, da Lei 8.666/93 e no art. 92 da Lei Orgânica do Município de Passos Maia.
O art. 24, inc. X, da Lei 8.666/93 autoriza a dispensa de licitação quando o
imóvel a ser locado deva ser escolhido tendo em vista suas características e localização para
atendimento das finalidades a que se destina.
De outro lado, o art. 92 da Lei Orgânica do Município de Passos Maia está
assim vazado1
:
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2. Art. 92. O Prefeito, Vice-Prefeito, e Secretários, e as pessoas ligadas a
qualquer deles por matrimônio ou união estável não poderão contratar com o
Município.
Parágrafo único. Não se incluem nesta proibição os contratos cujas cláusulas
e condições sejam uniformes para todos os interessados e mediante licitação
pública.
Do que consta nos autos emerge claro que havia no mínimo dois imóveis
aptos a receber a sede da Câmara de Vereadores: a antiga sede, pertencente a João Listoni, e a
atual, pertencente a Ademir Pasquali.
De outro lado, o afastamento do imóvel pertencente a João Listoni, tendo em
vista seu parentesco com o vice-prefeito, não encontra respaldo na Lei Orgânica do Município,
que não impede a contratação com genitor do vice-prefeito e, muito menos, quando possível a
realização de licitação.
É sabido que o código de processo civil, em seu art. 798, atribui ao juiz poder
geral de cautela, autorizando-o a determinar as medidas provisórias necessária a garantir a
utilidade do processo, desde que presentes os requisitos do periculum in mora e do fumus boni
iuris.Preleciona Hugo Nigro Mazzilli:
"Não apenas nos processos de natureza cautelar, mas em qualquer ação civil
pública ou coletiva, ou no mandado de segurança coletivo, em tese será
possível a concessão de mandado liminar. Assim, graças ao sistema peculiar
do processo coletivo, não é mister ajuizamento de ação cautelar para pedir-se
uma liminar; em qualquer ação de índole coletiva, pode o juiz conceder
liminar, se lhe for requerida. Desde que presentes os pressupostos gerais de
cautela, o juiz poderá conceder mandado liminar, com ou sem justificação
prévia nas ações civis públicas. [...] E quais são os pressupostos gerais de
cautela- São o fumus boni juris e o periculum in mora [...]." (A Defesa dos
Interesses Difusos em Juízo. 26 ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 555).
O fumus boni iuris configura-se como a probabilidade da existência do direito
invocado pelo autor e o periculum in mora como o risco de inutilidade do processo principal em
decorrência do transcurso do tempo, analisados tais pressupostos à luz de cognição prévia e
incompleta (Neste sentido: GRECO Filho, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. v. III. 10 ed.
São Paulo: Saraiva, 1995. p. 153/154).
No caso em apreço, os documentos amealhados aos autos permitem inferir, em
sede de cognição sumária, que havia possibilidade de competição para escolha do imóvel a ser
locado para sediar o Poder Legislativo de Passos Maia e que a dispensa não observou os
parâmetro legais.
Configurado, assim, o requisito fumus boni juris.
Por outro vértice, a eficácia do provimento final ficará comprometida caso não
seja adotada medida para cessar a eficácia do contrato em curso, devendo-se acautelar o Erário
no tocante aos pagamentos a serem realizados tendo em vista o questionamento da legalidade da
contratação, pois a anulação do procedimento licitatório conduz à anulação do respectivo contrato
e gera efeitos retroativos, cabendo indenização ao contratado apenas com relação a atos que não
lhe sejam imputáveis (art. 49 c/c art. 59, ambos da Lei 8.666/93).
No que tange ao pedido de indisponibilidade, tenho que também merece
acolhimento.
O Ministério Público aponta na inicial que houve gastos para reforma do prédio
para o qual transferida a sede da Câmara Municipal no valor de R$ 21.103,30 (vinte e um mil e
cento e três reais e trinta centavos), além do valor pago pelo locativo da sala antiga durante a
reforma, no valor de R$ 1.244,00 (um mil e duzentos e quarenta e quatro reais), o que totaliza R$
24.219,30 (vinte e quatro mil e duzentos e trinta reais).
Demonstrado em um juízo sumário de cognição a plausibilidade da tese de que
a dispensa de licitação para contratação do imóvel a ser locado foi ilegal e demonstrado
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3. suficientemente que realizados gastos para adaptação do novo espaço, deve ser deferida medida
acautelatória para reservar patrimônio para o pagamento de eventual indenização aos cofres
públicos.
A respeito dos requisitos para deferimento da medida, colaciono:
PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA.INDISPONIBILIDADE DE BENS. DESNECESSIDADE DE
PERICULUM IN MORA CONCRETO. FUMUS BONI IURIS DEMONSTRADO.
CONSTRIÇÃO PATRIMONIAL PROPORCIONAL À LESÃO E AO
ENRIQUECIMENTO ILÍCITO RESPECTIVO.1. A jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça tem-se alinhado no sentido da desnecessidade de prova
de periculum in mora concreto, ou seja, de que o réu estaria dilapidando seu
patrimônio, ou na iminência de fazê-lo, exigindo-se apenas a demonstração
de fumus boni iuris, consistente em fundados indícios da prática de atos de
improbidade. No memso sentido: REsp 1319515/ES, Rel. Ministro Napoleão
Nunes Maia Filho, Rel. p/ Acórdão Ministro Mauro Campbell Marques,
Primeira Seção, julgado em 22/08/2012, DJe 21/09/2012.2. A
indisponibilidade dos bens deve recair sobre o patrimônio dos réus de modo
suficiente a garantir o integral ressarcimento de eventual prejuízo ao erário,
levando-se em consideração, ainda, o valor de possível multa civil como
sanção autônoma que venha a ser aplicada.Agravo regimental parcialmente
provido.(AgRg no REsp 1414569/BA, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS,
SEGUNDA TURMA, julgado em 06/05/2014, DJe 13/05/2014)
Tendo em vista que o montante do patrimônio que deverá ser reservado para
acautelar este processo, entendo que a constrição de valores por meio do BACENJUD mostra-se
inadequada. Primeiro, porque pouco provável que a parte disponha desse volume de recursos
disponível; segundo, porque há concreta possibilidade de que valores constritados insiram-se em
hipótese de impenhorabilidade.
De outro lado, o valor é estimado, de modo que a inserção da indisponibilidade
em imóvel do réu mostra-se meio mais eficaz de atender aos fins da medida.
Ante o exposto, DEFIRO o pedido liminar formulado na inicial para:
a) SUSPENDER a vigência do contrato administrativo n. 001/2013, firmado
entre a Câmara Municipal de Passos Maia e Ademir Pasquali, bem como do aditivo a ele
vinculado, cujo objeto é a locação do imóvel localizado na Rua Pedro Bresciani, n. 1.079, esquina
com Avenida Antonio Cancelli, Centro, Município de Passos Maia.
Os locativos a vencer deverão ser depositados em conta vinculada ao processo.
A Câmara Municipal deverá no prazo de 30 (trinta) dias informar as providências
adotadas diante da suspensão da vigência do contrato.
b) DECRETAR a indisponibilidade de bens de Vanderlei Dalbosco, até o
montante de R$ 24.219,30 (vinte e quatro mil e duzentos e trinta reais).
Oficie-se ao Cartório de Registro de Imóveis de Ponte Serrada para averbação
da medida na matrícula de imóvel pertencente ao réu, encaminhando ao Juízo cópia.
Notifiquem-se os requeridos na forma do art. 17, §7º, da Lei 8.429/92.
Notifique-se o Município para intervir, querendo.
Intimem-se.
Ponte Serrada (SC), 23 de junho de 2014.
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4. Angélica Fassini
Juíza de Direito
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