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BADOU KOFFI ROBERT
Comunicação política via internet nas eleições
presidenciais da Costa do Marfim
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
Escola de Comunicação e Artes
Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo
Curso de Especialização em Marketing Político e Propaganda
Eleitoral
São Paulo
2012
BADOU KOFFI ROBERT
Comunicação política via Internet nas eleições
presidenciais da Costa do Marfim
Monografia apresentada à Banca Examinadora da
Universidade de São Paulo, como exigência parcial
para obtenção do título de Especialista em Marketing
Político e Propaganda Eleitoral, sob a orientação da
Profa. Dra. Katia Saisi.
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
Escola de Comunicação e Artes
Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo
Curso de Especialização em Marketing Político e Propaganda
Eleitoral
São Paulo
2012
DEDICATÓRIA
Ao meu filho Yannick, por ter nascido e trazido tanto amor e tanta alegria à
minha vida.
À mãe Marie, minha força.
À Michele, minha esposa, minha companheira e amiga.
Aos meus irmãos e irmãs: Yvette, Arsène, Roméo, Sylvana, Marie-Thérèse e
Lewis. A luta continua.
Ao meu pai e amigo.
AGRADECIMENTOS
Ao Prof. Dr. Ivan Santos Barbosa que me deu a oportunidade de cursar esta
especialização que muito contribuiu para o meu crescimento científico e
intelectual. Muito aprendi e continuo aprendendo. O meu agradecimento será
eterno.
À Profa. Dra. Katia Saisi. Obrigado pelo apoio, pela paciência e compreensão.
Sou-lhe muito grato pelas palavras incentivadoras que me levaram a
conclusão deste trabalho.
À Sueli pela sua dedicação no trabalho. Pela ajuda acadêmica e apoio moral
que recebi em momentos difíceis.
A todo o corpo docente do curso pelas aulas ministradas.
Aos professores da Banca, por terem aceitado avaliar o meu trabalho.
Eu sempre soube que dava para vencer a campanha
do referendo. Bastaria que deixassem a gente fazer
bem-feito, sem interferências, sem palpites, sem
“achômetros”, que a vitória estaria inevitavelmente ao
nosso alcance. (SANTA RITA, 2008: 33).
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................. 11
2 TRAJETÓRIA HISTÓRICA, SOCIOPOLÍTICA E ECONÔMICA .................. 16
2.1. O PROCESSO DE POVOAMENTO DA COSTA DO MARFIM...................18
2.2. MIGRAÇÕES E DIVERSIDADE SOCIAL.................................................. 22
2.3. TRAJETÓRIA SOCIOPOLÍTICA ............................................................... 23
2.3.1. LUTA PELO PODER E CRONOLOGIA DOS ACONTECIMENTOS...... 25
2.3.2. O CONCEITO DE IVOIRITÉ .................................................................. 27
2.4. CRONOLOGIA DE UMA CRISE: DE 2002 A 2010 ................................... 28
2.5. CONTEXTO SOCIOECONOMICO: DA PROSPERIDADE A CRISE
ECONOMICA ................................................................................................... 30
3. O SISTEMA POLÍTICO-PARTIDÁRIO E AVANÇOS DEMOCRÁTICOS.... 36
3.1. PODERES E PLURALISMO POLÍTICO.................................................... 36
3.2. O PODER EXECUTIVO ............................................................................ 37
3.3. O PODER LEGISLATIVO.......................................................................... 39
3.4. O PROCESSO ELEITORAL MARFINENSE ............................................. 40
3.4.1. AS INSTITUIÇÕES RESPONSÁVEIS PELAS ELEIÇÕES NA COSTA DO
MARFIM ........................................................................................................... 41
3.4.1.1. A COMISSÃO ELEITORAL INDEPENDENTE .................................... 41
3.4.1.2. O CONSELHO CONSTITUCIONAL.................................................... 42
4. AS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS DE 2010 E A CRISE PÓS-ELEITORAL. 43
5. COMUNICAÇÃO POLÍTICA E INTERNET.................................................. 51
5.1. A INTERNET E O ESPAÇO PÚBLICO MARFINENSE............................. 52
5.2. DADOS QUANTITATIVOS E QUALITATIVOS ......................................... 53
6. A COMUNICAÇÃO POLÍTICA VIA INTERNET........................................... 55
6.1. OS SITES.................................................................................................. 55
6.2. OS BLOGS, CHAT E GRUPOS DE DISCUSSÃO .................................... 59
7. A COMUNICAÇÃO POLÍTICA E A INTERNET NAS ELEIÇÕES DE 2010 60
7.1. O CONTEUDO DOS SITES...................................................................... 60
7.1.1. MILITANTES E ELEITORES COMO INTERNAUTAS............................ 61
7.1.2. OS LINKS............................................................................................... 63
8. BALANÇO E PERSPECTIVAS ................................................................... 65
8.1. BALANÇO DA INTERNET NAS ELEIÇÕES DE 2010 .............................. 65
8.1.1. INFORMAR EM VEZ DE COMUNICAR................................................. 66
8.1.1.1. UMA ADAPTAÇÃO DIFÍCIL................................................................ 67
8.1.1.2. DIFICULDADES LIGADAS À WEB ..................................................... 68
8.2. INICIATIVAS POSITIVAS A REFORÇAR ................................................. 70
8.3. PERSPECTIVA ......................................................................................... 72
8.3.1. RENOVAÇÃO POLÍTICA E COMPROMISSO COMUNICACIONAL ..... 72
8.3.2. O EXEMPLO AMERICANO.................................................................... 74
9. CONCLUSÃO .............................................................................................. 77
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................ 79
ANEXOS .......................................................................................................... 82
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CEI: Comissão Eleitoral Independente
FN : Forces Nouvelles
FPI : Front Populaire Ivoirien
PDCI : Parti Démocratique de Côte d’Ivoire
RDR : Rassemblement des Républicains
RGPH : Recensement Général de la Population et de l’Habitat
RESUMO
Ao contrário do que se pode imaginar com relação ao ambiente político no
continente africano, e principalmente na Costa do Marfim, caracterizado pelo
contexto antidemocrático, a comunicação política vem se desenvolvendo e teve nos
últimos anos um crescimento bastante significativo. Ela sempre se fez a partir de
modelos americanos e europeus e principalmente franceses. Hoje com o amplo
crescimento das novas tecnologias de comunicação no país, as eleições
presidenciais de 2010 não poderiam acontecer sem o uso da Internet. É, portanto
importante refletir sobre o seu uso adequado ou não durante as eleições,
apresentando o quadro em que ele serviu de ferramenta para a comunicação
política, fazendo um balanço e desenhando possíveis perspectivas para eleições
futuras.
Palavras-chaves: Comunicação Política, Internet, Eleições 2010, Costa do Marfim.
ABSTRACT
Despite of what is thought regarding the political environment in the African
continent, and mainly at Ivory Coast, characterized by the anti-democratic context,
the political communication is being developed and had a very significant growth in
the last years. It was always made from American and European models and mainly
the French model. Today, with the wide growth of new communication technologies
in the country, the 2010 presidential elections could not happen without the use of
the Internet. Therefore, it is important to reflect about its appropriate use or not during
the elections, presenting the image that was used as tool for the political
communication, making an assessment and drawing possible perspectives for future
elections.
Key Words: Political Communication, Internet, 2010 Elections, Ivory Coast.
1. INTRODUÇÃO
A Internet, nova ferramenta de comunicação, oferece novas oportunidades,
mas também impõe novas exigências. Parece, portanto interessante marcar um
tempo para analisar as mudanças radicais devido ao seu aparecimento - na Costa
do Marfim e principalmente a sua entrada no cenário político e no processo eleitoral
marfinense.
Os termos do tema “Comunicação política, Internet e eleições presidenciais
na Costa do Marfim” merecem uma explicação detalhada. Pois analisados de
maneira separada, é fácil entender cada um dos termos. Portanto trata-se de saber
como os políticos marfinenses comunicaram na Internet durante as eleições de
2010, no contexto de crescimento dessa nova ferramenta de comunicação. Será o
uso da Internet para fins de comunicacionais no período eleitoral foi adequado,
eficiente? Quais seriam os motivos para este uso sabendo que há poucos usuários
desta ferramenta no país? Resumindo, como é que os protagonistas do cenário
político marfinense entenderam a Internet, e a sua importância para a comunicação
política no processo eleitoral de 2010?
Após esses esclarecimentos iniciais, cabe definir o campo de estudo deste
trabalho.
Entendemos como protagonistas do cenário político, os candidatos a
presidente da república e seus respectivos partidos, assim como os militantes e
eleitores e cidadãos marfinenses. Afinal, os eleitores e cidadãos constituem os alvos
da comunicação política clássica. Com a Internet, um número crescente de cidadãos
tornam-se atores políticos, tendo os meios de expressões diversificados e potentes.
Há evidentemente outros protagonistas do cenário político que poderiam
também encontrar seu lugar neste estudo: trata-se de fato das instituições do estado
tai qual, a Assembleia Legislativa, o conselho Constitucional, mas a referência a eles
será breve e constará apenas na primeira parte do nosso trabalho quando falaremos
do ambiente político marfinense. É preciso salientar o fato que a comunicação
destas instituições mesmo política, não se encaixa naquela feita por partidos
políticos e seus candidatos durante as eleições, por ela não ser partidária. A
comunicação destas instituições continua política, pois o trabalho delas diz respeito
à gestão da sociedade no sentido amplo do termo com atividades como a publicação
de leis, emendas, decisões judiciais etc. Esta comunicação não pode ser partidária,
embora as leis e outras emendas publicadas sejam o resultado dos trabalhos e da
votação de eleitos destas instituições, que agem conforme as suas próprias
convicções e aspirações.
Além disso, analisar a comunicação destas instituições via Internet seria
abandonar a ideia principal que é pensar o uso da Internet durante a campanha
presidencial de 2010. E dizer também que, além da instituição dirigida pelo primeiro
ministro, não há outra instituição marfinense presente na Internet. Portanto, não
haveria como avaliar o uso que elas fariam.
No que se refere a internet, há debates importantes que se opõem: os que
acreditam que a internet seria uma nova mídia de massa, e outros que acham que é
apenas uma mídia elitista, isto é, não como um meio de informação de primeira mão,
mas um meio utilizado para levar fatos e argumentos suplementares a um público
alfabetizado e sensibilizado. No entanto, é evidente que para a internet se tornar um
novo espaço de reivindicações e de ativismo político, é necessário que seja
acessível a todos. Isso nos leva a questionar a estrutura da Internet e sua finalidade.
A internet teria a mesma estrutura que as mídias tradicionais sob uma forma, ou a
internet seria uma mídia de tipo diferente, mais orientada para a era da comunicação
e participação, e não uma mera informação? Outra hipótese apresentada é que a
internet seria uma nova mídia, devido ao seu surgimento e desenvolvimento
relativamente recentes, mas também pela sua própria natureza e as questões que a
rede suscita em nível mundial.
Para nós, não há debate possível sobre o fato de a internet ser uma nova
mídia, e é mesmo essa novidade que caduca o debate que opõe os que acham que
é uma mídia elitista e aqueles que a consideram uma mídia de massa. E como
qualquer novidade, ela nasce elitista: o equipamento necessário para ter acesso e
os preços da assinatura – que desde o seu surgimento no mercado tem caído de
maneira progressiva – somado as dificuldades da aprendizagem e do uso da
informática não foram fora de alcance para muitos usuários potenciais. Mas com o
passar do tempo, seu uso está começando a se espalhar, se já não se espalhou, e
se tornará um meio de comunicação de massa. É o que confirma a maioria das
pesquisas feitas a este respeito sobre o número e a qualidade dos internautas. No
caso da Costa do Marfim falaremos dos últimos números apresentados por agências
especializadas. Para nós, não há sombra de dúvidas, a internet é mesmo uma mídia
de massa e não se pode negligenciar a sua importância em uma comunicação
política. É esse posicionamento que teremos ao decorrer do no nosso trabalho.
Com base apenas nas realidades do uso da web pelos políticos, podemos
pensar que o uso mais ou menos recente desta mídia e, especialmente, a sua
democratização, chamaram a atenção dos políticos em geral. Nestas circunstâncias,
é compreensível entender porque os políticos marfinenses e principalmente os
candidatos às eleições presidenciais, seus respectivos partidos, os militantes e
eleitores invadiram a rede para torná-la um palanque eletrônico durante as eleições.
As eleições de 2010 deram um espaço significativo para a internet. E mesmo quase
um ano e meio após as eleições a tendência é acreditar que a comunicação política
via web não existe apenas no período eleitoral. Talvez por causa da crise pós-
eleitoral que viveu o país, a vontade de querer comunicar e dar a sua versão dos
acontecimentos continua levando os marfinenses a usarem a web como nunca
antes.
Infelizmente, o empenho notável dos partidos e políticos no palanque
eletrônico durante as eleições nos leva a acreditar que a comunicação política via
web é feita apenas para o período eleitoral. A maioria dos partidos e candidatos
criaram sites para a campanha e logo após as eleições estes sites desapareceram. .
Pelo menos os dois principais candidatos objeto da análise na segunda parte do
nosso trabalho, tentam provar o contrário: o primeiro, o economista Alassane
Ouattara, atual presidente, continua na web por motivo de imagem e o segundo, o
ex-presidente Laurent Gbagbo, um dos ilustres detentos do tribunal penal
internacional continua na rede, por motivo de resistência e luta pela sua liberdade.
A Costa do Marfim, conforme veremos na primeira parte do trabalho, é um
país jovem apenas 52 anos como país independente, vive uma crise econômica e
sociopolítica desde os anos 80 e a partir da década de 90, essa crise se amplificou
com diversas questões em torno da identidade marfinense. Faremos num primeiro
momento uma apresentação do país, retraçando a sua trajetória histórica,
econômica e sociopolítica, para depois falar da crise no país e principalmente e o
seu auge com as eleições de 2010.
Na segunda parte do nosso trabalho, falaremos do uso da internet nas
eleições de 2010. Analisaremos de maneira concreta como ela foi utilizada pelos
dois principais candidatos durante e após as eleições. Num primeiro momento, a
análise tratará dos conteúdos dos sites e páginas nas redes sociais dos dois
candidatos. Num segundo momento, o trabalho focará o balanço e perspectivas
sobre o desenvolvimento e as evoluções da comunicação política na Costa do
Marfim.
Por fim, diremos que as eleições presidenciais de 2010 foram revolucionárias
neste país “terceiro-mundista”. Notamos um grande avanço no cenário político
marfinense, com práticas comunicacionais semelhantes às dos países
desenvolvidos. A importante presença dos candidatos na rede, transformando-a no
palanque eletrônico. Também os diferentes debates entre candidatos na TV e
principalmente o debate entre o Alassane Ouattara e o Laurent Gbagbo na véspera
da eleição, foram determinantes para o país. Isso demonstra o quão importante é a
comunicação política. Se não há dúvidas quanto ao uso desta comunicação na
arena política marfinense, a novidade das últimas eleições com o uso da internet
consolida de fato o avanço no “fazer política” na Costa do marfim. As análises, a
partir do quinto item, feitas sobre o uso da internet durante todo o processo eleitoral,
provaram que apesar da queda da comunicação política via website observada após
este período, esta ferramenta de comunicação veio para ocupar espaço e influenciar
a relação entre partidos políticos, candidatos e eleitores, cidadãos que como
internautas se tornaram hoje verdadeiros cabos eleitorais .
2. TRAJETÓRIA, HISTÓRICA, SOCIOPOLÍTICA E ECONÔMICA
A Costa do Marfim, “ex-colônia” francesa, assim como a maioria dos países
africanos conforme estatísticas oficiais, tem uma diversidade de grupos étnicos que
se aproxima dos 63. Já nos anos 1840, a Costa do Marfim era dominada pela
França. Por volta dos anos 1888, se tornou protetorado, e foi estabelecida como
colônia autônoma em 1893. Nessa época, ainda não se falava em autoridade
central. O poder político era mantido por chefias tradicionais e tribos, sem ligações
nenhumas entre eles. O passado colonial comum a esses povos teria como
consequência o surgimento de uma consciência nacional que se manifestou de
forma prática através de diversas ações de luta pela emancipação.
A vontade de se libertar da colonização levou de fato a calar todas as
adversidades e singularidades étnicas, tribais e/ou regionais de maneira a conquistar
a independência. Vale lembrar que este processo não é único e nem específico a
Costa do Marfim, pois os países africanos em geral, e os francófonos em particular
tiveram o mesmo processo de povoamento com a colonização e também o mesmo
processo de “descolonização”.
Após a independência, ressurgirão a questão da diversidade cultural e das
singularidades étnicas, tribais e regionais. Além das divergências étnicas, o
ambiente político foi norteado por uma clivagem correspondente às regiões
geográficas Sul-Norte, zonas florestais e zonas de savanas. Outro fato importante é
a questão do nacionalismo, da cidadania e da construção da nação que levantaram
paixões.
Diversos movimentos de defesas dos interesses dos autóctones da Costa do
Marfim começam a ocupar o espaço sociopolítico antes e depois da colonização,
para protestar contra o fato de cidadãos de outros países como Senegal, Benin, Mali
ou ainda o Togo ocuparem lugares importantes na administração e nos empregos
públicos. Os protestos e lutas contra esta situação alcançaram níveis significativos
nos campos econômicos e sociais e desencadeavam, às vezes, em conflitos graves
no campo político. Neste contexto, podemos citar como exemplos os
acontecimentos dos anos 1958, com uma violenta repressão, da parte de
populações marfinenses contra cidadãos do Benin e do Togo, e 1966, de maneira
pacífica, através do parlamento, quando Félix Houphouet-Boigny1
propôs à
Assembléia legislativa um projeto de lei que autorizaria os cidadãos da África do
oeste a adquirirem a dupla cidadania. A partir daí, poderíamos dizer que a questão
do nacionalismo, no seu aspecto mais radical que envolve o afastamento dos
estrangeiros e no questionamento daquilo que poderia os levar a se tornar
“verdadeiros” cidadãos, é e permanece fato recorrente da história colonial e pós-
colonial da Costa do Marfim e de outros países africanos.
Isso pode se notar com a política de ivoirização2
do funcionalismo público nos
meados dos anos 70.
Também nos anos 1990, com a retirada do direito de voto para os
estrangeiros, e em 1994 com o advento da política da “Ivoirité”, criado pelo regime
do presidente Aimé Henry Konan Bedié3
. Esta questão do nacionalismo mantida
pelos governos posteriores destaca o problema da nacionalidade e a partir daí a
1
(1905-1993) Foi o primeiro presidente da Costa do Marfim. Dirigiu o país de 1960 a 1993.
2
Entender o termo como um quadro em que se criavam condições para que cargos importantes da
administração sejam ocupados por marfinenses em vez de estrangeiros africanos ou cooperantes
europeus.
3
(1934 -) Foi o segundo presidente da Costa do Marfim. Dirigiu o país de final de 1993 a dezembro
de 1999, quando perdeu o poder por golpe de estado.
definição da identidade nacional na Costa do Marfim e os direitos e prerrogativas a
ela se reportam.
2.1 O PROCESSO DE POVOAMENTO DA COSTA DO MARFIM
A Costa do Marfim é um país da África Ocidental, com uma área total de
322,463 km ². Assim como muitos outros países do continente e até do mundo, tem
a migração como a sua principal fonte de povoamento. As diferentes migrações de
populações relatadas pela história incluem deslocamentos, voluntários ou
involuntários, de populações ou indivíduos, de uma área geográfica para outra.
O país viveu entre os séculos XIV e XVIII, deslocamentos significativos de
populações vindas do Norte, do Leste e do Oeste, que formam hoje o núcleo de
seus habitantes. Essas diferentes ondas de migração acabarão criando no século
XIX no território nacional, quatro grandes áreas étnico-culturais, incluindo países
vizinhos e outros países da África Ocidental, como a Serra Leoa, a Guiné Bissau e o
Togo. Essa diversidade cultural faz da Costa do Marfim um país em que vivem
cidadãos oriundos de toda a África Ocidental.
Assim, essas quatro grandes áreas,
cada uma constituída por uma multiplicidade de grupos étnicos e tribos, localizam-se
no país da seguinte forma4:
4
Representação étnica na Costa do Marfim, Fonte: RGPH, 1998
 O grupo Mandê: localizado no noroeste do país também conhecido como os
Mandinga, inclui principalmente duas entidades. Os antigos Mandês,
chamados de Mandês do Sul: Iacuba, Guro, Gagu, etc, ocuparam a região
das montanhas no oeste do país, e os novos Mandês que vieram depois,
chamados Mandê do Norte: Malinkê, Gbin, Koiaka, instalados no Norte e
Nordeste.
 O grupo Kru: no Centro-sul e no Sudoeste residem os Kru ou Magwê.
 O grupo Gur (Voltaico): no Norte e Nordeste, é composto pelos Senufo, Lobi,
Tagbanan, Djimini etc.
 O grupo Akan: localizados no leste, no centro e sudeste. Este grupo pode ser
dividido em Akan do Centro (principalmente os Baulê), em Akan do leste
(Agni, Abron, etc ...) e Akan do sudeste e litoral (Ebriê, Aburê, Adiukru,
Apoloniens, Abidji, abey etc.).
A esta diversidade étnica e cultural acrescenta-se uma diversidade religiosa.
Existem duas religiões dominantes na Costa do Marfim, que são: o Islamismo com
mais de 38% da população total e o cristianismo (católico, protestantes com mais de
32% da população total, e mais 11% de animistas5
. No entanto, estas duas primeiras
religiões dominam a esfera religiosa marfinense, de grupo étnico para outro. Esta
configuração da paisagem religiosa reflete a história da penetração das religiões
monoteístas na Costa do Marfim. A penetração da religião muçulmana se deu a
partir do norte e a do cristianismo a partir do litoral com a chegada dos
colonizadores. Assim, os Akan e os Kru ocupando o centro, leste e sudeste são
5
Fonte : INS, RGPH 1998.
predominantemente cristãos, enquanto os Mandê e os Gur (Voltaicos) instalados no
norte e nordeste são fortemente islamizados6.
A história do povoamento da Costa do Marfim mostra as fontes da
configuração sócio-demográfica atual do país. Dada a importância das migrações
internas e externas, a sociedade marfinense apresenta um quadro demográfico
complexo que evidencia diversas comunidades étnicas e religiosas.
O debate político que envolve a definição da identidade nacional marfinense
alimenta-se também desse complexo demográfico. De fato, se a questão da
imigração não é novidade nenhuma na Costa do Marfim, a manipulação política é
porém mais recente.
Ela nunca deixou de alimentar o debate público.
6
Idem
2.2 MIGRAÇÕES E DIVERSIDADE SOCIAL
A questão das migrações estrangeiras, que é uma das fontes de conflitos na
Costa do Marfim, está ligada à política colonial de abertura para o exterior
desenvolvido como plataforma de desenvolvimento econômico da colônia. De fato,
com suas predisposições naturais, a Costa do Marfim tem ocupado uma posição
privilegiada no aprovisionamento da metrópole no que diz respeito às matérias-
primas agrícolas e industriais. Além do café e do cacau, a colônia dispunha de
espécies de árvores como o Sipo e o Samba. Com uma população estimada em
1.532,000 habitantes em 1921 e 1.931.000 em 1936 (Dados do PNUD 1999), a
Costa do Marfim não poderia fornecer a mão de obra suficiente de quê dependia a
metrópole para as suas atividades econômicas na colônia. A imigração na Costa do
Marfim tinha-se tornado desde então como uma necessidade. Será o resultado de
um ato deliberado da administração colonial. Entre os anos 1940 e 1959, mais de
600.000 voltaicos (originários do atual Burkina Faso) foram levados para Costa do
Marfim7.
Boa parte destas populações vindas do país vizinho foi estabelecida em
regiões do sudoeste.
Vale portanto lembrar que os fluxos migratórios e os seus motivos, durante a
época colonial foram essencialmente econômicos, após a independência, as
migrações de trabalho tiveram um caráter ultra-liberal, que se intensificou devido ao
boom econômico dos anos 1970. Com mais de Mais de três milhões em 1988, a
população estrangeira alcançou quatro milhões dez anos mais tarde, seja 26,03% da
7
Idem
população total estimada em 15.366.672 conforme a publicação do CI-RGPH
(Censo Geral da População e da Habitação)8
de 1998.
2.3. TRAJETÓRIA SOCIOPOLÍTICA
Desde a sua independência em 1960, a Costa do Marfim foi reconhecida pela
sua estabilidade política e pela sua prosperidade sócio-econômica, sob a liderança
de seu primeiro presidente, Felix Houphouet-Boigny, que dirigiu o país durante de
1960 a 1993.
Félix Houphouet-Boigny
Durante essa época o país atraiu grandes contingentes de trabalhadores
estrangeiros, sobretudo de países vizinhos, assim como investidores. Após a morte
do presidente Houphouet-Boigny em 7 de dezembro de 1993, a Costa do Marfim
teve uma sucessão difícil. Desde então, ela mergulhou em uma luta sem fim pelo
8
Versão original: « Recensement Général de la Population et de l’Habitat en Côte d’ivoire ».
Tradução própria.
poder, que degenerou em uma grave instabilidade política, e culminou em 1999 em
um golpe, e uma rebelião armada em setembro de 2002.
Ocupada desde 1960 pelo PDCI9
, o partido no poder, a esfera política do país
abriu-se em 1990 para o multipartidarismo. Nasce naquele ano o FPI dirigido pelo
Professor universitário Laurent Gbagbo.
Laurent Koudou Gbagbo
Neste mesmo ano, o país conhecia as suas primeiras eleições presidenciais
que opôseram o presidente Félix Houphouet-Boigny ao então Professor universitário
Laurent Gbagbo. Houphouet-Boigny foi reeleito em 28 de outubro de 1990, com 82%
dos votos. Mas morreu um ano depois e assim se iniciava a corrida pelo poder.
9
PDCI – Parti Démocratique de Côte d´ivoire. Tradução : Partido Democrático da Costa do Marfim
2.3.1 LUTA PELO PODER E CRONOLOGIA DOS ACONTECIMENTOS
Após a morte de Félix Houphouet-Boigny, a luta pelo poder é exacerbado
pelas controvérsias sobre as leis da nacionalidade e da elegibilidade nas eleições, e
principalmente às presidenciais.
Conforme os requisitos do artigo 11 da constituição do país modificada 1990,
o então presidente da Câmara Legislativa, Aimé Henry Konan Bédié tomou posse
como presidente da república.
Aimé Henry Konan Bédié
O economista Alassane Ouattara, então primeiro-ministro10
, também
interessado no poder, renunciou ao cargo.
10
Primeiro-ministro, entender chefe da casa civil no Brasil
Alassane Dramane Ouattara
Em 1994, surge o RDR11
. O cenário político é logo ocupado por três
personalidades: Bédié (presidente da República, PDCI), Gbagbo (FPI) e Ouattara
(RDR).
Esta luta pelo poder levou o Bédié a abrir o debate em torno da questão da
nacionalidade e da elegibilidade nas eleições, e às presidenciais em particular.
Nasce então o conceito de Ivoirieté, que será tratado no item a seguir. Um novo
código eleitoral é adotado em 08 de dezembro de 1994. Em 1995, Bedié foi eleito
presidente da República da Costa do Marfim, após eleições contestadas. Em 24 de
dezembro de 1999, ele sofreu um golpe de estado militar. Foi deposto e assim, o
General de exército aposentado, o Robert Guéi assumiu o poder. O general Robert
Guéi, responsável pela transição militar e por organizar eleições gerais no final de
2000, recoloca na mesa de debates a questão sobre a nacionalidade e a
elegibilidade.
11
RDR – Rassemblement des Républicains – Tradução : União dos Republicanos
Em 24 de julho de 2000, a nova Constituição aprovada por referendo prevê
que o candidato nas eleições presidenciais, “deve ser marfinense de pai e de mãe
também marfinenses de origem e não deverá ter pegado outra cidadania12
”. Esta
nova constituição, de fato, elimina o candidato do RDR, Alassane Ouattara, cujo pai
é de origem burkinabé. Após eleições tumultuadas, o Laurent Gbagbo é eleito
presidente da República e toma posse em 26 de outubro de 2000. De acordo com as
ações de seu programa de governo, ele estabelece a identificação como uma das
prioridades de maneira a resolver a crise identitária no país.
No entanto, esta política de identificação baseada na idéia de autoctonia
torna-se fonte de novas controvérsias e polêmicas, tanto na sociedade como na
esfera política.
2.3.2 O CONCEITO DE IVOIRITÉ
Considerado o principal motivo da crise identitária na Costa do Marfim, o
termo ivoirité nasceu em 1974, em um artigo do jornalista marfinense Pierre
Niava13
, que tratava da vida e obra do pensador e escritor marfinense Niangoranh
Porquet. De acordo com esse artigo, o conceito de ivoirité não é conceito xenófobo,
mas sim parte do movimento de libertação intelectual em paralelo com o movimento
da Negritude de Leopold Sedar Senghor. De fato, se a “independência” de muitos
países africanos, nos anos sessenta, foi adquirida a partir de um ponto de vista
político, dever-se-ia lutar por uma independência do ponto de vista, cultural,
filosófico, intelectual etc. Assim, o conceito em si, “seria multiforme e englobaria a
12
Versão original: doit être ivoirien de père et de mère eux-mêmes ivoiriens et qu’il ne doit pas s’être
prévalu d’une autre nationalité. Tradução própria.
13
http://ressources-cla.univ-fcomte.fr/gerflint/Afriqueouest3/boa.pdf
dinâmica socioeconômica, o triunfo multicultural, o pensamento do Homem
marfinense em toda a sua profundidade”14
. O conceito tornar-se-ia sinônimo da
afirmação da sua própria identidade, levando em conta a multiplicidade das
diferentes características que fundam a identidade marfinense. O termo, conforme o
seu inventor, leva em conta a diversidade que constitui a riqueza da sociedade
marfinense, incluindo as contribuições de diversas culturas. Seria de maneira
resumida o jeito marfinense de ser e de viver.
Assim, o conceito supostamente cultural, deslizará rapidamente na esfera
política com o presidente Bédié. O uso do conceito no âmbito político, sem aporte
teórico significativo e sem mudanças conceituais, acaba provocando novos atritos e
polêmicas. O conceito foi direcionado, de fato, para questionar e levantar dúvidas
sobre a nacionalidade e a elegibilidade do economista Alassane Ouattara, que seria
o candidato do RDR para as eleições de 1995.
O uso do termo desempenhou um papel importante na deterioração das
relações entre populações do Norte e do Sul ou ainda entre muçulmanos e cristãos
na Costa do Marfim. Assim, as reformas políticas e jurídicas empreendidas pelo
presidente Bedié não tiveram sucesso perante a população, e levantavam dúvidas
sobre o seu uso na esfera política em comparação com as características culturais e
sociais conforme a definição acima mencionada.
2.3 CRONOLOGIA DE UMA CRISE: DE 2002 A 2010
Em setembro de 2002, uma tentativa de golpe de estado que fracassou,
acabou levando o país para uma situação de guerra que opôs as Forças Armadas
14
Idem. Tradução Própria
Nacionais da Côte d'Ivoire (FANCI) favoráveis ao ex-presidente Laurent Gbagbo,
que controlavam o sul, aos rebeldes chamados Forces Nouvelles (FN) que vieram
do país vizinho Burkina Faso e que controlavam o norte e parte do centro da Costa
do Marfim.
Um processo de paz foi iniciado desde os acordos de Linas-Marcoussis15
, em
janeiro de 2003, e depois várias cidades e capitais africanas foram visitadas em
busca de acordos que pudessem trazer de volta a estabilidade política que
conheceu a Costa do Marfim até os anos 90. Entre outras capitais visitadas, temos
Lomé, Acra, Pretória, onde vários acordos foram assinados por ambas as partes. Em
geral esses acordos traziam em comum, pontos tal qual, a partilha do poder e uma
reforma do código da nacionalidade. Vale lembrar que as principais reivindicações
dos rebeldes traziam de fato a questão da nacionalidade e da elegibilidade do
Alassane Ouattara. A esfera política marfinense apresentava desde então uma
configuração. Por um lado, as "Forces Nouvelles" e os partidos como RDR, PDCI e
outros nanicos que, desde os acordos de Marcoussis passaram a exigir a aplicação
destes e de outro lado, o campo presidencial e aqueles que rejeitavam os ditos
acordos.
Esse contexto complexo e confuso, em que não havia paz nem guerra, levou
à adoção de diversas resoluções da parte das Nações Unidas, e acabaram também
não surtindo efeito. Em 2007, com a situação de bloqueio após as diferentes
negociações, o então presidente da Costa do Marfim resolveu iniciar negociações
diretas com os rebeldes, sob a mediação do presidente do Burkina Faso. Essas
negociações levaram a novos acordos de paz, chamados acordos de Uagadugu, em
4 de março de 2007. Após estes acordos, o Guillaume Kigbafori Soro, chefe da
15
Cidade do sul da França.
rebelião se tornou primeiro ministro e tinha como missão reunificar o país e resolver
a questão da identificação da população marfinense e organizar eleições justas,
transparentes e abertas a todos.
Guillaume Kigbafori Soro
Nestes acordos, constava também o desarmamento dos rebeldes e das
milícias.
2.5. CONTEXTO SOCIOECONOMICO: DA PROSPERIDADE À CRISE
ECONOMICA
Depois de duas décadas gloriosas (1960-1980) chamado de "milagre
marfinense"16
, a economia da Costa do Marfim entra em uma fase de crise com
consequências socialmente significativas. A dependência do crescimento do exterior
16
http://www.ritimo.org/dossiers_pays/afrique/cote_ivoire/cote_ivoire_miracle.html
e principalmente da França, e a gestão dos benefícios do crescimento constituem as
raízes dessa decadência econômica.
A partir dos anos 1960, a Costa do Marfim independente opta por um
desenvolvimento econômico baseado na exportação de matérias primas agrícolas,
como o café e principalmente o cacau, cuja produção até hoje faz dela o primeiro
produtor mundial. E também a exploração de minerais e madeira e mais tarde o
petróleo.
O país e suas principais
riquezas econômicas
Os altos preços do núcleo café-cacau nos mercados internacionais permitiram
ao o Estado financiar projetos de modernização. O crescimento da produção
provocou a migração de populações do centro e norte da Costa do Marfim, e
populações estrangeiras, e particularmente do Burkina Faso, e do Mali atraídos pelo
crescimento, para as regiões florestais do sul. Esta política agrária foi incentivada
por Houphouet-Boigny. Para a ocupação da terra, houve um compromisso entre
autóctones e estrangeiros. A integração de diferentes grupos baseia-se nos direitos
tradicionais à terra: o direito de usar sem ser de fato proprietário.
Este sistema se mostrou eficaz até os anos 1980. Os agricultores da Costa do
Marfim e imigrantes foram envolvidos ativamente no crescimento da produção e da
prosperidade do país. Entre 1974 e 1978 os preços das matérias-primas estão altos.
A produção aumenta, de modo que a Costa do Marfim se posiciona como primeiro
produtor mundial de cacau. Os agricultores beneficiam da redistribuição de renda17
.
Numerosos investidores e empresas investem na Costa do Marfim.
Segundo dados do Banco Mundial apresentados por Cogneau e Mesplé-
Somps em seu artigo publicado em Afrique Contemporaine de Verão 2003, a taxa de
crescimento do PIB marfinense é de 7% durante o período de 1960-198018.
Falamos
então de modelo de desenvolvimento da Costa do Marfim e do "milagre marfinense".
No entanto, esta prosperidade está baseada em produtos cujos preços são fixados
em outros lugares, nos mercados internacionais e dependendo, portanto das
especulações. Os preços do cacau e café apresentam uma queda a partir de 1979,
seguindo o boom do petróleo de 1973-197819.
Essa deterioração dos termos de troca
constituirá um freio para a fase de crescimento econômico em que se encontrava o
país. Ela reduz a capacidade reguladora do Estado. No início dos anos 1980, frente
à queda dos preços do café e do cacau, a economia do país entra em recessão. Há
uma diminuição drástica dos recursos financeiros do estado. No entanto, o país que,
durante o período do milagre marfinense, acabou se endividando, se deve de pagar
a sua dívida. As instituições financeiras internacionais resolveram não emprestar
mais ao país.
17
DUBRESSON, A., Ville et industries en Côte d’Ivoire. Pour une géographie de l’accumulation
urbaine, Karthala, Paris, 1989.
18
Cogneau, Denis ; Mesplé-Somps, Sandrine, « les illusions de l’économie ivoirienne et la crise
politique », Afrique contemporaine, n° 206, Eté 2003.
19
Idem
Diante da deterioração da situação financeira do país, e a necessidade de
honrar as dívidas, o país é forçado a aplicar programas destas instituições
financeiras, chamados “Programas de Ajustamento Estrutural”. Estas medidas
levarão à desvalorização do franco CFA, moeda dos países francófonos da África.
Vale salientar que estas medidas não foram aplicadas apenas na Costa do Marfim,
mas em todas as “ex-colônias” francesas. As reformas liberais de estabilização
financeira aplicadas entre os anos 1980 e 1990 não levaram aos resultados
esperados. A desvalorização da moeda CFA contribuiu para uma deterioração mais
acentuada da economia do país. As repercussões desta crise são importantes, tanto
em áreas urbanizadas como em áreas rurais.
O consumo médio per capita diminui quase pela metade durante o período
entre 1985 e 1993. A baixa na receita triplicou o índice de pobreza que aumento de
10 para mais de 30%20
. Em 1985, metade dos pobres se localizava, sobretudo nas
regiões de savana, nas regiões do Centro e Norte do país. Mas com a queda dos
preços do café e do cacau, a pobreza aumentou também nas regiões florestais do
Sul.
O aumento dos preços após a desvalorização nos mercados locais tem
contribuído para a deterioração das condições de vida das famílias. Os laços de
solidariedade antigamente presentes nos hábitos das populações começaram a
desaparecer e as pressões das comunitárias já não encontravam satisfação. A
persistência da crise econômica reaviva as tensões sociais21
.
A esta situação, acrescentaram-se as tensões ligadas à terra. O processo de
desenvolvimento rural dirigido pelo Estado durante os anos 1970 ganha uma nas
20
Akindès Francis, « Inégalités sociales et régulation politique en Côte d’Ivoire. L paupérisation en
Côte d’Ivoire est-elle réversible ? » Politique africaine, n°78, juin 2000.
21
Idem, p.29
relações sócio-espaciais que permitiram o crescimento econômico do país e a
integração de comunidades estrangeiras no espaço territorial.
Cabe salientar que a promoção da política agrária na Costa do Marfim girava
em torno de um slogan lançado pelo presidente Houphouet-Boigny em 1970: “a terra
pertence a quem a valoriza”. Com este slogan incorporado na ideologia liberal, o
Estado afirma que a terra lhe pertence e a coloca a disposição de quem quiser
valorizá-la em despeito do direito dos autóctones sobre as terras. Nesta base, os
Baulês, populações do centro do país e os burkinabês que não têm o direito à terra,
tornam-se os latifundiários em regiões que os receberam22.
Se a intervenção do Estado na regulação da economia agrícola funcionou
através de programas de planejamento de uso da terra para trabalhar, isso tem
gerado também um efeito de sobrecarga ou saturação das terras agrícolas
disponíveis. Estima-se que de 16 milhões de hectares de floresta em 1960 no sul,
existem hoje menos de 2 milhões.
A unidade de sócio-espacial formada na base do direito tradicional começa a
sofrer mudanças. Conflitos marcam a relação entre autóctones e alógenos quando
estes começam a reivindicar o direito à terra, de acordo com a ideologia da "terra
pertence a quem a valoriza”. A pressão demográfica aliada ao desmatamento reduz
as possibilidades de convivência entre autóctones e alógenos e contribuem para o
surgimento de disputas de terra em áreas rurais.
De fato, o rápido desmatamento e a pobreza levaram os jovens a fugir
massivamente aldeias para as cidades. Mas, perante a falta de alternativas com o
modelo urbano, além da proliferação de atividades informais, os jovens, às vezes
22
DEMBELÉ, Ousmane « La construction économique et politique de la catégorie « étranger » en
Côte d’Ivoire » dans Marc Lepape et Claudine Vidal (Eds) Côte d’Ivoire. L’année terrible 1999-2000,
Karthala, Paris, 2002, pp.123-171.
com níveis superiores e desempregados, resolvem voltar para as áreas rurais. Este
retorno é incentivado pelo Governo na década de 1980. Porém, o retorno não é feito
sem causar tensões ligadas à terra.
São motivos que evidenciam em certa medida a grave crise pela qual está
passando a Costa do Marfim. Poderíamos afirmar sem medo de errar que pano de
fundo da crise marfinense é principalmente o estado de empobrecimento que se
iniciou com o declínio da boa fase econômica. Porém, vale salientar a presença de
contingências externas e influenciadoras na crise, que não caberiam desenvolver
aqui devido ao tema escolhido. Outros estudos permitiram trabalhar em pormenor a
crise marfinense.
Tentamos trazer apenas alguns elementos suscetíveis de facilitar o
entendimento do ambiente sócio-político marfinense, a questão identitária e as
crises repetitivas no país.
3. O SISTEMA POLÍTICO-PARTIDÁRIO E AVANÇOS DEMOCRÁTICOS
Depois de 30 anos de partido único, a Costa do Marfim passou por um
período de transição democrática com a abertura do país para o multipartidarismo.
Apesar de todas as mudanças anticonstitucionais sofridas pelo país a partir dos
anos 1990 e posteriormente pelas situações dramáticas sofridas pelo país, houve
avanços democráticos significativos, embora a situação do país hoje, nos leve a
acreditar no contrário.
O exame das diferentes Constituições do país permite afirmar que elas
favoreceram importantes avanços no que diz respeito a consolidações das
instituições e da democracia. Esta afirmação pode se verificar pelo modelo de
racionalização da expressão do poder que delas surgiram.
3.1. PODERES E PLURALISMO POLÍTICO
O Pluralismo político e a separação dos poderes são pilares importantes, e
princípios organizacionais do poder a partir dos quais nasce a democracia. A
contribuição das Constituições marfinenses para racionalização da expressão do
poder consistiu em evidenciar estes princípios organizacionais, de forma que se
consegue na teoria separar o Poder executivo, dos poderes legislativo e judiciário.
No caso presente, trataremos apenas dos casos dos Poderes Executivos e
Legislativos.
A ideia de separação do poder executivo dos outros poderes surgiu de erros e
excessos observados na passagem da Costa do Marfim colônia para país
“independente”. A primeira Constituição da Costa do Marfim independente
autorizava o multipartidarismo23
. Era uma disposição original que deveria permitir a
expressão do sufrágio com bases pluralistas. De tão surpreendente que possa
parecer, essa disposição importante e inédita para um país africano, francófono e
que acabava de se tornar independente, gerou esperanças de curta duração. O
sistema de partido único acabou se impondo com era de práxis nos outros estados
da África do oeste. Os partidos políticos opostos ao sistema de partido único não
podiam ter uma existência legal, portanto obrigados a permanecer na
clandestinidade. É o caso do FPI que nasceu em 1982 e só pude oficializar as suas
atividades apenas em 1990, após a abertura do país para o multipartidarismo.
3.2 O PODER EXECUTIVO
Depois de 30 anos de existência, o sistema de partido único que era uma
prática anticonstitucional, autoritária e digna de um sistema ditatorial, cedeu sob a
pressão de uma sociedade ávida de liberdade de expressão e de pluralismo
ideológico e político. Esta fase que se iniciou no final dos anos 1980 ganhou em
efetividade no Começo de 1990. Essa mudança abriu as portas para o início de uma
transição democrática para a expressão do poder executivo, perceptível tanto ao
nível do mecanismo do acesso ao poder como as regras para o exercício do poder.
No que diz respeito às regras do acesso ao poder executivo, o primeiro fato
importante é o reconhecimento de uma oposição no sistema político com direitos
constitucionais. Essa mudança se deu na revisão constitucional de 199024
. O país
estava de volta para o constitucionalismo.
23
Artigo 7 da Constituição: Os partidos e movimentos políticos concorrem à expressão do sufrágio...
24
Draft paper presented at African Network of Constitutional Law conference on Fostering
Constitutionalism in Africa Nairobi April 2007.
Outro elemento importante é a elaboração de condições estritas de acesso ao
poder, inscritas no Artigo 35 da Constituição de 200025
. Apesar das diversas
controvérsias provocadas por este artigo, é preciso dizer que este artigo tem a
vantagem de promover mais transparência na gestão do jogo político. Na realidade,
a importância dos elementos levados em conta é a vontade de “limpar” o caminho
que leva ao poder político. Evidentemente, esta posição não nega os vieses que
poderiam se introduzir na aplicação dessa disposição, como foi o caso da
recuperação política que fez dela uma disposição excludente. Sem querer entrar
positivismo exagerado, esta posição baseia-se naquilo que há de vantajoso neste
artigo, que como fundamento jurídico garante a vontade dos marfinenses de querer
um poder executivo dirigido por uma pessoa que beneficiaria de um mínimo de
integridade. Além disso, a Constituição de 2000 estabelece a criação de uma
Comissão Eleitoral Independente. O principio da organização de eleições livres é
adquirido desde a abertura do país para o multipartidarismo em 1990, e a
Constituição de 2000 impõe a necessidade da criação de quadro institucional
adequado.
No que diz respeito às regras do exercício do poder, elas sofreram alterações
progressivas. Primeiramente, com um executivo monocéfalo criado pela Constituição
de 1960, nasce um executivo bicéfalo com a revisão constitucional de 199026
. De
fato, se analisarmos o regime político marfinense que um regime presidencialista, a
instituição de um primeiro ministro torna-se atípico. Porém no contexto de um
sistema de partido único, a presença de um primeiro ministro reduziria o exercício
exclusivo do poder executivo pelo presidente da república, e lenificaria a imagem
25
Constituição elaborada após o golpe de estado de 1999 e aprovado por mais de 86% dos eleitores.
26
Lei constitucional n°90- 1529 de 06 de Novembro de 1990. Tradução própria.
ditatorial do regime político marfinense. Há também outro fato não menos importante
que é a limitação do mandato presidencial. Trata-se de um mandato com uma
duração de cinco (5) anos, renovável uma (1) vez.
Conforme o artigo 3527
da Constituição marfinense, a idade mínima para
participar às eleições presidenciais é de quarenta (40) anos, e a máxima é de
setenta e cinco (75) anos. O candidato deve ser marfinense de origem, com os seus
pais também marfinenses de origem. Acrescenta-se a estas disposições,
declarações de boa saúde física e mental, do seu patrimônio.
A eleição do presidente é adquirida à maioria absoluta dos sufrágios. Caso
não obtida, acontece um segundo turno, quinze (15) dias após a proclamação dos
resultados do primeiro turno. Apenas se apresentam os dois primeiros colocados do
primeiro turno. O primeiro turno das eleições presidenciais acontece durante o mês o
mês de outubro do quinto ano do mandato do presidente da Republica.
3.3 O PODER LEGISLATIVO
Tendo escolhido o regime presidencialista desde a independência, a
Assembleia unicameral da Costa do Marfim, não tinha poderes para destituir o
presidente da República. Este tinha e continua tendo uma supremacia total no
exercício do seu poder. Portanto o papel da Assembleia se limitava apenas a suas
prerrogativas legislativas. A competência exclusiva a ela reconhecida na edição das
normas lhe dava a autoridade nas suas atividades.
27
Constituição de 2000
O Poder legislativo marfinense era antes da transição democrática “parte do
poder executivo”28
. A partir de 1990, a ativação do pluralismo político revaloriza o
poder legislativo. Primeiramente, a configuração da Assembleia muda. Sua nova
estrutura heterogênea quebrou o monopólio partidário. Hoje, com as eleições de
2011, a nova Assembleia caracteriza-se pela diversidade, mesmo arbitrária e não
respondendo às aspirações e votos dos marfinenses, ela é composta por deputados
de “diversos partidos políticos”.
A duração da legislatura é de cinco (5) anos. O mandato dos parlamentares é
renovável. Eles são eleitos no sufrágio universal direto.
3.4 O PROCESSO ELEITORAL MARFINENSE
A Costa do Marfim teve acesso à soberania internacional em 1960 e tornou-
se República da Costa do Marfim. Seus textos fundadores fazem do povo, o
Soberano; Ele é quem “exerce a soberania” através dos seus representantes eleitos.
Esta opção está confirmada na Constituição de 200029
.
A jovem República, como a maioria dos países africanos de língua francesa,
retoma a legislação do antigo colonizador ou adota textos que tem fundamentos nos
princípios gerais do direito francês. A eleição se torna o modo exclusivo para a
designação dos governantes. Para que esta eleição seja a expressão da livre
escolha do povo, os princípios são apoiados e complementados por textos que
respeitam os critérios internacionais como:
28
WODIE, Francis, Institutions politiques et droit constitutionnel em Côte d´ivoire. Abidjan, Presses
Universitaires de Côte d´ivoire, 1996, p.370.
29
http://democratie.francophonie.org/IMG/pdf/Cote_d_Ivoire.pdf
a) O sufrágio é universal, igual e secreto, portanto “aberto a todos”; existem,
porém discriminações legais. Elas são reduzidas e constituem fora a
questão da idade, a sanção da comissão de atos incompatíveis com a
qualidade de representante do povo.
b) Para ser eleitor, tem que ser cidadão marfinense, gozando de todos os
seus direitos civis e políticos, sem ter sido condenado e preso por crimes
de roubo, estelionato, falsidade ideológica, desvio de bens públicos,
corrupção etc.
c) As candidaturas são abertas a quem preenche todas as condições.
3.4.1 AS INSTITUIÇÕES RESPONSÁVEIS PELAS ELEIÇÕES NA COSTA DO
MARFIM
A organização das eleições respeita a separação dos poderes que nelas
intervém e que permanecem independentes uns com relação aos outros na
execução das diferentes tarefas. Existem duas instituições responsáveis por todo o
processo eleitoral, desde o cadastro dos eleitores, o registro das candidaturas até a
publicação dos resultados definitivos.
3.4.1.1 A COMISSÃO ELEITORAL INDEPENDENTE
A Comissão Eleitoral Independente (CEI) é o responsável administrativo das
eleições na Costa do Marfim. Ela é responsável por organizar, supervisionar e
monitorar a conduta de todas as eleições em conformidade com as leis e
regulamentações30
. Ela proclama os resultados provisórios.
3.4.1.2 O CONSELHO CONSTITUCIONAL
No quadro do processo eleitoral, o Conselho Constitucional controla a
regularidade das operações eleitorais, avalia o contencioso eleitoral e proclama os
resultados definitivos31
das eleições.
30
Artigo 2 da Constituição de 2000.
31
Artigos 32 e 94 da Constituição de 2000.
4. AS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS DE 2010 E A CRISE PÓS-ELEITORAL
Os acordos de paz ocorridos em 2007 conseguiram trazer certa confiança
para a população marfinense cansada por anos de crises intermináveis. As eleições
presidenciais traziam em si fatores positivos para a população, como a abertura à
livre circulação do Norte para o Sul, a reunificação do país, o cessar fogo, e
perspectivas de relance econômico após as eleições.
Em geral, as eleições de 2010 marcariam de fato o fim da guerra na Costa do
Marfim. O primeiro turno das eleições foi satisfatório no seu conjunto, devido à
participação da população marfinense.
32
32
http://www.rfi.fr/afrique/20101104-cote-ivoire-enseignements-premier-tour
33
O segundo turno das eleições presidenciais inicia-se com um clima tenso, e
completamente oposto ao clima de festa que reinava no primeiro turno. Esta
situação acabará influindo o período pós-eleitoral e levará a uma crise sem
precedente no país. Daí nasce uma psicose quanto ao risco cada vez maior de
guerra civil generalizada. O quase caos na Costa do Marfim chama a atenção das
organizações regionais e internacionais e atrai todos os olhares quanto à busca por
uma solução duradora para sair da crise, mas antes, entender os motivos e a
verdade sobre os acontecimentos.
33
http://www.rfi.fr/afrique/20101104-carte-resultats-premier-tour-presidentielle-ivoirienne
É importante ressaltar nesta fase do trabalho que embora marfinense e com
um posicionamento claro perante a crise que vive o país, a objetividade do trabalho
acadêmico e tema em si necessitam a produção de uma argumentação não
partidária, mas apenas uma exposição dos fatos conforme relatos da mídia, que
também tem responsabilidade comprovada nos conflitos em geral e no caso
específico da Costa do Marfim.
Cabe acrescentar também que o objetivo não é apresentar de forma
detalhada os acontecimentos da crise pós-eleitoral. O nosso objetivo será uma breve
exposição com uma análise dos fatos importante dessa crise.
O segundo turno das eleições presidenciais foi marcado pela proclamação de
dois resultados contraditórios. Um resultado proclamado pelo presidente da
Comissão Eleitoral Independente no Quartel Geral do Candidato Alassane Ouattara,
que representava a oposição. Esses resultados o deram como vencedor das
eleições com mais de 54% dos votos, e acabaram levando a controvérsias quanto á
validade jurídica e ética da proclamação de tais resultados. Isso se justifica ainda
mais na medida em que esses resultados não foram detalhados como os do primeiro
turno e foram dadas em circunstâncias duvidosas como, por exemplo, o fato dos
resultados serem proclamados apenas pelo presidente da Comissão Eleitoral
Independente, sem a presença dos vice-presidentes deste órgão administrativo, no
Quartel Geral do Candidato Ouattara e no quarto dia após as eleições, enquanto a
Constituição prevê um prazo máximo de três (3) dias, para a proclamação dos
resultados provisórios que deveria logo em seguida ser averiguada e confirmada ou
não pelo Conselho Constitucional.
O segundo resultado foi dado pelo presidente do Conselho Constitucional em
ruptura com o resultado dado horas antes pelo presidente da Comissão Eleitoral
Independente. Com base em relatos e informações comprovadas, de fraudes em
massa e violências físicas contra os seus militantes, a coalizão de partidos que
apoiava o presidente Gbagbo entrou com pedidos em anulação dos votos em
algumas regiões do país. Esses pedidos encontraram um parecer favorável da parte
do Conselho Constitucional que na base das provas apresentadas, anulou os
resultados de sete departamentos do Norte e do Centro do país e proclamou a
vitória do presidente Laurent Gbagbo com um pouco mais de 51%. Cabe mencionar
que estes departamentos eram todos majoritariamente favoráveis ao candidato da
oposição, o Alassane Ouattara.
Outro fato importante é a entrada em jogo do representante da ONU que tinha
um mandato de certificação dos resultados das eleições e que acabou confirmando
o resultado dado pelo órgão administrativo (a Comissão Eleitoral Independente) que
davam o candidato da oposição como vencedor das eleições.
Segue-se a partir deste momento uma fase muito confusa em que se assistia
a dois eventos de posse. Um primeiro no respeito do ritual habitual e o outro por
escrito a partir do seu Quartel Geral. Cada um formou o seu governo.
O governo do presidente Gbagbo tinha um controle efetivo do poder, visto que
controlava o conjunto dos pontos e setores estratégicos do país, exceto as regiões
ocupadas pela rebelião. Um Controle e uma efetividade do poder que se faziam
apesar do embargo econômico da Europa sobre a Costa do Marfim, que autorizava
o fechamento do Banco Central de todos os bancos europeus presentes no país.
O segundo governo, o do Alassane Ouattara, com relação ao primeiro, tinha
uma audiência diplomática, principalmente apoios de países como França, Inglaterra
e a maioria dos países europeus, os Estados Unidos e de países africanos, além do
apoio da rebelião no país. Era um governo mais passivo, que apenas esperava
decisões da comunidade internacional para resolução da crise.
Inicia-se uma nova fase de confrontos militares entre as forças leais ao
presidente Laurent Gbagbo e a rebelião. Notou-se um avanço importante sem
resistência da rebelião e a ocupação de alguns bairros da Capital Abidjan, favoráveis
ao Alassane Ouattara. A partir do dia 28 de março de 2011, os rebeldes lançaram o
ataque final que eles chamavam “a conquista de Abidjan”34
.
Frente a militares com armamentos pesados e muito bem treinados, que
tinham um conhecimento aguçado e claro da arte da guerra e que defendiam suas
posições naquilo que chamavam guerra de libertação, encontravam-se rebeldes
desordenados e indisciplinados. Eles apresentavam lacunas importantes em
estratégias militares que foram decisivas na guerra de Abidjan onde sofreram uma
grande derrota com a perda de um importante contingente de rebeldes.
Vendo o desequilíbrio das forças e a derrota dos rebeldes a missão das
Nações Unidas na Costa do Marfim e a Força francesa no país entraram em ação
sob uma resolução35
da ONU que impedia o uso de armamentos pesados contra
civis e sanções contra algumas personalidades favoráveis ao regime do presidente
Gbagbo. A ambigüidade dessa resolução e as chamadas repetidas do Alassane
Ouattara e do chefe da rebelião Guillaume Kigbafori Soro, levaram as forças
estrangeiras acima mencionadas a entrarem de fato na guerra contra o regime do
presidente Gbagbo. O principal argumento apresentado para essa guerra contra o
regime de Gbagbo era a “proteção dos civis”. Um uso desproporcional de
armamentos de guerra contra pontos estratégicos, tais quais a residência do
34
Tradução própria – Versão original: “La conquête d´Abidjan”.
35
A Resolução 1975 do Conselho de Segurança da ONU sobre a situação da Costa do Marfim.
presidente da República, a Presidência da República, bases militares e até cidades
universitárias que abrigariam milícias favoráveis ao presidente Gbagbo.
No dia 11 de abril de 2011, no período da tarde, e após intensos bombardeios
das forças francesas e da ONU contra a sua residência, o presidente Laurent
Koudou Gbagbo é capturado pelas forças francesas e entregue aos rebeldes do
Alassane Ouattara e Guillaume Soro. Uma captura vergonhosa, que apresentavam
imagens de um chefe de Estado humilhado que parecia não ter consciência da
gravidade da situação, cujo é um dos principais antagonistas e responsáveis.
O presidente Laurent Gbagbo sendo levado pelos rebeldes para o Quartel Geral do
seu adversário Alassane Ouattara
O dia 11 de abril de 2011 é o dia que marcaria de fato a divisão dos
marfinenses, criando dois sentimentos que reavivam a psicose de uma guerra civil.
Para parte dos marfinenses é o dia de vitória contra a ditadura do regime Gbagbo.
Para os outros, favoráveis ao presidente Gbagbo e/ou nacionalistas é uma grande
humilhação e indignação perante aquilo que é chamado de regresso para a
colonização. Para eles era difícil entender bombardeios contra a residência do
presidente e, sobretudo o argumento da proteção de civis para provocar a morte
destes que se pretendia defender.
Esta situação sem precedente na Costa do Marfim coloca o país a beira de
uma guerra civil que poderá explodir a qualquer momento. Daí surge diversos
questionamentos sobre os tratamentos recebidos por parte dos partidários do
Gbagbo. Há necessidade de manter personalidades do país, ex-ministros e
presidentes de instituições presos sem direito a defesa nem motivos para
permanecerem na cadeia? Há necessidade de bloquear bens, salários e até
aposentadorias de pessoas que a certo momento da história do país serviram o
estado nos seus altos escalões. Como é que poderá acontecer a reconciliação entre
marfinenses se parte da população continua frustrada ocasionando feridas cada vez
mais profundas entre cidadãos de um mesmo país?
A ex-Primeira Dama da Costa do Marfim sendo humilhada e maltratada por rebeldes
O Michel Gbagbo, Professor universitário e filho do presidente Gbagbo, preso, sendo humilhado e
maltratada por rebeldes, sem ter cometido nenhum crime.
5. COMUNICAÇÃO POLÍTICA E INTERNET
No contexto mundial, a política se faz através do uso das mídias. E com a
chegada da internet, há uma necessidade de mudança e de adaptação da parte dos
outros meios de comunicação, repensar o jeito de veicular a informação numa época
em cada um de nós constitui uma fonte de informações.
A entrada da internet na comunicação política mudou de maneira significativa
as relações entre as mídias tradicionais e os políticos. A comunicação política via
www apresenta-se na Costa do Marfim, assim como em outros lugares do mundo,
sob duas formas que evoluem não separadamente, mas juntas. Uma primeira forma
que se enquadraria na comunicação oficial, é mais usada por partidos políticos, por
candidatos e/ou instituições. Ela é feita seguindo regras e leis ditadas pelo jogo
político.
Do outro lado a uma comunicação, mais virulenta, e que usa todos os meios
de ataques, em geral ilegais para com adversários políticos. A internet é, portanto
uma ferramenta de diálogo e uma arma de combate a serviço dos políticos.
Mídia privilegiada por parte da população marfinense alfabetizada e/ou da
elite residente no país ou da diáspora, a internet impõe mudanças radicais em
diversos setores.
Iniciaremos o nosso trabalho apresentando o espaço público e o perfil dos
internautas marfinenses e em seguida analisaremos o quadro da comunicação
política via internet nas eleições de marfinenses.
5.1. A INTERNET E O ESPAÇO PÚBLICO MARFINENSE
No contexto marfinense, podemos dizer que a internet favoreceu uma
liberdade expressão para políticos e movimentos que até os 2000 tinham pouco
espaço para expressar a sua ideologia e idéias. Vale salientar que a situação de
crise e principalmente o período após o golpe de 2002, a internet começou a ocupar
um lugar importante na comunicação em geral e na comunicação política em
particular. A internet torna-se o novo espaço de expressão da liberdade e de
reivindicações para partidos, movimentos e outros indivíduos. As limitações do jogo
midiático, que durantes décadas não possibilitavam a expressão plural por três
motivos essenciais: O controle das mídias pelo governo com apenas dois canais de
TVs (RTI 1 e 2)36
sob o seu domínio que as organiza de maneira a satisfazer
propagandas unilaterais, de elogios pro governo, também pela falta de interesse e
credibilidade, da parte do cidadão marfinense para com os políticos e por fim a falta
de recursos para o uso diário da mídia impressa.
O tradicional domínio das mídias tradicionais sobre as informações que
deveriam ou não levadas ao público passa a ser contestado com a chegada da
internet. Há uma mudança significativa naquilo que eu chamaria de “ditadura da
mídia”37
para usar os termos de Altamiro Borges, pois o fazer a informação torna-se
accessível a todos, pelo menos para aqueles que teriam acesso a internet. Com a
internet os debates e as opiniões não são mais orientados pelas mídias tradicionais.
São os indivíduos e internautas que decidem o que é importante e prioritário para
leitura, para escuta etc.
36
http://www.rti.ci/
37
BORGES, Altamiro. A ditadura da mídia. São Paulo: Anita Garibaldi/Associação Vermelho, 2009.
Essa fase importante no espaço público marfinense nos leva a apresentar o
quadro dos usuários da internet na Costa do Marfim. O número de usuários da
internet na Costa do Marfim assim como no mundo inteiro continua em constante
crescimento.
5.2. DADOS QUANTITATIVOS E QUALITATIVOS
Segundo dados de Agência Reguladora a ATCI (Agência das
Telecomunicações da Costa do Marfim) publicados na revista NETCOM38
em 2005,
tinha no final de 2002, 15.354 assinantes à internet e mais de 70.000 internautas,
uma proporção de cerca de 4,3 usuários para cada 1.000 habitantes. Se
considerarmos que na África em geral, e particularmente na Costa de Marfim, que a
caixa postal e os endereços eletrônicos servem de canal de comunicação para
várias pessoas, o número relativo à comunidade de usuários é logicamente mais alto
do que aquele apresentado pela Agência Reguladora. O potencial de crescimento do
país nesta área é maior, considerando a baixa das tarifas para assinantes e também
pela concorrência favorecida pela presença no país de diversos fornecedores de
acesso à internet.
O problema fundamental da expansão da internet na Costa do Marfim, e na
África em geral, vem da necessidade de ter um computador ou um telefone, duas
ferramentas nem sempre acessíveis para o cidadão comum. A esta necessidade
material acrescenta-se a necessidade de possuir conhecimentos básicos em
informática.
38
LOUKOU, Alain F. Networks and Communication Studies. NETCOM, Vol.19 (2005), n° 1-2, pp. 23-
52
Dados mais recentes publicados pela Planet Expert39
no seu site atualizam
informações a respeito do país. Segundo este site, com uma população total de
19.737.800, a Costa do Marfim possui 1,6 computadores para cada 100 habitantes e
3,2 usuários da internet para cada 100 habitantes, dando um total de 631609,6
internautas na Costa do Marfim, lembrando que são números que podem ser
revisados devido ao argumento apresentado na página anterior sobre o uso do email
como ferramenta de comunicação.
É importante mencionar que os dados quantitativos sobre o público dos
internautas marfinenses como público particular correspondem a um público
socioeconômico relativamente especifico. O retrato40
típico do internauta marfinense
é o de um jovem com um nível de estudo, estatuto social e com uma renda mais ou
menos razoável. Seria, portanto um público jovem e alfabetizado que seria
politicamente bem informado e as vezes com certo engajamento sociopolítico que
representa proporcionalmente um eleitorado com uma alta participação nos debates
eleitorais.
39
http://www.planet-expert.com/fr/pays/cote-d-ivoire/chiffres-cles
40
Op.cit
6. A COMUNICAÇÃO POLÍTICA VIA INTERNET
A comunicação política via internet, na Costa do Marfim assim como no resto
do mundo, traduz a vontade de apresentar as suas opiniões aos outros e, se
possível, levá-los a abraçar essas opiniões. E para isso diversas ferramentas da
internet são usadas, os sites (sites de partidos políticos, de candidatos), os grupos
de discussão, blogs e o twitter.
6.1. OS SITES
O site web é a ferramenta central da comunicação política na internet, e todos
os grandes partidos políticos41
da Costa do Marfim possuem um site internet. Existe
até um site para a rebelião no país, sinal da importância da comunicação política na
Internet para os atores do ambiente político marfinense. Apesar do grande número
de partidos, em torno de 13042
, apenas uma dezena possui um website.
41
http://www.afrique-express.com/afrique/cotedivoire/cote-d-ivoire-liens.html
42
www.izf.net/pages/côte-d-ivoire/4926/
Website do PDCI43
de Henry Konan Bédié
Se hoje há grandes motivações para o uso da internet para fins políticos, é
importante dizer que o início da comunicação política no país não foi dos mais
promissores, primeiro pela falta de conhecimento com relação a esta ferramenta, a
sua capacidade de mobilização até fora das fronteiras e, segundo, devido aos custos
altos para se manter um website na Costa do Marfim até alguns anos atrás.
43
http://pdcirda-suisse.org/
Website do RDR44
de Alassane Ouattra
Igualmente, a grande motivação pelo uso da internet para uma comunicação
política veio também do interesse dos internautas que como mencionado nas linhas
anteriores, são em grande maioria jovens e formadores de opinião. Hoje o uso da
internet tornou-se uma ferramenta quase indispensável pelos políticos.
Além dos websites dos partidos, os sites mais presentes e mais visitados são
os pessoais dos candidatos, que têm maior visibilidade. Nota-se que o profundo
enraizamento do personalismo político é um dos fatores da valorização dos sites
pessoais. A cultura do político demiurgo ainda é significativa no fazer política na
Costa do Marfim.
44
http://www.rdrci.org/main.asp
Site de Alassane Ouattara45
Site de Laurent Gbagbo46
45
http://www.adosolutions.ci/ado/home.php
46
http://www.gbagbo.ci/
E com as eleições presidenciais de 2010, houve um crescimento importante de
sites na internet para a campanha. A maioria deles já deixou de existir, mas tiveram
grandes impactos durante a campanha.
A crise pós-eleitoral veio também ampliar esse horizonte comunicacional dando
vida a diversos sites de resistência.
6.2 OS BLOGS, CHAT E GRUPOS DE DISCUSSÃO
Assim como o Rádio e a TV, a internet já começou a revolucionar o mundo da
comunicação política. Não se trata apenas de alguns internautas passivos com o
sonho da democracia eletrônica direta; há uma organização dos cidadãos, através
de lista de difusão e de fóruns, em comunidades virtuais, em torno de uma causa ou
de um objetivo comum. Hoje com a crise pós-eleitoral há uma presença de diversos
de grupos de resistência ou fan clubs. O site de relacionamento Facebook é hoje a
referência no que diz respeito a debates sobre a Costa do Marfim e, aliás, de
assuntos ligados ao mundo inteiro. Inúmeros blogs também tratam de assuntos
ligados à Costa do Marfim e principalmente da crise pós-eleitoral.
Os grupos de chat e de discussão relevam uma vontade de diálogo, mas existe
também diferenças notáveis entre estas duas formas de comunicação. Os grupos de
discussão sobre a Costa do Marfim constituem um elemento importante e em
constante crescimento na internet e principalmente nas redes sociais.
7. A COMUNICAÇÃO POLÍTICA E A INTERNET NAS ELEIÇÕES DE 2010
É importante dizer que o período eleitoral de 2010 na Costa do Marfim definiu
uma fase importante para o uso da internet como ferramenta para a comunicação
política. Portanto é relevante analisar os sites dos partidos e candidatos durante e
depois da campanha. Faremos apenas uma análise do conteúdo deixando de lado
aspectos relativos à construção do site e uso de ferramentas para especialistas. O
nosso intuito é apenas tratar da noção de conteúdo. Avaliaremos tanto as riquezas
da informação para campanha eleitoral e as modalidades segundo as quais o
acesso foi organizado. Vale dizer que a crise pós-eleitoral de fato destruiu o avanço
no uso da internet para comunicação política, com o desaparecimento de diversos
sites e blogs de campanha que deram espaço hoje para site de resistência e blogs.
7.1 O CONTEÚDO DOS SITES
Dois dos maiores partidos do país, representados pelos três potenciais
candidatos (Alassane Ouattara, Laurent Gbagbo), respetivamente, o RDR, o FPI,
investiram muito durante a campanha eleitoral e a comunicação política via internet
foi uma área bastante aproveitada. Porém diversos questionamentos vêm à tona,
quando se trata dos serviços que foram disponibilizados durante o período eleitoral e
após as eleições, para os internautas. Dois pontos serão analisados. Primeiramente
o contato com os militantes e eleitores via internet e os links e outros recursos
oferecidos.
7.1.1. MILITANTES E ELEITORES COMO INTERNAUTAS
Os sites marfinenses de candidatos e partidos foram planejados durante o
período eleitoral para um público específico e restrito, mas muito importante, por
este ser composto de formadores de opiniões e potenciais cabos eleitorais. Estes
sites iniciaram as suas atividades apenas para serem um meio adicional de
informações e uma plataforma de agenda e divulgação detalhada dos programas de
governo de cada partido e governo, mas também uma forma de abrir espaço para
debates e contribuições. Havia a necessidade de criar um espaço de troca de
informações, de dados, de downloads e transferência de documentos, também para
marfinenses e eleitores da diáspora. Sem medo de exagerar, podemos afirmar que o
intuito dos comunicadores ao incentivarem o uso da internet durante a campanha
para aproximar ainda mais os candidatos deste público específico que faz parte da
“classe mais intelectualizada ou a chama classe A/B, com troca de e-mail, chat e
vídeos”47
.
Com o alto desenvolvimento da internet, os partidos podiam alcançar os
“cabos eleitorais virtuais” que seriam determinantes na persuasão e no
convencimento de eleitores para integrarem a campanha de determinado candidato.
E a característica dos sites políticos, permitir e incentivar iniciativas militantes
permaneceu o foco da maioria destas páginas da Web. A internet é, portanto um
meio para facilitar e melhorar a ação de terreno. Esta foi a lógica seguida pelos
quartéis gerais dos dois candidatos durante a campanha. Os sites dos candidatos
propunham ajuda para comunicação de proximidade, que se apresentavam sob a
forma de dicas de campanha, informativos e até agendas dos candidatos. Havia
47
ROMANINI, M.G. A internet como comunicação política. In “Marketing Político, do comício à
Internet.. – São Paulo: ABCOP, 2007.
constantes atualizações, com vídeos e informações diárias. Além disso, os sites dos
candidatos apresentavam panóplia de recursos para conhecer os candidatos, seus
programas de governo, sugestões para campanha, News... No caso do site
ADOSULUTIONS48
, site do Alassane Ouattara, havia um item “EXPRIMEZ-VOUS”
que permitia aos internautas opinarem e fazerem sugestões sobre questões
importantes como: educação, emprego, mulheres, jovens, paz, saúde,
infraestruturas etc. Havia também um item “QUESTIONS A ADO” que servia para
perguntas diretas ao candidato.
No entanto, um ponto que poderia parecer negativo nesta campanha via site
pessoal, era a falta de interação direta entre eleitores, militantes, até adversários e
os candidatos. Não foi o caso, visto que estes dois candidatos tinham blogs e
páginas em diversas redes sociais, principalmente o Facebook e o Twitter. O
candidato Laurent Gbagbo tem no blog ligado ao site de campanha, um item na
parte direita da tela onde consta a frase “RESTEZ CONNECTÉ”49
. Esta frase
personalizada permite ao internauta, acessar páginas do candidato nas redes
sociais: Facebook, Twitter, Youtube, Daylimotion, Myspace e Viadeo.
Os sites destes dois candidatos e seus respectivos partidos são os únicos que
ofereciam a seus eleitores, militantes e até oponentes, tal panóplia e alternativas
para permanecer ligado a eles e assim obter resultados quanto à intenção inicial de
usar a Internet para a comunicação política.
48
http://www.adosolutions.ci/ado/home.php
49
http://blog.gbagbo.ci/home.asp
7.1.2. OS LINKS
Os links oferecidos nos sites permitiam aos internautas encontrarem
informações específicas. De fato, os links eram frequentemente muito ricos e
reveladores de informações. Eles indicavam ao internauta uma série de sites
alternativos e páginas de redes sociais e blogs do seu interesse e em relação com o
candidato ou ligado ao partido ou sua ideologia50
. O site gbagbo.ci usava os termos
“Liens utiles” e o adosolutions.ci “Autres sites et Blogs”.
Conforme já mencionado, os links também são reveladores de informações,
mas também de uma forma de conceber a comunicação política via internet,
principalmente durante o período eleitoral. Há certa coerência que se destaca no
estudo destes links, visto que os dois partidos e seus candidatos valorizam um
aspecto. É um aspecto interno, sem ligação com o internacional, como ações ligadas
a partidos políticos de uma mesma corrente ideológica. Os links remetem em geral a
representações, QGs de candidatos, movimentos de jovens e/ou mulheres, assim
como associações e até sindicatos. O site de campanha do Alassane Ouattara
apresenta links como: Blog du RJR, Blog Jeunesses Intellectuelles pour ADO51
, Blog
All for ADO, Site de Campagne du QG de Cocody, Site Representation Rayaume-
Uni.
Cada uma das organizações políticas e seus respectivos candidatos se
apresentavam em redes. Porém, estas redes eram apresentavam também
particularidades conforme os próprios partidos, que remetiam as suas
especificidades em termos de identidades políticas. O site do candidato Laurent
50
http://www.adosolutions.ci/ado/lire.php?link=autres_sites
51
http://lacwa.ivoire-blog.com/
Gbagbo no caso, tinha links das instituições, do tipo site do governo, site dos
diferentes ministérios, de empresas públicas, de sindicatos e de personalidades
ligadas de certa forma ao candidato e seu partido.
Para Alassane Ouattara e o seu partido, a referência feita a instituições
aparece menos importante. São mais valorizados os links do universo do partido e
do candidato.
Para finalizar esta parte, vale salientar que o intuito ao trabalhar sites
pessoais desses dois candidatos e dos seus partidos, não é comparar nos mínimos
detalhes os seus sites de campanhas, mas sim trazer apenas elementos que
confirmam o uso da internet para a comunicação política. Aliás um trabalho
detalhado nos levaria a demonstrar a qualidade de uns sites com relação aos outros
e assim tratar de um favoritismo, em função das nossas próprias afinidades, o que
tentamos evitar até o momento, realizando uma análise descritiva com critérios
puramente objetivos.
8. BALANÇO E PERSPECTIVAS
Depois de apresentar o uso desta ferramenta na comunicação política durante
o período eleitoral, cabe fazer um balanço da análise descritiva feita no capítulo
anterior. Esse balanço mostrará, de maneira sintética, os traços importantes dos
sites marfinenses. É a adaptação lenta com relação às grandes possibilidades da
internet, que apesar de algumas iniciativas interessantes, chama a nossa atenção.
Com base nesta observação, vamos tentar delinear o que será, certamente, a
comunicação política na internet em nosso país, nas eleições futuras, caso o novo
poder resolva incluir no seu jeito de governar, eleições democráticas, livres e abertas
a todos conforme prevê a Constituição.
8.1 BALANÇO DA INTERNET NAS ELEIÇÕES DE 2010
Se pensarmos na totalidade dos sites marfinenses de campanha, houve uma
desigualdade no quesito qualidade. No caso dos sites de candidatos e de seus
partidos analisados, há três pontos que podem ser destacados. O primeiro é aquilo
que poderíamos chamar de falta de interação direta com os internautas, que tem um
papel passivo nestes sites. Outro ponto essencial é também entender que a internet
não pode ser usada apenas para satisfazer práticas da comunicação política
tradicional. E por fim, as dificuldades ligadas à web ainda complicam o seu uso para
fins de comunição política.
8.1.1 INFORMAR EM VEZ DE COMUNICAR
Embora haja alternativas criadas com os blogs, e outras páginas nas redes
sociais, a falta de interação nos sites de campanha merece alguma análise. Os sites
de campanhas de nossos candidatos sofreram pela subutilização ou um mau uso
das ferramentas da informática. Isso se traduziu pela disponibilização de sites
puramente informativos que deixavam pouco espaço ou nenhum para a
interatividade. Podemos avaliar que, para os comunicadores dos QGs de campanha
e para os partidos, a Internet seria apenas uma mídia com dispositivos
suplementares, como o e-mail e as informações sobre atividades dos candidatos e
seus partidos. Há poucas inovações (fóruns, opção de pagamento on-line...).
Nota-se ainda mais a importância de certos modos de funcionamento
(comunicação da diretoria para com os membros, a disponibilidade de documentos
já publicados na mídia impressa, a ausência de registro e adesão on-line etc.), que
demonstra a falta de flexibilidade e de abertura para o debate. Há ainda certa rigidez
das organizações no fazer a comunicação política via internet. Há informações,
porém, são quase inexistentes as possibilidades de diálogo da base com a diretoria
e/ou candidatos, a troca de informações permanece rara. Isso nos leva a crer que os
partidos não mudaram o seu jeito de funcionar mesmo com o surgimento da internet,
numa era em que há troca de informações numa velocidade sem precedente. Para
as eleições foram criados sites, o que foi de fato inovador para as eleições de 2010,
mas que não mudaram muito o jeito de comunicar dos partidos e candidatos.
O último ponto a considerar sobre a falta de interação é também a presença
de um email para contato, porém inativo para o envio de respostas as inúmeras
correspondências enviadas52
. Esta falta de resposta constitui um ponto negativo
quanto à impressão que pode ter um militante, eleitor que não conseguiu entrar em
contato com o candidato ou a diretoria para informações sobre a sua cidade, a sua
zona eleitoral. Vale dizer nesta parte do trabalho que esse fato não é apenas
específico à Costa do Marfim e seus políticos, mas sim um fenômeno generalizado.
8.1.1.1 UMA ADAPTAÇÃO DIFÍCIL
Parece que os dois partidos e seus candidatos não entenderam que a
comunicação política via internet não pode ser feita da mesma forma que nas mídias
tradicionais, ou então já entenderam e se recusam a abrir o espaço para comunicar
em vez de informar.
A boa comunicação Política na internet não tem nada a ver com uma
transposição daquilo que é feito em outro lugar. Como escrevem Francisco de Assis
e Letícia Maria Pinto da Costa,
É preciso entender que a ideia básica dessas páginas da Web é divulgar
conteúdos diversos, numa linguagem muitas vezes informal, a fim de que um
grande número de internautas possa ter acesso ao material publicado e
deixar registrada a sua opinião53
.
Pela citação acima mencionada, podemos dizer que os internautas querem
mais trocas, que cada ponto lhe sejam explicado, argumentado. Eles querem pedir
esclarecimentos e obtê-los, querem que o candidato esteja presente antes, durante
e após as eleições, eleito ou não, mantendo um contato regular e personalizado,
52
Durante a campanha de 2010, enviamos vários emails para apresentar um projeto de telemarketing
político para os QGs de campanha, sem nenhuma resposta. Apenas conseguimos contatos através
do telefone.
53
Assis, Francisco De. A internet como instrumento da propaganda ideológica: o blog de Ricardo
Noblat e o caso “mensalão”. In “Marketing Político, do comício à internet. (org). São Paulo : ABCOP,
2007.
com eles54
. A internet inverte completamente a lógica do marketing político
tradicional. Na televisão, o candidato deve emitir uma mensagem curta. No palanque
eletrônico, é o oposto: quanto mais informação e comunicação tiverem, melhor para
os candidatos e seus partidos.
Não se pode também afogar este potencial cabo eleitoral virtual em um mar
de informações. Na verdade, o usuário deve encontrar as informações de que
necessita num piscar de olho e em apenas uma página. É importante notar que um
internauta, à procura de uma informação específica ou simples visitante que chegou
mais ou menos por acaso, passa em média 43 segundos55
em uma página, tempo
suficiente para opinar sobre o seu interesse ou não. O uso de um sumário rápido em
forma de ícones pode acentuar o lado visual do site e assim chamar mais a atenção
do internauta.
8.1.1.2. DIFICULDADES LIGADAS À WEB
O uso da web para comunicação política e, sobretudo campanha eleitoral é
muito complexo. E esta complexidade é em parte devido à enorme quantidade de
dados que se pode encontrar na web e entre os quais o usuário deve fazer a
triagem. Frequentemente promessas de acesso à informação são frustradas, por
exemplo, quando um motor de busca direciona para um site já obsoleto. Temos o
exemplo do Henri Konan Bédié, site do terceiro colocado para o primeiro turno das
eleições, que continua existindo sem ter nenhuma informação como pode se ver nas
ilustrações abaixo. Digitando o endereço aparece a primeira página, onde consta
54
Granjon F., L'Internet militant - Mouvement social et usage des réseaux télématiques, Rennes, éd.
Apogées, 2001. Tradução Própria.
55
http://www.journaldunet.com/0508/050831surfeurs.shtml
logo abaixo da foto, a frase “PASSER L´INTRO” que significa pular a introdução.
Basta passar a introdução que aparece uma página em branco com a seguinte
frase: NOT FOUND: The requested URL/índex.php was not found on this Server.
O vazio jurídico que prevalece neste caso não ajuda a reduzir esse fenômeno:
as regras mais específicas nesta área forçariam os partidos e seus candidatos a
respeitarem procedimentos, como atualizações de conteúdos mesmo após as
eleições. Vale salientar que vários candidatos saíram do palanque eletrônico logo
após o primeiro turno. E no caso dos nossos principais candidatos, objetos de
análise neste trabalho, houve uma adaptação para os sites e páginas do Laurent
Gbagbo, passando de site de campanha para sites e páginas de resistência, como
apresentados nos anexos. No caso de Alassane Ouattara, atual presidente, não
houve alterações. De novidades constam apenas informações desfilando na parte
superior do site sobre atividades do novo presidente.
Acabamos de apresentar um balanço não positivo do uso da web para
comunicação política no período eleitoral e pós-eleitoral. A realidade, como
chegamos a mostrar nas análises acima, apresenta um quadro pouco estruturado e
pouco especializado do uso da web na comunicação política. E para pensar como os
“ciberotimistas”56
que apesar das insuficiências, acreditam e enfatizam as
características positivas que o uso da internet propicia nas campanhas políticas. A
comunicação política na internet, novo ramo da comunicação de campanha tem um
futuro promissor sem medo de exagerar.
8.2. INICIATIVAS POSITIVAS A REFORÇAR
Os sites marfinenses submetidos a nosso estudo apresentam aspectos
encorajadores para aqueles ligados ou interessados nesta nova forma de
comunicação política.
Desde o seu surgimento, foi comprovado que o papel da internet nas eleições
está cada vez mais forte. As últimas eleições na Costa do Marfim apresentam-se
como catalisadores, pois os candidatos estão sempre procurando novos meios para
seduzir um público cada vez mais desiludido com a política. Um paralelismo é
possível: assim como as guerras de todo tempo contribuíram para o progresso
científico, as eleições francesas de 2007 e as eleições americanas de 2008 têm
contribuído para um uso mais aguçado do palanque eletrônico nos países africanos
56
LASULAITIS, Sylvia. As agendas de notícias dos websites eleitorais e as estratégias persuasivas
empregados pelos candidatos do PT e do PSDB á presidência. In “Marketing Político, do comício à
internet. (org). São Paulo : ABCOP, 2007.
e principalmente nas eleições marfinenses de 2010, e uma entrada definitiva dos
partidos e candidatos na comunicação política via internet.
Há muitos outros casos que podem fazer ofício de exemplo neste sentido. Os
ex-rebeldes do norte da Costa do Marfim entenderam que para possíveis apoios de
dentro e fora do país, na guerra contra as instituições marfinenses, era preciso uma
comunicação mais ativa, embora nos mesmos moldes que os sites de partidos, eles
investiram na comunicação política via net.
O site dos ex-rebeldes se tornou hoje um site de partido político, já que os ex-
rebeldes criaram um partido político e participaram das eleições legislativas de 2011.
. A campanha eleitoral de 2010, que culminou em uma crise sem precedente
para o país com mais de 3.000 mil mortos, demonstrou que mais uma vez que estes
confrontos eleitorais trazem muitas inovações. Encontros via internet com os
candidatos, uma maior proximidade com estes, programas de governos mais
detalhados, com a possibilidade para os “cabos eleitorais virtuais” disporem de mais
informações sobre a campanha, o partido e os candidatos. A internet teve um
impacto importante no processo eleitoral, com os resultados do primeiro turno
publicados on-line no mesmo tempo que foram proclamados ao vivo na principal TV
marfinense. É longe ainda a época em que todo mundo terá acesso, mas podemos
dizer que os internautas marfinenses tinham lugares privilegiados durante a
campanha para presidente em 2010.
8.3. PERSPECTIVA
A evolução da comunicação política na internet envolve cumprimento de
certas condições. Realização cada vez mais provável visto as partes envolvidas têm
um interesse claro em termos de imagem e marca. Deve-se incentivar em primeiro
lugar, um maior envolvimento dos políticos para seguirem o caminho dessa nova
forma de comunicar com o público, que supõe provavelmente a renovação da classe
política marfinense. Em seguida, a modernização da comunicação na Costa do
Marfim passa talvez pelo estudo de modelos estrangeiros. A este respeito, deve-se
questionar se os sites dos principais partidos políticos podem servir de exemplos. No
caso o UMP e o PS.
8.3.1. RENOVAÇÃO POLÍTICA E COMPROMISSO COMUNICACIONAL
O futuro da comunicação política na internet, com certeza, passa por um
melhor conhecimento e uso mais eficaz das ferramentas da web. Boa parte dos sites
oficiais de partidos e políticos marfinenses peca por seu caráter ainda rudimentar.
Pelo menos os sites dos principais candidatos, Laurent Gbagbo e Alassane Ouattara
parecem ter sido feitos por empresas especializadas. O que não é o caso dos outros
partidos e candidatos que privilegiam pessoas menos experientes para realização e
gestão. Esta opção apresenta muitas vantagens tanto para o partido, como para os
militantes, sendo economia e garantia de determinada orientação do conteúdo para
o primeiro, participação ativa e responsabilidade para o último.
Para ter um resultado eficiente e um maior aproveitamento durante as
eleições, e até para um bom marketing político, é preciso agir com profissionalismo,
contratando pessoas especialistas e conhecedoras do ambiente político, para cuidar
dos sites, desde a criação até a gestão diária. Esta prática modelo nos Estados
Unidos, já ganhou campo importante na América Latina e principalmente no Brasil.
Esta terceirização ainda está numa fase embrionária nos países africanos e na
Costa do Marfim, pois em geral os partidos contratam uma única empresa de
comunicação que cuida desta parte técnica. O que a nosso ver está errado.
Ao amadorismo que vimos durante as eleições, sucederá um profissionalismo
nos moldes americanos ou europeus. Seria uma evolução pelo menos lógica que
poderá acontecer de fato se houver condições democráticas para a expressão das
diferenças. Porém já se iniciou esse processo evolutivo, nas eleições de 2010.
Embora lenta, já se pode afirmar que o profissionalismo ganha espaço no fazer
política na Costa do Marfim.
A classe política marfinense já de idade avançada pode constituir e explicar
essa lentidão, pois acostumados com o modelo de comunicação política tradicional,
com as mídias tradicionais. Existem generalizações a este respeito: Os idosos têm
mais dificuldades para se adaptarem às novas tecnologias, e podemos dizer que os
políticos marfinenses não são exceção a este clichê. Dos mais jovens políticos
marfinenses, apenas ex-chefe rebelde e atual primeiro ministro de 39 anos entendeu
a importância de uma comunicação política via internet, criando o site da rebelião
acima ilustrado e com o site que criou assim que ocupou o cargo de primeiro
ministro, o site: http://www.premierministre.ci/ e o blog:
http://www.guillaumesoro.com/ com diversas outras páginas das redes sociais.
Mesmo com os jovens políticos, tal qual o Guillaume Soro, há uma
preocupação em fazer imgens do que criar um conteúdo adequado para a
comunicação política via internet. O que podemos deduzir desta situação de
evolução lenta é que, poderá haver evolução concreta e plena somente quando os
políticos terão ou incorporaram a cultura da internet. Em outras palavras, os políticos
que terão um maior envolvimento, e uma compreensão aguçada deste tipo de mídia,
são aqueles que cresceram com ela. Esperamos que o exemplo das eleições de
2010 possa fazer escola de maneira a não esperar a renovação da classe política.
8.3.2. O EXEMPLO AMERICANO
É importante dizer que os EUA desempenharam a respeito da comunicação
política um papel exemplar para o resto do mundo. Vale salientar que foi nos
estados que surgiu o world wide web, e os dois grandes protagonistas do cenário
político americano, os partidos Democrata e Republicano fazem parte dos primeiros
partidos políticos do mundo a abrirem sites para promoverem suas ideias e ideais57
.
Hoje o grande referencial do uso da internet para comunicação política e
sobretudo em período eleitoral é o Barack Obama antes e durante as eleições de
2008, conforme escreve FLEURY (2009):
Talvez a grande percepção da equipe que conduziu sua campanha foi de
que a internet não seria só “Consequência” das ações do candidato, de
suas ideias, desejos e visões (assim como os políticos brasileiros pensam
até hoje). E sim uma das principais “causas” de um grande movimento.
57
http://www.erudit.org/livre/moniered/2002/livrel5_div7.pdf
Nunca antes alguém havia pensado e arquitetado uma campanha no
mundo utilizando-se de tamanhas artimanhas – uma rede virtual capaz de
aproximar pessoas, motivá-las, inseri-las num processo maior, ouvindo
ideias, pensamentos e todos aqueles que quisessem opinar sobre a
construção de um novo país, um novo modelo de se fazer política.58
Assim apesar das críticas de muitos “cibercéticos”59
que permanecem
minoritários nos seus julgamentos, a internet se tornou, mais do que um novo meio
de comunicação, uma ferramenta essencial para eleições.
Ainda nos Estados Unidos, outro fato importante consistiu em organizar uma
"Troca de votos" online entre os candidatos Al Gore do partido dos Democratas e
Ralph Nader do partido verde, durante as eleições de 2000. Tratava-se de
convencer os eleitores de Nader (Partido Verde) a votarem Gore em estados onde o
candidato democrata tinha chance de ganhar contra Bush. Em troca, os eleitores de
Al Gore votariam em Nader em estados onde Bush tinha uma vantagem confortável.
O interesse era mútuo: reforçar as chances de vitória para Al Gore em estados onde
a votação seria apertada, e para Nader garantir os 5% dos votos necessários para
obter ajuda financeira do governo federal para as próximas eleições. O eleitor podia
desta forma ter o sentimento de que o seu voto era mais eficaz.
Trocas de votos, voto on-line e outras artimanhas da internet, podem surtir
efeitos nos estados unidos e em outros países desenvolvidos, porém as
possibilidades para estas práticas cruzarem o atlântico e alcançarem o Golfo da
Guiné (Costa oeste africana) ainda reflete o campo da ilusão, apesar dos avanços
cibernéticos. Apesar de acreditar no avanço da internet como ferramenta essencial
para comunicação política, as últimas notícias sobre eleições no continente deixam
58
FLEURY, Gustavo. Eleições 2008. O Brasil e o Efeito Obama.
59
LASULAITIS, Sylvia. As agendas de notícias dos websites eleitorais e as estratégias persuasivas
empregados pelos candidatos do PT e do PSDB á presidência. In “Marketing Político, do comício à
internet. (org). São Paulo : ABCOP, 2007.
dúvidas sobre a saída da tão amada ditadura para se construir um espaço
democrático onde possam se desenvolver comunicações eficientes em que o povo
se sinta a vontade para trocar informações e participar do fazer política e não do
morrer pela política.
No que diz respeito às pesquisas de opinião, a maioria dos sites americanos
publicam durante o período eleitoral em suas páginas pesquisas simples, com
questões regularmente atualizadas. Os candidatos dispõem assim de um feedback
contínuo sobre a relevância de sua mensagem de campanha, tendo a possibilidade
de mudar, aprimorar ou excluir. Em geral, os internautas que visitam os sites são
questionados sobre a ordem das suas preocupações, sobre as propostas do
candidato que recebe maior aprovação etc. Esta prática é utilizada diferentemente
nos sites de campanha dos candidatos durante as eleições marfinenses. Há apenas
possibilidades para os eleitores e/ou militantes opinarem sobre questões já
predefinidas e sobre as quais só poderiam se expressar. Mesmo com a vontade de
comunicar com os internautas, a comunicação aqui é orientada para a visão do
partido e do seu candidato para com questões que julgam necessárias para as
populações. Qual foi a base para definir a classificação destas preocupações se há
também uma falta de pesquisas eleitorais feitas por empresas qualificadas. As
pesquisas são sempre orientadas para as intenções de votos60
.
60
http://www.jeuneafrique.com/Article/ARTJAJA2533p010-011.xml0/
Comunicação política via internet nas eleições presidenciais da Costa do Marfim
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  • 1. BADOU KOFFI ROBERT Comunicação política via internet nas eleições presidenciais da Costa do Marfim UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Escola de Comunicação e Artes Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo Curso de Especialização em Marketing Político e Propaganda Eleitoral São Paulo 2012
  • 2. BADOU KOFFI ROBERT Comunicação política via Internet nas eleições presidenciais da Costa do Marfim Monografia apresentada à Banca Examinadora da Universidade de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Especialista em Marketing Político e Propaganda Eleitoral, sob a orientação da Profa. Dra. Katia Saisi. UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Escola de Comunicação e Artes Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo Curso de Especialização em Marketing Político e Propaganda Eleitoral São Paulo 2012
  • 3. DEDICATÓRIA Ao meu filho Yannick, por ter nascido e trazido tanto amor e tanta alegria à minha vida. À mãe Marie, minha força. À Michele, minha esposa, minha companheira e amiga. Aos meus irmãos e irmãs: Yvette, Arsène, Roméo, Sylvana, Marie-Thérèse e Lewis. A luta continua. Ao meu pai e amigo.
  • 4. AGRADECIMENTOS Ao Prof. Dr. Ivan Santos Barbosa que me deu a oportunidade de cursar esta especialização que muito contribuiu para o meu crescimento científico e intelectual. Muito aprendi e continuo aprendendo. O meu agradecimento será eterno. À Profa. Dra. Katia Saisi. Obrigado pelo apoio, pela paciência e compreensão. Sou-lhe muito grato pelas palavras incentivadoras que me levaram a conclusão deste trabalho. À Sueli pela sua dedicação no trabalho. Pela ajuda acadêmica e apoio moral que recebi em momentos difíceis. A todo o corpo docente do curso pelas aulas ministradas. Aos professores da Banca, por terem aceitado avaliar o meu trabalho.
  • 5. Eu sempre soube que dava para vencer a campanha do referendo. Bastaria que deixassem a gente fazer bem-feito, sem interferências, sem palpites, sem “achômetros”, que a vitória estaria inevitavelmente ao nosso alcance. (SANTA RITA, 2008: 33).
  • 6. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................. 11 2 TRAJETÓRIA HISTÓRICA, SOCIOPOLÍTICA E ECONÔMICA .................. 16 2.1. O PROCESSO DE POVOAMENTO DA COSTA DO MARFIM...................18 2.2. MIGRAÇÕES E DIVERSIDADE SOCIAL.................................................. 22 2.3. TRAJETÓRIA SOCIOPOLÍTICA ............................................................... 23 2.3.1. LUTA PELO PODER E CRONOLOGIA DOS ACONTECIMENTOS...... 25 2.3.2. O CONCEITO DE IVOIRITÉ .................................................................. 27 2.4. CRONOLOGIA DE UMA CRISE: DE 2002 A 2010 ................................... 28 2.5. CONTEXTO SOCIOECONOMICO: DA PROSPERIDADE A CRISE ECONOMICA ................................................................................................... 30 3. O SISTEMA POLÍTICO-PARTIDÁRIO E AVANÇOS DEMOCRÁTICOS.... 36 3.1. PODERES E PLURALISMO POLÍTICO.................................................... 36 3.2. O PODER EXECUTIVO ............................................................................ 37 3.3. O PODER LEGISLATIVO.......................................................................... 39 3.4. O PROCESSO ELEITORAL MARFINENSE ............................................. 40 3.4.1. AS INSTITUIÇÕES RESPONSÁVEIS PELAS ELEIÇÕES NA COSTA DO MARFIM ........................................................................................................... 41 3.4.1.1. A COMISSÃO ELEITORAL INDEPENDENTE .................................... 41 3.4.1.2. O CONSELHO CONSTITUCIONAL.................................................... 42 4. AS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS DE 2010 E A CRISE PÓS-ELEITORAL. 43 5. COMUNICAÇÃO POLÍTICA E INTERNET.................................................. 51 5.1. A INTERNET E O ESPAÇO PÚBLICO MARFINENSE............................. 52 5.2. DADOS QUANTITATIVOS E QUALITATIVOS ......................................... 53
  • 7. 6. A COMUNICAÇÃO POLÍTICA VIA INTERNET........................................... 55 6.1. OS SITES.................................................................................................. 55 6.2. OS BLOGS, CHAT E GRUPOS DE DISCUSSÃO .................................... 59 7. A COMUNICAÇÃO POLÍTICA E A INTERNET NAS ELEIÇÕES DE 2010 60 7.1. O CONTEUDO DOS SITES...................................................................... 60 7.1.1. MILITANTES E ELEITORES COMO INTERNAUTAS............................ 61 7.1.2. OS LINKS............................................................................................... 63 8. BALANÇO E PERSPECTIVAS ................................................................... 65 8.1. BALANÇO DA INTERNET NAS ELEIÇÕES DE 2010 .............................. 65 8.1.1. INFORMAR EM VEZ DE COMUNICAR................................................. 66 8.1.1.1. UMA ADAPTAÇÃO DIFÍCIL................................................................ 67 8.1.1.2. DIFICULDADES LIGADAS À WEB ..................................................... 68 8.2. INICIATIVAS POSITIVAS A REFORÇAR ................................................. 70 8.3. PERSPECTIVA ......................................................................................... 72 8.3.1. RENOVAÇÃO POLÍTICA E COMPROMISSO COMUNICACIONAL ..... 72 8.3.2. O EXEMPLO AMERICANO.................................................................... 74 9. CONCLUSÃO .............................................................................................. 77 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................ 79 ANEXOS .......................................................................................................... 82
  • 8. LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CEI: Comissão Eleitoral Independente FN : Forces Nouvelles FPI : Front Populaire Ivoirien PDCI : Parti Démocratique de Côte d’Ivoire RDR : Rassemblement des Républicains RGPH : Recensement Général de la Population et de l’Habitat
  • 9. RESUMO Ao contrário do que se pode imaginar com relação ao ambiente político no continente africano, e principalmente na Costa do Marfim, caracterizado pelo contexto antidemocrático, a comunicação política vem se desenvolvendo e teve nos últimos anos um crescimento bastante significativo. Ela sempre se fez a partir de modelos americanos e europeus e principalmente franceses. Hoje com o amplo crescimento das novas tecnologias de comunicação no país, as eleições presidenciais de 2010 não poderiam acontecer sem o uso da Internet. É, portanto importante refletir sobre o seu uso adequado ou não durante as eleições, apresentando o quadro em que ele serviu de ferramenta para a comunicação política, fazendo um balanço e desenhando possíveis perspectivas para eleições futuras. Palavras-chaves: Comunicação Política, Internet, Eleições 2010, Costa do Marfim.
  • 10. ABSTRACT Despite of what is thought regarding the political environment in the African continent, and mainly at Ivory Coast, characterized by the anti-democratic context, the political communication is being developed and had a very significant growth in the last years. It was always made from American and European models and mainly the French model. Today, with the wide growth of new communication technologies in the country, the 2010 presidential elections could not happen without the use of the Internet. Therefore, it is important to reflect about its appropriate use or not during the elections, presenting the image that was used as tool for the political communication, making an assessment and drawing possible perspectives for future elections. Key Words: Political Communication, Internet, 2010 Elections, Ivory Coast.
  • 11. 1. INTRODUÇÃO A Internet, nova ferramenta de comunicação, oferece novas oportunidades, mas também impõe novas exigências. Parece, portanto interessante marcar um tempo para analisar as mudanças radicais devido ao seu aparecimento - na Costa do Marfim e principalmente a sua entrada no cenário político e no processo eleitoral marfinense. Os termos do tema “Comunicação política, Internet e eleições presidenciais na Costa do Marfim” merecem uma explicação detalhada. Pois analisados de maneira separada, é fácil entender cada um dos termos. Portanto trata-se de saber como os políticos marfinenses comunicaram na Internet durante as eleições de 2010, no contexto de crescimento dessa nova ferramenta de comunicação. Será o uso da Internet para fins de comunicacionais no período eleitoral foi adequado, eficiente? Quais seriam os motivos para este uso sabendo que há poucos usuários desta ferramenta no país? Resumindo, como é que os protagonistas do cenário político marfinense entenderam a Internet, e a sua importância para a comunicação política no processo eleitoral de 2010? Após esses esclarecimentos iniciais, cabe definir o campo de estudo deste trabalho. Entendemos como protagonistas do cenário político, os candidatos a presidente da república e seus respectivos partidos, assim como os militantes e eleitores e cidadãos marfinenses. Afinal, os eleitores e cidadãos constituem os alvos da comunicação política clássica. Com a Internet, um número crescente de cidadãos tornam-se atores políticos, tendo os meios de expressões diversificados e potentes. Há evidentemente outros protagonistas do cenário político que poderiam
  • 12. também encontrar seu lugar neste estudo: trata-se de fato das instituições do estado tai qual, a Assembleia Legislativa, o conselho Constitucional, mas a referência a eles será breve e constará apenas na primeira parte do nosso trabalho quando falaremos do ambiente político marfinense. É preciso salientar o fato que a comunicação destas instituições mesmo política, não se encaixa naquela feita por partidos políticos e seus candidatos durante as eleições, por ela não ser partidária. A comunicação destas instituições continua política, pois o trabalho delas diz respeito à gestão da sociedade no sentido amplo do termo com atividades como a publicação de leis, emendas, decisões judiciais etc. Esta comunicação não pode ser partidária, embora as leis e outras emendas publicadas sejam o resultado dos trabalhos e da votação de eleitos destas instituições, que agem conforme as suas próprias convicções e aspirações. Além disso, analisar a comunicação destas instituições via Internet seria abandonar a ideia principal que é pensar o uso da Internet durante a campanha presidencial de 2010. E dizer também que, além da instituição dirigida pelo primeiro ministro, não há outra instituição marfinense presente na Internet. Portanto, não haveria como avaliar o uso que elas fariam. No que se refere a internet, há debates importantes que se opõem: os que acreditam que a internet seria uma nova mídia de massa, e outros que acham que é apenas uma mídia elitista, isto é, não como um meio de informação de primeira mão, mas um meio utilizado para levar fatos e argumentos suplementares a um público alfabetizado e sensibilizado. No entanto, é evidente que para a internet se tornar um novo espaço de reivindicações e de ativismo político, é necessário que seja acessível a todos. Isso nos leva a questionar a estrutura da Internet e sua finalidade. A internet teria a mesma estrutura que as mídias tradicionais sob uma forma, ou a
  • 13. internet seria uma mídia de tipo diferente, mais orientada para a era da comunicação e participação, e não uma mera informação? Outra hipótese apresentada é que a internet seria uma nova mídia, devido ao seu surgimento e desenvolvimento relativamente recentes, mas também pela sua própria natureza e as questões que a rede suscita em nível mundial. Para nós, não há debate possível sobre o fato de a internet ser uma nova mídia, e é mesmo essa novidade que caduca o debate que opõe os que acham que é uma mídia elitista e aqueles que a consideram uma mídia de massa. E como qualquer novidade, ela nasce elitista: o equipamento necessário para ter acesso e os preços da assinatura – que desde o seu surgimento no mercado tem caído de maneira progressiva – somado as dificuldades da aprendizagem e do uso da informática não foram fora de alcance para muitos usuários potenciais. Mas com o passar do tempo, seu uso está começando a se espalhar, se já não se espalhou, e se tornará um meio de comunicação de massa. É o que confirma a maioria das pesquisas feitas a este respeito sobre o número e a qualidade dos internautas. No caso da Costa do Marfim falaremos dos últimos números apresentados por agências especializadas. Para nós, não há sombra de dúvidas, a internet é mesmo uma mídia de massa e não se pode negligenciar a sua importância em uma comunicação política. É esse posicionamento que teremos ao decorrer do no nosso trabalho. Com base apenas nas realidades do uso da web pelos políticos, podemos pensar que o uso mais ou menos recente desta mídia e, especialmente, a sua democratização, chamaram a atenção dos políticos em geral. Nestas circunstâncias, é compreensível entender porque os políticos marfinenses e principalmente os candidatos às eleições presidenciais, seus respectivos partidos, os militantes e eleitores invadiram a rede para torná-la um palanque eletrônico durante as eleições.
  • 14. As eleições de 2010 deram um espaço significativo para a internet. E mesmo quase um ano e meio após as eleições a tendência é acreditar que a comunicação política via web não existe apenas no período eleitoral. Talvez por causa da crise pós- eleitoral que viveu o país, a vontade de querer comunicar e dar a sua versão dos acontecimentos continua levando os marfinenses a usarem a web como nunca antes. Infelizmente, o empenho notável dos partidos e políticos no palanque eletrônico durante as eleições nos leva a acreditar que a comunicação política via web é feita apenas para o período eleitoral. A maioria dos partidos e candidatos criaram sites para a campanha e logo após as eleições estes sites desapareceram. . Pelo menos os dois principais candidatos objeto da análise na segunda parte do nosso trabalho, tentam provar o contrário: o primeiro, o economista Alassane Ouattara, atual presidente, continua na web por motivo de imagem e o segundo, o ex-presidente Laurent Gbagbo, um dos ilustres detentos do tribunal penal internacional continua na rede, por motivo de resistência e luta pela sua liberdade. A Costa do Marfim, conforme veremos na primeira parte do trabalho, é um país jovem apenas 52 anos como país independente, vive uma crise econômica e sociopolítica desde os anos 80 e a partir da década de 90, essa crise se amplificou com diversas questões em torno da identidade marfinense. Faremos num primeiro momento uma apresentação do país, retraçando a sua trajetória histórica, econômica e sociopolítica, para depois falar da crise no país e principalmente e o seu auge com as eleições de 2010. Na segunda parte do nosso trabalho, falaremos do uso da internet nas eleições de 2010. Analisaremos de maneira concreta como ela foi utilizada pelos dois principais candidatos durante e após as eleições. Num primeiro momento, a
  • 15. análise tratará dos conteúdos dos sites e páginas nas redes sociais dos dois candidatos. Num segundo momento, o trabalho focará o balanço e perspectivas sobre o desenvolvimento e as evoluções da comunicação política na Costa do Marfim. Por fim, diremos que as eleições presidenciais de 2010 foram revolucionárias neste país “terceiro-mundista”. Notamos um grande avanço no cenário político marfinense, com práticas comunicacionais semelhantes às dos países desenvolvidos. A importante presença dos candidatos na rede, transformando-a no palanque eletrônico. Também os diferentes debates entre candidatos na TV e principalmente o debate entre o Alassane Ouattara e o Laurent Gbagbo na véspera da eleição, foram determinantes para o país. Isso demonstra o quão importante é a comunicação política. Se não há dúvidas quanto ao uso desta comunicação na arena política marfinense, a novidade das últimas eleições com o uso da internet consolida de fato o avanço no “fazer política” na Costa do marfim. As análises, a partir do quinto item, feitas sobre o uso da internet durante todo o processo eleitoral, provaram que apesar da queda da comunicação política via website observada após este período, esta ferramenta de comunicação veio para ocupar espaço e influenciar a relação entre partidos políticos, candidatos e eleitores, cidadãos que como internautas se tornaram hoje verdadeiros cabos eleitorais .
  • 16. 2. TRAJETÓRIA, HISTÓRICA, SOCIOPOLÍTICA E ECONÔMICA A Costa do Marfim, “ex-colônia” francesa, assim como a maioria dos países africanos conforme estatísticas oficiais, tem uma diversidade de grupos étnicos que se aproxima dos 63. Já nos anos 1840, a Costa do Marfim era dominada pela França. Por volta dos anos 1888, se tornou protetorado, e foi estabelecida como colônia autônoma em 1893. Nessa época, ainda não se falava em autoridade central. O poder político era mantido por chefias tradicionais e tribos, sem ligações nenhumas entre eles. O passado colonial comum a esses povos teria como consequência o surgimento de uma consciência nacional que se manifestou de forma prática através de diversas ações de luta pela emancipação. A vontade de se libertar da colonização levou de fato a calar todas as adversidades e singularidades étnicas, tribais e/ou regionais de maneira a conquistar a independência. Vale lembrar que este processo não é único e nem específico a Costa do Marfim, pois os países africanos em geral, e os francófonos em particular tiveram o mesmo processo de povoamento com a colonização e também o mesmo processo de “descolonização”. Após a independência, ressurgirão a questão da diversidade cultural e das singularidades étnicas, tribais e regionais. Além das divergências étnicas, o ambiente político foi norteado por uma clivagem correspondente às regiões geográficas Sul-Norte, zonas florestais e zonas de savanas. Outro fato importante é a questão do nacionalismo, da cidadania e da construção da nação que levantaram paixões. Diversos movimentos de defesas dos interesses dos autóctones da Costa do Marfim começam a ocupar o espaço sociopolítico antes e depois da colonização,
  • 17. para protestar contra o fato de cidadãos de outros países como Senegal, Benin, Mali ou ainda o Togo ocuparem lugares importantes na administração e nos empregos públicos. Os protestos e lutas contra esta situação alcançaram níveis significativos nos campos econômicos e sociais e desencadeavam, às vezes, em conflitos graves no campo político. Neste contexto, podemos citar como exemplos os acontecimentos dos anos 1958, com uma violenta repressão, da parte de populações marfinenses contra cidadãos do Benin e do Togo, e 1966, de maneira pacífica, através do parlamento, quando Félix Houphouet-Boigny1 propôs à Assembléia legislativa um projeto de lei que autorizaria os cidadãos da África do oeste a adquirirem a dupla cidadania. A partir daí, poderíamos dizer que a questão do nacionalismo, no seu aspecto mais radical que envolve o afastamento dos estrangeiros e no questionamento daquilo que poderia os levar a se tornar “verdadeiros” cidadãos, é e permanece fato recorrente da história colonial e pós- colonial da Costa do Marfim e de outros países africanos. Isso pode se notar com a política de ivoirização2 do funcionalismo público nos meados dos anos 70. Também nos anos 1990, com a retirada do direito de voto para os estrangeiros, e em 1994 com o advento da política da “Ivoirité”, criado pelo regime do presidente Aimé Henry Konan Bedié3 . Esta questão do nacionalismo mantida pelos governos posteriores destaca o problema da nacionalidade e a partir daí a 1 (1905-1993) Foi o primeiro presidente da Costa do Marfim. Dirigiu o país de 1960 a 1993. 2 Entender o termo como um quadro em que se criavam condições para que cargos importantes da administração sejam ocupados por marfinenses em vez de estrangeiros africanos ou cooperantes europeus. 3 (1934 -) Foi o segundo presidente da Costa do Marfim. Dirigiu o país de final de 1993 a dezembro de 1999, quando perdeu o poder por golpe de estado.
  • 18. definição da identidade nacional na Costa do Marfim e os direitos e prerrogativas a ela se reportam. 2.1 O PROCESSO DE POVOAMENTO DA COSTA DO MARFIM A Costa do Marfim é um país da África Ocidental, com uma área total de 322,463 km ². Assim como muitos outros países do continente e até do mundo, tem a migração como a sua principal fonte de povoamento. As diferentes migrações de populações relatadas pela história incluem deslocamentos, voluntários ou involuntários, de populações ou indivíduos, de uma área geográfica para outra.
  • 19. O país viveu entre os séculos XIV e XVIII, deslocamentos significativos de populações vindas do Norte, do Leste e do Oeste, que formam hoje o núcleo de seus habitantes. Essas diferentes ondas de migração acabarão criando no século XIX no território nacional, quatro grandes áreas étnico-culturais, incluindo países vizinhos e outros países da África Ocidental, como a Serra Leoa, a Guiné Bissau e o Togo. Essa diversidade cultural faz da Costa do Marfim um país em que vivem cidadãos oriundos de toda a África Ocidental. Assim, essas quatro grandes áreas, cada uma constituída por uma multiplicidade de grupos étnicos e tribos, localizam-se no país da seguinte forma4: 4 Representação étnica na Costa do Marfim, Fonte: RGPH, 1998
  • 20.  O grupo Mandê: localizado no noroeste do país também conhecido como os Mandinga, inclui principalmente duas entidades. Os antigos Mandês, chamados de Mandês do Sul: Iacuba, Guro, Gagu, etc, ocuparam a região das montanhas no oeste do país, e os novos Mandês que vieram depois, chamados Mandê do Norte: Malinkê, Gbin, Koiaka, instalados no Norte e Nordeste.  O grupo Kru: no Centro-sul e no Sudoeste residem os Kru ou Magwê.  O grupo Gur (Voltaico): no Norte e Nordeste, é composto pelos Senufo, Lobi, Tagbanan, Djimini etc.  O grupo Akan: localizados no leste, no centro e sudeste. Este grupo pode ser dividido em Akan do Centro (principalmente os Baulê), em Akan do leste (Agni, Abron, etc ...) e Akan do sudeste e litoral (Ebriê, Aburê, Adiukru, Apoloniens, Abidji, abey etc.). A esta diversidade étnica e cultural acrescenta-se uma diversidade religiosa. Existem duas religiões dominantes na Costa do Marfim, que são: o Islamismo com mais de 38% da população total e o cristianismo (católico, protestantes com mais de 32% da população total, e mais 11% de animistas5 . No entanto, estas duas primeiras religiões dominam a esfera religiosa marfinense, de grupo étnico para outro. Esta configuração da paisagem religiosa reflete a história da penetração das religiões monoteístas na Costa do Marfim. A penetração da religião muçulmana se deu a partir do norte e a do cristianismo a partir do litoral com a chegada dos colonizadores. Assim, os Akan e os Kru ocupando o centro, leste e sudeste são 5 Fonte : INS, RGPH 1998.
  • 21. predominantemente cristãos, enquanto os Mandê e os Gur (Voltaicos) instalados no norte e nordeste são fortemente islamizados6. A história do povoamento da Costa do Marfim mostra as fontes da configuração sócio-demográfica atual do país. Dada a importância das migrações internas e externas, a sociedade marfinense apresenta um quadro demográfico complexo que evidencia diversas comunidades étnicas e religiosas. O debate político que envolve a definição da identidade nacional marfinense alimenta-se também desse complexo demográfico. De fato, se a questão da imigração não é novidade nenhuma na Costa do Marfim, a manipulação política é porém mais recente. Ela nunca deixou de alimentar o debate público. 6 Idem
  • 22. 2.2 MIGRAÇÕES E DIVERSIDADE SOCIAL A questão das migrações estrangeiras, que é uma das fontes de conflitos na Costa do Marfim, está ligada à política colonial de abertura para o exterior desenvolvido como plataforma de desenvolvimento econômico da colônia. De fato, com suas predisposições naturais, a Costa do Marfim tem ocupado uma posição privilegiada no aprovisionamento da metrópole no que diz respeito às matérias- primas agrícolas e industriais. Além do café e do cacau, a colônia dispunha de espécies de árvores como o Sipo e o Samba. Com uma população estimada em 1.532,000 habitantes em 1921 e 1.931.000 em 1936 (Dados do PNUD 1999), a Costa do Marfim não poderia fornecer a mão de obra suficiente de quê dependia a metrópole para as suas atividades econômicas na colônia. A imigração na Costa do Marfim tinha-se tornado desde então como uma necessidade. Será o resultado de um ato deliberado da administração colonial. Entre os anos 1940 e 1959, mais de 600.000 voltaicos (originários do atual Burkina Faso) foram levados para Costa do Marfim7. Boa parte destas populações vindas do país vizinho foi estabelecida em regiões do sudoeste. Vale portanto lembrar que os fluxos migratórios e os seus motivos, durante a época colonial foram essencialmente econômicos, após a independência, as migrações de trabalho tiveram um caráter ultra-liberal, que se intensificou devido ao boom econômico dos anos 1970. Com mais de Mais de três milhões em 1988, a população estrangeira alcançou quatro milhões dez anos mais tarde, seja 26,03% da 7 Idem
  • 23. população total estimada em 15.366.672 conforme a publicação do CI-RGPH (Censo Geral da População e da Habitação)8 de 1998. 2.3. TRAJETÓRIA SOCIOPOLÍTICA Desde a sua independência em 1960, a Costa do Marfim foi reconhecida pela sua estabilidade política e pela sua prosperidade sócio-econômica, sob a liderança de seu primeiro presidente, Felix Houphouet-Boigny, que dirigiu o país durante de 1960 a 1993. Félix Houphouet-Boigny Durante essa época o país atraiu grandes contingentes de trabalhadores estrangeiros, sobretudo de países vizinhos, assim como investidores. Após a morte do presidente Houphouet-Boigny em 7 de dezembro de 1993, a Costa do Marfim teve uma sucessão difícil. Desde então, ela mergulhou em uma luta sem fim pelo 8 Versão original: « Recensement Général de la Population et de l’Habitat en Côte d’ivoire ». Tradução própria.
  • 24. poder, que degenerou em uma grave instabilidade política, e culminou em 1999 em um golpe, e uma rebelião armada em setembro de 2002. Ocupada desde 1960 pelo PDCI9 , o partido no poder, a esfera política do país abriu-se em 1990 para o multipartidarismo. Nasce naquele ano o FPI dirigido pelo Professor universitário Laurent Gbagbo. Laurent Koudou Gbagbo Neste mesmo ano, o país conhecia as suas primeiras eleições presidenciais que opôseram o presidente Félix Houphouet-Boigny ao então Professor universitário Laurent Gbagbo. Houphouet-Boigny foi reeleito em 28 de outubro de 1990, com 82% dos votos. Mas morreu um ano depois e assim se iniciava a corrida pelo poder. 9 PDCI – Parti Démocratique de Côte d´ivoire. Tradução : Partido Democrático da Costa do Marfim
  • 25. 2.3.1 LUTA PELO PODER E CRONOLOGIA DOS ACONTECIMENTOS Após a morte de Félix Houphouet-Boigny, a luta pelo poder é exacerbado pelas controvérsias sobre as leis da nacionalidade e da elegibilidade nas eleições, e principalmente às presidenciais. Conforme os requisitos do artigo 11 da constituição do país modificada 1990, o então presidente da Câmara Legislativa, Aimé Henry Konan Bédié tomou posse como presidente da república. Aimé Henry Konan Bédié O economista Alassane Ouattara, então primeiro-ministro10 , também interessado no poder, renunciou ao cargo. 10 Primeiro-ministro, entender chefe da casa civil no Brasil
  • 26. Alassane Dramane Ouattara Em 1994, surge o RDR11 . O cenário político é logo ocupado por três personalidades: Bédié (presidente da República, PDCI), Gbagbo (FPI) e Ouattara (RDR). Esta luta pelo poder levou o Bédié a abrir o debate em torno da questão da nacionalidade e da elegibilidade nas eleições, e às presidenciais em particular. Nasce então o conceito de Ivoirieté, que será tratado no item a seguir. Um novo código eleitoral é adotado em 08 de dezembro de 1994. Em 1995, Bedié foi eleito presidente da República da Costa do Marfim, após eleições contestadas. Em 24 de dezembro de 1999, ele sofreu um golpe de estado militar. Foi deposto e assim, o General de exército aposentado, o Robert Guéi assumiu o poder. O general Robert Guéi, responsável pela transição militar e por organizar eleições gerais no final de 2000, recoloca na mesa de debates a questão sobre a nacionalidade e a elegibilidade. 11 RDR – Rassemblement des Républicains – Tradução : União dos Republicanos
  • 27. Em 24 de julho de 2000, a nova Constituição aprovada por referendo prevê que o candidato nas eleições presidenciais, “deve ser marfinense de pai e de mãe também marfinenses de origem e não deverá ter pegado outra cidadania12 ”. Esta nova constituição, de fato, elimina o candidato do RDR, Alassane Ouattara, cujo pai é de origem burkinabé. Após eleições tumultuadas, o Laurent Gbagbo é eleito presidente da República e toma posse em 26 de outubro de 2000. De acordo com as ações de seu programa de governo, ele estabelece a identificação como uma das prioridades de maneira a resolver a crise identitária no país. No entanto, esta política de identificação baseada na idéia de autoctonia torna-se fonte de novas controvérsias e polêmicas, tanto na sociedade como na esfera política. 2.3.2 O CONCEITO DE IVOIRITÉ Considerado o principal motivo da crise identitária na Costa do Marfim, o termo ivoirité nasceu em 1974, em um artigo do jornalista marfinense Pierre Niava13 , que tratava da vida e obra do pensador e escritor marfinense Niangoranh Porquet. De acordo com esse artigo, o conceito de ivoirité não é conceito xenófobo, mas sim parte do movimento de libertação intelectual em paralelo com o movimento da Negritude de Leopold Sedar Senghor. De fato, se a “independência” de muitos países africanos, nos anos sessenta, foi adquirida a partir de um ponto de vista político, dever-se-ia lutar por uma independência do ponto de vista, cultural, filosófico, intelectual etc. Assim, o conceito em si, “seria multiforme e englobaria a 12 Versão original: doit être ivoirien de père et de mère eux-mêmes ivoiriens et qu’il ne doit pas s’être prévalu d’une autre nationalité. Tradução própria. 13 http://ressources-cla.univ-fcomte.fr/gerflint/Afriqueouest3/boa.pdf
  • 28. dinâmica socioeconômica, o triunfo multicultural, o pensamento do Homem marfinense em toda a sua profundidade”14 . O conceito tornar-se-ia sinônimo da afirmação da sua própria identidade, levando em conta a multiplicidade das diferentes características que fundam a identidade marfinense. O termo, conforme o seu inventor, leva em conta a diversidade que constitui a riqueza da sociedade marfinense, incluindo as contribuições de diversas culturas. Seria de maneira resumida o jeito marfinense de ser e de viver. Assim, o conceito supostamente cultural, deslizará rapidamente na esfera política com o presidente Bédié. O uso do conceito no âmbito político, sem aporte teórico significativo e sem mudanças conceituais, acaba provocando novos atritos e polêmicas. O conceito foi direcionado, de fato, para questionar e levantar dúvidas sobre a nacionalidade e a elegibilidade do economista Alassane Ouattara, que seria o candidato do RDR para as eleições de 1995. O uso do termo desempenhou um papel importante na deterioração das relações entre populações do Norte e do Sul ou ainda entre muçulmanos e cristãos na Costa do Marfim. Assim, as reformas políticas e jurídicas empreendidas pelo presidente Bedié não tiveram sucesso perante a população, e levantavam dúvidas sobre o seu uso na esfera política em comparação com as características culturais e sociais conforme a definição acima mencionada. 2.3 CRONOLOGIA DE UMA CRISE: DE 2002 A 2010 Em setembro de 2002, uma tentativa de golpe de estado que fracassou, acabou levando o país para uma situação de guerra que opôs as Forças Armadas 14 Idem. Tradução Própria
  • 29. Nacionais da Côte d'Ivoire (FANCI) favoráveis ao ex-presidente Laurent Gbagbo, que controlavam o sul, aos rebeldes chamados Forces Nouvelles (FN) que vieram do país vizinho Burkina Faso e que controlavam o norte e parte do centro da Costa do Marfim. Um processo de paz foi iniciado desde os acordos de Linas-Marcoussis15 , em janeiro de 2003, e depois várias cidades e capitais africanas foram visitadas em busca de acordos que pudessem trazer de volta a estabilidade política que conheceu a Costa do Marfim até os anos 90. Entre outras capitais visitadas, temos Lomé, Acra, Pretória, onde vários acordos foram assinados por ambas as partes. Em geral esses acordos traziam em comum, pontos tal qual, a partilha do poder e uma reforma do código da nacionalidade. Vale lembrar que as principais reivindicações dos rebeldes traziam de fato a questão da nacionalidade e da elegibilidade do Alassane Ouattara. A esfera política marfinense apresentava desde então uma configuração. Por um lado, as "Forces Nouvelles" e os partidos como RDR, PDCI e outros nanicos que, desde os acordos de Marcoussis passaram a exigir a aplicação destes e de outro lado, o campo presidencial e aqueles que rejeitavam os ditos acordos. Esse contexto complexo e confuso, em que não havia paz nem guerra, levou à adoção de diversas resoluções da parte das Nações Unidas, e acabaram também não surtindo efeito. Em 2007, com a situação de bloqueio após as diferentes negociações, o então presidente da Costa do Marfim resolveu iniciar negociações diretas com os rebeldes, sob a mediação do presidente do Burkina Faso. Essas negociações levaram a novos acordos de paz, chamados acordos de Uagadugu, em 4 de março de 2007. Após estes acordos, o Guillaume Kigbafori Soro, chefe da 15 Cidade do sul da França.
  • 30. rebelião se tornou primeiro ministro e tinha como missão reunificar o país e resolver a questão da identificação da população marfinense e organizar eleições justas, transparentes e abertas a todos. Guillaume Kigbafori Soro Nestes acordos, constava também o desarmamento dos rebeldes e das milícias. 2.5. CONTEXTO SOCIOECONOMICO: DA PROSPERIDADE À CRISE ECONOMICA Depois de duas décadas gloriosas (1960-1980) chamado de "milagre marfinense"16 , a economia da Costa do Marfim entra em uma fase de crise com consequências socialmente significativas. A dependência do crescimento do exterior 16 http://www.ritimo.org/dossiers_pays/afrique/cote_ivoire/cote_ivoire_miracle.html
  • 31. e principalmente da França, e a gestão dos benefícios do crescimento constituem as raízes dessa decadência econômica. A partir dos anos 1960, a Costa do Marfim independente opta por um desenvolvimento econômico baseado na exportação de matérias primas agrícolas, como o café e principalmente o cacau, cuja produção até hoje faz dela o primeiro produtor mundial. E também a exploração de minerais e madeira e mais tarde o petróleo. O país e suas principais riquezas econômicas Os altos preços do núcleo café-cacau nos mercados internacionais permitiram ao o Estado financiar projetos de modernização. O crescimento da produção provocou a migração de populações do centro e norte da Costa do Marfim, e populações estrangeiras, e particularmente do Burkina Faso, e do Mali atraídos pelo crescimento, para as regiões florestais do sul. Esta política agrária foi incentivada por Houphouet-Boigny. Para a ocupação da terra, houve um compromisso entre autóctones e estrangeiros. A integração de diferentes grupos baseia-se nos direitos tradicionais à terra: o direito de usar sem ser de fato proprietário.
  • 32. Este sistema se mostrou eficaz até os anos 1980. Os agricultores da Costa do Marfim e imigrantes foram envolvidos ativamente no crescimento da produção e da prosperidade do país. Entre 1974 e 1978 os preços das matérias-primas estão altos. A produção aumenta, de modo que a Costa do Marfim se posiciona como primeiro produtor mundial de cacau. Os agricultores beneficiam da redistribuição de renda17 . Numerosos investidores e empresas investem na Costa do Marfim. Segundo dados do Banco Mundial apresentados por Cogneau e Mesplé- Somps em seu artigo publicado em Afrique Contemporaine de Verão 2003, a taxa de crescimento do PIB marfinense é de 7% durante o período de 1960-198018. Falamos então de modelo de desenvolvimento da Costa do Marfim e do "milagre marfinense". No entanto, esta prosperidade está baseada em produtos cujos preços são fixados em outros lugares, nos mercados internacionais e dependendo, portanto das especulações. Os preços do cacau e café apresentam uma queda a partir de 1979, seguindo o boom do petróleo de 1973-197819. Essa deterioração dos termos de troca constituirá um freio para a fase de crescimento econômico em que se encontrava o país. Ela reduz a capacidade reguladora do Estado. No início dos anos 1980, frente à queda dos preços do café e do cacau, a economia do país entra em recessão. Há uma diminuição drástica dos recursos financeiros do estado. No entanto, o país que, durante o período do milagre marfinense, acabou se endividando, se deve de pagar a sua dívida. As instituições financeiras internacionais resolveram não emprestar mais ao país. 17 DUBRESSON, A., Ville et industries en Côte d’Ivoire. Pour une géographie de l’accumulation urbaine, Karthala, Paris, 1989. 18 Cogneau, Denis ; Mesplé-Somps, Sandrine, « les illusions de l’économie ivoirienne et la crise politique », Afrique contemporaine, n° 206, Eté 2003. 19 Idem
  • 33. Diante da deterioração da situação financeira do país, e a necessidade de honrar as dívidas, o país é forçado a aplicar programas destas instituições financeiras, chamados “Programas de Ajustamento Estrutural”. Estas medidas levarão à desvalorização do franco CFA, moeda dos países francófonos da África. Vale salientar que estas medidas não foram aplicadas apenas na Costa do Marfim, mas em todas as “ex-colônias” francesas. As reformas liberais de estabilização financeira aplicadas entre os anos 1980 e 1990 não levaram aos resultados esperados. A desvalorização da moeda CFA contribuiu para uma deterioração mais acentuada da economia do país. As repercussões desta crise são importantes, tanto em áreas urbanizadas como em áreas rurais. O consumo médio per capita diminui quase pela metade durante o período entre 1985 e 1993. A baixa na receita triplicou o índice de pobreza que aumento de 10 para mais de 30%20 . Em 1985, metade dos pobres se localizava, sobretudo nas regiões de savana, nas regiões do Centro e Norte do país. Mas com a queda dos preços do café e do cacau, a pobreza aumentou também nas regiões florestais do Sul. O aumento dos preços após a desvalorização nos mercados locais tem contribuído para a deterioração das condições de vida das famílias. Os laços de solidariedade antigamente presentes nos hábitos das populações começaram a desaparecer e as pressões das comunitárias já não encontravam satisfação. A persistência da crise econômica reaviva as tensões sociais21 . A esta situação, acrescentaram-se as tensões ligadas à terra. O processo de desenvolvimento rural dirigido pelo Estado durante os anos 1970 ganha uma nas 20 Akindès Francis, « Inégalités sociales et régulation politique en Côte d’Ivoire. L paupérisation en Côte d’Ivoire est-elle réversible ? » Politique africaine, n°78, juin 2000. 21 Idem, p.29
  • 34. relações sócio-espaciais que permitiram o crescimento econômico do país e a integração de comunidades estrangeiras no espaço territorial. Cabe salientar que a promoção da política agrária na Costa do Marfim girava em torno de um slogan lançado pelo presidente Houphouet-Boigny em 1970: “a terra pertence a quem a valoriza”. Com este slogan incorporado na ideologia liberal, o Estado afirma que a terra lhe pertence e a coloca a disposição de quem quiser valorizá-la em despeito do direito dos autóctones sobre as terras. Nesta base, os Baulês, populações do centro do país e os burkinabês que não têm o direito à terra, tornam-se os latifundiários em regiões que os receberam22. Se a intervenção do Estado na regulação da economia agrícola funcionou através de programas de planejamento de uso da terra para trabalhar, isso tem gerado também um efeito de sobrecarga ou saturação das terras agrícolas disponíveis. Estima-se que de 16 milhões de hectares de floresta em 1960 no sul, existem hoje menos de 2 milhões. A unidade de sócio-espacial formada na base do direito tradicional começa a sofrer mudanças. Conflitos marcam a relação entre autóctones e alógenos quando estes começam a reivindicar o direito à terra, de acordo com a ideologia da "terra pertence a quem a valoriza”. A pressão demográfica aliada ao desmatamento reduz as possibilidades de convivência entre autóctones e alógenos e contribuem para o surgimento de disputas de terra em áreas rurais. De fato, o rápido desmatamento e a pobreza levaram os jovens a fugir massivamente aldeias para as cidades. Mas, perante a falta de alternativas com o modelo urbano, além da proliferação de atividades informais, os jovens, às vezes 22 DEMBELÉ, Ousmane « La construction économique et politique de la catégorie « étranger » en Côte d’Ivoire » dans Marc Lepape et Claudine Vidal (Eds) Côte d’Ivoire. L’année terrible 1999-2000, Karthala, Paris, 2002, pp.123-171.
  • 35. com níveis superiores e desempregados, resolvem voltar para as áreas rurais. Este retorno é incentivado pelo Governo na década de 1980. Porém, o retorno não é feito sem causar tensões ligadas à terra. São motivos que evidenciam em certa medida a grave crise pela qual está passando a Costa do Marfim. Poderíamos afirmar sem medo de errar que pano de fundo da crise marfinense é principalmente o estado de empobrecimento que se iniciou com o declínio da boa fase econômica. Porém, vale salientar a presença de contingências externas e influenciadoras na crise, que não caberiam desenvolver aqui devido ao tema escolhido. Outros estudos permitiram trabalhar em pormenor a crise marfinense. Tentamos trazer apenas alguns elementos suscetíveis de facilitar o entendimento do ambiente sócio-político marfinense, a questão identitária e as crises repetitivas no país.
  • 36. 3. O SISTEMA POLÍTICO-PARTIDÁRIO E AVANÇOS DEMOCRÁTICOS Depois de 30 anos de partido único, a Costa do Marfim passou por um período de transição democrática com a abertura do país para o multipartidarismo. Apesar de todas as mudanças anticonstitucionais sofridas pelo país a partir dos anos 1990 e posteriormente pelas situações dramáticas sofridas pelo país, houve avanços democráticos significativos, embora a situação do país hoje, nos leve a acreditar no contrário. O exame das diferentes Constituições do país permite afirmar que elas favoreceram importantes avanços no que diz respeito a consolidações das instituições e da democracia. Esta afirmação pode se verificar pelo modelo de racionalização da expressão do poder que delas surgiram. 3.1. PODERES E PLURALISMO POLÍTICO O Pluralismo político e a separação dos poderes são pilares importantes, e princípios organizacionais do poder a partir dos quais nasce a democracia. A contribuição das Constituições marfinenses para racionalização da expressão do poder consistiu em evidenciar estes princípios organizacionais, de forma que se consegue na teoria separar o Poder executivo, dos poderes legislativo e judiciário. No caso presente, trataremos apenas dos casos dos Poderes Executivos e Legislativos. A ideia de separação do poder executivo dos outros poderes surgiu de erros e excessos observados na passagem da Costa do Marfim colônia para país “independente”. A primeira Constituição da Costa do Marfim independente
  • 37. autorizava o multipartidarismo23 . Era uma disposição original que deveria permitir a expressão do sufrágio com bases pluralistas. De tão surpreendente que possa parecer, essa disposição importante e inédita para um país africano, francófono e que acabava de se tornar independente, gerou esperanças de curta duração. O sistema de partido único acabou se impondo com era de práxis nos outros estados da África do oeste. Os partidos políticos opostos ao sistema de partido único não podiam ter uma existência legal, portanto obrigados a permanecer na clandestinidade. É o caso do FPI que nasceu em 1982 e só pude oficializar as suas atividades apenas em 1990, após a abertura do país para o multipartidarismo. 3.2 O PODER EXECUTIVO Depois de 30 anos de existência, o sistema de partido único que era uma prática anticonstitucional, autoritária e digna de um sistema ditatorial, cedeu sob a pressão de uma sociedade ávida de liberdade de expressão e de pluralismo ideológico e político. Esta fase que se iniciou no final dos anos 1980 ganhou em efetividade no Começo de 1990. Essa mudança abriu as portas para o início de uma transição democrática para a expressão do poder executivo, perceptível tanto ao nível do mecanismo do acesso ao poder como as regras para o exercício do poder. No que diz respeito às regras do acesso ao poder executivo, o primeiro fato importante é o reconhecimento de uma oposição no sistema político com direitos constitucionais. Essa mudança se deu na revisão constitucional de 199024 . O país estava de volta para o constitucionalismo. 23 Artigo 7 da Constituição: Os partidos e movimentos políticos concorrem à expressão do sufrágio... 24 Draft paper presented at African Network of Constitutional Law conference on Fostering Constitutionalism in Africa Nairobi April 2007.
  • 38. Outro elemento importante é a elaboração de condições estritas de acesso ao poder, inscritas no Artigo 35 da Constituição de 200025 . Apesar das diversas controvérsias provocadas por este artigo, é preciso dizer que este artigo tem a vantagem de promover mais transparência na gestão do jogo político. Na realidade, a importância dos elementos levados em conta é a vontade de “limpar” o caminho que leva ao poder político. Evidentemente, esta posição não nega os vieses que poderiam se introduzir na aplicação dessa disposição, como foi o caso da recuperação política que fez dela uma disposição excludente. Sem querer entrar positivismo exagerado, esta posição baseia-se naquilo que há de vantajoso neste artigo, que como fundamento jurídico garante a vontade dos marfinenses de querer um poder executivo dirigido por uma pessoa que beneficiaria de um mínimo de integridade. Além disso, a Constituição de 2000 estabelece a criação de uma Comissão Eleitoral Independente. O principio da organização de eleições livres é adquirido desde a abertura do país para o multipartidarismo em 1990, e a Constituição de 2000 impõe a necessidade da criação de quadro institucional adequado. No que diz respeito às regras do exercício do poder, elas sofreram alterações progressivas. Primeiramente, com um executivo monocéfalo criado pela Constituição de 1960, nasce um executivo bicéfalo com a revisão constitucional de 199026 . De fato, se analisarmos o regime político marfinense que um regime presidencialista, a instituição de um primeiro ministro torna-se atípico. Porém no contexto de um sistema de partido único, a presença de um primeiro ministro reduziria o exercício exclusivo do poder executivo pelo presidente da república, e lenificaria a imagem 25 Constituição elaborada após o golpe de estado de 1999 e aprovado por mais de 86% dos eleitores. 26 Lei constitucional n°90- 1529 de 06 de Novembro de 1990. Tradução própria.
  • 39. ditatorial do regime político marfinense. Há também outro fato não menos importante que é a limitação do mandato presidencial. Trata-se de um mandato com uma duração de cinco (5) anos, renovável uma (1) vez. Conforme o artigo 3527 da Constituição marfinense, a idade mínima para participar às eleições presidenciais é de quarenta (40) anos, e a máxima é de setenta e cinco (75) anos. O candidato deve ser marfinense de origem, com os seus pais também marfinenses de origem. Acrescenta-se a estas disposições, declarações de boa saúde física e mental, do seu patrimônio. A eleição do presidente é adquirida à maioria absoluta dos sufrágios. Caso não obtida, acontece um segundo turno, quinze (15) dias após a proclamação dos resultados do primeiro turno. Apenas se apresentam os dois primeiros colocados do primeiro turno. O primeiro turno das eleições presidenciais acontece durante o mês o mês de outubro do quinto ano do mandato do presidente da Republica. 3.3 O PODER LEGISLATIVO Tendo escolhido o regime presidencialista desde a independência, a Assembleia unicameral da Costa do Marfim, não tinha poderes para destituir o presidente da República. Este tinha e continua tendo uma supremacia total no exercício do seu poder. Portanto o papel da Assembleia se limitava apenas a suas prerrogativas legislativas. A competência exclusiva a ela reconhecida na edição das normas lhe dava a autoridade nas suas atividades. 27 Constituição de 2000
  • 40. O Poder legislativo marfinense era antes da transição democrática “parte do poder executivo”28 . A partir de 1990, a ativação do pluralismo político revaloriza o poder legislativo. Primeiramente, a configuração da Assembleia muda. Sua nova estrutura heterogênea quebrou o monopólio partidário. Hoje, com as eleições de 2011, a nova Assembleia caracteriza-se pela diversidade, mesmo arbitrária e não respondendo às aspirações e votos dos marfinenses, ela é composta por deputados de “diversos partidos políticos”. A duração da legislatura é de cinco (5) anos. O mandato dos parlamentares é renovável. Eles são eleitos no sufrágio universal direto. 3.4 O PROCESSO ELEITORAL MARFINENSE A Costa do Marfim teve acesso à soberania internacional em 1960 e tornou- se República da Costa do Marfim. Seus textos fundadores fazem do povo, o Soberano; Ele é quem “exerce a soberania” através dos seus representantes eleitos. Esta opção está confirmada na Constituição de 200029 . A jovem República, como a maioria dos países africanos de língua francesa, retoma a legislação do antigo colonizador ou adota textos que tem fundamentos nos princípios gerais do direito francês. A eleição se torna o modo exclusivo para a designação dos governantes. Para que esta eleição seja a expressão da livre escolha do povo, os princípios são apoiados e complementados por textos que respeitam os critérios internacionais como: 28 WODIE, Francis, Institutions politiques et droit constitutionnel em Côte d´ivoire. Abidjan, Presses Universitaires de Côte d´ivoire, 1996, p.370. 29 http://democratie.francophonie.org/IMG/pdf/Cote_d_Ivoire.pdf
  • 41. a) O sufrágio é universal, igual e secreto, portanto “aberto a todos”; existem, porém discriminações legais. Elas são reduzidas e constituem fora a questão da idade, a sanção da comissão de atos incompatíveis com a qualidade de representante do povo. b) Para ser eleitor, tem que ser cidadão marfinense, gozando de todos os seus direitos civis e políticos, sem ter sido condenado e preso por crimes de roubo, estelionato, falsidade ideológica, desvio de bens públicos, corrupção etc. c) As candidaturas são abertas a quem preenche todas as condições. 3.4.1 AS INSTITUIÇÕES RESPONSÁVEIS PELAS ELEIÇÕES NA COSTA DO MARFIM A organização das eleições respeita a separação dos poderes que nelas intervém e que permanecem independentes uns com relação aos outros na execução das diferentes tarefas. Existem duas instituições responsáveis por todo o processo eleitoral, desde o cadastro dos eleitores, o registro das candidaturas até a publicação dos resultados definitivos. 3.4.1.1 A COMISSÃO ELEITORAL INDEPENDENTE A Comissão Eleitoral Independente (CEI) é o responsável administrativo das eleições na Costa do Marfim. Ela é responsável por organizar, supervisionar e
  • 42. monitorar a conduta de todas as eleições em conformidade com as leis e regulamentações30 . Ela proclama os resultados provisórios. 3.4.1.2 O CONSELHO CONSTITUCIONAL No quadro do processo eleitoral, o Conselho Constitucional controla a regularidade das operações eleitorais, avalia o contencioso eleitoral e proclama os resultados definitivos31 das eleições. 30 Artigo 2 da Constituição de 2000. 31 Artigos 32 e 94 da Constituição de 2000.
  • 43. 4. AS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS DE 2010 E A CRISE PÓS-ELEITORAL Os acordos de paz ocorridos em 2007 conseguiram trazer certa confiança para a população marfinense cansada por anos de crises intermináveis. As eleições presidenciais traziam em si fatores positivos para a população, como a abertura à livre circulação do Norte para o Sul, a reunificação do país, o cessar fogo, e perspectivas de relance econômico após as eleições. Em geral, as eleições de 2010 marcariam de fato o fim da guerra na Costa do Marfim. O primeiro turno das eleições foi satisfatório no seu conjunto, devido à participação da população marfinense. 32 32 http://www.rfi.fr/afrique/20101104-cote-ivoire-enseignements-premier-tour
  • 44. 33 O segundo turno das eleições presidenciais inicia-se com um clima tenso, e completamente oposto ao clima de festa que reinava no primeiro turno. Esta situação acabará influindo o período pós-eleitoral e levará a uma crise sem precedente no país. Daí nasce uma psicose quanto ao risco cada vez maior de guerra civil generalizada. O quase caos na Costa do Marfim chama a atenção das organizações regionais e internacionais e atrai todos os olhares quanto à busca por uma solução duradora para sair da crise, mas antes, entender os motivos e a verdade sobre os acontecimentos. 33 http://www.rfi.fr/afrique/20101104-carte-resultats-premier-tour-presidentielle-ivoirienne
  • 45. É importante ressaltar nesta fase do trabalho que embora marfinense e com um posicionamento claro perante a crise que vive o país, a objetividade do trabalho acadêmico e tema em si necessitam a produção de uma argumentação não partidária, mas apenas uma exposição dos fatos conforme relatos da mídia, que também tem responsabilidade comprovada nos conflitos em geral e no caso específico da Costa do Marfim. Cabe acrescentar também que o objetivo não é apresentar de forma detalhada os acontecimentos da crise pós-eleitoral. O nosso objetivo será uma breve exposição com uma análise dos fatos importante dessa crise. O segundo turno das eleições presidenciais foi marcado pela proclamação de dois resultados contraditórios. Um resultado proclamado pelo presidente da Comissão Eleitoral Independente no Quartel Geral do Candidato Alassane Ouattara, que representava a oposição. Esses resultados o deram como vencedor das eleições com mais de 54% dos votos, e acabaram levando a controvérsias quanto á validade jurídica e ética da proclamação de tais resultados. Isso se justifica ainda mais na medida em que esses resultados não foram detalhados como os do primeiro turno e foram dadas em circunstâncias duvidosas como, por exemplo, o fato dos resultados serem proclamados apenas pelo presidente da Comissão Eleitoral Independente, sem a presença dos vice-presidentes deste órgão administrativo, no Quartel Geral do Candidato Ouattara e no quarto dia após as eleições, enquanto a Constituição prevê um prazo máximo de três (3) dias, para a proclamação dos resultados provisórios que deveria logo em seguida ser averiguada e confirmada ou não pelo Conselho Constitucional. O segundo resultado foi dado pelo presidente do Conselho Constitucional em ruptura com o resultado dado horas antes pelo presidente da Comissão Eleitoral
  • 46. Independente. Com base em relatos e informações comprovadas, de fraudes em massa e violências físicas contra os seus militantes, a coalizão de partidos que apoiava o presidente Gbagbo entrou com pedidos em anulação dos votos em algumas regiões do país. Esses pedidos encontraram um parecer favorável da parte do Conselho Constitucional que na base das provas apresentadas, anulou os resultados de sete departamentos do Norte e do Centro do país e proclamou a vitória do presidente Laurent Gbagbo com um pouco mais de 51%. Cabe mencionar que estes departamentos eram todos majoritariamente favoráveis ao candidato da oposição, o Alassane Ouattara. Outro fato importante é a entrada em jogo do representante da ONU que tinha um mandato de certificação dos resultados das eleições e que acabou confirmando o resultado dado pelo órgão administrativo (a Comissão Eleitoral Independente) que davam o candidato da oposição como vencedor das eleições. Segue-se a partir deste momento uma fase muito confusa em que se assistia a dois eventos de posse. Um primeiro no respeito do ritual habitual e o outro por escrito a partir do seu Quartel Geral. Cada um formou o seu governo. O governo do presidente Gbagbo tinha um controle efetivo do poder, visto que controlava o conjunto dos pontos e setores estratégicos do país, exceto as regiões ocupadas pela rebelião. Um Controle e uma efetividade do poder que se faziam apesar do embargo econômico da Europa sobre a Costa do Marfim, que autorizava o fechamento do Banco Central de todos os bancos europeus presentes no país. O segundo governo, o do Alassane Ouattara, com relação ao primeiro, tinha uma audiência diplomática, principalmente apoios de países como França, Inglaterra e a maioria dos países europeus, os Estados Unidos e de países africanos, além do
  • 47. apoio da rebelião no país. Era um governo mais passivo, que apenas esperava decisões da comunidade internacional para resolução da crise. Inicia-se uma nova fase de confrontos militares entre as forças leais ao presidente Laurent Gbagbo e a rebelião. Notou-se um avanço importante sem resistência da rebelião e a ocupação de alguns bairros da Capital Abidjan, favoráveis ao Alassane Ouattara. A partir do dia 28 de março de 2011, os rebeldes lançaram o ataque final que eles chamavam “a conquista de Abidjan”34 . Frente a militares com armamentos pesados e muito bem treinados, que tinham um conhecimento aguçado e claro da arte da guerra e que defendiam suas posições naquilo que chamavam guerra de libertação, encontravam-se rebeldes desordenados e indisciplinados. Eles apresentavam lacunas importantes em estratégias militares que foram decisivas na guerra de Abidjan onde sofreram uma grande derrota com a perda de um importante contingente de rebeldes. Vendo o desequilíbrio das forças e a derrota dos rebeldes a missão das Nações Unidas na Costa do Marfim e a Força francesa no país entraram em ação sob uma resolução35 da ONU que impedia o uso de armamentos pesados contra civis e sanções contra algumas personalidades favoráveis ao regime do presidente Gbagbo. A ambigüidade dessa resolução e as chamadas repetidas do Alassane Ouattara e do chefe da rebelião Guillaume Kigbafori Soro, levaram as forças estrangeiras acima mencionadas a entrarem de fato na guerra contra o regime do presidente Gbagbo. O principal argumento apresentado para essa guerra contra o regime de Gbagbo era a “proteção dos civis”. Um uso desproporcional de armamentos de guerra contra pontos estratégicos, tais quais a residência do 34 Tradução própria – Versão original: “La conquête d´Abidjan”. 35 A Resolução 1975 do Conselho de Segurança da ONU sobre a situação da Costa do Marfim.
  • 48. presidente da República, a Presidência da República, bases militares e até cidades universitárias que abrigariam milícias favoráveis ao presidente Gbagbo. No dia 11 de abril de 2011, no período da tarde, e após intensos bombardeios das forças francesas e da ONU contra a sua residência, o presidente Laurent Koudou Gbagbo é capturado pelas forças francesas e entregue aos rebeldes do Alassane Ouattara e Guillaume Soro. Uma captura vergonhosa, que apresentavam imagens de um chefe de Estado humilhado que parecia não ter consciência da gravidade da situação, cujo é um dos principais antagonistas e responsáveis. O presidente Laurent Gbagbo sendo levado pelos rebeldes para o Quartel Geral do seu adversário Alassane Ouattara O dia 11 de abril de 2011 é o dia que marcaria de fato a divisão dos marfinenses, criando dois sentimentos que reavivam a psicose de uma guerra civil. Para parte dos marfinenses é o dia de vitória contra a ditadura do regime Gbagbo. Para os outros, favoráveis ao presidente Gbagbo e/ou nacionalistas é uma grande humilhação e indignação perante aquilo que é chamado de regresso para a colonização. Para eles era difícil entender bombardeios contra a residência do
  • 49. presidente e, sobretudo o argumento da proteção de civis para provocar a morte destes que se pretendia defender. Esta situação sem precedente na Costa do Marfim coloca o país a beira de uma guerra civil que poderá explodir a qualquer momento. Daí surge diversos questionamentos sobre os tratamentos recebidos por parte dos partidários do Gbagbo. Há necessidade de manter personalidades do país, ex-ministros e presidentes de instituições presos sem direito a defesa nem motivos para permanecerem na cadeia? Há necessidade de bloquear bens, salários e até aposentadorias de pessoas que a certo momento da história do país serviram o estado nos seus altos escalões. Como é que poderá acontecer a reconciliação entre marfinenses se parte da população continua frustrada ocasionando feridas cada vez mais profundas entre cidadãos de um mesmo país? A ex-Primeira Dama da Costa do Marfim sendo humilhada e maltratada por rebeldes
  • 50. O Michel Gbagbo, Professor universitário e filho do presidente Gbagbo, preso, sendo humilhado e maltratada por rebeldes, sem ter cometido nenhum crime.
  • 51. 5. COMUNICAÇÃO POLÍTICA E INTERNET No contexto mundial, a política se faz através do uso das mídias. E com a chegada da internet, há uma necessidade de mudança e de adaptação da parte dos outros meios de comunicação, repensar o jeito de veicular a informação numa época em cada um de nós constitui uma fonte de informações. A entrada da internet na comunicação política mudou de maneira significativa as relações entre as mídias tradicionais e os políticos. A comunicação política via www apresenta-se na Costa do Marfim, assim como em outros lugares do mundo, sob duas formas que evoluem não separadamente, mas juntas. Uma primeira forma que se enquadraria na comunicação oficial, é mais usada por partidos políticos, por candidatos e/ou instituições. Ela é feita seguindo regras e leis ditadas pelo jogo político. Do outro lado a uma comunicação, mais virulenta, e que usa todos os meios de ataques, em geral ilegais para com adversários políticos. A internet é, portanto uma ferramenta de diálogo e uma arma de combate a serviço dos políticos. Mídia privilegiada por parte da população marfinense alfabetizada e/ou da elite residente no país ou da diáspora, a internet impõe mudanças radicais em diversos setores. Iniciaremos o nosso trabalho apresentando o espaço público e o perfil dos internautas marfinenses e em seguida analisaremos o quadro da comunicação política via internet nas eleições de marfinenses.
  • 52. 5.1. A INTERNET E O ESPAÇO PÚBLICO MARFINENSE No contexto marfinense, podemos dizer que a internet favoreceu uma liberdade expressão para políticos e movimentos que até os 2000 tinham pouco espaço para expressar a sua ideologia e idéias. Vale salientar que a situação de crise e principalmente o período após o golpe de 2002, a internet começou a ocupar um lugar importante na comunicação em geral e na comunicação política em particular. A internet torna-se o novo espaço de expressão da liberdade e de reivindicações para partidos, movimentos e outros indivíduos. As limitações do jogo midiático, que durantes décadas não possibilitavam a expressão plural por três motivos essenciais: O controle das mídias pelo governo com apenas dois canais de TVs (RTI 1 e 2)36 sob o seu domínio que as organiza de maneira a satisfazer propagandas unilaterais, de elogios pro governo, também pela falta de interesse e credibilidade, da parte do cidadão marfinense para com os políticos e por fim a falta de recursos para o uso diário da mídia impressa. O tradicional domínio das mídias tradicionais sobre as informações que deveriam ou não levadas ao público passa a ser contestado com a chegada da internet. Há uma mudança significativa naquilo que eu chamaria de “ditadura da mídia”37 para usar os termos de Altamiro Borges, pois o fazer a informação torna-se accessível a todos, pelo menos para aqueles que teriam acesso a internet. Com a internet os debates e as opiniões não são mais orientados pelas mídias tradicionais. São os indivíduos e internautas que decidem o que é importante e prioritário para leitura, para escuta etc. 36 http://www.rti.ci/ 37 BORGES, Altamiro. A ditadura da mídia. São Paulo: Anita Garibaldi/Associação Vermelho, 2009.
  • 53. Essa fase importante no espaço público marfinense nos leva a apresentar o quadro dos usuários da internet na Costa do Marfim. O número de usuários da internet na Costa do Marfim assim como no mundo inteiro continua em constante crescimento. 5.2. DADOS QUANTITATIVOS E QUALITATIVOS Segundo dados de Agência Reguladora a ATCI (Agência das Telecomunicações da Costa do Marfim) publicados na revista NETCOM38 em 2005, tinha no final de 2002, 15.354 assinantes à internet e mais de 70.000 internautas, uma proporção de cerca de 4,3 usuários para cada 1.000 habitantes. Se considerarmos que na África em geral, e particularmente na Costa de Marfim, que a caixa postal e os endereços eletrônicos servem de canal de comunicação para várias pessoas, o número relativo à comunidade de usuários é logicamente mais alto do que aquele apresentado pela Agência Reguladora. O potencial de crescimento do país nesta área é maior, considerando a baixa das tarifas para assinantes e também pela concorrência favorecida pela presença no país de diversos fornecedores de acesso à internet. O problema fundamental da expansão da internet na Costa do Marfim, e na África em geral, vem da necessidade de ter um computador ou um telefone, duas ferramentas nem sempre acessíveis para o cidadão comum. A esta necessidade material acrescenta-se a necessidade de possuir conhecimentos básicos em informática. 38 LOUKOU, Alain F. Networks and Communication Studies. NETCOM, Vol.19 (2005), n° 1-2, pp. 23- 52
  • 54. Dados mais recentes publicados pela Planet Expert39 no seu site atualizam informações a respeito do país. Segundo este site, com uma população total de 19.737.800, a Costa do Marfim possui 1,6 computadores para cada 100 habitantes e 3,2 usuários da internet para cada 100 habitantes, dando um total de 631609,6 internautas na Costa do Marfim, lembrando que são números que podem ser revisados devido ao argumento apresentado na página anterior sobre o uso do email como ferramenta de comunicação. É importante mencionar que os dados quantitativos sobre o público dos internautas marfinenses como público particular correspondem a um público socioeconômico relativamente especifico. O retrato40 típico do internauta marfinense é o de um jovem com um nível de estudo, estatuto social e com uma renda mais ou menos razoável. Seria, portanto um público jovem e alfabetizado que seria politicamente bem informado e as vezes com certo engajamento sociopolítico que representa proporcionalmente um eleitorado com uma alta participação nos debates eleitorais. 39 http://www.planet-expert.com/fr/pays/cote-d-ivoire/chiffres-cles 40 Op.cit
  • 55. 6. A COMUNICAÇÃO POLÍTICA VIA INTERNET A comunicação política via internet, na Costa do Marfim assim como no resto do mundo, traduz a vontade de apresentar as suas opiniões aos outros e, se possível, levá-los a abraçar essas opiniões. E para isso diversas ferramentas da internet são usadas, os sites (sites de partidos políticos, de candidatos), os grupos de discussão, blogs e o twitter. 6.1. OS SITES O site web é a ferramenta central da comunicação política na internet, e todos os grandes partidos políticos41 da Costa do Marfim possuem um site internet. Existe até um site para a rebelião no país, sinal da importância da comunicação política na Internet para os atores do ambiente político marfinense. Apesar do grande número de partidos, em torno de 13042 , apenas uma dezena possui um website. 41 http://www.afrique-express.com/afrique/cotedivoire/cote-d-ivoire-liens.html 42 www.izf.net/pages/côte-d-ivoire/4926/
  • 56. Website do PDCI43 de Henry Konan Bédié Se hoje há grandes motivações para o uso da internet para fins políticos, é importante dizer que o início da comunicação política no país não foi dos mais promissores, primeiro pela falta de conhecimento com relação a esta ferramenta, a sua capacidade de mobilização até fora das fronteiras e, segundo, devido aos custos altos para se manter um website na Costa do Marfim até alguns anos atrás. 43 http://pdcirda-suisse.org/
  • 57. Website do RDR44 de Alassane Ouattra Igualmente, a grande motivação pelo uso da internet para uma comunicação política veio também do interesse dos internautas que como mencionado nas linhas anteriores, são em grande maioria jovens e formadores de opinião. Hoje o uso da internet tornou-se uma ferramenta quase indispensável pelos políticos. Além dos websites dos partidos, os sites mais presentes e mais visitados são os pessoais dos candidatos, que têm maior visibilidade. Nota-se que o profundo enraizamento do personalismo político é um dos fatores da valorização dos sites pessoais. A cultura do político demiurgo ainda é significativa no fazer política na Costa do Marfim. 44 http://www.rdrci.org/main.asp
  • 58. Site de Alassane Ouattara45 Site de Laurent Gbagbo46 45 http://www.adosolutions.ci/ado/home.php 46 http://www.gbagbo.ci/
  • 59. E com as eleições presidenciais de 2010, houve um crescimento importante de sites na internet para a campanha. A maioria deles já deixou de existir, mas tiveram grandes impactos durante a campanha. A crise pós-eleitoral veio também ampliar esse horizonte comunicacional dando vida a diversos sites de resistência. 6.2 OS BLOGS, CHAT E GRUPOS DE DISCUSSÃO Assim como o Rádio e a TV, a internet já começou a revolucionar o mundo da comunicação política. Não se trata apenas de alguns internautas passivos com o sonho da democracia eletrônica direta; há uma organização dos cidadãos, através de lista de difusão e de fóruns, em comunidades virtuais, em torno de uma causa ou de um objetivo comum. Hoje com a crise pós-eleitoral há uma presença de diversos de grupos de resistência ou fan clubs. O site de relacionamento Facebook é hoje a referência no que diz respeito a debates sobre a Costa do Marfim e, aliás, de assuntos ligados ao mundo inteiro. Inúmeros blogs também tratam de assuntos ligados à Costa do Marfim e principalmente da crise pós-eleitoral. Os grupos de chat e de discussão relevam uma vontade de diálogo, mas existe também diferenças notáveis entre estas duas formas de comunicação. Os grupos de discussão sobre a Costa do Marfim constituem um elemento importante e em constante crescimento na internet e principalmente nas redes sociais.
  • 60. 7. A COMUNICAÇÃO POLÍTICA E A INTERNET NAS ELEIÇÕES DE 2010 É importante dizer que o período eleitoral de 2010 na Costa do Marfim definiu uma fase importante para o uso da internet como ferramenta para a comunicação política. Portanto é relevante analisar os sites dos partidos e candidatos durante e depois da campanha. Faremos apenas uma análise do conteúdo deixando de lado aspectos relativos à construção do site e uso de ferramentas para especialistas. O nosso intuito é apenas tratar da noção de conteúdo. Avaliaremos tanto as riquezas da informação para campanha eleitoral e as modalidades segundo as quais o acesso foi organizado. Vale dizer que a crise pós-eleitoral de fato destruiu o avanço no uso da internet para comunicação política, com o desaparecimento de diversos sites e blogs de campanha que deram espaço hoje para site de resistência e blogs. 7.1 O CONTEÚDO DOS SITES Dois dos maiores partidos do país, representados pelos três potenciais candidatos (Alassane Ouattara, Laurent Gbagbo), respetivamente, o RDR, o FPI, investiram muito durante a campanha eleitoral e a comunicação política via internet foi uma área bastante aproveitada. Porém diversos questionamentos vêm à tona, quando se trata dos serviços que foram disponibilizados durante o período eleitoral e após as eleições, para os internautas. Dois pontos serão analisados. Primeiramente o contato com os militantes e eleitores via internet e os links e outros recursos oferecidos.
  • 61. 7.1.1. MILITANTES E ELEITORES COMO INTERNAUTAS Os sites marfinenses de candidatos e partidos foram planejados durante o período eleitoral para um público específico e restrito, mas muito importante, por este ser composto de formadores de opiniões e potenciais cabos eleitorais. Estes sites iniciaram as suas atividades apenas para serem um meio adicional de informações e uma plataforma de agenda e divulgação detalhada dos programas de governo de cada partido e governo, mas também uma forma de abrir espaço para debates e contribuições. Havia a necessidade de criar um espaço de troca de informações, de dados, de downloads e transferência de documentos, também para marfinenses e eleitores da diáspora. Sem medo de exagerar, podemos afirmar que o intuito dos comunicadores ao incentivarem o uso da internet durante a campanha para aproximar ainda mais os candidatos deste público específico que faz parte da “classe mais intelectualizada ou a chama classe A/B, com troca de e-mail, chat e vídeos”47 . Com o alto desenvolvimento da internet, os partidos podiam alcançar os “cabos eleitorais virtuais” que seriam determinantes na persuasão e no convencimento de eleitores para integrarem a campanha de determinado candidato. E a característica dos sites políticos, permitir e incentivar iniciativas militantes permaneceu o foco da maioria destas páginas da Web. A internet é, portanto um meio para facilitar e melhorar a ação de terreno. Esta foi a lógica seguida pelos quartéis gerais dos dois candidatos durante a campanha. Os sites dos candidatos propunham ajuda para comunicação de proximidade, que se apresentavam sob a forma de dicas de campanha, informativos e até agendas dos candidatos. Havia 47 ROMANINI, M.G. A internet como comunicação política. In “Marketing Político, do comício à Internet.. – São Paulo: ABCOP, 2007.
  • 62. constantes atualizações, com vídeos e informações diárias. Além disso, os sites dos candidatos apresentavam panóplia de recursos para conhecer os candidatos, seus programas de governo, sugestões para campanha, News... No caso do site ADOSULUTIONS48 , site do Alassane Ouattara, havia um item “EXPRIMEZ-VOUS” que permitia aos internautas opinarem e fazerem sugestões sobre questões importantes como: educação, emprego, mulheres, jovens, paz, saúde, infraestruturas etc. Havia também um item “QUESTIONS A ADO” que servia para perguntas diretas ao candidato. No entanto, um ponto que poderia parecer negativo nesta campanha via site pessoal, era a falta de interação direta entre eleitores, militantes, até adversários e os candidatos. Não foi o caso, visto que estes dois candidatos tinham blogs e páginas em diversas redes sociais, principalmente o Facebook e o Twitter. O candidato Laurent Gbagbo tem no blog ligado ao site de campanha, um item na parte direita da tela onde consta a frase “RESTEZ CONNECTÉ”49 . Esta frase personalizada permite ao internauta, acessar páginas do candidato nas redes sociais: Facebook, Twitter, Youtube, Daylimotion, Myspace e Viadeo. Os sites destes dois candidatos e seus respectivos partidos são os únicos que ofereciam a seus eleitores, militantes e até oponentes, tal panóplia e alternativas para permanecer ligado a eles e assim obter resultados quanto à intenção inicial de usar a Internet para a comunicação política. 48 http://www.adosolutions.ci/ado/home.php 49 http://blog.gbagbo.ci/home.asp
  • 63. 7.1.2. OS LINKS Os links oferecidos nos sites permitiam aos internautas encontrarem informações específicas. De fato, os links eram frequentemente muito ricos e reveladores de informações. Eles indicavam ao internauta uma série de sites alternativos e páginas de redes sociais e blogs do seu interesse e em relação com o candidato ou ligado ao partido ou sua ideologia50 . O site gbagbo.ci usava os termos “Liens utiles” e o adosolutions.ci “Autres sites et Blogs”. Conforme já mencionado, os links também são reveladores de informações, mas também de uma forma de conceber a comunicação política via internet, principalmente durante o período eleitoral. Há certa coerência que se destaca no estudo destes links, visto que os dois partidos e seus candidatos valorizam um aspecto. É um aspecto interno, sem ligação com o internacional, como ações ligadas a partidos políticos de uma mesma corrente ideológica. Os links remetem em geral a representações, QGs de candidatos, movimentos de jovens e/ou mulheres, assim como associações e até sindicatos. O site de campanha do Alassane Ouattara apresenta links como: Blog du RJR, Blog Jeunesses Intellectuelles pour ADO51 , Blog All for ADO, Site de Campagne du QG de Cocody, Site Representation Rayaume- Uni. Cada uma das organizações políticas e seus respectivos candidatos se apresentavam em redes. Porém, estas redes eram apresentavam também particularidades conforme os próprios partidos, que remetiam as suas especificidades em termos de identidades políticas. O site do candidato Laurent 50 http://www.adosolutions.ci/ado/lire.php?link=autres_sites 51 http://lacwa.ivoire-blog.com/
  • 64. Gbagbo no caso, tinha links das instituições, do tipo site do governo, site dos diferentes ministérios, de empresas públicas, de sindicatos e de personalidades ligadas de certa forma ao candidato e seu partido. Para Alassane Ouattara e o seu partido, a referência feita a instituições aparece menos importante. São mais valorizados os links do universo do partido e do candidato. Para finalizar esta parte, vale salientar que o intuito ao trabalhar sites pessoais desses dois candidatos e dos seus partidos, não é comparar nos mínimos detalhes os seus sites de campanhas, mas sim trazer apenas elementos que confirmam o uso da internet para a comunicação política. Aliás um trabalho detalhado nos levaria a demonstrar a qualidade de uns sites com relação aos outros e assim tratar de um favoritismo, em função das nossas próprias afinidades, o que tentamos evitar até o momento, realizando uma análise descritiva com critérios puramente objetivos.
  • 65. 8. BALANÇO E PERSPECTIVAS Depois de apresentar o uso desta ferramenta na comunicação política durante o período eleitoral, cabe fazer um balanço da análise descritiva feita no capítulo anterior. Esse balanço mostrará, de maneira sintética, os traços importantes dos sites marfinenses. É a adaptação lenta com relação às grandes possibilidades da internet, que apesar de algumas iniciativas interessantes, chama a nossa atenção. Com base nesta observação, vamos tentar delinear o que será, certamente, a comunicação política na internet em nosso país, nas eleições futuras, caso o novo poder resolva incluir no seu jeito de governar, eleições democráticas, livres e abertas a todos conforme prevê a Constituição. 8.1 BALANÇO DA INTERNET NAS ELEIÇÕES DE 2010 Se pensarmos na totalidade dos sites marfinenses de campanha, houve uma desigualdade no quesito qualidade. No caso dos sites de candidatos e de seus partidos analisados, há três pontos que podem ser destacados. O primeiro é aquilo que poderíamos chamar de falta de interação direta com os internautas, que tem um papel passivo nestes sites. Outro ponto essencial é também entender que a internet não pode ser usada apenas para satisfazer práticas da comunicação política tradicional. E por fim, as dificuldades ligadas à web ainda complicam o seu uso para fins de comunição política.
  • 66. 8.1.1 INFORMAR EM VEZ DE COMUNICAR Embora haja alternativas criadas com os blogs, e outras páginas nas redes sociais, a falta de interação nos sites de campanha merece alguma análise. Os sites de campanhas de nossos candidatos sofreram pela subutilização ou um mau uso das ferramentas da informática. Isso se traduziu pela disponibilização de sites puramente informativos que deixavam pouco espaço ou nenhum para a interatividade. Podemos avaliar que, para os comunicadores dos QGs de campanha e para os partidos, a Internet seria apenas uma mídia com dispositivos suplementares, como o e-mail e as informações sobre atividades dos candidatos e seus partidos. Há poucas inovações (fóruns, opção de pagamento on-line...). Nota-se ainda mais a importância de certos modos de funcionamento (comunicação da diretoria para com os membros, a disponibilidade de documentos já publicados na mídia impressa, a ausência de registro e adesão on-line etc.), que demonstra a falta de flexibilidade e de abertura para o debate. Há ainda certa rigidez das organizações no fazer a comunicação política via internet. Há informações, porém, são quase inexistentes as possibilidades de diálogo da base com a diretoria e/ou candidatos, a troca de informações permanece rara. Isso nos leva a crer que os partidos não mudaram o seu jeito de funcionar mesmo com o surgimento da internet, numa era em que há troca de informações numa velocidade sem precedente. Para as eleições foram criados sites, o que foi de fato inovador para as eleições de 2010, mas que não mudaram muito o jeito de comunicar dos partidos e candidatos. O último ponto a considerar sobre a falta de interação é também a presença de um email para contato, porém inativo para o envio de respostas as inúmeras
  • 67. correspondências enviadas52 . Esta falta de resposta constitui um ponto negativo quanto à impressão que pode ter um militante, eleitor que não conseguiu entrar em contato com o candidato ou a diretoria para informações sobre a sua cidade, a sua zona eleitoral. Vale dizer nesta parte do trabalho que esse fato não é apenas específico à Costa do Marfim e seus políticos, mas sim um fenômeno generalizado. 8.1.1.1 UMA ADAPTAÇÃO DIFÍCIL Parece que os dois partidos e seus candidatos não entenderam que a comunicação política via internet não pode ser feita da mesma forma que nas mídias tradicionais, ou então já entenderam e se recusam a abrir o espaço para comunicar em vez de informar. A boa comunicação Política na internet não tem nada a ver com uma transposição daquilo que é feito em outro lugar. Como escrevem Francisco de Assis e Letícia Maria Pinto da Costa, É preciso entender que a ideia básica dessas páginas da Web é divulgar conteúdos diversos, numa linguagem muitas vezes informal, a fim de que um grande número de internautas possa ter acesso ao material publicado e deixar registrada a sua opinião53 . Pela citação acima mencionada, podemos dizer que os internautas querem mais trocas, que cada ponto lhe sejam explicado, argumentado. Eles querem pedir esclarecimentos e obtê-los, querem que o candidato esteja presente antes, durante e após as eleições, eleito ou não, mantendo um contato regular e personalizado, 52 Durante a campanha de 2010, enviamos vários emails para apresentar um projeto de telemarketing político para os QGs de campanha, sem nenhuma resposta. Apenas conseguimos contatos através do telefone. 53 Assis, Francisco De. A internet como instrumento da propaganda ideológica: o blog de Ricardo Noblat e o caso “mensalão”. In “Marketing Político, do comício à internet. (org). São Paulo : ABCOP, 2007.
  • 68. com eles54 . A internet inverte completamente a lógica do marketing político tradicional. Na televisão, o candidato deve emitir uma mensagem curta. No palanque eletrônico, é o oposto: quanto mais informação e comunicação tiverem, melhor para os candidatos e seus partidos. Não se pode também afogar este potencial cabo eleitoral virtual em um mar de informações. Na verdade, o usuário deve encontrar as informações de que necessita num piscar de olho e em apenas uma página. É importante notar que um internauta, à procura de uma informação específica ou simples visitante que chegou mais ou menos por acaso, passa em média 43 segundos55 em uma página, tempo suficiente para opinar sobre o seu interesse ou não. O uso de um sumário rápido em forma de ícones pode acentuar o lado visual do site e assim chamar mais a atenção do internauta. 8.1.1.2. DIFICULDADES LIGADAS À WEB O uso da web para comunicação política e, sobretudo campanha eleitoral é muito complexo. E esta complexidade é em parte devido à enorme quantidade de dados que se pode encontrar na web e entre os quais o usuário deve fazer a triagem. Frequentemente promessas de acesso à informação são frustradas, por exemplo, quando um motor de busca direciona para um site já obsoleto. Temos o exemplo do Henri Konan Bédié, site do terceiro colocado para o primeiro turno das eleições, que continua existindo sem ter nenhuma informação como pode se ver nas ilustrações abaixo. Digitando o endereço aparece a primeira página, onde consta 54 Granjon F., L'Internet militant - Mouvement social et usage des réseaux télématiques, Rennes, éd. Apogées, 2001. Tradução Própria. 55 http://www.journaldunet.com/0508/050831surfeurs.shtml
  • 69. logo abaixo da foto, a frase “PASSER L´INTRO” que significa pular a introdução. Basta passar a introdução que aparece uma página em branco com a seguinte frase: NOT FOUND: The requested URL/índex.php was not found on this Server. O vazio jurídico que prevalece neste caso não ajuda a reduzir esse fenômeno: as regras mais específicas nesta área forçariam os partidos e seus candidatos a respeitarem procedimentos, como atualizações de conteúdos mesmo após as eleições. Vale salientar que vários candidatos saíram do palanque eletrônico logo após o primeiro turno. E no caso dos nossos principais candidatos, objetos de análise neste trabalho, houve uma adaptação para os sites e páginas do Laurent Gbagbo, passando de site de campanha para sites e páginas de resistência, como apresentados nos anexos. No caso de Alassane Ouattara, atual presidente, não
  • 70. houve alterações. De novidades constam apenas informações desfilando na parte superior do site sobre atividades do novo presidente. Acabamos de apresentar um balanço não positivo do uso da web para comunicação política no período eleitoral e pós-eleitoral. A realidade, como chegamos a mostrar nas análises acima, apresenta um quadro pouco estruturado e pouco especializado do uso da web na comunicação política. E para pensar como os “ciberotimistas”56 que apesar das insuficiências, acreditam e enfatizam as características positivas que o uso da internet propicia nas campanhas políticas. A comunicação política na internet, novo ramo da comunicação de campanha tem um futuro promissor sem medo de exagerar. 8.2. INICIATIVAS POSITIVAS A REFORÇAR Os sites marfinenses submetidos a nosso estudo apresentam aspectos encorajadores para aqueles ligados ou interessados nesta nova forma de comunicação política. Desde o seu surgimento, foi comprovado que o papel da internet nas eleições está cada vez mais forte. As últimas eleições na Costa do Marfim apresentam-se como catalisadores, pois os candidatos estão sempre procurando novos meios para seduzir um público cada vez mais desiludido com a política. Um paralelismo é possível: assim como as guerras de todo tempo contribuíram para o progresso científico, as eleições francesas de 2007 e as eleições americanas de 2008 têm contribuído para um uso mais aguçado do palanque eletrônico nos países africanos 56 LASULAITIS, Sylvia. As agendas de notícias dos websites eleitorais e as estratégias persuasivas empregados pelos candidatos do PT e do PSDB á presidência. In “Marketing Político, do comício à internet. (org). São Paulo : ABCOP, 2007.
  • 71. e principalmente nas eleições marfinenses de 2010, e uma entrada definitiva dos partidos e candidatos na comunicação política via internet. Há muitos outros casos que podem fazer ofício de exemplo neste sentido. Os ex-rebeldes do norte da Costa do Marfim entenderam que para possíveis apoios de dentro e fora do país, na guerra contra as instituições marfinenses, era preciso uma comunicação mais ativa, embora nos mesmos moldes que os sites de partidos, eles investiram na comunicação política via net. O site dos ex-rebeldes se tornou hoje um site de partido político, já que os ex- rebeldes criaram um partido político e participaram das eleições legislativas de 2011. . A campanha eleitoral de 2010, que culminou em uma crise sem precedente para o país com mais de 3.000 mil mortos, demonstrou que mais uma vez que estes confrontos eleitorais trazem muitas inovações. Encontros via internet com os candidatos, uma maior proximidade com estes, programas de governos mais detalhados, com a possibilidade para os “cabos eleitorais virtuais” disporem de mais informações sobre a campanha, o partido e os candidatos. A internet teve um
  • 72. impacto importante no processo eleitoral, com os resultados do primeiro turno publicados on-line no mesmo tempo que foram proclamados ao vivo na principal TV marfinense. É longe ainda a época em que todo mundo terá acesso, mas podemos dizer que os internautas marfinenses tinham lugares privilegiados durante a campanha para presidente em 2010. 8.3. PERSPECTIVA A evolução da comunicação política na internet envolve cumprimento de certas condições. Realização cada vez mais provável visto as partes envolvidas têm um interesse claro em termos de imagem e marca. Deve-se incentivar em primeiro lugar, um maior envolvimento dos políticos para seguirem o caminho dessa nova forma de comunicar com o público, que supõe provavelmente a renovação da classe política marfinense. Em seguida, a modernização da comunicação na Costa do Marfim passa talvez pelo estudo de modelos estrangeiros. A este respeito, deve-se questionar se os sites dos principais partidos políticos podem servir de exemplos. No caso o UMP e o PS. 8.3.1. RENOVAÇÃO POLÍTICA E COMPROMISSO COMUNICACIONAL O futuro da comunicação política na internet, com certeza, passa por um melhor conhecimento e uso mais eficaz das ferramentas da web. Boa parte dos sites oficiais de partidos e políticos marfinenses peca por seu caráter ainda rudimentar. Pelo menos os sites dos principais candidatos, Laurent Gbagbo e Alassane Ouattara parecem ter sido feitos por empresas especializadas. O que não é o caso dos outros
  • 73. partidos e candidatos que privilegiam pessoas menos experientes para realização e gestão. Esta opção apresenta muitas vantagens tanto para o partido, como para os militantes, sendo economia e garantia de determinada orientação do conteúdo para o primeiro, participação ativa e responsabilidade para o último. Para ter um resultado eficiente e um maior aproveitamento durante as eleições, e até para um bom marketing político, é preciso agir com profissionalismo, contratando pessoas especialistas e conhecedoras do ambiente político, para cuidar dos sites, desde a criação até a gestão diária. Esta prática modelo nos Estados Unidos, já ganhou campo importante na América Latina e principalmente no Brasil. Esta terceirização ainda está numa fase embrionária nos países africanos e na Costa do Marfim, pois em geral os partidos contratam uma única empresa de comunicação que cuida desta parte técnica. O que a nosso ver está errado. Ao amadorismo que vimos durante as eleições, sucederá um profissionalismo nos moldes americanos ou europeus. Seria uma evolução pelo menos lógica que poderá acontecer de fato se houver condições democráticas para a expressão das diferenças. Porém já se iniciou esse processo evolutivo, nas eleições de 2010. Embora lenta, já se pode afirmar que o profissionalismo ganha espaço no fazer política na Costa do Marfim. A classe política marfinense já de idade avançada pode constituir e explicar essa lentidão, pois acostumados com o modelo de comunicação política tradicional, com as mídias tradicionais. Existem generalizações a este respeito: Os idosos têm mais dificuldades para se adaptarem às novas tecnologias, e podemos dizer que os políticos marfinenses não são exceção a este clichê. Dos mais jovens políticos marfinenses, apenas ex-chefe rebelde e atual primeiro ministro de 39 anos entendeu a importância de uma comunicação política via internet, criando o site da rebelião
  • 74. acima ilustrado e com o site que criou assim que ocupou o cargo de primeiro ministro, o site: http://www.premierministre.ci/ e o blog: http://www.guillaumesoro.com/ com diversas outras páginas das redes sociais. Mesmo com os jovens políticos, tal qual o Guillaume Soro, há uma preocupação em fazer imgens do que criar um conteúdo adequado para a comunicação política via internet. O que podemos deduzir desta situação de evolução lenta é que, poderá haver evolução concreta e plena somente quando os políticos terão ou incorporaram a cultura da internet. Em outras palavras, os políticos que terão um maior envolvimento, e uma compreensão aguçada deste tipo de mídia, são aqueles que cresceram com ela. Esperamos que o exemplo das eleições de 2010 possa fazer escola de maneira a não esperar a renovação da classe política. 8.3.2. O EXEMPLO AMERICANO É importante dizer que os EUA desempenharam a respeito da comunicação política um papel exemplar para o resto do mundo. Vale salientar que foi nos estados que surgiu o world wide web, e os dois grandes protagonistas do cenário político americano, os partidos Democrata e Republicano fazem parte dos primeiros partidos políticos do mundo a abrirem sites para promoverem suas ideias e ideais57 . Hoje o grande referencial do uso da internet para comunicação política e sobretudo em período eleitoral é o Barack Obama antes e durante as eleições de 2008, conforme escreve FLEURY (2009): Talvez a grande percepção da equipe que conduziu sua campanha foi de que a internet não seria só “Consequência” das ações do candidato, de suas ideias, desejos e visões (assim como os políticos brasileiros pensam até hoje). E sim uma das principais “causas” de um grande movimento. 57 http://www.erudit.org/livre/moniered/2002/livrel5_div7.pdf
  • 75. Nunca antes alguém havia pensado e arquitetado uma campanha no mundo utilizando-se de tamanhas artimanhas – uma rede virtual capaz de aproximar pessoas, motivá-las, inseri-las num processo maior, ouvindo ideias, pensamentos e todos aqueles que quisessem opinar sobre a construção de um novo país, um novo modelo de se fazer política.58 Assim apesar das críticas de muitos “cibercéticos”59 que permanecem minoritários nos seus julgamentos, a internet se tornou, mais do que um novo meio de comunicação, uma ferramenta essencial para eleições. Ainda nos Estados Unidos, outro fato importante consistiu em organizar uma "Troca de votos" online entre os candidatos Al Gore do partido dos Democratas e Ralph Nader do partido verde, durante as eleições de 2000. Tratava-se de convencer os eleitores de Nader (Partido Verde) a votarem Gore em estados onde o candidato democrata tinha chance de ganhar contra Bush. Em troca, os eleitores de Al Gore votariam em Nader em estados onde Bush tinha uma vantagem confortável. O interesse era mútuo: reforçar as chances de vitória para Al Gore em estados onde a votação seria apertada, e para Nader garantir os 5% dos votos necessários para obter ajuda financeira do governo federal para as próximas eleições. O eleitor podia desta forma ter o sentimento de que o seu voto era mais eficaz. Trocas de votos, voto on-line e outras artimanhas da internet, podem surtir efeitos nos estados unidos e em outros países desenvolvidos, porém as possibilidades para estas práticas cruzarem o atlântico e alcançarem o Golfo da Guiné (Costa oeste africana) ainda reflete o campo da ilusão, apesar dos avanços cibernéticos. Apesar de acreditar no avanço da internet como ferramenta essencial para comunicação política, as últimas notícias sobre eleições no continente deixam 58 FLEURY, Gustavo. Eleições 2008. O Brasil e o Efeito Obama. 59 LASULAITIS, Sylvia. As agendas de notícias dos websites eleitorais e as estratégias persuasivas empregados pelos candidatos do PT e do PSDB á presidência. In “Marketing Político, do comício à internet. (org). São Paulo : ABCOP, 2007.
  • 76. dúvidas sobre a saída da tão amada ditadura para se construir um espaço democrático onde possam se desenvolver comunicações eficientes em que o povo se sinta a vontade para trocar informações e participar do fazer política e não do morrer pela política. No que diz respeito às pesquisas de opinião, a maioria dos sites americanos publicam durante o período eleitoral em suas páginas pesquisas simples, com questões regularmente atualizadas. Os candidatos dispõem assim de um feedback contínuo sobre a relevância de sua mensagem de campanha, tendo a possibilidade de mudar, aprimorar ou excluir. Em geral, os internautas que visitam os sites são questionados sobre a ordem das suas preocupações, sobre as propostas do candidato que recebe maior aprovação etc. Esta prática é utilizada diferentemente nos sites de campanha dos candidatos durante as eleições marfinenses. Há apenas possibilidades para os eleitores e/ou militantes opinarem sobre questões já predefinidas e sobre as quais só poderiam se expressar. Mesmo com a vontade de comunicar com os internautas, a comunicação aqui é orientada para a visão do partido e do seu candidato para com questões que julgam necessárias para as populações. Qual foi a base para definir a classificação destas preocupações se há também uma falta de pesquisas eleitorais feitas por empresas qualificadas. As pesquisas são sempre orientadas para as intenções de votos60 . 60 http://www.jeuneafrique.com/Article/ARTJAJA2533p010-011.xml0/