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Os impactos psíquicos que o racismo e a
     intolerância religiosa causa na
            população negra.

         Dr. Patrick de Oliveira – Odétòóla (Psicólogo e Psicanalista)
   Diretor Geral da Nova Escola Lacaniana de Psicanálise – NELP/Goiânia
  Coordenador do Núcleo de Atendimento Psicanalítico - NAPSI/NELP-GO
 Membro Psicólogo da Equipe de Psicologia do Hospital Psiquiátrico Casa de
                           Eurípedes – Goiânia - GO
             Omo Ty Olòógunode da Egbé Mogaji Ifá (Goiânia-GO)
Que Esú Olóònòn
 nos abra todos os
  caminhos. Agô
       Esú
Ser negro no Brasil
   "60% dos jovens de periferia sem antecedentes criminais já
 sofreram violência policial. A cada 4 pessoas mortas pela polícia,
   3 são negras. Nas universidades brasileiras apenas 2% dos
      alunos são negros. A cada 4 horas, um jovem negro morre
     violentamente em São Paulo. Quatro minutos se passaram e
   ninguém viu. O monstro que nasceu em algum lugar do Brasil.
    Talvez o mano que trampa de baixo de um carro sujo de óleo.
   Que enquadra o carro forte na febre com sangue nos olhos. O
  mano que entrega envelope o dia inteiro no sol. Ou o que vende
 chocolate de farol em farol. Talvez o cara que defende o pobre no
  tribunal. Ou que procura vida nova na condicional. Alguém num
 quarto de madeira lendo à luz de vela. Ouvindo um rádio velho no
 fundo de uma cela. Ou da família real de negro como eu sou. Um
                príncipe guerreiro que defende o gol”.
            (Racionais - capítulo 4, versículo 3- Mano Prato e Primo
                                 Preto)
Desmistificação da democracia racial
brasileira

   No Brasil, vivenciamos o mito da “democracia
    racial” que esconde a verdadeira face do
    preconceito racial em nosso meio, mas que ganha
    “corpo” no imaginário coletivo e até mesmo
    veracidade. É impossível afirmar e reafirmar a
    democracia racial num país em que as
    experiências de democracia política são precárias e
    que a democracia social, se existe, é incipiente. Isso
     é minimamente uma contradição, um paradoxo,
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Conceituando identidade étnica, raça e
cor

   Para compreendermos a origem do racismo e do
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    passa a ser definida em termos de adscrição, “é
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    caracterizados pela distinção que eles percebem
    entre eles próprios e com os grupos com os quais
    interagem, devendo decidir suas regras de
    inclusão ou exclusão.
   Segundo a antropóloga brasileira Manuela Cunha,
    destaca que a cultura original de um grupo étnico,
    na diáspora ou em situações de extremo contato,
    não se perde ou se funde simplesmente, mas
    adquire uma nova função, torna-se uma cultura de
    contraste. O grupo só fala de si quando está
    relacionado com outros grupos. É nas situações de
    fronteira que a identidade é mais operante e os
    traços distintivos são reafirmados e, portanto,
    marcados. Não se leva para a diáspora todos os
    pertences, é preciso escolher os mais significativos.
   Quando se fala em raça, nos Estados Unidos, isso
    faz imediatamente sentido para as pessoas; não há
    possibilidade de se viver neste país sem ter uma
    raça, e isso é imprescindível para possibilitar o
    diálogo com pessoas que se designam “negras”,
    “brancas” e “judias”. Todos os grupos étnicos viram
    raça naquele país, porque raça é um conceito nativo
    classificatório. Nitidamente estamos falando de
    movimentos que estão reivindicando não somente
    uma origem comum, mas um destino político
    comum enquanto povo.
   Para entender o conceito de raça é necessário compreender
    também o de “cor”. “Cor” nunca é um conceito analítico, a não
    ser talvez na pintura, na estética, na fotografia, mas nas
    ciências sociais ele é sempre nativo, usado para classificar
    pessoas nas mais diversas sociedades. Os conceitos são
    mutáveis, assim como o de raça. As raças foram, de fato, um
    conceito nativo no Brasil, e durante muito tempo uma categoria
    de posição social. Na época do Brasil colônia, raça e classe
    andaram juntas para sinalizar a diferença entre “senhores”
    e “escravos”. Com o tempo, possivelmente pressionada
    pelo avanço social dos ex libertos e de seus
    descendentes, a categoria predominantemente em termos de
    classificação social passou a ser “cor” e não “raça”.
Saúde da População Negra

   No Brasil existe um consenso entre os diversos
    estudiosos acerca das doenças e agravos prevalentes na
    população negra, havendo, portanto alguns agrupamentos e
    categorias para estes casos: a) geneticamente determinados
    como a anemia falciforme, a deficiência de glicose 6-fosfato
    desidrogenase, foliculite; b) adquiridos em condições
    desfavoráveis - desnutrição, anemia ferropriva, doenças do
    trabalho, doenças sexualmente transmissíveis, HIV/aids,
    mortes violentas, mortalidade infantil elevada, abortos
    sépticos, sofrimento psíquico, estresse, depressão,
    tuberculose, transtornos mentais (derivados do uso do álcool e
    outras drogas); e c) de evolução agravada ou tratamento
    dificultado - hipertensão arterial, diabetes mellitus,
    coronariopatias, insuficiência renal crônica, câncer,
    miomatoses. (Informações obtida do Programa das Nações Unidas para o
    Desenvolvimento - PNUD/2011)
Sofrimento psicossocial na população negra:
violência, racismo e intolerância religiosa


 Variáveis  como a maior exposição à
  violência, ao racismo, a intolerância religiosa
  e ao preconceito racial, além dos fatores
  socioeconômicos desfavoráveis em relação
  à população geral, fazem com que a
  população negra esteja mais predisposta às
  várias formas de sofrimento psíquico.
O  nosso inconsciente coletivo marcado pelo
 racismo e pelo sexismo, manifestado
 através de preconceitos, estereótipos e
 discriminação é gerador de situações de
 violência física e simbólica, que
 produzem marcas psíquicas, ocasionam
 dificuldades e distorcem sentimentos e
 percepções de si mesmo.
O  racismo institucionalizado é determinante
 no acesso diferenciado dos afro-
 descendentes aos equipamentos sociais e
 gera conflitos nas relações inte-raciais,
 provocando desigualdades na forma de
 inserção dos grupos racialmente
 oprimidos, com impactos perversos em
 sua dinâmica psíquica.
 Não  existem dados precisos sobre a
 prevalência dos transtornos mentais na
 população negra, o que se deve a dois
 motivos, o primeiro é a não coleta por parte
 dos profissionais de saúde do quesito cor na
 ficha dos usuários dos serviços. Segundo,
 quando coletado, existe a não análise
 desses dados pelo Ministério da Saúde
 através do DATASUS.
   Nesta perspectiva o Ministério da Saúde em 2007
    desenvolveu a política de saúde da população negra
    tendo como diretrizes específicas a política para o
    campo da saúde mental da criança, adolescente,
    jovem, adulto e idoso, na perspectiva de prevenção
    dos agravos decorrentes dos efeitos da
    discriminação e da exclusão social. E, também,
    na necessidade de atenção à saúde mental do
    adolescente e jovem negros, em especial com
    transtornos decorrentes do uso de álcool e outras
    drogas, como parte do enfrentamento da complexa
    dinâmica da violência da qual jovens negros, pobres
    e moradores das periferias das grandes cidades têm
    sido vítimas preferenciais.
Terreiro: lugar de resistência e
cuidado

 No terreiro todas pessoas são acolhidas,
 sejam elas das mais variadas etnias e
 classes. Entretanto, percebemos que a
 comunidade mais carente procura os
 terreiros no sentido de buscar ajuda para
 problemas de origem social, e que a classe
 média faz aproximação com esta religião
 no sentido de resgate cultural e
 espiritualização.
   Escutei muitos Babalorixás e Yalorixás de Candomblé e Sacerdotes e
    Sacerdotisas de Umbanda em Goiânia, onde pude perceber que as
    formas de sofrimento psicossocial mais referidas pelas pessoas que
    procuram os terreiros são: etilismo (uso e abuso de álcool),
    dependência química diversas, sobretudo crack, a depressão, ora
    eram subjetivações do sofrimento como “perturbação” e estresse. O
    mais interessante é que as pessoas que chegam aos terreiros com
    essas cartografias escondem marcas (traumas) inconscientes de
    outras ordens. Ou seja, ouvindo o relato dessas pessoas pude
    perceber que muitas delas tinham problemas sérios de auto-estima,
    de aceitação, crises de identidade, não se aceitavam enquanto
    negras, ou mesmo, por pertencerem a uma tradição familiar de gente
    de orixá. Traziam as marcas do preconceito racial e da intolerância
    religiosa sobre elas – o terreiro acaba sendo este espaço terapêutico,
    lugar por excelência de acolhimento do sofrimento humano, oriundo
    das questões relacionada a cor/raça e religiosidade.
 Os terreiros podem assim ser considerados
 como equipamento social que presta
 serviços “extra oficiais” em saúde. Os
 terreiros são espaços de escuta de queixas
 como o racismo, a intolerância religiosa, e o
 preconceito racial, construindo a
 possibilidade de empoderamento e
 enfrentamento à violência estrutural sofrida
 pela comunidade negra.
O  cuidado no sofrimento psicossocial
 prestado pelos terreiros nos colocam várias
 possibilidades de engajamento desta
 população no seio da comunidade. A luta
 anti-manicomial e a reforma psiquiátrica se
 apropriam das práticas de cuidado na
 comunidade para enfrentar a medicalização
 desnecessária, a hospitalização e a
 institucionalização, seja ela qual for.
   A pesquisa que venho realizando já alguns anos em Goiânia
    junto aos terreiros em torno dos impactos psíquicos que o
    racismo e a intolerância racial causam na população negra
    reconhece a importância do trabalho em rede, da necessidade
    de inserção da pessoa em sofrimento psicossocial na
    comunidade e do enfrentamento do preconceito frente aos
    povos tradicionais de terreiro. E aponta os terreiros como
    equipamento social de cuidado e acolhimento. Possibilita
    também compreender como a população negra busca apoio no
    sofrimento psicossocial, trazendo à luz do conhecimento, tanto
    as subjetivações do sofrimento psicossocial, quanto o
    processo de adoecer da população negra.
Meu muito obrigado
Que Exú nos mostre sempre o melhor caminho

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  • 2. Que Esú Olóònòn nos abra todos os caminhos. Agô Esú
  • 3. Ser negro no Brasil "60% dos jovens de periferia sem antecedentes criminais já sofreram violência policial. A cada 4 pessoas mortas pela polícia, 3 são negras. Nas universidades brasileiras apenas 2% dos alunos são negros. A cada 4 horas, um jovem negro morre violentamente em São Paulo. Quatro minutos se passaram e ninguém viu. O monstro que nasceu em algum lugar do Brasil. Talvez o mano que trampa de baixo de um carro sujo de óleo. Que enquadra o carro forte na febre com sangue nos olhos. O mano que entrega envelope o dia inteiro no sol. Ou o que vende chocolate de farol em farol. Talvez o cara que defende o pobre no tribunal. Ou que procura vida nova na condicional. Alguém num quarto de madeira lendo à luz de vela. Ouvindo um rádio velho no fundo de uma cela. Ou da família real de negro como eu sou. Um príncipe guerreiro que defende o gol”. (Racionais - capítulo 4, versículo 3- Mano Prato e Primo Preto)
  • 4. Desmistificação da democracia racial brasileira  No Brasil, vivenciamos o mito da “democracia racial” que esconde a verdadeira face do preconceito racial em nosso meio, mas que ganha “corpo” no imaginário coletivo e até mesmo veracidade. É impossível afirmar e reafirmar a democracia racial num país em que as experiências de democracia política são precárias e que a democracia social, se existe, é incipiente. Isso é minimamente uma contradição, um paradoxo, num país oriundo da escravatura, autocrático, com ciclos de autoritarismos muito acentuados.
  • 5. Conceituando identidade étnica, raça e cor  Para compreendermos a origem do racismo e do preconceito racial temos que conhecer os conceitos de identidade étnica, raça e cor. A identidade étnica passa a ser definida em termos de adscrição, “é índio quem se considera índio e é considerado como tal pelo grupo”. Os grupos étnicos só podem ser caracterizados pela distinção que eles percebem entre eles próprios e com os grupos com os quais interagem, devendo decidir suas regras de inclusão ou exclusão.
  • 6. Segundo a antropóloga brasileira Manuela Cunha, destaca que a cultura original de um grupo étnico, na diáspora ou em situações de extremo contato, não se perde ou se funde simplesmente, mas adquire uma nova função, torna-se uma cultura de contraste. O grupo só fala de si quando está relacionado com outros grupos. É nas situações de fronteira que a identidade é mais operante e os traços distintivos são reafirmados e, portanto, marcados. Não se leva para a diáspora todos os pertences, é preciso escolher os mais significativos.
  • 7. Quando se fala em raça, nos Estados Unidos, isso faz imediatamente sentido para as pessoas; não há possibilidade de se viver neste país sem ter uma raça, e isso é imprescindível para possibilitar o diálogo com pessoas que se designam “negras”, “brancas” e “judias”. Todos os grupos étnicos viram raça naquele país, porque raça é um conceito nativo classificatório. Nitidamente estamos falando de movimentos que estão reivindicando não somente uma origem comum, mas um destino político comum enquanto povo.
  • 8. Para entender o conceito de raça é necessário compreender também o de “cor”. “Cor” nunca é um conceito analítico, a não ser talvez na pintura, na estética, na fotografia, mas nas ciências sociais ele é sempre nativo, usado para classificar pessoas nas mais diversas sociedades. Os conceitos são mutáveis, assim como o de raça. As raças foram, de fato, um conceito nativo no Brasil, e durante muito tempo uma categoria de posição social. Na época do Brasil colônia, raça e classe andaram juntas para sinalizar a diferença entre “senhores” e “escravos”. Com o tempo, possivelmente pressionada pelo avanço social dos ex libertos e de seus descendentes, a categoria predominantemente em termos de classificação social passou a ser “cor” e não “raça”.
  • 9. Saúde da População Negra  No Brasil existe um consenso entre os diversos estudiosos acerca das doenças e agravos prevalentes na população negra, havendo, portanto alguns agrupamentos e categorias para estes casos: a) geneticamente determinados como a anemia falciforme, a deficiência de glicose 6-fosfato desidrogenase, foliculite; b) adquiridos em condições desfavoráveis - desnutrição, anemia ferropriva, doenças do trabalho, doenças sexualmente transmissíveis, HIV/aids, mortes violentas, mortalidade infantil elevada, abortos sépticos, sofrimento psíquico, estresse, depressão, tuberculose, transtornos mentais (derivados do uso do álcool e outras drogas); e c) de evolução agravada ou tratamento dificultado - hipertensão arterial, diabetes mellitus, coronariopatias, insuficiência renal crônica, câncer, miomatoses. (Informações obtida do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD/2011)
  • 10. Sofrimento psicossocial na população negra: violência, racismo e intolerância religiosa  Variáveis como a maior exposição à violência, ao racismo, a intolerância religiosa e ao preconceito racial, além dos fatores socioeconômicos desfavoráveis em relação à população geral, fazem com que a população negra esteja mais predisposta às várias formas de sofrimento psíquico.
  • 11. O nosso inconsciente coletivo marcado pelo racismo e pelo sexismo, manifestado através de preconceitos, estereótipos e discriminação é gerador de situações de violência física e simbólica, que produzem marcas psíquicas, ocasionam dificuldades e distorcem sentimentos e percepções de si mesmo.
  • 12. O racismo institucionalizado é determinante no acesso diferenciado dos afro- descendentes aos equipamentos sociais e gera conflitos nas relações inte-raciais, provocando desigualdades na forma de inserção dos grupos racialmente oprimidos, com impactos perversos em sua dinâmica psíquica.
  • 13.  Não existem dados precisos sobre a prevalência dos transtornos mentais na população negra, o que se deve a dois motivos, o primeiro é a não coleta por parte dos profissionais de saúde do quesito cor na ficha dos usuários dos serviços. Segundo, quando coletado, existe a não análise desses dados pelo Ministério da Saúde através do DATASUS.
  • 14. Nesta perspectiva o Ministério da Saúde em 2007 desenvolveu a política de saúde da população negra tendo como diretrizes específicas a política para o campo da saúde mental da criança, adolescente, jovem, adulto e idoso, na perspectiva de prevenção dos agravos decorrentes dos efeitos da discriminação e da exclusão social. E, também, na necessidade de atenção à saúde mental do adolescente e jovem negros, em especial com transtornos decorrentes do uso de álcool e outras drogas, como parte do enfrentamento da complexa dinâmica da violência da qual jovens negros, pobres e moradores das periferias das grandes cidades têm sido vítimas preferenciais.
  • 15. Terreiro: lugar de resistência e cuidado  No terreiro todas pessoas são acolhidas, sejam elas das mais variadas etnias e classes. Entretanto, percebemos que a comunidade mais carente procura os terreiros no sentido de buscar ajuda para problemas de origem social, e que a classe média faz aproximação com esta religião no sentido de resgate cultural e espiritualização.
  • 16. Escutei muitos Babalorixás e Yalorixás de Candomblé e Sacerdotes e Sacerdotisas de Umbanda em Goiânia, onde pude perceber que as formas de sofrimento psicossocial mais referidas pelas pessoas que procuram os terreiros são: etilismo (uso e abuso de álcool), dependência química diversas, sobretudo crack, a depressão, ora eram subjetivações do sofrimento como “perturbação” e estresse. O mais interessante é que as pessoas que chegam aos terreiros com essas cartografias escondem marcas (traumas) inconscientes de outras ordens. Ou seja, ouvindo o relato dessas pessoas pude perceber que muitas delas tinham problemas sérios de auto-estima, de aceitação, crises de identidade, não se aceitavam enquanto negras, ou mesmo, por pertencerem a uma tradição familiar de gente de orixá. Traziam as marcas do preconceito racial e da intolerância religiosa sobre elas – o terreiro acaba sendo este espaço terapêutico, lugar por excelência de acolhimento do sofrimento humano, oriundo das questões relacionada a cor/raça e religiosidade.
  • 17.  Os terreiros podem assim ser considerados como equipamento social que presta serviços “extra oficiais” em saúde. Os terreiros são espaços de escuta de queixas como o racismo, a intolerância religiosa, e o preconceito racial, construindo a possibilidade de empoderamento e enfrentamento à violência estrutural sofrida pela comunidade negra.
  • 18. O cuidado no sofrimento psicossocial prestado pelos terreiros nos colocam várias possibilidades de engajamento desta população no seio da comunidade. A luta anti-manicomial e a reforma psiquiátrica se apropriam das práticas de cuidado na comunidade para enfrentar a medicalização desnecessária, a hospitalização e a institucionalização, seja ela qual for.
  • 19. A pesquisa que venho realizando já alguns anos em Goiânia junto aos terreiros em torno dos impactos psíquicos que o racismo e a intolerância racial causam na população negra reconhece a importância do trabalho em rede, da necessidade de inserção da pessoa em sofrimento psicossocial na comunidade e do enfrentamento do preconceito frente aos povos tradicionais de terreiro. E aponta os terreiros como equipamento social de cuidado e acolhimento. Possibilita também compreender como a população negra busca apoio no sofrimento psicossocial, trazendo à luz do conhecimento, tanto as subjetivações do sofrimento psicossocial, quanto o processo de adoecer da população negra.