SlideShare ist ein Scribd-Unternehmen logo
1 von 3
Downloaden Sie, um offline zu lesen
O professor, o estado e ranço
                                                                                         Cláudio Bertode 1
           “O professor é tão forte que é capaz de agir de forma positiva ou negativa no futuro da
sociedade. Um agente capaz de interferir e transformar o espaço do qual faz parte; até mesmo
construir ou reconstruir o próprio Estado Nacional”. Bem que esta frase poderia ser uma síntese de
algumas questões que tocam o pensamento de Paulo Freire. Alguém poderia argumentar que não se
pode sintetizar desta forma posições filosóficas e políticas de um grande ideólogo que vão muito além
de uma simples frase. Isto seria uma ação redutora deste pensamento, argumentará esta voz. Mas a
verdade é que não dissemos que era o possível resumo, mas simples nota de um leitor. Apenas que
esta frase toca alguma essência das palavras do bom educador. Uma essência bonita que conquistou
muitos jovens idealistas do país. A educação chegou a se transformar no refúgio da resistência contra
a Ditadura militar.
           Freire abriu caminhos para se pensar e para encarar a educação de um outro prisma, porém
contribuiu, mesmo sem querer, (será?) para o grande abismo entre professores e o estado brasileiro.
Por trazer idéias tão novas para sua época e por ser comunista; tornou-se um belo subversivo e foi
um fora da lei por natureza e por opção. Para este incrível pensador o estado devia ser transformado
pela educação; para o Brasil ditatorial a educação não era mais que ferramenta para dominar e para
criar o cidadão que foi predefinido nas mesas das reuniões ministeriais. É bem provável que o regime
tinha em mente um cidadão a ser criado nas salas de aula. Não diremos que isso deva ser visto como
mais um erro daquele estado, afinal elogia-se que os militares sanguinários tinham um projeto de
cidadão. Cabe lembrar que todo estado deve preconizar tal projeto, mesmo os estados autoritários.
Pena que no estado atual, essa democracia tão sonhada pela nação, nele não se manifeste este tipo
de projeto. Tanto Paulo Freire, quanto outros educadores da época, foram perseguidos. Muitos foram
presos e torturados por subverterem a ordem preestabelecida pelo regime militar.
           O professor se tornou um problema, virou o porta voz da sublevação e o ser capaz de incutir
nos jovens alunos os sonhos comunistas, se transformou no elemento fora de controle. Com isso foi
preciso o governo criar mecanismos de desvalorização desta peça tão importante na sociedade. Em
qualquer sociedade, é impossível negar a importância da figura do educador. Este que se recusava a
ser um instrumento positivo ao serviço público estatal do regime, precisava ser detido; nem que para
isso a educação pública fosse perdendo direitos e espaços. Perdendo visibilidade e qualidade. Com a
desvalorização, muitos dos profissionais deixaram as salas de aula e foram para outros ramos. O
magistério deixa de ser exercido pelas classes médias e altas, pois esta profissão não tinha mais o
mesmo prestígio nem era mais rentável, futuramente este profissional passa a surgir das próprias
classes desvalorizadas.b A educação passa a ser exercida por pessoas muitas vezes desqualificadas

1
    Cláudio Bertode é professor da Rede de Ensino Público e Privado do Estado de Goiás
ou por seres alheios a um curso na área. Por exemplo, engenheiros, advogados e outros. Estes
encararam a profissão como “um bico”, algo que exerciam nas horas de ócio, nas horas sem ter o
que fazer nas suas profissões. Outro tipo de profissional foi aquele sem curso superior, mas
precisava de um emprego e seria até capaz de “entrar” em uma sala de aula pelo menos o tempo de
conseguir um emprego melhor. Chegou mesmo, com o aumento do número de escolas, de mais de
oitenta por cento dos professores não terem curso superior de licenciatura ou não terem curso
nenhum.
       Os bons professores foram para as universidades, que aceitavam educadores com uma
simples licenciatura, outros foram para a rede privada, uma vez que esta começou a pagar melhor
que a rede pública. Os filhos dos ricos, a elite, vão estudar na rede privada; com isso, o professor que
ali trabalha conserva certo ar de “status”. Essa pequena elite continua com o projeto de ter uma boa
educação para entrar em uma Universidade Federal. A escola pública fica a míngua e só com a velha
ideologia freiriana, com a esperança de que melhor que entrar em uma Universidade era pelo menos
saber ler e escrever, saber atravessar a rua, jogar o lixo na lata, ler o jornal que vem nos embrulhos
do pão (e daí se não tem dinheiro para assinar um jornal diário?); um avanço em relação aos pais
destas crianças que não tiveram oportunidade nenhuma. Passa então o governo a pregar que agora
havia igualdade de oportunidades. Tanto o filho do mais rico deputado, que estuda nas escolas de
altas mensalidades e de ideologia elitista, quanto a escola da periferia davam a oportunidade de o
jovem pleitear uma vaga na Universidade, ao final. “Mas será que igualdade de oportunidades é o
mesmo que igualdade de condições?”. Essa pergunta já circulou a mesa de reuniões e de muitos
seminários sobre educação. Inclusive o nosso bom educador e pesquisador Libâneo já a proferiu
muitas vezes. Engana-se quem pensa ou prega que o ensino privado só trabalha com números. A
verdade é que continuam preparando os líderes de nossa sociedade. Da mesma forma, engana-se
quem disser que o ensino público prepara o cidadão crítico e qualifica para exercer direitos e deveres.
Engana-se quem pensa que o estado não se preocupa com números muito mais do que a rede
privada, esta, ao menos, tem a desculpa de estar em busca de novos e ricos clientes. O governo
através de sua secretaria de educação pressiona suas escolas para que aprove seus alunos. A meta
silenciosa, mas não secreta e muitas vezes gritada de maneira implícita é que o aluno passe pela
escola de Ensino Fundamental e Médio o mais rápido o possível para baixar os custos. “Sabe quanto
custa um aluno, por ano, para o estado?”, já nos foi perguntado certa vez por uma sub-coordenadora
da secretaria de educação do estado. A ordem silenciosa é acelerar, aprovar, passar, promover,
elevar os números. As escolas que tentam aliar qualidade com quantidade, ficam mal vistas e mal
avaliadas pelas subsecretarias. A autonomia comemorada pelas escolas e educadores é uma
autonomia vigiada e falseada na leitura dos números. É elogiada a escola que cria mecanismos para
os números positivos, independente de qualidade. Embora isto não fique claro, “bastam poucas
chibatadas na carga para que o burro saiba que é hora de romper o passo”.
No Brasil do pós-militarismo cria este movimento inverso. O professor novamente começa a
assumir seu papel de pensador. A maioria novamente tem curso superior e boa parte tem pós-
graduação e cursos de aperfeiçoamento na área da educação. Um problema é que continua o salário
pouco atrativo e que obriga o professor a se sobrecarregar para se sustentar. Isso quando os
melhores não migram para outros setores do serviço público através de concursos ou
“apadrinhamento”. Com isso, quem tenta sobreviver de educação tem de morrer um pouquinho por
dia. Perde o tempo para preparar boas aulas e para seu crescimento enquanto pensador e ideólogo
da sociedade. Sobram para o advento do magistério ou os poetas idealistas e messiânicos ou os que
não são bons o bastante para irem para outra área. Chega ao cúmulo do paradoxo de o professor
cobrar dos alunos para que leiam um pouco mais, e ele próprio não abrir outro livro que não seja o
didático.
       Resultado é que não houve ainda uma trégua na queda de braço entre governo e educador. O
estado ainda deixa escapar o ranço contra o educador e este ainda não confia no estado que o
rebaixou a uma subcategoria dentro do serviço público e dentro da sociedade. O governo prega o
avanço dos números, o aumento da quantidade de escolas, a quantidade de aprovações ao final de
cada ano, o número alto de matrículas (mesmo a custo de bolsa escola, e outros incentivos), mas o
professor continua trabalhando como um clandestino, um subversivo silencioso pronto a transformar
a sociedade se assim pudesse e transformar o estado em estado verdadeiramente democrático e
igualitário. O governo finge que respeita o papel do professor, que se solidariza, que compactua as
mesmas idéias, mas basta falar em salário e outros direitos como plano de carreira, que novamente o
professor é visto como o velho fora da lei. Em Brasília o governador chegou ao disparate de
empunhar uma campanha na tevê para desmoralizar perante a opinião pública as reivindicações dos
educadores.
       Estamos longe de uma boa educação pública no país. Temos muitos discursos, muita
disposição, muita fé, mas enquanto não desfizermos o mal entendido gerado entre estado e
educadores não vamos ter uma verdadeira transformação do ensino brasileiro.

Weitere ähnliche Inhalte

Was ist angesagt?

Curso de Redação para o Enem: Aula 3
Curso de Redação para o Enem: Aula 3Curso de Redação para o Enem: Aula 3
Curso de Redação para o Enem: Aula 3
Aline Gomes
 
Redação: Proposta, planejamento e introdução
Redação: Proposta, planejamento e introduçãoRedação: Proposta, planejamento e introdução
Redação: Proposta, planejamento e introdução
Mande Bem no ENEM
 
Aprender é formular hipóteses, ensinar é organizar provocações
Aprender é formular hipóteses, ensinar é organizar provocaçõesAprender é formular hipóteses, ensinar é organizar provocações
Aprender é formular hipóteses, ensinar é organizar provocações
Léa Marques
 
Parlamento dos jovens 2014 15- jornal be cre - eb d. carlos i - sintra
Parlamento dos jovens 2014 15- jornal be cre - eb d. carlos i - sintraParlamento dos jovens 2014 15- jornal be cre - eb d. carlos i - sintra
Parlamento dos jovens 2014 15- jornal be cre - eb d. carlos i - sintra
Sandra Pratas
 
Os tres modelos de analfabetos na sociedade angolana
Os tres modelos de analfabetos na sociedade angolanaOs tres modelos de analfabetos na sociedade angolana
Os tres modelos de analfabetos na sociedade angolana
homeliber
 
Resposta dos professores de pernambuco ao governador
Resposta dos professores de pernambuco ao governadorResposta dos professores de pernambuco ao governador
Resposta dos professores de pernambuco ao governador
Portal NE10
 
Convite 13° semana nacional em defesa e promoção da educação pública
Convite 13° semana nacional em defesa e promoção da educação públicaConvite 13° semana nacional em defesa e promoção da educação pública
Convite 13° semana nacional em defesa e promoção da educação pública
ACTEBA
 
Intple (5)
Intple (5)Intple (5)
Intple (5)
eadl
 
Discurso lula-sciences-po-27-09-2011
Discurso lula-sciences-po-27-09-2011Discurso lula-sciences-po-27-09-2011
Discurso lula-sciences-po-27-09-2011
Jamildo Melo
 

Was ist angesagt? (20)

Educação
EducaçãoEducação
Educação
 
Elvia apost0001
Elvia apost0001Elvia apost0001
Elvia apost0001
 
Redação - Trabalho
Redação - TrabalhoRedação - Trabalho
Redação - Trabalho
 
Liberdade de Educação - Adão da Fonseca ao 'Diário Insular'
Liberdade de Educação - Adão da Fonseca ao 'Diário Insular'Liberdade de Educação - Adão da Fonseca ao 'Diário Insular'
Liberdade de Educação - Adão da Fonseca ao 'Diário Insular'
 
Curso de Redação para o Enem: Aula 3
Curso de Redação para o Enem: Aula 3Curso de Redação para o Enem: Aula 3
Curso de Redação para o Enem: Aula 3
 
Redação: Proposta, planejamento e introdução
Redação: Proposta, planejamento e introduçãoRedação: Proposta, planejamento e introdução
Redação: Proposta, planejamento e introdução
 
Aprender é formular hipóteses, ensinar é organizar provocações
Aprender é formular hipóteses, ensinar é organizar provocaçõesAprender é formular hipóteses, ensinar é organizar provocações
Aprender é formular hipóteses, ensinar é organizar provocações
 
Curso de Redação para o Enem: Aula 6
Curso de Redação para o Enem: Aula 6Curso de Redação para o Enem: Aula 6
Curso de Redação para o Enem: Aula 6
 
Parlamento dos jovens 2014 15- jornal be cre - eb d. carlos i - sintra
Parlamento dos jovens 2014 15- jornal be cre - eb d. carlos i - sintraParlamento dos jovens 2014 15- jornal be cre - eb d. carlos i - sintra
Parlamento dos jovens 2014 15- jornal be cre - eb d. carlos i - sintra
 
A Educação no mundo pós-moderno - Artigo - Jornal GO
A Educação no mundo pós-moderno - Artigo - Jornal GOA Educação no mundo pós-moderno - Artigo - Jornal GO
A Educação no mundo pós-moderno - Artigo - Jornal GO
 
Educação que futuro nos espera - Prof. Dr. Mozart Neves
Educação que futuro nos espera - Prof. Dr. Mozart NevesEducação que futuro nos espera - Prof. Dr. Mozart Neves
Educação que futuro nos espera - Prof. Dr. Mozart Neves
 
Os tres modelos de analfabetos na sociedade angolana
Os tres modelos de analfabetos na sociedade angolanaOs tres modelos de analfabetos na sociedade angolana
Os tres modelos de analfabetos na sociedade angolana
 
Resposta dos professores de pernambuco ao governador
Resposta dos professores de pernambuco ao governadorResposta dos professores de pernambuco ao governador
Resposta dos professores de pernambuco ao governador
 
Convite 13° semana nacional em defesa e promoção da educação pública
Convite 13° semana nacional em defesa e promoção da educação públicaConvite 13° semana nacional em defesa e promoção da educação pública
Convite 13° semana nacional em defesa e promoção da educação pública
 
Se não se ler bem, é se diminuído na cidadania e nas oportunidades
Se não se ler bem, é se diminuído na cidadania e nas oportunidadesSe não se ler bem, é se diminuído na cidadania e nas oportunidades
Se não se ler bem, é se diminuído na cidadania e nas oportunidades
 
Intple (5)
Intple (5)Intple (5)
Intple (5)
 
Educação
EducaçãoEducação
Educação
 
Literacias
LiteraciasLiteracias
Literacias
 
Discurso lula-sciences-po-27-09-2011
Discurso lula-sciences-po-27-09-2011Discurso lula-sciences-po-27-09-2011
Discurso lula-sciences-po-27-09-2011
 
CNTE-Semana Nacional
CNTE-Semana NacionalCNTE-Semana Nacional
CNTE-Semana Nacional
 

Ähnlich wie O professor fora da lei

A Educação Infantil levado a serio
A Educação Infantil levado a serioA Educação Infantil levado a serio
A Educação Infantil levado a serio
Eduardo Lopes
 
Atividadefinal ericson
Atividadefinal ericsonAtividadefinal ericson
Atividadefinal ericson
Ericson Araujo
 
Gcvc esc politicas_publicas_educ_bas_tema02
Gcvc esc politicas_publicas_educ_bas_tema02Gcvc esc politicas_publicas_educ_bas_tema02
Gcvc esc politicas_publicas_educ_bas_tema02
escolawashington
 
Patria educadora documento_preliminar_sae
Patria educadora documento_preliminar_saePatria educadora documento_preliminar_sae
Patria educadora documento_preliminar_sae
Daniela Carvalho
 
Fins e príncípios da Educação
Fins e príncípios da  EducaçãoFins e príncípios da  Educação
Fins e príncípios da Educação
Antonio Futuro
 

Ähnlich wie O professor fora da lei (20)

CORTELLA, Mario Sergio. A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológico...
CORTELLA, Mario Sergio. A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológico...CORTELLA, Mario Sergio. A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológico...
CORTELLA, Mario Sergio. A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológico...
 
Educação x democracia pedagoga claudia de oliveira andrade
Educação x democracia pedagoga claudia de oliveira andradeEducação x democracia pedagoga claudia de oliveira andrade
Educação x democracia pedagoga claudia de oliveira andrade
 
"Terceira Carta" Paulo Freire
"Terceira Carta" Paulo Freire"Terceira Carta" Paulo Freire
"Terceira Carta" Paulo Freire
 
Carta Aberta aos Professores da Rede Pública do Estado de São Paulo alterad...
Carta Aberta aos Professores da Rede Pública do Estado de São Paulo   alterad...Carta Aberta aos Professores da Rede Pública do Estado de São Paulo   alterad...
Carta Aberta aos Professores da Rede Pública do Estado de São Paulo alterad...
 
10 daniel gutierrez
10 daniel gutierrez10 daniel gutierrez
10 daniel gutierrez
 
Ad1 EAD
Ad1   EADAd1   EAD
Ad1 EAD
 
Analisedetexto2017
Analisedetexto2017Analisedetexto2017
Analisedetexto2017
 
A Educação Infantil levado a serio
A Educação Infantil levado a serioA Educação Infantil levado a serio
A Educação Infantil levado a serio
 
A dualidade estrutural na formação do ensino medio
A dualidade estrutural na formação do ensino medioA dualidade estrutural na formação do ensino medio
A dualidade estrutural na formação do ensino medio
 
Atividadefinal ericson
Atividadefinal ericsonAtividadefinal ericson
Atividadefinal ericson
 
Gcvc esc politicas_publicas_educ_bas_tema02
Gcvc esc politicas_publicas_educ_bas_tema02Gcvc esc politicas_publicas_educ_bas_tema02
Gcvc esc politicas_publicas_educ_bas_tema02
 
Hugo
HugoHugo
Hugo
 
Monografia Agda Pedagogia Itiúba 2012
Monografia Agda Pedagogia Itiúba 2012Monografia Agda Pedagogia Itiúba 2012
Monografia Agda Pedagogia Itiúba 2012
 
Patria educadora documento_preliminar_sae
Patria educadora documento_preliminar_saePatria educadora documento_preliminar_sae
Patria educadora documento_preliminar_sae
 
EDUCAÇÃO & DITADURA DE 64
EDUCAÇÃO & DITADURA DE 64  EDUCAÇÃO & DITADURA DE 64
EDUCAÇÃO & DITADURA DE 64
 
CONFESSAR, MERCANTILIZAR, DEMOCRATIZAR, MAS NÃO DEMONIZAR
CONFESSAR, MERCANTILIZAR, DEMOCRATIZAR, MAS NÃO DEMONIZARCONFESSAR, MERCANTILIZAR, DEMOCRATIZAR, MAS NÃO DEMONIZAR
CONFESSAR, MERCANTILIZAR, DEMOCRATIZAR, MAS NÃO DEMONIZAR
 
Artigo 02
Artigo 02Artigo 02
Artigo 02
 
Artigo 02
Artigo 02Artigo 02
Artigo 02
 
Fins e príncípios da Educação
Fins e príncípios da  EducaçãoFins e príncípios da  Educação
Fins e príncípios da Educação
 
Reda+ç+âo 2
Reda+ç+âo 2Reda+ç+âo 2
Reda+ç+âo 2
 

Kürzlich hochgeladen

PROJETO DE EXTENSÃO I - TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO Relatório Final de Atividade...
PROJETO DE EXTENSÃO I - TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO Relatório Final de Atividade...PROJETO DE EXTENSÃO I - TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO Relatório Final de Atividade...
PROJETO DE EXTENSÃO I - TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO Relatório Final de Atividade...
HELENO FAVACHO
 
2° ANO - ENSINO FUNDAMENTAL ENSINO RELIGIOSO
2° ANO - ENSINO FUNDAMENTAL ENSINO RELIGIOSO2° ANO - ENSINO FUNDAMENTAL ENSINO RELIGIOSO
2° ANO - ENSINO FUNDAMENTAL ENSINO RELIGIOSO
LeloIurk1
 
Revolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividades
Revolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividadesRevolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividades
Revolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividades
FabianeMartins35
 
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: LEITURA DE IMAGENS, GRÁFICOS E MA...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: LEITURA DE IMAGENS, GRÁFICOS E MA...PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: LEITURA DE IMAGENS, GRÁFICOS E MA...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: LEITURA DE IMAGENS, GRÁFICOS E MA...
azulassessoria9
 
421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf
421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf
421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf
LeloIurk1
 
A QUATRO MÃOS - MARILDA CASTANHA . pdf
A QUATRO MÃOS  -  MARILDA CASTANHA . pdfA QUATRO MÃOS  -  MARILDA CASTANHA . pdf
A QUATRO MÃOS - MARILDA CASTANHA . pdf
Ana Lemos
 

Kürzlich hochgeladen (20)

Análise poema país de abril (Mauel alegre)
Análise poema país de abril (Mauel alegre)Análise poema país de abril (Mauel alegre)
Análise poema país de abril (Mauel alegre)
 
PROJETO DE EXTENSÃO I - TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO Relatório Final de Atividade...
PROJETO DE EXTENSÃO I - TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO Relatório Final de Atividade...PROJETO DE EXTENSÃO I - TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO Relatório Final de Atividade...
PROJETO DE EXTENSÃO I - TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO Relatório Final de Atividade...
 
2° ANO - ENSINO FUNDAMENTAL ENSINO RELIGIOSO
2° ANO - ENSINO FUNDAMENTAL ENSINO RELIGIOSO2° ANO - ENSINO FUNDAMENTAL ENSINO RELIGIOSO
2° ANO - ENSINO FUNDAMENTAL ENSINO RELIGIOSO
 
Construção (C)erta - Nós Propomos! Sertã
Construção (C)erta - Nós Propomos! SertãConstrução (C)erta - Nós Propomos! Sertã
Construção (C)erta - Nós Propomos! Sertã
 
Revolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividades
Revolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividadesRevolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividades
Revolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividades
 
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: LEITURA DE IMAGENS, GRÁFICOS E MA...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: LEITURA DE IMAGENS, GRÁFICOS E MA...PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: LEITURA DE IMAGENS, GRÁFICOS E MA...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: LEITURA DE IMAGENS, GRÁFICOS E MA...
 
421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf
421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf
421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf
 
Slides Lição 6, CPAD, As Nossas Armas Espirituais, 2Tr24.pptx
Slides Lição 6, CPAD, As Nossas Armas Espirituais, 2Tr24.pptxSlides Lição 6, CPAD, As Nossas Armas Espirituais, 2Tr24.pptx
Slides Lição 6, CPAD, As Nossas Armas Espirituais, 2Tr24.pptx
 
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de HotéisAbout Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
 
Nós Propomos! " Pinhais limpos, mundo saudável"
Nós Propomos! " Pinhais limpos, mundo saudável"Nós Propomos! " Pinhais limpos, mundo saudável"
Nós Propomos! " Pinhais limpos, mundo saudável"
 
Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!
Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!
Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!
 
Currículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdf
Currículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdfCurrículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdf
Currículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdf
 
Slides Lição 05, Central Gospel, A Grande Tribulação, 1Tr24.pptx
Slides Lição 05, Central Gospel, A Grande Tribulação, 1Tr24.pptxSlides Lição 05, Central Gospel, A Grande Tribulação, 1Tr24.pptx
Slides Lição 05, Central Gospel, A Grande Tribulação, 1Tr24.pptx
 
Historia da Arte europeia e não só. .pdf
Historia da Arte europeia e não só. .pdfHistoria da Arte europeia e não só. .pdf
Historia da Arte europeia e não só. .pdf
 
PROJETO DE EXTENSÃO I - Radiologia Tecnologia
PROJETO DE EXTENSÃO I - Radiologia TecnologiaPROJETO DE EXTENSÃO I - Radiologia Tecnologia
PROJETO DE EXTENSÃO I - Radiologia Tecnologia
 
COMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcante
COMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcanteCOMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcante
COMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcante
 
DeClara n.º 75 Abril 2024 - O Jornal digital do Agrupamento de Escolas Clara ...
DeClara n.º 75 Abril 2024 - O Jornal digital do Agrupamento de Escolas Clara ...DeClara n.º 75 Abril 2024 - O Jornal digital do Agrupamento de Escolas Clara ...
DeClara n.º 75 Abril 2024 - O Jornal digital do Agrupamento de Escolas Clara ...
 
PROJETO DE EXTENSÃO I - TERAPIAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES.pdf
PROJETO DE EXTENSÃO I - TERAPIAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES.pdfPROJETO DE EXTENSÃO I - TERAPIAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES.pdf
PROJETO DE EXTENSÃO I - TERAPIAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES.pdf
 
Atividade - Letra da música Esperando na Janela.
Atividade -  Letra da música Esperando na Janela.Atividade -  Letra da música Esperando na Janela.
Atividade - Letra da música Esperando na Janela.
 
A QUATRO MÃOS - MARILDA CASTANHA . pdf
A QUATRO MÃOS  -  MARILDA CASTANHA . pdfA QUATRO MÃOS  -  MARILDA CASTANHA . pdf
A QUATRO MÃOS - MARILDA CASTANHA . pdf
 

O professor fora da lei

  • 1. O professor, o estado e ranço Cláudio Bertode 1 “O professor é tão forte que é capaz de agir de forma positiva ou negativa no futuro da sociedade. Um agente capaz de interferir e transformar o espaço do qual faz parte; até mesmo construir ou reconstruir o próprio Estado Nacional”. Bem que esta frase poderia ser uma síntese de algumas questões que tocam o pensamento de Paulo Freire. Alguém poderia argumentar que não se pode sintetizar desta forma posições filosóficas e políticas de um grande ideólogo que vão muito além de uma simples frase. Isto seria uma ação redutora deste pensamento, argumentará esta voz. Mas a verdade é que não dissemos que era o possível resumo, mas simples nota de um leitor. Apenas que esta frase toca alguma essência das palavras do bom educador. Uma essência bonita que conquistou muitos jovens idealistas do país. A educação chegou a se transformar no refúgio da resistência contra a Ditadura militar. Freire abriu caminhos para se pensar e para encarar a educação de um outro prisma, porém contribuiu, mesmo sem querer, (será?) para o grande abismo entre professores e o estado brasileiro. Por trazer idéias tão novas para sua época e por ser comunista; tornou-se um belo subversivo e foi um fora da lei por natureza e por opção. Para este incrível pensador o estado devia ser transformado pela educação; para o Brasil ditatorial a educação não era mais que ferramenta para dominar e para criar o cidadão que foi predefinido nas mesas das reuniões ministeriais. É bem provável que o regime tinha em mente um cidadão a ser criado nas salas de aula. Não diremos que isso deva ser visto como mais um erro daquele estado, afinal elogia-se que os militares sanguinários tinham um projeto de cidadão. Cabe lembrar que todo estado deve preconizar tal projeto, mesmo os estados autoritários. Pena que no estado atual, essa democracia tão sonhada pela nação, nele não se manifeste este tipo de projeto. Tanto Paulo Freire, quanto outros educadores da época, foram perseguidos. Muitos foram presos e torturados por subverterem a ordem preestabelecida pelo regime militar. O professor se tornou um problema, virou o porta voz da sublevação e o ser capaz de incutir nos jovens alunos os sonhos comunistas, se transformou no elemento fora de controle. Com isso foi preciso o governo criar mecanismos de desvalorização desta peça tão importante na sociedade. Em qualquer sociedade, é impossível negar a importância da figura do educador. Este que se recusava a ser um instrumento positivo ao serviço público estatal do regime, precisava ser detido; nem que para isso a educação pública fosse perdendo direitos e espaços. Perdendo visibilidade e qualidade. Com a desvalorização, muitos dos profissionais deixaram as salas de aula e foram para outros ramos. O magistério deixa de ser exercido pelas classes médias e altas, pois esta profissão não tinha mais o mesmo prestígio nem era mais rentável, futuramente este profissional passa a surgir das próprias classes desvalorizadas.b A educação passa a ser exercida por pessoas muitas vezes desqualificadas 1 Cláudio Bertode é professor da Rede de Ensino Público e Privado do Estado de Goiás
  • 2. ou por seres alheios a um curso na área. Por exemplo, engenheiros, advogados e outros. Estes encararam a profissão como “um bico”, algo que exerciam nas horas de ócio, nas horas sem ter o que fazer nas suas profissões. Outro tipo de profissional foi aquele sem curso superior, mas precisava de um emprego e seria até capaz de “entrar” em uma sala de aula pelo menos o tempo de conseguir um emprego melhor. Chegou mesmo, com o aumento do número de escolas, de mais de oitenta por cento dos professores não terem curso superior de licenciatura ou não terem curso nenhum. Os bons professores foram para as universidades, que aceitavam educadores com uma simples licenciatura, outros foram para a rede privada, uma vez que esta começou a pagar melhor que a rede pública. Os filhos dos ricos, a elite, vão estudar na rede privada; com isso, o professor que ali trabalha conserva certo ar de “status”. Essa pequena elite continua com o projeto de ter uma boa educação para entrar em uma Universidade Federal. A escola pública fica a míngua e só com a velha ideologia freiriana, com a esperança de que melhor que entrar em uma Universidade era pelo menos saber ler e escrever, saber atravessar a rua, jogar o lixo na lata, ler o jornal que vem nos embrulhos do pão (e daí se não tem dinheiro para assinar um jornal diário?); um avanço em relação aos pais destas crianças que não tiveram oportunidade nenhuma. Passa então o governo a pregar que agora havia igualdade de oportunidades. Tanto o filho do mais rico deputado, que estuda nas escolas de altas mensalidades e de ideologia elitista, quanto a escola da periferia davam a oportunidade de o jovem pleitear uma vaga na Universidade, ao final. “Mas será que igualdade de oportunidades é o mesmo que igualdade de condições?”. Essa pergunta já circulou a mesa de reuniões e de muitos seminários sobre educação. Inclusive o nosso bom educador e pesquisador Libâneo já a proferiu muitas vezes. Engana-se quem pensa ou prega que o ensino privado só trabalha com números. A verdade é que continuam preparando os líderes de nossa sociedade. Da mesma forma, engana-se quem disser que o ensino público prepara o cidadão crítico e qualifica para exercer direitos e deveres. Engana-se quem pensa que o estado não se preocupa com números muito mais do que a rede privada, esta, ao menos, tem a desculpa de estar em busca de novos e ricos clientes. O governo através de sua secretaria de educação pressiona suas escolas para que aprove seus alunos. A meta silenciosa, mas não secreta e muitas vezes gritada de maneira implícita é que o aluno passe pela escola de Ensino Fundamental e Médio o mais rápido o possível para baixar os custos. “Sabe quanto custa um aluno, por ano, para o estado?”, já nos foi perguntado certa vez por uma sub-coordenadora da secretaria de educação do estado. A ordem silenciosa é acelerar, aprovar, passar, promover, elevar os números. As escolas que tentam aliar qualidade com quantidade, ficam mal vistas e mal avaliadas pelas subsecretarias. A autonomia comemorada pelas escolas e educadores é uma autonomia vigiada e falseada na leitura dos números. É elogiada a escola que cria mecanismos para os números positivos, independente de qualidade. Embora isto não fique claro, “bastam poucas chibatadas na carga para que o burro saiba que é hora de romper o passo”.
  • 3. No Brasil do pós-militarismo cria este movimento inverso. O professor novamente começa a assumir seu papel de pensador. A maioria novamente tem curso superior e boa parte tem pós- graduação e cursos de aperfeiçoamento na área da educação. Um problema é que continua o salário pouco atrativo e que obriga o professor a se sobrecarregar para se sustentar. Isso quando os melhores não migram para outros setores do serviço público através de concursos ou “apadrinhamento”. Com isso, quem tenta sobreviver de educação tem de morrer um pouquinho por dia. Perde o tempo para preparar boas aulas e para seu crescimento enquanto pensador e ideólogo da sociedade. Sobram para o advento do magistério ou os poetas idealistas e messiânicos ou os que não são bons o bastante para irem para outra área. Chega ao cúmulo do paradoxo de o professor cobrar dos alunos para que leiam um pouco mais, e ele próprio não abrir outro livro que não seja o didático. Resultado é que não houve ainda uma trégua na queda de braço entre governo e educador. O estado ainda deixa escapar o ranço contra o educador e este ainda não confia no estado que o rebaixou a uma subcategoria dentro do serviço público e dentro da sociedade. O governo prega o avanço dos números, o aumento da quantidade de escolas, a quantidade de aprovações ao final de cada ano, o número alto de matrículas (mesmo a custo de bolsa escola, e outros incentivos), mas o professor continua trabalhando como um clandestino, um subversivo silencioso pronto a transformar a sociedade se assim pudesse e transformar o estado em estado verdadeiramente democrático e igualitário. O governo finge que respeita o papel do professor, que se solidariza, que compactua as mesmas idéias, mas basta falar em salário e outros direitos como plano de carreira, que novamente o professor é visto como o velho fora da lei. Em Brasília o governador chegou ao disparate de empunhar uma campanha na tevê para desmoralizar perante a opinião pública as reivindicações dos educadores. Estamos longe de uma boa educação pública no país. Temos muitos discursos, muita disposição, muita fé, mas enquanto não desfizermos o mal entendido gerado entre estado e educadores não vamos ter uma verdadeira transformação do ensino brasileiro.