Este documento discute a influência da tribologia no desempenho de transmissões, cobrindo tópicos como materiais, processos de fabricação, geometria, lubrificantes e falhas. Explica como fatores como projeto de engrenagens, superfícies, tratamentos térmicos e de lubrificação afetam a durabilidade e eficiência. Também discute métodos para prever falhas através da análise de lubrificantes e monitoramento de variáveis como temperatura e desgaste de componentes.
1. 2013
Influência da Tribologia
na Performance da
Transmissão
Uma visão de materiais, processos , geometria e usinagem
Engº Carlos Mussato
A N Á L I S E D E L U B R I F I C A N T E S E T R I B O L Ó G I C A S A P L I C A D A S À S T R A N S M I S S Õ E S
3. Resumo
Com a presente condição severa de utilização dos
veículos comerciais médios e pesados no Brasil, a
questão da lubrificação se tornou evidente e
fundamental para o aproveitamento da vida útil dos
equipamentos.
Neste contexto, a análise Tribológica e de
Lubrificantes estabelece um cenário claro da
interação das variáveis de infuência nos modos de
falha, permitindo ao OEM planejar sua manutenção e
acompanhamento de frota, reduzindo os custos
operacionais.
Este trabalho visa apresentar todos estes fatores, de
forma ordenada a estabelecer uma visão sobre o
compromisso do estudo Tribológico na busca da
eficiência das transmissões manuais de veículos
comerciais em aplicação no mercado Brasileiro.
Visão Geral do Panorama de aplicação
O avanço tecnológico dos veículos comerciais,
utilizando projetos de motores eletrônicos, com a
possibilidade de torques diferenciados para as
marchas, aliado à uma maior potência para atender à
uma condição de carga e terreno, tipicamente severos
como o Brasileiro, implicou em uma evolução
providencial das transmissões, de forma a atender à
cada um dos requisitos de exigência mecânica e de
dirigibilidade.
Da mesma forma os lubrificantes tiveram uma
evolução significativa para com os compromissos
físico-químicos inerentes ao avanço tecnológico das
transmissões, balanceando proteção e desempenho.
As exigências ambientais dirigidas pelos programas
de redução de emissões, influenciaram sobremaneira
as transmissões no tocante à torque e temperatura de
operação.
O papel do lubrificante passou a ser fundamental na
combinação da redução de consumo de combustível e
proteção de película lubrificante, com baixo coeficiente
de atrito. As classes de desempenho API podem ser
diferentes do exposto de acordo com o projeto
mecânico dos equipamentos. Daí a importância de
seguir sempre a recomendação do fabricante no uso
dos lubrificantes homologados por este.
As empresas do segmento de auto-pecas de classe
mundial, preparam-se para atenderem à exigências de
mercado de forma científica, através de estudo das
variáveis importantes de projeto por meios de
cálculos, simuladores e bancos de teste, permitindo
assim maximizar os resultados do equipamento, bem
como otimizar os mesmos, pela observação dos
resultados dos testes. Essa técnica de Engenharia
Mecânica se denomina back to back.
4. A topografia do terreno é um fator implicante nos
modos de falha dos componentes do veículo como um
todo. Variações de piso quanto à aderência, aclives e
declives acentuados, altitude e temperatura ambiente,
são fatores extremamente importante de projeto das
transmissões e devem ser mapeados para um
dimensionamento correto.
O compromisso de uma frota é transportar com
eficiência, segurança e conforto. Estes requisitos são
pensados no projeto da transmissão, de forma a
oferecer ao motorista, opções de escalonamento de
marchas que atenda às nuances de terreno
encontradas, mantendo a capacidade de tração do
veículo. Para que isso seja possível, as transmissões
dividem-se em Leves, Médias e Pesadas.
Mecânica de funcionamento do Sistema
com ação do Lubrificante
Importância das Interfaces dos componentes
Para se entender os limites de projeto mecânico de
uma transmissão, deve-se conhecer as interfaces
existentes e as exigências dinâmicas e físicas de cada
componente. Este mapeamento inclui todos os
movimentos e deslizamentos cruzados entre as partes
metálicas. O integrante de maior responsabilidade no
tocante à desgaste e atrito, é o conjunto sincronizador.
Este componente necessita de suporte de lubrificação
especial, voltado à redução de atrito e proteção
metálica por película lubrificante. O compromisso
entre estes dois fenômenos resulta em um
funcionamento correto do sistema de troca de
marchas.
Entre a parte posterior da transmissão, carcaça 1,
para com o motor, localiza-se o componente
Embreagem. Grandezas físicas como Inércia e
Torque, combinadas com alinhamentos geométricos
de montagem do conjunto transmissão-embreagem-
motor, geram grande responsabilidade do lubrificante
na atenuação da elevação de temperatura e da
manutenção do valor de coeficiente de atrito dinâmico
(µ). Estas variáveis devem ser levadas em conta no
estudo de causa raiz de um problema com a qualidade
do engate de marchas. Na carcaça 2, localiza-se um
componente fundamental para o conforto de engate,
denominado Torre de mudança. Este componente por
si só não garante o bom engate de marchas, ele deve
ser calibrado com a exata regulagem do curso de
embreagem. O modo de dirigibilidade também afeta a
incidência de falhas do conjunto sincronizador. O
motorista deve proceder engate sem movimentos
bruscos, uma vez que a torre de mudança já garante o
conforto necessário.
Na parte inferior da transmissão, localiza-se a PTO
(Power-Take-Off), ou tomada de força, e a Flange de
saída, ou Yoke. Estes dois componentes são
5. interfaces críticas na transmissão do movimento da
transmissão ao cardan e ao eixo traseiro do veículo,
portanto os alinhamentos de montagem são
importantes para a redução de falhas da transmissão.
A atenção à vazamentos de lubrificante nesta região é
fundamental para a manutenção do veículo. O
componente PTO deve ser acionado somente com a
transmissão desengatada, para evitar falhas na
mesma.
Importância do projeto e responsabilidade do set
de engrenagens
O elemento mecânico de maior responsabilidade na
transmissão do movimento do veículo é a
Engrenagem. O dimensionamento da geometria deste
componente obedece à complexos critérios de
resistência mecânica, que garantem alta durabilidade
e baixo ruído no trabalho. Com torques altos da ordem
de 2.500 N.m, o projeto das engrenagens precisa
prever dureza superficial de flancos adequada para
com a vida útil projetada. Este critério é contemplado
pela teoria de dimensionamento de engrenagens
chamada Lei de Hertz.
Entre os flancos dos dentes dos pares engrenados, há
uma folga de projeto, que diminui com a ação do
torque do motor. Este movimento gera calor e
elevação do atrito entre os flancos dos dentes. Para
garantir que as partes metálicas não se fundam e que
a temperatura de operação seja atenuada, os
lubrificantes assumem papel fundamental neste
requisito, oferecendo proteção metálica por resistência
de filme.
O projeto do set de engrenagens deve obedecer,
como em todo projeto mecânico, à uma otimização do
custo de fabricação. Para isso, explora-se a condição
de micro-geometria do dentado, em substituição à
dimensionamentos de largura e material das
engrenagens.
Entretanto, este critério de projeto demanda grande
tecnologia de fabricação das engrenagens, com
desvios geométricos projetados da ordem de 0,005
µm em toda a extensão do dentado. Estes valores
obedecem à critérios de redução de ruídos e aumento
de vida útil do componente, devido ao estudo do
contato entre os flancos.
O desprendimento metálico é portanto diminuido
através deste recurso de projeto, propiciando uma
ação dispersante do lubrificante mais eficaz.
Importância do processo de fabricação e
tratamentos especiais da superfície dos dentes
das engrenagens
Em decorrência da necessidade de resistência
mecânica e absorção de impacto dos dentes das
engrenagens, tratamentos especiais como o Shot
Peening são utilizados em todo os projetos de
transmissões veiculares. Consiste na elevação da
resistência à compressão na região imediatamente
abaixo dos flancos dos dentes, propiciando
elevadíssima vida à fadiga do componente, quando
submetido à esforços cíclicos. A aplicação de Shot
Peening pode ser feita somente na região dos dentes
para engrenagens retificadas e em toda a região dos
flancos para engrenagens Sheivadas.
+
+
6. A combinação de lubrificação adequada à condição de
resistência mecânica obtida pelo processo de
fabricação, conferem à transmissão uma excelente
vida útil.
Em tribologia, o estudo das superfícies de contato
definem o comportamento dos componentes
mecânicos sob um regime de lubrificação. A métrica
definida para este dimensionamento é a Rugosidade
superficial, avaliada em µm. O desprendimento
metálico oriúndo destas irregularidades superficiais é
absorvido pela ação dispersante do lubrificante,
entretanto é importante combinar pares de mesma
tecnologia, para maximizar a vida útil dos mesmos.
Abaixo a descrição dos principais processos de
fabricação de dentados para engrenagens
automotivas. Os processos A e B são fases
preliminares dos processos C a F, e ocorrem antes do
Tratamento térmico das engrenagens. Os processos
D, E e F são utilizados para altos compromissos com
níveis baixos de ruído e alta capacidade de carga.
As tecnologias de retificação dos dentes de
engrenagens utilizam rebolos cerâmicos e galvânicos.
Estes últimos dispensam o uso de processo Shot
Peening ainda que em baixas velocidades de corte
(<30m/min). Os grãos de nitreto cúbico de boro
conferem usinagem por abrasão e deformação
simultaneamente, conferindo grande resistência à
fadiga e baixíssimo desprendimento metálico no
período inicial de uso da transmissão, colaborando
portanto com a eficiência do lubrificante utilizado.
A
B
C
D
E
F
7. Condição de homologação dos Lubrificantes para
Transmissões
Os lubrificantes devem responder positivamente às
exigências de lubricidade, atrito, temperatura e
sujidade. Para dimensionar um lubrificante, deve-se
fazer uma matriz de ponderação de performance,
contemplando os componentes mecânicos e suas
respectivas funções na transmissãom, conforme
ilustrado abaixo.
Os ensaios tribológicos utilizados na aprovação da
transmissão tem importância fundamental no ciclo de
projeto da mesma, perfazendo a análise do
comportamento em desgaste em simuladores das
condições reais de uso, findando nos testes de campo
conforme as condições previstas no projeto. Também
os lubrificantes são submetidos à cada uma destas
fases, tendo suas propriedades físico-químicas
avaliadas e classificadas. Na fase laboratorial, se
verificam a reologia e composição química, nos testes
tribológicos as propriedades de atrito e proteção
lubrificante e nos testes de campo os períodos de
troca de acordo com as especificações dos fabricantes
ou OEMs.
Uma das principais variáveis influentes na obtenção
da vida útil projetada das transmissões para com as
condições severas de uso, é a Viscosidade cinemática
(cSt). O projeto dos lubrificantes prevê limites de
variação da viscosidade em função das condições de
uso, predominantemente temperatura, tempo de
operação, contaminação e regime de carga do
veículo. Todos estes fatores combinados ao extremo,
implicam em grande responsabilidade do lubrificante
para a durabilidade da transmissão. O tempo de uso é
extrapolado do teste KRL para as condições reais de
campo. Conhecendo-se a viscosidade de
cisalhamento, pode-se monitorar a vida útil do
equipamento, evitando modos de falha como Pitting
nos dentes das engrenagens.
Finalmente as condições de contorno da homologação
dos lubrificantes é conhecida e a ponderação de cada
item de desempenho é comparada, para destinar o
lubrificante corretamente à aplicação.
Uma vez escolhido a lubrificação ideal para a
transmissão, pode-se registrar a qualidade do
lubrificante de primeiro enchimento através de uma
checagem via Infra-Vermelho da condição sem uso ou
0Km. Desta forma evitam-se problemas de desgaste
prematuro da transmissão em decorrência do uso de
lubrificantes não homologados pelo fabricante.
Lubrificantes de bases
sintéticas
SAE80W SAE40 SAE75W80
8. Métodos e medições eficientes na
predição de falhas
Em uma transmissão a quantidade de componentes
metálicos em funcionamento simultâneo é enorme e
portanto o desprendimento de ferro é em algumas
vezes alto.
Para que a análise do lubrificante seja útil ao
monitoramento da vida da transmissão, o fabricante
deve conhecer a origem de cada desprendimento
metálico e contaminantes. Desta forma poderá intervir
à tempo no equipamento, através de uma inspeção
detalhada ou teardown planejado, identificando o
componente em desgaste e substituindo-o.
Assim como se faz a análise IR do lubrificante quando
novo, pode-se fazer também a análise da rugosidade
das partes metálicas fundamentais, para se ter claro a
evolução de desgaste. O desprendimento metálico é
mais acentuado no cone do corpo de acoplamento,
seguido dos garfos do sistema de mudança e em
último pelo set de engrenagens e rolamentos.
Existem variáveis que podem serem monitoradas em
complemento às análises de lubrificantes, para ser
associada à esta durante um teste de campo ou rotina
de inspeção veicular. A temperatura de operação é
uma das principais variáveis de influência na
degradação do lubrificante e por conseguinte da
transmissão. Em determinadas aplicações severas em
que as temperaturas excedem 100ºC o uso de
lubrificantes sintéticos se faz necessário para garantir
a vida útil da transmissão.
Além da composição química correspondente à
aditivação e a viscosidade cinemática do lubrificante, o
tamanho e quantidade do particulado em suspensão
devem também serem analisados e servem de
parâmetros para o analista quanto à contaminação do
lubrificante, de maneira que pode visualizar de forma
fracionada, os respectivos ppms de particulados.
Uma lubrificação em boas condições de sujidade deve
apresentar uma classificação ISO4406 --/22/20 para
transmissões mecânicas e automatizadas. Uma
análise da morfologia das partículas presentes na
amostra do lubrificante pelo método de Ferrografia
analítica pode ser útil quando a classificação ISO4406
tiver sido superada. Os particulados de ferro gerados
pelo trabalho da transmissão nos diversos níveis de
aplicação, devem ser analisados e interpretados à
cada amostragem, pois constituem o maior fator de
influência no desgaste e vida útil das transmissões. O
ensaio de tamanho de partículas acima mencionado,
pode revelar a intensidade do desprendimento
metálico. Como visto anteriormente, existem inúmeros
fatores que levam ao desgaste metálico e
consequente redução da vida útil da transmissão.
9. Um teste de campo com veículo instrumentado para
levantamento das variáveis de temperatura de
operação, coletivo de marchas, funcionamento da
embreagem e do sistema de mudança, combinados
com as análises de lubrificante, pode fornecer um
mapa fundamental para o fabricante e o usuário final,
uma vez que obedecido estes limites, a vida útil da
transmissão será maximizada.
Conclusões e observações
Os testes tribológicos e análises dos lubrificantes
contribuem significativamente para a redução e
detecção de falhas nos equipamentos mecânicos
complexos como transmissões automotivas,
possibilitando aos fabricantes a confiabilidade
desejada e fornecendo ao cliente um suporte eficaz e
eficiente.
Os modos de falhas decorrem em grande parte do uso
inadequado dos equipamentos ou de condições não
previstas nos projetos e manuais de operação. A
manutenção da lubrificação assume papel
fundamental nos custos de frotas, uma vez que os
equipamentos se tornam cada vez mais sofisticados e
caros.
Os apelos ecológicos, exigências de conforto, e
reduções de custos com combustíveis, aliados à
condições severas crescentes no uso dos veículos
comerciais, implicou em uma tecnologia embarcada
do powertrain com alto valor agregado, justificando o
uso de lubrificantes sintéticos de alto desempenho em
escala crescente.