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Comissão Organizadora
Amanda de Moraes Narcizo
Camila Helena de Souza Queiroz
Camila Lopes Petrilli
Cláudia Emanuele Carvalho de Sousa
Diego Jose Belato y Orts
Felipe Viegas Rodrigues
Kelly Dhayane Abrantes Lima
Leopoldo Francisco Barletta Marchelli
Marco Antônio Pires Camilo Lapa
Maria Nathália de Carvalho Magalhães Moraes
Marina Marçola Pereira de Freitas
Tatiana Hideko Kawamoto
Coordenador: Prof. Dr. Márcio Reis Custódio
VII Curso de Inverno:
“Tópicos em Fisiologia Comparativa”
http://www.ib.usp.br/cursodeinverno
Realização
Patrocínio
Apresentação
VII Curso de Inverno - IB/USP Pág. i
APRESENTAÇÃO
A idéia da criação do Curso de Inverno: Tópicos em Fisiologia Comparativa surgiu
em 2002, quando alunos da pós-graduação do Departamento de Fisiologia Geral do Instituto
de Biociências da Universidade de São Paulo – USP, ansiavam a criação de um espaço que
possibilitasse alternativas de aprendizado complementar. Naquele momento de inquietude e
vontade discente, a decisão foi de empenho em realizar um curso no período de férias e
oferecê-lo a graduandos e recém-graduados que almejassem ingressar na pós-graduação
em Fisiologia, ou mesmo para aqueles que se interessassem pelo tema de uma forma geral.
Além disso, na última década, percebemos uma preocupação crescente em
descentralizar o desenvolvimento concentrado na região Sudeste do país e atingir áreas
mais carentes tanto em pesquisa quanto em desenvolvimento humano. Em defesa deste
conjunto de idéias e ações que a Comissão Organizadora do Curso de Inverno busca
sempre ampliar o alcance do curso, colaborando cada vez mais efetivamente na construção
de um país com menos desigualdades.
Sendo assim, o curso é voltado para alunos originários das diversas áreas do
conhecimento que tenham interesse em Ciências Fisiológicas, mais especificamente em
Fisiologia Comparativa. Seu principal objetivo é promover discussões de conhecimentos
fundamentais para uma boa formação em Fisiologia, assim como proporcionar uma vivência
no dia-a-dia da pesquisa do Departamento de Fisiologia do Instituto de Biociências - USP.
Este livro visa complementar os conteúdos discutidos em sala de aula,
proporcionando uma fonte adicional de consulta para os participantes. O livro é composto de
nove unidades que abrangem os mais variados temas dentro da Fisiologia Comparativa, os
quais apresentam desde teorias básicas até as mais novas discussões da atualidade.
Desejamos uma boa leitura a todos!
Comissão Organizadora
VII Curso de Inverno: Tópicos em Fisiologia Comparativa
Universidade de São Paulo
5 a 23 de Julho de 2010
Mapa Conceitual
Pág. ii VII Curso de Inverno - IB/USP
MAPA CONCEITUAL
Na tentativa de sempre melhorar a qualidade das aulas e a comunicação dos pós-
graduandos, a edição 2010 do “Curso de Inverno: Tópicos em Fisiologia Comparativa” foi
organizado em módulos conforme delineamento sugerido por um mapa conceitual, o qual
mostra a interligação entre os diversos assuntos da Fisiologia e aponta as relações
existentes entre os temas que serão abordados no decorrer do curso. Assim sendo, a partir
dele, os módulos deste ano foram criados de acordo com as proximidades de cada
tema. Desta maneira, podemos oferecer aos alunos participantes uma base mais sólida e
coesa a cerca da Fisiologia Comparativa, e ao mesmo tempo transmitiremos uma boa noção
da diversidade de temas abordados no Departamento de Fisiologia.
Mapa Conceitual mostrando as interligações existentes nos mais diversos temas abordados no
Departamento de Fisiologia Geral do Instituto de Biociências da USP, os quais serão
apresentados durante as aulas no Curso de Inverno: Tópicos em Fisiologia Comparativa 2010.
Sumário
VII Curso de Inverno - IB/USP Pág. iii
SUMÁRIO
Unidade 1
Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa
Capítulo 1 O que é ciência e como praticá-la pág. 03
Capítulo 2 Formulando perguntas em fisiologia comparativa pág. 09
Capítulo 3 Evitando confundir-nos: aspectos fundamentais do desenho
experimental e a estatística inferencial pág. 13
Capítulo 4 O Fim da Picada: Comunicando Ciência pág. 17
Glossário pág. 21
Bibliografia pág. 22
Unidade 2
Sinalização Celular
Capítulo 5 Comunicação celular: entendendo a ritmicidade endógena pág. 23
Capítulo 6 Fisiologia celular do plasmodium durante a fase assexuada pág. 41
Capítulo 7 RNAi: ouvindo a voz do silêncio pág. 49
Bibliografia pág. 66
Unidade 3
Neurociências
Capítulo 8 História da neurociência pág. 79
Capítulo 9 Princípios básicos em fisiologia neural pág. 89
Capítulo 10 Fisiologia sensorial pág. 103
Capítulo 11 Neurofisiologia da visão pág. 115
Capítulo 12 Causa e função pág. 121
Capítulo 13 Percepção pág. 127
Capítulo 14 Memória e seus aspectos evolutivos pág. 139
Capítulo 15 Navegação espacial pág. 153
Capítulo 16 Neurobiologia das emoções pág. 163
Capítulo 17 Neurofisiologia da linguagem pág. 179
Sumário
Pág. iv VII Curso de Inverno - IB/USP
Capítulo 18 Neurofisiologia da música pág. 187
Bibliografia pág. 194
Unidade 4
Metabolismo
Capítulo 19 Metabolismo e Temperatura: Conceitos e Implicações pág. 205
Capítulo 20 Medindo a chama da vida pág. 217
Capítulo 21 Ectotermia: um acesso de baixo custo à vida pág. 235
Capítulo 22 Termorregulação em endotérmicos: febre e anapirexia. “Ana” o quê?
pág. 247
Capítulo 23 Metabolismo energético em câmera lenta: mecanismos de depressão
metabólica sazonal pág. 257
Capítulo 24 Custos e benefícios da reprodução: papel dos lipídios pág. 269
Capítulo 25 A ecofisiologia no cenário das mudanças climáticas globais pág. 279
Bibliografia pág. 286
Unidade 5
Neuroendocrinologia Comparada
Lista de abreviações pág. 301
Capítulo 26 Neuroendocrinologia comparada: análise comparativa entre o encéfalo
e a hipófise de peixes e mamíferos pág.305
Capítulo 27 Neuroendocrinologia comparada: o encéfalo e a hipófise de anfíbios,
répteis e aves pág. 323
Capítulo 28 Sistema neuroimunoendócrino pág. 337
Bibliografia pág. 348
Unidade 6
Ecotoxicologia Aquática
Capítulo 29 Metal não essencial: o cádmio e seus efeitos pág. 361
Capítulo 30 Transporte de Metais Essenciais em Organismos Aquáticos: o cobre e
o zinco pág. 371
Sumário
VII Curso de Inverno - IB/USP Pág. v
Capítulo 31 Efeitos da toxicidade de metais no metabolismo de organismos
aquáticos pág. 381
Capítulo 32 Alterações neuroendócrinas resultantes da exposição a metais
pág. 395
Bibliografia pág. 407
Unidade 7
Fisiologia Comparada de Invertebrados Marinhos: Trocas Gasosas,
Digestão e Sistema Imune
Capítulo 33 Trocas gasosas em invertebrados marinhos pág. 427
Capítulo 34 Adquirindo energia: formas de alimentação e digestão em inverte-
brados marinhos pág. 435
Capítulo 35 Sistema Imune de Invertebrados marinhos: mecanismos, funções e
similaridades pág. 455
Bibliografia pág. 467
Unidade 8
Fundamentos de Toxinologia
Capítulo 36 Co-evolução entre peçonhas e seus alvos pág. 473
Capítulo 37 Produtos naturais e sua função como defesa química pág. 483
Capítulo 38 Invertebrados marinhos: toxinas e seus mecanismos de ação pág. 493
Capítulo 39 Lepidópteros: aspectos biológicos e toxinológicos pág. 501
Capítulo 40 Raias – biologia e envenenamento pág. 511
Capítulo 41 Serpentes peçonhentas do Brasil: biologia, fisiologia e epidemiologia
pág. 519
Bibliografia pág. 535
Sumário
Pág. vi VII Curso de Inverno - IB/USP
Unidade 9
Quantificação e Análise de Dados
Capítulo 42 Quantificação de Fenômenos Fisiológicos pág. 547
Bibliografia pág. 564
Unidade 1
Método Científico Aplicado a Estudos
em Fisiologia Comparativa
Coordenador: Agustín Camacho Guerrero
Laboratório de Herpetologia
agustin.camacho@usp.br
Este capítulo tem três objetivos. A) Apresentar aos leitores os principais métodos usados
para gerar conhecimento científico, B) Mostrar como a fisiologia comparativa pode valer-se
de dois destes métodos: o método indutivo e o hipotético-dedutivo, C) Revisar o processo de
geração de conhecimento, desde o levantamento de perguntas científicas até a
comunicação dos resultados de um projeto de pesquisa, passando por apresentar as bases
do desenho experimental e a análise estatística. O fim último deste texto e as aulas
associadas é que os alunos tenham uma visão básica e estruturada do método científico.
Com esta visão, espero que lhes seja mais fácil aprender no futuro sobre temas mais
específicos (desenho experimental, estatística, comunicação da ciência, etc). No final do
capítulo, existe um glossário que define termos importantes em negrito. Os termos estão na
ordem em que são encontrados durante a leitura, para facilitar uma consulta inmediata.
Por que ler este texto?
Infelizmente, muitos cursos em biologia colocam as disciplinas de método científico como
optativas, em lugar de inserir este tipo de preparo, ao menos nas disciplinas obrigatórias da
grade curricular. Deste modo, muitos alunos não têm um preparo mínimo para planejar,
executar projetos científicos, nem comunicar os resultados obtidos. Como conseqüência, os
primeiros trabalhos de um aluno perdem em qualidade, diminuindo também suas
possibilidades de obter bolsas no futuro. Este capítulo pretende mostrar alguns conceitos
básicos e dicas para auxiliar aos alunos nos seus primeiros encontros com o trabalho de
pesquisador. Durante as aulas relacionadas a este módulo veremos estes conceitos da
forma mais didática possível, mas neste capítulo tem informações e dicas úteis que não
serão explicadas na aula.
VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa”
Pág. 2 Julho/2010
Todos os capítulos revisados pelos profs
Dr. Pedro Ribeiro e Dr. Pedro Luis Bernardo da Rocha
Capítulo 1 O que é ciência e como praticá-la pág. 03
Agustín Camacho Guerrero
Capítulo 2 Formulando perguntas em fisiologia comparativa pág. 09
Agustín Camacho Guerrero
Capítulo 3 Evitando confundir-nos: aspectos fundamentais do desenho
experimental e a estatística inferencial pág. 13
Agustín Camacho Guerrero
Capítulo 4 O Fim da Picada: Comunicando Ciência pág. 17
Agustín Camacho Guerrero
Glossário pág. 21
Bibliografia pág. 22
Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa
Julho/2010 Pág. 3
O que é ciência e como praticá-la.
Agustín Camacho Guerrero
Laboratório de Herpetologia
agustin.camacho@usp.br
O que é ciência?
Uma bonita forma de começar a preparar-nos é conhecer a etimologia da palavra
que definirá nosso trabalho, talvez pelo resto das nossas vidas. A palavra ciência provém do
latim “scientia” proveniente do verbo “scire = saber”, este está relacionado com o verbo,
também latim, “scindo = dividir”. Existem várias definições de ciência, mais ou menos
completas, seja com ênfase nos seus objetivos ou nos métodos que usam. Uma definição
bastante completa é:
“1. The systematic observation of natural events and conditions in order to discover
facts about them and to formulate laws and principles based on these facts. 2. The
organized body of knowledge that is derived from such observations and that can be verified
or tested by further investigation. 3. Any specific branch of this general body of knowledge,
such as biology, physics, geology or astronomy.” Academic Press Dictionary of Science &
Technology.
Neste módulo, seguiremos uma visão de ciência como busca e comunicação de
conhecimento, o mais confiável possível, sobre a natureza.
Métodos conceituais de obtenção do conhecimento.
Desde séculos antes de Cristo, filósofos, empiristas e estatísticos, tais como
Aristóteles, Bacon, Bayes, Fisher, Popper, Underwood e Jaynes, vêm aprimorando os
métodos conceituais de obter conhecimento do mundo natural, de forma a obter mais
conhecimento e com maior confiabilidade. Assumo que um passo necessário para sermos
bons cientistas passa por conhecer os diferentes modos de obtenção de conhecimento. A
continuação, lhe introduzirei aos métodos mais conhecidos e utilizados. Deste modo, espero
justificar um esquema unificado de obtenção de conhecimento que lhe facilite a assimilação
de conceitos apresentados em futuros cursos de estatística e delineamento experimental.
Vamos lá:
No século IV a. c., Aristóteles definiu o raciocínio demonstrativo, ou lógica
aristotélica, em seis obras conhecidas coletivamente como Organon. De acordo com
Aristóteles, existem termos gerais (Ex. os homens) e termos particulares (Ex. Socrates) que
se referem a subconjuntos dos termos gerais. Segundo este método, estes elementos
podem ser identificados e, relacionando estes através de construções lógicas (silogismos),
é possível derivar conhecimento novo e necessariamente certo (inferências). Nestas
construções, a combinação de dois ou mais enunciados verdadeiros (Ex. todos os homens
VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa”
Pág. 4 Julho/2010
são primatas; Sócrates é um homem) permitem inferir um novo conhecimento, também
verdadeiro (então Sócrates é um primata). O sistema lógico inventado por Aristóteles, nos
permite até hoje combinar observações consideradas certas para fazer crescer nosso
conhecimento. Porém, Aristóteles não criou um sistema formal para a determinação da
veracidade ou generalidade dos termos, fazendo com que esta determinação fosse, durante
muito tempo, feita com base no conhecimento prévio e subjetivo dos naturalistas.
Em 1620, Francis Bacon rompeu com a tradição da lógica aristotélica propondo
evitar que prévias doutrinas intercedam nas nossas observações. Para Bacon, só era
possível aumentar nosso conhecimento através da experimentação e das observações. O
conhecimento gerado permitiria, segundo ele, explicar de forma cautelosa, situações
relativamente similares. Produzir explicações sobre grupos de casos gerais com base no
que sabemos de casos particulares é definido por ele como indução. Para Bacon, este
conhecimento deveria gerar novos experimentos e ser testado em diversas situações. Ele
defendia que os cientistas deveriam ser céticos acima de tudo, e não aceitar explicações
que não possam ser verificadas pela observação e experiência. Bacon, entretanto, não
clarificou quantas nem como deviam ser feitas as observações para assumir um
conhecimento como certo.
Em 1670, Bayes elaborou um método lógico de atribuir uma probabilidade a
afirmações geradas por indução. Este método é conhecido como lógica probabilística
indutiva. Assume que a probabilidade de uma hipótese ser verdadeira pode ser calculada
multiplicando: A) nossa expectativa de que a hipótese seja certa, expressada em forma de
probabilidade prévia, vezes B) um valor de verossimilhança (likelihood) obtido a partir de
novas observações (Bayes 1763). Desta forma, a probabilidade bayesiana fornece uma
medida de quanto é razoável acreditar em uma hipótese usando toda a informação de que
dispomos (Jaynes 2003). Um problema com este método é que as probabilidades prévias
podem mudar subjetivamente com o pesquisador, e isto afeta ao resultado final. Outro
problema é exposto na continuação.
Karl Popper (1934) enunciou o Método hipotético-dedutivo, chamado também
probabilismo ou falsificacionismo. Segundo este método, não é possível derivar
probabilidades para asserções geradas por indução (Popper 1959) (ex. o simples fato de
que todos os corvos que vi até agora são pretos, não permite calcular a probabilidade de
que o próximo corvo que eu veja será preto, pois não conheço quantos corvos existem no
mundo). Para Popper, o conhecimento deve estar justificado de forma lógica. Deste modo,
ele defende que só podemos justificar de forma lógica a crença em uma teoria, em quanto
previsões derivadas logicamente desta estejam sobrevivendo a testes com base em
observações. Segundo este autor, a validade de uma teoria pode ser testada de quatro
formas diferentes: 1) Determinando se as conclusões de uma teoria contradizem-se entre
Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa
Julho/2010 Pág. 5
elas (Para este autor, você pode considerar “conclusões de uma teoria” sinônimo de
previsões, predições ou hipóteses). 2) Verificando a estrutura lógica da teoria, para
determinar se esta é empírica ou é uma tautologia; 3) Comparando com outras teorias
para saber se o fato de superar nossos testes suporia um avanço científico; 4) Testar
empiricamente as conclusões. Para testar as conclusões, Popper propõe testar aquelas que
vão mais de contra com a teoria e que possam ser mais severamente testadas. Um dos
problemas principais apontados a este método é que não gera crescimento da certeza
relativa nas diferentes teorias, por considerar-se que sempre existirão infinitas possíveis
teorias competindo para explicar cada fenômeno.
Outros autores tem defendido o uso da verificação para aumentar nossa certeza
sobre teorias (Ex. Sober 1999 e Lloyd 1987, citados por Lewin-koh et al. 2004). Apesar do
problema lógico apontado por Popper, vários autores baseiam-se no procedimento de
“verossemelhança máxima” popularizado por Fischer (Aldrich 1997) para defender que a
verificação de certas hipóteses em várias instâncias (ex. uma relação entre taxa de
ventilação e percentagem de O2 no fluxo sanguíneo dos pulmões foi observada em vários
vertebrados) permite obter confiança objetivamente mensurável sobre predições feitas para
novas observações (Ex. relação entre a taxa de ventilação e percentagem de O2 no torrente
sanguíneo de um novo vertebrado que ventila). A representação matemática destas
relações é comumente chamada de modelagem. Onde os modelos podem ser
considerados representações matemáticas que descrevem ou relacionam variáveis.
Em geral, podemos observar que os métodos de obtenção de conhecimento desde
Bacon valem se de concepções que representam o que pensamos do mundo real (Ex.
teorias, modelos, hipóteses) e seu contraste com observações do mesmo (também
representadas em forma de variáveis, amostras, etc). Na literatura, podemos encontrar uma
diversidade de significados para estes conceitos em função do autor e a área da ciência
(Suppes 1960). Pessoalmente, opino que para que grupos de conceitos sejam úteis e mais
facilmente ensináveis estes devem ter significados específicos e estar relacionados entre
eles de forma lógica. Por isto, neste capítulo combinei a relação entre modelo e teoria
proposta por Suppes (1960) e a relação entre modelo e hipótese proposta por Underwood
(1997). Desta forma estes conceitos ficam hierárquica e logicamente relacionados, e seus
significados são aceitáveis desde os diferentes modos de obtenção de conhecimento
(compare com Jaynes 2003, durante sua apresentação de raciocínio plausível, uma
abordagem verificacionista da obtenção de evidência). Assim, é possível inserir-los num
processo unificado de obtenção de conhecimento científico que combina teoria e
observação. O mapa de conceitos na figura 1 representa tais relações.
VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa”
Pág. 6 Julho/2010
Sistemas
biológicos
Teorias
Modelos
Hipóteses
(=predições)
Variáveis
dos que se
derivam
relacionam ou
descrevem
representados por
compostas
por
explicam
predizem valores
sob determinadas
circunstancias
Figura 1 - Relações lógicas entre conceitos centrais ao processo de obtenção de
conhecimento. Mapa de conceitos baseado nas propostas de Suppes (1960) e Underwood
(1997).
O que é Fisiologia Comparativa?
Em 1950, Prosser listou alguns objetivos da fisiologia comparativa como disciplina.
Estes foram:
1) Descrever como os organismos obtêm seus requerimentos no ambiente onde moram.
2) Prover bases fisiológicas para entender a ecologia.
3) Chamar a atenção sobre animais particularmente bons para estudar processos
fisiológicos.
4) Encontrar generalizações derivadas do uso de distintas espécies animais em estudos
fisiológicos.
Um campo com grande desenvolvimento da fisiologia comparativa é a fisiologia
evolutiva, que busca entender a evolução dos parâmetros fisiológicos (Garland & Carter
1994). Uma vez que as técnicas moleculares têm acelerado nosso conhecimento das
relações filogenéticas entre as espécies, muitos cientistas tentam desvendar processos
evolutivos através da comparação de características em linhagens de espécies com
filogenias conhecidas (Wiens, 2008).
Este campo da fisiologia comparativa nos proporciona um exemplo de como dois ou
mais métodos de obtenção do conhecimento podem ser combinados (Fig. 2). Imagine que
queremos saber se, em lagartos, morar em hábitats abertos provoca um aumento da taxa
Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa
Julho/2010 Pág. 7
metabólica com relação a morar em florestas. Para isto, poderíamos comparar espécies de
área aberta com espécies de floresta. Assim, poderíamos obter que espécies de áreas
abertas têm uma maior taxa metabólica (Fig. 2, esquerda). Entretanto, as espécies são
elementos que apresentam relações filogenéticas. Imagine que estas fossem representadas
pelo gráfico A, veríamos que as espécies de área florestada pertencem à linhagem da
esquerda e as de área aberta à linhagem da direita. Poderíamos ter certeza que é o tipo de
hábitat quem faz aumentar a taxa metabólica? Teríamos mais certeza se nossa hipótese
fosse representada por B?
taxametabólica
floresta área
aberta
sp1
sp2
sp3
sp4
sp5
sp6
sp7
sp8
sp5 sp6 sp7 sp8sp1 sp2 sp3 sp4
sp5 sp1 sp7 sp2sp6 sp2 sp8 sp4
B
A
Figura 2. Comparação hipotética da taxa metabólica entre espécies de lagartos de áreas de floresta e
de área aberta. Os cladogramas A e B mostram diferentes relações filogenéticas entre as espécies
comparadas. Sob a hipótese de parentesco A, as espécies de cada tratamento são aparentadas,
implicando em que a taxa metabólica mais baixa pode ser devida a viver em floresta ou a ser
simplesmente uma característica compartilhada do grupo. Sob a hipótese de parentesco B, a menor
taxa metabólica não pode mais ser explicada pelo parentesco, pois em todos os pares de espécies
mais aparentadas a que mora na mata tem a taxa metabólica mais baixa que a que mora em um
hábitat aberto.
Hoje em dia, métodos indutivos (análise bayesiana) e verificacionistas (análise da
verossimilhança máxima) estão entre os mais usados para escolher dentre hipóteses de
relações filogenéticas (Amorim 2002). Por outro lado, tanto métodos falsificacionistas
(Ex.Teste de Fisher) quanto verificacionistas nos permitiriam testar de maneira objetiva se a
taxa metabólica aumenta em função do tipo de habitat, com base em amostras da taxa
metabólica das espécies referidas. Deste modo, os produtos dos diferentes métodos de
obter conhecimento podem ser combinados dentro de uma disciplina científica. Por
exemplo, na fisiologia comparativa. Você concorda com esta forma de proceder, ou opina
que só podemos confiar em um modo de obtenção de conhecimento? Aqui não é possível
VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa”
Pág. 8 Julho/2010
estender-se mais sobre este assunto, mas lhe recomendo que consulte Sober (2008) antes
de decidir-se.
Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa
Julho/2010 Pág. 9
Formulando perguntas em fisiologia comparativa
Agustín Camacho Guerrero
Laboratório de Herpetologia
agustin.camacho@usp.br
Buscando trabalho: como levantar uma pergunta a responder.
Centremo-nos agora sobre o seu trabalho: fazer ciência. Você sempre deverá
começar com uma pergunta que, para ter certeza de que vale a pena respondê-la, deverá
ter surgido do conhecimento do estado da arte da disciplina de interesse. Quando
realizamos perguntas baseadas sobre conhecimento levantando por outros pesquisadores,
as chances de gerar um maior avanço científico se multiplicam. “Levante-se sobre os
ombros dos gigantes” diria Issac Newton. É necessário pensar duas vezes antes descrever
um aspecto da fisiologia de uma espécie ou grupo de espécies sob o pretexto único de que
“nunca foi estudado”. Isto pode estar escondendo o problema de que não sabemos o que é
mais relevante saber sobre nosso objeto de estudo (Peters, 1987).
Existem várias ferramentas em internet e nas bibliotecas para encontrar este
conhecimento (Web of Science, Biological Abstracts, Zoological Records, Google
Acadêmico etc.). Através destas ferramentes podemos procurar artigos ou livros que falem
sobre nosso tema de interesse. É importante uma cuidadosa seleção de palavras chave,
para encontrar o grupo de artigos que tratam o tema de nosso interesse (uma opção: use os
conceitos relacionados na sua hipótese de estudo). Uma vez conseguidas algumas
referências devemos procurar o material. Nas universidades públicas brasileiras o portal de
periódicos da CAPES garante acesso a vários jornais científicos on-line. Em são Paulo, a
Fapesp ainda fornece acesso ao site Jstor, com artigos mais antigos. “O sistema COMUT de
bibliotecas brasileiras permite, mediante prévio pagamento, a solicitação de xérox ou
arquivos ”.PDF” de quaisquer artigos ou separatas que se encontrem numa biblioteca
brasileira. Por último, você pode pedir diretamente ao autor ou conseguir na internet do seu
site pessoal, ou site do laboratório onde trabalha. Exija da sua universidade maior acesso a
revistas científicas e participe da solicitação de livros na biblioteca da sua unidade! Em
seguida, leia organizadamente o material bibliográfico e busque mais entre as referências
bibliográficas destes trabalhos. As perguntas podem surgir como hipóteses que refutam as
previsões centrais da teoria comumente aceita sobre um determinado tema, ou bem como a
necessidade de dados sobre aspectos fisiológicos de determinadas espécies ou grupos que
a complementam.
VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa”
Pág. 10 Julho/2010
Como ser objetivo: Transformação da
pergunta em um gráfico
Uma vez que tenhamos uma pergunta e
confiamos em que esta tem relevância suficiente
para investir o esforço necessário, deveremos
formulá-la da maneira mais clara possível. Isto é
fundamental para: A) determinar o que queremos
medir exatamente, desenhar nossas observações
de modo a evitar que estas nos confundam; B)
fazer testes estatísticos que nos permitam
calcular, de maneira objetiva, confiança sobre a
resposta indicada pelas nossas observações e C)
determinar se os custos para responder esta
pergunta são altos demais como para tentar
responde-la. Uma pergunta clara é aquela que
pode ser expressa como uma previsão, ou
hipótese, Ex. “a testosterona estimula o
comportamento agressivo na piranha?” ou “a taxa
de crescimento dos girinos é mais alta em presença de Iodo na água?” Um indício de que a
pergunta está bastante clara é que você pode ver nos dois exemplos, é que podemos
transformar a pergunta em hipótese só tirando o ponto de interrogação.
Levantar uma pergunta clara sobre o mundo implica necessariamente que possamos
representá-la em um gráfico cartesiano (Magnusson e Mourão, 2004) (ou tal vez em uns
poucos, caso responder sua pergunta precise de algumas sub-perguntas). Fazer uma
representação gráfica dos nossos objetivos ajuda a esclarecer quais os tipos de variáveis
devemos e podemos medir. Ainda, ao facilitar a exposição dos nossos objetivos e resultados
esperados a outras pessoas (Cleveland, 1984), permite que as outras pessoas realizem
sugestões ou críticas mais importantes antes de começar todo o trabalho (Magnusson e
Mourão, 2004).
Os eixos do gráfico devem representar as partes de nossa pergunta. Os fatores ou
variáveis independentes serão representados sempre no eixo horizontal e as variáveis
dependentes ou de interesse são representadas sempre no eixo vertical (Cleveland,
1984).
Agora estamos em condições de decidir se usaremos variáveis contínuas ou
categóricas para representar nossos fatores e variáveis de interesse. Variáveis contínuas
representam características da natureza atribuindo-lhes números reais, enquanto que
variáveis categóricas dividem estas variáveis sob critérios subjetivos para representá-las
4. Desenho das observações
que respondem à pergunta
Quadro 1.  Esquema básico do 
processo de  trabalho científico.
1.Leitura e observações
prévias
2. Identificação da lacuna de 
conhecimento
3. Emissão da pergunta cuja 
resposta preenchea lacuna
5. Execução e análise das 
observações
7. Interpretação
8. Comunicação de resultados 
e conclusões.
Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa
Julho/2010 Pág. 11
(etiquetas, categorias). Entre os exemplos mais comuns de variáveis contínuas estão:
comprimento de onda, peso, comprimento, concentração, etc. como variáveis categóricas
podemos citar cores, sexo, tratamento. As variáveis contínuas proporcionam mais
informação, enquanto as categóricas são mais simples de entender e manejar. O melhor
tipo de variável vai depender essencialmente da sua pergunta e dos recursos disponíveis.
Os tipos de variáveis escolhidas determinarão o tipo de gráfico utilizado. Entre os
gráficos mais informativos e fáceis de entender estão os gráficos de nuvens de pontos,
gráficos de dispersão, ou scatter plots (Magnusson e Mourão, 2004). Podemos encontrar
dois tipos básicos, o primeiro tem variáveis categóricas no eixo horizontal, o segundo usa
variáveis contínuas no eixo horizontal (Fig. 3).
O CHUMBO NA ÁGUA INFLUENCIA A TAXA METABÓLICA DOS GIRINOS?
muito
chumbo
pouco
chumbo
concentração de
chumbo na água
A B
taxametabólica
taxametabólica
Figura 3. Exemplos de gráficos de dispersão. A) gráfico com fator categórico. B) Gráfico com
fator contínuo (modificado de Magnusson e Mourão, 2004).
Como mostra a Fig. 3, quando categorizamos variáveis podemos perder informação
(Magnusson e Mourão, 2004). Se na pergunta anterior o pesquisador tivesse escolhido
comparar duas concentrações de chumbo, não teria detectado o efeito do chumbo sobre o
crescimento dos girinos, mesmo quando realmente existe uma relação entre as variáveis.
Por outro lado, as categorias podem ser mais didáticas e fáceis de manejar. Por isto é
necessário estar seguro sobre qual informação se quer obter para decidir sobre que tipo de
variável usar.
VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa”
Pág. 12 Julho/2010
Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa
Julho/2010 Pág. 13
Evitando confundir-nos: aspectos fundamentais do desenho
experimental e a estatística inferencial.
Agustín Camacho Guerrero
Laboratório de Herpetologia
agustin.camacho@usp.br
Agora que já sabemos qual é nossa pergunta e como representá-la, deveremos
realizar observações que a respondam. Entretanto, um dos maiores problemas para
responder perguntas sobre sistemas naturais é que estes são afetados por múltiplos fatores.
Estes são fatores cujo efeito se mistura com o do nosso fator de estudo, de maneira que
pode ser impossível saber se a variação observada na variável dependente é derivada de
nosso fator ou destes fatores (Hurlbert, 1984). Por exemplo, um experimentador poderia
determinar que a secreção de saliva é controlada pela presença de alimentos na boca, uma
vez depositados alimentos na boca de um animal e medindo variações no volume de saliva.
Entretanto, se ele não tiver o cuidado de administrar alimentos sem que o animal os veja ou
os cheire, a secreção de saliva poderia ser provocada pela visão ou cheiro destes antes que
pela sua presença na boca do animal. Para um cientista, é crucial aprender a enxergar e
evitar fatores que confundam suas conclusões de maneira não desejada ou oculta. O
desenho experimental representa nossa decisão de quantas observações necessitamos e
como as distribuímos para evitar que fatores de confusão, influenciem em nossa resposta
(Quinn e Keogh, 2002).
Erros cometidos durante o desenho amostral podem fazer com que o efeito de
fatores inadvertidos seja indistinguível do efeito dos teus fatores de estudo. Para evitar
confusões ao comunicar-se com colaboradores durante a fase de planejamento é
conveniente aprender claramente os seguintes conceitos: Unidade amostral, repetição ou
réplica: elas são cada uma das observações que gera uma resposta a sua pergunta (são os
pontos nos gráficos); Universo amostral: é aquela parte da natureza sobre a qual se quer
obter informações por meio de observações e a qual se aplicam nossas conclusões.
O que significa testar uma hipótese?
Como vimos antes, para avançar em ciência derivamos hipóteses a partir de modelos
considerados válidos cuja rejeição/aceitação com base em observações implicaria no
refinamento ou rejeição das teorias que possuímos sobre o mundo. Testar uma hipótese é
mesmo isto: contrastar os valores das nossas observações com os valores que
esperaríamos para ela (No falsificacionismo, compararíamos com os valores esperados
caso nossa hipótese não fosse correta. No verificacionismo, compararíamos as observações
com diferentes possibilidades teoricamente justificadas).
VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa”
Pág. 14 Julho/2010
Frequentemente, queremos realizar algum de dois tipos de testes: A) se os valores
de nossa variável de interesse estão relacionados com uma ou mais variáveis
independentes (fatores), ou B) Se os valores de nossa variável de interesse feitas em duas
ou mais situações diferentes (tratamentos) são iguais ou diferentes (Fig.4).
variação
provocada
pelo fator
ruído
fator
variável
dependente
tratamento
1
tratamento
2
ruído
variação
provocada
pelo fator
A B
variável
dependente
Figura 4. “Scatter-plots” mostrando a distribuição da variação em dois tipos básicos de análise: A)
análise da relação entre duas variáveis e B) comparação do efeito de dois tratamentos sobre uma
variável.
Você pode estar-se perguntando: “para que toda esta complicação?” A resposta é a
seguinte: como normalmente só conseguimos observar uma parte da variação de nosso
sistema de estudo, é possível que o resultado de nosso experimento seja esperado pelo
acaso. Os testes estatísticos nos permitem estimar o quanto é seguro aceitar a resposta a
nossa pergunta (= houve/não houve relação; houve /não houve diferença, que hipótese
suporta melhor os dados), em função de como a variabilidade está partilhada nos dados que
representam nossas observações.
Uma forma comum de fazer isto é distribuir-se a variação encontrada em tal conjunto
de dados em variação provocada por um fator (efeito) e a variação não devida a este fator
(ruído) (Fig. 4). Neste caso, a finalidade de um experimento é avaliar se a variação
provocada pelo fator é, uma vez isolados possíveis fatores de confusão, maior do que o
ruído. Associado a este tipo de experimento, um teste falsificacionista compararia a
distribuição de freqüências observadas com a distribuição de freqüência teórica (=hipótese):
esperada no caso de que o ruído seja maior que o efeito. Um teste verificacionista
compararia a distribuição de freqüências observadas com as distribuições de freqüências
teóricas para os dois casos possíveis: que o efeito seja maior ou vice-versa.
Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa
Julho/2010 Pág. 15
Repetição, pseudorepetição e confiança.
Lembra do problema no final do capítulo 1? Quando um fator altera os valores de
nossas repetições, de modo que faz com que seu valor esteja relacionado, as repetições
são chamadas de pseudorepetições. Aumentar o número de repetições nos permite
aumentar nossa confiança no resultado, mas isso não acontece com as pseudorepetições,
apesar de que aumentar o número de pseudorepetições pode nos dar uma falsa sensação
de confiança.
Para entender a relação entre fatores de confusão, confiança e pseudorepetição, leia
o seguinte exemplo: Imagine que você quer ir “bonito(a)” a uma festa. Em que caso você se
sentiria com maior confiança sobre as opiniões: depois de perguntar a sua mãe? Depois de
perguntar a sua mãe, avós e tias? Depois de perguntar a um(a) colega, ou depois de
perguntar a várias meninas não muito próximas? Como pode ter deduzido, perguntar a suas
avós e tias depois de perguntar a sua mãe não vai trazer tanta confiança, pois é provável
que vão dizer que você está muito bonito(a). Na opinião de cada uma delas está embutido o
fator de confusão “parentesco” (que, vamos lá, é importante neste caso!). Agora, se você
pergunta a um(a) colega, e sua resposta é que você está “muito bonito(a)”, você poderia
ainda pensar que “ele(a) quer te agradar”. Finalmente, se a resposta deste(a) colega)
concordar com a de outros(as) colegas não relacionados(as) com ele(a), sua confiança em
que você está bonito(a) aumentará muito! Cair na pseudorepetição é acreditar que
repetições aumentaram nossa confiança sobre a resposta a nossa pergunta quando estas,
na realidade, estão relacionadas por um fator de confusão. Busque sempre respostas
independentes para suas perguntas!
Provocam pseudorepetição aqueles fatores que não fazem parte do estudo e que
fazem com que os valores de nossas observações não sejam independentes entre eles.
Tipos gerais de pseudo-repetição incluem: espacial= as observações tem valores
relacionados por causa da sua posição no espaço, temporal= quando o fator que relaciona
os valores das observações é o tempo, filogenética= provocada por relações de origem
comum entre as observações e técnica= quando é um elemento do equipamento ou
procedimento experimental que está relacionando os valores obtidos nas observações.
Obtenha informações mais detalhadas e mais exemplos em Hulbert (1984) e Magnusson e
Mourão (2004).
Existem outros aspectos do desenho de um experimento. Por exemplo, decidir
quantas observações serão necessárias, se estas serão dispostas aleatória ou
sistematicamente, e como serão feitos os controles. Explicar isto está fora do tempo
disponível para este módulo, mas todos estes passos são críticos para o sucesso do seu
trabalho. Lhe recomendo que leia a maior quantidade de literatura possível sobre desenho
experimental e estatística antes de começar a coletar seus dados. Comece pela tabela de
VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa”
Pág. 16 Julho/2010
Magnusson e Mourão (2004), pag. 4. Parafraseando a Peters (1987): Não fazer isto “porque
você não teve tempo” facilmente acabará em que todo o esforço e dinheiro público investido
não sirvam para nada.
Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa
Julho/2010 Pág. 17
O Fim da Picada: Comunicando Ciência.
Agustín Camacho Guerrero
Laboratório de Herpetologia
agustin.camacho@usp.br
Pense por um segundo no momento no qual você terminará seu experimento. Foi um
caminho árduo: você teve que ler vários artigos que não entendia bem ou com os quais nem
concordava para levantar uma pergunta não respondida até agora. Passou tempo lendo,
pensando e discutindo o projeto com outras pessoas que, às vezes, não lhe entendiam bem.
Suas idéias sofreram críticas, você teve que esperar longas burocracias (licenças,
solicitação de fundos) e repetir seu experimento várias vezes, resolvendo inúmeros
problemas (animais que morrem antes de obter os dados, infra-estrutura falha, falta dinheiro,
segurança, etc.). Conseguiu imaginar? Com certeza você vai lembrar-se deste parágrafo
depois do seu mestrado...
Bom, se você não tem cuidado no que vem agora, tudo isso pode não ter servido de
nada. A valia dos cientistas se mede grandemente a través da qualidade e quantidade de
artigos científicos que publicam. Para isto, uma grande dose de experiência é necessária.
Recomendo que você a procure em seu orientador e lendo artigos nas revistas onde
pretendam publicar. Assim mesmo, busque textos (Ex. referências neste capítulo, manuais
de redação de jornais científicos) e faça cursos especializados no tema. A continuação,
veremos algumas dicas básicas para estruturar textos científicos. Estas dicas estão
baseadas no livro de Peters (1984), e você deve dominá-las desde o começo.
Repassaremos aqui as partes de um relatório de pesquisa, as relações lógicas entre elas e
alguns elementos básicos que devem conter.
Partes e estrutura de um relatório de pesquisa.
Um relatório de pesquisa deve ser tão claro, preciso e curto quanto seja possível.
Basicamente, consta de 7 partes: título, resumo, introdução, material e métodos, resultados,
discussão, agradecimentos e referências. Veja dicas úteis sobre o título, agradecimentos e
referências na tabela 1. Iremos nos estender mais nas seções de resumo, introdução,
material e métodos, resultados e discussão.
O resumo se compõe normalmente de um parágrafo que demonstra a relevância e
os objetivos do estudo, e explica de forma sucinta os métodos empregados e os principais
resultados e conclusões.
Dentro da introdução devem ficar claros: A) o problema que vamos abordar e sua
relevância B) o estado da arte sobre o problema, mostrando a lacuna de conhecimento que
pretendemos preencher e porque precisa ser preenchida e C) as decorrências dos possíveis
VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa”
Pág. 18 Julho/2010
resultados de nosso trabalho. Por último, os objetivos devem aparecer da forma mais clara
possível. Concretamente, em forma de hipótese a ser testada.
O “material e métodos” deve conter uma explicação clara dos métodos empregados
para alcançar o objetivo declarado no fim da introdução. Desta forma, as técnicas, o
desenho experimental e as análises devem aparecer explicados e justificados de forma que
os leitores sejam capazes de: A) entender como alcançam o objetivo escolhido B) Repeti-lo
C) perceber possíveis fraquezas no delineamento. Se evitarmos mostrar claramente nosso
desenho experimental pode ser que rejeitem nosso relatório na revista que o queremos
publicar. Pior ainda, podemos enganar aos nossos leitores.
A seção de “resultados” deve dar toda a informação necessária para responder
nossa pergunta inicial e que outros possam avaliar se a respondemos mesmo ou não. Isto
implica em descrever as observações feitas, estabelecendo as relações que foram
estatisticamente significativas e as que não foram. Os dados, quando numerosos, devem
ser apresentados em forma de tabelas. Os gráficos devem expor a parte mais importante
dos nossos resultados (nossa pergunta e as observações que a respondem) e informar
sempre o número de repetições. Se nos nossos resultados, os gráficos não representam as
partes de nossa pergunta, a evidência gerada para respondê-la parecerá fraca a vista dos
outros (Magnusson, 1966). Tanto tabelas quanto gráficos devem ter uma legenda curta e
auto-explicativa, e serem numerados, de forma que possam ser referidos no texto. Dados
apresentados em tabelas e gráficos devem ser explicados também no texto, mas evitando
redundância.
Na discussão, devemos expor como nossos resultados se relacionam com a
hipótese que pretendíamos testar, reconhecendo as fraquezas que puderem comprometer
os resultados. Em seguida, mostrar a consistência (ou inconsistência) dos nossos resultados
com os resultados de outros trabalhos levantados na introdução, mostrando quais as
implicações dos nossos resultados sobre a lacuna de conhecimento levantada. Por último,
este é o lugar onde se deve apontar, curtamente, futuros experimentos ou hipóteses
testáveis que permitam avançar no entendimento do problema abordado.
Se o relatório tem vários objetivos, estes devem seguir a mesma ordem na
introdução, material e métodos, resultados e discussão. A fim de facilitar a interpretação do
leitor. Veja uma lista de verificação básica para identificar problemas em seu relatório de
pesquisa (Tab.1).
Busque críticas, seja crítico e ajude à ciência progredir.
Einstein dizia que se você não consegue explicar seu trabalho a seu avô, é porque
você não entende bem o que está fazendo. Agora, eu digo a você que, explicando
corretamente para ele, até seu avô poderia fazer críticas imprevistas e acertadas sobre o
Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa
Julho/2010 Pág. 19
seu trabalho. A comunidade científica deve ajudar-se a través de visão crítica e sentido
construtivo.
Lembre-se que em ciência, tratamos com assuntos que, via de regra, são
complicados. Isto faz com que todos nós cometamos erros. Para evitar erros em seu
experimento, a melhor saída é apresentar seu projeto a pessoas com visão crítica. Se estas
pessoas conseguem entendê-lo perfeitamente, poderão julgar se foram convencidas ou não
pelos seus argumentos. Encontrar falhas nos aspectos do desenvolvimento lógico do
trabalho de um colega pode ser de grande ajuda para ele, antes que invista grande esforço
e dinheiro em um projeto mal planejado. Assim mesmo, podemos evitar que um trabalho
confunda a comunidade científica através da geração de evidências ou argumentos que
permita mostrar que este está errado.
Considerações finais.
Terminou este capítulo que pretendia mostrar-lhe um pouquinho do que vem pela
frente. A melhor forma de enfrentar os próximos anos de preparação é você que deve
planejar. A lista de referências que segue é uma seleção da literatura que fez muita
diferença na minha própria formação (alguma delas chegou um pouco tarde). Espero que
lhe ajude.
VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa”
Pág. 20 Julho/2010
Tabela 1: Lista de verificação na redação de um relatório de pesquisa.
No título
O titulo representa os elementos da sua pergunta? E o universo de estudo?
Na introdução:
A lacuna de conhecimento está clara?
Esta se deriva logicamente do estado da arte da disciplina?
Os objetivos buscam preencher esta lacuna?
Os conceitos mantêm o significado ao longo do texto?
Os objetivos buscam testar ou verificar uma hipótese?
Nos métodos:
Há pontos importantes para julgar a validade do trabalho que não foram explicados?
Está claro para que serve cada seção dos métodos?
As medidas realizadas e os procedimentos adotados estão claramente justificados?
No caso de várias hipóteses, as análises estão redigidas na mesma ordem que os
objetivos?
Nos resultados:
Um gráfico de dispersão representa a resposta a nossa pergunta principal?
O número de observações está claro no gráfico?
Existe redundância entre a informação mostrada no texto e os dados apresentados nos
gráficos e/ou tabelas?
No caso de vários objetivos, os resultados foram apresentados na mesma ordem que as
análises dos métodos?
Os dados mostrados permitem julgar se as análises foram feitas corretamente?
Na discussão
Foram discutidos problemas que possam ter interferido na resposta?
Os resultados de estudos comparados com o nosso são mesmo comparáveis?
As conclusões e sugestões derivam logicamente dos resultados?
Mostraram-se novas hipóteses para avançar no entendimento do tema abordado?
Nos reconhecimentos
As pessoas/organizações que prestaram a ajuda ou licenças mais fundamentais estão
presentes?
Nas referências
Todas as citações, e só as que estão no texto, aparecem na seção referencias?
Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa
Julho/2010 Pág. 21
Glossário
Etimologia: parte da gramática que estuda da história ou origem das palavras.
Lei científica: relação tão demonstrada empiricamente que é assumido que sempre vai ser
observada em determinadas condições.
Princípio científico: pode ser considerado sinônimo de lei científica
Epistemológico: relativo ao estudo do funcionamento da ciência.
Silogismos: arranjos de três proposições lógicas onde a última se deduz necessariamente
das duas anteriores
Inferência: conclusão, seja esta tomada sobre uma população, a partir de uma amostra da
mesma, ou bem tomada a partir da combinação lógica de duas premissas verdadeiras (Ex:
Se as premissas de que todos os homens tem coração e que Sócrates é um homem são
verdadeiras, então podemos inferir que Sócrates tem coração)
Casos gerais e particulares: Para Aristóteles e Bacon, são duas categorias que mostram
generalidade de aplicação de um conceito.
Indução: Raciocínio ou forma de conhecimento pelo qual passamos do particular ao
universal, do especial ao geral, do conhecimento dos fatos ao conhecimento das leis.
Probabilidade prévia: estimação subjetiva da probabilidade de um evento, prévia a um
experimento.
Verossimilhança: Dado um conjunto de dados observados, a verossimilhança valoriza a
plausibilidade de um descritor hipotético deste conjunto, sobre outro possível descritor.
verossimilhança é proporcional à probabilidade de observar os dados sendo um
determinado descritor verdadeiro.
Teoria: explicação sobre um fenômeno. Para Popper, deve ser um conjunto de enunciados.
Diferencia-se de lei porque a teoria não precisa ter sido demonstrada amplamente com
dados empíricos.
Conclusões, previsões, predições ou hipóteses: uma proposição aceitável do ponto de
vista de uma teoria ou um modelo, mas ainda não conferida.
Modelo: tem variados significados dependendo do contexto, porém a maioria pode ser
considerada como “representação simplificada”. Dentro do processo de geração de
conhecimento um modelo pode ser considerado como uma representação de relações entre
variáveis acorde com a teoria da que forma parte tal modelo.
Teoria empírica: Segundo Popper, aquela teoria que pode ser testada.
Tautologia: uma afirmação lógica onde as premissas são iguais à conclusão.
(ex. estes animais não são aquáticos, logo eles não moram na água)
Filogenia: representação de relações de parentesco entre espécies ou grupos de espécies.
Caráter ancestral: característica considerada original para um grupo de espécies.
Teste: prova, ensaio, exame.
VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa”
Pág. 22 Julho/2010
Tratamento: aqui tratado como manipulação.
Fatores ou variáveis independentes: elemento ou circunstância que contribui a produzir
um estado em uma variável influenciada por ele.
Variáveis dependentes ou de interesse: variável cuja variação estamos interessados em
explicar, sendo influenciada pelos fatores.
Efeito: influencia de um elemento sobre outro.
Ruído: variação não devida ao fator.
Pseudorepetições: observações cujos valores estão afetados por um fator de confusão.
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VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa”
Pág. 24 Julho/2010
Unidade 2
Sinalização Celular
Maria Nathália de Carvalho Magalhães Moraes
Laboratório de Fisiologia Comparativa da Pigmentação
nathalia.moraes@usp.br
A sobrevivência dos organismos multicelulares depende de uma rede
elaborada de comunicação inter e intracelular, que coordena o crescimento, a
diferenciação e o metabolismo das células em diversos tecidos e órgãos. Neste
módulo, serão abordados os aspectos da evolução da multicelularidade e os
mecanismos básicos da transdução de sinais, bem como a contextualização desses
mecanismos dentro de patologias, como é o caso da malária. Além disso, será
apresentada a técnica do RNAi (RNA de interferência) como ferramenta de estudo
para a fisiologia, com destaque para as vias de transdução do sinal em diversos
modelos.
VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa”
Pág. 26 Julho/2010
Capítulo 5 Comunicação celular: entendendo a ritmicidade endógena pág. 27
Maria Nathália C. Magalhães Moraes
Revisado por Dra Ana Maria de Lauro Castrucci
Capítulo 6 Fisiologia Celular do Plasmodium durante a fase assexuada
pág. 41
Laura Nogueira da Cruz
Revisado por Dra. Célia R. S. Garcia
Capítulo 7 RNAi: ouvindo a voz do silêncio pág. 49
Maísa Costa
Revisado por Dr. Daniel Carneiro Carrettiero
Bibliografia pág. 66
Sinalização Celular
Julho/2010 Pág. 27
Comunicação Celular: Entendendo a Ritmicidade Endógena
Maria Nathália de Carvalho Magalhães Moraes
Laboratório de Fisiologia Comparativa da Pigmentação
nathalia.moraes@usp.br
Evolução da Multicelularidade
O grande passo obtido através da evolução da unicelularidade para a
pluricelularidade certamente foi a capacidade de comunicação entre as células, por meio da
evolução a partir de uma única célula, a qual desempenhava todas as funções necessárias
para o organismo, para um conjunto de células especializadas proporcionando interações
entre elas (Ben-Shlomo e col., 2003). Os ancestrais dos organismos multicelulares seriam
simples agregados de seres unicelulares, que formavam estruturas designadas colônias.
Inicialmente todas as células da colônia desempenhavam a mesma função. Contudo, ao
longo do tempo algumas das células da colônia especializaram-se em determinadas
funções. A diferenciação celular, relacionada com a função especifica acentuou-se no
decorrer da evolução, originando os verdadeiros seres multicelulares. Neste processo foram
surgindo diferentes tipos de células, que mais tarde originaram tecidos, os quais levaram ao
aparecimento de órgãos. A especialização celular permitiu uma melhor utilização da energia,
levando a uma diminuição da taxa metabólica, além de uma maior independência em
relação ao ambiente.
Para que as células pudessem sincronizar as tarefas e perceber informações do
ambiente, foi necessária a especialização de células para percepção do ambiente
(receptores sensoriais), centros integradores dessas informações (sistema nervoso) e
efetuadores de ajustes homeostáticos (sistema muscular, endócrino e exócrino) (Isoldi e
Castrucci, 2007).
Para garantir o sucesso e a diversificação da vida, foi necessário o aparecimento de
estruturas de ligação e principalmente de comunicação entre as diferentes células. Nos
organismos multicelulares, a manutenção da homeostase é dependente de um
processamento continuo de informações através de uma complexa rede de células. Além
disso, para que o organismo responda a constantes mudanças do ambiente, sinais
intracelulares devem ser transduzidos, ampliados e finalmente convertidos para uma
resposta fisiológica adequada (Pires-da-Silva e Sommer, 2003). Muitos hormônios,
neurotransmissores, quimiocinas, mediadores locais e estímulos sensoriais exercem seus
efeitos sobre as células através de ligação a diferentes classes de receptores. Esses
transdutores altamente especializados são capazes de modular a sinalização de várias vias
que levam a diversas respostas biológicas (Cabrera-Vera e col., 2003). A maioria das
VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa”
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famílias de receptores evoluiu com o advento da multicelularidade e com a necessidade de
um comportamento coordenado do organismo (Ben-Shlomo e col., 2003).
Alvos para ação dos mensageiros químicos
Os mensageiros químicos intercelulares devem atingir células alvo, que possam
interpretar os sinais. Para que as células interpretem esses sinais devem apresentar
elementos que reconheçam esses mensageiros, os chamados receptores, que mudam sua
conformação quando os mensageiros se ligam a eles. A ligação mensageiro-receptor inicia
uma cascata de sinalização que irá evocar a participação de diversos segundos
mensageiros, ativando múltiplas vias de sinalização. Cada classe de receptor ativa
segundos mensageiros específicos, os quais amplificam o sinal e desencadeiam respostas
intracelulares específicas para o sinal inicial. Os princípios moleculares nos quais a
transdução do sinal se baseia são representados por associações específicas de proteínas
e sua fosforilação ou desfosforilação, onde a fosforilação de alvos protéicos leva geralmente
a mudanças imediatas em sua configuração e atividade. Deste modo, o balanço entre
fosforilação e desfosforilação é determinante para a transdução do sinal intracelular. Ainda,
os receptores podem evocar tipos diferentes de efeitos celulares. Alguns deles são muito
rápidos em escala de milissegundos, enquanto os efeitos produzidos por hormônios
esteróides, por exemplo, ocorrem dentro de algumas horas ou dias (Fig. 1) (Rang e Dale,
2007).
Os mensageiros químicos extracelulares podem ser classificados de acordo com a
distância que percorrerão do local de sua síntese até a célula alvo, bem como o tipo de
inter-relação entre a célula produtora e a célula alvo. Os sinalizadores secretados pela
própria célula produtora e que atuam em células adjacentes próximas são chamados de
parácrinos, enquanto os sinalizadores que atuam na própria célula produtora são
conhecidos como autócrinos, além dos sinalizadores que são lançados na corrente
sanguínea, cuja célula alvo encontra-se distante, os quais são chamados de hormônios. Os
sinalizadores parácrinos produzidos por células nervosas são denominados
neurotransmissores, os quais são lançados na região entre neurônios, entre neurônios e
fibra muscular ou entre neurônios e glândula exócrina ou endócrina; essa região é
conhecida como fenda sináptica. Os ligantes podem ainda ser classificados quanto à sua
solubilidade, em hidrossolúveis e lipossolúveis. Os hidrossolúveis são incapazes de
atravessar a membrana celular, e dessa forma, devem ser reconhecidos por receptores
localizados na membrana. Já os compostos lipossolúveis apresentam alta afinidade química
pela membrana podendo, portanto, atravessar a membrana e atuar dentro das células,
chegando muitas vezes ao núcleo, dessa forma sendo reconhecidos por receptores
intracelulares (Isoldi e Castrucci, 2007).
Sinalização Celular
Julho/2010 Pág. 29
Figura 1 – Relação receptor e tempo de ação. Adaptado de Rang e Dale, 2007
Interação molécula-receptor
Existe uma diferença importante entre agonistas e antagonistas. Agonistas e
antagonistas são poderosas ferramentas que permitem a caracterização de estruturas e
funções de subtipos de receptores (Squire e col, 2003). Os agonistas ativam os receptores,
enquanto os antagonistas podem se combinar com os mesmos sítios, porém sem causar
ativação desse receptor, e dessa forma bloqueando o efeito dos agonistas. A ocupação de
um receptor por uma molécula de um ligante pode ou não resultar na ativação desse
receptor. A ativação do receptor ocorre através da ligação da molécula de tal modo que
desencadeie uma resposta tecidual. A ligação e ativação representam duas etapas distintas
da geração de uma resposta mediada por um receptor, que é iniciada por um agonista. A
tendência de um ligante se ligar aos receptores é dada através de sua afinidade. Os ligantes
com alta potência geralmente apresentam alta afinidade pelos receptores e,
consequentemente, ocupam uma porcentagem significativa dos receptores, mesmo em
baixas concentrações (Rang e Dale, 2007).
Tipos de receptores
Segundo a estrutura molecular e a natureza do mecanismo de transmissão, os
receptores são agrupados em quatro superfamílias, a saber: (1) superfamília tipo 1 -
receptores-canal (ou ionotrópicos), receptores de membrana que formam o próprio canal
VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa”
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iônico; (2) superfamília tipo 2 - receptores acoplados à proteína G (GPCRs ou 7-TM ou
metabotrópicos), receptores de membrana acoplados a sistemas efetores intracelulares por
meio de proteína G; (3) superfamília tipo 3 – receptores enzimáticos, receptores de
membrana com domínio intracelular de proteína quinase (em geral, tirosina quinase,
fosfatase e outras) e (4) superfamília tipo 4 - receptores reguladores da transcrição de genes
(ou receptores nucleares ou receptores intracelulares), receptores solúveis no citosol (Fig.
2).
Figura 2 - Tipos de famílias de receptores
Superfamília tipo 1: receptores-canal
Os íons são incapazes de penetrar na bicamada lipídica da membrana celular, e só
podem atravessá-la com a ajuda de proteínas transmembrânicas na forma de canais ou
transportadoras. Os receptores do tipo canal são compostos por 4 ou 5 subunidades (α, β, γ,
δ) combinadas para formar um canal iônico através da membrana (Fig. 3). Cada subunidade
consiste de 4 segmentos transmembrana (TM) referidos como TM1-TM4. Na ausência de
um neurotransmissor, esses canais iônicos permanecem em estado fechado e são
impermeáveis aos íons. A ligação do neurotransmissor induz uma rápida mudança
conformacional que abre o canal, permitindo o fluxo dos íons (Fig. 4). As mudanças na
corrente da membrana resultante da ligação do ligante ao canal ionotrópico são geralmente
mensuradas numa escala de milissegundos. O fluxo iônico cessa quando o transmissor se
dissocia do receptor ou quando o receptor se torna dessensibilizado (Squire e col., 2003). O
primeiro receptor dessa família a ser clonado, foi o receptor nicotínico da acetilcolina
(nAchR), o qual é usado como modelo para o estudo da estrutura dos receptores
ionotrópicos. Sua estrutura pentamérica (2α, β, γ, δ) possui dois sítios de ligação à
acetilcolina, cada um na interface das duas subunidades α. Para que o receptor seja
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ativado, duas moléculas de acetilcolina devem se ligar a esses sítios e, dessa forma, o canal
se abre quase que instantaneamente, permitindo a passagem de íons (Rang e Dale, 2007).
Os canais controlados por voltagem abrem-se quando a membrana celular é
despolarizada. Essa abertura (ativação) induzida pela despolarização da membrana é de
curta duração, mesmo quando a despolarização é mantida. Os canais mais importantes
nesse grupo são os canais seletivos para sódio, potássio e cálcio.
                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                             
Figura 3 – Estrutura do receptor canal. Figura 4 - Esquema de abertura do canal.
Retirado de Squire e col., 2003. Retirado de Squire e col., 2003.
Os canais controlados por ligantes são ativados através da ligação de um
mensageiro químico extracelular a um sítio na molécula do canal. Os receptores desse tipo
controlam os eventos sinápticos mais rápidos do sistema nervoso. A maior parte dos
neurotransmissores excitatórios, como acetilcolina, glutamato, ácido gama-amino butírico
(GABA) e ATP agem dessa maneira e causam aumento na permeabilidade ao Na+
e K+
.
Alguns canais controlados por ligantes respondem a sinais intracelulares e não
extracelulares, tais como: (i) canais de potássio ativados por cálcio, se abrem,
hiperpolarizando a célula, quando ocorre um aumento da [Ca2+
]i; (ii) canais de potássio
sensíveis a ATP, se abrem quando a concentração intracelular de ATP cai. Esses canais
são distintos daqueles que medeiam os efeitos excitatórios de ATP extracelular; (iii) existem
ainda outros canais que respondem a ligantes intracelulares, como canais de potássio
sensíveis a diacilglicerol, cujas funções ainda não estão bem esclarecidas. Dependendo do
íon para o qual o canal é seletivo a alteração no potencial de repouso da célula poderá atuar
de forma diferente, podendo levar à despolarização celular, como é o caso de alguns
subtipos de receptores de acetilcolina e glutamato, que são canais de sódio ou cálcio; ou
dificultando uma eventual resposta de despolarização a um estimulo excitatório, como é o
caso de GABA e glicina, que são canais de cloro (Squire e col., 2003).
Os receptores canais de glutamato são responsáveis pelo fenômeno de potenciação
de longo termo (LTP), plasticidade sináptica e neurodegeneração. O influxo de íons através
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do canal aberto é conseqüência da liberação de glutamato do neurônio pré-sináptico e da
despolarização da membrana do neurônio pós-sináptico, essa mudança de voltagem da
membrana expele íons Mg2+
que estavam bloqueando o canal, fazendo com que este
permita o influxo de cálcio e a geração de oxido nítrico e/ou espécies reativas de oxigênio
(Kloda e col., 2007).
Superfamília tipo 2: receptores acoplados a proteínas G
Os receptores da família tipo 2 são de origem antiga, sendo os primeiros receptores
a emergirem entre os organismos unicelulares. O papel central desses receptores em
organismos multicelulares é refletido por suas divergentes estruturas e funções. A ligação do
mensageiro ao receptor acoplado a proteína G (GPCRs) induz uma mudança
conformacional no receptor, o qual recruta e ativa diferentes proteínas G, as quais
estimulam a geração de adenosina 3’,5’ monofosfato (AMPc), fosfoinositídeos, diacilglicerol e
outros segundos mensageiros. Em termo, esses segundos mensageiros disparam eventos
como ativação de cascatas cinéticas e fosforilação de fatores citosólicos e transcrição de
fatores nucleares (Brivanlou e Darnell, 2002). Os estímulos extracelulares que ativam os
GPCRs incluem luz, íons, nucleotídeos, lipídeos, esteróides, aminoácidos modificados,
peptídeos e hormônios glicoprotéicos (Ben-Shlomo e col., 2003)
Estrutura da proteína G
A interação de hormônios, neurotransmissores ou glicoproteínas com os receptores
7TM na superfície da célula induz uma mudança conformacional do receptor que ativa a
proteína G – composta das subunidades α, β, γ – no interior da célula. No estágio inativo
GDP liga-se à subunidade Gα. (Fig. 5). Quando a proteína G é ativada, o GDP é liberado, e
o GTP liga-se à subunidade Gα e assim ocorre a dissociação do complexo Gα-GTP do
complexo Gβγ. Dessa forma tanto Gα-GTP quanto Gβγ encontram-se livres para ativar seus
efetores, como por exemplo canais iônicos ou enzimas (Pierce e col., 2002). A duração do
sinal é determinada pela taxa de hidrólise do GTP da subunidade Gα e subseqüente
reassociação de Gα-GDP com Gβγ (Hamm, 1998). A cinética da ativação da proteína G
através dos GPCRs tem sido descrita recentemente. Baseado em observações de que a
atividade GTPásica de proteínas G isoladas é mais baixa do que sob condições fisiológicas,
postulou-se a existência de mecanismos que aceleram a atividade GTPásica. Vários
efetores tem sido apontados como promotores da atividade GTPásica da subunidade α da
proteína G. Recentemente, uma família de proteínas chamadas “reguladoras da sinalização
da proteína G” (proteína RGS), capaz de aumentar a atividade GTPásica da subunidade α
da proteína G foi identificada (Wettschureck e Offermanns, 2005).
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Classicamente, as proteínas G são divididas em quatro famílias baseadas na
similaridade de suas subunidades α: Gαi/0, Gαs, Gαq e Gα12/13 (fig. 7) (Cabrera-Vera e col.,
2003; Pierce e col., 2002). Cada família consiste de vários membros que frequentemente
mostram padrões de expressão específicos. Membros de uma família são estruturalmente
similares e frequentemente compartilham algumas de suas propriedades funcionais.
Figura 5 - Mecanismo de ação do receptor acoplado a proteína G. A interação do ligante exógeno
com o receptor de membrana promove a ativação do receptor e sua interação com a proteína G
intracelular. O acoplamento do receptor a proteína G faz com que ocorra uma mudança de GDP para
GTP na subunidade Gα. Gα-GTP então se dissocia do complexo Gβγ e do receptor. Ambas
subunidades estão livres para modular a atividade de uma grande variedade de efetores
intracelulares. O sinal é finalizado quando a γ-fosfatase do GTP é removida pela intrínseca atividade
GTPásica da subunidade Gα, levando a ligação do GDP a Gα. A reassociação de GDP com Gα
completa o ciclo.
Após ativação do receptor acoplado a proteína Gs, adenililciclase (AC) é ativada pela
subunidade α da proteína Gs passando a sintetizar AMPc, como representado na figura 6
(Isoldi e Castrucci, 2008). Existem 9 tipos de adenililciclases conhecidas em mamíferos, as
quais podem ser ativadas pelo complexo cálcio/calmodulina, outras inibidas por baixas
concentrações de cálcio ou por calcineurina (uma proteína fosfatase dependente de ca2+
) ou
pela fosforilação de proteínas quinases II dependentes de Ca2+
/calmodulina (CAMK II). Em
alguns casos, a subunidade α da proteína G inibe a adenililciclase (Gi), promovendo assim
uma diminuição dos níveis de AMPc, ou pode ainda ligar-se a canais modulando-os e dessa
forma não exercendo função reguladora sobre adenililciclase (Schwartz, 2001). Para estudar
as funções das proteínas Gi tem sido muito utilizada uma toxina extraída do Clostridium
botulinum (toxina de pertússis ou PTX) a qual é capaz de ribosilar ADP dessas proteínas
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tornando-as incapaz de interagir com o receptor. Dessa forma o tratamento com PTX resulta
em um desacoplamento do receptor com a proteína Gi (Wettschureck e Offermanns, 2005).
Figura 6 – Representação esquemática da via de sinalização intracelular envolvendo
adenililciclase.
Depois de formado, o AMPc liga-se a proteínas quinases dependentes de AMPc
(PKAs). Na sua forma inativa, a PKA é formada por duas subunidades reguladoras (R), e
duas subunidades catalíticas (C). Ativação da PKA ocorre através da ligação do AMPc nas
subunidades (R), e subsequente liberação da subunidade (C). Após ativação, PKA pode
atuar em diferentes substratos e desencadear uma variedade de respostas. Na ausência de
AMPc, a subunidade (C) volta a inibir a PKA pela reassociação com a subunidade (R). As
subunidades C livres são capazes de fosforilar o fator de transcrição CREB, levando a célula
a um aumento da transcrição de genes específicos. CREB liga-se a regiões do gene que
contêm um elemento de resposta ao AMPc (CRE) e sob fosforilação inicia a cascata de
expressão de genes (Schwartz, 2001).
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Figura 7 - Representação esquemática da cascata de sinalização evocada por proteínas G. As
setas em vermelho representam inibição de um componente da via, e as setas em verde a ativação.
A subunidade Giα inibe adenililciclase, promovendo a diminuição de AMPc. A subunidade Gsα ao
contrario de Giα promove aumento do concentração de AMPc. A subunidade Gqα ativa a produção de
DAG e IP3, e dessa forma IP3 atua em receptores do reticulo promovendo liberação do cálcio.
A família da proteína Gq é uma das mais bem caracterizadas entre as proteínas G
(ver fig. 8). Quando a proteína Gq é estimulada, promove a ativação da enzima fosfolipase
Cβ (PLCβ). Uma vez ativada, a PLCβ promove a catálise do fosfolipídio de membrana 4,5-
bisfosfato de fosfatidilinositol, gerando 1,4,5-trisfosfato de inositol (IP3) e diacilglicerol
(DAG). IP3 difunde-se da membrana para o interior da célula, onde se ligará aos receptores
de IP3 (IP3R), que são canais de cálcio existentes na membrana do reticulo endoplasmático
ou sarcoplasmático. Essa ligação promove a abertura desses canais de cálcio e a
conseqüente liberação dos estoques desse íon para o citoplasma. Em muitos tipos
celulares, a liberação de cálcio dos estoques intracelulares induz a abertura de canais de
cálcio da membrana celular, promovendo assim um influxo de cálcio do meio extracelular
para o interior da célula. O DAG permanece na membrana podendo promover ativação da
proteína quinase C (PKC) desencadeando assim uma cascata de fosforilação, ou ainda,
podendo ser clivado, gerando ácido araquidônico, o qual dá inicio à via de síntese de
eicosanóides como as prostaglandinas (Isoldi e Castrucci, 2007).
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Figura 8 – Representação esquemática da via de sinalização intracelular envolvendo a
participação da fosfolipase C.
Existe ainda uma superfamília de proteínas G, referidas como proteínas G
monoméricas (são formadas somente pela subunidade α), ou Ras. Essas proteínas Ras
estão envolvidas em uma variedade de processos celulares, incluindo proliferação,
diferenciação, migração, maturação e apoptose. A ativação de Ras sob estimulação de
GPCRs e receptores de fatores de crescimento é regulada pela mudança do fator
nucleotídeo de guanina, o qual estimula uma mudança na atividade de GDP/GTP resultando
na ligação do GTP em seu estado ativo à proteína (Schaafsma e col., 2008). As proteínas
Ras processam sinais vindos de receptores tirosina quinase e GPCRs, para o interior das
células, afetando a transcrição gênica (Schenk e Snaar-Jakelska, 1999).
Superfamília do tipo 3: receptores enzimáticos
São encontrados quatro receptores com diferentes domínios enzimáticos: tirosina
quinase, serina/treonina quinase, tirosina fosfatase, guanililciclase. Os receptores do tipo
serina/treonina apresentam como ligante o fator de crescimento transformante beta (TGFβ).
Esses receptores se apresentam em dois sub-tipos, os receptores do tipo I e II, os quais são
classificados de acordo com suas propriedades estruturais e funcionais. O domínio
citoplasmático do receptor tipo II é constitutivamente ativo e este fosforila o receptor tipo I
em resíduos serina e treonina em resposta à ligação do mensageiro extracelular. O receptor
tipo I ativado tradicionalmente fosforila proteínas SMAD citoplasmáticas, dessa forma
ativando a transdução do sinal para o núcleo. As proteínas SMAD ligam-se ao DNA
reprimindo ou estimulando a transcrição de genes e, desse modo, essa cascata de
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sinalização de TGF-β pode representar um papel chave na patogênese de várias doenças
incluindo o câncer (Wright e col., 2009).
As proteínas tirosina quinase foram identificadas em 1980 como as maiores
representantes no câncer resultando na investigação desses receptores como alvos
terapêuticos. (Levitzki, 2003). Receptores tirosina quinase (RTK) são glicoproteínas
transmembrânicas que são ativados pela ligação de ligantes cognatos e transduzem o sinal
extracelular para o citoplasma através da fosforilação do resíduo de tirosina no próprio
receptor (autofosforilação) (Hubbard e Till, 2000). Os RTKs ativam numerosas vias de
sinalização dentro da célula, levando a proliferação, diferenciação, migração, ou mudanças
metabólicas. A família dos RTKs inclui os receptores de insulina e muitos fatores de
crescimento, tais como fator de crescimento epidérmico (EGF), fator de crescimento de
fibroblasto (FGF), fator de crescimento derivado de plaqueta (PDGF), fator de crescimento
endotelial vascular (VEGF). Os RTKs consistem de uma porção extracelular que se liga aos
ligantes polipeptídicos, uma hélice transmembrânica e uma porção citoplasmática que
possui tirosina quinase com atividade catalítica (Fig. 9). A grande maioria de RTKs é
monomérica e dimeriza-se na presença do ligante. A ativação do receptor pelo ligante leva à
ativação da porção quinásica do receptor, resultando em autofosforilação e fosforilação de
substratos SHC, o que culmina com a ativação da proteína G monomérica Ras. Nas vias de
sinalização de receptores monoméricos, a cascata de MAP quinases (MAPK) é recrutada,
resultando na ativação de fatores de transcrição como CREB, c-Fos e Elk-1, envolvidos na
transcrição de genes relacionados à proliferação celular. Em adição aos RTKs, existe uma
ampla família de tirosina quinases citosólicas não receptoras (NRTKs), as quais incluem Src,
Janus Kinases (Jaks), Ab1 (Fig 10). Os NRTKs são componentes das cascatas de
sinalização disparadas por RTKs e por outros receptores de superfície como receptores
acoplados a proteína G e receptores do sistema imunológico (Hubbard e Till, 2000).
Em contrapartida, os receptores tirosina fosfatase, quando ativados por ligantes,
desfosforilam proteínas celulares. Esses receptores têm sido implicados na angiogênese e
na adesão celular (Isoldi e Castrucci, 2007).
Os receptores guanililciclases (GC) são ativados por um hormônio peptídico
denominado peptídeo atrial natriurético (ANP), o qual possui um importante papel na
regulação da homeostase cardiovascular, através da manutenção da pressão arterial. As
ações dos peptídeos natriuréticos são mediadas por sua ligação a três tipos de receptores.
Os receptores NPR A e B (receptor peptídico natriurético A e B) são guanililciclases que
aumentam a concentração intracelular de GMPc e ativam proteínas quinases dependentes
de GMPc. A ativação dos receptores NPRC resulta na inibição da atividade da adenililciclase
(Woodard e Rosado, 2008)
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Figura 9 – Receptores tirosina quinase. Via de sinalização envolvendo a participação das MAP
quinase.
Figura 10 – Via de sinalização dos receptores tirosina quinase, envolvendo a participação das
tirosinas quinases citosólicas.
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Superfamília do tipo 4: receptores reguladores da transcrição de genes
A família de receptores reguladores da transcrição de genes ou receptores nucleares
(NR) compreende fatores de transcrição de uma grande família de genes, incluindo
receptores de hormônio da tireóide (TH), esteróides, retinóides, vitamina D, colesterol entre
outros. Os receptores nucleares são bem difundidos e representam importante papel no
desenvolvimento, metabolismo, homeostase e doenças (Togash e col., 2005). A ativação
dos receptores nucleares ocorre através de ligantes lipofílicos, fosforilação e interação com
outras proteínas. Estes podem ativar ou reprimir genes alvos pela ligação direta ao elemento
responsivo ao DNA como homo- ou hetero-dímeros ou pela ligação de outras classes de
fatores de transcrição ligados ao DNA. Essa atividade tem sido relacionada à formação de
complexos com moléculas que parecem servir como co-ativadoras ou co-repressoras,
causando modificação local da estrutura da cromatina para regular a expressão desses
genes alvo (Hart, 2002).
Os receptores nucleares representam uma classe evolutiva altamente conservada de
fatores de transcrição em mamíferos, e podem ser classificados de acordo com o tipo de
hormônio que se liga a eles. Desse modo os receptores são divididos em: esteróides
(glicocorticóides, mineralocorticóides, andrógenos e estrógeno), derivados de esteróides
(vitamina D3), não esteróides (hormônios da tireóide, retinóides, prostaglandinas) e
receptores para os quais não foi encontrado ainda um ligante específico (receptores órfãos).
A diferente classificação é baseada no modo de ligação ao elemento responsivo ao DNA, e
assim são classificados dentro de quatro grupos, dependendo de sua habilidade para se
ligar à sequência de DNA e dimerizar: (1) os receptores esteróides são associados com a
proteína de choque térmico (“shock heat” hsps). A ligação do hormônio leva a mudança
conformacional, dissociação da proteína hsps e ligação a sequências do DNA como homo-
dímeros. Deste modo o papel do hormônio é induzir a ligação ao DNA; (2) a segunda classe
representa os receptores tais como hormônios da tireóide, retinóides, prostaglandinas e
vitamina D3. Membros dessa classe são ligados ao DNA na ausência do hormônio. A
ligação do ligante ao receptor leva a mudança conformacional do domínio de ligação ao
hormônio e conseqüente ativação transcricional. Os receptores dessa classe são
predominantemente ligados ao DNA como hetero-dímeros; (3) os receptores órfãos que
podem se ligar ao DNA como formas monoméricas; (4) ou como dímeros (Tenbaum e
Baniahmad, 1997).
Em geral, os receptores nucleares possuem em comum três domínios: um variável
domínio amino-terminal de ligação ao promotor, um domínio de ligação ao DNA altamente
conservado (DBD), e um domínio c-terminal menos conservado, de ligação ao ligante (LBD),
como apresentado na figura 11 (Ribeiro e col., 1995). O motivo de ligação ao DNA é
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essencial para o reconhecimento do elemento responsivo pelo receptor. O motivo de ligação
consiste de 66 aminoácidos contendo dois motivos em dedos de zinco. Quatro resíduos de
cisteína altamente conservados são requeridos para coordenar a ligação dos íons Zn2+
(Ribeiro e col., 1995; Tenbaum e Baniahmad, 1997). O LBD confere especificidade na
ligação ao ligante e possui um número de funções reguladas por essa ligação. Essas
funções incluem a liberação do receptor do complexo hsps, translocação para o núcleo,
homodimerização, heterodimerizção e ativação transcricional (Ribeiro e col., 1995).
Figura 11 – Estrutura dos receptores nucleares. O esquema apresenta os diferentes domínios dos
receptores nucleares. Modificado de Rang e Dale, 2007.
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Fisiologia Celular do Plasmodium durante a fase assexuada
Laura Nogueira da Cruz
Laboratório de Fisiologia Celular e Molecular do Plasmodium
laurancruz@gmail.com
Malária
Malária é uma das mais importantes infecções por protozoários no mundo causando
morte de mais de 2 milhões de pessoas anualmente (Who, 2005). A Africa subsaariana
concentra 90% dos casos, no entanto mais de 40% da população mundial está sob risco da
doença, principalmente os habitantes das regiões tropicais e subtropicais do globo (Fig. 1)
onde ocorre a distribuição geográfica do mosquito do gênero Anopheles (A. darling, no Brasil
e A. gambiae, na África), que transmite as espécies infectantes humanas P. falciparum, P.
malariae, P. vivax e P. ovale, sendo as três primeiras espécies encontradas no Brasil.
P. falciparum é o parasita que mais causa morte por malária no mundo ocorrendo em
maior incidência na África. No Brasil, a maioria dos casos é de P. vivax (Who, 2005).
É importante lembrar que a malária pode ser muito mais antiga que a humanidade e
existem quase 100 espécies de plasmódios, 22 dos quais infectam macacos e 50 parasitam
aves ou répteis (que tiveram seu apogeu nos períodos Permiano e Triássico, quando os
insetos hematófagos já existiam).
Plasmódios de roedores e aves são freqüentemente utilizados, no laboratório, como
modelos experimentais. Entender a complexa biologia do parasita é fundamental para o
desenho de novas e mais eficientes drogas e desenvolver novas estratégias para combater
a epidemia.
Figura 1: Potencial mundial de transmissão de malária.
(Fonte : http://en.wikipedia.org/wiki/File:Malaria_geographic_distribution_2003.png)
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Combate à malária
Nos últimos cinqüenta anos muitas pesquisas foram realizadas fomentando o
desenvolvimento de drogas sintéticas antimalaricas. A mais importante dessas foi a
cloroquina que possui baixa toxicidade, baixo custo e necessidade de ser aplicada apenas
uma vez por semana. Atualmente, no entanto, um grande problema no combate à malária
deve-se ao aumento da resistência dos parasitas a cloroquina, derivados de cloroquina e a
grande maioria de antimaláricos introduzidos (Olliaro e col., 1996). Para inibir o
aparecimento de resistência a WHO recomenda que o tratamento utilize pelo menos o
combinado de 2 anti-maláricos.
A incidência da malária, no Brasil, por exemplo, aumentou cerca de 10 vezes nos
últimos 30 anos, sendo que hoje 99% desses casos ocorrem na Amazônia Legal (FNS,
2002), área endêmica do país, composta pelos estados do Acre, Amapá, Amazonas,
Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins. Nos Estados fora da
Amazônia Legal, o risco de transmissão local é pequeno ou inexistente e a quase totalidade
dos casos de malária registrada é importada da Amazônia Legal ou de outros países,
principalmente da África
Limitações da quimioterapia no controle da malária demonstram a necessidade de
novas drogas, preferencialmente contra novos alvos (McKerrow e col., 1993; Rosenthal,
1998), pois apesar de todas as pesquisas e informações adicionais o número de casos de
malária vem aumentando e uma vacina eficiente provavelmente não estará disponível no
futuro próximo (Hoffman, 1996). Além disso, os esforços para controlar o mosquito
Anopheles tiveram pouco sucesso (Alonso, 1991).
Atualmente o que pode ser feito são medidas de profilaxias para pessoas que se
dirigem a áreas de maior transmissão. O regime profilático consiste em prescrição médica
dos medicamentos antimaláricos de acordo com as espécies de Plasmodium predominantes,
grau de risco da infecção da área de destino, perfil de resistência ás drogas e avaliação dos
efeitos colaterais associados ao uso das mesmas (Farias, 2005)
A quimioprofilaxia deve ser iniciada uma semana antes da viagem, para avaliação
dos efeitos colaterais, e prolongada por quatro semanas após a saída da área endêmica, a
fim de sustentar a ausência dos parasitas na corrente sangüínea, mesmo após a sua
transição pelo estágio hepático, período de incubação que pode levar á formação de formas
latentes do parasita, responsáveis por recaídas. Contudo, apesar das medidas preventivas,
febre no período de dois meses após o curso da quimioprofilaxia ainda pode ser originada
pela infecção. Outro propósito da profilaxia se estender por um tempo depois da visita a área
de risco é para evitar que se importe doença para a origem do viajante.
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Trabalhos recentes mostram que o controle com telas mosquiteiras impregnadas com
inseticida ajuda no combate da malaria. (Chouaibou e col., 2006). A malaria caiu na década
de 50 pelo esforço combinado da cloroquina e do DTT, que combatia o mosquito!
Ciclo de vida
O Plasmodium é um parasita eucarioto unicelular, de vida intracelular obrigatória, que
mede 1,6 X 1,0 uM e pertence ao filo Apicomplexa. Possui um ciclo de vida caracterizado
pela sucessão de várias formas especializadas de desenvolvimento
Em vertebrados, a infecção se inicia pela picada do mosquito Anopheles, fêmea, que
retira 3 a 4 microlitros de sangue, enquanto injeta saliva contendo alguns esporozoitos. Uma
vez na corrente sanguínea, os esporozoitos invadem os hepatócitos e se desenvolvem para
o estágio assexuado de merozoito. Durante este período a infecção é assintomática e cada
esporozoito forma 30,000 merozoitos. Estes são liberados diretamente na corrente
sangüínea e invadem os eritrócitos (Sturn e col., 2006). Na corrente sangüínea amadurecem
passando pelos estágios de anel, trofozoito e esquizonte. Por um processo ainda
desconhecido, alguns merozoitos não invadem os eritrócitos e se diferenciam em
gametócitos, a forma infectante do mosquito (Garcia, 2001).
Para o fechamento do ciclo, o mosquito – onde ocorre o ciclo sexual do parasita -
terá que picar o vertebrado que tem gametocitos presentes na circulação. Estes, após o
ciclo no mosquito formarão os esporozoitos que migrarão até a glândula salivar e serão
transmitidos ao hospedeiro vertebrado (Fig. 2).
Figura 2: Ciclo de vida da malária (Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/Malaria).
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O ciclo intraeritrocítico é, portanto, o responsável por toda manifestação clínica na
malária, sendo na ruptura do eritrócito infectado e conseqüente liberação do parasita para
infecção de novas células que ocorrem febre e tremedeira, típicas da doença (Hawking,
1970). Dependendo da espécie de parasita, estes sintomas ocorrem em intervalos distintos –
3 ou 4 dias para P. falciparum e P. vivax, respectivamente (Garcia, e col., 2001) (Tab. 1).
Função da melatonina
A transição do estágio intraeritrocítico, bem como o processo de invasão in vivo e a
produção de gametócitos são processos altamente sincronizados (Garcia, 2001) e na
maioria mamíferos estudados seguem ciclos múltiplos de 24h (Tab. 1)
Tabela 1- Período do ciclo intraeritrocítio de diversas
espécies de Plasmodium (Modificado de Garcia, e col., 2001).
Parasita Hospedeiro vertebrado Período do ciclo
intraeritrocítico
P. knowlesi primata 24h
P. cathemerium pássaro 24h
P. vinckei roedor 24h
P. chabaudi roedor 24h
P. berghei roedor 24h
P. yoelii roedor 18h
P. gallinaceum galinha 36h
P. falciparm homem 48h
P. vivax Homem 48h
P. cynomolgi Primata 48h
P. coatneyi Primata 48h
P. malariae Homem 72h
P. inui Pássaro 72h
P. brasilianum Primata 72h
No caso do desenvolvimento intraeritrocítico do Plasmodium, os processos de divisão
celular e expressão gênica específicas de cada estágio são de extrema importância. Foi
demonstrado por Hotta e col., (2000) que o hormônio melatonina é capaz de sincronizar o
desenvolvimento do Plasmodium in vivo e in vitro. Quando se mantém parasitas em cultura,
Sinalização Celular
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a sincronia é perdida, um dos fenômenos que sugeriram que o hospedeiro tem papel
fundamental no estabelecimento do ritmo. (Hotta e col., 2000).
A melatonina tem um largo espectro de atuação (vertebrados, plantas e protozoários)
podendo ser sintetizada em vários tecidos, porém sua síntese rítmica é confinada
primariamente à glândula pineal. Este hormônio é sintetizado a partir de serotonina, que está
presente em grande quantidade na glândula pineal.
É interessante observar ainda que os precursores da melatonina, que são devirados
do triptofano, têm o mesmo efeito da melatonina tanto no ciclo celular do Plasmodium quanto
na mobilização de Ca2+
de estoques intracelulares (Beraldo e col., 2005).
Hotta e col., (2000) consideram que a melatonina é capaz de ativar a cascata da
fosfolipase C que, por sua vez, ativa a via de inositol 1,4,5-triposfato (IP3) e libera Ca2+
do
retículo endoplasmático (RE), nos estágios trofozoitos do Plasmodium.
Homeostasia e sinalização por cálcio
Variações na concentração de cálcio intracelular exercem papel fundamental em
muitos processos biológicos de células eucarióticas, como organização do citoesqueleto,
divisão e diferenciação celular (Berridge, 2003).
As células eucarióticas possuem mecanismos para manter a homeostasia de Ca2+
estes incluem uma bomba de cálcio na membrana plasmática, no retículo endoplasmático
além de trocadores em organelas intracelulares e na membrana plasmática (Passos e
Garcia, 1997; Garcia e col., 1998).
Especificamente, para o parasita da malária foi demonstrado a existência de 2
compartimentos de Ca2+
: um é o clássico retículo endoplasmatico (Passos and Garcia, 1997,
Varoti e col., 2003) e o outro é um compartimento ácido (Garcia e col., 1998, Varotti e col.,
2003).
Sabe-se que para Plasmodium falciparum o Ca2+
extracelular é indispensável no
processo de invasão do eritrócito pelo parasita e estudos fisiológicos mostram envolvimento
da sinalização de Ca2+
no processo de maturação do parasita. (Garcia, 1999, Gazarini e col.,
2003).
Como qualquer célula eucariótica, o citoplasma do eritrócito possui baixa
concentração de cálcio (menor que 100 nM ), sendo que o ambiente extracelular encontrado
pela maior parte das células eucarióticas situa-se ao redor de 1 mM. A ausência de Ca2+
extracelular é normalmente incompatível com as funções normais da célula e sua
sobrevivência.
Dentro deste contexto, nosso laboratório demonstrou que o parasita resolve o
problema de pouco Ca2+
no meio em que sobrevive, através da invaginação da membrana
citoplasmática do eritrócito, pois no momento da infecção forma o vacúolo parasitóforo (VP)
VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa”
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e inverte a polaridade da Ca2+
ATPase da membrana (bombeando ativamente Ca2+
para o
interior do VP). Desta forma pode manter o ambiente de alta concentração de Ca2+
necessário ao desenvolvimento do parasita (Gazarini e col., 2003).
Enzimas proteolíticas
Enzimas proteolíticas possuem um importante papel no ciclo de vida de todos os
protozoários medicamente importantes como leshmania, toxoplasma, giardia e plasmodium
(Rosenthal,1999).
Várias proteases de protozoários foram identificadas e caracterizadas sendo
utilizadas pelos protozoários em diferentes funções tais como: invasão de células e tecidos
do hospedeiro, degradação de mediadores da resposta imune e hidrólise de proteínas para
suprir necessidades nutricionais do parasita (Rosenthal,1999).
As proteases podem ser classificadas em quatro classes (Neurath 1989; Barrett,
1994), sendo três delas (serine, cisteina e aspartil proteases), assim denominadas pela
existência de sítio de aminoácido chave e a metaloprotease , pela necessidade do íon
metálico para catálise.
Sabe-se ainda que para a invasão dos eritrócitos por merozoitos e ruptura pelos
esquizontes maduros, são necessárias proteases do parasita, pois durante estes eventos
proteínas do citoesqueleto do eritrócito precisam ser hidrolizadas e algumas proteínas do
parasita são proteolicamente processadas (Klemba, 2002).
Outra importante função das proteases inclui a degradação da hemoglobina que é
utilizada como uma fonte de amino ácido livre pelo parasita (Scheibel e Sherman, 1988).
O conteúdo da hemoglobina em eritrócitos infectados diminui 25-75% durante o ciclo
de vida do parasita eritrocítico (Ball e col., 1948; Groman, 1951; Roth e col., 1986), a
concentração de aminoácido livre é maior nos eritrócitos infectados do que nos não
infectados e a composição dos aminoácidos de eritrócitos infectados é semelhante à
composição de aminoácidos da hemoglobina.
Peptídeos fluorescente para determinar atividade de proteases
Recentemente foram desenvolvidos peptídeos sintéticos, com seqüências específicas
de aminoácido capazes de penetrar na célula e emitir fluorescência quando clivado pela
protease (Fig. 3). Dependendo da especificidade da seqüência peptídica e das proteases
pode-se então determinar atividades e funções proteolíticas.
Em estudos realizados com P. chabaudi utilizou-se este quelante interno
fluorescente de peptídeos (IQF) e microscopia confocal para demonstrar-se que
Sinalização Celular
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melatonina induz atividade das thiol protease em uma forma cálcio-dependente
(Farias et al, 2005).
Estas proteases estão localizadas predominantemente no citoplasma do
parasita e sua atividade pode também ser induzida por agentes que aumentam o
cálcio citosolico como tapsigardina (inibidor específico da Ca2+
ATPase do retículo
endoplasmático), nigericina (ionóforo K+
/H+
) e ionomicina (ionóforo Ca2+
/H+
) (Farias
et al, 2005).
Figura 3: Representação esquemática do mecanismo de funcionamento dos
substratos quelante interno fluorescente de peptídeos (IQF).(Modificado de Carmona
et al, 2009).
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Método Científico em Fisiologia Comparativa

  • 1.
  • 2.  
  • 3. Comissão Organizadora Amanda de Moraes Narcizo Camila Helena de Souza Queiroz Camila Lopes Petrilli Cláudia Emanuele Carvalho de Sousa Diego Jose Belato y Orts Felipe Viegas Rodrigues Kelly Dhayane Abrantes Lima Leopoldo Francisco Barletta Marchelli Marco Antônio Pires Camilo Lapa Maria Nathália de Carvalho Magalhães Moraes Marina Marçola Pereira de Freitas Tatiana Hideko Kawamoto Coordenador: Prof. Dr. Márcio Reis Custódio VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” http://www.ib.usp.br/cursodeinverno Realização Patrocínio
  • 4.
  • 5. Apresentação VII Curso de Inverno - IB/USP Pág. i APRESENTAÇÃO A idéia da criação do Curso de Inverno: Tópicos em Fisiologia Comparativa surgiu em 2002, quando alunos da pós-graduação do Departamento de Fisiologia Geral do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo – USP, ansiavam a criação de um espaço que possibilitasse alternativas de aprendizado complementar. Naquele momento de inquietude e vontade discente, a decisão foi de empenho em realizar um curso no período de férias e oferecê-lo a graduandos e recém-graduados que almejassem ingressar na pós-graduação em Fisiologia, ou mesmo para aqueles que se interessassem pelo tema de uma forma geral. Além disso, na última década, percebemos uma preocupação crescente em descentralizar o desenvolvimento concentrado na região Sudeste do país e atingir áreas mais carentes tanto em pesquisa quanto em desenvolvimento humano. Em defesa deste conjunto de idéias e ações que a Comissão Organizadora do Curso de Inverno busca sempre ampliar o alcance do curso, colaborando cada vez mais efetivamente na construção de um país com menos desigualdades. Sendo assim, o curso é voltado para alunos originários das diversas áreas do conhecimento que tenham interesse em Ciências Fisiológicas, mais especificamente em Fisiologia Comparativa. Seu principal objetivo é promover discussões de conhecimentos fundamentais para uma boa formação em Fisiologia, assim como proporcionar uma vivência no dia-a-dia da pesquisa do Departamento de Fisiologia do Instituto de Biociências - USP. Este livro visa complementar os conteúdos discutidos em sala de aula, proporcionando uma fonte adicional de consulta para os participantes. O livro é composto de nove unidades que abrangem os mais variados temas dentro da Fisiologia Comparativa, os quais apresentam desde teorias básicas até as mais novas discussões da atualidade. Desejamos uma boa leitura a todos! Comissão Organizadora VII Curso de Inverno: Tópicos em Fisiologia Comparativa Universidade de São Paulo 5 a 23 de Julho de 2010
  • 6. Mapa Conceitual Pág. ii VII Curso de Inverno - IB/USP MAPA CONCEITUAL Na tentativa de sempre melhorar a qualidade das aulas e a comunicação dos pós- graduandos, a edição 2010 do “Curso de Inverno: Tópicos em Fisiologia Comparativa” foi organizado em módulos conforme delineamento sugerido por um mapa conceitual, o qual mostra a interligação entre os diversos assuntos da Fisiologia e aponta as relações existentes entre os temas que serão abordados no decorrer do curso. Assim sendo, a partir dele, os módulos deste ano foram criados de acordo com as proximidades de cada tema. Desta maneira, podemos oferecer aos alunos participantes uma base mais sólida e coesa a cerca da Fisiologia Comparativa, e ao mesmo tempo transmitiremos uma boa noção da diversidade de temas abordados no Departamento de Fisiologia. Mapa Conceitual mostrando as interligações existentes nos mais diversos temas abordados no Departamento de Fisiologia Geral do Instituto de Biociências da USP, os quais serão apresentados durante as aulas no Curso de Inverno: Tópicos em Fisiologia Comparativa 2010.
  • 7. Sumário VII Curso de Inverno - IB/USP Pág. iii SUMÁRIO Unidade 1 Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa Capítulo 1 O que é ciência e como praticá-la pág. 03 Capítulo 2 Formulando perguntas em fisiologia comparativa pág. 09 Capítulo 3 Evitando confundir-nos: aspectos fundamentais do desenho experimental e a estatística inferencial pág. 13 Capítulo 4 O Fim da Picada: Comunicando Ciência pág. 17 Glossário pág. 21 Bibliografia pág. 22 Unidade 2 Sinalização Celular Capítulo 5 Comunicação celular: entendendo a ritmicidade endógena pág. 23 Capítulo 6 Fisiologia celular do plasmodium durante a fase assexuada pág. 41 Capítulo 7 RNAi: ouvindo a voz do silêncio pág. 49 Bibliografia pág. 66 Unidade 3 Neurociências Capítulo 8 História da neurociência pág. 79 Capítulo 9 Princípios básicos em fisiologia neural pág. 89 Capítulo 10 Fisiologia sensorial pág. 103 Capítulo 11 Neurofisiologia da visão pág. 115 Capítulo 12 Causa e função pág. 121 Capítulo 13 Percepção pág. 127 Capítulo 14 Memória e seus aspectos evolutivos pág. 139 Capítulo 15 Navegação espacial pág. 153 Capítulo 16 Neurobiologia das emoções pág. 163 Capítulo 17 Neurofisiologia da linguagem pág. 179
  • 8. Sumário Pág. iv VII Curso de Inverno - IB/USP Capítulo 18 Neurofisiologia da música pág. 187 Bibliografia pág. 194 Unidade 4 Metabolismo Capítulo 19 Metabolismo e Temperatura: Conceitos e Implicações pág. 205 Capítulo 20 Medindo a chama da vida pág. 217 Capítulo 21 Ectotermia: um acesso de baixo custo à vida pág. 235 Capítulo 22 Termorregulação em endotérmicos: febre e anapirexia. “Ana” o quê? pág. 247 Capítulo 23 Metabolismo energético em câmera lenta: mecanismos de depressão metabólica sazonal pág. 257 Capítulo 24 Custos e benefícios da reprodução: papel dos lipídios pág. 269 Capítulo 25 A ecofisiologia no cenário das mudanças climáticas globais pág. 279 Bibliografia pág. 286 Unidade 5 Neuroendocrinologia Comparada Lista de abreviações pág. 301 Capítulo 26 Neuroendocrinologia comparada: análise comparativa entre o encéfalo e a hipófise de peixes e mamíferos pág.305 Capítulo 27 Neuroendocrinologia comparada: o encéfalo e a hipófise de anfíbios, répteis e aves pág. 323 Capítulo 28 Sistema neuroimunoendócrino pág. 337 Bibliografia pág. 348 Unidade 6 Ecotoxicologia Aquática Capítulo 29 Metal não essencial: o cádmio e seus efeitos pág. 361 Capítulo 30 Transporte de Metais Essenciais em Organismos Aquáticos: o cobre e o zinco pág. 371
  • 9. Sumário VII Curso de Inverno - IB/USP Pág. v Capítulo 31 Efeitos da toxicidade de metais no metabolismo de organismos aquáticos pág. 381 Capítulo 32 Alterações neuroendócrinas resultantes da exposição a metais pág. 395 Bibliografia pág. 407 Unidade 7 Fisiologia Comparada de Invertebrados Marinhos: Trocas Gasosas, Digestão e Sistema Imune Capítulo 33 Trocas gasosas em invertebrados marinhos pág. 427 Capítulo 34 Adquirindo energia: formas de alimentação e digestão em inverte- brados marinhos pág. 435 Capítulo 35 Sistema Imune de Invertebrados marinhos: mecanismos, funções e similaridades pág. 455 Bibliografia pág. 467 Unidade 8 Fundamentos de Toxinologia Capítulo 36 Co-evolução entre peçonhas e seus alvos pág. 473 Capítulo 37 Produtos naturais e sua função como defesa química pág. 483 Capítulo 38 Invertebrados marinhos: toxinas e seus mecanismos de ação pág. 493 Capítulo 39 Lepidópteros: aspectos biológicos e toxinológicos pág. 501 Capítulo 40 Raias – biologia e envenenamento pág. 511 Capítulo 41 Serpentes peçonhentas do Brasil: biologia, fisiologia e epidemiologia pág. 519 Bibliografia pág. 535
  • 10. Sumário Pág. vi VII Curso de Inverno - IB/USP Unidade 9 Quantificação e Análise de Dados Capítulo 42 Quantificação de Fenômenos Fisiológicos pág. 547 Bibliografia pág. 564
  • 11. Unidade 1 Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa Coordenador: Agustín Camacho Guerrero Laboratório de Herpetologia agustin.camacho@usp.br Este capítulo tem três objetivos. A) Apresentar aos leitores os principais métodos usados para gerar conhecimento científico, B) Mostrar como a fisiologia comparativa pode valer-se de dois destes métodos: o método indutivo e o hipotético-dedutivo, C) Revisar o processo de geração de conhecimento, desde o levantamento de perguntas científicas até a comunicação dos resultados de um projeto de pesquisa, passando por apresentar as bases do desenho experimental e a análise estatística. O fim último deste texto e as aulas associadas é que os alunos tenham uma visão básica e estruturada do método científico. Com esta visão, espero que lhes seja mais fácil aprender no futuro sobre temas mais específicos (desenho experimental, estatística, comunicação da ciência, etc). No final do capítulo, existe um glossário que define termos importantes em negrito. Os termos estão na ordem em que são encontrados durante a leitura, para facilitar uma consulta inmediata. Por que ler este texto? Infelizmente, muitos cursos em biologia colocam as disciplinas de método científico como optativas, em lugar de inserir este tipo de preparo, ao menos nas disciplinas obrigatórias da grade curricular. Deste modo, muitos alunos não têm um preparo mínimo para planejar, executar projetos científicos, nem comunicar os resultados obtidos. Como conseqüência, os primeiros trabalhos de um aluno perdem em qualidade, diminuindo também suas possibilidades de obter bolsas no futuro. Este capítulo pretende mostrar alguns conceitos básicos e dicas para auxiliar aos alunos nos seus primeiros encontros com o trabalho de pesquisador. Durante as aulas relacionadas a este módulo veremos estes conceitos da forma mais didática possível, mas neste capítulo tem informações e dicas úteis que não serão explicadas na aula.
  • 12. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 2 Julho/2010 Todos os capítulos revisados pelos profs Dr. Pedro Ribeiro e Dr. Pedro Luis Bernardo da Rocha Capítulo 1 O que é ciência e como praticá-la pág. 03 Agustín Camacho Guerrero Capítulo 2 Formulando perguntas em fisiologia comparativa pág. 09 Agustín Camacho Guerrero Capítulo 3 Evitando confundir-nos: aspectos fundamentais do desenho experimental e a estatística inferencial pág. 13 Agustín Camacho Guerrero Capítulo 4 O Fim da Picada: Comunicando Ciência pág. 17 Agustín Camacho Guerrero Glossário pág. 21 Bibliografia pág. 22
  • 13. Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa Julho/2010 Pág. 3 O que é ciência e como praticá-la. Agustín Camacho Guerrero Laboratório de Herpetologia agustin.camacho@usp.br O que é ciência? Uma bonita forma de começar a preparar-nos é conhecer a etimologia da palavra que definirá nosso trabalho, talvez pelo resto das nossas vidas. A palavra ciência provém do latim “scientia” proveniente do verbo “scire = saber”, este está relacionado com o verbo, também latim, “scindo = dividir”. Existem várias definições de ciência, mais ou menos completas, seja com ênfase nos seus objetivos ou nos métodos que usam. Uma definição bastante completa é: “1. The systematic observation of natural events and conditions in order to discover facts about them and to formulate laws and principles based on these facts. 2. The organized body of knowledge that is derived from such observations and that can be verified or tested by further investigation. 3. Any specific branch of this general body of knowledge, such as biology, physics, geology or astronomy.” Academic Press Dictionary of Science & Technology. Neste módulo, seguiremos uma visão de ciência como busca e comunicação de conhecimento, o mais confiável possível, sobre a natureza. Métodos conceituais de obtenção do conhecimento. Desde séculos antes de Cristo, filósofos, empiristas e estatísticos, tais como Aristóteles, Bacon, Bayes, Fisher, Popper, Underwood e Jaynes, vêm aprimorando os métodos conceituais de obter conhecimento do mundo natural, de forma a obter mais conhecimento e com maior confiabilidade. Assumo que um passo necessário para sermos bons cientistas passa por conhecer os diferentes modos de obtenção de conhecimento. A continuação, lhe introduzirei aos métodos mais conhecidos e utilizados. Deste modo, espero justificar um esquema unificado de obtenção de conhecimento que lhe facilite a assimilação de conceitos apresentados em futuros cursos de estatística e delineamento experimental. Vamos lá: No século IV a. c., Aristóteles definiu o raciocínio demonstrativo, ou lógica aristotélica, em seis obras conhecidas coletivamente como Organon. De acordo com Aristóteles, existem termos gerais (Ex. os homens) e termos particulares (Ex. Socrates) que se referem a subconjuntos dos termos gerais. Segundo este método, estes elementos podem ser identificados e, relacionando estes através de construções lógicas (silogismos), é possível derivar conhecimento novo e necessariamente certo (inferências). Nestas construções, a combinação de dois ou mais enunciados verdadeiros (Ex. todos os homens
  • 14. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 4 Julho/2010 são primatas; Sócrates é um homem) permitem inferir um novo conhecimento, também verdadeiro (então Sócrates é um primata). O sistema lógico inventado por Aristóteles, nos permite até hoje combinar observações consideradas certas para fazer crescer nosso conhecimento. Porém, Aristóteles não criou um sistema formal para a determinação da veracidade ou generalidade dos termos, fazendo com que esta determinação fosse, durante muito tempo, feita com base no conhecimento prévio e subjetivo dos naturalistas. Em 1620, Francis Bacon rompeu com a tradição da lógica aristotélica propondo evitar que prévias doutrinas intercedam nas nossas observações. Para Bacon, só era possível aumentar nosso conhecimento através da experimentação e das observações. O conhecimento gerado permitiria, segundo ele, explicar de forma cautelosa, situações relativamente similares. Produzir explicações sobre grupos de casos gerais com base no que sabemos de casos particulares é definido por ele como indução. Para Bacon, este conhecimento deveria gerar novos experimentos e ser testado em diversas situações. Ele defendia que os cientistas deveriam ser céticos acima de tudo, e não aceitar explicações que não possam ser verificadas pela observação e experiência. Bacon, entretanto, não clarificou quantas nem como deviam ser feitas as observações para assumir um conhecimento como certo. Em 1670, Bayes elaborou um método lógico de atribuir uma probabilidade a afirmações geradas por indução. Este método é conhecido como lógica probabilística indutiva. Assume que a probabilidade de uma hipótese ser verdadeira pode ser calculada multiplicando: A) nossa expectativa de que a hipótese seja certa, expressada em forma de probabilidade prévia, vezes B) um valor de verossimilhança (likelihood) obtido a partir de novas observações (Bayes 1763). Desta forma, a probabilidade bayesiana fornece uma medida de quanto é razoável acreditar em uma hipótese usando toda a informação de que dispomos (Jaynes 2003). Um problema com este método é que as probabilidades prévias podem mudar subjetivamente com o pesquisador, e isto afeta ao resultado final. Outro problema é exposto na continuação. Karl Popper (1934) enunciou o Método hipotético-dedutivo, chamado também probabilismo ou falsificacionismo. Segundo este método, não é possível derivar probabilidades para asserções geradas por indução (Popper 1959) (ex. o simples fato de que todos os corvos que vi até agora são pretos, não permite calcular a probabilidade de que o próximo corvo que eu veja será preto, pois não conheço quantos corvos existem no mundo). Para Popper, o conhecimento deve estar justificado de forma lógica. Deste modo, ele defende que só podemos justificar de forma lógica a crença em uma teoria, em quanto previsões derivadas logicamente desta estejam sobrevivendo a testes com base em observações. Segundo este autor, a validade de uma teoria pode ser testada de quatro formas diferentes: 1) Determinando se as conclusões de uma teoria contradizem-se entre
  • 15. Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa Julho/2010 Pág. 5 elas (Para este autor, você pode considerar “conclusões de uma teoria” sinônimo de previsões, predições ou hipóteses). 2) Verificando a estrutura lógica da teoria, para determinar se esta é empírica ou é uma tautologia; 3) Comparando com outras teorias para saber se o fato de superar nossos testes suporia um avanço científico; 4) Testar empiricamente as conclusões. Para testar as conclusões, Popper propõe testar aquelas que vão mais de contra com a teoria e que possam ser mais severamente testadas. Um dos problemas principais apontados a este método é que não gera crescimento da certeza relativa nas diferentes teorias, por considerar-se que sempre existirão infinitas possíveis teorias competindo para explicar cada fenômeno. Outros autores tem defendido o uso da verificação para aumentar nossa certeza sobre teorias (Ex. Sober 1999 e Lloyd 1987, citados por Lewin-koh et al. 2004). Apesar do problema lógico apontado por Popper, vários autores baseiam-se no procedimento de “verossemelhança máxima” popularizado por Fischer (Aldrich 1997) para defender que a verificação de certas hipóteses em várias instâncias (ex. uma relação entre taxa de ventilação e percentagem de O2 no fluxo sanguíneo dos pulmões foi observada em vários vertebrados) permite obter confiança objetivamente mensurável sobre predições feitas para novas observações (Ex. relação entre a taxa de ventilação e percentagem de O2 no torrente sanguíneo de um novo vertebrado que ventila). A representação matemática destas relações é comumente chamada de modelagem. Onde os modelos podem ser considerados representações matemáticas que descrevem ou relacionam variáveis. Em geral, podemos observar que os métodos de obtenção de conhecimento desde Bacon valem se de concepções que representam o que pensamos do mundo real (Ex. teorias, modelos, hipóteses) e seu contraste com observações do mesmo (também representadas em forma de variáveis, amostras, etc). Na literatura, podemos encontrar uma diversidade de significados para estes conceitos em função do autor e a área da ciência (Suppes 1960). Pessoalmente, opino que para que grupos de conceitos sejam úteis e mais facilmente ensináveis estes devem ter significados específicos e estar relacionados entre eles de forma lógica. Por isto, neste capítulo combinei a relação entre modelo e teoria proposta por Suppes (1960) e a relação entre modelo e hipótese proposta por Underwood (1997). Desta forma estes conceitos ficam hierárquica e logicamente relacionados, e seus significados são aceitáveis desde os diferentes modos de obtenção de conhecimento (compare com Jaynes 2003, durante sua apresentação de raciocínio plausível, uma abordagem verificacionista da obtenção de evidência). Assim, é possível inserir-los num processo unificado de obtenção de conhecimento científico que combina teoria e observação. O mapa de conceitos na figura 1 representa tais relações.
  • 16. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 6 Julho/2010 Sistemas biológicos Teorias Modelos Hipóteses (=predições) Variáveis dos que se derivam relacionam ou descrevem representados por compostas por explicam predizem valores sob determinadas circunstancias Figura 1 - Relações lógicas entre conceitos centrais ao processo de obtenção de conhecimento. Mapa de conceitos baseado nas propostas de Suppes (1960) e Underwood (1997). O que é Fisiologia Comparativa? Em 1950, Prosser listou alguns objetivos da fisiologia comparativa como disciplina. Estes foram: 1) Descrever como os organismos obtêm seus requerimentos no ambiente onde moram. 2) Prover bases fisiológicas para entender a ecologia. 3) Chamar a atenção sobre animais particularmente bons para estudar processos fisiológicos. 4) Encontrar generalizações derivadas do uso de distintas espécies animais em estudos fisiológicos. Um campo com grande desenvolvimento da fisiologia comparativa é a fisiologia evolutiva, que busca entender a evolução dos parâmetros fisiológicos (Garland & Carter 1994). Uma vez que as técnicas moleculares têm acelerado nosso conhecimento das relações filogenéticas entre as espécies, muitos cientistas tentam desvendar processos evolutivos através da comparação de características em linhagens de espécies com filogenias conhecidas (Wiens, 2008). Este campo da fisiologia comparativa nos proporciona um exemplo de como dois ou mais métodos de obtenção do conhecimento podem ser combinados (Fig. 2). Imagine que queremos saber se, em lagartos, morar em hábitats abertos provoca um aumento da taxa
  • 17. Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa Julho/2010 Pág. 7 metabólica com relação a morar em florestas. Para isto, poderíamos comparar espécies de área aberta com espécies de floresta. Assim, poderíamos obter que espécies de áreas abertas têm uma maior taxa metabólica (Fig. 2, esquerda). Entretanto, as espécies são elementos que apresentam relações filogenéticas. Imagine que estas fossem representadas pelo gráfico A, veríamos que as espécies de área florestada pertencem à linhagem da esquerda e as de área aberta à linhagem da direita. Poderíamos ter certeza que é o tipo de hábitat quem faz aumentar a taxa metabólica? Teríamos mais certeza se nossa hipótese fosse representada por B? taxametabólica floresta área aberta sp1 sp2 sp3 sp4 sp5 sp6 sp7 sp8 sp5 sp6 sp7 sp8sp1 sp2 sp3 sp4 sp5 sp1 sp7 sp2sp6 sp2 sp8 sp4 B A Figura 2. Comparação hipotética da taxa metabólica entre espécies de lagartos de áreas de floresta e de área aberta. Os cladogramas A e B mostram diferentes relações filogenéticas entre as espécies comparadas. Sob a hipótese de parentesco A, as espécies de cada tratamento são aparentadas, implicando em que a taxa metabólica mais baixa pode ser devida a viver em floresta ou a ser simplesmente uma característica compartilhada do grupo. Sob a hipótese de parentesco B, a menor taxa metabólica não pode mais ser explicada pelo parentesco, pois em todos os pares de espécies mais aparentadas a que mora na mata tem a taxa metabólica mais baixa que a que mora em um hábitat aberto. Hoje em dia, métodos indutivos (análise bayesiana) e verificacionistas (análise da verossimilhança máxima) estão entre os mais usados para escolher dentre hipóteses de relações filogenéticas (Amorim 2002). Por outro lado, tanto métodos falsificacionistas (Ex.Teste de Fisher) quanto verificacionistas nos permitiriam testar de maneira objetiva se a taxa metabólica aumenta em função do tipo de habitat, com base em amostras da taxa metabólica das espécies referidas. Deste modo, os produtos dos diferentes métodos de obter conhecimento podem ser combinados dentro de uma disciplina científica. Por exemplo, na fisiologia comparativa. Você concorda com esta forma de proceder, ou opina que só podemos confiar em um modo de obtenção de conhecimento? Aqui não é possível
  • 18. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 8 Julho/2010 estender-se mais sobre este assunto, mas lhe recomendo que consulte Sober (2008) antes de decidir-se.
  • 19. Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa Julho/2010 Pág. 9 Formulando perguntas em fisiologia comparativa Agustín Camacho Guerrero Laboratório de Herpetologia agustin.camacho@usp.br Buscando trabalho: como levantar uma pergunta a responder. Centremo-nos agora sobre o seu trabalho: fazer ciência. Você sempre deverá começar com uma pergunta que, para ter certeza de que vale a pena respondê-la, deverá ter surgido do conhecimento do estado da arte da disciplina de interesse. Quando realizamos perguntas baseadas sobre conhecimento levantando por outros pesquisadores, as chances de gerar um maior avanço científico se multiplicam. “Levante-se sobre os ombros dos gigantes” diria Issac Newton. É necessário pensar duas vezes antes descrever um aspecto da fisiologia de uma espécie ou grupo de espécies sob o pretexto único de que “nunca foi estudado”. Isto pode estar escondendo o problema de que não sabemos o que é mais relevante saber sobre nosso objeto de estudo (Peters, 1987). Existem várias ferramentas em internet e nas bibliotecas para encontrar este conhecimento (Web of Science, Biological Abstracts, Zoological Records, Google Acadêmico etc.). Através destas ferramentes podemos procurar artigos ou livros que falem sobre nosso tema de interesse. É importante uma cuidadosa seleção de palavras chave, para encontrar o grupo de artigos que tratam o tema de nosso interesse (uma opção: use os conceitos relacionados na sua hipótese de estudo). Uma vez conseguidas algumas referências devemos procurar o material. Nas universidades públicas brasileiras o portal de periódicos da CAPES garante acesso a vários jornais científicos on-line. Em são Paulo, a Fapesp ainda fornece acesso ao site Jstor, com artigos mais antigos. “O sistema COMUT de bibliotecas brasileiras permite, mediante prévio pagamento, a solicitação de xérox ou arquivos ”.PDF” de quaisquer artigos ou separatas que se encontrem numa biblioteca brasileira. Por último, você pode pedir diretamente ao autor ou conseguir na internet do seu site pessoal, ou site do laboratório onde trabalha. Exija da sua universidade maior acesso a revistas científicas e participe da solicitação de livros na biblioteca da sua unidade! Em seguida, leia organizadamente o material bibliográfico e busque mais entre as referências bibliográficas destes trabalhos. As perguntas podem surgir como hipóteses que refutam as previsões centrais da teoria comumente aceita sobre um determinado tema, ou bem como a necessidade de dados sobre aspectos fisiológicos de determinadas espécies ou grupos que a complementam.
  • 20. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 10 Julho/2010 Como ser objetivo: Transformação da pergunta em um gráfico Uma vez que tenhamos uma pergunta e confiamos em que esta tem relevância suficiente para investir o esforço necessário, deveremos formulá-la da maneira mais clara possível. Isto é fundamental para: A) determinar o que queremos medir exatamente, desenhar nossas observações de modo a evitar que estas nos confundam; B) fazer testes estatísticos que nos permitam calcular, de maneira objetiva, confiança sobre a resposta indicada pelas nossas observações e C) determinar se os custos para responder esta pergunta são altos demais como para tentar responde-la. Uma pergunta clara é aquela que pode ser expressa como uma previsão, ou hipótese, Ex. “a testosterona estimula o comportamento agressivo na piranha?” ou “a taxa de crescimento dos girinos é mais alta em presença de Iodo na água?” Um indício de que a pergunta está bastante clara é que você pode ver nos dois exemplos, é que podemos transformar a pergunta em hipótese só tirando o ponto de interrogação. Levantar uma pergunta clara sobre o mundo implica necessariamente que possamos representá-la em um gráfico cartesiano (Magnusson e Mourão, 2004) (ou tal vez em uns poucos, caso responder sua pergunta precise de algumas sub-perguntas). Fazer uma representação gráfica dos nossos objetivos ajuda a esclarecer quais os tipos de variáveis devemos e podemos medir. Ainda, ao facilitar a exposição dos nossos objetivos e resultados esperados a outras pessoas (Cleveland, 1984), permite que as outras pessoas realizem sugestões ou críticas mais importantes antes de começar todo o trabalho (Magnusson e Mourão, 2004). Os eixos do gráfico devem representar as partes de nossa pergunta. Os fatores ou variáveis independentes serão representados sempre no eixo horizontal e as variáveis dependentes ou de interesse são representadas sempre no eixo vertical (Cleveland, 1984). Agora estamos em condições de decidir se usaremos variáveis contínuas ou categóricas para representar nossos fatores e variáveis de interesse. Variáveis contínuas representam características da natureza atribuindo-lhes números reais, enquanto que variáveis categóricas dividem estas variáveis sob critérios subjetivos para representá-las 4. Desenho das observações que respondem à pergunta Quadro 1.  Esquema básico do  processo de  trabalho científico. 1.Leitura e observações prévias 2. Identificação da lacuna de  conhecimento 3. Emissão da pergunta cuja  resposta preenchea lacuna 5. Execução e análise das  observações 7. Interpretação 8. Comunicação de resultados  e conclusões.
  • 21. Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa Julho/2010 Pág. 11 (etiquetas, categorias). Entre os exemplos mais comuns de variáveis contínuas estão: comprimento de onda, peso, comprimento, concentração, etc. como variáveis categóricas podemos citar cores, sexo, tratamento. As variáveis contínuas proporcionam mais informação, enquanto as categóricas são mais simples de entender e manejar. O melhor tipo de variável vai depender essencialmente da sua pergunta e dos recursos disponíveis. Os tipos de variáveis escolhidas determinarão o tipo de gráfico utilizado. Entre os gráficos mais informativos e fáceis de entender estão os gráficos de nuvens de pontos, gráficos de dispersão, ou scatter plots (Magnusson e Mourão, 2004). Podemos encontrar dois tipos básicos, o primeiro tem variáveis categóricas no eixo horizontal, o segundo usa variáveis contínuas no eixo horizontal (Fig. 3). O CHUMBO NA ÁGUA INFLUENCIA A TAXA METABÓLICA DOS GIRINOS? muito chumbo pouco chumbo concentração de chumbo na água A B taxametabólica taxametabólica Figura 3. Exemplos de gráficos de dispersão. A) gráfico com fator categórico. B) Gráfico com fator contínuo (modificado de Magnusson e Mourão, 2004). Como mostra a Fig. 3, quando categorizamos variáveis podemos perder informação (Magnusson e Mourão, 2004). Se na pergunta anterior o pesquisador tivesse escolhido comparar duas concentrações de chumbo, não teria detectado o efeito do chumbo sobre o crescimento dos girinos, mesmo quando realmente existe uma relação entre as variáveis. Por outro lado, as categorias podem ser mais didáticas e fáceis de manejar. Por isto é necessário estar seguro sobre qual informação se quer obter para decidir sobre que tipo de variável usar.
  • 22. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 12 Julho/2010
  • 23. Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa Julho/2010 Pág. 13 Evitando confundir-nos: aspectos fundamentais do desenho experimental e a estatística inferencial. Agustín Camacho Guerrero Laboratório de Herpetologia agustin.camacho@usp.br Agora que já sabemos qual é nossa pergunta e como representá-la, deveremos realizar observações que a respondam. Entretanto, um dos maiores problemas para responder perguntas sobre sistemas naturais é que estes são afetados por múltiplos fatores. Estes são fatores cujo efeito se mistura com o do nosso fator de estudo, de maneira que pode ser impossível saber se a variação observada na variável dependente é derivada de nosso fator ou destes fatores (Hurlbert, 1984). Por exemplo, um experimentador poderia determinar que a secreção de saliva é controlada pela presença de alimentos na boca, uma vez depositados alimentos na boca de um animal e medindo variações no volume de saliva. Entretanto, se ele não tiver o cuidado de administrar alimentos sem que o animal os veja ou os cheire, a secreção de saliva poderia ser provocada pela visão ou cheiro destes antes que pela sua presença na boca do animal. Para um cientista, é crucial aprender a enxergar e evitar fatores que confundam suas conclusões de maneira não desejada ou oculta. O desenho experimental representa nossa decisão de quantas observações necessitamos e como as distribuímos para evitar que fatores de confusão, influenciem em nossa resposta (Quinn e Keogh, 2002). Erros cometidos durante o desenho amostral podem fazer com que o efeito de fatores inadvertidos seja indistinguível do efeito dos teus fatores de estudo. Para evitar confusões ao comunicar-se com colaboradores durante a fase de planejamento é conveniente aprender claramente os seguintes conceitos: Unidade amostral, repetição ou réplica: elas são cada uma das observações que gera uma resposta a sua pergunta (são os pontos nos gráficos); Universo amostral: é aquela parte da natureza sobre a qual se quer obter informações por meio de observações e a qual se aplicam nossas conclusões. O que significa testar uma hipótese? Como vimos antes, para avançar em ciência derivamos hipóteses a partir de modelos considerados válidos cuja rejeição/aceitação com base em observações implicaria no refinamento ou rejeição das teorias que possuímos sobre o mundo. Testar uma hipótese é mesmo isto: contrastar os valores das nossas observações com os valores que esperaríamos para ela (No falsificacionismo, compararíamos com os valores esperados caso nossa hipótese não fosse correta. No verificacionismo, compararíamos as observações com diferentes possibilidades teoricamente justificadas).
  • 24. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 14 Julho/2010 Frequentemente, queremos realizar algum de dois tipos de testes: A) se os valores de nossa variável de interesse estão relacionados com uma ou mais variáveis independentes (fatores), ou B) Se os valores de nossa variável de interesse feitas em duas ou mais situações diferentes (tratamentos) são iguais ou diferentes (Fig.4). variação provocada pelo fator ruído fator variável dependente tratamento 1 tratamento 2 ruído variação provocada pelo fator A B variável dependente Figura 4. “Scatter-plots” mostrando a distribuição da variação em dois tipos básicos de análise: A) análise da relação entre duas variáveis e B) comparação do efeito de dois tratamentos sobre uma variável. Você pode estar-se perguntando: “para que toda esta complicação?” A resposta é a seguinte: como normalmente só conseguimos observar uma parte da variação de nosso sistema de estudo, é possível que o resultado de nosso experimento seja esperado pelo acaso. Os testes estatísticos nos permitem estimar o quanto é seguro aceitar a resposta a nossa pergunta (= houve/não houve relação; houve /não houve diferença, que hipótese suporta melhor os dados), em função de como a variabilidade está partilhada nos dados que representam nossas observações. Uma forma comum de fazer isto é distribuir-se a variação encontrada em tal conjunto de dados em variação provocada por um fator (efeito) e a variação não devida a este fator (ruído) (Fig. 4). Neste caso, a finalidade de um experimento é avaliar se a variação provocada pelo fator é, uma vez isolados possíveis fatores de confusão, maior do que o ruído. Associado a este tipo de experimento, um teste falsificacionista compararia a distribuição de freqüências observadas com a distribuição de freqüência teórica (=hipótese): esperada no caso de que o ruído seja maior que o efeito. Um teste verificacionista compararia a distribuição de freqüências observadas com as distribuições de freqüências teóricas para os dois casos possíveis: que o efeito seja maior ou vice-versa.
  • 25. Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa Julho/2010 Pág. 15 Repetição, pseudorepetição e confiança. Lembra do problema no final do capítulo 1? Quando um fator altera os valores de nossas repetições, de modo que faz com que seu valor esteja relacionado, as repetições são chamadas de pseudorepetições. Aumentar o número de repetições nos permite aumentar nossa confiança no resultado, mas isso não acontece com as pseudorepetições, apesar de que aumentar o número de pseudorepetições pode nos dar uma falsa sensação de confiança. Para entender a relação entre fatores de confusão, confiança e pseudorepetição, leia o seguinte exemplo: Imagine que você quer ir “bonito(a)” a uma festa. Em que caso você se sentiria com maior confiança sobre as opiniões: depois de perguntar a sua mãe? Depois de perguntar a sua mãe, avós e tias? Depois de perguntar a um(a) colega, ou depois de perguntar a várias meninas não muito próximas? Como pode ter deduzido, perguntar a suas avós e tias depois de perguntar a sua mãe não vai trazer tanta confiança, pois é provável que vão dizer que você está muito bonito(a). Na opinião de cada uma delas está embutido o fator de confusão “parentesco” (que, vamos lá, é importante neste caso!). Agora, se você pergunta a um(a) colega, e sua resposta é que você está “muito bonito(a)”, você poderia ainda pensar que “ele(a) quer te agradar”. Finalmente, se a resposta deste(a) colega) concordar com a de outros(as) colegas não relacionados(as) com ele(a), sua confiança em que você está bonito(a) aumentará muito! Cair na pseudorepetição é acreditar que repetições aumentaram nossa confiança sobre a resposta a nossa pergunta quando estas, na realidade, estão relacionadas por um fator de confusão. Busque sempre respostas independentes para suas perguntas! Provocam pseudorepetição aqueles fatores que não fazem parte do estudo e que fazem com que os valores de nossas observações não sejam independentes entre eles. Tipos gerais de pseudo-repetição incluem: espacial= as observações tem valores relacionados por causa da sua posição no espaço, temporal= quando o fator que relaciona os valores das observações é o tempo, filogenética= provocada por relações de origem comum entre as observações e técnica= quando é um elemento do equipamento ou procedimento experimental que está relacionando os valores obtidos nas observações. Obtenha informações mais detalhadas e mais exemplos em Hulbert (1984) e Magnusson e Mourão (2004). Existem outros aspectos do desenho de um experimento. Por exemplo, decidir quantas observações serão necessárias, se estas serão dispostas aleatória ou sistematicamente, e como serão feitos os controles. Explicar isto está fora do tempo disponível para este módulo, mas todos estes passos são críticos para o sucesso do seu trabalho. Lhe recomendo que leia a maior quantidade de literatura possível sobre desenho experimental e estatística antes de começar a coletar seus dados. Comece pela tabela de
  • 26. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 16 Julho/2010 Magnusson e Mourão (2004), pag. 4. Parafraseando a Peters (1987): Não fazer isto “porque você não teve tempo” facilmente acabará em que todo o esforço e dinheiro público investido não sirvam para nada.
  • 27. Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa Julho/2010 Pág. 17 O Fim da Picada: Comunicando Ciência. Agustín Camacho Guerrero Laboratório de Herpetologia agustin.camacho@usp.br Pense por um segundo no momento no qual você terminará seu experimento. Foi um caminho árduo: você teve que ler vários artigos que não entendia bem ou com os quais nem concordava para levantar uma pergunta não respondida até agora. Passou tempo lendo, pensando e discutindo o projeto com outras pessoas que, às vezes, não lhe entendiam bem. Suas idéias sofreram críticas, você teve que esperar longas burocracias (licenças, solicitação de fundos) e repetir seu experimento várias vezes, resolvendo inúmeros problemas (animais que morrem antes de obter os dados, infra-estrutura falha, falta dinheiro, segurança, etc.). Conseguiu imaginar? Com certeza você vai lembrar-se deste parágrafo depois do seu mestrado... Bom, se você não tem cuidado no que vem agora, tudo isso pode não ter servido de nada. A valia dos cientistas se mede grandemente a través da qualidade e quantidade de artigos científicos que publicam. Para isto, uma grande dose de experiência é necessária. Recomendo que você a procure em seu orientador e lendo artigos nas revistas onde pretendam publicar. Assim mesmo, busque textos (Ex. referências neste capítulo, manuais de redação de jornais científicos) e faça cursos especializados no tema. A continuação, veremos algumas dicas básicas para estruturar textos científicos. Estas dicas estão baseadas no livro de Peters (1984), e você deve dominá-las desde o começo. Repassaremos aqui as partes de um relatório de pesquisa, as relações lógicas entre elas e alguns elementos básicos que devem conter. Partes e estrutura de um relatório de pesquisa. Um relatório de pesquisa deve ser tão claro, preciso e curto quanto seja possível. Basicamente, consta de 7 partes: título, resumo, introdução, material e métodos, resultados, discussão, agradecimentos e referências. Veja dicas úteis sobre o título, agradecimentos e referências na tabela 1. Iremos nos estender mais nas seções de resumo, introdução, material e métodos, resultados e discussão. O resumo se compõe normalmente de um parágrafo que demonstra a relevância e os objetivos do estudo, e explica de forma sucinta os métodos empregados e os principais resultados e conclusões. Dentro da introdução devem ficar claros: A) o problema que vamos abordar e sua relevância B) o estado da arte sobre o problema, mostrando a lacuna de conhecimento que pretendemos preencher e porque precisa ser preenchida e C) as decorrências dos possíveis
  • 28. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 18 Julho/2010 resultados de nosso trabalho. Por último, os objetivos devem aparecer da forma mais clara possível. Concretamente, em forma de hipótese a ser testada. O “material e métodos” deve conter uma explicação clara dos métodos empregados para alcançar o objetivo declarado no fim da introdução. Desta forma, as técnicas, o desenho experimental e as análises devem aparecer explicados e justificados de forma que os leitores sejam capazes de: A) entender como alcançam o objetivo escolhido B) Repeti-lo C) perceber possíveis fraquezas no delineamento. Se evitarmos mostrar claramente nosso desenho experimental pode ser que rejeitem nosso relatório na revista que o queremos publicar. Pior ainda, podemos enganar aos nossos leitores. A seção de “resultados” deve dar toda a informação necessária para responder nossa pergunta inicial e que outros possam avaliar se a respondemos mesmo ou não. Isto implica em descrever as observações feitas, estabelecendo as relações que foram estatisticamente significativas e as que não foram. Os dados, quando numerosos, devem ser apresentados em forma de tabelas. Os gráficos devem expor a parte mais importante dos nossos resultados (nossa pergunta e as observações que a respondem) e informar sempre o número de repetições. Se nos nossos resultados, os gráficos não representam as partes de nossa pergunta, a evidência gerada para respondê-la parecerá fraca a vista dos outros (Magnusson, 1966). Tanto tabelas quanto gráficos devem ter uma legenda curta e auto-explicativa, e serem numerados, de forma que possam ser referidos no texto. Dados apresentados em tabelas e gráficos devem ser explicados também no texto, mas evitando redundância. Na discussão, devemos expor como nossos resultados se relacionam com a hipótese que pretendíamos testar, reconhecendo as fraquezas que puderem comprometer os resultados. Em seguida, mostrar a consistência (ou inconsistência) dos nossos resultados com os resultados de outros trabalhos levantados na introdução, mostrando quais as implicações dos nossos resultados sobre a lacuna de conhecimento levantada. Por último, este é o lugar onde se deve apontar, curtamente, futuros experimentos ou hipóteses testáveis que permitam avançar no entendimento do problema abordado. Se o relatório tem vários objetivos, estes devem seguir a mesma ordem na introdução, material e métodos, resultados e discussão. A fim de facilitar a interpretação do leitor. Veja uma lista de verificação básica para identificar problemas em seu relatório de pesquisa (Tab.1). Busque críticas, seja crítico e ajude à ciência progredir. Einstein dizia que se você não consegue explicar seu trabalho a seu avô, é porque você não entende bem o que está fazendo. Agora, eu digo a você que, explicando corretamente para ele, até seu avô poderia fazer críticas imprevistas e acertadas sobre o
  • 29. Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa Julho/2010 Pág. 19 seu trabalho. A comunidade científica deve ajudar-se a través de visão crítica e sentido construtivo. Lembre-se que em ciência, tratamos com assuntos que, via de regra, são complicados. Isto faz com que todos nós cometamos erros. Para evitar erros em seu experimento, a melhor saída é apresentar seu projeto a pessoas com visão crítica. Se estas pessoas conseguem entendê-lo perfeitamente, poderão julgar se foram convencidas ou não pelos seus argumentos. Encontrar falhas nos aspectos do desenvolvimento lógico do trabalho de um colega pode ser de grande ajuda para ele, antes que invista grande esforço e dinheiro em um projeto mal planejado. Assim mesmo, podemos evitar que um trabalho confunda a comunidade científica através da geração de evidências ou argumentos que permita mostrar que este está errado. Considerações finais. Terminou este capítulo que pretendia mostrar-lhe um pouquinho do que vem pela frente. A melhor forma de enfrentar os próximos anos de preparação é você que deve planejar. A lista de referências que segue é uma seleção da literatura que fez muita diferença na minha própria formação (alguma delas chegou um pouco tarde). Espero que lhe ajude.
  • 30. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 20 Julho/2010 Tabela 1: Lista de verificação na redação de um relatório de pesquisa. No título O titulo representa os elementos da sua pergunta? E o universo de estudo? Na introdução: A lacuna de conhecimento está clara? Esta se deriva logicamente do estado da arte da disciplina? Os objetivos buscam preencher esta lacuna? Os conceitos mantêm o significado ao longo do texto? Os objetivos buscam testar ou verificar uma hipótese? Nos métodos: Há pontos importantes para julgar a validade do trabalho que não foram explicados? Está claro para que serve cada seção dos métodos? As medidas realizadas e os procedimentos adotados estão claramente justificados? No caso de várias hipóteses, as análises estão redigidas na mesma ordem que os objetivos? Nos resultados: Um gráfico de dispersão representa a resposta a nossa pergunta principal? O número de observações está claro no gráfico? Existe redundância entre a informação mostrada no texto e os dados apresentados nos gráficos e/ou tabelas? No caso de vários objetivos, os resultados foram apresentados na mesma ordem que as análises dos métodos? Os dados mostrados permitem julgar se as análises foram feitas corretamente? Na discussão Foram discutidos problemas que possam ter interferido na resposta? Os resultados de estudos comparados com o nosso são mesmo comparáveis? As conclusões e sugestões derivam logicamente dos resultados? Mostraram-se novas hipóteses para avançar no entendimento do tema abordado? Nos reconhecimentos As pessoas/organizações que prestaram a ajuda ou licenças mais fundamentais estão presentes? Nas referências Todas as citações, e só as que estão no texto, aparecem na seção referencias?
  • 31. Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa Julho/2010 Pág. 21 Glossário Etimologia: parte da gramática que estuda da história ou origem das palavras. Lei científica: relação tão demonstrada empiricamente que é assumido que sempre vai ser observada em determinadas condições. Princípio científico: pode ser considerado sinônimo de lei científica Epistemológico: relativo ao estudo do funcionamento da ciência. Silogismos: arranjos de três proposições lógicas onde a última se deduz necessariamente das duas anteriores Inferência: conclusão, seja esta tomada sobre uma população, a partir de uma amostra da mesma, ou bem tomada a partir da combinação lógica de duas premissas verdadeiras (Ex: Se as premissas de que todos os homens tem coração e que Sócrates é um homem são verdadeiras, então podemos inferir que Sócrates tem coração) Casos gerais e particulares: Para Aristóteles e Bacon, são duas categorias que mostram generalidade de aplicação de um conceito. Indução: Raciocínio ou forma de conhecimento pelo qual passamos do particular ao universal, do especial ao geral, do conhecimento dos fatos ao conhecimento das leis. Probabilidade prévia: estimação subjetiva da probabilidade de um evento, prévia a um experimento. Verossimilhança: Dado um conjunto de dados observados, a verossimilhança valoriza a plausibilidade de um descritor hipotético deste conjunto, sobre outro possível descritor. verossimilhança é proporcional à probabilidade de observar os dados sendo um determinado descritor verdadeiro. Teoria: explicação sobre um fenômeno. Para Popper, deve ser um conjunto de enunciados. Diferencia-se de lei porque a teoria não precisa ter sido demonstrada amplamente com dados empíricos. Conclusões, previsões, predições ou hipóteses: uma proposição aceitável do ponto de vista de uma teoria ou um modelo, mas ainda não conferida. Modelo: tem variados significados dependendo do contexto, porém a maioria pode ser considerada como “representação simplificada”. Dentro do processo de geração de conhecimento um modelo pode ser considerado como uma representação de relações entre variáveis acorde com a teoria da que forma parte tal modelo. Teoria empírica: Segundo Popper, aquela teoria que pode ser testada. Tautologia: uma afirmação lógica onde as premissas são iguais à conclusão. (ex. estes animais não são aquáticos, logo eles não moram na água) Filogenia: representação de relações de parentesco entre espécies ou grupos de espécies. Caráter ancestral: característica considerada original para um grupo de espécies. Teste: prova, ensaio, exame.
  • 32. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 22 Julho/2010 Tratamento: aqui tratado como manipulação. Fatores ou variáveis independentes: elemento ou circunstância que contribui a produzir um estado em uma variável influenciada por ele. Variáveis dependentes ou de interesse: variável cuja variação estamos interessados em explicar, sendo influenciada pelos fatores. Efeito: influencia de um elemento sobre outro. Ruído: variação não devida ao fator. Pseudorepetições: observações cujos valores estão afetados por um fator de confusão. Bibliografia Aldrich, J. 1997. R. A. Fisher and the Making of Maximum Likelihood 1912-1922. Statistical Science.12;162-176. Amorim, D. S. (2002) Fundamentos de sistemática filogenética. Editora Holos, Ribeirão Preto, Brazil, 154 pp. Aristóteles (350 A.C). Prior Analytics (livro 1). Trad. Por A.J. Jenkinson. Disponível em: http://ebooks.adelaide.edu.au/ (Maio 2009). 59 pp. Bayes, T. (1763) An Essay towards solving a Problem in the Doctrine of Chances. Philosophical Transactions of the Royal Society of London 53, 370–418. Cleveland, W. S. (1987) Graphs in scientific publications. American Statistician 38: 26-19. Francis Bacon. (1620) Novum Organum.Trad por J. Spedding (1858). Disponível em: http://en.wikisource.org/wiki/Novum_Organum (Maio 2009). Jaynes, E. T. (2003) Probability Theory: The Logic of Science. Cambridge University Press, Cambridge. Disponível em: http://www-biba.inrialpes.fr/Jaynes/prob.html (maio 2009). Lewin-Koh, N., Taper, M.L, Subhash R.L. 2004. A brief tour of statistical concepts. The nature of scientific evidence, statistical, philosophical and empirical considerations(eds. Taper, M.L, e Subhash R.L.). The university of Chicago Press. 567p. Magnusson, W. E. (1996). How To Write Backwards. Bulletin of Ecological Society of America 77, 88- 88. Magnusson, W. E.; Mourão, G. (2004) Statistics without Math. 1. ed: Editora Planta / Sinauer Associates. Londrina. 136 pp. Morris C. (1992) Academic Press Dictionary of Science & Technology. Morris Books, Escondido, California, USA. 2342 pp. Peters, R. H. (1991) A Critique for Ecology. Cambridge University Press, New York 366 pp. Popper, K. R.(1959). The logic of scientific discovery. First English edition by Hutchinson & Co. 545 pp. Quinn G.P.; Keogh M.J. (2002) Experimental design and data analysis for biologists. Cambridge University Press; Cambridge. 557pp.
  • 33. Método Científico Aplicado a Estudos em Fisiologia Comparativa Julho/2010 Pág. 23 Huey, R. B. (1987) Reply to Stearns: Some acynical advice for graduate students. Bulletin of the Ecological Society of America 68: 150-153. Scheiner, S. M.; Willig, M. R. 2008. A general theory of ecology. Theoretical_Ecology. 1:21–28. Sober, E. 2008. Evidence and Evolution: The Logic Behind the Science, Cambridge UP, 392pp. Stearns, S.C. 1987. Some modest advice for graduate students. Bulletin of the Ecological Society of America 68: 145-150. Suppes, P. 1960. A comparison of the uses and the meaings of models in mathematics and physics. Technical report Nº 33. Proceedings of the colloquium “La notion et Ie role du modele dans les sciences mathematiques, naturelles et sociales”. North Holland press. Underwood, A. J. 1997. Experiments in ecology: their logical design and interpretation under analysis of variance. Cambridge university press. 522 pp. Underwood, A. J.; Chapman M. G. e Connell. S. D. (2000) Observations in ecology: you can’t make progress on processes without understanding the patterns. Journal of Experimental Marine Biology and Ecology 250, 97-115. Wiens, J. J. 2008. Systematics and herpetology in the age of genomics. Bioscience 58, 297–307.
  • 34. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 24 Julho/2010
  • 35. Unidade 2 Sinalização Celular Maria Nathália de Carvalho Magalhães Moraes Laboratório de Fisiologia Comparativa da Pigmentação nathalia.moraes@usp.br A sobrevivência dos organismos multicelulares depende de uma rede elaborada de comunicação inter e intracelular, que coordena o crescimento, a diferenciação e o metabolismo das células em diversos tecidos e órgãos. Neste módulo, serão abordados os aspectos da evolução da multicelularidade e os mecanismos básicos da transdução de sinais, bem como a contextualização desses mecanismos dentro de patologias, como é o caso da malária. Além disso, será apresentada a técnica do RNAi (RNA de interferência) como ferramenta de estudo para a fisiologia, com destaque para as vias de transdução do sinal em diversos modelos.
  • 36. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 26 Julho/2010 Capítulo 5 Comunicação celular: entendendo a ritmicidade endógena pág. 27 Maria Nathália C. Magalhães Moraes Revisado por Dra Ana Maria de Lauro Castrucci Capítulo 6 Fisiologia Celular do Plasmodium durante a fase assexuada pág. 41 Laura Nogueira da Cruz Revisado por Dra. Célia R. S. Garcia Capítulo 7 RNAi: ouvindo a voz do silêncio pág. 49 Maísa Costa Revisado por Dr. Daniel Carneiro Carrettiero Bibliografia pág. 66
  • 37. Sinalização Celular Julho/2010 Pág. 27 Comunicação Celular: Entendendo a Ritmicidade Endógena Maria Nathália de Carvalho Magalhães Moraes Laboratório de Fisiologia Comparativa da Pigmentação nathalia.moraes@usp.br Evolução da Multicelularidade O grande passo obtido através da evolução da unicelularidade para a pluricelularidade certamente foi a capacidade de comunicação entre as células, por meio da evolução a partir de uma única célula, a qual desempenhava todas as funções necessárias para o organismo, para um conjunto de células especializadas proporcionando interações entre elas (Ben-Shlomo e col., 2003). Os ancestrais dos organismos multicelulares seriam simples agregados de seres unicelulares, que formavam estruturas designadas colônias. Inicialmente todas as células da colônia desempenhavam a mesma função. Contudo, ao longo do tempo algumas das células da colônia especializaram-se em determinadas funções. A diferenciação celular, relacionada com a função especifica acentuou-se no decorrer da evolução, originando os verdadeiros seres multicelulares. Neste processo foram surgindo diferentes tipos de células, que mais tarde originaram tecidos, os quais levaram ao aparecimento de órgãos. A especialização celular permitiu uma melhor utilização da energia, levando a uma diminuição da taxa metabólica, além de uma maior independência em relação ao ambiente. Para que as células pudessem sincronizar as tarefas e perceber informações do ambiente, foi necessária a especialização de células para percepção do ambiente (receptores sensoriais), centros integradores dessas informações (sistema nervoso) e efetuadores de ajustes homeostáticos (sistema muscular, endócrino e exócrino) (Isoldi e Castrucci, 2007). Para garantir o sucesso e a diversificação da vida, foi necessário o aparecimento de estruturas de ligação e principalmente de comunicação entre as diferentes células. Nos organismos multicelulares, a manutenção da homeostase é dependente de um processamento continuo de informações através de uma complexa rede de células. Além disso, para que o organismo responda a constantes mudanças do ambiente, sinais intracelulares devem ser transduzidos, ampliados e finalmente convertidos para uma resposta fisiológica adequada (Pires-da-Silva e Sommer, 2003). Muitos hormônios, neurotransmissores, quimiocinas, mediadores locais e estímulos sensoriais exercem seus efeitos sobre as células através de ligação a diferentes classes de receptores. Esses transdutores altamente especializados são capazes de modular a sinalização de várias vias que levam a diversas respostas biológicas (Cabrera-Vera e col., 2003). A maioria das
  • 38. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 28 Julho/2010 famílias de receptores evoluiu com o advento da multicelularidade e com a necessidade de um comportamento coordenado do organismo (Ben-Shlomo e col., 2003). Alvos para ação dos mensageiros químicos Os mensageiros químicos intercelulares devem atingir células alvo, que possam interpretar os sinais. Para que as células interpretem esses sinais devem apresentar elementos que reconheçam esses mensageiros, os chamados receptores, que mudam sua conformação quando os mensageiros se ligam a eles. A ligação mensageiro-receptor inicia uma cascata de sinalização que irá evocar a participação de diversos segundos mensageiros, ativando múltiplas vias de sinalização. Cada classe de receptor ativa segundos mensageiros específicos, os quais amplificam o sinal e desencadeiam respostas intracelulares específicas para o sinal inicial. Os princípios moleculares nos quais a transdução do sinal se baseia são representados por associações específicas de proteínas e sua fosforilação ou desfosforilação, onde a fosforilação de alvos protéicos leva geralmente a mudanças imediatas em sua configuração e atividade. Deste modo, o balanço entre fosforilação e desfosforilação é determinante para a transdução do sinal intracelular. Ainda, os receptores podem evocar tipos diferentes de efeitos celulares. Alguns deles são muito rápidos em escala de milissegundos, enquanto os efeitos produzidos por hormônios esteróides, por exemplo, ocorrem dentro de algumas horas ou dias (Fig. 1) (Rang e Dale, 2007). Os mensageiros químicos extracelulares podem ser classificados de acordo com a distância que percorrerão do local de sua síntese até a célula alvo, bem como o tipo de inter-relação entre a célula produtora e a célula alvo. Os sinalizadores secretados pela própria célula produtora e que atuam em células adjacentes próximas são chamados de parácrinos, enquanto os sinalizadores que atuam na própria célula produtora são conhecidos como autócrinos, além dos sinalizadores que são lançados na corrente sanguínea, cuja célula alvo encontra-se distante, os quais são chamados de hormônios. Os sinalizadores parácrinos produzidos por células nervosas são denominados neurotransmissores, os quais são lançados na região entre neurônios, entre neurônios e fibra muscular ou entre neurônios e glândula exócrina ou endócrina; essa região é conhecida como fenda sináptica. Os ligantes podem ainda ser classificados quanto à sua solubilidade, em hidrossolúveis e lipossolúveis. Os hidrossolúveis são incapazes de atravessar a membrana celular, e dessa forma, devem ser reconhecidos por receptores localizados na membrana. Já os compostos lipossolúveis apresentam alta afinidade química pela membrana podendo, portanto, atravessar a membrana e atuar dentro das células, chegando muitas vezes ao núcleo, dessa forma sendo reconhecidos por receptores intracelulares (Isoldi e Castrucci, 2007).
  • 39. Sinalização Celular Julho/2010 Pág. 29 Figura 1 – Relação receptor e tempo de ação. Adaptado de Rang e Dale, 2007 Interação molécula-receptor Existe uma diferença importante entre agonistas e antagonistas. Agonistas e antagonistas são poderosas ferramentas que permitem a caracterização de estruturas e funções de subtipos de receptores (Squire e col, 2003). Os agonistas ativam os receptores, enquanto os antagonistas podem se combinar com os mesmos sítios, porém sem causar ativação desse receptor, e dessa forma bloqueando o efeito dos agonistas. A ocupação de um receptor por uma molécula de um ligante pode ou não resultar na ativação desse receptor. A ativação do receptor ocorre através da ligação da molécula de tal modo que desencadeie uma resposta tecidual. A ligação e ativação representam duas etapas distintas da geração de uma resposta mediada por um receptor, que é iniciada por um agonista. A tendência de um ligante se ligar aos receptores é dada através de sua afinidade. Os ligantes com alta potência geralmente apresentam alta afinidade pelos receptores e, consequentemente, ocupam uma porcentagem significativa dos receptores, mesmo em baixas concentrações (Rang e Dale, 2007). Tipos de receptores Segundo a estrutura molecular e a natureza do mecanismo de transmissão, os receptores são agrupados em quatro superfamílias, a saber: (1) superfamília tipo 1 - receptores-canal (ou ionotrópicos), receptores de membrana que formam o próprio canal
  • 40. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 30 Julho/2010 iônico; (2) superfamília tipo 2 - receptores acoplados à proteína G (GPCRs ou 7-TM ou metabotrópicos), receptores de membrana acoplados a sistemas efetores intracelulares por meio de proteína G; (3) superfamília tipo 3 – receptores enzimáticos, receptores de membrana com domínio intracelular de proteína quinase (em geral, tirosina quinase, fosfatase e outras) e (4) superfamília tipo 4 - receptores reguladores da transcrição de genes (ou receptores nucleares ou receptores intracelulares), receptores solúveis no citosol (Fig. 2). Figura 2 - Tipos de famílias de receptores Superfamília tipo 1: receptores-canal Os íons são incapazes de penetrar na bicamada lipídica da membrana celular, e só podem atravessá-la com a ajuda de proteínas transmembrânicas na forma de canais ou transportadoras. Os receptores do tipo canal são compostos por 4 ou 5 subunidades (α, β, γ, δ) combinadas para formar um canal iônico através da membrana (Fig. 3). Cada subunidade consiste de 4 segmentos transmembrana (TM) referidos como TM1-TM4. Na ausência de um neurotransmissor, esses canais iônicos permanecem em estado fechado e são impermeáveis aos íons. A ligação do neurotransmissor induz uma rápida mudança conformacional que abre o canal, permitindo o fluxo dos íons (Fig. 4). As mudanças na corrente da membrana resultante da ligação do ligante ao canal ionotrópico são geralmente mensuradas numa escala de milissegundos. O fluxo iônico cessa quando o transmissor se dissocia do receptor ou quando o receptor se torna dessensibilizado (Squire e col., 2003). O primeiro receptor dessa família a ser clonado, foi o receptor nicotínico da acetilcolina (nAchR), o qual é usado como modelo para o estudo da estrutura dos receptores ionotrópicos. Sua estrutura pentamérica (2α, β, γ, δ) possui dois sítios de ligação à acetilcolina, cada um na interface das duas subunidades α. Para que o receptor seja
  • 41. Sinalização Celular Julho/2010 Pág. 31 ativado, duas moléculas de acetilcolina devem se ligar a esses sítios e, dessa forma, o canal se abre quase que instantaneamente, permitindo a passagem de íons (Rang e Dale, 2007). Os canais controlados por voltagem abrem-se quando a membrana celular é despolarizada. Essa abertura (ativação) induzida pela despolarização da membrana é de curta duração, mesmo quando a despolarização é mantida. Os canais mais importantes nesse grupo são os canais seletivos para sódio, potássio e cálcio.                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                               Figura 3 – Estrutura do receptor canal. Figura 4 - Esquema de abertura do canal. Retirado de Squire e col., 2003. Retirado de Squire e col., 2003. Os canais controlados por ligantes são ativados através da ligação de um mensageiro químico extracelular a um sítio na molécula do canal. Os receptores desse tipo controlam os eventos sinápticos mais rápidos do sistema nervoso. A maior parte dos neurotransmissores excitatórios, como acetilcolina, glutamato, ácido gama-amino butírico (GABA) e ATP agem dessa maneira e causam aumento na permeabilidade ao Na+ e K+ . Alguns canais controlados por ligantes respondem a sinais intracelulares e não extracelulares, tais como: (i) canais de potássio ativados por cálcio, se abrem, hiperpolarizando a célula, quando ocorre um aumento da [Ca2+ ]i; (ii) canais de potássio sensíveis a ATP, se abrem quando a concentração intracelular de ATP cai. Esses canais são distintos daqueles que medeiam os efeitos excitatórios de ATP extracelular; (iii) existem ainda outros canais que respondem a ligantes intracelulares, como canais de potássio sensíveis a diacilglicerol, cujas funções ainda não estão bem esclarecidas. Dependendo do íon para o qual o canal é seletivo a alteração no potencial de repouso da célula poderá atuar de forma diferente, podendo levar à despolarização celular, como é o caso de alguns subtipos de receptores de acetilcolina e glutamato, que são canais de sódio ou cálcio; ou dificultando uma eventual resposta de despolarização a um estimulo excitatório, como é o caso de GABA e glicina, que são canais de cloro (Squire e col., 2003). Os receptores canais de glutamato são responsáveis pelo fenômeno de potenciação de longo termo (LTP), plasticidade sináptica e neurodegeneração. O influxo de íons através
  • 42. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 32 Julho/2010 do canal aberto é conseqüência da liberação de glutamato do neurônio pré-sináptico e da despolarização da membrana do neurônio pós-sináptico, essa mudança de voltagem da membrana expele íons Mg2+ que estavam bloqueando o canal, fazendo com que este permita o influxo de cálcio e a geração de oxido nítrico e/ou espécies reativas de oxigênio (Kloda e col., 2007). Superfamília tipo 2: receptores acoplados a proteínas G Os receptores da família tipo 2 são de origem antiga, sendo os primeiros receptores a emergirem entre os organismos unicelulares. O papel central desses receptores em organismos multicelulares é refletido por suas divergentes estruturas e funções. A ligação do mensageiro ao receptor acoplado a proteína G (GPCRs) induz uma mudança conformacional no receptor, o qual recruta e ativa diferentes proteínas G, as quais estimulam a geração de adenosina 3’,5’ monofosfato (AMPc), fosfoinositídeos, diacilglicerol e outros segundos mensageiros. Em termo, esses segundos mensageiros disparam eventos como ativação de cascatas cinéticas e fosforilação de fatores citosólicos e transcrição de fatores nucleares (Brivanlou e Darnell, 2002). Os estímulos extracelulares que ativam os GPCRs incluem luz, íons, nucleotídeos, lipídeos, esteróides, aminoácidos modificados, peptídeos e hormônios glicoprotéicos (Ben-Shlomo e col., 2003) Estrutura da proteína G A interação de hormônios, neurotransmissores ou glicoproteínas com os receptores 7TM na superfície da célula induz uma mudança conformacional do receptor que ativa a proteína G – composta das subunidades α, β, γ – no interior da célula. No estágio inativo GDP liga-se à subunidade Gα. (Fig. 5). Quando a proteína G é ativada, o GDP é liberado, e o GTP liga-se à subunidade Gα e assim ocorre a dissociação do complexo Gα-GTP do complexo Gβγ. Dessa forma tanto Gα-GTP quanto Gβγ encontram-se livres para ativar seus efetores, como por exemplo canais iônicos ou enzimas (Pierce e col., 2002). A duração do sinal é determinada pela taxa de hidrólise do GTP da subunidade Gα e subseqüente reassociação de Gα-GDP com Gβγ (Hamm, 1998). A cinética da ativação da proteína G através dos GPCRs tem sido descrita recentemente. Baseado em observações de que a atividade GTPásica de proteínas G isoladas é mais baixa do que sob condições fisiológicas, postulou-se a existência de mecanismos que aceleram a atividade GTPásica. Vários efetores tem sido apontados como promotores da atividade GTPásica da subunidade α da proteína G. Recentemente, uma família de proteínas chamadas “reguladoras da sinalização da proteína G” (proteína RGS), capaz de aumentar a atividade GTPásica da subunidade α da proteína G foi identificada (Wettschureck e Offermanns, 2005).
  • 43. Sinalização Celular Julho/2010 Pág. 33 Classicamente, as proteínas G são divididas em quatro famílias baseadas na similaridade de suas subunidades α: Gαi/0, Gαs, Gαq e Gα12/13 (fig. 7) (Cabrera-Vera e col., 2003; Pierce e col., 2002). Cada família consiste de vários membros que frequentemente mostram padrões de expressão específicos. Membros de uma família são estruturalmente similares e frequentemente compartilham algumas de suas propriedades funcionais. Figura 5 - Mecanismo de ação do receptor acoplado a proteína G. A interação do ligante exógeno com o receptor de membrana promove a ativação do receptor e sua interação com a proteína G intracelular. O acoplamento do receptor a proteína G faz com que ocorra uma mudança de GDP para GTP na subunidade Gα. Gα-GTP então se dissocia do complexo Gβγ e do receptor. Ambas subunidades estão livres para modular a atividade de uma grande variedade de efetores intracelulares. O sinal é finalizado quando a γ-fosfatase do GTP é removida pela intrínseca atividade GTPásica da subunidade Gα, levando a ligação do GDP a Gα. A reassociação de GDP com Gα completa o ciclo. Após ativação do receptor acoplado a proteína Gs, adenililciclase (AC) é ativada pela subunidade α da proteína Gs passando a sintetizar AMPc, como representado na figura 6 (Isoldi e Castrucci, 2008). Existem 9 tipos de adenililciclases conhecidas em mamíferos, as quais podem ser ativadas pelo complexo cálcio/calmodulina, outras inibidas por baixas concentrações de cálcio ou por calcineurina (uma proteína fosfatase dependente de ca2+ ) ou pela fosforilação de proteínas quinases II dependentes de Ca2+ /calmodulina (CAMK II). Em alguns casos, a subunidade α da proteína G inibe a adenililciclase (Gi), promovendo assim uma diminuição dos níveis de AMPc, ou pode ainda ligar-se a canais modulando-os e dessa forma não exercendo função reguladora sobre adenililciclase (Schwartz, 2001). Para estudar as funções das proteínas Gi tem sido muito utilizada uma toxina extraída do Clostridium botulinum (toxina de pertússis ou PTX) a qual é capaz de ribosilar ADP dessas proteínas
  • 44. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 34 Julho/2010 tornando-as incapaz de interagir com o receptor. Dessa forma o tratamento com PTX resulta em um desacoplamento do receptor com a proteína Gi (Wettschureck e Offermanns, 2005). Figura 6 – Representação esquemática da via de sinalização intracelular envolvendo adenililciclase. Depois de formado, o AMPc liga-se a proteínas quinases dependentes de AMPc (PKAs). Na sua forma inativa, a PKA é formada por duas subunidades reguladoras (R), e duas subunidades catalíticas (C). Ativação da PKA ocorre através da ligação do AMPc nas subunidades (R), e subsequente liberação da subunidade (C). Após ativação, PKA pode atuar em diferentes substratos e desencadear uma variedade de respostas. Na ausência de AMPc, a subunidade (C) volta a inibir a PKA pela reassociação com a subunidade (R). As subunidades C livres são capazes de fosforilar o fator de transcrição CREB, levando a célula a um aumento da transcrição de genes específicos. CREB liga-se a regiões do gene que contêm um elemento de resposta ao AMPc (CRE) e sob fosforilação inicia a cascata de expressão de genes (Schwartz, 2001).
  • 45. Sinalização Celular Julho/2010 Pág. 35 Figura 7 - Representação esquemática da cascata de sinalização evocada por proteínas G. As setas em vermelho representam inibição de um componente da via, e as setas em verde a ativação. A subunidade Giα inibe adenililciclase, promovendo a diminuição de AMPc. A subunidade Gsα ao contrario de Giα promove aumento do concentração de AMPc. A subunidade Gqα ativa a produção de DAG e IP3, e dessa forma IP3 atua em receptores do reticulo promovendo liberação do cálcio. A família da proteína Gq é uma das mais bem caracterizadas entre as proteínas G (ver fig. 8). Quando a proteína Gq é estimulada, promove a ativação da enzima fosfolipase Cβ (PLCβ). Uma vez ativada, a PLCβ promove a catálise do fosfolipídio de membrana 4,5- bisfosfato de fosfatidilinositol, gerando 1,4,5-trisfosfato de inositol (IP3) e diacilglicerol (DAG). IP3 difunde-se da membrana para o interior da célula, onde se ligará aos receptores de IP3 (IP3R), que são canais de cálcio existentes na membrana do reticulo endoplasmático ou sarcoplasmático. Essa ligação promove a abertura desses canais de cálcio e a conseqüente liberação dos estoques desse íon para o citoplasma. Em muitos tipos celulares, a liberação de cálcio dos estoques intracelulares induz a abertura de canais de cálcio da membrana celular, promovendo assim um influxo de cálcio do meio extracelular para o interior da célula. O DAG permanece na membrana podendo promover ativação da proteína quinase C (PKC) desencadeando assim uma cascata de fosforilação, ou ainda, podendo ser clivado, gerando ácido araquidônico, o qual dá inicio à via de síntese de eicosanóides como as prostaglandinas (Isoldi e Castrucci, 2007).
  • 46. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 36 Julho/2010 Figura 8 – Representação esquemática da via de sinalização intracelular envolvendo a participação da fosfolipase C. Existe ainda uma superfamília de proteínas G, referidas como proteínas G monoméricas (são formadas somente pela subunidade α), ou Ras. Essas proteínas Ras estão envolvidas em uma variedade de processos celulares, incluindo proliferação, diferenciação, migração, maturação e apoptose. A ativação de Ras sob estimulação de GPCRs e receptores de fatores de crescimento é regulada pela mudança do fator nucleotídeo de guanina, o qual estimula uma mudança na atividade de GDP/GTP resultando na ligação do GTP em seu estado ativo à proteína (Schaafsma e col., 2008). As proteínas Ras processam sinais vindos de receptores tirosina quinase e GPCRs, para o interior das células, afetando a transcrição gênica (Schenk e Snaar-Jakelska, 1999). Superfamília do tipo 3: receptores enzimáticos São encontrados quatro receptores com diferentes domínios enzimáticos: tirosina quinase, serina/treonina quinase, tirosina fosfatase, guanililciclase. Os receptores do tipo serina/treonina apresentam como ligante o fator de crescimento transformante beta (TGFβ). Esses receptores se apresentam em dois sub-tipos, os receptores do tipo I e II, os quais são classificados de acordo com suas propriedades estruturais e funcionais. O domínio citoplasmático do receptor tipo II é constitutivamente ativo e este fosforila o receptor tipo I em resíduos serina e treonina em resposta à ligação do mensageiro extracelular. O receptor tipo I ativado tradicionalmente fosforila proteínas SMAD citoplasmáticas, dessa forma ativando a transdução do sinal para o núcleo. As proteínas SMAD ligam-se ao DNA reprimindo ou estimulando a transcrição de genes e, desse modo, essa cascata de
  • 47. Sinalização Celular Julho/2010 Pág. 37 sinalização de TGF-β pode representar um papel chave na patogênese de várias doenças incluindo o câncer (Wright e col., 2009). As proteínas tirosina quinase foram identificadas em 1980 como as maiores representantes no câncer resultando na investigação desses receptores como alvos terapêuticos. (Levitzki, 2003). Receptores tirosina quinase (RTK) são glicoproteínas transmembrânicas que são ativados pela ligação de ligantes cognatos e transduzem o sinal extracelular para o citoplasma através da fosforilação do resíduo de tirosina no próprio receptor (autofosforilação) (Hubbard e Till, 2000). Os RTKs ativam numerosas vias de sinalização dentro da célula, levando a proliferação, diferenciação, migração, ou mudanças metabólicas. A família dos RTKs inclui os receptores de insulina e muitos fatores de crescimento, tais como fator de crescimento epidérmico (EGF), fator de crescimento de fibroblasto (FGF), fator de crescimento derivado de plaqueta (PDGF), fator de crescimento endotelial vascular (VEGF). Os RTKs consistem de uma porção extracelular que se liga aos ligantes polipeptídicos, uma hélice transmembrânica e uma porção citoplasmática que possui tirosina quinase com atividade catalítica (Fig. 9). A grande maioria de RTKs é monomérica e dimeriza-se na presença do ligante. A ativação do receptor pelo ligante leva à ativação da porção quinásica do receptor, resultando em autofosforilação e fosforilação de substratos SHC, o que culmina com a ativação da proteína G monomérica Ras. Nas vias de sinalização de receptores monoméricos, a cascata de MAP quinases (MAPK) é recrutada, resultando na ativação de fatores de transcrição como CREB, c-Fos e Elk-1, envolvidos na transcrição de genes relacionados à proliferação celular. Em adição aos RTKs, existe uma ampla família de tirosina quinases citosólicas não receptoras (NRTKs), as quais incluem Src, Janus Kinases (Jaks), Ab1 (Fig 10). Os NRTKs são componentes das cascatas de sinalização disparadas por RTKs e por outros receptores de superfície como receptores acoplados a proteína G e receptores do sistema imunológico (Hubbard e Till, 2000). Em contrapartida, os receptores tirosina fosfatase, quando ativados por ligantes, desfosforilam proteínas celulares. Esses receptores têm sido implicados na angiogênese e na adesão celular (Isoldi e Castrucci, 2007). Os receptores guanililciclases (GC) são ativados por um hormônio peptídico denominado peptídeo atrial natriurético (ANP), o qual possui um importante papel na regulação da homeostase cardiovascular, através da manutenção da pressão arterial. As ações dos peptídeos natriuréticos são mediadas por sua ligação a três tipos de receptores. Os receptores NPR A e B (receptor peptídico natriurético A e B) são guanililciclases que aumentam a concentração intracelular de GMPc e ativam proteínas quinases dependentes de GMPc. A ativação dos receptores NPRC resulta na inibição da atividade da adenililciclase (Woodard e Rosado, 2008)
  • 48. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 38 Julho/2010 Figura 9 – Receptores tirosina quinase. Via de sinalização envolvendo a participação das MAP quinase. Figura 10 – Via de sinalização dos receptores tirosina quinase, envolvendo a participação das tirosinas quinases citosólicas.
  • 49. Sinalização Celular Julho/2010 Pág. 39 Superfamília do tipo 4: receptores reguladores da transcrição de genes A família de receptores reguladores da transcrição de genes ou receptores nucleares (NR) compreende fatores de transcrição de uma grande família de genes, incluindo receptores de hormônio da tireóide (TH), esteróides, retinóides, vitamina D, colesterol entre outros. Os receptores nucleares são bem difundidos e representam importante papel no desenvolvimento, metabolismo, homeostase e doenças (Togash e col., 2005). A ativação dos receptores nucleares ocorre através de ligantes lipofílicos, fosforilação e interação com outras proteínas. Estes podem ativar ou reprimir genes alvos pela ligação direta ao elemento responsivo ao DNA como homo- ou hetero-dímeros ou pela ligação de outras classes de fatores de transcrição ligados ao DNA. Essa atividade tem sido relacionada à formação de complexos com moléculas que parecem servir como co-ativadoras ou co-repressoras, causando modificação local da estrutura da cromatina para regular a expressão desses genes alvo (Hart, 2002). Os receptores nucleares representam uma classe evolutiva altamente conservada de fatores de transcrição em mamíferos, e podem ser classificados de acordo com o tipo de hormônio que se liga a eles. Desse modo os receptores são divididos em: esteróides (glicocorticóides, mineralocorticóides, andrógenos e estrógeno), derivados de esteróides (vitamina D3), não esteróides (hormônios da tireóide, retinóides, prostaglandinas) e receptores para os quais não foi encontrado ainda um ligante específico (receptores órfãos). A diferente classificação é baseada no modo de ligação ao elemento responsivo ao DNA, e assim são classificados dentro de quatro grupos, dependendo de sua habilidade para se ligar à sequência de DNA e dimerizar: (1) os receptores esteróides são associados com a proteína de choque térmico (“shock heat” hsps). A ligação do hormônio leva a mudança conformacional, dissociação da proteína hsps e ligação a sequências do DNA como homo- dímeros. Deste modo o papel do hormônio é induzir a ligação ao DNA; (2) a segunda classe representa os receptores tais como hormônios da tireóide, retinóides, prostaglandinas e vitamina D3. Membros dessa classe são ligados ao DNA na ausência do hormônio. A ligação do ligante ao receptor leva a mudança conformacional do domínio de ligação ao hormônio e conseqüente ativação transcricional. Os receptores dessa classe são predominantemente ligados ao DNA como hetero-dímeros; (3) os receptores órfãos que podem se ligar ao DNA como formas monoméricas; (4) ou como dímeros (Tenbaum e Baniahmad, 1997). Em geral, os receptores nucleares possuem em comum três domínios: um variável domínio amino-terminal de ligação ao promotor, um domínio de ligação ao DNA altamente conservado (DBD), e um domínio c-terminal menos conservado, de ligação ao ligante (LBD), como apresentado na figura 11 (Ribeiro e col., 1995). O motivo de ligação ao DNA é
  • 50. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 40 Julho/2010 essencial para o reconhecimento do elemento responsivo pelo receptor. O motivo de ligação consiste de 66 aminoácidos contendo dois motivos em dedos de zinco. Quatro resíduos de cisteína altamente conservados são requeridos para coordenar a ligação dos íons Zn2+ (Ribeiro e col., 1995; Tenbaum e Baniahmad, 1997). O LBD confere especificidade na ligação ao ligante e possui um número de funções reguladas por essa ligação. Essas funções incluem a liberação do receptor do complexo hsps, translocação para o núcleo, homodimerização, heterodimerizção e ativação transcricional (Ribeiro e col., 1995). Figura 11 – Estrutura dos receptores nucleares. O esquema apresenta os diferentes domínios dos receptores nucleares. Modificado de Rang e Dale, 2007.
  • 51. Sinalização Celular Julho/2010 Pág. 41 Fisiologia Celular do Plasmodium durante a fase assexuada Laura Nogueira da Cruz Laboratório de Fisiologia Celular e Molecular do Plasmodium laurancruz@gmail.com Malária Malária é uma das mais importantes infecções por protozoários no mundo causando morte de mais de 2 milhões de pessoas anualmente (Who, 2005). A Africa subsaariana concentra 90% dos casos, no entanto mais de 40% da população mundial está sob risco da doença, principalmente os habitantes das regiões tropicais e subtropicais do globo (Fig. 1) onde ocorre a distribuição geográfica do mosquito do gênero Anopheles (A. darling, no Brasil e A. gambiae, na África), que transmite as espécies infectantes humanas P. falciparum, P. malariae, P. vivax e P. ovale, sendo as três primeiras espécies encontradas no Brasil. P. falciparum é o parasita que mais causa morte por malária no mundo ocorrendo em maior incidência na África. No Brasil, a maioria dos casos é de P. vivax (Who, 2005). É importante lembrar que a malária pode ser muito mais antiga que a humanidade e existem quase 100 espécies de plasmódios, 22 dos quais infectam macacos e 50 parasitam aves ou répteis (que tiveram seu apogeu nos períodos Permiano e Triássico, quando os insetos hematófagos já existiam). Plasmódios de roedores e aves são freqüentemente utilizados, no laboratório, como modelos experimentais. Entender a complexa biologia do parasita é fundamental para o desenho de novas e mais eficientes drogas e desenvolver novas estratégias para combater a epidemia. Figura 1: Potencial mundial de transmissão de malária. (Fonte : http://en.wikipedia.org/wiki/File:Malaria_geographic_distribution_2003.png)
  • 52. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 42 Julho/2010 Combate à malária Nos últimos cinqüenta anos muitas pesquisas foram realizadas fomentando o desenvolvimento de drogas sintéticas antimalaricas. A mais importante dessas foi a cloroquina que possui baixa toxicidade, baixo custo e necessidade de ser aplicada apenas uma vez por semana. Atualmente, no entanto, um grande problema no combate à malária deve-se ao aumento da resistência dos parasitas a cloroquina, derivados de cloroquina e a grande maioria de antimaláricos introduzidos (Olliaro e col., 1996). Para inibir o aparecimento de resistência a WHO recomenda que o tratamento utilize pelo menos o combinado de 2 anti-maláricos. A incidência da malária, no Brasil, por exemplo, aumentou cerca de 10 vezes nos últimos 30 anos, sendo que hoje 99% desses casos ocorrem na Amazônia Legal (FNS, 2002), área endêmica do país, composta pelos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins. Nos Estados fora da Amazônia Legal, o risco de transmissão local é pequeno ou inexistente e a quase totalidade dos casos de malária registrada é importada da Amazônia Legal ou de outros países, principalmente da África Limitações da quimioterapia no controle da malária demonstram a necessidade de novas drogas, preferencialmente contra novos alvos (McKerrow e col., 1993; Rosenthal, 1998), pois apesar de todas as pesquisas e informações adicionais o número de casos de malária vem aumentando e uma vacina eficiente provavelmente não estará disponível no futuro próximo (Hoffman, 1996). Além disso, os esforços para controlar o mosquito Anopheles tiveram pouco sucesso (Alonso, 1991). Atualmente o que pode ser feito são medidas de profilaxias para pessoas que se dirigem a áreas de maior transmissão. O regime profilático consiste em prescrição médica dos medicamentos antimaláricos de acordo com as espécies de Plasmodium predominantes, grau de risco da infecção da área de destino, perfil de resistência ás drogas e avaliação dos efeitos colaterais associados ao uso das mesmas (Farias, 2005) A quimioprofilaxia deve ser iniciada uma semana antes da viagem, para avaliação dos efeitos colaterais, e prolongada por quatro semanas após a saída da área endêmica, a fim de sustentar a ausência dos parasitas na corrente sangüínea, mesmo após a sua transição pelo estágio hepático, período de incubação que pode levar á formação de formas latentes do parasita, responsáveis por recaídas. Contudo, apesar das medidas preventivas, febre no período de dois meses após o curso da quimioprofilaxia ainda pode ser originada pela infecção. Outro propósito da profilaxia se estender por um tempo depois da visita a área de risco é para evitar que se importe doença para a origem do viajante.
  • 53. Sinalização Celular Julho/2010 Pág. 43 Trabalhos recentes mostram que o controle com telas mosquiteiras impregnadas com inseticida ajuda no combate da malaria. (Chouaibou e col., 2006). A malaria caiu na década de 50 pelo esforço combinado da cloroquina e do DTT, que combatia o mosquito! Ciclo de vida O Plasmodium é um parasita eucarioto unicelular, de vida intracelular obrigatória, que mede 1,6 X 1,0 uM e pertence ao filo Apicomplexa. Possui um ciclo de vida caracterizado pela sucessão de várias formas especializadas de desenvolvimento Em vertebrados, a infecção se inicia pela picada do mosquito Anopheles, fêmea, que retira 3 a 4 microlitros de sangue, enquanto injeta saliva contendo alguns esporozoitos. Uma vez na corrente sanguínea, os esporozoitos invadem os hepatócitos e se desenvolvem para o estágio assexuado de merozoito. Durante este período a infecção é assintomática e cada esporozoito forma 30,000 merozoitos. Estes são liberados diretamente na corrente sangüínea e invadem os eritrócitos (Sturn e col., 2006). Na corrente sangüínea amadurecem passando pelos estágios de anel, trofozoito e esquizonte. Por um processo ainda desconhecido, alguns merozoitos não invadem os eritrócitos e se diferenciam em gametócitos, a forma infectante do mosquito (Garcia, 2001). Para o fechamento do ciclo, o mosquito – onde ocorre o ciclo sexual do parasita - terá que picar o vertebrado que tem gametocitos presentes na circulação. Estes, após o ciclo no mosquito formarão os esporozoitos que migrarão até a glândula salivar e serão transmitidos ao hospedeiro vertebrado (Fig. 2). Figura 2: Ciclo de vida da malária (Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/Malaria).
  • 54. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 44 Julho/2010 O ciclo intraeritrocítico é, portanto, o responsável por toda manifestação clínica na malária, sendo na ruptura do eritrócito infectado e conseqüente liberação do parasita para infecção de novas células que ocorrem febre e tremedeira, típicas da doença (Hawking, 1970). Dependendo da espécie de parasita, estes sintomas ocorrem em intervalos distintos – 3 ou 4 dias para P. falciparum e P. vivax, respectivamente (Garcia, e col., 2001) (Tab. 1). Função da melatonina A transição do estágio intraeritrocítico, bem como o processo de invasão in vivo e a produção de gametócitos são processos altamente sincronizados (Garcia, 2001) e na maioria mamíferos estudados seguem ciclos múltiplos de 24h (Tab. 1) Tabela 1- Período do ciclo intraeritrocítio de diversas espécies de Plasmodium (Modificado de Garcia, e col., 2001). Parasita Hospedeiro vertebrado Período do ciclo intraeritrocítico P. knowlesi primata 24h P. cathemerium pássaro 24h P. vinckei roedor 24h P. chabaudi roedor 24h P. berghei roedor 24h P. yoelii roedor 18h P. gallinaceum galinha 36h P. falciparm homem 48h P. vivax Homem 48h P. cynomolgi Primata 48h P. coatneyi Primata 48h P. malariae Homem 72h P. inui Pássaro 72h P. brasilianum Primata 72h No caso do desenvolvimento intraeritrocítico do Plasmodium, os processos de divisão celular e expressão gênica específicas de cada estágio são de extrema importância. Foi demonstrado por Hotta e col., (2000) que o hormônio melatonina é capaz de sincronizar o desenvolvimento do Plasmodium in vivo e in vitro. Quando se mantém parasitas em cultura,
  • 55. Sinalização Celular Julho/2010 Pág. 45 a sincronia é perdida, um dos fenômenos que sugeriram que o hospedeiro tem papel fundamental no estabelecimento do ritmo. (Hotta e col., 2000). A melatonina tem um largo espectro de atuação (vertebrados, plantas e protozoários) podendo ser sintetizada em vários tecidos, porém sua síntese rítmica é confinada primariamente à glândula pineal. Este hormônio é sintetizado a partir de serotonina, que está presente em grande quantidade na glândula pineal. É interessante observar ainda que os precursores da melatonina, que são devirados do triptofano, têm o mesmo efeito da melatonina tanto no ciclo celular do Plasmodium quanto na mobilização de Ca2+ de estoques intracelulares (Beraldo e col., 2005). Hotta e col., (2000) consideram que a melatonina é capaz de ativar a cascata da fosfolipase C que, por sua vez, ativa a via de inositol 1,4,5-triposfato (IP3) e libera Ca2+ do retículo endoplasmático (RE), nos estágios trofozoitos do Plasmodium. Homeostasia e sinalização por cálcio Variações na concentração de cálcio intracelular exercem papel fundamental em muitos processos biológicos de células eucarióticas, como organização do citoesqueleto, divisão e diferenciação celular (Berridge, 2003). As células eucarióticas possuem mecanismos para manter a homeostasia de Ca2+ estes incluem uma bomba de cálcio na membrana plasmática, no retículo endoplasmático além de trocadores em organelas intracelulares e na membrana plasmática (Passos e Garcia, 1997; Garcia e col., 1998). Especificamente, para o parasita da malária foi demonstrado a existência de 2 compartimentos de Ca2+ : um é o clássico retículo endoplasmatico (Passos and Garcia, 1997, Varoti e col., 2003) e o outro é um compartimento ácido (Garcia e col., 1998, Varotti e col., 2003). Sabe-se que para Plasmodium falciparum o Ca2+ extracelular é indispensável no processo de invasão do eritrócito pelo parasita e estudos fisiológicos mostram envolvimento da sinalização de Ca2+ no processo de maturação do parasita. (Garcia, 1999, Gazarini e col., 2003). Como qualquer célula eucariótica, o citoplasma do eritrócito possui baixa concentração de cálcio (menor que 100 nM ), sendo que o ambiente extracelular encontrado pela maior parte das células eucarióticas situa-se ao redor de 1 mM. A ausência de Ca2+ extracelular é normalmente incompatível com as funções normais da célula e sua sobrevivência. Dentro deste contexto, nosso laboratório demonstrou que o parasita resolve o problema de pouco Ca2+ no meio em que sobrevive, através da invaginação da membrana citoplasmática do eritrócito, pois no momento da infecção forma o vacúolo parasitóforo (VP)
  • 56. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 46 Julho/2010 e inverte a polaridade da Ca2+ ATPase da membrana (bombeando ativamente Ca2+ para o interior do VP). Desta forma pode manter o ambiente de alta concentração de Ca2+ necessário ao desenvolvimento do parasita (Gazarini e col., 2003). Enzimas proteolíticas Enzimas proteolíticas possuem um importante papel no ciclo de vida de todos os protozoários medicamente importantes como leshmania, toxoplasma, giardia e plasmodium (Rosenthal,1999). Várias proteases de protozoários foram identificadas e caracterizadas sendo utilizadas pelos protozoários em diferentes funções tais como: invasão de células e tecidos do hospedeiro, degradação de mediadores da resposta imune e hidrólise de proteínas para suprir necessidades nutricionais do parasita (Rosenthal,1999). As proteases podem ser classificadas em quatro classes (Neurath 1989; Barrett, 1994), sendo três delas (serine, cisteina e aspartil proteases), assim denominadas pela existência de sítio de aminoácido chave e a metaloprotease , pela necessidade do íon metálico para catálise. Sabe-se ainda que para a invasão dos eritrócitos por merozoitos e ruptura pelos esquizontes maduros, são necessárias proteases do parasita, pois durante estes eventos proteínas do citoesqueleto do eritrócito precisam ser hidrolizadas e algumas proteínas do parasita são proteolicamente processadas (Klemba, 2002). Outra importante função das proteases inclui a degradação da hemoglobina que é utilizada como uma fonte de amino ácido livre pelo parasita (Scheibel e Sherman, 1988). O conteúdo da hemoglobina em eritrócitos infectados diminui 25-75% durante o ciclo de vida do parasita eritrocítico (Ball e col., 1948; Groman, 1951; Roth e col., 1986), a concentração de aminoácido livre é maior nos eritrócitos infectados do que nos não infectados e a composição dos aminoácidos de eritrócitos infectados é semelhante à composição de aminoácidos da hemoglobina. Peptídeos fluorescente para determinar atividade de proteases Recentemente foram desenvolvidos peptídeos sintéticos, com seqüências específicas de aminoácido capazes de penetrar na célula e emitir fluorescência quando clivado pela protease (Fig. 3). Dependendo da especificidade da seqüência peptídica e das proteases pode-se então determinar atividades e funções proteolíticas. Em estudos realizados com P. chabaudi utilizou-se este quelante interno fluorescente de peptídeos (IQF) e microscopia confocal para demonstrar-se que
  • 57. Sinalização Celular Julho/2010 Pág. 47 melatonina induz atividade das thiol protease em uma forma cálcio-dependente (Farias et al, 2005). Estas proteases estão localizadas predominantemente no citoplasma do parasita e sua atividade pode também ser induzida por agentes que aumentam o cálcio citosolico como tapsigardina (inibidor específico da Ca2+ ATPase do retículo endoplasmático), nigericina (ionóforo K+ /H+ ) e ionomicina (ionóforo Ca2+ /H+ ) (Farias et al, 2005). Figura 3: Representação esquemática do mecanismo de funcionamento dos substratos quelante interno fluorescente de peptídeos (IQF).(Modificado de Carmona et al, 2009).
  • 58. VII Curso de Inverno: “Tópicos em Fisiologia Comparativa” Pág. 48 Julho/2010