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INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objetivo precípuo, obedecendo a uma formatação acadêmica
mostrar, de maneira sistemática, o resultado da pesquisa teórica, assim como o prático, do
estudo de tradições da cultura brasileira, destacando o folclore nordestino Guerreiro e
reproduzir um fragmento desse brincante que é o chapéu, através da linguagem visual da
Marchetaria.
Não tem a pretensão de tornar-se um corolário sobre a temática, nem tampouco se
tornar um manual de orientação à execução da linguagem apresentada, a marchetaria; mas tão
somente, uma síntese de ambos assuntos. Procurei dar formatação sucinta ao conteúdo, uma
vez que seu estudo demandaria muitas e muitas páginas, para não confundir o leitor. Não
pretendo me aprofundar na composição física das cores, como veículo de expressão visual em
si, ou como instrumento de comunicação estética, ou seja, da cor propriamente dita.
Apesar de não utilizar cores à base de luz, ou pigmentos – usando apenas as cores
naturais da madeira que sofrem algumas interferências da mão humana ou da industrialização;
desejei produzir uma leitura visual no plano bidimensional a partir de abstrações feitas em
fotografias dos objetos em tridimensionalidade.
Procurei realizar um trabalho que proporcionasse uma agradável visualização e uma
fácil interpretação dos objetos reproduzidos. Utilizando apenas as cores e texturas naturais das
lâminas de madeira, dei aos trabalhos ares de movimento e flutuabilidade, para imprimir ao
observador um devaneio visual.
Demonstrar na prática, essa forma de linguagem visual, utilizada há milhares de anos,
a marchetaria, foi para mim um desafio. Primeiro, por não ter maiores conhecimentos acerca
do assunto, e segundo, por utilizar apenas ferramentas manuais em noventa por cento dos
trabalhos. Ferramentas simples, como estiletes e mini-formões. Além, de uma reduzida
quantidade de matéria-prima, devido à falta de oferta em nossa região.
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É bem verdade que a variedade de cores das madeiras utilizadas possa haver sofrido
algum tipo de interferência da mão humana quando da industrialização da mesma, todavia,
isso não descaracteriza sua naturalidade.
Para mim, o resultado final, se apresentou rico em detalhes e contrastes tonais,
agradáveis à apreciação visual. E isso, só obtive graças a uma combinação prévia do material
disponível e, uma certa variedade de espécies de madeira, cujas constituições orgânicas
oferecem desde cores e texturas diferenciadas, à disposição de fibras e desenhos nas lâminas.
Tais madeiras, são extraídas da natureza, obedecendo algumas normas técnicas de
escolha, corte e segmentação. Para realizar este trabalho, tomei como referência temática já
citada acima, o chapéu do Guerreiro; e, procurei trabalhar na Marchetaria a composição de
painéis, observando os princípios estéticos de formas, cores e texturas dos originais. Os
resultados ora apresentados, sintetizam sobremaneira, minha abnegação em realizar este
trabalho. O estudo da composição visual obedeceu a alguns princípios técnicos e à quantidade
dos matizes cromáticos disponíveis. É de bom alvitre salientar que, em razão das dificuldades
na aquisição de uma maior variedades de cores, texturas e espécies de lâminas, tive de
reorganizar meu trabalho pensando na reduzida quantidade desse material. É claro, que com
uma maior diversidade de materiais e ferramentas, poder-si-a alcançar melhores
performances. Entretanto, acredito haver atingido meu objetivo, ao realizar artesanalmente
todo o processo produtivo. Somente em torno de dez por cento deste, foi utilizado maquinário.
Entendo haver cumprido o desafio, e justificada a temática escolhida, pela apresentação das
obras.
O objetivo deste trabalho é mostrar um fragmento do que é a cultura nordestina através
do folguedo Guerreiro. E isto se comprova agora com sua finalização e apresentação pública.
Fiz esta opção com a clara intenção de falar da cultura de maneira não muito abrangente, e
sim, apenas mostrar um fragmento dela, em linguagem visual da marchetaria. Foi uma missão
quase impossível, pois o assunto da temática é extenso e controverso. Existem várias
correntes de pesquisadores e estudiosos do assunto, o que deixa pairar dúvidas quanto à
origem, formação dos folguedos e divulgadores. Mas não posso prescindir das informações
básicas necessárias, para que o leitor entenda minha proposta. Procurei ser o mais equânime
possível no que tange aos comentários a respeito da temática e da linguagem.
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Ao fazer este trabalho pensei em avivar a memória de um folguedo que sempre
marcou minha infância. E, é para mim muito gratificante, porque me renova as esperanças de
ver reflorir na sociedade brasileira a cultuação às brincadeiras infantis, religiosas e de roda,
visto que isso faz parte da formação moral e cívica de um povo. Recentemente vi nos
telejornais que em São Paulo as professoras estão resgatando esses princípios fundamentais na
formação cultural das crianças. Ao resolver falar desse tema, entendi que de alguma maneira
estou contribuindo para o retorno de tais brincadeiras à baila do cotidiano das escolas.
Sei que este trabalho não ficará arquivado apenas nas prateleiras de alguma seção da
universidade, mas possivelmente será divulgado por alguém que entenda o que é cultura e
saiba o seu valor na formação de um povo, de um país e de uma nação. Uma rica cultura
como é a nordestina, e mais particularmente a alagoana, precisa ser conhecida por outros
rincões deste imenso território brasileiro.
É apenas uma sementinha que estou plantando das muitas que pretendo semear de
agora em diante, me tornando um divulgador da cultura nordestina por onde quer que venha
estar. Falar de uma dança, folguedo ou brincadeira nordestina me transporta no tempo, já que
no momento não posso estar no espaço, aos meus idos de criança. Só isso para mim, já
justifica a proposta de meu trabalho. Todavia, quando se torna um documento acadêmico de
maior consistência histórica, mais justificada está em relação à propositura acadêmica do
curso.
Falo do Guerreiro como temática, - centrado no adorno de cabeça -, mas também
discorro sobre outros que lhe deram origem. Falo da Marchetaria como arte milenar, mas
também cito alguns trechos de movimentos artísticos e suas particularidades. Cito diversos
artistas e escritores que sem suas referências bibliográficas e obras, talvez não houvesse
chegado a este fim.
Apenas a título de uma prévia informação ao leitor, quero salientar que o Guerreiro é
uma mistura de várias outras danças com conotação religiosa, mas que ao longo dos tempos
ganhou tons de profanidade. O Guerreiro também é uma arte, uma vez que se enquadra no
campo das danças dramáticas brasileiras e da música.
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E porque a marchetaria como linguagem de expressão? Bem, nos vários momentos de
reflexão na escolha do que deveria apresentar como linguagem de expressão visual, no
trabalho de final de curso, sempre me deparei com dificuldades em coadunar o tema com a
linguagem. E isso, me impulsionou ao desafio de encarar a marchetaria, pela sua peculiar
característica.
A Marchetaria me fascinou, por ser uma arte milenar em que a criatividade, a
paciência e a dedicação exclusiva, são atributos que não podem faltar quando de sua
elaboração. Tudo isso me deu coragem e determinação para chegar onde ora estou.
Apresentando este trabalho, com sua parte teórica e prática atendendo ao preconizado pelas
normas acadêmicas.
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CAPITULO I
DIVIDIR PARA SOMAR
1 - COMPOSIÇÃO DAS PARTES
1.1 – Elementos de composição
O que é compor algo? Etimologicamente falando, compor significa arrumar de forma
ordenada, partes diferentes ou iguais, dando uma nova estruturação ao todo. O Dicionário
Aurélio, (1975: 454) dispõe que: “Compor [Do lat. Componere.] V.t.d. 1.Formar ou construir
de diferentes partes, ou de várias coisas. 3. Produzir, inventar”.
Segundo o dicionário, numa concepção filosófica, e aí se faz necessário remeter à
teoria platonista, que diz podermos chegar a uma forma definida no campo físico, a partir de
uma concepção no campo do imaginário. Platão com sua teoria afirma que o que se forma no
campo do ideal pode ser transformado em real, isto é, para ele o campo do ideal é o campo da
razão, enquanto o do físico é o campo do sentimento. Esse campo do real, que segundo a
teoria platonista é o campo do sentimento, permite que o artista possa criar a partir de uma
idéia. Partindo desse conceito, as coisas imaginadas tomam sua forma definitiva, e aí se
concretizam.
Mas, para começar o processo de criação daquilo que foi imaginado, necessário se faz
que elaboremos uma composição do que será concretizado. E para isso necessitamos de várias
partes.
A essas partes chamarei de elementos de composição. Os que procurei empregar na
confecção de meu trabalho, são os que normalmente se usa quando da criação de uma obra de
arte. Seja ela de natureza bidimensional ou tridimensional. São elementos do desenho e da
forma. O desenho, inicialmente um esboço. A partir dele, a definição final do que será
executado na prática. Foi o que procurei fazer no processo de criação ou recriação do chapéu
do Guerreiro. E como os elementos que se dispõem ao desenho são: o ponto, a linha, as
formas geométricas de uma maneira geral, além da luz, sombra e cor, me dispus de tudo isso
para a minha composição.
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Também utilizei alguns fundamentos de desenho, no corte adequado da chapa de
MDF. Por exemplo, para o corte da chapa, cujas dimensões são de 2,70m por 2,20m, procurei
sistematizá-lo de forma que, aproveitasse o máximo do material. A perda total situou-se em
torno de um por cento. A placa foi dividida de tal maneira, que descontando o corte da serra e
os possíveis retalhos, consegui quinze pedaços retangulares medindo aproximadamente 0,60m
por 0,50m o que me proporcionou os suportes de medidas aproximadas ao que preconiza o
retângulo áureo.
O retângulo áureo é uma figura geométrica que apresenta as dimensões mais perfeitas
para utilização em telas quadros e painéis. Observando-se sua proporcionalidade. E isto tem
uma influência fundamental no que concerne ao processo de visualização do ser humano, em
cuja disposição facial situam-se os olhos, que formam proporcionalmente, um retângulo áureo
em disposição panorâmica. O artigo que explica esse conceito e traz uma demonstração
prática do exposto neste parágrafo, relativo ao retângulo, é realizada por SODRÉ e TOFFOLI
(2005). Observando as (Figuras 01 e 02) podemos melhor entender o gráfico que representa o
retângulo áureo. Não usei o rigor das medidas do referido retângulo para cortar e compor os
painéis, mas, procurei racionalmente aproveitar o material obedecendo a esse fundamento.
Figuras 01 e 02 - Gráficos de composição do retângulo áureo.
Fonte: http://pessoal.sercomtel.com.br/matematica/alegria/fibonacci/seqfib2.htm
Já no que concerne às lâminas de madeira, o que posso explanar, é que algumas foram
importadas de outro estado, com as seguintes dimensões: 0,31m X 0,31m X 0,001m. As
demais adquiridas na região. Algumas têm 0,40m de largura por 3,00m de comprimento e
0,001m de espessura, outras têm 0,30m de largura por 3,0m de comprimento e a mesma
espessura citada.
Para a composição dos painéis procurei me nortear no princípio do retângulo citado.
Mas o que é um painel? Explica CORTELAZZO (2005): “O painel é uma forma de
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apresentação dos resultados dos trabalhos realizados em torno de um tema”. Se tomarmos
como base que o homem é um animal de estatura erétil, e que sua área de visibilidade está
distribuída dentro da área de um retângulo áureo, isso me leva a crer que por ser um animal de
estatura erétil sua área de visualização é mais voltada para tudo que está na vertical. Por essa
razão, optei pela disposição retrato nos painéis. Isto se deve ao fato de que procurei distribuir
as imagens de maneira que o observador numa primeira olhada, possa definir o objeto
interposto no campo visual. A minha intenção é que na primeira leitura visual, ele possa
vislumbrar o motivo principal.
Para pessoas leigas ao folguedo Guerreiro, a primeira impressão que se tem das
imagens é de formas de igrejas, entretanto, logo se percebe que não existe a linha do
horizonte, que delimita o espaço do chão, e que demonstraria se tratar de um desenho
arquitetônico. Inexistente nos meus trabalhos, essa linha não divide o campo visual em espaço
e chão, dando ao observador a impressão de apenas um cosmo. E isso foi intencional, pois
queria que as figuras em Marchetaria representassem chapéus flutuando. E isso incomoda de
alguma forma, a primeira visualização da imagem. A supressão natural dessa linha, se deu
para levar o observador a vivenciar o movimento do objeto, como se estivesse vivendo o
momento do folguedo. Procurei aproximar o máximo o objeto, como se o estivesse
fotografando em zoom, reduzindo a visão do fundo par justificar minha intencionalidade.
Mas, numa olhada mais criteriosa, pode-se observar que se trata de outra imagem, e não de
um simples desenho arquitetônico. A imagem parece mover-se em rotação e translação,
segundo afirma FONTOURA (1962: 38): “Translação é o movimento de um corpo em que o
conjunto de seus pontos tem em cada instante a mesma velocidade e este mantém uma direção
constante”. Em outra conceituação FONTOURA (1962: 40) diz: “Rotação é o movimento de
um corpo em que o conjunto de seus pontos, em um instante determinado, descreve arcos de
circunferência cujos centros estão sobre uma mesma reta, denominados eixo instantâneo ou
simplesmente eixo de rotação”. Todas as figuras dos painéis insinuam movimento. Isto se
percebe pelas formas curvilíneas das fitas e pelo aspecto dos cortes em perspectiva. É a partir
daí, que o observador começa a abstrair conforme sua idealização e conhecimento.
Só numa segunda investida visual perceberá que está diante de um objeto que flutua, e
não diante de uma retratação arquitetônica de igreja ou de outro objeto. Pois se assim o fosse,
haveria a base ou linha de horizonte. Isto, se deve aos elementos de composição empregados
na realização da obra. Utilizei neste trabalho, vários elementos de composição como: o ponto,
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a linha, a perspectiva, o escorso, a deformação; finalmente, todos os elementos do desenho,
de maneira que pudesse dar leveza e movimento nas composições dos quadros.
Procurei situar o enquadramento de tal maneira, que imagens e formas se
apresentassem bem próximas do observador, remetendo-o a uma leitura visual próximo do
infinito. Capturei essas informações em alguns sites da Internet como o que destaco a seguir
SODRÉ E TOFFOLI (2005) no qual comentam:
Anexando dois quadrados com lado = 1, teremos um retângulo 2x1, sendo o
lado maior igual à soma dos lados dos quadrados anteriores. Anexamos agora
outro quadrado com lado = 2 (o maior lado do retângulo 2x1) e teremos um
retângulo 3x2. Continuamos a anexar quadrados com lados iguais ao maior
dos comprimentos dos retângulos obtidos no passo anterior. A seqüência dos
lados dos próximos quadrados é: 3,5,8,13,... que é a seqüência de Fibonacci.
Procuro demonstrar com este trabalho, o que se situa entre o imaginário e o real. Na
minha concepção, é um trabalho metafísico do ponto de vista filosófico. Metafísico, porque
parto do imaginário daquilo que quero representar, para a realidade do que apresento: (meta:
além, e física: matéria). Ou seja, a obra não quer ser apenas uma mimese do real, ela é em si, a
síntese do que foi concebida no campo do ideal. O Mito da Caverna narrado por PLATÃO
(2004: 225) é, talvez, uma das mais poderosas metáforas imaginadas pela filosofia, em
qualquer tempo, para descrever a situação geral em que se encontra o homem. Para o filósofo,
todos nós estamos condenados a ver sombras a nossa frente e tomá-las como verdadeiras.
Essa poderosa crítica escrita há quase 2500 anos atrás, narra a condição em que o homem se
encontra diante do inusitado, inspirou e ainda inspira inúmeras reflexões pelos tempos afora.
Quero salientar, que meu trabalho pode parecer confuso do ponto de vista estético e
estrutural, mas certamente com um olhar mais acurado o observador notará que está diante de
algo que representa o que se propõe. O trabalho na sua organização visual, traz elementos de
composição como o escorso, a profundidade, a vista em corte, a linha, o ponto etc. Conforme
já disse anteriormente. Além dos elementos geométricos em várias configurações. Também
podem ser percebidas, a cor, a luz e a sombra.
Todavia, para alguns observadores pode parecer obscura a leitura visual. Talvez pela
falta de conhecimento daquilo que quero retratar, - o chapéu do guerreiro. Reportando-me à
fábula de Platão, a uma primeira olhada, parece ao observador leigo, como as sombras da
caverna de Platão. Porém, após uma melhor reflexão, revelará imagens do real, do mundo da
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luz, citado no exemplo. Dependerá da capacidade interpretativa de cada observador. Mas não
tenho o compromisso de justificar a capacidade ou não de cada indivíduo, uma vez que a arte
não tem compromisso com a verdade, ela é mimética na suas essência. Depende do grau de
assimilação que cada um possa ter como no caso dos homens da caverna. E para justificar esta
colocação, tomei como base o seguinte trecho do artigo de SCHILLING (2005) mas que li no
livro VII de a Republica de PLATÃO (2004: 225):
Platão viu a maioria da humanidade condenada a uma infeliz condição.
Imaginou (no Livro VII de A República, um diálogo escrito entre 380-370
a.C.) todos presos desde a infância no fundo de uma caverna, imobilizados,
obrigados pelas correntes que os atavam a olharem sempre a parede em frente.
O que veriam então? Supondo a seguir que existissem algumas pessoas, uns
prisioneiros, carregando para lá para cá, sobre suas cabeças, estatuetas de
homens, de animais, vasos, bacias e outros vasilhames, por detrás do muro
onde os demais estavam encadeados, havendo ainda uma escassa iluminação
vinda do fundo do subterrâneo, disse que os habitantes daquele triste lugar só
poderiam enxergar o bruxuleio das sombras daqueles objetos, surgindo e se
desfazendo diante deles. Era assim que viviam os homens, concluiu ele.
Acreditavam que as imagens fantasmagóricas que apareciam aos seus olhos
(que Platão chama de ídolos) eram verdadeiras, tomando o espectro pela
realidade. A sua existência era pois inteiramente dominada pela ignorância
(agnóia). Se por um acaso, segue Platão na sua narrativa, alguém resolvesse
libertar um daqueles pobres diabos da sua pesarosa ignorância e o levasse
ainda que arrastado para longe daquela caverna, o que poderia então lhe
suceder? Num primeiro momento, chegando do lado de fora, ele nada
enxergaria, ofuscado pela extrema luminosidade do exuberante Hélio, o Sol,
que tudo pode, que tudo provê e vê. Mas, depois, livre aclimatado, ele iria
desvendando aos poucos, como se fosse alguém que lentamente recuperasse a
visão; as manchas, as imagens, e, finalmente, uma infinidade outra de objetos
maravilhosos que o cercavam. Assim, ainda estupefato, ele se depararia com a
existência de um outro mundo, totalmente oposto ao do subterrâneo em que
fora criado. O universo da ciência (gnose) e o do conhecimento (espiteme),
por inteiro, se escancarava perante ele, podendo então vislumbrar e
embevecer-se com o mundo das formas perfeitas. site:
educaterra.terra.com.br/voltaire/cultura/caverna.htm
A estética do meu trabalho, é indissociável da teoria das idéias. Pois sua composição
estética surge no campo do ideal, não é uma cópia daquilo que se baseia, mas uma nova
criação, a partir de um modelo. É a partir de sua idealização no campo do imaginário, que
fica evidenciada a nova forma, agora real. Ela se apresenta ao observador como algo novo,
pois já fluiu do campo do imaginário, (razão) para tomar sua forma definitiva no campo do
real (sentimento) situada por assim dizer como matéria, posta no campo dos sentidos que
Platão preconizava, uma vez que agora pode ser vista tocada e sentida. E a essa nova
composição, atribuo um novo valor estético. Segundo FONTES (2005): PLATÃO dizia:
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“Como as idéias são imutáveis e eternas, se pretendemos apreciar as obras de arte devemos
seguir estes princípios, exigindo que elas se aproximem das idéias, o mesmo é dizer da
perfeição”. Neste sentido, Platão não pode admitir qualquer mudança ou inovação no campo
artístico. Entretanto, quero destacar como síntese do meu trabalho, inúmeros pensamentos e
antevisões daquilo que vivenciei. E não mudo minhas pretensões, por entender que elas só se
tornarão arte, a partir dessa tomada de decisão. Não só juntei partes (etimologicamente
falando) ao rejuntar retalhos de madeira e compor uma nova figura; fui mais além, rejuntei
partes distintas de um todo fragmentado, quero dizer, de minhas lembranças; e, rejuntando-as
novamente imprimi-lhes uma nova forma num trabalho difícil e meticuloso. Procurei dar uma
nova cara ao ornato de cabeça usado no Guerreiro, como também, juntei fragmentos de vida,
numa nova dimensionalidade visual que se concretiza na elaboração de cada quadro.
Ao dividir cada lâmina de madeira, em pequenos pedaços e tiras, para depois compor
uma nova imagem; pude sentir o prazer de realizar o meu trabalho. Percebi, que mesmo com
retalhos esparsos de madeira, é possível se produzir uma forma esteticamente equilibrada, e,
que possa proporcionar prazer visual ao observador. E, é isso que cada painel se propõe. É a
síntese do trabalho meticuloso e paciente, onde o amor, a paciência e a dedicação exclusiva
podem agregar à obra, o sentimento de que Platão fala. E esse sentimento que sai do meu
interior (campo do imaginário e da razão) pode fluir da própria obra em direção ao observador
quando visualizá-la, que certamente fruirá seu conteúdo estético refazendo o caminho inverso
da teoria platônica.
Efetuar uma composição pictórica, a partir de partes distintas de delgadas lâminas de
madeira, de cores e textura variadas, e, se chegar a uma nova composição visual, foi muito
interessante e gratificante. Cada passo dado, sentia uma nova emoção! E a satisfação pelo
objetivo alcançado não podia ser outra, senão a esperada.
Uma vez recortadas as partes conforme as necessidades, procurei compor imagens e
dar-lhes forma e expressão visual organizada e harmônica. Neste trabalho de composição em
mosaico, agrego algumas sutilezas, que de alguma forma dão conotações do impressionismo,
do expressionismo e do cubismo.
Do impressionismo, porque parto do meu olhar exterior ao modelo, e o transporto para
o consciente onde elabora no campo do imaginário o que vou reproduzir no suporte. Dessa
forma, as características do impressionismo, que se envolvem neste caso, são a impressão que
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abstraio do modelo e transformo em outras formas. Uma das premissas do impressionismo, é
que a impressão é um movimento do exterior para o interior, ou seja, é a realidade do objeto
que se imprime na mente do sujeito.
A arte alegre vibrante e moderna dos impressionistas, enche os olhos de cor e luz.
Prevalecem a luz e a cor natural. É a presença da natureza, a transparência luminosa, a
claridade das cores. É a sugestão de felicidade e de vida harmoniosa que transparece nas
imagens criadas pelos impressionistas. É isto que acontece no momento que olho o trabalho.
Obviamente não possui a transparência visual, pois são feitos de materiais opacos, mas existe
uma certa transparência no campo do imaginário.
Do ponto de vista expressionista, o movimento acontece ao contrário, ele parte do
interior para o exterior, e isso, de alguma forma é o que tento passar no trabalho. O
Expressionismo é a arte do instinto, trata-se de uma arte dramática, subjetiva, “expressando”
sentimentos humanos. Tento transmitir ao observador meus sentimentos e vivências. Ao ver
os trabalhos, mesmo um leigo em relação a arte, se remete imediatamente à religião, e isto se
dá, pelas características visuais da obra.
Já do ponto de vista cubista, a própria disposição dos retalhos de madeira, formando
uma imagem às vezes indecifrável aos olhos do observador, um verdadeiro mosaico; remete
àquele. O artista cubista tenta representar os objetos em três dimensões, numa superfície
plana, sob formas geométricas, com o predomínio de linhas retas. Não representa, mas sugere
a estrutura dos corpos ou objetos. Representa-os como se movimentassem em torno deles,
vendo-os sob todos os ângulos visuais, por cima e por baixo, percebendo todos os planos e
volumes. Não é o que minhas imagens retratam com uma fidelidade, porém, remete-se ao
cubismo quando verificadas as formas e, percebe-se que flutuam livres e como se estivessem
em movimento. É aí, que o observador mais atento vai logo entender não se tratar de uma
representação arquitetônica, cujo fundamento básico seria a linha delimitadora do horizonte.
Nos meus trabalhos, essa linha não existe, pois intencionalmente quis induzir o observador a
um mergulho imaginário no cosmo, como dito anteriormente.
O leitor mais familiarizado com as artes logo perceberá essas características; mas,
entendi necessária esta explicação, uma vez que nem todos, têm o conhecimento da história
da arte de tal modo que possa vislumbrar à primeira vista o exposto.
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Quanto à utilização do campo visual disponível nos painéis, procurei ocupar de tal
maneira que deixasse destacado o meu motivo pictórico. Procurei compor de tal forma que,
os contrastes de luz e sombra, como também da cor e seus matizes, surgissem ao ritmo da
disponibilidade do material. Obedeci à minha intuição e ao que diz SILVA, (2005) quando
afirma:
Num quadro, todas as partes serão visíveis e desempenharão o papel que lhes
é atribuído, seja ele principal ou secundário. Tudo o que não é útil no quadro é
prejudicial. Uma obra de arte deve ser harmoniosa em sua totalidade; pois os
detalhes supérfluos, na mente do espectador, usurpariam os elementos
essenciais.
Nas composições que formulei, procurei ocupar todo o espaço visual, de forma que o
espectador possa melhor aproveitar a disposição dos objetos, bem como de suas interposições
cromáticas. A partir de uma idealização do mosaico, e utilizando o material disponível,
procurei compor os painéis de maneira que não deixasse se distanciar demais das formas que
serviram como referenciação. A composição deveria refletir parte do que estava reproduzindo.
Daí, me centrar de certa maneira, na reprodução abstrata dos meus modelos. Novamente em
SILVA, (2005) encontra-se:
O lugar ocupado por figuras ou objetos, o espaço vazio em torno deles, as
proporções, tudo desempenha um papel. A composição é a arte de dispor, de
maneira decorativa, os vários elementos à disposição do pintor para a
expressão de seus sentimentos.
Procurei dispor nos meus trabalhos, formas de fácil interpretação visual, porém,
imprimi a estas, minhas características pessoais, o que de certa maneira, traduz o que foi
preconizado por MATISSE na citação anterior. Já em relação à expressividade das formas por
mim adotadas nos painéis, parto do pressuposto de que na arte cada um deve procurar seu
estilo, para assim, poder logo imprimir a seus trabalhos sua marca como objeto de
identificação pessoal, e, que de certa forma dita a personalização artística. E fui buscar esta
premissa em OSTROWER, (1990: 16), o grifo é meu:
Na arte, as formas expressivas são sempre formas de estilo, formas de
linguagem, formas de condensação de experiências, formas poéticas e,
nesse sentido, também as palavras, das poesias, ou de níveis poéticos,
devem ser entendidas como formas verbais- (...).
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1.2 – COMPOSIÇÃO ATRAVÉS DA TÉCNICA DO MOSAICO
A origem do mosaico vem do latim musa, que também proporcionou música e museu.
Está entre as primeiras manifestações elevadas do ser humano, tais como a pintura ou a
escultura. Arqueólogos e estudiosos costumam datar os primeiros mosaicos em painéis do
século V a.C., encontrados na Suméria. Quando os gregos fundaram estabelecimentos
coloniais no sul da Itália, entraram em contato com uma vastidão de mármores, que logo se
tornou matéria-prima para a ornamentação de pavimentos e paredes. Os romanos
aprofundaram seu uso, difundindo-o por todo o mundo sob seu domínio, desde os confins da
Ásia Menor até a Lusitânia (Portugal), onde hoje ainda se encontram vestígios, muitos bem
conservados especialmente em Conímbriga próximo à cidade de Coimbra. Internet
ALIBERTI (2005).
O primeiro trabalho em mosaico foi realizado pelos sumérios há 5000 anos. Este povo,
originário do Oriente, criou pilastras revestidas com cones de argila colorida e fixadas em
massa. Os motivos eram geométricos e mostravam inspiração na arte da tapeçaria.
Aproximadamente 300 anos a.C., os gregos já formavam quadros de pequenos seixos brancos,
pretos e vermelhos com cenas de luta e caça, além de motivos mitológicos. Desde então, o
homem tem usado pedaços de pedra, cerâmica, vidro, conchas e os mais diferentes materiais
para criar mosaico.
Antigamente a técnica do trabalho em mosaico consistia na colocação de fragmentos
de mármore ou de pasta vítrea de diferentes cores sobre o piso de cimento, composto de várias
camadas de lama misturada com seixos e com uma leve cobertura de gesso. O artista
procurava as linhas do desenho esboçado sobre o gesso e demonstrava sua perícia em
desenvolver formas e cores, além de conseguir contraste de sombra e luz. Em geral os
mosaicos eram executados no local, embora a figura central que requeria uma mão-de-obra
acurada em materiais mais refinados, fosse preparada sobre o desenho de um painel especial
na oficina do artesão e depois inserida dentro do local escolhido.
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Para a realização de um mosaico podem se distinguir três etapas importantes. O
desenho do mosaico é a primeira e através dele deve-se preparar, em papel, um esboço em
escala inferior do tamanho real da peça desejada.
A próxima etapa é o traslado deste desenho para a superfície escolhida. Amplia-se, a
lápis, a escala real do desenho para o local onde o mosaico será instalado. Por último, realiza-
se a colocação das pastilhas mediante dois métodos distintos para a instalação: direto e
indireto. A partir de 40 a.C. a Itália torna-se o maior centro de produção de mosaicos. Ele era
utilizado principalmente em motivos religiosos, revestindo pisos e paredes. Ravena é umas
das cidades italianas onde se encontram mosaicos maravilhosos. O mosaico bizantino utiliza
muito o tom dourado e prateado e foi utilizado principalmente no revestimento de tetos de
igrejas. No Brasil o mosaico foi utilizado por Cândido Portinari, Di Cavalcanti e Tomie
Ohtake em diversas de suas obras. Ele ainda é utilizado, principalmente na construção civil
em imensos painéis, na decoração de piscinas e em pisos e paredes dos mais diversos
ambientes. ESTHER (2005) Internet.
Paulo Werneck (1907 / 1987) nasceu no Rio em 29 de julho. Foi pintor, desenhista e
ilustrador de livros infantis e colunas políticas de diversos jornais. Autodidata, Paulo Werneck
introduziu no Brasil a técnica do mosaico. Contribuiu com seus murais para projetos de
arquitetos como Oscar Niemeyer, Marcelo, Milton e Maurício Roberto. Dentre os painéis
realizados destacam-se os localizados nos edifícios Ministério da Fazenda, Seguradoras,
Marques do Herval, Banco Boavista, no Rio, na Igreja São Francisco de Assis, na Pampulha,
e no Palácio do Itamaraty, em Brasília. Paulo Werneck foi um incansável colaborador do
Modernismo. Como ilustrador Paulo Werneck publicou duas lendas brasileiras – Negrinho do
Pastoreio (1941) e Lenda da Carnaubeira (1939). Esta última foi também publicada nos
Estados Unidos pela editora Grosset & Dunlap (1940). (Figura 03). Internet WERNECK
(2005).
15
Figura 03 – Mosaico de Paulo Werneck
Fonte:www.projetopaulowerneck.com.br
Procurei referenciar artistas brasileiros por entender que dessa forma estou valorizando
o que temos de melhor em nossa sociedade. Paulo Werneck é um artista conhecido no meio
artístico brasileiro como também no campo literário com vários trabalhos publicados.
Também procurei informações a respeito de um marcheteiro que trabalhasse essa arte mais no
aspecto mosaicista. E encontrei na obra de Marcos Resende o que buscava para me
referenciar. Até porque, sendo ele um artista admirador de Volpi, pois suas obras carregam
fortes traços de identidade com aquele, entendi que deveria citá-lo porque também vejo em
minha obra alguma semelhança com a obra de Volpi, pois as fitas multicoloridas dos quadros
lembram de certa forma as bandeirinhas. Não quero que leitor entenda que meu trabalho tenha
verossimilhança com o do Grande Mestre Volpi, até porque, as linguagens são bem distintas,
porém, existe uma pequena lembrança daquele no que se refere aos contrastes de cores nas
fitas dos chapéus com as bandeirinhas. (Figura 04).
Figura 04 - Pintura de bandeirinhas de Alfredo Volpi
Fonte: www.pinturabrasileira.com/artistas
16
1.3- MARCHETARIA – O MOSAICO DE MADEIRA
O que é marchetaria e onde surgiu? O termo Marchetaria refere-se cortar, encaixar e
colar, especialmente pedaços ou lâminas de madeiras sobre uma superfície sólida, para então,
montar um projeto decorativo de acordo com as tendências próprias do artesão. Este termo do
francês, marqueter, quer dizer embutir.
A origem da marchetaria é desconhecida, porém sua atribuição é dada à França por
haver difundido a arte pelo resto do mundo. Desde a época dos Egípcios já se praticava a
Marchetaria. Data de aproximadamente 3000 anos atrás. Caixas de alto requinte, painéis e
mobílias decorativas enriqueceram os projetos nos palácios e templos da época.
Confeccionados em madeiras coloridas, muitas dessas peças, foram deixadas nas pirâmides,
mais tarde descobertas pelos arqueólogos.
Outros exemplares de Marchetaria apareceram na Ásia Menor em torno de 350 A.C.,
cujas peças foram desenvolvidas em mármore. Por simples definição, a arte da marchetaria
consiste em envolver uma determinada área com pequenos pedaços de madeira coloridas de
diferentes tipos que depois de cortadas, são devidamente embutidas ou coladas lado a lado,
posteriormente recebendo um acabamento.
Depois da queda do Império Romano, poucas oficinas sobreviveram na Itália. Nos
séculos 14 e 15 foram criadas algumas escolas de marchetaria na cidade de Florença, cujo
exterior das peças eram moldados com o formão. Somente com a criação de associações da
marcheteiros é que a arte pode se sustentar de forma mais perene. Inicialmente criadas na
Europa, foram se espalhando pelo resto do planeta nos demais continentes. Melhores
informações serão apresentadas em capítulos específicos.
O objetivo de realizar este trabalho, é trazer alguma informação aqui para a região, do
que é um a cultura nordestina, apresentando um fragmento dela em linguagem plástica. E,
também resgatar de forma artística acadêmica, a milenar arte da marchetaria.
Procurando conhecer melhor a produção em Marchetaria no Brasil, investiguei sobre
os artistas que têm trabalhos nessa técnica e encontrei Marco Resende. Nascido no Rio de
17
Janeiro em 1966, Artista Plástico e Restaurador de obras de arte, iniciou sua carreira em 1984,
cursando Arquitetura na Universidade Santa Úrsula- RJ, logo depois passando a dedicar-se ao
estudo da pintura na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, onde teve aulas com
importantes artistas contemporâneos, como Daniel Senise, Charles Watson e Gianguido
Bonfanti, entre outros. No ano de 2000 coordenou o trabalho de restauração de cerca de 600
m² do assoalho de madeira em Parquet marchetado das salas do Palácio das Laranjeiras,
residência oficial do Governador do Rio de Janeiro.
Desde então vem utilizando a madeira em seu trabalho como artista, que se baseia nos
princípios do Construtivismo. Na Figura 05, podemos ver trabalho do artista em Marchetaria
que caracteriza sobremaneira a arte do mosaico, só que em madeira.
Figura 05 -Trabalho de Marco Resende em marchetaria
Fonte: www.volpigaleriadearte.com.br
O meu trabalho não representa as características mais marcantes do mosaico
propriamente dito, entretanto carregam em seu bojo, uma forte tendência mosaicista, haja
vista a variedade de formas cores e disposições das partes. Na elaboração do trabalho em
madeira, procurei obedecer a uma seqüência básica de confecção dos quadros ou painéis.
Primeiramente, como já citei anteriormente, produzi no campo das idéais, aquilo que
pretendia retratar na prática e na linguagem que escolhi. Depois, numa segunda fase,
vislumbrei todo o processo de execução. Desde que material iria utilizar até como deveria ser
o desfecho final. Numa terceira fase, já de posse do material, e ferramentas, parti para a
execução do trabalho.
18
Primeiro escolhi os modelos que pretendia reproduzir, depois segui as técnicas
normais da Marchetaria. Porém, à medida que ia realizando o trabalho, diversos fatores
inesperados iam surgindo e tive de contorná-los adequando-os às minhas reais possibilidades,
conforme exposição detalhada no item 1, deste capítulo. Outros detalhes serão relatados na
parte que falo sobre a confecção de cada quadro no capitulo III.
1.4 – GUERREIRO – COR, FORMA E MOVIMENTO
Entendo ser interessante, que o leitor tome conhecimento da temática deste trabalho
que é o chapéu do Guerreiro, e, como conseqüência possa conhecer melhor um pouco da
cultura e arte nordestina, em especial a alagoana que conforme ANDRADE, (1959: 22), é:
“Uma das manifestações mais características da música popular brasileira são as nossas
danças-dramáticas”. Guerreiro”1
, é um folguedo natalino de caráter dramático profano-
religioso.
Antigamente era formado por aproximadamente sessenta figurantes, mas com o
passar do tempo, e o advento da mídia eletrônica que invade os lares populares do nordeste, e
a difusão desenfreada das culturas ditas modernas como o axé-music, os trios elétricos e o
carnaval, o culto às festas folclóricas tem diminuído assustadoramente, colocando em risco de
extinção essas danças folclóricas ricas em história, musicalidade e poesia.
Hoje, esses números variam entre 25 e 35 componentes. O Guerreiro é um grupo de
dançadores e cantadores, surgido pelo sincretismo do “Reisado”2
alagoano, junto ao já
1
-Guerreiro: Grupo multicolorido de dançadores e cantadores, semelhantes aos do Reisado, mas com maior
número de figurantes, maior riqueza nos trajes e mais música. Surgiu em Alagoas, entre os anos de 1927 e 1929,
sendo resultado da fusão de reisados e pastoris. Possui em média, 46 personagens entre rei, rainha, mestre,
contra-mestre, palhaço, etc.
2
-Reisado: De origem portuguesa, no período natalino, músicos e dançadores vão de casa em casa anunciando o
nascimento de Jesus. Os reisados aparecem durante o ciclo de Natal, a partir da Bahia, pelos estados do Nordeste
até o Piauí. Seguem a mesma tradição secular ibérica, indo de casa em casa, fazendo em cantoria a pedição de
abertura de porta e louvação aos donos das casas. Cantam o nascimento do Menino Jesus, numa fusão de temas
sacros e profanos.
19
desaparecido “Cabocolinhos”3
, e ainda com subsídios temáticos das Cheganças, Pastoril e do
Bumba-meu-boi. Comporta também o maior número de figurantes e episódios, tendo mais
riqueza de peças e cores em seus trajes bem como mais melodia e poesia musical. Muitos
estudiosos do Folclore, costumam dizer se tratar de um "Reisado Moderno", podendo ele, o
“Guerreiro” substituir ambos, “Cabocolinhos” e “Reisado” tornando-se assim, um único
folguedo. Quero destacar o que diz LIMA (1962: 99): “O Guerreiro tem a estrutura básica dos
reisados com danças, cantos,’entremeios’ dramáticos etc.”. Essa afirmação de que o Guerreiro
é uma espécie de Reisado, já dá um certo direcionamento ao objeto de estudo da temática.
É uma espécie de dança dramática, com cantorias alegóricas relacionadas com os
festejos de natal que passeia pelas ruas do bairro ou cidade, indo de porta em porta e fazendo
louvação ao menino Jesus. Mas, como suas raízes remontam a outros folguedos como: o
Reisado, o Caboclinhos, a Chegança4
, o Pastoril5
o Bumba-meu-boi6
etc., sua estruturação
poética é mais complexa e extensiva. Pode-se encontrar no Guerreiro, figuras da nobreza
como a Rainha7
; do poder repressor, como é o caso das cheganças, simbolizada pelo General8
;
das comunidades silvícolas que habitavam a costa brasileira na figura do Índio9
; da
3
-Caboclinhos: São grupos de homens e mulheres, com cocares de penas de ema, pavão e avestruz. São caboclos
que evoluem nas ruas em duas filas, ao som dos estalidos secos das preacas - um objeto que reproduz o arco e a
flecha e que emite um estalido quando percutido. A manifestação dos caboclinhos é uma representação do povo
indígena e é, também, um dos mais antigos bailados populares do Brasil. Os caboclinhos preservam passos e
danças nativas que se somaram às influências européia e negra.
4
-A Chegança tem sua origem na reconquista espanhola na luta travada entre cristãos e mouros. É apresentada
sempre no ciclo natalino. Trata-se de um folguedo antigo, cuja ação transcorre em terra, onde está o quartel da
mourama, e no mar, por onde chega a cristandade. São muitos os cânticos de rua, incluindo a saudação e a
despedida, e os cânticos embarcados, por parte dos cristãos.
5
-Os Pastoris são danças e cantos que por ocasião das festas de Natal se realizam em homenagem ao Deus
Menino.Em geral se desenvolve; defronte de um Presépio ou em tablados, em praça pública. É um rancho alegre,
de meninas, mocinhas, que ano após ano, entoam ao Menino Jesus.
6
-Dança dramática presente em várias festividades, como o Natal e as festas juninas, o bumba-meu-boi tem
características diferentes e recebe inclusive denominações distintas de acordo com a localidade em que é
apresentado: no Piauí e no Maranhão, chama-se bumba-meu-boi; na Amazônia, boi-bumbá; em Santa Catarina,
boi-de-mamão; no Recife, é o boi-calemba e no Estado do Rio de Janeiro, folguedo-do-boi.
7
-Às vezes aparecem em um número de três: Rainha dos Guerreiros, Rainha dos Caboclos, Rainha da Nação.
Além de sua própria patente, elas coordenam as demais figuras.
8
-Responsável pela harmonia do Guerreiro, são os apaziguadores do grupo.
9
-Índio peri e seus dois vassalos: No Guerreiro substitui a Guerra dos Reisados, baseado na prisão, e, às vezes
morte de um guerreiro inimigo. Então, surge a guerra, que tem um bailado de grande beleza, onde os figurantes e
o Índio Peri digladiam-se.
20
comunidade fidalga aqui representada pela Lira10
e os Mateus11
, espécie de intermediário
entre o Guerreiro e o Rei. ANDRADE, (1959: 21) escreve:
Uma das manifestações mais características da música popular brasileira são
as nossas danças dramáticas (1)”. (...) Possuímos um grupo numeroso de
bailados, todos eles providos de maior ou menor entrecho dramático, textos,
músicas e danças próprias. E se me fatiga bastante, pela sua precariedade
contemporânea, afirmar que o povo brasileiro é formado das três correntes:
portuguesa, africana e ameríndia, sempre é comovente verificar que apenas
essas três bases étnicas o povo celebra secularmente em suas danças
dramáticas. (...) Aliás a verdade mais fundamental. A meu ver, é que nenhum
dos dramas cantados do nosso povo tem origem profana. “O drama popular é
de origem religiosa”, generaliza Heggert Krappe (1, p. 308), o que implica
aliás todo o teatro erudito. Porque se existe fenômeno típico de
desnivelamento dum gênero artístico, é o teatro folclórico. Ele nasce como
imposição de grupos dominantes que, na celebração, ensinam por meio do
mimetismo dramático a vida imperante dos espíritos, dos deuses. Assim, não
é a profanidade do heroísmo, da coragem, dos feitos históricos tradições e
costumes raciais que provocou a fundação das nossas danças dramáticas.
Todas são de fundo religioso. Ou melhor dizendo: o tema, o assunto de cada
bailado é conjuntamente profano religioso, nisso de representar ao mesmo
tempo um fator prático, imediatamente condicionado a uma transfiguração
religiosa.
Percebe-se que, as danças dramáticas brasileiras têm origem nas epopéias vividas
pelos povos que formaram a raça brasileira, a partir, das narradas conquistas ibero-
americanas, assim como, das conquistas dos europeus, em solos brasileiros e das guerras
travadas pelos Mouros12
e Cristãos ainda em terras distantes.
Uma vez miscigenada as raças, muitas danças foram sendo elaboradas à guisa dos
enredos que envolviam cada cultura regional. Se tiver origem profana ou religiosa, a ótica
aqui nesse momento não nos interessa, o que realmente vem à tona, é a capacidade do povo
brasileiro criar em cima de suas conjecturas de vida. Andrade, (1959: 22):
Gilberto Freyre lembra que o antagonismo racial, regional ou de classe, como
entre Cristãos e Mouros “se origina ou se alimenta é quase sempre de
antagonismos econômicos (...) mas foi pela mística religiosa que o movimento
de reconquista se definiu. Cristãos contra infiéis”. É o que se dá também, às
10
- Trazida pelo Rei dos Guerreiros, ela é ameaçada de morte pelo caboclinho a mando da Rainha, por estar com
ciúme do Rei.
11
- Às vezes aparecem em dois, eles são responsáveis pelo contrato do Guerreiro. Na dança eles cantam e
grosam.
12
- Os muçulmanos eram também designados como sarracenos (e também por mouros, embora este último
termo designasse mais corretamente os muçulmanos naturais do Magrebe que se encontravam na Península
Ibérica).
21
mais das vezes, com as criações artísticas populares. A realidade econômica,
o fator prático, é insuficiente pra criar a manifestação artística que vai se
tornar coletiva, porque as artes não aplicadas imediatamente, são de si
mesmas e pela sua função, misteriosas e inexplicáveis. E para a mentalidade
popular, que nisso coincide com a mentalidade primitiva, o mistério pode
explicar outro mistério ou qualquer realidade. É o que fazem as artes como as
religiões.Mas não sei que nunca uma realidade pudesse explicar
folclòricamente um mistério. De forma que uma razão econômica não seria
satisfatória pra justificar a existência duma manifestação artística. Explicar o
ódio ao Mouro e a Chegança de Mouros por questão de propriedade de terras
e riquezas a conquistar, é demasiado probante e simplista para o
complicadíssimo homem popular. E não explica de fato nada, porque não é
uma explicação permanente, estável, que sirva em qualquer ocasião.Não
explica principalmente o ódio, que permanece mesmo depois da vitória. A
explicação realista é clara e insolúvel por demais pra ser aplicada às mil e
uma cambiantes dos fenômenos da vida coletiva. Não tem mistério não tem
simbólica (2).
A partir do exposto acima, percebe-se claramente, que a origem das danças e bailados
brasileiros, que mais tarde foram tornando-se peças do nosso rico folclore, têm origem ainda
em terras do além mar. Na Europa ibero-asiática, onde os movimentos de lutas entre Mouros e
Cristãos se davam, à espreita de conquistas de terras e riquezas, se criaram-se determinados
hábitos e costumes que vieram aportar em nosso solo, por ocasião da descoberta do Brasil.
Na chegança tradicional do nordeste, os mouros, com suas roupas vermelhas, seus
armamentos, não cantam, salvo quando, depois de vencidos e batizados, repetem o coro dos
cristãos, como um pedido de clemência. A grande profusão de folguedos que hoje podemos
verificar em nossa cultura brasileira, se originou a partir dessas sagas. E o “Reisado”, que é
uma forma de expressão artística teatral, tem origem nessas lutas entre reinados euro-
asiáticos. Naqueles tempos, era comum um povo invadir os domínios de outros povos em
busca de riquezas e conquistas de espaços.
As danças dramáticas brasileiras, hoje denominadas folguedos, em sua maioria
carregam nitidamente em suas roupagens e cantorias, marcas que denotam a presença das
realezas européias e de outros povos, como os afros e os médio-asiáticos. Estes últimos, pela
sua penetração e conquista de parte da Europa, (Portugal) e península ibérica chegaram ao
Brasil através da colonização. Por essa razão, notam-se em algumas danças dramáticas,
aspectos que lembram fortemente os costumes e rituais daqueles povos. Já o folguedo
“Caboclinhos”, que é de origem estritamente brasileira, apresenta características da
coletividade indígena brasileira, entretanto. Sua ornamentação básica, é o uso de produtos
22
advindos da flora e da fauna brasileiras. Penas de animais multicoloridos, sementes, cores
extraídas das plantas dão à indumentária desse folguedo o toque de particularidade que lhe é
peculiar. Mais tarde foi tomando outra conotação profano-religiosa e se tornou um bailado de
louvação festiva carnavalesca. Assim também sua indumentária foi agregando produtos de
origem industrial ao seu enredo e vestimentas.
O “Guerreiro” que é referenciado neste trabalho, tem como origem a fusão
inicialmente destas duas correntes dançantes, numa nova forma de expressão artístico-
religiosa, tem algumas figuras do povo negro ocupando lugar, mesmo que de forma sutil, nas
diversas passagens. Na Figura 06 pode-se perceber o uso dos adornos e vestimentas do
Guerreiro.
Figura 06 - Guerreira em evolução.
Fonte: www.ufal.br/guerreiropornatureza/fotos3.htm
1.4.1 – A origem
Conforme estudos de THÉO BRANDÃO citado em TAVARES (1962: 99) o
Guerreiro surgiu em Alagoas no final da década de 20 do século XX, formado através da
fusão de outros folguedos: o Auto dos Cabocolinhos, o Reisado, a Chegança e dos Pastoris. É
um grupo de cantadores e dançadores acompanhado pela sanfona, tambor e pandeiros que se
apresentam com vestimentas coloridas geralmente nos festejos natalinos.
Incorporando o Reisado, algumas figuras dos Caboclinhos, outras da Chegança, umas
do Pastoril, inventaram cantos mais animados à base da improvisação, aparecendo então o
atual Guerreiro. O Folguedo possui diversas figuras, entre elas a Lira, a Rainha, a Sereia, o
Índio Peri, os Vassalos, a Borboleta, o General e os Embaixadores etc. O mestre é a principal
23
e a imprescindível. Tudo isto, porém, tira suas origens do Auto dos Congos cujos ramos são o
Reisado, o Bumba-meu-boi e a Chegança.
Uma das partes mais encantadoras é a Sereia, ninguém, talvez, possa explicar como
esta "figura" foi introduzida no Guerreiro. Será a Iemanjá dos negros Africanos? ou a Iara dos
Indígenas? O Guerreiro é hoje o auto popular de maior divulgação e de maior número de
figurantes. Seus trajes são mais ricos do que os do Reisado, chapéus enormes, onde se nota a
junção artística de um verdadeiro artesanato.
As roupas diferem de uns para outros grupos. Mesmo sendo o folguedo Guerreiro há
uma grande variação de modelos e figurinos. Os chapéus também diferem em estética, forma
e estrutura. Dá para se perceber, que não existe uma rigorosa padronização na confecção, e
padronização das indumentárias do Guerreiro. Tudo depende do poder aquisitivo de cada
agremiação e da localidade onde se estabelece. Porém, algumas figuras devem obedecer a
suas caracterizações. O número de figurantes também pode variar de Guerreiro para
Guerreiro.
Já o Reisado é uma das pantomimas folclóricas mais ricas e mais apreciadas,
principalmente no Nordeste. Faz parte do repertório das Festas Jesuínas, e é apresentado de 24
de dezembro a 6 de janeiro, isto é, pelo Natal, Ano Bom e Reis. O Reisado é formado por um
grupo de foliões, de pastores e pastoras que se reúnem numa espécie de rancho, com o fim de
visitar as casas das pessoas mais gradas e hospitaleiras da região, a cantar e a dançar. Esse
folguedo e mais outros deram origem ao atual Guerreiro. Para quem não tem conhecimento
mais profundo sobre essas folias, o Reisado pode ser confundido com o Guerreiro pela
indumentária. Todavia, os cantos, o enredo e a evolução são deferentes entre eles. Na página
seguinte pode-se ver dois componentes do Guerreiro. Um é oriundo do Reisado, o Mateus, é
aquele cujo traje é muito colorido calça comprida e frouxa, e jaquetão. Os personagens do
Guerreiro normalmente usam roupas mais sóbrias e de cores distintas. (Figura 07).
24
Figura 07 – Chapéus Típicos do Guerreiro
Fonte: www.aiegua.com.br/folclore.php
1.4.2 – Elementos que compõem o guerreiro
Para dissertar melhor sobre a composição do Guerreiro, foi-lhe atribuída por mim,
uma classificação para que o leitor tenha um melhor entendimento. Primeiro, quero salientar
que essa iniciativa não foi baseada em qualquer informação científica ou metodológica, e
segundo, que apenas dividi em três categorias básicas do ponto de vista estrutural. O
Guerreiro fica assim distribuído: elementos simbólicos, iconográficos e estéticos.
Os elementos simbólicos são os personagens que compõe o corpo dançante do
folguedo, tais como a Rainha, a Lira, o Índio, o Mateus etc. Cada um destes personagens, tem
uma história e sua simbologia dentro do enredo.
Os elementos iconográficos, estão representados pelas vestimentas, ornatos e chapéus.
Cada um também tem uma história e sua representação dentro do enredo e das crenças de
cada povo. E os elementos estéticos são representados pelas formas dos chapéus, das
vestimentas, dos adereços e das cores. Tudo tem origem e referenciação gnóstica13
.
13
Gnóstico (a) - Gnose é o substantivo do verbo gignósko, que significa conhecer. Gnose é conhecimento
superior, interno, espiritual, iniciático. No grego clássico e no grego popular, koiné, seu significado é semelhante
ao da palavra epistéme. Em filosofia, epistéme significa "conhecimento científico" em oposição a "opinião",
enquanto gnôsis significa conhecimento em oposição a "ignorância", chamada de ágnoia.
25
Os personagens do Guerreiro são em número maior que no Reisado. Todavia, cada
personagem tem sua função dentro do enredo do folguedo, inclusive com loas (versos) e
cantoria, diferenciando um pouco do outro. Na Figura 08 se ver um desfile de Guerreiro, e na
Figura 09 o de um Reisado respectivamente, dá para se perceber a ligeira diferença de trajes e
ornatos.
Figura 08 - Foto de Celso Brandão – Guerreiro em evolução
Fonte: www.ideario.org.br/expresculturais/guerreiro/guerreiro.htm
Figura 09 - Foto de Celso Brandão – Reisado em evolução
Fonte: www.ideario.org.br/expresculturais/guerreiro/guerreiro.htm
No anexo 01 destaco a título de informação as funções de cada personagem do
Reisado e do Guerreiro com suas semelhanças e diferenças. No Guerreiro as vestimentas
imitam os antigos trajes nobres da colônia, sendo adaptados ao gosto, e, sobretudo, à condição
26
econômica de cada grupo que em sua maioria são bem baixas. Os homens usam calção com
meiões até o joelho e, as mulheres saiotes e camisetas nas cores vermelha e azul
caracterizando os dois cordões, coletes verde e amarelo, mantos, tênis preto e meião branco,
fitas coloridas acetinadas, espelhos, contas de aljôfar, enfeites de árvore de natal, guarda-
peitos, espadas e espadins. Os chapéus dão o toque característico do folguedo. Já no Reisado
os trajes normalmente são iguais, variando apenas de modelos e cores. Nas cabeças são
usadas coroas por todos componentes.
No Guerreiro o mestre e os embaixadores trazem chapéus em forma de igrejas e
catedrais; o rei e a rainha usam coroas; o general com seu uniforme militar de brim branco
com dragonas, faixas e cinto, e quepe do antigo sistema militar, ou ainda chapéu de dois bicos
enfeitados de arminho; os índios usam calções sob a tanga de penas, cocar e braçadeiras e
perneiras de penas, camisa justa de meia, arco e flecha. Como dissemos acima, a diferença de
trajes, de enredo, de cantoria e evolução do Guerreiro para o Reisado, é substancial. No
Guerreiro existem mais cantos, mais entremeios, mais figurantes e a variedades de adornos de
cabeça é bem maior que no Reisado. A temática do enredo também é ligeiramente diferente.
Enquanto no reisado se fala mais sobre o nascimento do Menino Jesus, no Guerreiro a
temática abrange mais as conquistas de uns sobre outros. Nas Figuras 11 e 12 podemos notar
que são dois grupos de Guerreiros diferentes em evoluções.
Figura 10 – Apresentação de Guerreiro Figura 11 – Apresentação de Guerreiro
Fonte:www.amigobrasileiro.com/pt/maceio.php Fonte: www.ufal.br/guerreiropornatureza/vencedor.ht
27
1.4.3 - Reisado
Como foi possível ver visualmente o que existe é uma ligeira diferença do Guerreiro
para o Reisado, não obstante, o Guerreiro carrega em seu bojo grande influência daquele. A
maior parte da iconografia do Guerreiro é própria deste, entretanto a objetividade como dança
dramática, a música e a composição do grupo inspiraram-se no Reisado. ANDRADE
(1959:34):
A palavra Reisado deriva evidentemente de “Reis”, e foi uma masculinização
brasileira de palavra portuguesa mais logicamente criada. Em Portugal existe
o termo “Reisada”, como quem diz “rapaziada” e “patuscada”, coisas próprias
de rapazes ou patuscos (13). A reisada é especialmente minhota, e consiste ou
consistia primitivamente na representação dum auto sobre tablado, com pano
de chita ao fundo, por onde saem os atores Alberto Pimentel que na ! Triste
canção do Sul” dá Reisada como sinônimo de canção, já nas “Alegres
Canções do Norte” descreve com minúcia a representação duma Reisada na
aldeia de Friães (Minho) O auto se intitula !Representação de Herodes com u
(sic) Nascimento do Menino”, e tem como personagens Herodes, Bambalho,
Capitão Representante, Reinaldo, Conde Alberto, reis Balthazar, Belchior e
Gaspar, moços de Balthazar e Belchior,Preto, Fama Ligeira, Anjo, pastores
Alberto, Fileno e Albano, pastoras Belmira e Florinda, sábios Sadoc e
Haiquim, Juiz, Guarda-Bandeira, Simeão. Um pouco antes o Autor afirmara
que as Reisadas das várias aldeias minhotas que cita, são autos de Natal; e
leite de Vasconcelos criticando o livro repete que se trata duma “Reisada ou
auto popular de Natal”.
Pelo exposto acima, podemos concluir que o Reisado brasileiro é naturalmente
oriundo das Reisadas portuguesas, que eram espécies de teatros populares de tablado, onde se
narravam passagens bíblicas. Daí sua grande identificação religiosa, porém, com fortes sinais
da realeza, como é o caso da presença dos três reis Magos e seus servos. Ora, todos sabemos
que os Reis magos levaram diversos presentes ao Menino Jesus, e esses presentes eram ouro,
tecidos e fitas coloridas de muito brilho. Também sabemos, que naqueles tempos muitas
roupas eram tecidas com fios de ouro e prata, e que as paramentas dos reis, como os ornatos
de cabeça, cintos, escudos, etc. eram feitos de metais valiosos como ouro e prata, às vezes
revestidos de pedras preciosas. Deduz-se daí o porquê o Reisado brasileiro é rico em brilho e
cores em suas vestimentas. Mário de Andrade, continua discorrendo sobre o que é o Reisado,
ou Reinados para alguns; e que é praticado em Minas Gerais, Bahia e Sergipe. E sempre
enfatiza: “...dança dramática, apresentada em tablado, com algumas variações e inclusão de
negros caracterizando as congadas, que também são danças africanas com forte identificação
28
de cortejo”. Daí, se deduzir, que o Reisado brasileiro tomou outro rumo cultural sendo
transformado no que é hoje.
O Guerreiro por sua vez, por ter fortes traços hereditários daquele, carrega em sua
composição algumas lembranças do Reisado. Como vimos, o tema principal do Reisado é
sempre religioso, alusivo ao nascimento do Menino Jesus. Porém foi sendo misturado a outras
vertentes culturais e profanizou-se. O que importa salientar neste caso, é, que tanto a
indumentária, como a música e a evolução (Coreografia), estão assentadas em representações
teatrais e simbólicas de uma passagem bíblica, fato que foi o nascimento de Jesus. Daí, o forte
simbolismo presente. E baseado nisso, LIMA (1962: 97): (...”O Reisado Alagoano”, é uma
representação dramática, geralmente, curta e pobre de enredo, quase sempre acompanhada e
precedida de canto...”). Portanto, o Reisado que deu origem ao Guerreiro, se apresenta como
um folguedo mais pobre que o seu sucessor. No estado de Alagoas há uma predisposição do
povo pelo Guerreiro; todavia, existem muitos Reisados em atividade na região nordestina.
1.4.4 – Pastoril
Do pastoril, o Guerreiro herdou também fortes traços de simbologia. Senão vejamos:
O brincante, reproduz peças natalinas, defrontes a presépios ou em tablados armados com esta
finalidade, e é o mais popular e difundido folguedo de Natal no Folclore de Maceió.
É uma fragmentação do Presépio, sem os textos declamados e diálogos, constituído
apenas por jornadas soltas, canções e danças religiosas ou profanas, de variados estilos e
épocas, sem qualquer ordem ou seqüência lógica. Apenas a jornada inicial - ou Boa Noite - e
a final - ou Despedida -, obedecem esta ordem, sendo as demais, geralmente hozanas ao
nascimento de Jesus ou disputas entre os dois cordões, de livre criação do grupo.
Em geral, participam apenas moças, (pastorinhas), em número de doze, ou mais,
divididas em dois cordões, o azul e o encarnado, cores que ostentam nas vestes (faixas,
aventais, saias, blusas ou boleros). Os dois cordões, postados em fila no palco, um à esquerda
e outro à direita. No centro entre os dois cordões e à frente se posta a Diana, pastora que veste
metade de encarnado e metade de azul e não tem partido. O cordão encarnado é encabeçado
pela Mestra e o azul, pela Contra-Mestra.
29
O Pastoril é encenado em casas de família, colégios, teatros e em festas de ruas ou
praças, com acompanhamento de orquestra variada, desde violões e sanfonas, até conjuntos de
sopro e percussão. As pastorinhas cantam diversos trechos de músicas que são entremeadas de
improvisos quando elas se dirigem aos espectadores para tecer elogios e conquista de votos.
Quando o elogiado é sensibilizado normalmente oferece uma quantia em dinheiro que é
colocado em uma urna para o grupo ou afixado em suas vestes com alfinete, como forma de
agradecimento e voto. Os demais donativos doados em dinheiro vão para urnas previamente
colocadas em locais estratégicos. Após a apresentação, a arrecadação é dividida. Parte vai
para o grupo cobrir as despesas e parte vai para as dançarinas. A lira do Guerreiro é uma
figura saída do pastoril. E alguns cantos entremeiam estrofes advindas desse folguedo. A
indumentária do pastoril é rica e variada, porém, obedece sempre a divisão em dois cordões
azul e encarnado com uma Diana dividindo os dois. No artigo a seguir extraído da Internet
(2005), de autoria não identificada, extraí o seguinte texto:
É fato comprovado pela grande maioria dos estudiosos que se dedicam às
pesquisas em torno das manifestações culturais do povo brasileiro, a falta de
elementos profanos nas suas origens, principalmente, as nossas danças
dramáticas. Lembramos, por exemplo, Gilberto Freyre e Mário de Andrade,
quando são unânimes em afirmarem a origem religiosa das manifestações
artísticas populares, mesmo que tenham suas bases ou alimento em fatores
econômicos, mas se considerarmos o sentimento religioso como permanente e
solúvel, sua afirmação se dá pela mística religiosa, justificando-se através do
mistério qualquer variante de algum fenômeno vital. Site:
www.recife.pe.gov.br/especiais/brincantes/encarte8.html
Ainda destaco o conteúdo do texto seguinte, extraído do mesmo site (2005) onde o
autor não identificado referencia ANDRADE (1959: 23) da seguinte maneira: ”Outra
característica importante salientada pelo folclorista, é que, na maioria dos nossos folguedos
encontramos a morte e ressurreição da entidade principal ou como nos Pastoris e Cheganças, a
luta do bem contra o mal, caracterizando a noção de perigo e salvação".
Podemos perceber, neste caso, que sempre existem dois lados em confronto, o bem
contra o mal; os cristãos contra os mouros, a morte e a vida, e assim por diante, sempre dando
uma conotação de embate. No caso nordestino, vem desaguar na rivalidade entre os cordões
azul e encarnado. Entretanto, é claro, que nos Pastoris, originários da Península Ibérica, o
conceito de morte e ressurreição não aparece de forma contundente, mas há no chamado
Pastoril profano, a luta entre o cordão azul e o encarnado, revelando um confronto se
30
considerarmos o cordão encarnado como o mais audaz, atrevido, por assim dizer, do que as
pastoras do cordão azul. De qualquer forma foi a finalidade religiosa que deu a essas danças
dramáticas ou bailados, como diz ANDRADE (1959: 24 ) "Foi a finalidade religiosa que deu
aos bailados a sua origem primeira e interessada, a sua razão de ser psicológica e a sua
tradicionalização".
O Pastoril, mesmo em suas origens, nunca foi inteiramente popular, mas burguês, e,
sua justificativa se dá com os Presépios, pois, sistematicamente, os pastoris eram dançados em
frente da lapinha, representação estática do nascimento do menino Jesus. Normalmente só as
mocinhas de família, faziam parte dessa encenação.
Com poucas diferenças, os estudiosos afirmam que as comemorações do Natal, a festa
da Natividade, surgiram no início do século X. Conforme comprovam as pesquisas de
ANDRADE (1959: 344): "a idéia de comemorar o nascimento do Cristo, através de
representações dramáticas, foi do monge Tuotilo, morto em abril de 915, na Abadia de São
Galo, centro germânico onde nasceram, ou donde pelo menos se espalharam com maior
autoridade as Seqüências e os Tropos".
O Tropo consistia em intercalar textos novos e frases melódicas novas, em textos
religiosos oficiais da Igreja, cantados em gregoriano. Logo, tanto na França como na
Inglaterra, os tropos dialogados do natal se desenvolveram rapidamente, transformando-se em
núcleos do drama litúrgico medieval. Dividia-se em três partes principais: A anunciação do
nascimento do Cristo aos pastores; a adoração dos três reis magos; o massacre dos inocentes.
Os dois primeiros temas se conservaram vivos e se desenvolveram com rapidez por todo o
ocidente europeu e Portugal, através dos jesuítas, que assim repassaram para o Brasil Colônia.
ANDRADE destaca (1959: 352): “...apenas no período oitocentista o pastoril teve seu
brilho e apogeu”. Essa afirmação está relatada no livro Danças Dramáticas Brasileiras. É
curioso observar que essa dança dramática não teve uma repercussão nacional diferente dos
presépios que se tornaram tradição em todo o país, talvez, por ser um “fenômeno de
imposição burguesa”, como afirma ele. Porém, em Alagoas e Bahia este folguedo tem forte
penetração na sociedade, que participa ativamente de suas encenações, fornecendo a matéria
prima que as componentes.
31
Ao enveredar por outros caminhos, o Auto Pastoril transforma-se em sincretismo
profano-religioso, tornando-se, muitas vezes, mais profano, que religioso. Uma vez que, suas
características ressaltam a licenciosidade do Velho do Pastoril e a sensualidade das Pastoras.
No meio dos dois cordões, cada um comandado pela Mestra (cordão azul), e, Contra-mestra,
(cordão encarnado), vamos encontrar a Diana, vestida metade azul, metade encarnado como já
citado anteriormente. O Velho, conhecido como Bedegueba14
, mas que toma diversos
apelidos é uma espécie de bufão, de palhaço de circo, que comanda as jornadas (cantos das
pastoras) e se esparrama em piadas, numa atuação que ressalta o histrionismo, a
improvisação. (Figura 10).
Figura 10 – Bedegueba ou palhaço de pastoril
Fonte: Jaime Fotografia
Na Figura 11 pode-se ver o cordão vermelho de uma dessas entidades, em pleno
exercício de evolução. Veja que a indumentária difere sobremodo, da que apresentaremos
mais adiante quando veremos o cordão azul de outro pastoril.
14
-Bedegueba- espécie de Chefe, Patrão, conforme o dicionário Aurélio.referenciado página 194.
32
Figura 11 – Apresentação do cordão encarnado do pastoril Estrela Brilhante
Fonte: Banco de Imagem / JC
Dentre os outros personagens do pastoril profano, também desfilavam o Anjo a Estrela
do Norte, o Cruzeiro do Sul, a Cigana, além de outras figuras que aparecem ocasionalmente
por influência do local, da região. Hoje o pastoril perdeu em sentido hierático e lírico, mas
transformou-se num gênero popular de representação, diferenciado e que atingiu sua própria
forma. Não é questão de involução mas de interferência dos artistas populares que com os
seus espíritos inquietos e brincantes conduzem esses folguedos.
O cordão encarnado, pela própria razão de sua estrutura cromática, em que o vermelho
é mais vibrante, se revela na maioria dos pastoris, como sendo o cordão da força, da avidez.
Aquele que sai à luta e busca novos horizontes. Simboliza as invasões Mouras. É o cordão da
conquista, é ele que toma a iniciativa provocante do canto e desenrolar do folguedo. Por essa
razão, se conota nele a dita profanação. Já o azul, que é uma cromatização calmante e
passivadora, representa o cordão dos católicos, de melhor índole, segundo a religião cristã. O
pastoril é um auto que conta toda uma saga dos cristãos nos momentos que viveram sob a
perseguição de dominadores como Herodes por exemplo.
A comicidade, uma das características mais fortes dos espetáculos populares do
Nordeste, aos poucos também foi aparecendo no Pastoril. Com as pastoras divididas em dois
cordões, como dito anteriormente azul e encarnado; possibilitou a formação de partidos que se
batiam pelas cores de suas preferências e muitas vezes terminava em pancadaria. O leilão
também despertava entusiasmo e quando o pastoril saiu do amadorismo para um certo
33
profissionalismo, acentuou-se a sensualidade e sexualidade e era comum um pastoril terminar
com o rapto da Mestra, Contramestra ou da Diana. Na Figura 12 pode-se visualizar o cordão
azul de ouro do pastoril Vitória Régia, e, verificar-se que o conjunto traja outro tipo de
vestimenta diferente do anterior, entretanto com a mesma beleza estética.
Figura 12 – Cordão azul do Pastoril Vitória Régia em apresentação
Fonte: Banco de Imagem /JC
1.4.5 – Caboclinhos
Dos caboclinhos pode-se destacar a figura do índio Peri presente no Guerreiro que
caracteriza a luta dos índios contra a ocupação do espaço nativo. E, segundo LIMA, (1962:
155):
Caboclinhos existem ou existiram nos estados da Paraíba, Pernambuco, Rio
Grande do Norte, Alagoas, e Minas Gerais. Nesta última região, são
chamados Caboclinhos. Também dizem ”Os caboclos”, nome mais antigo,
pelo que me informaram, escreve Mário de Andrade em “Danças Dramáticas
do Brasil” O grupo se apresenta aos olhos dos folcloristas que o registraram e
estudaram como o de um folguedo popular de inspiração indígena. Com
figurado característico, partes faladas ou representadas, os caboclinhos se
exibem pelas ruas das cidades, nas festas religiosas ou durante o carnaval.
34
São grupos de homens e mulheres, com cocares de penas de ema, pavão e avestruz.
São caboclos que evoluem nas ruas em duas filas, ao som dos estalidos secos das preacas - um
objeto que reproduz o arco e a flecha e que emite um estalido quando percutido.
A manifestação dos caboclinhos é uma representação do povo indígena e é, também,
um dos mais antigos folguedos populares do Brasil. Os caboclinhos preservam passos e
danças nativas que se somaram às influências européias e negras.
Os personagens dos caboclinhos são vários e estão dispostos, a título de informação no
anexo I deste trabalho junto com os dos outros folguedos. A orquestra é formada pela inúbia15
(gaita de taquara), os caracaxás16
, o tarol17
e o surdo18
, além das dezenas de preacas que
estalam num ritmo frenético. Os caboclinhos tomam várias estruturações dos grupos, variando
muito de uma localidade para outra, inclusive na vestimenta. LIMA (1962: 155) diz: “ ...De
acordo com pesquisa, ainda inéditas, de Guerra Peixe, os Caboclinhos de Recife, Pernambuco,
possuem nos seus diversos grupos ou tribos uma organização mais ou menos semelhantes...”
Ora, o que o autor quer dizer, é que esse folguedo varia de lugar para lugar, na indumentária,
na evolução, no canto e no atos; entretanto, no Caboclinhos de Alagoas, que veio a ceder parte
da origem do Guerreiro a característica lhe é própria. Senão, vejamos o que diz LIMA (1962:
157):
Em Alagoas, segundo Theo Brandão, o folguedo é “estruturalmente um
Reisado”. “O próprio traje da maioria dos personagens, bem como a
denominação de grande número destes, é o mesmo do Reisado, com
acréscimos naturais, em virtude do seu grande número de partes”. Entretanto,
o mesmo autor afirma que há Caboclinhos que obedecem “ao estilo
convencional de índio”, mencionando os Índios de Ouro, que apareceram em
Maceió no ano de 1941.
Como vimos, a variedade de formas do folguedo é grande, porém a que originou o
Guerreiro, é a de Alagoas. Na Figura 13 é possível ver uma organização de caboclinhos
desfilando. Não tecerei maiores comentários a respeito dos Caboclinhos por entender que sua
contribuição no Guerreiro restringe-se à figura do índio Peri que no enredo do Guerreiro é o
contraponto ao Rei e sua invasão e dominação das terras indígenas brasileiras. Não que o
assunto seja de pouca relevância, mas por entender que sua alegoria restringe-se à figura do
índio, no conjunto não acrescenta muito ao meu trabalho. Entretanto, entendi que devia
15
- Inúbia é uma trombeta de guerra estridente usada pelos índios.
16
-Também conhecido como reco-reco, regue-regue, o caracaxá é feito com um pedaço de bambu ou taquara
com talhos transversais. A execução é feita passando, sobre os talhos, uma vareta de madeira ou de ferro.
17
-Tarol espécie de caixa, semelhante às usadas em bandas marciais.
18
- Espécie de bumbo ou tambor, semelhante aos usados em bandas de música.
35
reservar um espaço para esta figura, pois fala da nossa gente, da nossa cultura, do nosso povo.
E realizei um painel exclusivamente a este personagem em forma de cocar.
Os caboclinhos ainda existem na região nordestina, como na cidade do Recife, onde
tem forte aceitação pela população, todavia, sua caracterização hoje, está mais para bloco
carnavalesco que para folguedo natalino ou junino. A manifestação dos caboclinhos é uma
representação do povo indígena e é, também, um dos mais antigos bailados populares do
Brasil. Os caboclinhos preservam passos e danças nativas que se somaram às influências
européias e negras. Segundo o contido no site caboclinhos (2005), os mais antigos
caboclinhos de Pernambuco são as tribos Canidés (1897), Carijós (1897), Taperaguases
(1916), Caboclos Tupy (1933), Tabajaras (1956) e Tapirapés (1957).
Figura 13 – Caboclinhos do recife em desfile
Fonte: photos © O Globo / © JB / © A Tarde / or current holder
Também existem as tribos, que são agremiações carnavalescas que além dos
caboclinhos, é outro folguedo evocando personagens indígenas que também enriquecem a
beleza do carnaval de Pernambuco. Suas fantasias são muito influenciadas pelo imaginário do
cinema americano: um exemplo são as índias com machadinhas e índios com pequenas
lanças, todos vestidos com calças ou saias num estilo vagamente faroeste. Acompanhados por
gaitas, ganzás e surdos, as tribos evoluem com os rostos pintados de vermelho. As mais
conhecidas de Pernambuco são Paranaguases (1953), Tupy-Guarany (1956), Tupy Papo
Amarelo (1962) e Tapajós (1985).
36
1.4.6 – Chegança
Quanto à chegança, sua contribuição para o Guerreiro é de grande importância, porque
fala de conquistas. A Chegança, segundo ANDRADE (1962: 118), constitui junto com o
Fandango, o que poderia ser melhor e mais belo dos trabalhos do mar Português. Já para
outros pesquisadores e estudiosos da cultura brasileira, a Chegança tem sua origem aqui
mesmo no Brasil. Um Exemplo é o que LIMA expõe (1962: 196):
É possível que o primeiro registro da Chegança, que alguns autores designam
pelo nome de “Chegança de Mouros”, seja o de Henry Koster. Na obra
”Viagem ao Nordeste do Brasil”, descreve um folguedo realizado dentro do
mar e nas praias da ilha de Itamaracá, em 1814, no qual houve lutas entre
mouros e cristãos, que terminou com a vitória destes e o batismo do rei
mouro. Nesse registro, encontramos alguns elementos essenciais da folgança
ou Chegança de Mouros referida, depois, por Silvio Romero, Pereira da Costa
e Gustavo Barroso.
O que é possível perceber depois deste destaque, é que a Chegança é um folguedo
cujas raízes podem até vir de outras partes do mundo, porém, sua sedimentação histórica está
no nordeste brasileiro, onde até o momento é praticada com grande ênfase. Existem variações
de canto, coreografia e de indumentária, mas o cerne da composição é sempre o mesmo.
Relata as conquistas e reconquistas de ambas as partes entre Mouros e Cristãos.
A Chegança surgiu, segundo afirma LIMA (1962: 197): que conforme “...Um
informante de Antonio Osmar Gomes, de Vilanova e redondezas, no Estado de Sergipe, vem
em comemoração às vitórias de Carlos Magno sobre os mouros, quando andava procurando
converter os infiéis à lei cristã, batizando-os”.
Na chegança, que varia em indumentária canto e evolução, de um lugar para outro,
podemos verificam-se algumas variações no conjunto dos componentes, entretanto sua
estruturação básica é a mesma. LIMA (1962: 197):
Seus figurantes são marinheiros ou marujos e oficiais da Marinha e como tais
se apresentam vestidos. Em Vilanova, compreendiam: primeiro-tenente,
segundo-tenente, tenente-ajudante, capitão-tenente, capitão-piloto, capitão-
patrão, general-mar-guerra, Padre, Doutor-cirurgião, dois Guardas-marinha,
dois Gajeiros, dois calafatinhos, um Cozinheiro, quatro caixas, vinte
marinheiros e dois mouros. Em Piassabuçu, na margem alagoana do Rio São
Francisco, segundo ainda Antonio Osmar Gomes, apareciam três mouros e
um Sargento-de-mar-e-guerra e não se registrava a presença dos calafatinhos
e dos caixas. Em Maceió, observamos também o almirante, Contra-almirante,
37
dois mouros, o rei, ou general e o príncipe, ambos com manto vermelho,
coroa de lata, enfeitada com purpurina, cabelos longos feitos de corda
desfiada e espadas nas mãos.
Na versão de Vilanova, em Sergipe como diz LIMA, (1962: 197): “...o folguedo
começa com um convite às pessoas para virem ver a ‘nau tirana’, que vai para alto mar, a fim
de lutar por Deus e libertar a Terra Santa“. Percebe-se aqui que a influência desse folguedo no
Guerreiro é que realmente lhe assegura o nome que usa. E a presença do General, assim como
do rei, rainha e demais figuras da realeza que aparecem no Guerreiro, são advindas das
culturas, do Reisado e da Chegança.
Os personagens da Chegança usam trajes semelhantes aos das Marinhas de todo o
mundo, como também alguns postos. Conforme já foi citado por LIMA (1962: 197) tendo
cada um deles uma participação especial no drama e suas participações são chamadas de
entremeios.
Quatro ou seis pandeiros acompanham a coreografia que é seguida por coro de vozes.
O General, comandante das evoluções, usa um apito para a mudança das marchas. O pandeiro
é o principal instrumento de acompanhamento. A batida forte e ritmada dá o tom dos cantos e
evoluções.
A apresentação completa da Chegança demora, geralmente, 60 minutos, e é bastante
teatral, composta basicamente por duas partes: o cortejo – o deslocamento do grupo para o
local da apresentação, e, a parte dramática, compostas por diversas encenações.
A Chegança tem sua inspiração na reconquista espanhola dos embates travados entre
Cristãos e Mouros. Trata-se de um folguedo antigo, cuja ação transcorre em terra, onde está o
quartel da mourama19
, e no mar, por onde chega a cristandade. É apresentada sempre no ciclo
natalino. São muitos os cânticos de rua, incluindo a saudação e a despedida, e os cânticos
embarcados, por parte dos cristãos.
As indumentárias desse folguedo, variam do esfuziante colorido das camisas (Figura
14), em alguns lugares, ao rigor dos uniformes de marinheiro. Em alguns lugares são
dançados o fandango e a marujada, que têm grande semelhança no vestir, porém com origem
e enredos diferentes.
Os mouros, com suas roupas vermelhas, seus armamentos, não cantam, salvo quando,
depois de vencidos e batizados, repetem o coro dos cristãos, como um pedido de clemência.
19
- Mourama – Derivativa de mouros, lugar onde se estabelecia uma cidadela de mouros.
38
Figura 14 – Exemplo de vestimenta de chegança
Fonte: www.ivanpaixao.com.br/sergipe_folclore.asp
O modo de trajar das cheganças é variado; entretanto, o básico usado no estado de
Alagoas é o uniforme de marinheiro com as cores, azul e branco bem definidas, que conforme
LIMA, (1962: 197): “Figurantes - São marinheiros ou marujos e oficiais da Marinha e como
tais se apresentam vestidos”. Nas Figuras 14 e 15, observa-se que existem diferenças nos
uniformes, porém segue sempre a mesma padronização.
Figura 15 – Apresentação de uma chegança
Fonte: www.recife.pe.gov.br/especiais/brincantes/encarte8.html
Como exemplo de avivamento das culturas nordestinas e principalmente da alagoana,
destaco como referência, um trecho do Trabalho de Conclusão do Curso de Jornalismo da
UFAL, dos formandos: Maikel Ranyeri Marques de Melo e Patrícia Yara Santos Silva, na
parte da justificava se sua monografia, em que fala do Guerreiro e sua fundadora:
39
O resgate de uma manifestação folclórica por meio do mais novo veículo
contemporâneo de comunicação, a Internet, que o presente trabalho pretende
realizar, destacando-se a importância de uma mulher que esteve por muito
tempo à frente de um folguedo popular genuinamente nosso, o Guerreiro,
importa para a valorização da cultura popular alagoana, raiz e fonte de arte e
sabedoria das classes subalternas. Já que para as camadas populares, a
comunicação formal não cumpre a função de divertir, educar, informar e
refletir, estes papéis são transferidos para o campo dos folguedos, em especial
o Guerreiro, principal objeto de estudo deste trabalho. Assim, fica claro que
esse tipo de manifestação folclórica, ao promover o resgate dos costumes de
um povo, também desenvolve o papel de refletir o querer, o saber e o sonhar
do grupo que o preserva, se transformando num instrumento de intercâmbio
das vivências e tradições da cultura de Alagoas. Situando-se no campo da
folkcomunicação e trabalhando com temas como a riqueza regional e o seu
resgate universal, o folclore e sua valorização, o sistema econômico do
engenho e sua influência nos costumes do povo nordestino, a pesquisa
realizada pretende discutir a troca de idéias, opiniões e informações por meio
das manifestações típicas da cultura popular. No Departamento de
Comunicação Social da Ufal faltam trabalhos que se situem no campo da
folkcomunicação, bem como pesquisas mais delimitadas que ofereçam um
maior conhecimento da cultura popular alagoana. Entretanto, essa carência
cultural não só se restringe ao meio acadêmico. Na interconexão mundial de
computadores, a chamada Internet, ou seja, no infinito universo que ela
abriga, quase que inexistem trabalhos dessa natureza. É daí que se reforça a
importância da pesquisa realizada, pois é necessário que o mundo conheça,
através do ciberespaço , pelo menos uma fatia da imensa riqueza cultural do
povo alagoano, aqui representada por uma autêntica manifestação folclórica
que tanto contribuiu para a manutenção das tradições populares: o Guerreiro
de Dona Joana Gajuru. http://www.chla.ufal.br/multireferencial/gajuru
Embora não concorde que estejam fazendo resgate algum, já que a manifestação cultural ainda
existe por si só, achei interessante citar este trecho do trabalho dos acadêmicos acima
referenciados, por entender que é de suma importância que jovens se preocupem com a
memória cultural, seja de que estirpe for. No caso acima, são formandos em jornalismo, mas
poderiam ser de qualquer outra área de informação e cultura. O importante é que não se deixe
morrer a memória dos costumes, danças e rituais de um povo. Um país que se preza, zela pela
sua história cultural.
40
CAPITULO II
PROCESSO DE CRIAÇÃO COM MADEIRA RECORTADA
METODOLOGIA
Na elaboração dos painéis, desde o momento de pensar que matéria seria utilizada até
a experimentação de um determinado material, me vi envolvido em dúvidas a respeito do que
deveria utilizar. Qual o mais adequado, o mais econômico e, o mais ecologicamente correto.
Fiz uma experiência com compensado e não gostei do resultado. O compensado,
definitivamente não é o material mais indicado para o exercício da Marchetaria. Pude
observar que em espessura inferior a dez milímetros, ele não se adaptou às reais necessidades
dos painéis. Em dois exemplares que utilizei tal material, eles se deformaram, o que me levou,
a revesti-los com molduras externas, interferindo de alguma forma na moldura de Marchetaria
por mim confeccionada.
Por orientação da pré-banca, fui aconselhado a retirar alguns detalhes que estavam
incomodando à observação dos trabalhos. Mas, para não deixar as laterais à vista, fui
orientado a reformular o adorno lateral do suporte de outra maneira, de tal forma que, não
interferissem na estética dos painéis. Como já havia feito esses dois exemplares naquele
material, a banca me concedeu a permanência das molduras, entretanto, exigiu a retirada dos
inconvenientes.
Entendi aí, que é de suma importância haver uma intimidade entre o artista e o
material com qual vai trabalhar. É uma espécie de simbiose. Um estar para outro na mesma
razão e proporção de suas qualidades. E revendo este fato lembrei-me de uma citação de
OSTROWER, (1990: 22): “Quem não vivenciar a sensualidade da matéria com que trabalha,
como profunda verdade existencial, e como compromisso irredutível com o próprio ser, não
há de se tornar artista”. É bem verdade, a qualidade da matéria com que se trabalha é de suma
importância, e isso às vezes nada tem a ver com preços. É mais uma questão de identidade
entre as partes.
41
Foi a partir de determinadas observações que cheguei à conclusão de que para se
chegar a objetivos proveitosos no campo das artes, necessário é, que sejamos obstinados e
coerentes com o que nos propomos a realizar. E ainda mais uma vez, refleti sobre uma citação
de OSTROWER (1990: 52): “O mundo de nossa sensibilidade é um mundo de diálogos com
as formas de matérias, físicas ou psíquicas”. Ser artis ‘ta é antes de tudo ter consciência de
suas limitações e suas potencialidades. FRAZÃO (2005) diz: “Artista é antes de tudo um ser
com vocação religiosa. Existem sim muitas mitologias mas antes existe o poder de vir a ser
descoberto pela mídia para tornar-se um ser mítico - é desta forma que se separa o joio do
trigo. O artista não esta interessado em aparecer antes do seu trabalho”. Mas também observei
Matisse na citação feita em SILVA (2005): “O que eu busco, acima de tudo, é expressão... A
expressão, no meu modo de pensar, não consiste na paixão espelhada num rosto humano ou
denunciada por um gesto violento. Toda a disposição de minha pintura é expressiva.”
1 – MARCHETARIA
O meu trabalho foi pensado de forma que pudesse realizá-lo em marchetaria,
utilizando os recursos disponíveis no momento. Parti da premissa, de que não dispondo de
uma gama maior de materiais e ferramentas mais elaboradas, que pudesse realizar
satisfatoriamente o que me propus a fazer. E para isso, inicialmente procurei verificar no
comércio de Campo Grande, MS., o que encontraria de lâminas e de ferramentas. E foi
pensando como deveria resolver as deficiências encontradas que cheguei a uma conclusão:
buscar recursos técnicos e materiais fora da cidade. A partir disso procurei pela Internet
empresas que fornecessem o material necessário. Por questões econômicas, não consegui tudo
que pretendia, algumas empresas só vendem por atacado. Fortuitamente, descobri um ateliê
que vende lâminas de cores e texturas diferenciadas em pedaços de 0,30 m X 0,30 m,
condição necessária ao acomodamento da embalagem para transporte.
Dessa forma, o custo unitário saiu um pouco alto o que me limitou a adquirir apenas
algumas variedades. De posse do material para mão-de-obra e de algumas ferramentas
manuais como estiletes, tesouras e mini-formões, comecei a planejar na mente o que deveria
levar a efeito na prática. Depois do processo idealístico, partí para a combinação de materiais.
Fiz inúmeras combinações visuais entre as lâminas, obedecendo à disponibilidade do material.
E o resultado mais adequado que pude atingir é o que ora é apresentado. Certamente outras
42
infinitas combinações poderiam ser feitas, mas para mim o que ora apresento foi o que melhor
se ajustou às condições e materiais disponíveis
O que pensei em termos de formas do que iria reproduzir, não saiu exatamente de
minha imaginação, pois queria fazer um trabalho que se baseasse em algo já existente, e que
não destoasse muito do meu propósito que era fazer uma releitura do chapéu do Guerreiro em
uma linguagem diferente da que ele se apresenta naturalmente. Para essa nova releitura,
escolhi a Marchetaria. Parecia-me mais fácil. Mas não foi. Isto, pela limitação de variedade
de materiais e cores. O que limitou sobremodo muitas alternativas. Reproduzir imagens no
bidimensional usando a linguagem visual da marchetaria, não a mesma coisa que usar tinta,
pastel ou crayon.
Experimentei alguns modelos antes de iniciar o trabalho definitivo e constatei que
cada lâmina de madeira apresenta características próprias tais como: dureza, sentido das
fibras, consistência, cor, reação à cobertura com seladora, disposição das fibras reação aos
recortes etc. Foi a partir esse primeiro experimento, que tracei os primeiros rumos a serem
seguidos.
Numa primeira etapa, procurei fotos na Internet sobre os diversos chapéus do
Guerreiro e procurei identificar aqueles que melhor se encaixavam nas minhas pretensões. A
seguir selecionei aqueles que achei mais adequado às minhas condições de realizar o trabalho
e à disponibilidade do material. Por isso, procurei analisar cautelosamente cada chapéu dos
que pude ter acesso, e, estudei cuidadosamente suas formas e dificuldades de reprodução.
Uma vez resolvida essa primeira etapa, passei para a execução do primeiro exemplar.
Conforme relatei no início, verifiquei que o compensado não era a melhor solução. Foi
aí que comecei a descobrir alguns segredos da Marchetaria. A cada pedaço de lâmina cortado
e colado, eu ia adquirindo experiência na lida com a arte milenar. E pude entender o que diz
MOTTA20
(2005): “Para se trabalhar em marchetaria é necessário se conciliar: amor,
paciência e exclusividade.” E foi fazendo esse trabalho que constatei ser verdade a máxima
acima citada.
Inicialmente pensei em fazer fotografias de um único modelo de chapéu em oito
posições diferentes, e depois reproduzi-las na marchetaria. Mas, logo percebi que não
atenderia ao meu propósito. Quero mostrar um pouco da história do Guerreiro, com algumas
de suas peculiaridades. Foi aí que decidi realizar oito modelos diferentes de chapéus, sendo
20
- Mauricio Mota é artista especializado em Marchetaria e tem o site disposto nas referencias bibliográficas.
43
quatro em formas de templos cristãos representado o sagrado e quatro de formas diferentes
representando o profano.
E isto se impõe pelo fato de que o Guerreiro é um folguedo sacro-profano.
(Inicialmente não tinha a intencionalidade de ser profano como é afirmado por ANDRADE
1959: 21,22) “Assim, não é a profanidade do heroísmo, da coragem, dos feitos históricos,
tradições e costumes raciais que provocou a fundação das nossas danças dramáticas” Mas, ao
se mesclar com outras danças dramáticas como o Pastoril, a Chegança e os Caboclinhos,
ganhou sua dose de profanação. Por isso, defini que quatro dos chapéus representariam o
mundo sacro, e quatro retratariam o profano. Os chapéus característicos do Guerreiro, são os
que trazem miniaturas de capelas, igrejas ou catedrais. Todavia, outros tantos fazem parte de
outras vertentes como, o Índio, a Lira, o Mateus o Embaixador etc. Sobre cada um desses
elementos falarei na parte que narra cada quadro mais especificamente.
Deveria a partir dessa nova concepção idealística do que seria realizado, compor cada
painel de acordo com o que foi previamente pensado. Escolhi quatro formas diferentes de
retratar as imagens de templos e quatro tipos diferentes que não simbolizam o religioso e sim
o profano.
Quanto às formas, não as criei, procurei abstrair das fotos de chapéus capturados da
Internet. Entretanto, dei a cada trabalho minha identificação pessoal. Não fiz cópia e sim uma
mimese daquilo que serviu como referência visual dentro da linguagem adotada. No tocante
às cores, procurei contrastar de modo que o objeto de apreciação ficasse o mais definido
possível no contexto visual. Mas também brinquei com inserção de linhas num mesmo
panorama visual, demonstrando ser possível se divisionar uma imagem num mesmo suporte
cromático, usando apenas as linhas para separação do objeto do fundo. Os elementos do
desenho estão presentes em todos os quadros. Alguns fundamentos também podem ser
percebidos em FONTOURA (1982: 8):
É evidente que o aspecto do objeto não se determina apenas pela imagem que
impressiona o olho, nem tão pouco, pelos seus limites, mas este estudo
deteve-se sumariamente à forma em si, uma visão geométrica a partir das
denominadas ‘formas fundamentais’: o circulo, o triangulo e o quadrado.
A minha intenção, é demonstrar que os meus modelos estão num espaço etérico sem
qualquer base de sustentação, em plena leveza cósmica. Determinando dessa maneira não se
tratar de uma simples imitação arquitetônica. Isso porque não quero deixar parecer apenas
uma reprodução mimética do real-imaginário que é o chapéu do Guerreiro. A minha produção
44
pretende ser o que é, ou seja, é fruto de uma imaginação, não é o real. Procurei observar o que
diz FOUTOURA (1982: 11):
Levando-se em conta os ensinamentos da Gestalt, um objeto é uma forma na
medida em que este objeto é percebido. A percepção da forma destaca sempre
uma figura do fundo, que por outro lado, mantém uma relação de
interdependência. Perceber esta relação de figura e fundo é fundamental no
âmbito da composição e da criação artística, além de fornecer elementos para
melhor leitura dos objetos. A figura está sobre o fundo e depende do fundo
sobre a qual está localizada. Este, serve como uma estrutura ou suporte em
que a figura está colocada, por conseguinte, determina a figura. A diferença
de articulação entre figura e fundo é universal. Portanto, não só se apresenta
em relação a suas configurações como também em relação a suas cores”. O
mesmo campo cromático se parece mais colorido quando é figura do que
quando é fundo.
Ao ler minhas imagens o observador poderá constatar alguns princípios fundamentais
conforme os relatados acima, além dos fundamentos básicos do desenho, como: a perspectiva,
a luz, a sombra, a cor etc. Porém, procurei imprimir em alguns trabalhos princípios de
desenho artístico como o escorso, a deformação, o contraste etc. A dimensionalidade dos
painéis, obedeceu ao princípio do retângulo áureo como foi dito em capitulo anterior,
entretanto, não foi seguido o rigor da perfeição do referido retângulo por questões de
economia.
Os painéis se apresentam nas seguintes dimensões: os dois primeiros que foram
realizados no compensado de 6 mm, têm as medidas: 0,60m X 0,50m com as molduras, e os
demais, feitos em MDF, ficaram com as medidas: 0,61 X 0,50m sem molduras.
Procurei dimensionar as partes de maneira que o todo apresentasse uma visualização
conjunta intercalando-se o fundo com o objeto descrito ou delimitado nesse espaço. Todos os
cortes efetuados nas diversas tiras que compõem o trabalho, não obedeceram a qualquer
forma previamente elaborada, mas, à disposição que a madeira ia se apresentando no que
tange à dificuldade de lidar com ela. Num primeiro momento, ia sendo imaginada uma forma,
mas, à medida que iam sendo recortadas as tiras de madeira, se fazia necessários ajustes e
recortes que de certa maneira mudava aquilo que previamente se concebeu na minha mente. E
isso é o mais importante para mim neste trabalho, pois não obedeci a cânones
preestabelecidos, e, sim, à minha intuição e capacidade contornar problemas. Como diz
FONTOURA, (1982: 17):
O corte é um elemento fundamental neste estudo, pois é a causa para a
obtenção das partes. Duas ou mais partes é um problema de seleção, porque o
Almeida; mário duarte de   releitura de imagens do guerreiro em marchetaria
Almeida; mário duarte de   releitura de imagens do guerreiro em marchetaria
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Almeida; mário duarte de releitura de imagens do guerreiro em marchetaria

  • 1. INTRODUÇÃO Este trabalho tem como objetivo precípuo, obedecendo a uma formatação acadêmica mostrar, de maneira sistemática, o resultado da pesquisa teórica, assim como o prático, do estudo de tradições da cultura brasileira, destacando o folclore nordestino Guerreiro e reproduzir um fragmento desse brincante que é o chapéu, através da linguagem visual da Marchetaria. Não tem a pretensão de tornar-se um corolário sobre a temática, nem tampouco se tornar um manual de orientação à execução da linguagem apresentada, a marchetaria; mas tão somente, uma síntese de ambos assuntos. Procurei dar formatação sucinta ao conteúdo, uma vez que seu estudo demandaria muitas e muitas páginas, para não confundir o leitor. Não pretendo me aprofundar na composição física das cores, como veículo de expressão visual em si, ou como instrumento de comunicação estética, ou seja, da cor propriamente dita. Apesar de não utilizar cores à base de luz, ou pigmentos – usando apenas as cores naturais da madeira que sofrem algumas interferências da mão humana ou da industrialização; desejei produzir uma leitura visual no plano bidimensional a partir de abstrações feitas em fotografias dos objetos em tridimensionalidade. Procurei realizar um trabalho que proporcionasse uma agradável visualização e uma fácil interpretação dos objetos reproduzidos. Utilizando apenas as cores e texturas naturais das lâminas de madeira, dei aos trabalhos ares de movimento e flutuabilidade, para imprimir ao observador um devaneio visual. Demonstrar na prática, essa forma de linguagem visual, utilizada há milhares de anos, a marchetaria, foi para mim um desafio. Primeiro, por não ter maiores conhecimentos acerca do assunto, e segundo, por utilizar apenas ferramentas manuais em noventa por cento dos trabalhos. Ferramentas simples, como estiletes e mini-formões. Além, de uma reduzida quantidade de matéria-prima, devido à falta de oferta em nossa região.
  • 2. 2 É bem verdade que a variedade de cores das madeiras utilizadas possa haver sofrido algum tipo de interferência da mão humana quando da industrialização da mesma, todavia, isso não descaracteriza sua naturalidade. Para mim, o resultado final, se apresentou rico em detalhes e contrastes tonais, agradáveis à apreciação visual. E isso, só obtive graças a uma combinação prévia do material disponível e, uma certa variedade de espécies de madeira, cujas constituições orgânicas oferecem desde cores e texturas diferenciadas, à disposição de fibras e desenhos nas lâminas. Tais madeiras, são extraídas da natureza, obedecendo algumas normas técnicas de escolha, corte e segmentação. Para realizar este trabalho, tomei como referência temática já citada acima, o chapéu do Guerreiro; e, procurei trabalhar na Marchetaria a composição de painéis, observando os princípios estéticos de formas, cores e texturas dos originais. Os resultados ora apresentados, sintetizam sobremaneira, minha abnegação em realizar este trabalho. O estudo da composição visual obedeceu a alguns princípios técnicos e à quantidade dos matizes cromáticos disponíveis. É de bom alvitre salientar que, em razão das dificuldades na aquisição de uma maior variedades de cores, texturas e espécies de lâminas, tive de reorganizar meu trabalho pensando na reduzida quantidade desse material. É claro, que com uma maior diversidade de materiais e ferramentas, poder-si-a alcançar melhores performances. Entretanto, acredito haver atingido meu objetivo, ao realizar artesanalmente todo o processo produtivo. Somente em torno de dez por cento deste, foi utilizado maquinário. Entendo haver cumprido o desafio, e justificada a temática escolhida, pela apresentação das obras. O objetivo deste trabalho é mostrar um fragmento do que é a cultura nordestina através do folguedo Guerreiro. E isto se comprova agora com sua finalização e apresentação pública. Fiz esta opção com a clara intenção de falar da cultura de maneira não muito abrangente, e sim, apenas mostrar um fragmento dela, em linguagem visual da marchetaria. Foi uma missão quase impossível, pois o assunto da temática é extenso e controverso. Existem várias correntes de pesquisadores e estudiosos do assunto, o que deixa pairar dúvidas quanto à origem, formação dos folguedos e divulgadores. Mas não posso prescindir das informações básicas necessárias, para que o leitor entenda minha proposta. Procurei ser o mais equânime possível no que tange aos comentários a respeito da temática e da linguagem.
  • 3. 3 Ao fazer este trabalho pensei em avivar a memória de um folguedo que sempre marcou minha infância. E, é para mim muito gratificante, porque me renova as esperanças de ver reflorir na sociedade brasileira a cultuação às brincadeiras infantis, religiosas e de roda, visto que isso faz parte da formação moral e cívica de um povo. Recentemente vi nos telejornais que em São Paulo as professoras estão resgatando esses princípios fundamentais na formação cultural das crianças. Ao resolver falar desse tema, entendi que de alguma maneira estou contribuindo para o retorno de tais brincadeiras à baila do cotidiano das escolas. Sei que este trabalho não ficará arquivado apenas nas prateleiras de alguma seção da universidade, mas possivelmente será divulgado por alguém que entenda o que é cultura e saiba o seu valor na formação de um povo, de um país e de uma nação. Uma rica cultura como é a nordestina, e mais particularmente a alagoana, precisa ser conhecida por outros rincões deste imenso território brasileiro. É apenas uma sementinha que estou plantando das muitas que pretendo semear de agora em diante, me tornando um divulgador da cultura nordestina por onde quer que venha estar. Falar de uma dança, folguedo ou brincadeira nordestina me transporta no tempo, já que no momento não posso estar no espaço, aos meus idos de criança. Só isso para mim, já justifica a proposta de meu trabalho. Todavia, quando se torna um documento acadêmico de maior consistência histórica, mais justificada está em relação à propositura acadêmica do curso. Falo do Guerreiro como temática, - centrado no adorno de cabeça -, mas também discorro sobre outros que lhe deram origem. Falo da Marchetaria como arte milenar, mas também cito alguns trechos de movimentos artísticos e suas particularidades. Cito diversos artistas e escritores que sem suas referências bibliográficas e obras, talvez não houvesse chegado a este fim. Apenas a título de uma prévia informação ao leitor, quero salientar que o Guerreiro é uma mistura de várias outras danças com conotação religiosa, mas que ao longo dos tempos ganhou tons de profanidade. O Guerreiro também é uma arte, uma vez que se enquadra no campo das danças dramáticas brasileiras e da música.
  • 4. 4 E porque a marchetaria como linguagem de expressão? Bem, nos vários momentos de reflexão na escolha do que deveria apresentar como linguagem de expressão visual, no trabalho de final de curso, sempre me deparei com dificuldades em coadunar o tema com a linguagem. E isso, me impulsionou ao desafio de encarar a marchetaria, pela sua peculiar característica. A Marchetaria me fascinou, por ser uma arte milenar em que a criatividade, a paciência e a dedicação exclusiva, são atributos que não podem faltar quando de sua elaboração. Tudo isso me deu coragem e determinação para chegar onde ora estou. Apresentando este trabalho, com sua parte teórica e prática atendendo ao preconizado pelas normas acadêmicas.
  • 5. 5 CAPITULO I DIVIDIR PARA SOMAR 1 - COMPOSIÇÃO DAS PARTES 1.1 – Elementos de composição O que é compor algo? Etimologicamente falando, compor significa arrumar de forma ordenada, partes diferentes ou iguais, dando uma nova estruturação ao todo. O Dicionário Aurélio, (1975: 454) dispõe que: “Compor [Do lat. Componere.] V.t.d. 1.Formar ou construir de diferentes partes, ou de várias coisas. 3. Produzir, inventar”. Segundo o dicionário, numa concepção filosófica, e aí se faz necessário remeter à teoria platonista, que diz podermos chegar a uma forma definida no campo físico, a partir de uma concepção no campo do imaginário. Platão com sua teoria afirma que o que se forma no campo do ideal pode ser transformado em real, isto é, para ele o campo do ideal é o campo da razão, enquanto o do físico é o campo do sentimento. Esse campo do real, que segundo a teoria platonista é o campo do sentimento, permite que o artista possa criar a partir de uma idéia. Partindo desse conceito, as coisas imaginadas tomam sua forma definitiva, e aí se concretizam. Mas, para começar o processo de criação daquilo que foi imaginado, necessário se faz que elaboremos uma composição do que será concretizado. E para isso necessitamos de várias partes. A essas partes chamarei de elementos de composição. Os que procurei empregar na confecção de meu trabalho, são os que normalmente se usa quando da criação de uma obra de arte. Seja ela de natureza bidimensional ou tridimensional. São elementos do desenho e da forma. O desenho, inicialmente um esboço. A partir dele, a definição final do que será executado na prática. Foi o que procurei fazer no processo de criação ou recriação do chapéu do Guerreiro. E como os elementos que se dispõem ao desenho são: o ponto, a linha, as formas geométricas de uma maneira geral, além da luz, sombra e cor, me dispus de tudo isso para a minha composição.
  • 6. 6 Também utilizei alguns fundamentos de desenho, no corte adequado da chapa de MDF. Por exemplo, para o corte da chapa, cujas dimensões são de 2,70m por 2,20m, procurei sistematizá-lo de forma que, aproveitasse o máximo do material. A perda total situou-se em torno de um por cento. A placa foi dividida de tal maneira, que descontando o corte da serra e os possíveis retalhos, consegui quinze pedaços retangulares medindo aproximadamente 0,60m por 0,50m o que me proporcionou os suportes de medidas aproximadas ao que preconiza o retângulo áureo. O retângulo áureo é uma figura geométrica que apresenta as dimensões mais perfeitas para utilização em telas quadros e painéis. Observando-se sua proporcionalidade. E isto tem uma influência fundamental no que concerne ao processo de visualização do ser humano, em cuja disposição facial situam-se os olhos, que formam proporcionalmente, um retângulo áureo em disposição panorâmica. O artigo que explica esse conceito e traz uma demonstração prática do exposto neste parágrafo, relativo ao retângulo, é realizada por SODRÉ e TOFFOLI (2005). Observando as (Figuras 01 e 02) podemos melhor entender o gráfico que representa o retângulo áureo. Não usei o rigor das medidas do referido retângulo para cortar e compor os painéis, mas, procurei racionalmente aproveitar o material obedecendo a esse fundamento. Figuras 01 e 02 - Gráficos de composição do retângulo áureo. Fonte: http://pessoal.sercomtel.com.br/matematica/alegria/fibonacci/seqfib2.htm Já no que concerne às lâminas de madeira, o que posso explanar, é que algumas foram importadas de outro estado, com as seguintes dimensões: 0,31m X 0,31m X 0,001m. As demais adquiridas na região. Algumas têm 0,40m de largura por 3,00m de comprimento e 0,001m de espessura, outras têm 0,30m de largura por 3,0m de comprimento e a mesma espessura citada. Para a composição dos painéis procurei me nortear no princípio do retângulo citado. Mas o que é um painel? Explica CORTELAZZO (2005): “O painel é uma forma de
  • 7. 7 apresentação dos resultados dos trabalhos realizados em torno de um tema”. Se tomarmos como base que o homem é um animal de estatura erétil, e que sua área de visibilidade está distribuída dentro da área de um retângulo áureo, isso me leva a crer que por ser um animal de estatura erétil sua área de visualização é mais voltada para tudo que está na vertical. Por essa razão, optei pela disposição retrato nos painéis. Isto se deve ao fato de que procurei distribuir as imagens de maneira que o observador numa primeira olhada, possa definir o objeto interposto no campo visual. A minha intenção é que na primeira leitura visual, ele possa vislumbrar o motivo principal. Para pessoas leigas ao folguedo Guerreiro, a primeira impressão que se tem das imagens é de formas de igrejas, entretanto, logo se percebe que não existe a linha do horizonte, que delimita o espaço do chão, e que demonstraria se tratar de um desenho arquitetônico. Inexistente nos meus trabalhos, essa linha não divide o campo visual em espaço e chão, dando ao observador a impressão de apenas um cosmo. E isso foi intencional, pois queria que as figuras em Marchetaria representassem chapéus flutuando. E isso incomoda de alguma forma, a primeira visualização da imagem. A supressão natural dessa linha, se deu para levar o observador a vivenciar o movimento do objeto, como se estivesse vivendo o momento do folguedo. Procurei aproximar o máximo o objeto, como se o estivesse fotografando em zoom, reduzindo a visão do fundo par justificar minha intencionalidade. Mas, numa olhada mais criteriosa, pode-se observar que se trata de outra imagem, e não de um simples desenho arquitetônico. A imagem parece mover-se em rotação e translação, segundo afirma FONTOURA (1962: 38): “Translação é o movimento de um corpo em que o conjunto de seus pontos tem em cada instante a mesma velocidade e este mantém uma direção constante”. Em outra conceituação FONTOURA (1962: 40) diz: “Rotação é o movimento de um corpo em que o conjunto de seus pontos, em um instante determinado, descreve arcos de circunferência cujos centros estão sobre uma mesma reta, denominados eixo instantâneo ou simplesmente eixo de rotação”. Todas as figuras dos painéis insinuam movimento. Isto se percebe pelas formas curvilíneas das fitas e pelo aspecto dos cortes em perspectiva. É a partir daí, que o observador começa a abstrair conforme sua idealização e conhecimento. Só numa segunda investida visual perceberá que está diante de um objeto que flutua, e não diante de uma retratação arquitetônica de igreja ou de outro objeto. Pois se assim o fosse, haveria a base ou linha de horizonte. Isto, se deve aos elementos de composição empregados na realização da obra. Utilizei neste trabalho, vários elementos de composição como: o ponto,
  • 8. 8 a linha, a perspectiva, o escorso, a deformação; finalmente, todos os elementos do desenho, de maneira que pudesse dar leveza e movimento nas composições dos quadros. Procurei situar o enquadramento de tal maneira, que imagens e formas se apresentassem bem próximas do observador, remetendo-o a uma leitura visual próximo do infinito. Capturei essas informações em alguns sites da Internet como o que destaco a seguir SODRÉ E TOFFOLI (2005) no qual comentam: Anexando dois quadrados com lado = 1, teremos um retângulo 2x1, sendo o lado maior igual à soma dos lados dos quadrados anteriores. Anexamos agora outro quadrado com lado = 2 (o maior lado do retângulo 2x1) e teremos um retângulo 3x2. Continuamos a anexar quadrados com lados iguais ao maior dos comprimentos dos retângulos obtidos no passo anterior. A seqüência dos lados dos próximos quadrados é: 3,5,8,13,... que é a seqüência de Fibonacci. Procuro demonstrar com este trabalho, o que se situa entre o imaginário e o real. Na minha concepção, é um trabalho metafísico do ponto de vista filosófico. Metafísico, porque parto do imaginário daquilo que quero representar, para a realidade do que apresento: (meta: além, e física: matéria). Ou seja, a obra não quer ser apenas uma mimese do real, ela é em si, a síntese do que foi concebida no campo do ideal. O Mito da Caverna narrado por PLATÃO (2004: 225) é, talvez, uma das mais poderosas metáforas imaginadas pela filosofia, em qualquer tempo, para descrever a situação geral em que se encontra o homem. Para o filósofo, todos nós estamos condenados a ver sombras a nossa frente e tomá-las como verdadeiras. Essa poderosa crítica escrita há quase 2500 anos atrás, narra a condição em que o homem se encontra diante do inusitado, inspirou e ainda inspira inúmeras reflexões pelos tempos afora. Quero salientar, que meu trabalho pode parecer confuso do ponto de vista estético e estrutural, mas certamente com um olhar mais acurado o observador notará que está diante de algo que representa o que se propõe. O trabalho na sua organização visual, traz elementos de composição como o escorso, a profundidade, a vista em corte, a linha, o ponto etc. Conforme já disse anteriormente. Além dos elementos geométricos em várias configurações. Também podem ser percebidas, a cor, a luz e a sombra. Todavia, para alguns observadores pode parecer obscura a leitura visual. Talvez pela falta de conhecimento daquilo que quero retratar, - o chapéu do guerreiro. Reportando-me à fábula de Platão, a uma primeira olhada, parece ao observador leigo, como as sombras da caverna de Platão. Porém, após uma melhor reflexão, revelará imagens do real, do mundo da
  • 9. 9 luz, citado no exemplo. Dependerá da capacidade interpretativa de cada observador. Mas não tenho o compromisso de justificar a capacidade ou não de cada indivíduo, uma vez que a arte não tem compromisso com a verdade, ela é mimética na suas essência. Depende do grau de assimilação que cada um possa ter como no caso dos homens da caverna. E para justificar esta colocação, tomei como base o seguinte trecho do artigo de SCHILLING (2005) mas que li no livro VII de a Republica de PLATÃO (2004: 225): Platão viu a maioria da humanidade condenada a uma infeliz condição. Imaginou (no Livro VII de A República, um diálogo escrito entre 380-370 a.C.) todos presos desde a infância no fundo de uma caverna, imobilizados, obrigados pelas correntes que os atavam a olharem sempre a parede em frente. O que veriam então? Supondo a seguir que existissem algumas pessoas, uns prisioneiros, carregando para lá para cá, sobre suas cabeças, estatuetas de homens, de animais, vasos, bacias e outros vasilhames, por detrás do muro onde os demais estavam encadeados, havendo ainda uma escassa iluminação vinda do fundo do subterrâneo, disse que os habitantes daquele triste lugar só poderiam enxergar o bruxuleio das sombras daqueles objetos, surgindo e se desfazendo diante deles. Era assim que viviam os homens, concluiu ele. Acreditavam que as imagens fantasmagóricas que apareciam aos seus olhos (que Platão chama de ídolos) eram verdadeiras, tomando o espectro pela realidade. A sua existência era pois inteiramente dominada pela ignorância (agnóia). Se por um acaso, segue Platão na sua narrativa, alguém resolvesse libertar um daqueles pobres diabos da sua pesarosa ignorância e o levasse ainda que arrastado para longe daquela caverna, o que poderia então lhe suceder? Num primeiro momento, chegando do lado de fora, ele nada enxergaria, ofuscado pela extrema luminosidade do exuberante Hélio, o Sol, que tudo pode, que tudo provê e vê. Mas, depois, livre aclimatado, ele iria desvendando aos poucos, como se fosse alguém que lentamente recuperasse a visão; as manchas, as imagens, e, finalmente, uma infinidade outra de objetos maravilhosos que o cercavam. Assim, ainda estupefato, ele se depararia com a existência de um outro mundo, totalmente oposto ao do subterrâneo em que fora criado. O universo da ciência (gnose) e o do conhecimento (espiteme), por inteiro, se escancarava perante ele, podendo então vislumbrar e embevecer-se com o mundo das formas perfeitas. site: educaterra.terra.com.br/voltaire/cultura/caverna.htm A estética do meu trabalho, é indissociável da teoria das idéias. Pois sua composição estética surge no campo do ideal, não é uma cópia daquilo que se baseia, mas uma nova criação, a partir de um modelo. É a partir de sua idealização no campo do imaginário, que fica evidenciada a nova forma, agora real. Ela se apresenta ao observador como algo novo, pois já fluiu do campo do imaginário, (razão) para tomar sua forma definitiva no campo do real (sentimento) situada por assim dizer como matéria, posta no campo dos sentidos que Platão preconizava, uma vez que agora pode ser vista tocada e sentida. E a essa nova composição, atribuo um novo valor estético. Segundo FONTES (2005): PLATÃO dizia:
  • 10. 10 “Como as idéias são imutáveis e eternas, se pretendemos apreciar as obras de arte devemos seguir estes princípios, exigindo que elas se aproximem das idéias, o mesmo é dizer da perfeição”. Neste sentido, Platão não pode admitir qualquer mudança ou inovação no campo artístico. Entretanto, quero destacar como síntese do meu trabalho, inúmeros pensamentos e antevisões daquilo que vivenciei. E não mudo minhas pretensões, por entender que elas só se tornarão arte, a partir dessa tomada de decisão. Não só juntei partes (etimologicamente falando) ao rejuntar retalhos de madeira e compor uma nova figura; fui mais além, rejuntei partes distintas de um todo fragmentado, quero dizer, de minhas lembranças; e, rejuntando-as novamente imprimi-lhes uma nova forma num trabalho difícil e meticuloso. Procurei dar uma nova cara ao ornato de cabeça usado no Guerreiro, como também, juntei fragmentos de vida, numa nova dimensionalidade visual que se concretiza na elaboração de cada quadro. Ao dividir cada lâmina de madeira, em pequenos pedaços e tiras, para depois compor uma nova imagem; pude sentir o prazer de realizar o meu trabalho. Percebi, que mesmo com retalhos esparsos de madeira, é possível se produzir uma forma esteticamente equilibrada, e, que possa proporcionar prazer visual ao observador. E, é isso que cada painel se propõe. É a síntese do trabalho meticuloso e paciente, onde o amor, a paciência e a dedicação exclusiva podem agregar à obra, o sentimento de que Platão fala. E esse sentimento que sai do meu interior (campo do imaginário e da razão) pode fluir da própria obra em direção ao observador quando visualizá-la, que certamente fruirá seu conteúdo estético refazendo o caminho inverso da teoria platônica. Efetuar uma composição pictórica, a partir de partes distintas de delgadas lâminas de madeira, de cores e textura variadas, e, se chegar a uma nova composição visual, foi muito interessante e gratificante. Cada passo dado, sentia uma nova emoção! E a satisfação pelo objetivo alcançado não podia ser outra, senão a esperada. Uma vez recortadas as partes conforme as necessidades, procurei compor imagens e dar-lhes forma e expressão visual organizada e harmônica. Neste trabalho de composição em mosaico, agrego algumas sutilezas, que de alguma forma dão conotações do impressionismo, do expressionismo e do cubismo. Do impressionismo, porque parto do meu olhar exterior ao modelo, e o transporto para o consciente onde elabora no campo do imaginário o que vou reproduzir no suporte. Dessa forma, as características do impressionismo, que se envolvem neste caso, são a impressão que
  • 11. 11 abstraio do modelo e transformo em outras formas. Uma das premissas do impressionismo, é que a impressão é um movimento do exterior para o interior, ou seja, é a realidade do objeto que se imprime na mente do sujeito. A arte alegre vibrante e moderna dos impressionistas, enche os olhos de cor e luz. Prevalecem a luz e a cor natural. É a presença da natureza, a transparência luminosa, a claridade das cores. É a sugestão de felicidade e de vida harmoniosa que transparece nas imagens criadas pelos impressionistas. É isto que acontece no momento que olho o trabalho. Obviamente não possui a transparência visual, pois são feitos de materiais opacos, mas existe uma certa transparência no campo do imaginário. Do ponto de vista expressionista, o movimento acontece ao contrário, ele parte do interior para o exterior, e isso, de alguma forma é o que tento passar no trabalho. O Expressionismo é a arte do instinto, trata-se de uma arte dramática, subjetiva, “expressando” sentimentos humanos. Tento transmitir ao observador meus sentimentos e vivências. Ao ver os trabalhos, mesmo um leigo em relação a arte, se remete imediatamente à religião, e isto se dá, pelas características visuais da obra. Já do ponto de vista cubista, a própria disposição dos retalhos de madeira, formando uma imagem às vezes indecifrável aos olhos do observador, um verdadeiro mosaico; remete àquele. O artista cubista tenta representar os objetos em três dimensões, numa superfície plana, sob formas geométricas, com o predomínio de linhas retas. Não representa, mas sugere a estrutura dos corpos ou objetos. Representa-os como se movimentassem em torno deles, vendo-os sob todos os ângulos visuais, por cima e por baixo, percebendo todos os planos e volumes. Não é o que minhas imagens retratam com uma fidelidade, porém, remete-se ao cubismo quando verificadas as formas e, percebe-se que flutuam livres e como se estivessem em movimento. É aí, que o observador mais atento vai logo entender não se tratar de uma representação arquitetônica, cujo fundamento básico seria a linha delimitadora do horizonte. Nos meus trabalhos, essa linha não existe, pois intencionalmente quis induzir o observador a um mergulho imaginário no cosmo, como dito anteriormente. O leitor mais familiarizado com as artes logo perceberá essas características; mas, entendi necessária esta explicação, uma vez que nem todos, têm o conhecimento da história da arte de tal modo que possa vislumbrar à primeira vista o exposto.
  • 12. 12 Quanto à utilização do campo visual disponível nos painéis, procurei ocupar de tal maneira que deixasse destacado o meu motivo pictórico. Procurei compor de tal forma que, os contrastes de luz e sombra, como também da cor e seus matizes, surgissem ao ritmo da disponibilidade do material. Obedeci à minha intuição e ao que diz SILVA, (2005) quando afirma: Num quadro, todas as partes serão visíveis e desempenharão o papel que lhes é atribuído, seja ele principal ou secundário. Tudo o que não é útil no quadro é prejudicial. Uma obra de arte deve ser harmoniosa em sua totalidade; pois os detalhes supérfluos, na mente do espectador, usurpariam os elementos essenciais. Nas composições que formulei, procurei ocupar todo o espaço visual, de forma que o espectador possa melhor aproveitar a disposição dos objetos, bem como de suas interposições cromáticas. A partir de uma idealização do mosaico, e utilizando o material disponível, procurei compor os painéis de maneira que não deixasse se distanciar demais das formas que serviram como referenciação. A composição deveria refletir parte do que estava reproduzindo. Daí, me centrar de certa maneira, na reprodução abstrata dos meus modelos. Novamente em SILVA, (2005) encontra-se: O lugar ocupado por figuras ou objetos, o espaço vazio em torno deles, as proporções, tudo desempenha um papel. A composição é a arte de dispor, de maneira decorativa, os vários elementos à disposição do pintor para a expressão de seus sentimentos. Procurei dispor nos meus trabalhos, formas de fácil interpretação visual, porém, imprimi a estas, minhas características pessoais, o que de certa maneira, traduz o que foi preconizado por MATISSE na citação anterior. Já em relação à expressividade das formas por mim adotadas nos painéis, parto do pressuposto de que na arte cada um deve procurar seu estilo, para assim, poder logo imprimir a seus trabalhos sua marca como objeto de identificação pessoal, e, que de certa forma dita a personalização artística. E fui buscar esta premissa em OSTROWER, (1990: 16), o grifo é meu: Na arte, as formas expressivas são sempre formas de estilo, formas de linguagem, formas de condensação de experiências, formas poéticas e, nesse sentido, também as palavras, das poesias, ou de níveis poéticos, devem ser entendidas como formas verbais- (...).
  • 13. 13 1.2 – COMPOSIÇÃO ATRAVÉS DA TÉCNICA DO MOSAICO A origem do mosaico vem do latim musa, que também proporcionou música e museu. Está entre as primeiras manifestações elevadas do ser humano, tais como a pintura ou a escultura. Arqueólogos e estudiosos costumam datar os primeiros mosaicos em painéis do século V a.C., encontrados na Suméria. Quando os gregos fundaram estabelecimentos coloniais no sul da Itália, entraram em contato com uma vastidão de mármores, que logo se tornou matéria-prima para a ornamentação de pavimentos e paredes. Os romanos aprofundaram seu uso, difundindo-o por todo o mundo sob seu domínio, desde os confins da Ásia Menor até a Lusitânia (Portugal), onde hoje ainda se encontram vestígios, muitos bem conservados especialmente em Conímbriga próximo à cidade de Coimbra. Internet ALIBERTI (2005). O primeiro trabalho em mosaico foi realizado pelos sumérios há 5000 anos. Este povo, originário do Oriente, criou pilastras revestidas com cones de argila colorida e fixadas em massa. Os motivos eram geométricos e mostravam inspiração na arte da tapeçaria. Aproximadamente 300 anos a.C., os gregos já formavam quadros de pequenos seixos brancos, pretos e vermelhos com cenas de luta e caça, além de motivos mitológicos. Desde então, o homem tem usado pedaços de pedra, cerâmica, vidro, conchas e os mais diferentes materiais para criar mosaico. Antigamente a técnica do trabalho em mosaico consistia na colocação de fragmentos de mármore ou de pasta vítrea de diferentes cores sobre o piso de cimento, composto de várias camadas de lama misturada com seixos e com uma leve cobertura de gesso. O artista procurava as linhas do desenho esboçado sobre o gesso e demonstrava sua perícia em desenvolver formas e cores, além de conseguir contraste de sombra e luz. Em geral os mosaicos eram executados no local, embora a figura central que requeria uma mão-de-obra acurada em materiais mais refinados, fosse preparada sobre o desenho de um painel especial na oficina do artesão e depois inserida dentro do local escolhido.
  • 14. 14 Para a realização de um mosaico podem se distinguir três etapas importantes. O desenho do mosaico é a primeira e através dele deve-se preparar, em papel, um esboço em escala inferior do tamanho real da peça desejada. A próxima etapa é o traslado deste desenho para a superfície escolhida. Amplia-se, a lápis, a escala real do desenho para o local onde o mosaico será instalado. Por último, realiza- se a colocação das pastilhas mediante dois métodos distintos para a instalação: direto e indireto. A partir de 40 a.C. a Itália torna-se o maior centro de produção de mosaicos. Ele era utilizado principalmente em motivos religiosos, revestindo pisos e paredes. Ravena é umas das cidades italianas onde se encontram mosaicos maravilhosos. O mosaico bizantino utiliza muito o tom dourado e prateado e foi utilizado principalmente no revestimento de tetos de igrejas. No Brasil o mosaico foi utilizado por Cândido Portinari, Di Cavalcanti e Tomie Ohtake em diversas de suas obras. Ele ainda é utilizado, principalmente na construção civil em imensos painéis, na decoração de piscinas e em pisos e paredes dos mais diversos ambientes. ESTHER (2005) Internet. Paulo Werneck (1907 / 1987) nasceu no Rio em 29 de julho. Foi pintor, desenhista e ilustrador de livros infantis e colunas políticas de diversos jornais. Autodidata, Paulo Werneck introduziu no Brasil a técnica do mosaico. Contribuiu com seus murais para projetos de arquitetos como Oscar Niemeyer, Marcelo, Milton e Maurício Roberto. Dentre os painéis realizados destacam-se os localizados nos edifícios Ministério da Fazenda, Seguradoras, Marques do Herval, Banco Boavista, no Rio, na Igreja São Francisco de Assis, na Pampulha, e no Palácio do Itamaraty, em Brasília. Paulo Werneck foi um incansável colaborador do Modernismo. Como ilustrador Paulo Werneck publicou duas lendas brasileiras – Negrinho do Pastoreio (1941) e Lenda da Carnaubeira (1939). Esta última foi também publicada nos Estados Unidos pela editora Grosset & Dunlap (1940). (Figura 03). Internet WERNECK (2005).
  • 15. 15 Figura 03 – Mosaico de Paulo Werneck Fonte:www.projetopaulowerneck.com.br Procurei referenciar artistas brasileiros por entender que dessa forma estou valorizando o que temos de melhor em nossa sociedade. Paulo Werneck é um artista conhecido no meio artístico brasileiro como também no campo literário com vários trabalhos publicados. Também procurei informações a respeito de um marcheteiro que trabalhasse essa arte mais no aspecto mosaicista. E encontrei na obra de Marcos Resende o que buscava para me referenciar. Até porque, sendo ele um artista admirador de Volpi, pois suas obras carregam fortes traços de identidade com aquele, entendi que deveria citá-lo porque também vejo em minha obra alguma semelhança com a obra de Volpi, pois as fitas multicoloridas dos quadros lembram de certa forma as bandeirinhas. Não quero que leitor entenda que meu trabalho tenha verossimilhança com o do Grande Mestre Volpi, até porque, as linguagens são bem distintas, porém, existe uma pequena lembrança daquele no que se refere aos contrastes de cores nas fitas dos chapéus com as bandeirinhas. (Figura 04). Figura 04 - Pintura de bandeirinhas de Alfredo Volpi Fonte: www.pinturabrasileira.com/artistas
  • 16. 16 1.3- MARCHETARIA – O MOSAICO DE MADEIRA O que é marchetaria e onde surgiu? O termo Marchetaria refere-se cortar, encaixar e colar, especialmente pedaços ou lâminas de madeiras sobre uma superfície sólida, para então, montar um projeto decorativo de acordo com as tendências próprias do artesão. Este termo do francês, marqueter, quer dizer embutir. A origem da marchetaria é desconhecida, porém sua atribuição é dada à França por haver difundido a arte pelo resto do mundo. Desde a época dos Egípcios já se praticava a Marchetaria. Data de aproximadamente 3000 anos atrás. Caixas de alto requinte, painéis e mobílias decorativas enriqueceram os projetos nos palácios e templos da época. Confeccionados em madeiras coloridas, muitas dessas peças, foram deixadas nas pirâmides, mais tarde descobertas pelos arqueólogos. Outros exemplares de Marchetaria apareceram na Ásia Menor em torno de 350 A.C., cujas peças foram desenvolvidas em mármore. Por simples definição, a arte da marchetaria consiste em envolver uma determinada área com pequenos pedaços de madeira coloridas de diferentes tipos que depois de cortadas, são devidamente embutidas ou coladas lado a lado, posteriormente recebendo um acabamento. Depois da queda do Império Romano, poucas oficinas sobreviveram na Itália. Nos séculos 14 e 15 foram criadas algumas escolas de marchetaria na cidade de Florença, cujo exterior das peças eram moldados com o formão. Somente com a criação de associações da marcheteiros é que a arte pode se sustentar de forma mais perene. Inicialmente criadas na Europa, foram se espalhando pelo resto do planeta nos demais continentes. Melhores informações serão apresentadas em capítulos específicos. O objetivo de realizar este trabalho, é trazer alguma informação aqui para a região, do que é um a cultura nordestina, apresentando um fragmento dela em linguagem plástica. E, também resgatar de forma artística acadêmica, a milenar arte da marchetaria. Procurando conhecer melhor a produção em Marchetaria no Brasil, investiguei sobre os artistas que têm trabalhos nessa técnica e encontrei Marco Resende. Nascido no Rio de
  • 17. 17 Janeiro em 1966, Artista Plástico e Restaurador de obras de arte, iniciou sua carreira em 1984, cursando Arquitetura na Universidade Santa Úrsula- RJ, logo depois passando a dedicar-se ao estudo da pintura na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, onde teve aulas com importantes artistas contemporâneos, como Daniel Senise, Charles Watson e Gianguido Bonfanti, entre outros. No ano de 2000 coordenou o trabalho de restauração de cerca de 600 m² do assoalho de madeira em Parquet marchetado das salas do Palácio das Laranjeiras, residência oficial do Governador do Rio de Janeiro. Desde então vem utilizando a madeira em seu trabalho como artista, que se baseia nos princípios do Construtivismo. Na Figura 05, podemos ver trabalho do artista em Marchetaria que caracteriza sobremaneira a arte do mosaico, só que em madeira. Figura 05 -Trabalho de Marco Resende em marchetaria Fonte: www.volpigaleriadearte.com.br O meu trabalho não representa as características mais marcantes do mosaico propriamente dito, entretanto carregam em seu bojo, uma forte tendência mosaicista, haja vista a variedade de formas cores e disposições das partes. Na elaboração do trabalho em madeira, procurei obedecer a uma seqüência básica de confecção dos quadros ou painéis. Primeiramente, como já citei anteriormente, produzi no campo das idéais, aquilo que pretendia retratar na prática e na linguagem que escolhi. Depois, numa segunda fase, vislumbrei todo o processo de execução. Desde que material iria utilizar até como deveria ser o desfecho final. Numa terceira fase, já de posse do material, e ferramentas, parti para a execução do trabalho.
  • 18. 18 Primeiro escolhi os modelos que pretendia reproduzir, depois segui as técnicas normais da Marchetaria. Porém, à medida que ia realizando o trabalho, diversos fatores inesperados iam surgindo e tive de contorná-los adequando-os às minhas reais possibilidades, conforme exposição detalhada no item 1, deste capítulo. Outros detalhes serão relatados na parte que falo sobre a confecção de cada quadro no capitulo III. 1.4 – GUERREIRO – COR, FORMA E MOVIMENTO Entendo ser interessante, que o leitor tome conhecimento da temática deste trabalho que é o chapéu do Guerreiro, e, como conseqüência possa conhecer melhor um pouco da cultura e arte nordestina, em especial a alagoana que conforme ANDRADE, (1959: 22), é: “Uma das manifestações mais características da música popular brasileira são as nossas danças-dramáticas”. Guerreiro”1 , é um folguedo natalino de caráter dramático profano- religioso. Antigamente era formado por aproximadamente sessenta figurantes, mas com o passar do tempo, e o advento da mídia eletrônica que invade os lares populares do nordeste, e a difusão desenfreada das culturas ditas modernas como o axé-music, os trios elétricos e o carnaval, o culto às festas folclóricas tem diminuído assustadoramente, colocando em risco de extinção essas danças folclóricas ricas em história, musicalidade e poesia. Hoje, esses números variam entre 25 e 35 componentes. O Guerreiro é um grupo de dançadores e cantadores, surgido pelo sincretismo do “Reisado”2 alagoano, junto ao já 1 -Guerreiro: Grupo multicolorido de dançadores e cantadores, semelhantes aos do Reisado, mas com maior número de figurantes, maior riqueza nos trajes e mais música. Surgiu em Alagoas, entre os anos de 1927 e 1929, sendo resultado da fusão de reisados e pastoris. Possui em média, 46 personagens entre rei, rainha, mestre, contra-mestre, palhaço, etc. 2 -Reisado: De origem portuguesa, no período natalino, músicos e dançadores vão de casa em casa anunciando o nascimento de Jesus. Os reisados aparecem durante o ciclo de Natal, a partir da Bahia, pelos estados do Nordeste até o Piauí. Seguem a mesma tradição secular ibérica, indo de casa em casa, fazendo em cantoria a pedição de abertura de porta e louvação aos donos das casas. Cantam o nascimento do Menino Jesus, numa fusão de temas sacros e profanos.
  • 19. 19 desaparecido “Cabocolinhos”3 , e ainda com subsídios temáticos das Cheganças, Pastoril e do Bumba-meu-boi. Comporta também o maior número de figurantes e episódios, tendo mais riqueza de peças e cores em seus trajes bem como mais melodia e poesia musical. Muitos estudiosos do Folclore, costumam dizer se tratar de um "Reisado Moderno", podendo ele, o “Guerreiro” substituir ambos, “Cabocolinhos” e “Reisado” tornando-se assim, um único folguedo. Quero destacar o que diz LIMA (1962: 99): “O Guerreiro tem a estrutura básica dos reisados com danças, cantos,’entremeios’ dramáticos etc.”. Essa afirmação de que o Guerreiro é uma espécie de Reisado, já dá um certo direcionamento ao objeto de estudo da temática. É uma espécie de dança dramática, com cantorias alegóricas relacionadas com os festejos de natal que passeia pelas ruas do bairro ou cidade, indo de porta em porta e fazendo louvação ao menino Jesus. Mas, como suas raízes remontam a outros folguedos como: o Reisado, o Caboclinhos, a Chegança4 , o Pastoril5 o Bumba-meu-boi6 etc., sua estruturação poética é mais complexa e extensiva. Pode-se encontrar no Guerreiro, figuras da nobreza como a Rainha7 ; do poder repressor, como é o caso das cheganças, simbolizada pelo General8 ; das comunidades silvícolas que habitavam a costa brasileira na figura do Índio9 ; da 3 -Caboclinhos: São grupos de homens e mulheres, com cocares de penas de ema, pavão e avestruz. São caboclos que evoluem nas ruas em duas filas, ao som dos estalidos secos das preacas - um objeto que reproduz o arco e a flecha e que emite um estalido quando percutido. A manifestação dos caboclinhos é uma representação do povo indígena e é, também, um dos mais antigos bailados populares do Brasil. Os caboclinhos preservam passos e danças nativas que se somaram às influências européia e negra. 4 -A Chegança tem sua origem na reconquista espanhola na luta travada entre cristãos e mouros. É apresentada sempre no ciclo natalino. Trata-se de um folguedo antigo, cuja ação transcorre em terra, onde está o quartel da mourama, e no mar, por onde chega a cristandade. São muitos os cânticos de rua, incluindo a saudação e a despedida, e os cânticos embarcados, por parte dos cristãos. 5 -Os Pastoris são danças e cantos que por ocasião das festas de Natal se realizam em homenagem ao Deus Menino.Em geral se desenvolve; defronte de um Presépio ou em tablados, em praça pública. É um rancho alegre, de meninas, mocinhas, que ano após ano, entoam ao Menino Jesus. 6 -Dança dramática presente em várias festividades, como o Natal e as festas juninas, o bumba-meu-boi tem características diferentes e recebe inclusive denominações distintas de acordo com a localidade em que é apresentado: no Piauí e no Maranhão, chama-se bumba-meu-boi; na Amazônia, boi-bumbá; em Santa Catarina, boi-de-mamão; no Recife, é o boi-calemba e no Estado do Rio de Janeiro, folguedo-do-boi. 7 -Às vezes aparecem em um número de três: Rainha dos Guerreiros, Rainha dos Caboclos, Rainha da Nação. Além de sua própria patente, elas coordenam as demais figuras. 8 -Responsável pela harmonia do Guerreiro, são os apaziguadores do grupo. 9 -Índio peri e seus dois vassalos: No Guerreiro substitui a Guerra dos Reisados, baseado na prisão, e, às vezes morte de um guerreiro inimigo. Então, surge a guerra, que tem um bailado de grande beleza, onde os figurantes e o Índio Peri digladiam-se.
  • 20. 20 comunidade fidalga aqui representada pela Lira10 e os Mateus11 , espécie de intermediário entre o Guerreiro e o Rei. ANDRADE, (1959: 21) escreve: Uma das manifestações mais características da música popular brasileira são as nossas danças dramáticas (1)”. (...) Possuímos um grupo numeroso de bailados, todos eles providos de maior ou menor entrecho dramático, textos, músicas e danças próprias. E se me fatiga bastante, pela sua precariedade contemporânea, afirmar que o povo brasileiro é formado das três correntes: portuguesa, africana e ameríndia, sempre é comovente verificar que apenas essas três bases étnicas o povo celebra secularmente em suas danças dramáticas. (...) Aliás a verdade mais fundamental. A meu ver, é que nenhum dos dramas cantados do nosso povo tem origem profana. “O drama popular é de origem religiosa”, generaliza Heggert Krappe (1, p. 308), o que implica aliás todo o teatro erudito. Porque se existe fenômeno típico de desnivelamento dum gênero artístico, é o teatro folclórico. Ele nasce como imposição de grupos dominantes que, na celebração, ensinam por meio do mimetismo dramático a vida imperante dos espíritos, dos deuses. Assim, não é a profanidade do heroísmo, da coragem, dos feitos históricos tradições e costumes raciais que provocou a fundação das nossas danças dramáticas. Todas são de fundo religioso. Ou melhor dizendo: o tema, o assunto de cada bailado é conjuntamente profano religioso, nisso de representar ao mesmo tempo um fator prático, imediatamente condicionado a uma transfiguração religiosa. Percebe-se que, as danças dramáticas brasileiras têm origem nas epopéias vividas pelos povos que formaram a raça brasileira, a partir, das narradas conquistas ibero- americanas, assim como, das conquistas dos europeus, em solos brasileiros e das guerras travadas pelos Mouros12 e Cristãos ainda em terras distantes. Uma vez miscigenada as raças, muitas danças foram sendo elaboradas à guisa dos enredos que envolviam cada cultura regional. Se tiver origem profana ou religiosa, a ótica aqui nesse momento não nos interessa, o que realmente vem à tona, é a capacidade do povo brasileiro criar em cima de suas conjecturas de vida. Andrade, (1959: 22): Gilberto Freyre lembra que o antagonismo racial, regional ou de classe, como entre Cristãos e Mouros “se origina ou se alimenta é quase sempre de antagonismos econômicos (...) mas foi pela mística religiosa que o movimento de reconquista se definiu. Cristãos contra infiéis”. É o que se dá também, às 10 - Trazida pelo Rei dos Guerreiros, ela é ameaçada de morte pelo caboclinho a mando da Rainha, por estar com ciúme do Rei. 11 - Às vezes aparecem em dois, eles são responsáveis pelo contrato do Guerreiro. Na dança eles cantam e grosam. 12 - Os muçulmanos eram também designados como sarracenos (e também por mouros, embora este último termo designasse mais corretamente os muçulmanos naturais do Magrebe que se encontravam na Península Ibérica).
  • 21. 21 mais das vezes, com as criações artísticas populares. A realidade econômica, o fator prático, é insuficiente pra criar a manifestação artística que vai se tornar coletiva, porque as artes não aplicadas imediatamente, são de si mesmas e pela sua função, misteriosas e inexplicáveis. E para a mentalidade popular, que nisso coincide com a mentalidade primitiva, o mistério pode explicar outro mistério ou qualquer realidade. É o que fazem as artes como as religiões.Mas não sei que nunca uma realidade pudesse explicar folclòricamente um mistério. De forma que uma razão econômica não seria satisfatória pra justificar a existência duma manifestação artística. Explicar o ódio ao Mouro e a Chegança de Mouros por questão de propriedade de terras e riquezas a conquistar, é demasiado probante e simplista para o complicadíssimo homem popular. E não explica de fato nada, porque não é uma explicação permanente, estável, que sirva em qualquer ocasião.Não explica principalmente o ódio, que permanece mesmo depois da vitória. A explicação realista é clara e insolúvel por demais pra ser aplicada às mil e uma cambiantes dos fenômenos da vida coletiva. Não tem mistério não tem simbólica (2). A partir do exposto acima, percebe-se claramente, que a origem das danças e bailados brasileiros, que mais tarde foram tornando-se peças do nosso rico folclore, têm origem ainda em terras do além mar. Na Europa ibero-asiática, onde os movimentos de lutas entre Mouros e Cristãos se davam, à espreita de conquistas de terras e riquezas, se criaram-se determinados hábitos e costumes que vieram aportar em nosso solo, por ocasião da descoberta do Brasil. Na chegança tradicional do nordeste, os mouros, com suas roupas vermelhas, seus armamentos, não cantam, salvo quando, depois de vencidos e batizados, repetem o coro dos cristãos, como um pedido de clemência. A grande profusão de folguedos que hoje podemos verificar em nossa cultura brasileira, se originou a partir dessas sagas. E o “Reisado”, que é uma forma de expressão artística teatral, tem origem nessas lutas entre reinados euro- asiáticos. Naqueles tempos, era comum um povo invadir os domínios de outros povos em busca de riquezas e conquistas de espaços. As danças dramáticas brasileiras, hoje denominadas folguedos, em sua maioria carregam nitidamente em suas roupagens e cantorias, marcas que denotam a presença das realezas européias e de outros povos, como os afros e os médio-asiáticos. Estes últimos, pela sua penetração e conquista de parte da Europa, (Portugal) e península ibérica chegaram ao Brasil através da colonização. Por essa razão, notam-se em algumas danças dramáticas, aspectos que lembram fortemente os costumes e rituais daqueles povos. Já o folguedo “Caboclinhos”, que é de origem estritamente brasileira, apresenta características da coletividade indígena brasileira, entretanto. Sua ornamentação básica, é o uso de produtos
  • 22. 22 advindos da flora e da fauna brasileiras. Penas de animais multicoloridos, sementes, cores extraídas das plantas dão à indumentária desse folguedo o toque de particularidade que lhe é peculiar. Mais tarde foi tomando outra conotação profano-religiosa e se tornou um bailado de louvação festiva carnavalesca. Assim também sua indumentária foi agregando produtos de origem industrial ao seu enredo e vestimentas. O “Guerreiro” que é referenciado neste trabalho, tem como origem a fusão inicialmente destas duas correntes dançantes, numa nova forma de expressão artístico- religiosa, tem algumas figuras do povo negro ocupando lugar, mesmo que de forma sutil, nas diversas passagens. Na Figura 06 pode-se perceber o uso dos adornos e vestimentas do Guerreiro. Figura 06 - Guerreira em evolução. Fonte: www.ufal.br/guerreiropornatureza/fotos3.htm 1.4.1 – A origem Conforme estudos de THÉO BRANDÃO citado em TAVARES (1962: 99) o Guerreiro surgiu em Alagoas no final da década de 20 do século XX, formado através da fusão de outros folguedos: o Auto dos Cabocolinhos, o Reisado, a Chegança e dos Pastoris. É um grupo de cantadores e dançadores acompanhado pela sanfona, tambor e pandeiros que se apresentam com vestimentas coloridas geralmente nos festejos natalinos. Incorporando o Reisado, algumas figuras dos Caboclinhos, outras da Chegança, umas do Pastoril, inventaram cantos mais animados à base da improvisação, aparecendo então o atual Guerreiro. O Folguedo possui diversas figuras, entre elas a Lira, a Rainha, a Sereia, o Índio Peri, os Vassalos, a Borboleta, o General e os Embaixadores etc. O mestre é a principal
  • 23. 23 e a imprescindível. Tudo isto, porém, tira suas origens do Auto dos Congos cujos ramos são o Reisado, o Bumba-meu-boi e a Chegança. Uma das partes mais encantadoras é a Sereia, ninguém, talvez, possa explicar como esta "figura" foi introduzida no Guerreiro. Será a Iemanjá dos negros Africanos? ou a Iara dos Indígenas? O Guerreiro é hoje o auto popular de maior divulgação e de maior número de figurantes. Seus trajes são mais ricos do que os do Reisado, chapéus enormes, onde se nota a junção artística de um verdadeiro artesanato. As roupas diferem de uns para outros grupos. Mesmo sendo o folguedo Guerreiro há uma grande variação de modelos e figurinos. Os chapéus também diferem em estética, forma e estrutura. Dá para se perceber, que não existe uma rigorosa padronização na confecção, e padronização das indumentárias do Guerreiro. Tudo depende do poder aquisitivo de cada agremiação e da localidade onde se estabelece. Porém, algumas figuras devem obedecer a suas caracterizações. O número de figurantes também pode variar de Guerreiro para Guerreiro. Já o Reisado é uma das pantomimas folclóricas mais ricas e mais apreciadas, principalmente no Nordeste. Faz parte do repertório das Festas Jesuínas, e é apresentado de 24 de dezembro a 6 de janeiro, isto é, pelo Natal, Ano Bom e Reis. O Reisado é formado por um grupo de foliões, de pastores e pastoras que se reúnem numa espécie de rancho, com o fim de visitar as casas das pessoas mais gradas e hospitaleiras da região, a cantar e a dançar. Esse folguedo e mais outros deram origem ao atual Guerreiro. Para quem não tem conhecimento mais profundo sobre essas folias, o Reisado pode ser confundido com o Guerreiro pela indumentária. Todavia, os cantos, o enredo e a evolução são deferentes entre eles. Na página seguinte pode-se ver dois componentes do Guerreiro. Um é oriundo do Reisado, o Mateus, é aquele cujo traje é muito colorido calça comprida e frouxa, e jaquetão. Os personagens do Guerreiro normalmente usam roupas mais sóbrias e de cores distintas. (Figura 07).
  • 24. 24 Figura 07 – Chapéus Típicos do Guerreiro Fonte: www.aiegua.com.br/folclore.php 1.4.2 – Elementos que compõem o guerreiro Para dissertar melhor sobre a composição do Guerreiro, foi-lhe atribuída por mim, uma classificação para que o leitor tenha um melhor entendimento. Primeiro, quero salientar que essa iniciativa não foi baseada em qualquer informação científica ou metodológica, e segundo, que apenas dividi em três categorias básicas do ponto de vista estrutural. O Guerreiro fica assim distribuído: elementos simbólicos, iconográficos e estéticos. Os elementos simbólicos são os personagens que compõe o corpo dançante do folguedo, tais como a Rainha, a Lira, o Índio, o Mateus etc. Cada um destes personagens, tem uma história e sua simbologia dentro do enredo. Os elementos iconográficos, estão representados pelas vestimentas, ornatos e chapéus. Cada um também tem uma história e sua representação dentro do enredo e das crenças de cada povo. E os elementos estéticos são representados pelas formas dos chapéus, das vestimentas, dos adereços e das cores. Tudo tem origem e referenciação gnóstica13 . 13 Gnóstico (a) - Gnose é o substantivo do verbo gignósko, que significa conhecer. Gnose é conhecimento superior, interno, espiritual, iniciático. No grego clássico e no grego popular, koiné, seu significado é semelhante ao da palavra epistéme. Em filosofia, epistéme significa "conhecimento científico" em oposição a "opinião", enquanto gnôsis significa conhecimento em oposição a "ignorância", chamada de ágnoia.
  • 25. 25 Os personagens do Guerreiro são em número maior que no Reisado. Todavia, cada personagem tem sua função dentro do enredo do folguedo, inclusive com loas (versos) e cantoria, diferenciando um pouco do outro. Na Figura 08 se ver um desfile de Guerreiro, e na Figura 09 o de um Reisado respectivamente, dá para se perceber a ligeira diferença de trajes e ornatos. Figura 08 - Foto de Celso Brandão – Guerreiro em evolução Fonte: www.ideario.org.br/expresculturais/guerreiro/guerreiro.htm Figura 09 - Foto de Celso Brandão – Reisado em evolução Fonte: www.ideario.org.br/expresculturais/guerreiro/guerreiro.htm No anexo 01 destaco a título de informação as funções de cada personagem do Reisado e do Guerreiro com suas semelhanças e diferenças. No Guerreiro as vestimentas imitam os antigos trajes nobres da colônia, sendo adaptados ao gosto, e, sobretudo, à condição
  • 26. 26 econômica de cada grupo que em sua maioria são bem baixas. Os homens usam calção com meiões até o joelho e, as mulheres saiotes e camisetas nas cores vermelha e azul caracterizando os dois cordões, coletes verde e amarelo, mantos, tênis preto e meião branco, fitas coloridas acetinadas, espelhos, contas de aljôfar, enfeites de árvore de natal, guarda- peitos, espadas e espadins. Os chapéus dão o toque característico do folguedo. Já no Reisado os trajes normalmente são iguais, variando apenas de modelos e cores. Nas cabeças são usadas coroas por todos componentes. No Guerreiro o mestre e os embaixadores trazem chapéus em forma de igrejas e catedrais; o rei e a rainha usam coroas; o general com seu uniforme militar de brim branco com dragonas, faixas e cinto, e quepe do antigo sistema militar, ou ainda chapéu de dois bicos enfeitados de arminho; os índios usam calções sob a tanga de penas, cocar e braçadeiras e perneiras de penas, camisa justa de meia, arco e flecha. Como dissemos acima, a diferença de trajes, de enredo, de cantoria e evolução do Guerreiro para o Reisado, é substancial. No Guerreiro existem mais cantos, mais entremeios, mais figurantes e a variedades de adornos de cabeça é bem maior que no Reisado. A temática do enredo também é ligeiramente diferente. Enquanto no reisado se fala mais sobre o nascimento do Menino Jesus, no Guerreiro a temática abrange mais as conquistas de uns sobre outros. Nas Figuras 11 e 12 podemos notar que são dois grupos de Guerreiros diferentes em evoluções. Figura 10 – Apresentação de Guerreiro Figura 11 – Apresentação de Guerreiro Fonte:www.amigobrasileiro.com/pt/maceio.php Fonte: www.ufal.br/guerreiropornatureza/vencedor.ht
  • 27. 27 1.4.3 - Reisado Como foi possível ver visualmente o que existe é uma ligeira diferença do Guerreiro para o Reisado, não obstante, o Guerreiro carrega em seu bojo grande influência daquele. A maior parte da iconografia do Guerreiro é própria deste, entretanto a objetividade como dança dramática, a música e a composição do grupo inspiraram-se no Reisado. ANDRADE (1959:34): A palavra Reisado deriva evidentemente de “Reis”, e foi uma masculinização brasileira de palavra portuguesa mais logicamente criada. Em Portugal existe o termo “Reisada”, como quem diz “rapaziada” e “patuscada”, coisas próprias de rapazes ou patuscos (13). A reisada é especialmente minhota, e consiste ou consistia primitivamente na representação dum auto sobre tablado, com pano de chita ao fundo, por onde saem os atores Alberto Pimentel que na ! Triste canção do Sul” dá Reisada como sinônimo de canção, já nas “Alegres Canções do Norte” descreve com minúcia a representação duma Reisada na aldeia de Friães (Minho) O auto se intitula !Representação de Herodes com u (sic) Nascimento do Menino”, e tem como personagens Herodes, Bambalho, Capitão Representante, Reinaldo, Conde Alberto, reis Balthazar, Belchior e Gaspar, moços de Balthazar e Belchior,Preto, Fama Ligeira, Anjo, pastores Alberto, Fileno e Albano, pastoras Belmira e Florinda, sábios Sadoc e Haiquim, Juiz, Guarda-Bandeira, Simeão. Um pouco antes o Autor afirmara que as Reisadas das várias aldeias minhotas que cita, são autos de Natal; e leite de Vasconcelos criticando o livro repete que se trata duma “Reisada ou auto popular de Natal”. Pelo exposto acima, podemos concluir que o Reisado brasileiro é naturalmente oriundo das Reisadas portuguesas, que eram espécies de teatros populares de tablado, onde se narravam passagens bíblicas. Daí sua grande identificação religiosa, porém, com fortes sinais da realeza, como é o caso da presença dos três reis Magos e seus servos. Ora, todos sabemos que os Reis magos levaram diversos presentes ao Menino Jesus, e esses presentes eram ouro, tecidos e fitas coloridas de muito brilho. Também sabemos, que naqueles tempos muitas roupas eram tecidas com fios de ouro e prata, e que as paramentas dos reis, como os ornatos de cabeça, cintos, escudos, etc. eram feitos de metais valiosos como ouro e prata, às vezes revestidos de pedras preciosas. Deduz-se daí o porquê o Reisado brasileiro é rico em brilho e cores em suas vestimentas. Mário de Andrade, continua discorrendo sobre o que é o Reisado, ou Reinados para alguns; e que é praticado em Minas Gerais, Bahia e Sergipe. E sempre enfatiza: “...dança dramática, apresentada em tablado, com algumas variações e inclusão de negros caracterizando as congadas, que também são danças africanas com forte identificação
  • 28. 28 de cortejo”. Daí, se deduzir, que o Reisado brasileiro tomou outro rumo cultural sendo transformado no que é hoje. O Guerreiro por sua vez, por ter fortes traços hereditários daquele, carrega em sua composição algumas lembranças do Reisado. Como vimos, o tema principal do Reisado é sempre religioso, alusivo ao nascimento do Menino Jesus. Porém foi sendo misturado a outras vertentes culturais e profanizou-se. O que importa salientar neste caso, é, que tanto a indumentária, como a música e a evolução (Coreografia), estão assentadas em representações teatrais e simbólicas de uma passagem bíblica, fato que foi o nascimento de Jesus. Daí, o forte simbolismo presente. E baseado nisso, LIMA (1962: 97): (...”O Reisado Alagoano”, é uma representação dramática, geralmente, curta e pobre de enredo, quase sempre acompanhada e precedida de canto...”). Portanto, o Reisado que deu origem ao Guerreiro, se apresenta como um folguedo mais pobre que o seu sucessor. No estado de Alagoas há uma predisposição do povo pelo Guerreiro; todavia, existem muitos Reisados em atividade na região nordestina. 1.4.4 – Pastoril Do pastoril, o Guerreiro herdou também fortes traços de simbologia. Senão vejamos: O brincante, reproduz peças natalinas, defrontes a presépios ou em tablados armados com esta finalidade, e é o mais popular e difundido folguedo de Natal no Folclore de Maceió. É uma fragmentação do Presépio, sem os textos declamados e diálogos, constituído apenas por jornadas soltas, canções e danças religiosas ou profanas, de variados estilos e épocas, sem qualquer ordem ou seqüência lógica. Apenas a jornada inicial - ou Boa Noite - e a final - ou Despedida -, obedecem esta ordem, sendo as demais, geralmente hozanas ao nascimento de Jesus ou disputas entre os dois cordões, de livre criação do grupo. Em geral, participam apenas moças, (pastorinhas), em número de doze, ou mais, divididas em dois cordões, o azul e o encarnado, cores que ostentam nas vestes (faixas, aventais, saias, blusas ou boleros). Os dois cordões, postados em fila no palco, um à esquerda e outro à direita. No centro entre os dois cordões e à frente se posta a Diana, pastora que veste metade de encarnado e metade de azul e não tem partido. O cordão encarnado é encabeçado pela Mestra e o azul, pela Contra-Mestra.
  • 29. 29 O Pastoril é encenado em casas de família, colégios, teatros e em festas de ruas ou praças, com acompanhamento de orquestra variada, desde violões e sanfonas, até conjuntos de sopro e percussão. As pastorinhas cantam diversos trechos de músicas que são entremeadas de improvisos quando elas se dirigem aos espectadores para tecer elogios e conquista de votos. Quando o elogiado é sensibilizado normalmente oferece uma quantia em dinheiro que é colocado em uma urna para o grupo ou afixado em suas vestes com alfinete, como forma de agradecimento e voto. Os demais donativos doados em dinheiro vão para urnas previamente colocadas em locais estratégicos. Após a apresentação, a arrecadação é dividida. Parte vai para o grupo cobrir as despesas e parte vai para as dançarinas. A lira do Guerreiro é uma figura saída do pastoril. E alguns cantos entremeiam estrofes advindas desse folguedo. A indumentária do pastoril é rica e variada, porém, obedece sempre a divisão em dois cordões azul e encarnado com uma Diana dividindo os dois. No artigo a seguir extraído da Internet (2005), de autoria não identificada, extraí o seguinte texto: É fato comprovado pela grande maioria dos estudiosos que se dedicam às pesquisas em torno das manifestações culturais do povo brasileiro, a falta de elementos profanos nas suas origens, principalmente, as nossas danças dramáticas. Lembramos, por exemplo, Gilberto Freyre e Mário de Andrade, quando são unânimes em afirmarem a origem religiosa das manifestações artísticas populares, mesmo que tenham suas bases ou alimento em fatores econômicos, mas se considerarmos o sentimento religioso como permanente e solúvel, sua afirmação se dá pela mística religiosa, justificando-se através do mistério qualquer variante de algum fenômeno vital. Site: www.recife.pe.gov.br/especiais/brincantes/encarte8.html Ainda destaco o conteúdo do texto seguinte, extraído do mesmo site (2005) onde o autor não identificado referencia ANDRADE (1959: 23) da seguinte maneira: ”Outra característica importante salientada pelo folclorista, é que, na maioria dos nossos folguedos encontramos a morte e ressurreição da entidade principal ou como nos Pastoris e Cheganças, a luta do bem contra o mal, caracterizando a noção de perigo e salvação". Podemos perceber, neste caso, que sempre existem dois lados em confronto, o bem contra o mal; os cristãos contra os mouros, a morte e a vida, e assim por diante, sempre dando uma conotação de embate. No caso nordestino, vem desaguar na rivalidade entre os cordões azul e encarnado. Entretanto, é claro, que nos Pastoris, originários da Península Ibérica, o conceito de morte e ressurreição não aparece de forma contundente, mas há no chamado Pastoril profano, a luta entre o cordão azul e o encarnado, revelando um confronto se
  • 30. 30 considerarmos o cordão encarnado como o mais audaz, atrevido, por assim dizer, do que as pastoras do cordão azul. De qualquer forma foi a finalidade religiosa que deu a essas danças dramáticas ou bailados, como diz ANDRADE (1959: 24 ) "Foi a finalidade religiosa que deu aos bailados a sua origem primeira e interessada, a sua razão de ser psicológica e a sua tradicionalização". O Pastoril, mesmo em suas origens, nunca foi inteiramente popular, mas burguês, e, sua justificativa se dá com os Presépios, pois, sistematicamente, os pastoris eram dançados em frente da lapinha, representação estática do nascimento do menino Jesus. Normalmente só as mocinhas de família, faziam parte dessa encenação. Com poucas diferenças, os estudiosos afirmam que as comemorações do Natal, a festa da Natividade, surgiram no início do século X. Conforme comprovam as pesquisas de ANDRADE (1959: 344): "a idéia de comemorar o nascimento do Cristo, através de representações dramáticas, foi do monge Tuotilo, morto em abril de 915, na Abadia de São Galo, centro germânico onde nasceram, ou donde pelo menos se espalharam com maior autoridade as Seqüências e os Tropos". O Tropo consistia em intercalar textos novos e frases melódicas novas, em textos religiosos oficiais da Igreja, cantados em gregoriano. Logo, tanto na França como na Inglaterra, os tropos dialogados do natal se desenvolveram rapidamente, transformando-se em núcleos do drama litúrgico medieval. Dividia-se em três partes principais: A anunciação do nascimento do Cristo aos pastores; a adoração dos três reis magos; o massacre dos inocentes. Os dois primeiros temas se conservaram vivos e se desenvolveram com rapidez por todo o ocidente europeu e Portugal, através dos jesuítas, que assim repassaram para o Brasil Colônia. ANDRADE destaca (1959: 352): “...apenas no período oitocentista o pastoril teve seu brilho e apogeu”. Essa afirmação está relatada no livro Danças Dramáticas Brasileiras. É curioso observar que essa dança dramática não teve uma repercussão nacional diferente dos presépios que se tornaram tradição em todo o país, talvez, por ser um “fenômeno de imposição burguesa”, como afirma ele. Porém, em Alagoas e Bahia este folguedo tem forte penetração na sociedade, que participa ativamente de suas encenações, fornecendo a matéria prima que as componentes.
  • 31. 31 Ao enveredar por outros caminhos, o Auto Pastoril transforma-se em sincretismo profano-religioso, tornando-se, muitas vezes, mais profano, que religioso. Uma vez que, suas características ressaltam a licenciosidade do Velho do Pastoril e a sensualidade das Pastoras. No meio dos dois cordões, cada um comandado pela Mestra (cordão azul), e, Contra-mestra, (cordão encarnado), vamos encontrar a Diana, vestida metade azul, metade encarnado como já citado anteriormente. O Velho, conhecido como Bedegueba14 , mas que toma diversos apelidos é uma espécie de bufão, de palhaço de circo, que comanda as jornadas (cantos das pastoras) e se esparrama em piadas, numa atuação que ressalta o histrionismo, a improvisação. (Figura 10). Figura 10 – Bedegueba ou palhaço de pastoril Fonte: Jaime Fotografia Na Figura 11 pode-se ver o cordão vermelho de uma dessas entidades, em pleno exercício de evolução. Veja que a indumentária difere sobremodo, da que apresentaremos mais adiante quando veremos o cordão azul de outro pastoril. 14 -Bedegueba- espécie de Chefe, Patrão, conforme o dicionário Aurélio.referenciado página 194.
  • 32. 32 Figura 11 – Apresentação do cordão encarnado do pastoril Estrela Brilhante Fonte: Banco de Imagem / JC Dentre os outros personagens do pastoril profano, também desfilavam o Anjo a Estrela do Norte, o Cruzeiro do Sul, a Cigana, além de outras figuras que aparecem ocasionalmente por influência do local, da região. Hoje o pastoril perdeu em sentido hierático e lírico, mas transformou-se num gênero popular de representação, diferenciado e que atingiu sua própria forma. Não é questão de involução mas de interferência dos artistas populares que com os seus espíritos inquietos e brincantes conduzem esses folguedos. O cordão encarnado, pela própria razão de sua estrutura cromática, em que o vermelho é mais vibrante, se revela na maioria dos pastoris, como sendo o cordão da força, da avidez. Aquele que sai à luta e busca novos horizontes. Simboliza as invasões Mouras. É o cordão da conquista, é ele que toma a iniciativa provocante do canto e desenrolar do folguedo. Por essa razão, se conota nele a dita profanação. Já o azul, que é uma cromatização calmante e passivadora, representa o cordão dos católicos, de melhor índole, segundo a religião cristã. O pastoril é um auto que conta toda uma saga dos cristãos nos momentos que viveram sob a perseguição de dominadores como Herodes por exemplo. A comicidade, uma das características mais fortes dos espetáculos populares do Nordeste, aos poucos também foi aparecendo no Pastoril. Com as pastoras divididas em dois cordões, como dito anteriormente azul e encarnado; possibilitou a formação de partidos que se batiam pelas cores de suas preferências e muitas vezes terminava em pancadaria. O leilão também despertava entusiasmo e quando o pastoril saiu do amadorismo para um certo
  • 33. 33 profissionalismo, acentuou-se a sensualidade e sexualidade e era comum um pastoril terminar com o rapto da Mestra, Contramestra ou da Diana. Na Figura 12 pode-se visualizar o cordão azul de ouro do pastoril Vitória Régia, e, verificar-se que o conjunto traja outro tipo de vestimenta diferente do anterior, entretanto com a mesma beleza estética. Figura 12 – Cordão azul do Pastoril Vitória Régia em apresentação Fonte: Banco de Imagem /JC 1.4.5 – Caboclinhos Dos caboclinhos pode-se destacar a figura do índio Peri presente no Guerreiro que caracteriza a luta dos índios contra a ocupação do espaço nativo. E, segundo LIMA, (1962: 155): Caboclinhos existem ou existiram nos estados da Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Alagoas, e Minas Gerais. Nesta última região, são chamados Caboclinhos. Também dizem ”Os caboclos”, nome mais antigo, pelo que me informaram, escreve Mário de Andrade em “Danças Dramáticas do Brasil” O grupo se apresenta aos olhos dos folcloristas que o registraram e estudaram como o de um folguedo popular de inspiração indígena. Com figurado característico, partes faladas ou representadas, os caboclinhos se exibem pelas ruas das cidades, nas festas religiosas ou durante o carnaval.
  • 34. 34 São grupos de homens e mulheres, com cocares de penas de ema, pavão e avestruz. São caboclos que evoluem nas ruas em duas filas, ao som dos estalidos secos das preacas - um objeto que reproduz o arco e a flecha e que emite um estalido quando percutido. A manifestação dos caboclinhos é uma representação do povo indígena e é, também, um dos mais antigos folguedos populares do Brasil. Os caboclinhos preservam passos e danças nativas que se somaram às influências européias e negras. Os personagens dos caboclinhos são vários e estão dispostos, a título de informação no anexo I deste trabalho junto com os dos outros folguedos. A orquestra é formada pela inúbia15 (gaita de taquara), os caracaxás16 , o tarol17 e o surdo18 , além das dezenas de preacas que estalam num ritmo frenético. Os caboclinhos tomam várias estruturações dos grupos, variando muito de uma localidade para outra, inclusive na vestimenta. LIMA (1962: 155) diz: “ ...De acordo com pesquisa, ainda inéditas, de Guerra Peixe, os Caboclinhos de Recife, Pernambuco, possuem nos seus diversos grupos ou tribos uma organização mais ou menos semelhantes...” Ora, o que o autor quer dizer, é que esse folguedo varia de lugar para lugar, na indumentária, na evolução, no canto e no atos; entretanto, no Caboclinhos de Alagoas, que veio a ceder parte da origem do Guerreiro a característica lhe é própria. Senão, vejamos o que diz LIMA (1962: 157): Em Alagoas, segundo Theo Brandão, o folguedo é “estruturalmente um Reisado”. “O próprio traje da maioria dos personagens, bem como a denominação de grande número destes, é o mesmo do Reisado, com acréscimos naturais, em virtude do seu grande número de partes”. Entretanto, o mesmo autor afirma que há Caboclinhos que obedecem “ao estilo convencional de índio”, mencionando os Índios de Ouro, que apareceram em Maceió no ano de 1941. Como vimos, a variedade de formas do folguedo é grande, porém a que originou o Guerreiro, é a de Alagoas. Na Figura 13 é possível ver uma organização de caboclinhos desfilando. Não tecerei maiores comentários a respeito dos Caboclinhos por entender que sua contribuição no Guerreiro restringe-se à figura do índio Peri que no enredo do Guerreiro é o contraponto ao Rei e sua invasão e dominação das terras indígenas brasileiras. Não que o assunto seja de pouca relevância, mas por entender que sua alegoria restringe-se à figura do índio, no conjunto não acrescenta muito ao meu trabalho. Entretanto, entendi que devia 15 - Inúbia é uma trombeta de guerra estridente usada pelos índios. 16 -Também conhecido como reco-reco, regue-regue, o caracaxá é feito com um pedaço de bambu ou taquara com talhos transversais. A execução é feita passando, sobre os talhos, uma vareta de madeira ou de ferro. 17 -Tarol espécie de caixa, semelhante às usadas em bandas marciais. 18 - Espécie de bumbo ou tambor, semelhante aos usados em bandas de música.
  • 35. 35 reservar um espaço para esta figura, pois fala da nossa gente, da nossa cultura, do nosso povo. E realizei um painel exclusivamente a este personagem em forma de cocar. Os caboclinhos ainda existem na região nordestina, como na cidade do Recife, onde tem forte aceitação pela população, todavia, sua caracterização hoje, está mais para bloco carnavalesco que para folguedo natalino ou junino. A manifestação dos caboclinhos é uma representação do povo indígena e é, também, um dos mais antigos bailados populares do Brasil. Os caboclinhos preservam passos e danças nativas que se somaram às influências européias e negras. Segundo o contido no site caboclinhos (2005), os mais antigos caboclinhos de Pernambuco são as tribos Canidés (1897), Carijós (1897), Taperaguases (1916), Caboclos Tupy (1933), Tabajaras (1956) e Tapirapés (1957). Figura 13 – Caboclinhos do recife em desfile Fonte: photos © O Globo / © JB / © A Tarde / or current holder Também existem as tribos, que são agremiações carnavalescas que além dos caboclinhos, é outro folguedo evocando personagens indígenas que também enriquecem a beleza do carnaval de Pernambuco. Suas fantasias são muito influenciadas pelo imaginário do cinema americano: um exemplo são as índias com machadinhas e índios com pequenas lanças, todos vestidos com calças ou saias num estilo vagamente faroeste. Acompanhados por gaitas, ganzás e surdos, as tribos evoluem com os rostos pintados de vermelho. As mais conhecidas de Pernambuco são Paranaguases (1953), Tupy-Guarany (1956), Tupy Papo Amarelo (1962) e Tapajós (1985).
  • 36. 36 1.4.6 – Chegança Quanto à chegança, sua contribuição para o Guerreiro é de grande importância, porque fala de conquistas. A Chegança, segundo ANDRADE (1962: 118), constitui junto com o Fandango, o que poderia ser melhor e mais belo dos trabalhos do mar Português. Já para outros pesquisadores e estudiosos da cultura brasileira, a Chegança tem sua origem aqui mesmo no Brasil. Um Exemplo é o que LIMA expõe (1962: 196): É possível que o primeiro registro da Chegança, que alguns autores designam pelo nome de “Chegança de Mouros”, seja o de Henry Koster. Na obra ”Viagem ao Nordeste do Brasil”, descreve um folguedo realizado dentro do mar e nas praias da ilha de Itamaracá, em 1814, no qual houve lutas entre mouros e cristãos, que terminou com a vitória destes e o batismo do rei mouro. Nesse registro, encontramos alguns elementos essenciais da folgança ou Chegança de Mouros referida, depois, por Silvio Romero, Pereira da Costa e Gustavo Barroso. O que é possível perceber depois deste destaque, é que a Chegança é um folguedo cujas raízes podem até vir de outras partes do mundo, porém, sua sedimentação histórica está no nordeste brasileiro, onde até o momento é praticada com grande ênfase. Existem variações de canto, coreografia e de indumentária, mas o cerne da composição é sempre o mesmo. Relata as conquistas e reconquistas de ambas as partes entre Mouros e Cristãos. A Chegança surgiu, segundo afirma LIMA (1962: 197): que conforme “...Um informante de Antonio Osmar Gomes, de Vilanova e redondezas, no Estado de Sergipe, vem em comemoração às vitórias de Carlos Magno sobre os mouros, quando andava procurando converter os infiéis à lei cristã, batizando-os”. Na chegança, que varia em indumentária canto e evolução, de um lugar para outro, podemos verificam-se algumas variações no conjunto dos componentes, entretanto sua estruturação básica é a mesma. LIMA (1962: 197): Seus figurantes são marinheiros ou marujos e oficiais da Marinha e como tais se apresentam vestidos. Em Vilanova, compreendiam: primeiro-tenente, segundo-tenente, tenente-ajudante, capitão-tenente, capitão-piloto, capitão- patrão, general-mar-guerra, Padre, Doutor-cirurgião, dois Guardas-marinha, dois Gajeiros, dois calafatinhos, um Cozinheiro, quatro caixas, vinte marinheiros e dois mouros. Em Piassabuçu, na margem alagoana do Rio São Francisco, segundo ainda Antonio Osmar Gomes, apareciam três mouros e um Sargento-de-mar-e-guerra e não se registrava a presença dos calafatinhos e dos caixas. Em Maceió, observamos também o almirante, Contra-almirante,
  • 37. 37 dois mouros, o rei, ou general e o príncipe, ambos com manto vermelho, coroa de lata, enfeitada com purpurina, cabelos longos feitos de corda desfiada e espadas nas mãos. Na versão de Vilanova, em Sergipe como diz LIMA, (1962: 197): “...o folguedo começa com um convite às pessoas para virem ver a ‘nau tirana’, que vai para alto mar, a fim de lutar por Deus e libertar a Terra Santa“. Percebe-se aqui que a influência desse folguedo no Guerreiro é que realmente lhe assegura o nome que usa. E a presença do General, assim como do rei, rainha e demais figuras da realeza que aparecem no Guerreiro, são advindas das culturas, do Reisado e da Chegança. Os personagens da Chegança usam trajes semelhantes aos das Marinhas de todo o mundo, como também alguns postos. Conforme já foi citado por LIMA (1962: 197) tendo cada um deles uma participação especial no drama e suas participações são chamadas de entremeios. Quatro ou seis pandeiros acompanham a coreografia que é seguida por coro de vozes. O General, comandante das evoluções, usa um apito para a mudança das marchas. O pandeiro é o principal instrumento de acompanhamento. A batida forte e ritmada dá o tom dos cantos e evoluções. A apresentação completa da Chegança demora, geralmente, 60 minutos, e é bastante teatral, composta basicamente por duas partes: o cortejo – o deslocamento do grupo para o local da apresentação, e, a parte dramática, compostas por diversas encenações. A Chegança tem sua inspiração na reconquista espanhola dos embates travados entre Cristãos e Mouros. Trata-se de um folguedo antigo, cuja ação transcorre em terra, onde está o quartel da mourama19 , e no mar, por onde chega a cristandade. É apresentada sempre no ciclo natalino. São muitos os cânticos de rua, incluindo a saudação e a despedida, e os cânticos embarcados, por parte dos cristãos. As indumentárias desse folguedo, variam do esfuziante colorido das camisas (Figura 14), em alguns lugares, ao rigor dos uniformes de marinheiro. Em alguns lugares são dançados o fandango e a marujada, que têm grande semelhança no vestir, porém com origem e enredos diferentes. Os mouros, com suas roupas vermelhas, seus armamentos, não cantam, salvo quando, depois de vencidos e batizados, repetem o coro dos cristãos, como um pedido de clemência. 19 - Mourama – Derivativa de mouros, lugar onde se estabelecia uma cidadela de mouros.
  • 38. 38 Figura 14 – Exemplo de vestimenta de chegança Fonte: www.ivanpaixao.com.br/sergipe_folclore.asp O modo de trajar das cheganças é variado; entretanto, o básico usado no estado de Alagoas é o uniforme de marinheiro com as cores, azul e branco bem definidas, que conforme LIMA, (1962: 197): “Figurantes - São marinheiros ou marujos e oficiais da Marinha e como tais se apresentam vestidos”. Nas Figuras 14 e 15, observa-se que existem diferenças nos uniformes, porém segue sempre a mesma padronização. Figura 15 – Apresentação de uma chegança Fonte: www.recife.pe.gov.br/especiais/brincantes/encarte8.html Como exemplo de avivamento das culturas nordestinas e principalmente da alagoana, destaco como referência, um trecho do Trabalho de Conclusão do Curso de Jornalismo da UFAL, dos formandos: Maikel Ranyeri Marques de Melo e Patrícia Yara Santos Silva, na parte da justificava se sua monografia, em que fala do Guerreiro e sua fundadora:
  • 39. 39 O resgate de uma manifestação folclórica por meio do mais novo veículo contemporâneo de comunicação, a Internet, que o presente trabalho pretende realizar, destacando-se a importância de uma mulher que esteve por muito tempo à frente de um folguedo popular genuinamente nosso, o Guerreiro, importa para a valorização da cultura popular alagoana, raiz e fonte de arte e sabedoria das classes subalternas. Já que para as camadas populares, a comunicação formal não cumpre a função de divertir, educar, informar e refletir, estes papéis são transferidos para o campo dos folguedos, em especial o Guerreiro, principal objeto de estudo deste trabalho. Assim, fica claro que esse tipo de manifestação folclórica, ao promover o resgate dos costumes de um povo, também desenvolve o papel de refletir o querer, o saber e o sonhar do grupo que o preserva, se transformando num instrumento de intercâmbio das vivências e tradições da cultura de Alagoas. Situando-se no campo da folkcomunicação e trabalhando com temas como a riqueza regional e o seu resgate universal, o folclore e sua valorização, o sistema econômico do engenho e sua influência nos costumes do povo nordestino, a pesquisa realizada pretende discutir a troca de idéias, opiniões e informações por meio das manifestações típicas da cultura popular. No Departamento de Comunicação Social da Ufal faltam trabalhos que se situem no campo da folkcomunicação, bem como pesquisas mais delimitadas que ofereçam um maior conhecimento da cultura popular alagoana. Entretanto, essa carência cultural não só se restringe ao meio acadêmico. Na interconexão mundial de computadores, a chamada Internet, ou seja, no infinito universo que ela abriga, quase que inexistem trabalhos dessa natureza. É daí que se reforça a importância da pesquisa realizada, pois é necessário que o mundo conheça, através do ciberespaço , pelo menos uma fatia da imensa riqueza cultural do povo alagoano, aqui representada por uma autêntica manifestação folclórica que tanto contribuiu para a manutenção das tradições populares: o Guerreiro de Dona Joana Gajuru. http://www.chla.ufal.br/multireferencial/gajuru Embora não concorde que estejam fazendo resgate algum, já que a manifestação cultural ainda existe por si só, achei interessante citar este trecho do trabalho dos acadêmicos acima referenciados, por entender que é de suma importância que jovens se preocupem com a memória cultural, seja de que estirpe for. No caso acima, são formandos em jornalismo, mas poderiam ser de qualquer outra área de informação e cultura. O importante é que não se deixe morrer a memória dos costumes, danças e rituais de um povo. Um país que se preza, zela pela sua história cultural.
  • 40. 40 CAPITULO II PROCESSO DE CRIAÇÃO COM MADEIRA RECORTADA METODOLOGIA Na elaboração dos painéis, desde o momento de pensar que matéria seria utilizada até a experimentação de um determinado material, me vi envolvido em dúvidas a respeito do que deveria utilizar. Qual o mais adequado, o mais econômico e, o mais ecologicamente correto. Fiz uma experiência com compensado e não gostei do resultado. O compensado, definitivamente não é o material mais indicado para o exercício da Marchetaria. Pude observar que em espessura inferior a dez milímetros, ele não se adaptou às reais necessidades dos painéis. Em dois exemplares que utilizei tal material, eles se deformaram, o que me levou, a revesti-los com molduras externas, interferindo de alguma forma na moldura de Marchetaria por mim confeccionada. Por orientação da pré-banca, fui aconselhado a retirar alguns detalhes que estavam incomodando à observação dos trabalhos. Mas, para não deixar as laterais à vista, fui orientado a reformular o adorno lateral do suporte de outra maneira, de tal forma que, não interferissem na estética dos painéis. Como já havia feito esses dois exemplares naquele material, a banca me concedeu a permanência das molduras, entretanto, exigiu a retirada dos inconvenientes. Entendi aí, que é de suma importância haver uma intimidade entre o artista e o material com qual vai trabalhar. É uma espécie de simbiose. Um estar para outro na mesma razão e proporção de suas qualidades. E revendo este fato lembrei-me de uma citação de OSTROWER, (1990: 22): “Quem não vivenciar a sensualidade da matéria com que trabalha, como profunda verdade existencial, e como compromisso irredutível com o próprio ser, não há de se tornar artista”. É bem verdade, a qualidade da matéria com que se trabalha é de suma importância, e isso às vezes nada tem a ver com preços. É mais uma questão de identidade entre as partes.
  • 41. 41 Foi a partir de determinadas observações que cheguei à conclusão de que para se chegar a objetivos proveitosos no campo das artes, necessário é, que sejamos obstinados e coerentes com o que nos propomos a realizar. E ainda mais uma vez, refleti sobre uma citação de OSTROWER (1990: 52): “O mundo de nossa sensibilidade é um mundo de diálogos com as formas de matérias, físicas ou psíquicas”. Ser artis ‘ta é antes de tudo ter consciência de suas limitações e suas potencialidades. FRAZÃO (2005) diz: “Artista é antes de tudo um ser com vocação religiosa. Existem sim muitas mitologias mas antes existe o poder de vir a ser descoberto pela mídia para tornar-se um ser mítico - é desta forma que se separa o joio do trigo. O artista não esta interessado em aparecer antes do seu trabalho”. Mas também observei Matisse na citação feita em SILVA (2005): “O que eu busco, acima de tudo, é expressão... A expressão, no meu modo de pensar, não consiste na paixão espelhada num rosto humano ou denunciada por um gesto violento. Toda a disposição de minha pintura é expressiva.” 1 – MARCHETARIA O meu trabalho foi pensado de forma que pudesse realizá-lo em marchetaria, utilizando os recursos disponíveis no momento. Parti da premissa, de que não dispondo de uma gama maior de materiais e ferramentas mais elaboradas, que pudesse realizar satisfatoriamente o que me propus a fazer. E para isso, inicialmente procurei verificar no comércio de Campo Grande, MS., o que encontraria de lâminas e de ferramentas. E foi pensando como deveria resolver as deficiências encontradas que cheguei a uma conclusão: buscar recursos técnicos e materiais fora da cidade. A partir disso procurei pela Internet empresas que fornecessem o material necessário. Por questões econômicas, não consegui tudo que pretendia, algumas empresas só vendem por atacado. Fortuitamente, descobri um ateliê que vende lâminas de cores e texturas diferenciadas em pedaços de 0,30 m X 0,30 m, condição necessária ao acomodamento da embalagem para transporte. Dessa forma, o custo unitário saiu um pouco alto o que me limitou a adquirir apenas algumas variedades. De posse do material para mão-de-obra e de algumas ferramentas manuais como estiletes, tesouras e mini-formões, comecei a planejar na mente o que deveria levar a efeito na prática. Depois do processo idealístico, partí para a combinação de materiais. Fiz inúmeras combinações visuais entre as lâminas, obedecendo à disponibilidade do material. E o resultado mais adequado que pude atingir é o que ora é apresentado. Certamente outras
  • 42. 42 infinitas combinações poderiam ser feitas, mas para mim o que ora apresento foi o que melhor se ajustou às condições e materiais disponíveis O que pensei em termos de formas do que iria reproduzir, não saiu exatamente de minha imaginação, pois queria fazer um trabalho que se baseasse em algo já existente, e que não destoasse muito do meu propósito que era fazer uma releitura do chapéu do Guerreiro em uma linguagem diferente da que ele se apresenta naturalmente. Para essa nova releitura, escolhi a Marchetaria. Parecia-me mais fácil. Mas não foi. Isto, pela limitação de variedade de materiais e cores. O que limitou sobremodo muitas alternativas. Reproduzir imagens no bidimensional usando a linguagem visual da marchetaria, não a mesma coisa que usar tinta, pastel ou crayon. Experimentei alguns modelos antes de iniciar o trabalho definitivo e constatei que cada lâmina de madeira apresenta características próprias tais como: dureza, sentido das fibras, consistência, cor, reação à cobertura com seladora, disposição das fibras reação aos recortes etc. Foi a partir esse primeiro experimento, que tracei os primeiros rumos a serem seguidos. Numa primeira etapa, procurei fotos na Internet sobre os diversos chapéus do Guerreiro e procurei identificar aqueles que melhor se encaixavam nas minhas pretensões. A seguir selecionei aqueles que achei mais adequado às minhas condições de realizar o trabalho e à disponibilidade do material. Por isso, procurei analisar cautelosamente cada chapéu dos que pude ter acesso, e, estudei cuidadosamente suas formas e dificuldades de reprodução. Uma vez resolvida essa primeira etapa, passei para a execução do primeiro exemplar. Conforme relatei no início, verifiquei que o compensado não era a melhor solução. Foi aí que comecei a descobrir alguns segredos da Marchetaria. A cada pedaço de lâmina cortado e colado, eu ia adquirindo experiência na lida com a arte milenar. E pude entender o que diz MOTTA20 (2005): “Para se trabalhar em marchetaria é necessário se conciliar: amor, paciência e exclusividade.” E foi fazendo esse trabalho que constatei ser verdade a máxima acima citada. Inicialmente pensei em fazer fotografias de um único modelo de chapéu em oito posições diferentes, e depois reproduzi-las na marchetaria. Mas, logo percebi que não atenderia ao meu propósito. Quero mostrar um pouco da história do Guerreiro, com algumas de suas peculiaridades. Foi aí que decidi realizar oito modelos diferentes de chapéus, sendo 20 - Mauricio Mota é artista especializado em Marchetaria e tem o site disposto nas referencias bibliográficas.
  • 43. 43 quatro em formas de templos cristãos representado o sagrado e quatro de formas diferentes representando o profano. E isto se impõe pelo fato de que o Guerreiro é um folguedo sacro-profano. (Inicialmente não tinha a intencionalidade de ser profano como é afirmado por ANDRADE 1959: 21,22) “Assim, não é a profanidade do heroísmo, da coragem, dos feitos históricos, tradições e costumes raciais que provocou a fundação das nossas danças dramáticas” Mas, ao se mesclar com outras danças dramáticas como o Pastoril, a Chegança e os Caboclinhos, ganhou sua dose de profanação. Por isso, defini que quatro dos chapéus representariam o mundo sacro, e quatro retratariam o profano. Os chapéus característicos do Guerreiro, são os que trazem miniaturas de capelas, igrejas ou catedrais. Todavia, outros tantos fazem parte de outras vertentes como, o Índio, a Lira, o Mateus o Embaixador etc. Sobre cada um desses elementos falarei na parte que narra cada quadro mais especificamente. Deveria a partir dessa nova concepção idealística do que seria realizado, compor cada painel de acordo com o que foi previamente pensado. Escolhi quatro formas diferentes de retratar as imagens de templos e quatro tipos diferentes que não simbolizam o religioso e sim o profano. Quanto às formas, não as criei, procurei abstrair das fotos de chapéus capturados da Internet. Entretanto, dei a cada trabalho minha identificação pessoal. Não fiz cópia e sim uma mimese daquilo que serviu como referência visual dentro da linguagem adotada. No tocante às cores, procurei contrastar de modo que o objeto de apreciação ficasse o mais definido possível no contexto visual. Mas também brinquei com inserção de linhas num mesmo panorama visual, demonstrando ser possível se divisionar uma imagem num mesmo suporte cromático, usando apenas as linhas para separação do objeto do fundo. Os elementos do desenho estão presentes em todos os quadros. Alguns fundamentos também podem ser percebidos em FONTOURA (1982: 8): É evidente que o aspecto do objeto não se determina apenas pela imagem que impressiona o olho, nem tão pouco, pelos seus limites, mas este estudo deteve-se sumariamente à forma em si, uma visão geométrica a partir das denominadas ‘formas fundamentais’: o circulo, o triangulo e o quadrado. A minha intenção, é demonstrar que os meus modelos estão num espaço etérico sem qualquer base de sustentação, em plena leveza cósmica. Determinando dessa maneira não se tratar de uma simples imitação arquitetônica. Isso porque não quero deixar parecer apenas uma reprodução mimética do real-imaginário que é o chapéu do Guerreiro. A minha produção
  • 44. 44 pretende ser o que é, ou seja, é fruto de uma imaginação, não é o real. Procurei observar o que diz FOUTOURA (1982: 11): Levando-se em conta os ensinamentos da Gestalt, um objeto é uma forma na medida em que este objeto é percebido. A percepção da forma destaca sempre uma figura do fundo, que por outro lado, mantém uma relação de interdependência. Perceber esta relação de figura e fundo é fundamental no âmbito da composição e da criação artística, além de fornecer elementos para melhor leitura dos objetos. A figura está sobre o fundo e depende do fundo sobre a qual está localizada. Este, serve como uma estrutura ou suporte em que a figura está colocada, por conseguinte, determina a figura. A diferença de articulação entre figura e fundo é universal. Portanto, não só se apresenta em relação a suas configurações como também em relação a suas cores”. O mesmo campo cromático se parece mais colorido quando é figura do que quando é fundo. Ao ler minhas imagens o observador poderá constatar alguns princípios fundamentais conforme os relatados acima, além dos fundamentos básicos do desenho, como: a perspectiva, a luz, a sombra, a cor etc. Porém, procurei imprimir em alguns trabalhos princípios de desenho artístico como o escorso, a deformação, o contraste etc. A dimensionalidade dos painéis, obedeceu ao princípio do retângulo áureo como foi dito em capitulo anterior, entretanto, não foi seguido o rigor da perfeição do referido retângulo por questões de economia. Os painéis se apresentam nas seguintes dimensões: os dois primeiros que foram realizados no compensado de 6 mm, têm as medidas: 0,60m X 0,50m com as molduras, e os demais, feitos em MDF, ficaram com as medidas: 0,61 X 0,50m sem molduras. Procurei dimensionar as partes de maneira que o todo apresentasse uma visualização conjunta intercalando-se o fundo com o objeto descrito ou delimitado nesse espaço. Todos os cortes efetuados nas diversas tiras que compõem o trabalho, não obedeceram a qualquer forma previamente elaborada, mas, à disposição que a madeira ia se apresentando no que tange à dificuldade de lidar com ela. Num primeiro momento, ia sendo imaginada uma forma, mas, à medida que iam sendo recortadas as tiras de madeira, se fazia necessários ajustes e recortes que de certa maneira mudava aquilo que previamente se concebeu na minha mente. E isso é o mais importante para mim neste trabalho, pois não obedeci a cânones preestabelecidos, e, sim, à minha intuição e capacidade contornar problemas. Como diz FONTOURA, (1982: 17): O corte é um elemento fundamental neste estudo, pois é a causa para a obtenção das partes. Duas ou mais partes é um problema de seleção, porque o