Este recurso trata de uma ação civil pública ambiental proposta pelo Ministério Público contra uma empresa de energia elétrica alegando que a implantação de uma rede elétrica não observou as condicionantes impostas na licença ambiental de instalação. A sentença julgou o pedido improcedente por entender que a emissão da licença ambiental de operação comprovava o cumprimento das exigências. O relator entendeu que a perícia mostrou que alguns postes foram instalados em desacordo com a legisla
1. Apelação Cível n. 2013.056548-9, de Criciúma
Relator: Des. João Henrique Blasi
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL.
IMPLANTAÇÃO DE REDE DE ENERGIA ELÉTRICA.
ALEGAÇÃO DE INOBSERVÂNCIA DAS CONDICIONANTES
IMPOSTAS EM LICENÇA AMBIENTAL DE INSTALAÇÃO.
DISTÂNCIA ENTRE OS POSTES AFIXADOS QUE DESTOA DO
EXIGIDO PELA LEGISLAÇÃO MUNICIPAL. PROVA PERICIAL
NESTE SENTIDO. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
NECESSIDADE DE APLICAÇÃO DE MEDIDAS QUE
ASSEGUREM RESULTADO PRÁTICO EQUIVALENTE AO DO
ADIMPLEMENTO. DECISÃO REFORMADA. APELO PROVIDO.
O fato de ter sido concedida licença ambiental de operação
(LAO) não autoriza a presunção de que foram cumpridas as
condicionantes da licença ambiental de instalação (LAI), sendo
certo, ainda, que, conquanto não tenha havido pedido expresso
para a regularização do assentamento dos postes de energia
elétrica, as condições de validade da LAI obrigavam o
empreendedor a conduzir a obra em consonância com as normas
e a legislação municipal vigentes. Nessa contextura, deve ser
reconhecida a procedência do pedido, pois o laudo pericial
evidenciou a desconformidade das obras com as exigências
normativas municipais atinentes à distância mínima que os postes
de energia elétrica devem guardar entre si, implicando a
necessidade da adoção de medidas corretivas, que assegurem o
resultado prático equivalente, a teor do art. 84 do Código de
Defesa do Consumidor e do art. 21 da Lei n. 7.347/85.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.
2013.056548-9, da comarca de Criciúma (2ª Vara da Fazenda), em que é apelante
Ministério Público do Estado e apelada Centrais Elétricas de Santa Catarina S/A -
Celesc:
A Segunda Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, dar
provimento ao recurso para julgar procedente o pedido inicial a fim de que a
empresa-ré, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, cumpra as condicionantes da
2. Licença Ambiental de Instalação, regularizando, consequentemente, a situação dos
postes de energia elétrica assentados em desconformidade com o Decreto Municipal
n. 184/SA/2008. Custas legais.
Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs.
Desembargadores Sérgio Roberto Baasch Luz e Cid Goulart.
Florianópolis, 24 de novembro de 2015
João Henrique Blasi
RELATOR E PRESIDENTE
Gabinete Des. João Henrique Blasi
3. RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta pelo Ministério Público do Estado, pelo
Promotor de Justiça Luiz Fernando Góes Ulysséa, contrastando sentença proferida
pelo Juiz Edison Alvanir Anjos de Oliveira Junior (fls. 659 a 664), que julgou
improcedente ação civil pública ambiental por ele proposta contra Centrais Elétricas
de Santa Catarina S/A - Celesc, objetivando compeli-la a não instalar rede elétrica de
alta voltagem na área objeto da ação, a não ser que cumpridas as condicionantes da
licença ambiental de instalação (LAI).
Irresignado com a prestação jurisdicional entregue, sustenta, o apelante
ser viável e imprescindível a regularização dos postes de energia elétrica instalados
pela empresa-ré, pois desconformes com a LAI (fls. 665 a 677).
Houve contrarrazões (fls. 685 a 691).
O Procurador de Justiça Alexandre Herculano Abreu opinou pelo
provimento do recurso (fls. 698 a 702).
É o relatório.
VOTO
Da exordial colhe-se que o Ministério Público Estadual deflagrou a
presente actio, objetivando, entre outros pedidos, o seguinte:
4 – a procedência do pedido inicial para compelir a CELESC, sob pena de
cominação de multa diária, nos termos do artigo 14, inciso I da Lei nº 6.938/81 c/c
art. 461, § 4º, do CPC:
4.1. à obrigação de não fazer, consistente em doravante abster-se de ligar a
rede de energia elétrica de alta voltagem, na área questionada, a não ser que
devidamente cumpridas as condicionantes da Licença Ambiental de Instalação e
apresentado o relatório de execução dos Programas Ambientais relacionados na
mesma, bem como a apresentação da Licença Ambiental de Operação. (fl. 12)
A sentença desacolheu o pedido inicial à luz da seguinte
fundamentação:
Extrai-se do referido pedido a obrigação pelo cumprimento das condicionantes
da Licença Ambiental de Instalação de fl. 27, e a obrigação de apresentação da
Licença Ambiental de Operação.
Conforme Informação Técnica – IT n. 063/2010 – GELUR já houve a expedição
da Licença Ambiental de Operação – LAO n. 304/09 (fls. 360/361), fato que por si
só esclarece e comprova que as condicionantes contidas na LAI n. 047/08 foram
devidamente cumprida.
Pois bem, retira-se da LAI n. 047/08 que:
[...]
Condições de validade desta Licença Ambiental de Instalação – LAI
[...]
2 - O empreendedor deverá informar a esta FATMA quando da conclusão das
obras de implantação, para efeito de vistoria e emissão da Licença Ambiental de
Operação/LAO
Gabinete Des. João Henrique Blasi
4. [...]
Condições gerais.
[...]
Deverá ser requerida a Licença Ambiental de Operação, antes do início
previsto para o funcionamento, que não será concedida caso não tenham sido
atendidas as restrições e as condições de validade constantes desta licença.
[...]
Se não bastasse isso, houve a comprovação das condicionantes da LAI em
questão, por meio dos documentos juntados às fls. 389/530.
Assim, entendo por devidamente cumprido o pedido contido no item 4.1. da
petição inicial e, por consequência, o indefiro.
De outro lado, não se relegou o fato de que por todo o processo se discutiu
sobre a colocação dos postes na linha de transmissão de energia elétrica entre
Criciúma-Içara, entretanto, da leitura atenta dos autos, estes fatos não constaram
da inicial, isto é, não há pedido a regularização na colocação dos postes. (fls. 663
e 664)
Discordo! O fato de ter sido concedida licença ambiental de operação
(LAO) não autoriza a presunção de que foram cumpridas as condicionantes da licença
ambiental de instalação (LAI), sendo certo, ainda, que, conquanto não tenha havido
pedido expresso para a regularização do assentamento dos postes de energia
elétrica, as condições de validade da LAI obrigavam o empreendedor a conduzir a
obra em consonância com as normas e a legislação municipal vigentes (fl. 27 v.)
Bem por isso do parecer do Parquet, ao manifestar-se sobre a perícia
(fls. 532 a 545), consta:
Segundo prescreve o art. 18, II da Lei Municipal n. 3.901/99 a largura mínima
da faixa carroçável deve ser de 7m (sete metros). Já a faixa destinada
exclusivamente à circulação de pedestres deve ter largura mínima de 1,20m (um
metro e vinte centímetros), medidos a partir do término da faixa de serviço (art. 11,
II, Decreto Municipal n. 184/SA/2008).
Contudo, o laudo pericial (fls. 532-545) demonstra que "os postes da LT 69 KV
foram instalados em diferentes distâncias em relação à margem carroçável [...]
que variam de 0,10 m a 4,43 m" (fl. 539).
Com efeito, o mencionado laudo atesta que alguns dos postes já instalados
encontram-se em desacordo com o Decreto Municipal n. 184/SA/2008, sendo que
inclusive, os postes n. 7 e 9 (gráficos fls 537-538) encontram-se invadindo a
margem carroçável. (fls. 700 e 701)
Deve, nessa contextura, ser reconhecida a procedência do pedido, pois,
como anotado, o laudo pericial evidenciou a desconformidade das obras realizadas
com as condicionantes impostas pela LAI, implicando a necessidade da adoção de
medidas corretivas.
Aplica-se, ao caso, mutatis mutantis, o seguinte precedente:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ESTAÇÕES DE RÁDIO BASE -
ERBs. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM. IMPRESCINDIBILIDADE DE
OBSERVÂNCIA DA LEGISLAÇÃO ESTADUAL E MUNICIPAL. NECESSIDADE
DE LICENÇAS PARA INSTALAÇÃO E FUNCIONAMENTO DE ANTENAS DE
TELEFONIA MÓVEL. PRECEDENTES. RECURSOS DESPROVIDOS. I. "[...]
não se vislumbrando na espécie qualquer interesse jurídico da União ou da
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5. ANATEL, sobretudo porque a discussão não envolve a concessão do serviço de
telefonia móvel, mas a observância, por parte da concessionária, das normas que
dispõem sobre a instalação das estações de rádio-base, a competência para
conhecer e julgar a presente demanda é mesmo da Justiça Comum Estadual."
(TJSC, Apelação Cível n. 2006.027298-4, rel. Des. Jaime Ramos, j. 14.2.2009) II.
"A Lei Estadual n. 12.684/2004, ao disciplinar as condições ambientais para
instalação de antenas de telefonia móvel (Estações de Rádiobase - ERB's), e
determinar a obtenção de licença ambiental (para as novas) ou o licenciamento
corretivo (para aquelas pré-existentes ao diploma), utiliza-se da competência
legislativa concorrente definida na 'Lex Mater', em seu art. 24, VI, VIII e XII, para
matéria ambiental e em defesa da saúde pública, sem o intuito de invadir os
critérios para o exercício de serviço público federal, limitado ao âmbito da União."
(TJSC, Apelação Cível n. 2007. 014201-7, rel. Des. Francisco Oliveira Filho, j.
4.12.2007) (TJSC - AC n. 2010.025036-9, de Urussanga, rel. Des. João Henrique
Blasi, j. 30.4.2013 - negritei).
Registre-se que a discussão sobre a implantação da linha de
transmissão em tela não é nova, tanto que este feito foi-me redistribuído por força de
prevenção em face de apelação cível em mandado de segurança de que fui relator (fl.
704), onde deixei assentado:
APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. MANDADO DE
SEGURANÇA. IMPLANTAÇÃO DE REDE DE ENERGIA ELÉTRICA.
ALEGAÇÃO DE QUE A DISTÂNCIA ENTRE OS POSTES FIXADOS DESTOA
DO EXIGIDO PELA LEGISLAÇÃO. DIVERGÊNCIA FÁTICA. MATÉRIA QUE
DEMANDA DILAÇÃO PROBATÓRIA. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E
CERTO A SER ALBERGADO PELA VIA MANDAMENTAL. EXTINÇÃO, EM
REEXAME NECESSÁRIO, DO MANDAMUS. RECURSO DE APELAÇÃO
PREJUDICADO.
Havendo fundada divergência em relação à matéria fática engastada nos
autos, que somente pode ser dirimida com a produção de prova técnica,
sabidamente descabida em sede de ação mandamental, é de ser extinto o writ,
sem resolução de mérito. (ACMS n. 2009.039127-6, de Criciúma, j. em 10.8.2010
- negritei).
Assim, com espeque na prova pericial, e atentando para o fato de que
"na ação que tenha por objeto o cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, o
juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará providências que
assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento" (art. 84 do CDC
c/c art. 21 da LACP/n. 7.347/85 - negritei), voto pelo provimento do recurso para julgar
procedente o pedido inicial a fim de que a empresa-ré, no prazo de 180 (cento e
oitenta) dias, cumpra as condicionantes da Licença Ambiental de Instalação (fl. 27),
em ordem a regularizar a situação dos postes de energia elétrica assentados em
desconformidade com o Decreto Municipal n. 184/ SA/2008, sob pena de cassação da
Licença Ambiental de Operação.
É como voto.
Gabinete Des. João Henrique Blasi