SlideShare ist ein Scribd-Unternehmen logo
1 von 37
Downloaden Sie, um offline zu lesen
A REVOLTA E AS REVIRAVOLTAS
       DE UMA LETRA

Eduardo Fernandes Paes e Sonia B. Hoffmann




                Porto Alegre
                    2010
A REVOLTA E AS REVIRAVOLTAS DE UMA LETRA



Um novo dia de trabalho tem seu começo. O Dr. Aurélio se
dedica muito à sua profissão e, durante todos os 20 anos
que a exerce, encontrou muitas situações diferentes e
jamais sentiu alguma monotonia porque os casos surgidos
sempre apresentaram novas maneiras e formas de
expressão. Para ele, o direito que cada um de nós temos a
viver nossa diversidade é o valor de maior riqueza que o ser
humano possui.
Sua secretária, em função de tantos anos de trabalho junto
a ele, conhece bem seus hábitos e o modo especial como
trata cada um daqueles que buscam seu auxílio profissional.
Por isso, ela procura deixar tudo muito bem organizado e
arrumado para que todos sintam-se confortáveis e para que
as probabilidades de sobressaltos sejam as menores
possíveis.

Como sempre acontece, ele chega sorridente e
cumprimenta a todos no prédio: desde o porteiro ao
ascensorista. Entra no consultório pela porta lateral e
analisa cuidadosamente as fichas de seus pacientes que já
se encontram sobre a mesa de trabalho.
Embora já se achasse acostumado com as novidades
impactantes, naquele dia, entretanto, ele estranha que em
uma destas fichas, no campo apropriado para a escrita do
nome do paciente, esteja registrado apenas a letra H. Por
esse motivo, o Dr. Aurélio decide interfonar para sua
secretária pedindo-lhe uma explicação sobre aquele fato
esquisito, e ela lhe revela um outro fato ainda mais
estranho: o próximo paciente era justamente a letra H, em
carne e osso, ou melhor, em perfeito símbolo gráfico.

- A senhora está de brincadeira comigo, Dona Seleta?

- Claro que não, Doutor. O seu próximo paciente, isto é,
sua próxima paciente é uma letra mesmo, a letra H. E acho
melhor o senhor não demorar muito a atendê-la, porque ela
está com um aspecto muito triste e abatido e também me
parece bastante nervosa...

Dr. Aurélio desliga o interfone e vai até a porta de seu
gabinete para tirar aquela história a limpo, já que está
achando um imenso absurdo tudo aquilo.

"Já me defrontei com muitas situações na vida... mas
esta... Bem, vamos ver o que está acontecendo. Talvez,
seja um engano... tenho pensado que a Dona Seleta anda
precisando de férias mesmo!"
No entanto, ao abrir a porta, seus olhos se arregalam
diante do que vê na sala de espera de seu consultório: há
realmente uma letra H sentada em uma das poltronas, com
as perninhas cruzadas e esboçando um ar de extremo
abatimento e inegável nervosismo.

No mesmo momento, ela ergue sua cabeça em direção à
porta e seu olhar suplicante cruza com o olhar espantado
do Doutor que, há muito custo, consegue se refazer e
gagueja:

- Entre, por favor, senhorita... ou seria senhora H?
- Já nem sei mais quem sou, Doutor... Quantos anos tenho,
qual meu sexo... até o dicionário me confunde... nele, sou
um substantivo masculino, mas é tão forte meu lado
feminino de letra que me sinto um substantivo feminino!
Serei Homossexual ou Heterossexual?... Penso que sou
mesmo uma Hermafrodita.

O Doutor Aurélio observava ainda espantado aquela letra
que, em pé no centro da sala, torcia e retorcia aflitivamente
suas mãos enquanto despejava uma torrente de palavras,
as quais, em princípio, não pareciam fazer qualquer
sentido.
- Me sinto tão só, Doutor... abandonada, rejeitada,
ignorada... Fico quase Histérica de vez em quando! Sinto
dores Hepáticas Horríveis!!! Tenho descuidado até da
minha Higiene: estou com mau Hálito e já tive sérias
Hemorragias! Penso que vou me tornar Hipocondríaca!!!

- Deite no divã e vamos ver como posso ajudar, disse o
Doutor Aurélio, engolindo em seco diante do que pressentia
ser um quadro complicado. - Diga-me o que a está
afligindo.

- Sabe o que é, Doutor... eu sempre soube que as pessoas
não me pronunciariam naquelas palavras em que eu sou a
primeira letra, já que a própria Fonética diz que em alguns
momentos consideram-me uma consoante muda e, quando
acompanho alguma outra letra, posso ser surda... Com este
papel secundário na Hierarquia social do alfabeto, já estava
até conformada... mas daí até acharem que não sou
necessária ou me esquecerem na escrita de algumas
palavras, vai uma grande diferença!!!

- Bem, vamos com calma. Em primeiro lugar, de onde você
tirou essa ideia de "hierarquia social do alfabeto"?! Você,
como parte integrante e tão indispensável como todas as
outras letras nesse alfabeto, deveria saber que toda letra
possui suas próprias características e sua função na
formação das palavras de uma língua.

- Hummm... Será, Doutor, disse H, um tanto quanto
Hesitante.

- Pelo que percebo, você não concorda comigo, replicou o
Doutor Aurélio, cada vez mais interessado no que aquela
letra lhe dizia.

- Pois é, Doutor. Sinto muito não concordar, mas... Eu já
acreditei nisso que o senhor me falou, mas acho que toda
essa importância que o senhor me atribui não é, pelo que
sinto, verdadeira para grande parte das pessoas...

- E por que diz isso, H?

- Porque, Doutor... Porque, além de esquecerem de me
colocar no início das palavras, muitas pessoas também me
trocam por outra letra, mesmo acompanhada de uma
grande companheira como é a letra C. Imagina, Doutor...
alguns consideram muitas vezes que nós duas somos
aquela vaidosa da X, que pensa ter a rainha na barriga,
porque apresenta muitas possibilidades de pronúncia!...
Enquanto H falava, o Doutor Aurélio se indagava: "Será que
a Técnica da Hipnose poderia ser indicada neste caso?...
Vamos aguardar."

- ... Como o senhor julga que eu e minha amiga C nos
sentimos ao nos vermos trocadas por essa arrogante da X
em palavras como CHuCHu, CHave, fleCHa, caCHoeira,
CHinelo, boCHecha, entre outros absurdos?

- Quer me dizer como você se sente, minha querida H,
quando isso acontece?
- Eu me sinto Hostilizada, Humilhada... Acho isto um crime
Hediondo!!! Às vezes, tenho vontade de dar na X até ela
ficar cheia de Hematomas!!! Aquela Hipócrita, Horrorosa,
com aquele sorrisinho de Hiena que pensa estar sempre
desfilando sob a luz dos Holofotes!!!

- Calma, H, calma!!! Não se agite tanto, implorou o Doutor
Aurélio ao perceber que H estava prestes a começar um
quebra-quebra no seu consultório.

- Ter calma, Doutor?! E quando me esquecem no início das
palavras, então... Me sinto pior ainda!!! Isto é uma
Hecatombe, um ato desprovido de qualquer Humanidade.
Isto me revolta! Quero fugir, quero sumir da Língua
Portuguesa!!! Providenciem meu Holocausto!!!

- Não, não, não diga esta Heresia, H. Tome este copo
d'água com Hortelã. Você vai ficar melhor.

- Água!... Duas moléculas de   Hidrogênio e uma de O... O...
O... Me nego a dizer o som     daquelazinha... Eu não tenho
um som!!! Vou me embora,       vou sumir de Helicóptero, de
Hidroavião... Vou para além    do Horizonte, onde "deve ter
algum lugar bonito pra viver   em paz", como diz o Roberto
Carlos em sua bela canção.
- Mas para onde exatamente você fugiria, H? perguntou o
Doutor Aurélio com voz tranquilizadora.

- Vou para a Inglaterra... ou talvez para os Estados
Unidos... Ou quem sabe para a Austrália... Na Língua
Inglesa, sou valorizada, eu existo quando dizem uma
palavra onde estou, tenho um som! Lá, eu sou Horse,
House, Heart... Aqui, tanto faz como tanto fez estar em
Hospital, Habitação, Halter, Hotel... não me pronunciam
mesmo!

Nesta altura, o Doutor Aurélio já havia entendido
completamente o problema de H: esta letra estava
passando por uma forte crise de identidade, à beira da
depressão. "Tenho de agir com Habilidade, pensou ele, pois
ela tanto pode fugir quanto cometer um suicídio... e até o
Homicídio da X."

- Minha querida H, que tal se Hospedar em uma clínica
gramatical por alguns dias... ou fazer uma viagem de
repouso na cidade da Fonologia... ou assistir a filmes
ortográficos bem-Humorados... ou...

- Não!!! Não!!! Chega, Doutor Aurélio. O senhor não sabe o
que é a crueldade dos Homens? Historicamente, venho
passando por esta situação de discriminação. Eles me
tratam como se eu fosse uma Homóptera!!!

- Uma o quê? perguntou o Dr. Aurélio entre curioso e
pasmo com a indignação de H.

- Homópteros são insetos de duas asas membranosas e
com aparelho bucal sugador, Doutor. Horripilante! Acho
melhor cometer um Haraquiri!!!

- Que Horror, que Horror, H! Não diga isso, morrer desse
jeito... abrindo seu ventre! Lembra, estamos no Brasil, e
não no Japão!!!
H se fechou num silêncio Hermético. O Dr. Aurélio,
percebendo que ela estava meditando sobre tudo que havia
falado até aquele momento, aproveitou para igualmente
refletir sobre toda aquela situação tão inusitada.

"H está tão fragilizada... Penso que, nesta situação, seja
melhor uma internação Hospitalar... Mas tenho de tomar
cuidado para falar com ela sobre isto. Esta letra não
reconhece sua importância e pode pensar que eu quero
mandá-la para um Hospício só para me ver livre dela!

Internada, ela poderia fazer um tratamento alopático ou
Homeopático...   Posso     pedir  Hemogramas...     uma
Helioterapia, quem sabe... um tratamento com a luz solar
pode dar muito resultado. Tudo depende de como ela irá
reagir... Mas será que não existe alguma outra alternativa
de fazer com que H melhore sua autoestima?!"

Enquanto isto, H se afundava cada vez mais nos seus
pensamentos e nos seus sonhos de liberdade, de
valorização e de cidadania... ou como H dizia, de
"cidaletria". Sim, cidadania ou "cidaletria" porque, no
pensamento de H, uma letra tinha direitos e deveres e ela
os queria exercer em toda sua plenitude.

"Que bom seria se eu estivesse em um vasto campo...
Hectares e Hectares de Heliantos! Mas a realidade é dura...
preferem dizer girassóis mesmo! E se eu não fosse uma
letra, mas uma Havaiana... uma Holandesa... uma Hindu...
uma Húngara... ou uma Hamburguesa, quem sabe!? Eu
poderia também fazer parte de um Harem... ou me tornar
uma Heroína!!! Em lugar de ficar me metendo na frente de
algumas palavras, para ser esquecida por todos, eu poderia
aprender a tocar Harmônica ou Harpa... Esquecida por
todos... por todos... por quase todos... não tenho
importância! Não tenho importância alguma!!!"

Esse pensamento em H começou a se repetir cada vez mais
forte, a ressoar na sua mente, e ela, não aguentando mais
essa força, quebrou o silêncio aos gritos:

- Não tenho nenhuma importância! Não sou uma letra
importante! Não gostam de mim!!!

- Como pode dizer isso, H!? Você é muito importante. A sua
falta em algumas palavras pode modificar o significado
dessas palavras, disse o Dr.Aurélio, categórico.

- A minha falta muda o sentido de algumas palavras,
Doutor?!... Foi isso mesmo que o senhor disse? gaguejou
H.
- Sim, H. Pense bem... pense... Hora e ora, sem h... As
duas palavras têm significados diferentes, não é?
argumentou o Doutor, feliz por ter encontrado uma maneira
de H se afastar daqueles pensamentos negativos.

- É verdade, Doutor... o senhor tem razão. Hora é um
substantivo feminino e significa cada uma das 24 partes
que formam o dia; enquanto Ora pode ser um advérbio,
significando agora; ou pode ser uma conjunção equivalente
a pois bem!

- Isso mesmo, H. E que outras palavras você pode lembrar
agora? Apressou-se em acrescentar o Doutor, fazendo com
que H ocupasse seu pensamento com lembranças úteis e
agradáveis.

- Huno e uno! Huno é um adjetivo e se refere a alguém que
fazia parte de um povo bárbaro, muito rude, da Ásia, no
século V da Era Cristã. Foi um povo que colocou em risco o
Império Romano. Mas uno é uma conjugação do verbo
unir: eu uno as duas pontas e dou um nó!

- Isso mesmo! Isso mesmo! Vá em frente, menina!!
incentivou o Dr. Aurélio.

- Hética e ética! Hética é um substantivo feminino e
significa uma doença... é a diminuição lenta e progressiva
da força do organismo... dizem também tísica...

- E ética, H? perguntou o Doutor deslumbrado com a
fisionomia mais entusiasmada da letra.

- Ética, Doutor, é um substantivo feminino que significa o
conjunto de princípios morais que devemos observar no
exercício de uma profissão. Mas é importante que se tenha
ética em todos os nossos relacionamentos, não apenas
naqueles profissionais!

- Viu, viu só como você é importante, H?
- Hummm... Eu ainda não Havia pensado desse jeito...
Hummm...

- Mas pense, H, mas pense! repetia o Doutor Aurélio, muito
alegre com as progressivas modificações no Humor de H.

"Preciso manter H nesta linha de pensamentos, pois assim
ela tem grandes possibilidades de retomar sua valorização
como letra", ponderava o Doutor. Nisto, surgiu-lhe uma
idéia brilhante:

- H, lembra que falou sobre uma companheira com quem
tem grande afinidade?
- Sim, Doutor. É com a letra C, respondeu H.

- Ela é a sua única amiga mais íntima?

- Ah, não... tenho mais duas ótimas amigas: as letras L e N,
com quem formo dois dígrafos conhecidíssimos, Doutor.
Claro que nossos encontros não são um sucesso assim
como aquele das duplas sertanejas, mas temos uma grande
popularidade. É gratificante a gente poder, juntas, construir
tantas e tantas palavras, facilitando o entendimento entre
as pessoas...
- Conte-me mais sobre isto, H, incentivou o Doutor Aurélio,
muito confiante.

- Bem, então vamos começar desde o princípio de tudo,
Doutor. O senhor lembra o que é um dígrafo?

- Bem... Hummm... Um dígrafo é... Deixe-me pensar...
Hummm...

- Acho que é melhor eu lhe refrescar a memória, disse H,
sorrindo marota. - Um dígrafo ocorre quando duas letras
são usadas para representar um único fonema, isto é, um
único som. Existem muitos dígrafos, mas, no meu caso,
acontecem somente quando me reúno com as letras C, L
ou N.

- Claro, isso mesmo... caiu a ficha, minha filha! brincou o
Doutor Aurélio sorridente.

- Ei, Doutor, o senhor falou três palavras seguidas com
dígrafos: fiCHa, miNHa e fiLHa!

- Exatamente, H, você é realmente uma letrinha muito
popular e tem um jeitinho muito especial de explicar as
coisas. Você já pensou em ser professora?
- Ah, já pensei, sim, Doutor. Pensei em ser professora de
tantas coisas... de História, de Hebraico, de Hagiologia, que
vou logo explicando pro senhor que é a disciplina que
estuda a vida dos santos e as coisas sagradas...

- Muito bem, H! Então por que não vai em frente e realiza
logo um desses seus sonhos?! Como já lhe disse, você tem
tudo para ser uma ótima professora.

- O senhor acha mesmo, Doutor? indagou H, já quase
convencida de sua real importância.

- Não só acho como tenho certeza de que será uma
professora bastante competente e muito admirada por seus
alunos, afirmou decididamente o Dr. Aurélio, olhando
fixamente nos olhos de H.

Eles se entreolharam, silenciosos, por um bom tempo... O
tempo necessário para H perscrutar seu espírito... sondar
sua mente... consultar seu coração... e abrir um largo
sorriso, o qual contagiou de imediato o Dr. Aurélio, que
retribuiu com outro não menos significativo sorriso.

E foi justamente H quem primeiro quebrou aquela
cumplicidade silenciosa, levantando-se abruptamente do
divã, pegando sua bolsa e dizendo com firmeza:
- Dr. Aurélio, o senhor nem pode imaginar como me fez
bem conversar esta Horinha aqui com o senhor. Estou me
sentindo outra letra! Estou com vontade de ir agora mesmo
procurar alguma faculdade para me inscrever em seu
vestibular, a fim de futuramente me tornar uma professora.

- Muito bem, H! Estou gostando de ver sua mudança de
atitude diante da vida. E desejo que você...

- Quem deseja no momento alguma coisa sou eu, Dr.
Desejo saber sobre seus Honorários e se devo voltar ao seu
consultório mais algumas vezes?
- Olha, senhorita H, como nunca tratei de uma letra antes,
nem sei lhe dizer quanto poderia cobrar pela consulta e,
por isso, é melhor esquecermos isto por hoje... E quanto a
retornar ao meu consultório... bem... pelo que estou vendo
à minha frente, acredito que só nos encontraremos
novamente em sua formatura de professora, isto é, se a
senhorita se lembrar de me enviar um convite...

O semblante tão sereno e sorridente do Dr. Aurélio e
aquela prova sincera de confiança em sua determinação, a
partir daquele momento, de que viria mesmo a ser uma
professora, fizeram com que H ficasse extremamente
emocionada e sem coragem de contestar aquela não
cobrança da consulta.

- Muito obrigada, Dr. Aurélio por essa gentileza e por me
fazer despertar para minhas Habilidades. Este dia eu não o
esquecerei jamais!!! Para mim, este foi o dia D da minha
mudança interior como letra!!!

Dr. Aurélio, num gesto enternecido, pega seu lenço,
oferece-o a H, que está com os olhos completamente
tomados por lágrimas de gratidão, e diz, com a voz um
pouco embargada pela emoção:
- Só uma correção no que você acabou de dizer, H: Hoje,
não é o seu dia D, e sim o seu dia H!!!

- Com certeza, Doutor, com certeza!!! O senhor entrou em
minha vida na Hora H!!!

Dr. Aurélio acompanha H até a porta de seu consultório,
abraça-a como se estivesse abraçando sua própria filha, e a
segue, com os olhos ainda úmidos, caminhar decididamente
até o elevador, de onde H lhe faz um aceno carinhoso antes
de entrar e desaparecer com seus sonhos de letra
importante.
Ele solta um suspiro de contentamento, fecha a porta da
antessala ainda pensando no futuro brilhante que a H
poderia ter se realmente fosse com coragem e
determinação em busca de seus sonhos, e segue
rapidamente para seu gabinete, pois pôde perceber pelo
canto dos olhos que ainda havia mais uma paciente na sala
de espera e ele não gostaria de deixá-la aguardando por
muito tempo.

Dr. Aurélio senta-se em sua poltrona com o propósito de
agora se concentrar exclusivamente na próxima paciente ,
apanha a última ficha que está sobre sua mesa e, com o
olhar e a alma novamente arregalados por um outro
espanto, que desta vez não lhe seria tão inusitado assim,
murmura o nome da paciente umas quatro vezes e
interfona para sua secretária, dizendo:

Dona Seleta, pode pedir para a senhora X entrar.




                         F i m
© dos autores
Permitida a reprodução




Contatos:
soniab27@terra.com.br
edu@nlnp.net

Sites:
http://www.diversidadeemcena.net
http://www.nlnp.net

Weitere ähnliche Inhalte

Andere mochten auch

Andere mochten auch (8)

Uma letra puxa a outra impressão
Uma letra puxa a outra impressãoUma letra puxa a outra impressão
Uma letra puxa a outra impressão
 
João das letras
João das letrasJoão das letras
João das letras
 
Alfabeto ilustrado
Alfabeto           ilustradoAlfabeto           ilustrado
Alfabeto ilustrado
 
Alfabeto
Alfabeto Alfabeto
Alfabeto
 
Cada letra uma aventura
Cada letra uma aventuraCada letra uma aventura
Cada letra uma aventura
 
ALFABETO
ALFABETO ALFABETO
ALFABETO
 
Hospital das letras
Hospital das letrasHospital das letras
Hospital das letras
 
Apostila "Arca das Letras"
Apostila "Arca das Letras"Apostila "Arca das Letras"
Apostila "Arca das Letras"
 

Ähnlich wie A revolta e a reviravolta de uma letra

Gralha Azul no. 10 - Sobrames Paraná - Abril 2011
Gralha Azul no. 10 - Sobrames Paraná - Abril 2011Gralha Azul no. 10 - Sobrames Paraná - Abril 2011
Gralha Azul no. 10 - Sobrames Paraná - Abril 2011Sérgio Pitaki
 
Entrevista do Médico/Ator Vitor Pordeus para a Revista Leros
Entrevista do Médico/Ator Vitor Pordeus para a Revista Leros Entrevista do Médico/Ator Vitor Pordeus para a Revista Leros
Entrevista do Médico/Ator Vitor Pordeus para a Revista Leros Allyson Grimbow
 
Rehfeld, a. o que diferencia uma abordagem fenomenológico existencial das demais
Rehfeld, a. o que diferencia uma abordagem fenomenológico existencial das demaisRehfeld, a. o que diferencia uma abordagem fenomenológico existencial das demais
Rehfeld, a. o que diferencia uma abordagem fenomenológico existencial das demaisÉrika Renata
 
Reencarnação no Mundo Espiritual
Reencarnação no Mundo EspiritualReencarnação no Mundo Espiritual
Reencarnação no Mundo EspiritualOsvaldo Brascher
 
Reencarnação no Mundo Espiritual
Reencarnação no Mundo EspiritualReencarnação no Mundo Espiritual
Reencarnação no Mundo EspiritualOsvaldo Brascher
 
Abaixo a-depressao-richard-simonetti
Abaixo a-depressao-richard-simonettiAbaixo a-depressao-richard-simonetti
Abaixo a-depressao-richard-simonettimario maciel
 
Abaixo a depressão richard simonetti
Abaixo a depressão   richard simonettiAbaixo a depressão   richard simonetti
Abaixo a depressão richard simonettiHelio Cruz
 
Abaixo a depressão, Richard Simonetti
Abaixo a depressão, Richard SimonettiAbaixo a depressão, Richard Simonetti
Abaixo a depressão, Richard SimonettiPerillo José Nunes
 
Aula 2 (complementar) - Cinco lições de Psicanálise.pdf
Aula 2 (complementar) - Cinco lições de Psicanálise.pdfAula 2 (complementar) - Cinco lições de Psicanálise.pdf
Aula 2 (complementar) - Cinco lições de Psicanálise.pdfFlaviadosSantosNasci
 
Esperando Beckett Ou Chão de Giz...
Esperando Beckett  Ou Chão de Giz...Esperando Beckett  Ou Chão de Giz...
Esperando Beckett Ou Chão de Giz...Muca Velasco
 
Morri e agora (psicografia vera lúcia marinzeck de carvalho espírito antoni...
Morri e agora (psicografia vera lúcia marinzeck de carvalho   espírito antoni...Morri e agora (psicografia vera lúcia marinzeck de carvalho   espírito antoni...
Morri e agora (psicografia vera lúcia marinzeck de carvalho espírito antoni...Sergio Brito Filho
 
A Morte É Um Dia que Vale a Pena Viver - Ana Claudia.pdf
A Morte É Um Dia que Vale a Pena Viver - Ana Claudia.pdfA Morte É Um Dia que Vale a Pena Viver - Ana Claudia.pdf
A Morte É Um Dia que Vale a Pena Viver - Ana Claudia.pdfPauloCesarSilva45
 
Rehfeld, a. especificidade de uma psicoterapia fenomenológico existencial
Rehfeld, a. especificidade de uma psicoterapia fenomenológico existencialRehfeld, a. especificidade de uma psicoterapia fenomenológico existencial
Rehfeld, a. especificidade de uma psicoterapia fenomenológico existencialÉrika Renata
 
Ernesto bozzano cinco excepcionais casos de identificação de espíritos
Ernesto bozzano   cinco excepcionais casos de identificação de espíritosErnesto bozzano   cinco excepcionais casos de identificação de espíritos
Ernesto bozzano cinco excepcionais casos de identificação de espíritosClaudia Ruzicki Kremer
 
Ensaio literatura portuguesa: José Cardoso Pires, "De Profundis, Valsa Lenta"
Ensaio literatura portuguesa: José Cardoso Pires, "De Profundis, Valsa Lenta"Ensaio literatura portuguesa: José Cardoso Pires, "De Profundis, Valsa Lenta"
Ensaio literatura portuguesa: José Cardoso Pires, "De Profundis, Valsa Lenta"UFMG
 
O Pensamento Vivo do Dr. Inácio
O Pensamento Vivo do Dr. InácioO Pensamento Vivo do Dr. Inácio
O Pensamento Vivo do Dr. InácioOsvaldo Brascher
 

Ähnlich wie A revolta e a reviravolta de uma letra (20)

Gralha Azul no. 10 - Sobrames Paraná - Abril 2011
Gralha Azul no. 10 - Sobrames Paraná - Abril 2011Gralha Azul no. 10 - Sobrames Paraná - Abril 2011
Gralha Azul no. 10 - Sobrames Paraná - Abril 2011
 
Entrevista do Médico/Ator Vitor Pordeus para a Revista Leros
Entrevista do Médico/Ator Vitor Pordeus para a Revista Leros Entrevista do Médico/Ator Vitor Pordeus para a Revista Leros
Entrevista do Médico/Ator Vitor Pordeus para a Revista Leros
 
A Escada de Jacó
A Escada de JacóA Escada de Jacó
A Escada de Jacó
 
Rehfeld, a. o que diferencia uma abordagem fenomenológico existencial das demais
Rehfeld, a. o que diferencia uma abordagem fenomenológico existencial das demaisRehfeld, a. o que diferencia uma abordagem fenomenológico existencial das demais
Rehfeld, a. o que diferencia uma abordagem fenomenológico existencial das demais
 
Reencarnação no Mundo Espiritual
Reencarnação no Mundo EspiritualReencarnação no Mundo Espiritual
Reencarnação no Mundo Espiritual
 
Reencarnação no Mundo Espiritual
Reencarnação no Mundo EspiritualReencarnação no Mundo Espiritual
Reencarnação no Mundo Espiritual
 
Por Amor ao Ideal
Por Amor ao IdealPor Amor ao Ideal
Por Amor ao Ideal
 
Abaixo a-depressao-richard-simonetti
Abaixo a-depressao-richard-simonettiAbaixo a-depressao-richard-simonetti
Abaixo a-depressao-richard-simonetti
 
Abaixo a depressão richard simonetti
Abaixo a depressão   richard simonettiAbaixo a depressão   richard simonetti
Abaixo a depressão richard simonetti
 
Abaixo a depressão, Richard Simonetti
Abaixo a depressão, Richard SimonettiAbaixo a depressão, Richard Simonetti
Abaixo a depressão, Richard Simonetti
 
Aula 2 (complementar) - Cinco lições de Psicanálise.pdf
Aula 2 (complementar) - Cinco lições de Psicanálise.pdfAula 2 (complementar) - Cinco lições de Psicanálise.pdf
Aula 2 (complementar) - Cinco lições de Psicanálise.pdf
 
Esperando Beckett Ou Chão de Giz...
Esperando Beckett  Ou Chão de Giz...Esperando Beckett  Ou Chão de Giz...
Esperando Beckett Ou Chão de Giz...
 
Morri e agora (psicografia vera lúcia marinzeck de carvalho espírito antoni...
Morri e agora (psicografia vera lúcia marinzeck de carvalho   espírito antoni...Morri e agora (psicografia vera lúcia marinzeck de carvalho   espírito antoni...
Morri e agora (psicografia vera lúcia marinzeck de carvalho espírito antoni...
 
Infinitas Moradas
Infinitas MoradasInfinitas Moradas
Infinitas Moradas
 
A Morte É Um Dia que Vale a Pena Viver - Ana Claudia.pdf
A Morte É Um Dia que Vale a Pena Viver - Ana Claudia.pdfA Morte É Um Dia que Vale a Pena Viver - Ana Claudia.pdf
A Morte É Um Dia que Vale a Pena Viver - Ana Claudia.pdf
 
A vida Viaja na Luz
A vida Viaja na LuzA vida Viaja na Luz
A vida Viaja na Luz
 
Rehfeld, a. especificidade de uma psicoterapia fenomenológico existencial
Rehfeld, a. especificidade de uma psicoterapia fenomenológico existencialRehfeld, a. especificidade de uma psicoterapia fenomenológico existencial
Rehfeld, a. especificidade de uma psicoterapia fenomenológico existencial
 
Ernesto bozzano cinco excepcionais casos de identificação de espíritos
Ernesto bozzano   cinco excepcionais casos de identificação de espíritosErnesto bozzano   cinco excepcionais casos de identificação de espíritos
Ernesto bozzano cinco excepcionais casos de identificação de espíritos
 
Ensaio literatura portuguesa: José Cardoso Pires, "De Profundis, Valsa Lenta"
Ensaio literatura portuguesa: José Cardoso Pires, "De Profundis, Valsa Lenta"Ensaio literatura portuguesa: José Cardoso Pires, "De Profundis, Valsa Lenta"
Ensaio literatura portuguesa: José Cardoso Pires, "De Profundis, Valsa Lenta"
 
O Pensamento Vivo do Dr. Inácio
O Pensamento Vivo do Dr. InácioO Pensamento Vivo do Dr. Inácio
O Pensamento Vivo do Dr. Inácio
 

Mehr von José Antonio Klaes Roig

Blogs educacionais como ambientes de aprendizagem mútua
Blogs educacionais como ambientes de aprendizagem mútuaBlogs educacionais como ambientes de aprendizagem mútua
Blogs educacionais como ambientes de aprendizagem mútuaJosé Antonio Klaes Roig
 
Arte, Tecnologia e Multiletramento na Educação / II FLIC - Feira Literária do...
Arte, Tecnologia e Multiletramento na Educação / II FLIC - Feira Literária do...Arte, Tecnologia e Multiletramento na Educação / II FLIC - Feira Literária do...
Arte, Tecnologia e Multiletramento na Educação / II FLIC - Feira Literária do...José Antonio Klaes Roig
 
Artigo espaços sustentáveis através da arte e educação by cei raio de sol joi...
Artigo espaços sustentáveis através da arte e educação by cei raio de sol joi...Artigo espaços sustentáveis através da arte e educação by cei raio de sol joi...
Artigo espaços sustentáveis através da arte e educação by cei raio de sol joi...José Antonio Klaes Roig
 
Cei raio de sol joinville sc brasil educação meio ambiente e sociedade
Cei raio de sol joinville sc brasil educação meio ambiente e sociedadeCei raio de sol joinville sc brasil educação meio ambiente e sociedade
Cei raio de sol joinville sc brasil educação meio ambiente e sociedadeJosé Antonio Klaes Roig
 
Convergencia educacional tecnologica e social jose roig
Convergencia educacional tecnologica e social jose roigConvergencia educacional tecnologica e social jose roig
Convergencia educacional tecnologica e social jose roigJosé Antonio Klaes Roig
 
Sheila rodrigues seminário boas práticas pedagógicas e digitais 2012
Sheila rodrigues  seminário boas práticas pedagógicas e digitais 2012Sheila rodrigues  seminário boas práticas pedagógicas e digitais 2012
Sheila rodrigues seminário boas práticas pedagógicas e digitais 2012José Antonio Klaes Roig
 
Regina xavier seminário de boas práticas pedagógicas e digitais
Regina xavier  seminário de boas práticas pedagógicas e digitaisRegina xavier  seminário de boas práticas pedagógicas e digitais
Regina xavier seminário de boas práticas pedagógicas e digitaisJosé Antonio Klaes Roig
 
Valesca Irala Seminário boas práticas digitais 2012
Valesca Irala  Seminário boas práticas digitais 2012Valesca Irala  Seminário boas práticas digitais 2012
Valesca Irala Seminário boas práticas digitais 2012José Antonio Klaes Roig
 

Mehr von José Antonio Klaes Roig (20)

Blogs educacionais como ambientes de aprendizagem mútua
Blogs educacionais como ambientes de aprendizagem mútuaBlogs educacionais como ambientes de aprendizagem mútua
Blogs educacionais como ambientes de aprendizagem mútua
 
Arte, Tecnologia e Multiletramento na Educação / II FLIC - Feira Literária do...
Arte, Tecnologia e Multiletramento na Educação / II FLIC - Feira Literária do...Arte, Tecnologia e Multiletramento na Educação / II FLIC - Feira Literária do...
Arte, Tecnologia e Multiletramento na Educação / II FLIC - Feira Literária do...
 
Artigo espaços sustentáveis através da arte e educação by cei raio de sol joi...
Artigo espaços sustentáveis através da arte e educação by cei raio de sol joi...Artigo espaços sustentáveis através da arte e educação by cei raio de sol joi...
Artigo espaços sustentáveis através da arte e educação by cei raio de sol joi...
 
Cei raio de sol joinville sc brasil educação meio ambiente e sociedade
Cei raio de sol joinville sc brasil educação meio ambiente e sociedadeCei raio de sol joinville sc brasil educação meio ambiente e sociedade
Cei raio de sol joinville sc brasil educação meio ambiente e sociedade
 
Convergencia educacional tecnologica e social jose roig
Convergencia educacional tecnologica e social jose roigConvergencia educacional tecnologica e social jose roig
Convergencia educacional tecnologica e social jose roig
 
Sheila rodrigues seminário boas práticas pedagógicas e digitais 2012
Sheila rodrigues  seminário boas práticas pedagógicas e digitais 2012Sheila rodrigues  seminário boas práticas pedagógicas e digitais 2012
Sheila rodrigues seminário boas práticas pedagógicas e digitais 2012
 
Regina xavier seminário de boas práticas pedagógicas e digitais
Regina xavier  seminário de boas práticas pedagógicas e digitaisRegina xavier  seminário de boas práticas pedagógicas e digitais
Regina xavier seminário de boas práticas pedagógicas e digitais
 
Valesca Irala Seminário boas práticas digitais 2012
Valesca Irala  Seminário boas práticas digitais 2012Valesca Irala  Seminário boas práticas digitais 2012
Valesca Irala Seminário boas práticas digitais 2012
 
O menino que queria voar
O menino que queria voarO menino que queria voar
O menino que queria voar
 
O menino que queria voar
O menino que queria voarO menino que queria voar
O menino que queria voar
 
O menino que queria voar
O menino que queria voarO menino que queria voar
O menino que queria voar
 
Apresentacão fórum lagoa dos patos
Apresentacão fórum lagoa dos patosApresentacão fórum lagoa dos patos
Apresentacão fórum lagoa dos patos
 
Pro ea gestão e conhecimento
Pro ea gestão e conhecimentoPro ea gestão e conhecimento
Pro ea gestão e conhecimento
 
Proea gestão e conhecimento
Proea gestão e conhecimentoProea gestão e conhecimento
Proea gestão e conhecimento
 
Pro ea gestão e conhecimento
Pro ea gestão e conhecimentoPro ea gestão e conhecimento
Pro ea gestão e conhecimento
 
Pro ea gestão e conhecimento
Pro ea gestão e conhecimentoPro ea gestão e conhecimento
Pro ea gestão e conhecimento
 
Nós estamos conectados professores
Nós estamos conectados professoresNós estamos conectados professores
Nós estamos conectados professores
 
Pro ea gestão e conhecimento
Pro ea gestão e conhecimentoPro ea gestão e conhecimento
Pro ea gestão e conhecimento
 
Pro ea gestão e conhecimento
Pro ea gestão e conhecimentoPro ea gestão e conhecimento
Pro ea gestão e conhecimento
 
Pro ea gestão e conhecimento
Pro ea gestão e conhecimentoPro ea gestão e conhecimento
Pro ea gestão e conhecimento
 

A revolta e a reviravolta de uma letra

  • 1. A REVOLTA E AS REVIRAVOLTAS DE UMA LETRA Eduardo Fernandes Paes e Sonia B. Hoffmann Porto Alegre 2010
  • 2. A REVOLTA E AS REVIRAVOLTAS DE UMA LETRA Um novo dia de trabalho tem seu começo. O Dr. Aurélio se dedica muito à sua profissão e, durante todos os 20 anos que a exerce, encontrou muitas situações diferentes e jamais sentiu alguma monotonia porque os casos surgidos sempre apresentaram novas maneiras e formas de expressão. Para ele, o direito que cada um de nós temos a viver nossa diversidade é o valor de maior riqueza que o ser humano possui.
  • 3. Sua secretária, em função de tantos anos de trabalho junto a ele, conhece bem seus hábitos e o modo especial como trata cada um daqueles que buscam seu auxílio profissional. Por isso, ela procura deixar tudo muito bem organizado e arrumado para que todos sintam-se confortáveis e para que as probabilidades de sobressaltos sejam as menores possíveis. Como sempre acontece, ele chega sorridente e cumprimenta a todos no prédio: desde o porteiro ao ascensorista. Entra no consultório pela porta lateral e analisa cuidadosamente as fichas de seus pacientes que já se encontram sobre a mesa de trabalho.
  • 4. Embora já se achasse acostumado com as novidades impactantes, naquele dia, entretanto, ele estranha que em uma destas fichas, no campo apropriado para a escrita do nome do paciente, esteja registrado apenas a letra H. Por esse motivo, o Dr. Aurélio decide interfonar para sua secretária pedindo-lhe uma explicação sobre aquele fato esquisito, e ela lhe revela um outro fato ainda mais estranho: o próximo paciente era justamente a letra H, em carne e osso, ou melhor, em perfeito símbolo gráfico. - A senhora está de brincadeira comigo, Dona Seleta? - Claro que não, Doutor. O seu próximo paciente, isto é,
  • 5. sua próxima paciente é uma letra mesmo, a letra H. E acho melhor o senhor não demorar muito a atendê-la, porque ela está com um aspecto muito triste e abatido e também me parece bastante nervosa... Dr. Aurélio desliga o interfone e vai até a porta de seu gabinete para tirar aquela história a limpo, já que está achando um imenso absurdo tudo aquilo. "Já me defrontei com muitas situações na vida... mas esta... Bem, vamos ver o que está acontecendo. Talvez, seja um engano... tenho pensado que a Dona Seleta anda precisando de férias mesmo!"
  • 6. No entanto, ao abrir a porta, seus olhos se arregalam diante do que vê na sala de espera de seu consultório: há realmente uma letra H sentada em uma das poltronas, com as perninhas cruzadas e esboçando um ar de extremo abatimento e inegável nervosismo. No mesmo momento, ela ergue sua cabeça em direção à porta e seu olhar suplicante cruza com o olhar espantado do Doutor que, há muito custo, consegue se refazer e gagueja: - Entre, por favor, senhorita... ou seria senhora H?
  • 7. - Já nem sei mais quem sou, Doutor... Quantos anos tenho, qual meu sexo... até o dicionário me confunde... nele, sou um substantivo masculino, mas é tão forte meu lado feminino de letra que me sinto um substantivo feminino! Serei Homossexual ou Heterossexual?... Penso que sou mesmo uma Hermafrodita. O Doutor Aurélio observava ainda espantado aquela letra que, em pé no centro da sala, torcia e retorcia aflitivamente suas mãos enquanto despejava uma torrente de palavras, as quais, em princípio, não pareciam fazer qualquer sentido.
  • 8. - Me sinto tão só, Doutor... abandonada, rejeitada, ignorada... Fico quase Histérica de vez em quando! Sinto dores Hepáticas Horríveis!!! Tenho descuidado até da minha Higiene: estou com mau Hálito e já tive sérias Hemorragias! Penso que vou me tornar Hipocondríaca!!! - Deite no divã e vamos ver como posso ajudar, disse o Doutor Aurélio, engolindo em seco diante do que pressentia ser um quadro complicado. - Diga-me o que a está afligindo. - Sabe o que é, Doutor... eu sempre soube que as pessoas não me pronunciariam naquelas palavras em que eu sou a
  • 9. primeira letra, já que a própria Fonética diz que em alguns momentos consideram-me uma consoante muda e, quando acompanho alguma outra letra, posso ser surda... Com este papel secundário na Hierarquia social do alfabeto, já estava até conformada... mas daí até acharem que não sou necessária ou me esquecerem na escrita de algumas palavras, vai uma grande diferença!!! - Bem, vamos com calma. Em primeiro lugar, de onde você tirou essa ideia de "hierarquia social do alfabeto"?! Você, como parte integrante e tão indispensável como todas as outras letras nesse alfabeto, deveria saber que toda letra
  • 10. possui suas próprias características e sua função na formação das palavras de uma língua. - Hummm... Será, Doutor, disse H, um tanto quanto Hesitante. - Pelo que percebo, você não concorda comigo, replicou o Doutor Aurélio, cada vez mais interessado no que aquela letra lhe dizia. - Pois é, Doutor. Sinto muito não concordar, mas... Eu já acreditei nisso que o senhor me falou, mas acho que toda
  • 11. essa importância que o senhor me atribui não é, pelo que sinto, verdadeira para grande parte das pessoas... - E por que diz isso, H? - Porque, Doutor... Porque, além de esquecerem de me colocar no início das palavras, muitas pessoas também me trocam por outra letra, mesmo acompanhada de uma grande companheira como é a letra C. Imagina, Doutor... alguns consideram muitas vezes que nós duas somos aquela vaidosa da X, que pensa ter a rainha na barriga, porque apresenta muitas possibilidades de pronúncia!...
  • 12. Enquanto H falava, o Doutor Aurélio se indagava: "Será que a Técnica da Hipnose poderia ser indicada neste caso?... Vamos aguardar." - ... Como o senhor julga que eu e minha amiga C nos sentimos ao nos vermos trocadas por essa arrogante da X em palavras como CHuCHu, CHave, fleCHa, caCHoeira, CHinelo, boCHecha, entre outros absurdos? - Quer me dizer como você se sente, minha querida H, quando isso acontece?
  • 13. - Eu me sinto Hostilizada, Humilhada... Acho isto um crime Hediondo!!! Às vezes, tenho vontade de dar na X até ela ficar cheia de Hematomas!!! Aquela Hipócrita, Horrorosa, com aquele sorrisinho de Hiena que pensa estar sempre desfilando sob a luz dos Holofotes!!! - Calma, H, calma!!! Não se agite tanto, implorou o Doutor Aurélio ao perceber que H estava prestes a começar um quebra-quebra no seu consultório. - Ter calma, Doutor?! E quando me esquecem no início das palavras, então... Me sinto pior ainda!!! Isto é uma Hecatombe, um ato desprovido de qualquer Humanidade.
  • 14. Isto me revolta! Quero fugir, quero sumir da Língua Portuguesa!!! Providenciem meu Holocausto!!! - Não, não, não diga esta Heresia, H. Tome este copo d'água com Hortelã. Você vai ficar melhor. - Água!... Duas moléculas de Hidrogênio e uma de O... O... O... Me nego a dizer o som daquelazinha... Eu não tenho um som!!! Vou me embora, vou sumir de Helicóptero, de Hidroavião... Vou para além do Horizonte, onde "deve ter algum lugar bonito pra viver em paz", como diz o Roberto Carlos em sua bela canção.
  • 15. - Mas para onde exatamente você fugiria, H? perguntou o Doutor Aurélio com voz tranquilizadora. - Vou para a Inglaterra... ou talvez para os Estados Unidos... Ou quem sabe para a Austrália... Na Língua Inglesa, sou valorizada, eu existo quando dizem uma palavra onde estou, tenho um som! Lá, eu sou Horse, House, Heart... Aqui, tanto faz como tanto fez estar em Hospital, Habitação, Halter, Hotel... não me pronunciam mesmo! Nesta altura, o Doutor Aurélio já havia entendido completamente o problema de H: esta letra estava
  • 16. passando por uma forte crise de identidade, à beira da depressão. "Tenho de agir com Habilidade, pensou ele, pois ela tanto pode fugir quanto cometer um suicídio... e até o Homicídio da X." - Minha querida H, que tal se Hospedar em uma clínica gramatical por alguns dias... ou fazer uma viagem de repouso na cidade da Fonologia... ou assistir a filmes ortográficos bem-Humorados... ou... - Não!!! Não!!! Chega, Doutor Aurélio. O senhor não sabe o que é a crueldade dos Homens? Historicamente, venho
  • 17. passando por esta situação de discriminação. Eles me tratam como se eu fosse uma Homóptera!!! - Uma o quê? perguntou o Dr. Aurélio entre curioso e pasmo com a indignação de H. - Homópteros são insetos de duas asas membranosas e com aparelho bucal sugador, Doutor. Horripilante! Acho melhor cometer um Haraquiri!!! - Que Horror, que Horror, H! Não diga isso, morrer desse jeito... abrindo seu ventre! Lembra, estamos no Brasil, e não no Japão!!!
  • 18. H se fechou num silêncio Hermético. O Dr. Aurélio, percebendo que ela estava meditando sobre tudo que havia falado até aquele momento, aproveitou para igualmente refletir sobre toda aquela situação tão inusitada. "H está tão fragilizada... Penso que, nesta situação, seja melhor uma internação Hospitalar... Mas tenho de tomar cuidado para falar com ela sobre isto. Esta letra não reconhece sua importância e pode pensar que eu quero mandá-la para um Hospício só para me ver livre dela! Internada, ela poderia fazer um tratamento alopático ou Homeopático... Posso pedir Hemogramas... uma
  • 19. Helioterapia, quem sabe... um tratamento com a luz solar pode dar muito resultado. Tudo depende de como ela irá reagir... Mas será que não existe alguma outra alternativa de fazer com que H melhore sua autoestima?!" Enquanto isto, H se afundava cada vez mais nos seus pensamentos e nos seus sonhos de liberdade, de valorização e de cidadania... ou como H dizia, de "cidaletria". Sim, cidadania ou "cidaletria" porque, no pensamento de H, uma letra tinha direitos e deveres e ela os queria exercer em toda sua plenitude. "Que bom seria se eu estivesse em um vasto campo...
  • 20. Hectares e Hectares de Heliantos! Mas a realidade é dura... preferem dizer girassóis mesmo! E se eu não fosse uma letra, mas uma Havaiana... uma Holandesa... uma Hindu... uma Húngara... ou uma Hamburguesa, quem sabe!? Eu poderia também fazer parte de um Harem... ou me tornar uma Heroína!!! Em lugar de ficar me metendo na frente de algumas palavras, para ser esquecida por todos, eu poderia aprender a tocar Harmônica ou Harpa... Esquecida por todos... por todos... por quase todos... não tenho importância! Não tenho importância alguma!!!" Esse pensamento em H começou a se repetir cada vez mais
  • 21. forte, a ressoar na sua mente, e ela, não aguentando mais essa força, quebrou o silêncio aos gritos: - Não tenho nenhuma importância! Não sou uma letra importante! Não gostam de mim!!! - Como pode dizer isso, H!? Você é muito importante. A sua falta em algumas palavras pode modificar o significado dessas palavras, disse o Dr.Aurélio, categórico. - A minha falta muda o sentido de algumas palavras, Doutor?!... Foi isso mesmo que o senhor disse? gaguejou H.
  • 22. - Sim, H. Pense bem... pense... Hora e ora, sem h... As duas palavras têm significados diferentes, não é? argumentou o Doutor, feliz por ter encontrado uma maneira de H se afastar daqueles pensamentos negativos. - É verdade, Doutor... o senhor tem razão. Hora é um substantivo feminino e significa cada uma das 24 partes que formam o dia; enquanto Ora pode ser um advérbio, significando agora; ou pode ser uma conjunção equivalente a pois bem! - Isso mesmo, H. E que outras palavras você pode lembrar agora? Apressou-se em acrescentar o Doutor, fazendo com
  • 23. que H ocupasse seu pensamento com lembranças úteis e agradáveis. - Huno e uno! Huno é um adjetivo e se refere a alguém que fazia parte de um povo bárbaro, muito rude, da Ásia, no século V da Era Cristã. Foi um povo que colocou em risco o Império Romano. Mas uno é uma conjugação do verbo unir: eu uno as duas pontas e dou um nó! - Isso mesmo! Isso mesmo! Vá em frente, menina!! incentivou o Dr. Aurélio. - Hética e ética! Hética é um substantivo feminino e
  • 24. significa uma doença... é a diminuição lenta e progressiva da força do organismo... dizem também tísica... - E ética, H? perguntou o Doutor deslumbrado com a fisionomia mais entusiasmada da letra. - Ética, Doutor, é um substantivo feminino que significa o conjunto de princípios morais que devemos observar no exercício de uma profissão. Mas é importante que se tenha ética em todos os nossos relacionamentos, não apenas naqueles profissionais! - Viu, viu só como você é importante, H?
  • 25. - Hummm... Eu ainda não Havia pensado desse jeito... Hummm... - Mas pense, H, mas pense! repetia o Doutor Aurélio, muito alegre com as progressivas modificações no Humor de H. "Preciso manter H nesta linha de pensamentos, pois assim ela tem grandes possibilidades de retomar sua valorização como letra", ponderava o Doutor. Nisto, surgiu-lhe uma idéia brilhante: - H, lembra que falou sobre uma companheira com quem tem grande afinidade?
  • 26. - Sim, Doutor. É com a letra C, respondeu H. - Ela é a sua única amiga mais íntima? - Ah, não... tenho mais duas ótimas amigas: as letras L e N, com quem formo dois dígrafos conhecidíssimos, Doutor. Claro que nossos encontros não são um sucesso assim como aquele das duplas sertanejas, mas temos uma grande popularidade. É gratificante a gente poder, juntas, construir tantas e tantas palavras, facilitando o entendimento entre as pessoas...
  • 27. - Conte-me mais sobre isto, H, incentivou o Doutor Aurélio, muito confiante. - Bem, então vamos começar desde o princípio de tudo, Doutor. O senhor lembra o que é um dígrafo? - Bem... Hummm... Um dígrafo é... Deixe-me pensar... Hummm... - Acho que é melhor eu lhe refrescar a memória, disse H, sorrindo marota. - Um dígrafo ocorre quando duas letras são usadas para representar um único fonema, isto é, um único som. Existem muitos dígrafos, mas, no meu caso,
  • 28. acontecem somente quando me reúno com as letras C, L ou N. - Claro, isso mesmo... caiu a ficha, minha filha! brincou o Doutor Aurélio sorridente. - Ei, Doutor, o senhor falou três palavras seguidas com dígrafos: fiCHa, miNHa e fiLHa! - Exatamente, H, você é realmente uma letrinha muito popular e tem um jeitinho muito especial de explicar as coisas. Você já pensou em ser professora?
  • 29. - Ah, já pensei, sim, Doutor. Pensei em ser professora de tantas coisas... de História, de Hebraico, de Hagiologia, que vou logo explicando pro senhor que é a disciplina que estuda a vida dos santos e as coisas sagradas... - Muito bem, H! Então por que não vai em frente e realiza logo um desses seus sonhos?! Como já lhe disse, você tem tudo para ser uma ótima professora. - O senhor acha mesmo, Doutor? indagou H, já quase convencida de sua real importância. - Não só acho como tenho certeza de que será uma
  • 30. professora bastante competente e muito admirada por seus alunos, afirmou decididamente o Dr. Aurélio, olhando fixamente nos olhos de H. Eles se entreolharam, silenciosos, por um bom tempo... O tempo necessário para H perscrutar seu espírito... sondar sua mente... consultar seu coração... e abrir um largo sorriso, o qual contagiou de imediato o Dr. Aurélio, que retribuiu com outro não menos significativo sorriso. E foi justamente H quem primeiro quebrou aquela cumplicidade silenciosa, levantando-se abruptamente do divã, pegando sua bolsa e dizendo com firmeza:
  • 31. - Dr. Aurélio, o senhor nem pode imaginar como me fez bem conversar esta Horinha aqui com o senhor. Estou me sentindo outra letra! Estou com vontade de ir agora mesmo procurar alguma faculdade para me inscrever em seu vestibular, a fim de futuramente me tornar uma professora. - Muito bem, H! Estou gostando de ver sua mudança de atitude diante da vida. E desejo que você... - Quem deseja no momento alguma coisa sou eu, Dr. Desejo saber sobre seus Honorários e se devo voltar ao seu consultório mais algumas vezes?
  • 32. - Olha, senhorita H, como nunca tratei de uma letra antes, nem sei lhe dizer quanto poderia cobrar pela consulta e, por isso, é melhor esquecermos isto por hoje... E quanto a retornar ao meu consultório... bem... pelo que estou vendo à minha frente, acredito que só nos encontraremos novamente em sua formatura de professora, isto é, se a senhorita se lembrar de me enviar um convite... O semblante tão sereno e sorridente do Dr. Aurélio e aquela prova sincera de confiança em sua determinação, a partir daquele momento, de que viria mesmo a ser uma professora, fizeram com que H ficasse extremamente
  • 33. emocionada e sem coragem de contestar aquela não cobrança da consulta. - Muito obrigada, Dr. Aurélio por essa gentileza e por me fazer despertar para minhas Habilidades. Este dia eu não o esquecerei jamais!!! Para mim, este foi o dia D da minha mudança interior como letra!!! Dr. Aurélio, num gesto enternecido, pega seu lenço, oferece-o a H, que está com os olhos completamente tomados por lágrimas de gratidão, e diz, com a voz um pouco embargada pela emoção:
  • 34. - Só uma correção no que você acabou de dizer, H: Hoje, não é o seu dia D, e sim o seu dia H!!! - Com certeza, Doutor, com certeza!!! O senhor entrou em minha vida na Hora H!!! Dr. Aurélio acompanha H até a porta de seu consultório, abraça-a como se estivesse abraçando sua própria filha, e a segue, com os olhos ainda úmidos, caminhar decididamente até o elevador, de onde H lhe faz um aceno carinhoso antes de entrar e desaparecer com seus sonhos de letra importante.
  • 35. Ele solta um suspiro de contentamento, fecha a porta da antessala ainda pensando no futuro brilhante que a H poderia ter se realmente fosse com coragem e determinação em busca de seus sonhos, e segue rapidamente para seu gabinete, pois pôde perceber pelo canto dos olhos que ainda havia mais uma paciente na sala de espera e ele não gostaria de deixá-la aguardando por muito tempo. Dr. Aurélio senta-se em sua poltrona com o propósito de agora se concentrar exclusivamente na próxima paciente , apanha a última ficha que está sobre sua mesa e, com o olhar e a alma novamente arregalados por um outro
  • 36. espanto, que desta vez não lhe seria tão inusitado assim, murmura o nome da paciente umas quatro vezes e interfona para sua secretária, dizendo: Dona Seleta, pode pedir para a senhora X entrar. F i m
  • 37. © dos autores Permitida a reprodução Contatos: soniab27@terra.com.br edu@nlnp.net Sites: http://www.diversidadeemcena.net http://www.nlnp.net